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A Emoção na Sala de Aula

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ao-professor
Publicado em NOVA ESCOLA 14 de Março | 2019
Pesquisa Aplicada
A emoção na sala de aula: o que
cabe ao professor?
Emoções não podem ser ignoradas e são importantes para a evolução da
inteligência, mas sala de aula não é consultório
Jordana Balduino
Soraya Vieira Santos
Crédito: Getty Images
Falar de emoção na sala de aula é sempre intrigante, pois existem diferentes perspectivas para
abordar o tema. Alguns professores acham que esse assunto não é para ser tratado na escola: lá seria
um lugar de conhecimento, em que a afetividade estaria em segundo plano e somente o aspecto
cognitivo seria relevante. Por outro lado, existem profissionais que dão tanta ênfase ao aspecto afetivo,
como se todos os problemas emocionais pudessem ser tratados na sala de aula. Este é um tema
controverso, mas, seguramente, pode-se afirmar que nenhum desses extremos é capaz de apreender
a questão em sua totalidade. Aliás, como em quase tudo na área da Educação, respostas dicotômicas
são apenas parciais. Não se trata de discutir se a emoção deve ou não estar na escola, porque ela já
está, mas também não se pode concluir que a escola consiga solucionar todos os problemas no âmbito
afetivo, porque ela não pode.
Segundo a psicologia de Henri Wallon, o homem é um ser completo, isto é, expressa domínios da
cognição, da afetividade e do movimento, sendo que esses domínios se influenciam, e em cada
momento do desenvolvimento da criança, há a predominância de um desses aspectos. 
Por isso, não é possível que dentro da escola as emoções sejam ignoradas. Ao entrar na sala de aula, o
professor não pode pedir: “Caro aluno, vou fechar a porta, por favor, deixe do lado de fora suas
emoções, sentimentos, paixões...”. Nem mesmo o professor pode despir-se de suas manifestações
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afetivas quando está lecionando. No entanto, é evidente que o educador tem (ou deveria ter)
condições de racionalizar muito mais suas próprias emoções do que o aluno. E, mais do que isso, de
compreender as manifestações afetivas deles, ajudando-os no seu desenvolvimento.
Para Henri Wallon, esse entendimento de que as emoções nos constituem, que não podem ser
ignoradas e de que, na verdade, são importantes para a própria evolução da inteligência, revela a
necessidade de que o professor seja bem preparado para o ato de ensinar.
Assim, se as emoções estão na sala de aula, ao mesmo tempo em que não são o foco central do ato
educativo, o que cabe ao professor? Essencialmente, conhecer e respeitar o aluno. Conhecer significa,
antes de tudo, entender o desenvolvimento da criança, compreender que cada etapa tem uma função
e que a própria criança deve ser sua referência, evitando-se assim as comparações e favorecendo o
atendimento às necessidades de cada aluno.
De acordo com Laurinda Ramalho de Almeida, “é responsabilidade do adulto, e principalmente do
educador, adequar o meio escolar às possibilidades e necessidades infantis do momento”. Ao conhecer
o aluno o professor torna sua ação psicológica, uma vez que, para Henri Wallon, “a orientação do
ensino torna-se psicológica a partir do momento em que ele pretende adaptar-se ao espírito e à
natureza da criança”.
Mas, além de conhecer a criança, a perspectiva de Wallon nos leva também ao entendimento de que é
preciso que o professor aprenda a respeitar o aluno. Laurinda Ramalho de Almeira explora esta
questão e sintetiza essa ideia afirmando que o fundamento do trabalho do professor é o respeito pelo
aluno. Segundo a autora, respeitar o aluno significa:
aceitá-lo no ponto em que está, conhecê-lo em sua etapa de formação e conhecer os meios em
que ele possa desenvolver suas ações;
não impor limites a seu desenvolvimento;
oferecer outros meios e grupos para que ele possa desenvolver suas ações;
aceitar que a Educação é uma relação evolutiva, que vai se transformando e tende para a
autonomia, para o ponto em que o aluno não precisa mais do professor.
Isso só será possível se o professor assumir sua função de observador atento da criança. Assim, a
autora afirma que “o professor precisa ser um arguto, lúcido, constante observador de seu aluno.
Observador da criança como uma pessoa completa, integrada, contextualizada; observador da criança
em cada um de seus domínios funcionais”. Mas, ao observar e demonstrar interesse pelo aluno, o
professor pode vir a se deparar com questões afetivas que extrapolam suas possibilidades de
intervenção. Nesse momento, é preciso reconhecer os limites de sua atuação e contar com um serviço
multidisciplinar que possa apoiar a criança nas suas necessidades. A parceria com a família é
fundamental e podem ser necessários encaminhamentos específicos, para os quais a escola precisa
estar preparada. 
Nas situações, entretanto, do dia a dia da sala de aula, em que caberá ao professor lidar com as mais
diversas manifestações afetivas do conjunto dos alunos e não apenas de uma criança, vale ressaltar a
importância de conhecer alguns aspectos das emoções como, por exemplo, o fato de que são
contagiosas. Wallon refere-se a isso em muitos de seus trabalhos e Laurinda Ramalho de Almeida
reitera que, dentro do ambiente escolar, muitas vezes esse contágio leva a um “circuito vicioso”, no
qual uma determinada emoção se expressa em uma criança, logo também em outra criança e, muitas
vezes também, por fim, no próprio professor. Por exemplo: uma criança pequena chorando logo
contamina os colegas com seu choro, assim como uma criança maior pode contaminar os amigos e o
professor com sua raiva ou com sua apatia. Cabe ao professor não apenas não se deixar contaminar,
como também romper este “circuito” impedindo que o contágio se alastre. Isso só é possível à medida
que o professor opera com a razão sobre a emoção e ajuda seus alunos a também operarem
racionalmente. Atividades que permitam a manifestação das emoções são aliadas importantes, dentre
elas pode-se ressaltar a expressão em desenhos, textos, música, poesia, teatro e discussões que
permitam “o movimento para liberar a tensão, intercalar momentos de maior e de menor
concentração”.
Cabe ao professor, portanto, conhecer seu aluno, respeitá-lo integralmente e ajudá-lo na empreitada
de, pouco a pouco, ser capaz de superar obstáculos e as situações de imperícia agindo racionalmente.
Dessa maneira, na atuação do professor “assumem relevância a sensibilidade, a curiosidade, a
atenção, o questionamento e a habilidade de observação”, descreve a autora Abigail Alvarenga
Mahoney. Muito mais do que repassar conhecimentos, é necessário compreender-se como humano e,
assim, enxergar os alunos para além das funções cognitivas. Esta é a difícil tarefa!
*Soraya Vieira Santos é pedagoga, mestre e doutora em Educação. Jordana de Castro Balduino
Paranahyba é psicóloga, mestre e doutora em Educação. Ambas são professoras de Psicologia da
Educação na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (FE/UFg) e coordenam a
pesquisa “A emoção na escola: um estudo sobre como a temática da afetividade tem
comparecido nas escolas de Educação Básica”.
 
Para saber mais:
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Wallon e a Educaçao. In: MAHONEY, Abigail Alvarenga.
ALMEIDA, Laurinda Ramalho de. Henri Wallon: Psicologia e Educação. 8. ed. 2008, p. 71-87.
ALMEIDA, Ana Rita Silva. A emoção na sala de aula. 2ª ed. Campinas, SP: Papirus, 1999.
MAHONEY, Abigail Alvarenga. A constituição da pessoa: desenvolvimento e aprendizagem. In:
MAHONEY, A. A.; ALMEIDA, L. R. (Orgs.). A constituição da pessoa na proposta de Henri Wallon.
São Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 13-24.
WALLON, Henri. A evolução psicológica da criança. Trad. Claudia Berliner. São Paulo: Martins
Fontes, 2007.
WALLON, Henri. A formação psicológica dos mestres. In: Psicologia e Educação da criança. Trad.
Ana Rabaça e Calado Trindade. Lisboa: Editorial Veja, 1979, p. 343-354.

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