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Natureza versus Graça

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4. A natureza tudo faz para seu próprio interesse e proveito, nada 
sabe fazer de graça, mas espera sempre, pelo bem que faz, 
receber outro tanto ou melhor em elogios ou favores e deseja que 
se faça grande caso de seus efeitos e dons. A graça, porém, não 
busca nenhuma coisa temporal, nem deseja outro prêmio, senão 
Deus só, e do temporal não deseja mais do que quanto lhe possa 
servir para conseguir a vida eterna. 
5. A natureza preza-se de muitos amigos e parentes, ufana-se de sua 
posição elevada e linhagem ilustre, procura agradar aos 
poderosos, lisonjeia os ricos, aplaude os seus iguais. A graça, 
porém, ama os próprios inimigos, não se gaba do grande número 
de seus amigos, não faz caso de posição e nobreza, se lhes não 
vê unida maior virtude. Favorece mais ao pobre que ao rico, tem 
mais compaixão do inocente do que do poderoso, alegra-se com o 
sincero, e não com o mentiroso. Estimula sempre os bons e 
maiores progressos, para que se assemelhem, pelas virtudes, ao 
Filho de Deus. A natureza logo se queixa da penúria e do trabalho. 
A graça sofre com paciência a pobreza. 
6. A natureza atribui tudo a si, em proveito seu peleja a porfia. A 
graça, porém, atribui tudo a Deus, de quem tudo dimana como de 
sua origem; nenhum bem atribui a si com arrogante presunção, 
não questiona, nem prefere a sua opinião à dos outros, mas em 
todo juízo e parecer se sujeita à sabedoria eterna e ao divino 
exame. A natureza deseja saber segredos e ouvir novidades, quer 
exibir-se em público e experimentar muitas coisas pelos sentidos; 
deseja ser conhecida e fazer aquilo donde lhe resultem louvor e 
admiração. A graça não cuida de novidades e curiosidades, porque 
tudo isso nasce da corrupção antiga, pois nada há de novo e 
estável sobre a terra. Ensina, pois, a refrear os sentidos, a evitar a 
vã complacência e ostentação, a ocultar humildemente o que 
provoque admiração e louvor, busca em todas as coisas e ciências 
proveito espiritual e a honra e glória de Deus. Não quer que a 
louvem, nem às suas obras, mas que Deus seja bendito em seus 
dons, que ele prodigaliza a todos por mera bondade. 
7. A graça é uma luz sobrenatural e um dom especial de Deus; é 
propriamente o sinal dos escolhidos e o penhor da salvação eterna, 
pois eleva o homem das coisas terrenas ao amor das celestiais, e 
de carnal o torna espiritual. Quanto mais, pois, é oprimida e 
dominada a natureza, tanto maior graça é infundida, e tanto mais 
cada dia é renovado o homem interior, conforme a imagem de 
Deus.

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