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Superbactérias: A Ameaça Mundial

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Farmacêuticas abandonam pesquisas e superbactérias já matam 1 milhão ao ano 
Wanderley Preite Sobrinho, UOL, São Paulo, 27/09/2023 
 
A indústria farmacêutica está abandonando as pesquisas de novos antibióticos ao mesmo tempo em 
que salta de 700 mil para 1,2 milhão o número de mortes relacionadas às superbactérias resistentes 
aos medicamentos tradicionais, alerta a OMS (Organização Mundial de Saúde) em seu relatório 
"Incentivando o Desenvolvimento de Novos Tratamentos Antibacterianos 2023". O micro-organismo 
pode causar pneumonia, infecção urinária e da corrente sanguínea. Seus efeitos vão de taquicardia, 
febre e inchaço até a falência múltipla dos órgãos. 
 
Farmacêuticas não investem 
O número de pesquisas de novos antibióticos é "insuficente" diante "da crescente propagação da 
resistência antibacteriana", diz a OMS. Hoje, porém, a maioria dos antibióticos no mercado são 
variações de medicamentos desenvolvidos ainda na década de 1980. 
Apenas 77 novos tratamentos estão em desenvolvimento clínico [no mundo], a maioria é derivada 
das classes de antibióticos já existentes (...) e é improvável que cheguem ao mercado. (Relatório da 
OMS) 
Como as bactérias se tornam resistentes cada vez mais cedo, os medicamentos ficam obsoletos 
rapidamente e deixam de interessar à indústria farmacêutica. "Não existe mercado viável para novos 
antibióticos. O retorno financeiro não cobre os custos do seu desenvolvimento, produção e 
distribuição", diz o relatório. "Como resultado, as principais empresas farmacêuticas recuaram no 
desenvolvimento de antibióticos." 
Gigantes do setor - como Novartis, AstraZeneca, Sanofi, Allergan e Medicines— encerraram suas 
pesquisas antibacterianas na última década. Os pesquisadores afirmam que o setor privado prefere 
investir em "áreas mais lucrativas, como a oncologia". Só nos Estados Unidos, essa diferença foi de 
17 vezes na última década: US$ 1,6 bilhão contra US$ 26,5 bilhões. 
Caberá ao setor público financiar novas pesquisas. Enquanto as empresas investem US$ 1,8 bilhão 
por ano em pesquisas do tipo, governos do G7 - grupo dos países mais ricos do mundo - passaram a 
gastar valor equivalente após compromisso assinado em 2022. A meta é colocar no mercado quatro 
novos antibióticos até 2030. 
E no Brasil? Procurado, o Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos) reforça a 
necessidade de investimento estatal para "frear o avanço das superbactérias". Seu presidente 
executivo, Nelson Mussolini, celebrou o relançamento do Geceis, o Complexo Econômico e 
Industrial da Saúde que pretende produzir no Brasil 70% da matéria-prima de novos medicamentos. 
Um arranjo focado nos laboratórios públicos, em colaboração com organismos de fomento e 
iniciativa privada, pode abrir caminho para que o país se torne protagonista na solução dessa 
grande questão mundial. (Nelson Mussolini, da Sindusfarma). 
 
Superbactérias já matam 1 milhão 
A OMS cita no relatório uma pesquisa publicada na revista científica "The Lancet", em 2022, sobre o 
aumento de mortes atribuídas a bactérias resistentes. Com dados de 204 países, o estudo estimou em 
1,27 milhão as mortes diretamente relacionadas às superbactérias em 2019, além de 4,95 milhões de 
óbitos indiretos. 
O número representa um salto em relação à conta anterior. Em 2016, estudo do economista britânico 
Jim O'Neill estimou em 700 mil os mortos anuais por infecções bacterianas. Seu prognóstico era de 
que a resistência aos antibióticos mataria 10 milhões de pessoas por ano a partir de 2050. Se a 
previsão se confirmar, esses óbitos ultrapassarão as 8,2 milhões de pessoas que morrem anualmente 
por algum tipo de câncer. "Já estamos muito mais próximos desse número do que pensávamos", 
lamenta Chris Murray, coautor do estudo na Lancet. 
Muitos morreram após infecções que poderiam ser tratadas. Cerca de 400 mil pessoas, por exemplo, 
tiveram problema respiratório, como pneumonia. Além disso, uma em cada cinco vítimas das 
superbactérias tinha menos de cinco anos. 
 
Como as bactérias ficam resistentes? 
Os médicos precisam receitar a quantidade suficiente de antibiótico pelo tempo necessário para 
matar todas as bactérias de um organismo doente. Quando mal receitado, o remédio mata apenas as 
bactérias mais sensíveis, enquanto as que sobrevivem por seleção natural ganham mais resistência 
quando expostas novamente ao remédio. 
"Antibiótico salva vidas, mas precisa ser bem indicado", afirma Thaís Di Gioia, médica 
microbiologista do Hospital das Clínicas de São Paulo. "Só um exame pode dizer se determinada 
infecção é causada por bactéria (quando o antibiótico é indicado) ou vírus, mas nem sempre o 
exame está disponível ao médico, que pode receitar errado", diz Gioia. E tem muita automedicação. 
A pessoa tem rinite, pensa que é sinusite e já toma aquele antibiótico guardado em casa. (Thaís Di 
Gioia, médica microbiologista) 
Ela recomenda que o paciente não se medique nem descarte antibiótico no lixo comum. "Há 
bactérias resistentes nos esgotos que chegam ao solo e, depois, ao alimento que a gente ingere", 
alerta. 
Muitas bactérias também se tornam resistentes devido ao uso de antibióticos na cadeia alimentar: 
70% do consumo da droga se dá no agronegócio. Apenas 20% do remédio servem para tratar 
doenças, enquanto 80% são usados para prevenção de doenças e engorda. Além de o micro-
organismo super-resistente chegar aos esgotos pelas fezes de animais como galinhas, bois e porcos, 
alimentos mal cozidos infectam o homem e se reproduzem no intestino. 
 
Penicilina, o primeiro antibiótico 
O primeiro antibiótico de que se tem registro é a penicilina, criada em 1928 pelo farmacologista 
britânico Alexander Fleming. Foi a solução para doenças que castigavam populações, como a peste 
negra, a tuberculose, a peste bubônica e a febre tifoide. 
Mas já no final da década de 1930 o próprio Fleming alertava sobre as mutações que as bactérias 
vinham sofrendo. Ao receber o Prêmio Nobel pela sua descoberta, em 1945, Fleming fez um 
discurso profético: 
“Existe o perigo de que um homem ignorante possa facilmente se aplicar uma dose insuficiente de 
antibiótico, e, ao expor os micróbios a uma quantidade não letal do medicamento, os torne 
resistentes.”(Alexander Fleming, inventor da penicilina).

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