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SEMANA 04 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 Sumário META 1 .............................................................................................................................................................. 8 DIREITO PENAL: TEORIA DO CRIME – PARTE III (ILICITUDE – CULPABILIDADE – TEORIA DO ERRO) ................. 8 1. ILICITUDE ....................................................................................................................................................... 8 1.1 Terminologias ........................................................................................................................................................... 9 1.2 Relação entre a Tipicidade e a Ilicitude .................................................................................................................. 10 1.3. Causas de Exclusão da Ilicitude ............................................................................................................................. 12 1.3.1. Causas Legais de Exclusão da Ilicitude ............................................................................................................ 12 1.3.2. Causas Supralegais de Exclusão da Ilicitude ................................................................................................... 32 1.4. Excesso na Justificante .......................................................................................................................................... 33 1.5. Excludente de Ilicitude e Indenização no Cível...................................................................................................... 34 2. CULPABILIDADE ........................................................................................................................................... 35 2.3. Funções da Culpabilidade ...................................................................................................................................... 37 2.2. Elementos da Culpabilidade .................................................................................................................................. 37 2.1.1. Imputabilidade ................................................................................................................................................ 39 2.1.2. Potencial Consciência de Ilicitude ................................................................................................................... 43 2.1.3. Exigibilidade de Conduta Diversa .................................................................................................................... 43 3. TEORIA DO ERRO ......................................................................................................................................... 47 3.1. Erro de Tipo (art. 20, CP) ....................................................................................................................................... 48 3.2. Erro de Proibição ................................................................................................................................................... 54 META 2 ............................................................................................................................................................ 60 DIREITO PROCESSUAL PENAL: AÇÃO PENAL (PARTE I) .................................................................................... 60 1. PRETENSÃO PUNITIVA ................................................................................................................................. 61 2. AÇÃO PENAL ................................................................................................................................................ 62 2.1 Direito De Ação....................................................................................................................................................... 62 2.2 Condições Da Ação ................................................................................................................................................. 64 2.2.1 Conceito ........................................................................................................................................................... 64 2.2.2 Condições Genéricas ........................................................................................................................................ 65 2.2.3 Condições Específicas da Ação ......................................................................................................................... 73 3. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL ....................................................................................................................... 78 3.1 Princípios Comuns Da Ação Penal Pública E Privada .............................................................................................. 78 3.2 Princípios Da Ação Penal Pública ............................................................................................................................ 79 3.3 Princípios Da Ação Penal Privada ........................................................................................................................... 85 4. AÇÃO PENAL PÚBLICA ................................................................................................................................. 89 4.1 Ação Penal Pública Incondicionada ........................................................................................................................ 89 4.2 Ação Penal Pública Condicionada ........................................................................................................................... 90 4.2.1 Ação Penal Pública Condicionada à Representação do Ofendido ................................................................... 90 4.2.2 Ação Penal Pública Condicionada à Requisição do Ministro da Justiça ........................................................... 94 4.2.3 Ação Penal Pública Subsidiária da Pública ....................................................................................................... 94 5. AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA ......................................................................................................... 95 5.1 Ação Penal Privada Personalíssima ........................................................................................................................ 96 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 5.2 Ação Penal Privada Exclusiva Ou Propriamente Dita ............................................................................................. 97 5.3 Ação Penal Privada Subsidiária Da Pública Ou Acidentalmente Privada Ou Supletiva .......................................... 97 META 3 .......................................................................................................................................................... 102 DIREITO PROCESSUAL PENAL: AÇÃO PENAL (PARTE II) ................................................................................. 102 6. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DA AÇÃO PENAL ............................................................................................... 102 6.1 Ação Penal Adesiva ............................................................................................................................................... 102 6.2 Ação Penal Popular ............................................................................................................................................... 102 6.3 Ação Penal Secundária ......................................................................................................................................... 103 6.4 Ação De Prevenção Penal ..................................................................................................................................... 103 7. DENÚNCIA E QUEIXACRIME ...................................................................................................................... 104 8. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (Lei 13.964/19) ........................................................................... 113 8.1 Conceito ............................................................................................................................................................... 113 8.2 Requisitos, Condições e Vedações ....................................................................................................................... 116 8.3 Procedimento Do Acordo De Não Persecução Penal ........................................................................................... 119 9. AÇÃO CIVIL EX DELICTO ............................................................................................................................. 124 9.1 Execução Civil Ex Delicto (Art. 63, CPP) X Ação Civil Ex Delicto (Art. 64, CPP) ...................................................... 125 9.2 Legitimados Ativos Para Propor A Ação Civil ........................................................................................................ 126 9.3 Indenização Na Sentença Condenatória .............................................................................................................. 127 9.4 Efeitos Civis Da Sentença Absolutória .................................................................................................................. 128 LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: CRIMES ELEITORAIS ...................................................................................... 132 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................. 132 1.1. Tipificação dos crimes previstos no Código Eleitoral .................................................................................... 133 1.2. Penas mínimas previstos no Código Eleitoral em caso de omissão .............................................................. 133 1.3. Ação penal nos crimes eleitorais e competência eleitoral ............................................................................ 134 1.4. Competência: ................................................................................................................................................ 134 1.5. Processo Penal Eleitoral e Inquérito Policial Eleitoral ................................................................................... 136 2. DOS CRIMES ELEITORAIS ................................................................................................................... 137 2.1. Inscrição fraudulenta de eleitor (art. 289) .................................................................................................... 137 2.2. Indução à inscrição irregular de eleitor (art. 290) ......................................................................................... 138 2.3. Perturbar ou impedir o alistamento (art. 293) .............................................................................................. 138 2.4. Retenção de título de eleitor (art. 295) ......................................................................................................... 139 2.5. Desordem dos trabalhos eleitorais (art. 296) ............................................................................................... 139 2.6. Impedimento ou embaraço ao exercício do sufrágio (art. 297) .................................................................... 139 2.7. Corrupção eleitoral (art. 299) ........................................................................................................................ 140 2.8. Coação moral eleitoral praticada por servidor público (art. 300) ................................................................. 140 2.9. Coação eleitoral cometida por particular (art. 301) ...................................................................................... 141 2.10. Promover a concentração de eleitores no dia da eleição com o fim de impedir, atrapalhar ou fraudar o voto (art. 302) ............................................................................................................................................................ 142 2.11. Recusa de fornecimento regular de alimentação e dos meios de transporte a todos no dia da eleição (art. 304) 142 2.12. Votar ou tentar votar mais de uma vez ou em lugar de outro eleitor (art. 309) ...................................... 143 2.13. Crime contra o segredo do voto Violação do sigilo do voto (art. 312) ..................................................... 143 2.14. Omissão na expedição do boletim de apuração (art. 313) ....................................................................... 143 2.15. Divulgação de fatos inverídicos na propaganda (art. 323) ....................................................................... 144 2.16. Calúnia eleitoral (art. 324) ........................................................................................................................ 145 2.17. Difamação eleitoral (art. 325) ................................................................................................................... 146 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 2.18. Injúria eleitoral (art. 326) .......................................................................................................................... 147 2.19. Denunciação caluniosa eleitoral (art. 326-A) ............................................................................................ 149 2.20. Violência política contra a mulher (art. 326-B) ......................................................................................... 150 2.21. Inutilização, alteração ou perturbação de propaganda lícita (art. 331) ................................................... 151 2.22. Impedimento do exercício de propaganda (art. 332) ............................................................................... 152 2.23. Recusa ou abandono do serviço eleitoral sem justa causa (art. 344) ....................................................... 152 2.24. Peculato eleitoral ou apropriação indébita eleitoral (art. 354-A) ............................................................. 153 META 4 .......................................................................................................................................................... 156 DIREITO CONSTITUCIONAL: REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS (PARTE I) .......................................................... 156 1. HABEAS CORPUS ........................................................................................................................................ 157 2. MANDADO DE SEGURANÇA ...................................................................................................................... 170 LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: CRIMES FALIMENTARES ............................................................................... 191 1. DISPOSIÇÕES COMUNS .............................................................................................................................. 191 2. DO PROCEDIMENTO PENAL ....................................................................................................................... 194 3. DOS CRIMES EM ESPÉCIE. .......................................................................................................................... 195 3.1. Fraude contra credores – Art. 168 ...................................................................................................................... 195 3.2. Violação de sigilo empresarial – Art. 169 ............................................................................................................ 198 3.3. Divulgação de informações falsas – Art. 170 .......................................................................................................199 3.4. Indução a erro – Art. 171 ..................................................................................................................................... 199 3.5. Favorecimento de Credores ................................................................................................................................ 200 3.6. Desvio, Ocultação ou Apropriação De Bens – Art. 173 ....................................................................................... 201 3.7. Aquisição, Recebimento ou Uso Ilegal de Bens – Art. 174: ................................................................................. 202 3.8. Habilitação ilegal de crédito – Art. 175 ............................................................................................................... 203 3.9. Exercício ilegal de atividade – Art. 176 ................................................................................................................ 204 3.10. Violação de impedimento – Art. 177 ................................................................................................................. 204 3.11. Omissão dos documentos contábeis obrigatórios – Art. 178 ............................................................................ 205 META 5 .......................................................................................................................................................... 208 DIREITO CONSTITUCIONAL: REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS (PARTE II) ......................................................... 208 3. MANDADO DE INJUNÇÃO .......................................................................................................................... 208 4. HABEAS DATA ............................................................................................................................................ 219 5. AÇÃO POPULAR (LEI Nº 4.717/65) ............................................................................................................. 223 6. AÇÃO CIVIL PÚBLICA (LEI 7.347/85) .......................................................................................................... 230 7. INQUÉRITO CIVIL ........................................................................................................................................ 241 8. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC) ........................................................................................ 243 META 6 – REVISÃO SEMANAL ........................................................................................................................ 246 DIREITO PENAL: TEORIA DO CRIME – PARTE III (ILICITUDE – CULPABILIDADE – TEORIA DO ERRO) ............. 246 DIREITO PROCESSUAL PENAL: AÇÃO PENAL.................................................................................................. 247 LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: CRIMES ELEITORAIS ...................................................................................... 249 DIREITO CONSTITUCIONAL: REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS .......................................................................... 250 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA SEMANA 04 META DIA ASSUNTO 1 SEG DIREITO PENAL: Teoria do Crime 2 TER DIREITO PROCESSUAL PENAL: Ação Penal (Parte I) 3 QUA DIREITO PROCESSUAL PENAL: Ação Penal (Parte II) LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Crimes Eleitorais 4 QUI DIREITO CONSTITUCIONAL: Remédios Constitucionais (Parte I) LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL: Crimes Falimentares 5 SEX DIREITO CONSTITUCIONAL: Remédios Constitucionais (Parte II) 6 SÁB REVISÃO SEMANAL CADERNO DE JURISPRUDÊNCIA (Anexo) ATENÇÃO Gostou do nosso material? Lembre de postar nas suas redes sociais e marcar o @dedicacaodelta. Conte sempre conosco. Equipe DD Prezado(a) aluno(a), Caso possua alguma dúvida jurídica sobre o conteúdo disponibilizado no curso, pedimos que utilize a sua área do aluno. Há um campo específico para enviar dúvidas. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 8 META 1 DIREITO PENAL: TEORIA DO CRIME – PARTE III (ILICITUDE – CULPABILIDADE – TEORIA DO ERRO) TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA CP: ⦁ Art. 20 a 25 ⦁ Art. 26 a 28 ⦁ Art. 65 ⦁ Art. 73 e 74 ⦁ Art. 163 ⦁ Art. 213 ⦁ Art. 228 OUTROS DIPLOMAS LEGAIS: ⦁ Art. 37, Lei 9605/98 ⦁ Art. 45 e 46, Lei de Drogas ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER! CP: ⦁ Art. 20 e 21 (importantíssimos!) ⦁ Art. 25, §único (introduzido pelo Pacote Anticrime) ⦁ Art. 26 ⦁ Art. 28, II e §1º ⦁ Art. 73 e 74 (importantíssimos!) 1. ILICITUDE É o segundo substrato do conceito analítico de crime, e consiste na relação de contrariedade entre o fato típico praticado por alguém e o ordenamento jurídico. Este é o conceito conferido segundo a finalismo. Para o autor Fernando Capez, é a contradição entre a conduta e o ordenamento jurídico, pela qual ação ou omissão típicas tornam-se ilícitas. Ex.: Embora a conduta do oficial de justiça quando apreende determinado bem contra a vontade do dono em razão de mandado judicial consista em subtrair coisa alheia móvel, o que seria um fato típico, sua conduta não é contrária ao ordenamento jurídico por estar abarcada pelo estrito cumprimento do dever legal, causa excludente de ilicitude, de modo que não haverá crime. É possível dividir a ilicitude em: NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 9 ● Ilicitude formal: É a mera contradição entre o fato e o direito. A ilicitude é analisada diante de todo o ordenamento jurídico, não somente no âmbito penal. ● Ilicitude material (substancial): É o conteúdo material do fato, ou seja, a violação de valores necessários para a manutenção da paz social. A contrariedade do fato em relação ao sentimento comum de justiça (injusto). É esse viés que permite a criação de causas supralegais de exclusão da ilicitude. Segundo o autor Mirabete a ilicitude consiste na lesão de determinado interesse vital aferido perante as normas de cultura reconhecidas pelo Estado. A ilicitude material se fundamenta em valores sociais, morais e políticos, sem um conceito específico, constituindo-se em ofensa às normas de cultura reconhecidas e aceitas pelo Estado, um comportamento antissocial. Em resumo, a ilicitude é o choque entre a conduta e o ordenamento jurídico. É o segundo elemento do conceito analítico do crime, conforme a teoria tripartida. 1.1 Terminologias a) Antijuridicidade x Ilicitude Alguns doutrinadores utilizam o termo ANTIJURIDICIDADE como sinônimo de ilicitude (ou até em sua preferência). Contudo, segundo Francisco Assis de Toledo o termo é tecnicamente incorreto, vez que o crime é, na verdade, um fato jurídico. Fato jurídico pode ser natural ou voluntário. Os voluntários se dividem em lícito e ilícito. Dentre os ilícitos, temos os ilícitos penais, que se dividem em crime ou contravenção. Portanto, melhor utilizar ILICITUDE, que foi o termo adotado pelo CP. b) Injusto x Ilicitude A ilicitude e a tipicidade formam o INJUSTO. Dessa forma, ilicitude é uma parte do injusto. Mirabete ensina que o injusto é a ação valorada como antijurídica. c) Justificantes x Exculpantes A JUSTIFICANTE corresponde a uma circunstância, legal ou supralegal, que exclui a ilicitude. Pode ser denominada ainda de excludentes da ilicitude, excludentes da criminalidade, causas justificativas, eximentes ou descriminantes. Por sua vez, a EXCULPANTE trata da hipótese, legal ou supralegal, de exclusão da culpabilidade. Também é conhecida como causa dirimentes, de exculpação, de inculpabilidade. Fato típico Antijurídico ou ilícito culpável NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 10 1.2 Relação entre a Tipicidade e a Ilicitude a) Teoria da AbsolutaIndependência do Tipo / do Tipo Avalorado / Tipo Meramente Descritivo (Von Liszt e Beling): o fato típico NÃO possui qualquer relação com a ilicitude. ● O tipo é a mera descrição objetiva do fato em lei (tipo penal acromático). ● Acaso a ilicitude deixe de existir, a tipicidade permanece. ● Para André Stefan (Direito Penal. Vol.1), trata-se de elemento valorativamente neutro. ● Sua concepção NÃO admitia o reconhecimento de elementos normativos ou subjetivos do tipo. b) Teoria Indiciária do Tipo / da Ratio Cognoscendi (Max Ernst Mayer): O fato típico é presumidamente ilícito, é um indício da ilicitude. ☞ Teoria majoritária e adotada pelo CP. ● A tipicidade deixa de ter função meramente descritiva, vindo a representar um indício da antijuridicidade. ● Onde há fumaça, há fogo, no sentido de que a tipicidade faz presumir a não conformidade com o ordenamento jurídico, a ilicitude da conduta. ● Praticando-se um fato típico, ele se presume ilícito. Essa presunção é relativa, pois admite prova em contrário, podendo ser afastada por uma excludente de ilicitude. ● A tipicidade NÃO é valorativamente neutra ou descritiva, de modo que se torna cabível o reconhecimento de elementos normativos e subjetivos do tipo penal. Essa teoria acarreta a inversão do ônus da prova no tocante às excludentes da ilicitude. Assim, para a acusação, basta provar que o fato é típico, cabendo à defesa alegar e provar as excludentes. Atenção! A adequação do fato típico e ilícito ocorrem de forma provisória até que possa ocorrer a apresentação de uma excludente de ilicitude. Aprofundando para uma prova discursiva / oral: A doutrina garantista critica essa inversão do ônus da prova. Segundo Aury Lopes Jr, não se pode ter uma presunção contrária ao réu em razão do princípio da presunção de inocência, de modo que cabe à acusação NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 11 demonstrar, não só o fato típico, mas a própria existência do crime. Ou seja: cabe à acusação demonstrar fato típico, ilicitude e culpabilidade. c) Teoria da Absoluta Dependência / da Ratio Essendi / da Identidade (Edmundo Mezger): O fato típico e ilícito seria um só elemento. A tipicidade não é só indício, é a essência da ilicitude, de modo que todo fato típico NECESSARIAMENTE é ilícito. ● Origina-se, aqui, o “injusto penal”, que é o fato típico + ilícito, analisados em uma única ocasião. ● O tipo possui função constitutiva da ilicitude, de tal forma que se o fato for lícito, será atípico. ● A ilicitude faz parte da tipicidade, ou seja, é a fusão entre os dois substratos. Ex.: O tipo penal do homicídio não seria matar alguém, mas matar alguém fora das hipóteses de legítima defesa, estado de necessidade etc. d) Teoria dos Elementos Negativos do Tipo: O tipo penal é composto por elementos positivos e elementos negativos. Os positivos são explícitos (tipo penal), enquanto os elementos negativos estão implícitos (causas excludentes de ilicitude). Para que o comportamento do agente seja típico, não podem estar configurados os elementos negativos. ● Face positiva: é chamada de tipicidade provisória (o que nós conhecemos como tipicidade). ● Face negativa: é a ausência dos elementos negativos do tipo (o que nós conhecemos como causas excludentes da ilicitude). Há aqui uma absoluta relação de dependência entre o fato típico e a ilicitude, pois, para que seja típico, não pode ser lícito, ou seja, deve também ser ilícito. Ex.: “matar alguém” = elemento positivo. No entanto, matar alguém só será crime se o agente não estiver amparado em uma excludente da ilicitude, pois, caso estivesse, incidiria um elemento negativo do tipo. Como dito, no Brasil adota-se a teoria indiciária, porém, mitigada a partir da reforma de 2008, em razão de dispositivos que privilegiam o “in dubio pro reo”, uma vez que, mesmo a defesa não provando cabalmente a excludente, em caso de dúvida, deve o magistrado decidir em favor do réu. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 12 1.3. Causas de Exclusão da Ilicitude 1.3.1. Causas Legais de Exclusão da Ilicitude As causas excludentes de ilicitude também podem ser denominadas de descriminantes ou de justificantes. A causa excludente ilicitude torna a conduta compatível com a ordem jurídica, levando a concluir-se a conformidade do comportamento do agente com o ordenamento jurídico. a) Parte Geral do CP: → Estado de necessidade → Legítima defesa → Estrito cumprimento de dever legal → Exercício regular do direito Art. 23, CP - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. b) Parte Especial do CP: Exemplos: → Art. 128, I, CP → Art. 146, §3º, I e II, CP c) Legislação Especial: Exemplos: → Art. 303, Lei 7.565/86 1. ESTADO DE NECESSIDADE (art. 24, CP) Art. 24, CP - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 13 evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. § 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. a) Conceito: Causa excludente de ilicitude que representa um choque entre dois interesses jurídicos colocados em perigo, sendo necessário sacrifício de um para salvar o outro de perigo atual, sendo este direito próprio ou alheio cujo sacrifício não era razoável exigir-se nessas circunstâncias. Se há dois bens em perigo de lesão, o estado permite que seja sacrificado um deles, pois, diante do caso concreto, a tutela penal não pode salvaguardar a ambos. Nesse caso, há sopesamento de bens diante de uma situação adversa. Ex.: Um pedestre joga-se na frente de um motorista, que, para preservar a vida humana, opta por desviar do seu veículo e colidir com outro que se encontrava estacionado nas proximidades. Entre sacrificar uma vida e um bem material, o agente fez a opção claramente mais razoável. Não pratica crime de dano, pois o fato embora típico, não é ilícito. b) Requisitos: (1) SITUAÇÃO DE PERIGO ATUAL: Perigo atual. → Pode advir da natureza, do homem, de comportamento animal. → Possui destinatário indeterminado. → Há discussão se perigo iminente também poderia ser englobado aqui. Masson diz que sim, valendo-se de analogia in bonan partem do art. 25. Sanches sustenta que não, haja vista o silêncio eloquente do legislador. Se a questão pedir conforme letra de lei, atual ou iminente é só na legítima defesa, sendo que estado de necessidade é atual. → Para determinar se há uma situação de perigo ou não, leva-se em consideração uma pessoa do mesmo círculo social do autor (observador inteligente), sendo que os conhecimentos e informações dessa pessoa devem ser agregados ao juízo de um especialista em perigo. Quanto à existência do perigo, a doutrina classifica o estado de necessidade em: a) Estado de necessidade real: a situação de perigo existe efetivamente (exclui a ilicitude); b) Estado de necessidade putativo: a situação de perigo não existe, é imaginária (não exclui a ilicitude). Se o perigo não existe (é imaginário), o agente está diante de uma discriminante putativa (estado de necessidade putativo). Isso é importante porque o estado de necessidade putativo não exclui ilicitude. (descriminante putativa por erro de tipo ou erro de proibição). NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 14 (2) PERIGO NÃO CAUSADO VOLUNTARIAMENTE PELO AGENTE O provocador do perigo NÃO pode beneficiar-se da excludente, salvo no caso em quetenha gerado involuntariamente. Em outras palavras, aquele que por sua vontade produz o perigo não poderá agir em estado de necessidade. Há divergência no que tange a voluntariedade da provocação do perigo: 1ª posição (Damásio): Somente o perigo causado dolosamente impede que seu autor alegue o estado de necessidade. 2ª posição (Frederico Marques, Mirabete, Masson): Não apenas o perigo doloso, mas também o provocado por culpa impede a alegação do estado de necessidade, uma vez que a conduta culposa também é voluntária em sua origem. (3) INEVITABILIDADE DO DANO “Que não podia, de outro modo, evitar” A inevitabilidade do dano é inerente ao estado de necessidade. Ou seja: o agente não tem como evitar o dano sem que pratique a conduta abrangida pelo estado de necessidade. ATENÇÃO: Para que essa conduta esteja amparada pelo estado de necessidade, o indivíduo tem que, necessariamente, escolher a opção menos danosa, sob pena que agir em excesso. Ocorre que, normalmente, a opção menos danosa é simplesmente a FUGA do perigo, justamente para evitar a lesão a outro bem jurídico legítimo. Isso porque, no estado de necessidade, há a exigência do commodus discessus (saída mais cômoda; saída mais fácil, fuga). → No estado de necessidade, o objetivo é a eliminação da situação de perigo, e não a necessária afirmação da prevalência do meu direito. Assim, ao contrário da legítima defesa, em que o indivíduo sofre uma injusta agressão, no estado de necessidade há dois bens jurídicos lícitos/devidos em conflito, de modo que não é possível preservar ambos. Por isso, é necessário buscar a saída mais cômoda para os dois bens jurídicos em risco. → Portanto, o commodus discessus é inerente à inevitabilidade do dano. Isso porque, se é possível evitar o dano fugindo/se afastando da fonte de perigo, é um dever fazê-lo. Ex.: O homicídio não é amparado pelo estado de necessidade quando é possível a lesão corporal. Configura-se, nesse caso, o excesso doloso, culposo ou escusável, dependendo das circunstâncias. (4) INEXISTÊNCIA DE DEVER LEGAL DE ENFRENTAR O PERIGO Há divergência acerca da configuração do dever legal. A discussão perpassa sobre o alcance (ou não) do dever jurídico. Nesse contexto, para doutrina majoritária, em sentido amplo, se for o garantidor, mesmo NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 15 que por relação contratual, NÃO pode alegar estado de necessidade (a depender da situação poderia até alegar inexigibilidade de conduta diversa, que afasta a culpabilidade). O sacrifício somente será inevitável quando, mesmo correndo risco pessoal, for impossível a preservação do bem. Em contrapartida, para quem não tem a obrigação de se arriscar, a inevitabilidade significa que, se houver algum perigo para o agente, já lhe será possível o commodus discessus. Ex.: Um bombeiro não pode alegar estado de necessidade como maneira de eximir-se do dever de enfrentar o perigo. (5) SALVAR DIREITO PRÓPRIO OU ALHEIO → Quando a ameaça for a direito próprio, haverá o estado de necessidade próprio. É o que ocorre quando o agente, por exemplo, subtrai pequena quantia de alimento para não morrer de fome (furto famélico) ou quando há um naufrágio e existem menos coletes salva-vidas do que o necessário e uma pessoa mata outra para ficar com um colete e se salvar. → Quando a ameaça for a direito de terceiro, haverá estado de necessidade de terceiro. É o caso, por exemplo, da subtração de pequena quantidade de alimento para alimentar e salvar a vida do filho pequeno; o motorista que desvia o veículo em direção ao muro de uma casa, para evitar o atropelamento de uma criança que atravessou a rua correndo. Saliente-se que, no caso de defesa do direito de terceiro, é desnecessária a prévia autorização deste, já que a lei não exige esse requisito. Não precisa também haver ratificação posterior pelo terceiro. No que concerne ao estado de necessidade, ensina Flávio Monteiro: O estado de necessidade de terceiro inspira-se no princípio da solidariedade humana. Tratando-se, porém, de bens disponíveis, alguns autores sustentam a necessidade da aquiescência do titular do direito exposto a perigo de lesão. Não procede o raciocínio, pois a vontade do terceiro em perigo, como dizia La Medica, não é tomada em consideração; é substituída pela vontade do agente, juridicamente superior. Sobremais, em muitos casos não há nem tempo para pedir a concordância do terceiro. (Direito Penal – Parte Geral. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 315-6). (6) INEXIGIBILIDADE DO SACRIFÍCIO DO INTERESSE AMEAÇADO É verificada a proporcionalidade entre o direito protegido e o sacrificado. A partir dessa ideia se desenvolvem duas teorias: ● Teoria Diferenciadora: Se o bem jurídico sacrificado tiver um valor menor que o bem jurídico protegido, haverá estado de necessidade com excludente da ilicitude, denominado de estado de necessidade justificante. Por outro lado, se o bem sacrificado tiver o valor igual ou maior do que o bem protegido, a doutrina denominará esta situação de estado de necessidade exculpante, ou seja, haveria a exclusão da culpabilidade. Teoria adotada pelo Código Penal Militar (art. 39 e art. 45, §único). NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 16 O BJ sacrificado tem menor valor que o BJ preservado – estado de necessidade justificante – exclui a ilicitude. BJ sacrificado tem maior valor ou igual que o BJ preservado – estado de necessidade exculpante – exclui a culpabilidade. Obs: Embora ainda haja divergências doutrinárias, para teoria diferenciadora se o BJ sacrificado tem maior valor ou igual que o BJ preservado é estado de necessidade exculpante! É DIFERENTE da teoria unitária (que é a adotada pelo CP), onde prevalece que o bem jurídico sacrificado pode ser de igual ou menor valor para ser estado de necessidade justificante! De acordo com o autor Rogério Greco a teoria diferenciadora traça uma distinção entre o estado de necessidade justificante (que afasta a ilicitude) e o estado de necessidade exculpante (que elimina a culpabilidade), considerando-se os bens em conflito. Mesmo para a teoria diferenciadora, existe uma divisão interna quanto à ponderação dos bens em conflito. Para uma corrente, haverá estado de necessidade justificante somente nas hipóteses em que o bem afetado for de valor inferior àquele que se defende. Assim, haveria estado de necessidade justificante, por exemplo, no confronto entre a vida e o patrimônio, ou seja, para salvar a própria vida, o agente destrói patrimônio alheio. Nas demais situações, vale dizer, quando o bem salvaguardado fosse de valor igual ou inferior àquele que se agride, o estado de necessidade seria exculpante. É a posição de Fragoso, quando aduz: “A legislação vigente, adotando fórmula unitária para o estado de necessidade e aludindo apenas ao sacrifício de um bem que, ‘nas circunstâncias, não era razoável exigir-se’, compreende impropriamente também o caso de bens de igual valor (é o caso do náufrago que, para reter a única tábua de salvamento, sacrifica o outro). Em tais casos subsiste a ilicitude da culpa (inexigibilidade de outra conduta), que a seu tempo examinaremos.” No mesmo sentido são os ensinamentos de Zaffaroni e Pierangeli, quando afirmam que “o estado de necessidade resultará de conformidade com o direito (justificante), quando a afetação do bem jurídico que causa a conduta do necessitado resulta de menor entidade que a lesão a um bem jurídico que corria perigo de sofrer.” Em sentido contrário, posiciona-se Assis Toledo, quando afirma que, por causa da redação do art. 24 do código penal, somente poderá se cogitar de aplicação do estado de necessidade exculpante, e mesmo assim de natureza supralegal, quando o bem ofendido for de valor superior ao do agressor: “Em princípio, não nos parece ‘razoável’, para usar-se ao pé da letraa terminologia do art. 24 do código penal – permitir-se o sacrifício de um bem de maior valor para salvar-se o de menor valor. Assim, inaplicável a essa hipótese é a causa de exclusão do crime do art. 23, I, tal como a define o art. 24. Todavia, caracterizando-se, nessa mesma hipótese, o injusto, a ação típica e antijurídica, há que se passar ao exame da culpabilidade do agente, sem a qual nenhuma pena lhe poderá ser infligida. E, nesta fase, a nível do juízo de culpabilidade, não há dúvida de que o estado necessário, dentro do qual o bem mais valioso foi sacrificado, poderá traduzir uma situação de inexigibilidade de outra conduta, que se reputa, conforme sustentamos no título anterior, uma causa de exclusão da culpabilidade. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 17 ● Teoria Unitária: O estado de necessidade é sempre causa excludente da ilicitude. O agente não precisa calcular o valor dos bens em conflito, basta que haja com razoabilidade. NÃO há estado de necessidade exculpante, mas apenas o estado de necessidade justificante, que é excludente da ilicitude e incidirá sempre que o bem sacrificado tiver valor igual ou menor que o bem jurídico protegido. Teoria adotada pelo CP. Sendo o bem sacrificado mais valioso do que o bem protegido, deverá o indivíduo responder pelo crime, mas haverá uma causa de redução de pena de 1/3 a 2/3, conforme o §2º do art. 24 estabelece. O dispositivo diz que embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. BJ sacrificado tem igual ou menor valor que o BJ preservado - estado de necessidade justificante. BJ sacrificado tem maior valor que o BJ preservado – hipótese de redução da pena. Vamos esquematizar? TEORIA ESTADO DE NECESSIDADE EXCLUDENTE BEM PROTEGIDO BEM SACRIFICADO TEORIA DIFERENCIADORA Justificante Exclui a ilicitude Vale Mais Vale Menos Exculpante Exclui a culpabilidade Vale Igual Vale Menos Vale Igual Vale Mais TEORIA UNITÁRIA Justificante Exclui a ilicitude Vale Mais Vale Igual Vale Menos Vale Igual (7) CONHECIMENTO DA SITUAÇÃO JUSTIFICANTE → Trata-se de requisito subjetivo. → Exige do agente conhecimento da situação de fato justificante. → A ação de estado de necessidade deve ser objetivamente necessária e subjetivamente conduzida pela vontade de salvamento. → Exige a consciência e vontade de salvar de perigo atual direito próprio ou alheio FURTO FAMÉLICO É a subtração de algo por aquele que possui fome, podendo configurar estado de necessidade. Logo, o furto de um pão, por quem está com fome e não possui recurso financeiro para comprá-lo, em situação de urgência, pode vir a ser estado de necessidade. Requisitos: ● Que o fato seja praticado para matar a fome; ● Que seja o único e derradeiro recurso do agente; NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 18 ● Que haja a subtração de coisa capaz de diretamente mitigar a fome; ● Hipossuficiência financeira c) Espécies: → Quanto à titularidade: . Próprio; . De terceiro. → Quanto aos elementos subjetivos do agente: . Real: existe efetivamente a situação de perigo; . Putativo: a situação de perigo foi fantasiada pelo agente (NÃO exclui a ilicitude) – descriminante putativa. → Quanto ao terceiro que sofre a ofensa: . Defensivo: sacrifica-se direito do próprio causado do perigo; . Agressivo: sacrifica-se direito de pessoa alheia à provocação do perigo. Gera responsabilidade civil, embora não seja ilícito penal. (1) ATENÇÃO: O estado de necessidade comunica-se no concurso de pessoas. Estado de necessidade em crimes habituais e permanentes O autor Rogério Sanches considera o questionamento sobre possibilidade de estado de necessidade diante de um crime habitual ou de um crime permanente. Segundo o autor, como a lei exige perigo atual, inevitabilidade do comportamento lesivo e não razoabilidade de sacrifício do direito ameaçado (art. 24, CP), não há como aplicar esses requisitos legais nos casos de crime permanente e crime habitual, pois no crime habitual, por exemplo, o sujeito não poderia exercer a medicina irregularmente em razão de um perigo atual. Contudo, poderá, eventualmente, o indivíduo se valer de uma inexigibilidade de conduta diversa, que é uma causa excludente da culpabilidade, não havendo em se falar em estado de necessidade em crime habitual ou permanente. Caiu na Prova Delegado – PCBA/2022 - Ainda no que se refere à Teoria do Crime, assinale a alternativa incorreta. a) Se o fato é cometido sob coação irresistível, só é punível o autor da coação b) O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminui-la de um sexto a um terço c) Se o fato é cometido em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da ordem d) Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente os meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem e) Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo iminente, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, era razoável exigir-se NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 19 GAB: letra E - NÃO era razoável exigir-se 2. LEGÍTIMA DEFESA Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) Inicialmente, é importante ressaltar que a legítima defesa é inerente à própria condição humana, enquanto decorrência do instinto defensivo do homem. Desse modo, o ordenamento jurídico não poderia criminalizar condutas praticadas nesse contexto, restando as legislações estabelecer condições, requisitos, limitações e efeitos jurídicos a esse instituto. Vejamos as lições do professor Galdino Siqueira nesse sentido: “Tão visceralmente ligada â pessoa se manifesta a defesa, isto é, a faculdade de repelir pela força o ataque no momento em que se produz, que CÍCERO, na sua oração —Pro Milone, a reputa como um direito natural derivado da necessidade — non scnpta sed nata lex, proposição verdadeira, se considerarmos o substratum fisiológico e psicológico da defesa, como reação do instinto de conservação que brota e se desenvolve independente de qualquer regulamentação. ” É importante também observarmos que a autotutela (defesa de direitos com as próprias forças) é, em regra, VEDADA em nosso ordenamento jurídico. Contudo, em hipóteses excepcionais, considerando que o Estado não estará presente em todos os momentos para tutelar os direitos protegidos, admite-se a autotutela. Desse modo, veja que a legítima defesa nada mais é do que maneira específica e autorizada de exercer a defesa de direitos próprios ou de terceiros diante de injustas agressões. Segundo a doutrina, a legítima defesa possui dois elementos estruturantes: I. Ponderação de interesses protegidos pela norma: Na fórmula geral do interesse preponderante que fundamenta todas as causas de justificação, o interesse legítimo de proteger o bem jurídico do agredido se revela preponderante em relação ao interesse ilegítimo de ataque do agressor, desde que a defesa seja necessária e proporcional ao agravo sofrido. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 20 II. Reafirmação da norma perante o injusto (princípio da afirmação do direito)1: Também chamada de princípioda prevalência do direito, posto ser desejável que o direito se afirme em face de agressões contra interesses individuais. Nesse contexto, pergunta-se: Qual é a natureza jurídica da legítima defesa? R.: Em nosso ordenamento jurídico, com previsão no artigo 25, Código Penal Brasileiro, é tratada como causa genérica de exclusão da ilicitude. Pergunta-se: Quais são os requisitos para a aplicação da legítima defesa? R.: A legítima defesa se desenvolve sob o binômio agressão / reação. Desse modo, pressupõe: Agressão Reação . Injusta; . Atual ou iminente; . Contra direito próprio ou de terceiros. . Uso dos meios necessários; . Uso moderado desses meios. . Conhecimento da situação de fato justificante (elemento subjetivo) – animus defendendi Assim, passamos a analisar cada um dos requisitos exigidos para a configuração da legítima defesa. (1) AGRESSÃO INJUSTA Nos dizeres do professor Cléber Masson, agressão é toda ação ou omissão humana, consciente e voluntária, que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse consagrado pelo ordenamento jurídico. O termo agressão somente é utilizado para agressões humanas, afastando, portanto, ações praticadas institivamente por animais, salvo se o animal for utilizado como instrumento de ataques humanos. Ademais, possui destinatário certo. Pergunta-se: É possível a legítima defesa contra inimputáveis? R.: SIM, conforme posicionamento da doutrina majoritária. Veja que a conduta do inimputável, apesar de não haver culpabilidade, é típica e ilícita e, portanto, apta a ser repelida por legítima defesa. Registramos posicionamento em sentido contrário exarado pelo professor Nelson Hungria para quem os inimputáveis se equiparam a ataques realizados por animais e, quando repelidos, configurariam estado de necessidade e não legítima defesa. Pergunta-se: Seria possível a prática da legítima defesa contra uma omissão ilícita? R.: SIM, Mezger fornece o exemplo do carcereiro que tem o dever de liberar o recluso cuja pena já foi integralmente cumprida. Com a sua omissão ilícita, inevitavelmente agride um bem jurídico do preso, autorizando a reação em legítima defesa.2 1 ROXIN, Strafrecht, 1997, § 15, n. 106-109, p. 602-603. 2 MEZGER, Edniund. Tratado de derecho penal. Trad, espanhola Josè Arturo Rodrigues Mufloz. Madrid: Revista de Derecho Privado, 1955. t 1, p. 453 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 21 Ainda se exige que a agressão seja injusta. O conceito de injustiça se coaduna com a ideia de contrariedade ao direito. Assim, NÃO é necessário que a conduta se configure especificamente como crime, basta que ela seja praticada em desacordo com as normas jurídicas. A doutrina admite a legítima defesa contra condutas culposas e até mesmo contra condutas despidas de culpa, desde que revestidas de injustiça. Ex.: aquele que está sentado no banco de um ônibus e nota uma pessoa que acabara de escorregar caindo em sua direção, pode, se necessário, empurrá-la contra o chão para não ser atingido, exemplo citado na obra do professor Cleber Masson. Pergunta-se: Admite-se legítima defesa da honra? R.: NÃO! O STF entendeu, no bojo do julgamento da ADPF 779, que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional! Assim, o STF entende que o acusado de feminicídio não pode ser absolvido, na forma do art. 483, III, § 2º, do CPP, com base na tese da “legítima defesa da honra”, de modo que é proibido que a defesa, a acusação, a autoridade policial ou o magistrado utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante julgamento perante o tribunal do júri. Nesse contexto, o STF decidiu que: (i) firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção à vida e da igualdade de gênero (art. 5º, caput, da CF); (ii) conferir interpretação conforme à Constituição aos arts. 23, inciso II, e 25, caput e parágrafo único, do Código Penal e ao art. 65 do Código de Processo Penal, de modo a excluir a legítima defesa da honra do âmbito do instituto da legítima defesa e, por consequência, (iii) obstar à defesa, à acusação, à autoridade policial e ao juízo que utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante o julgamento perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento; (iv) diante da impossibilidade de o acusado beneficiar-se da própria torpeza, fica vedado o reconhecimento da nulidade, na hipótese de a defesa ter-se utilizado da tese com esta finalidade. Por fim, julgou procedente também o pedido sucessivo apresentado pelo requerente, de forma a conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 483, III, § 2º, do Código de Processo Penal, para entender que não fere a soberania dos vereditos do Tribunal do Júri o provimento de apelação que anule a absolvição fundada em quesito genérico, quando, de algum modo, possa implicar a repristinação da odiosa tese da legítima defesa da honra. STF. Plenário ADPF 779/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 1º/8/2023 (Info 1105). (2) AGRESSÃO ATUAL OU IMINENTE Diferentemente do que ocorre em relação ao estado de necessidade, a legítima defesa autoriza que a agressão seja atual ou iminente. Não seria razoável exigir que o agente tivesse sua integridade ofendida para só então poder repeli-la. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 22 De outro modo, a agressão passada ou a agressão futura e remota NÃO autorizam a incidência da legítima defesa. No primeiro caso, justamente em razão de se configurar na verdade como vingança e, no segundo, por se configurar como fórmula que desestimularia as pessoas a buscarem auxílio das autoridades públicas quando sofrerem ameaças. Vejamos conceito de agressão atual ou iminente apresentada pelo professor Cleber Masson: → Atual é a agressão presente, isto é, já se iniciou e ainda não se encerrou a lesão ao bem jurídico. Ex.: a vítima é atacada com golpes de faca. → Iminente é a agressão prestes a acontecer, ou seja, aquela que se torna atual em um futuro imediato. Ex.: o agressor anuncia â vítima a intenção de matá-la, vindo à sua direção com uma faca em uma das mãos. DICA DD! Em caso de agressão futura, porém certa, configurando legítima defesa antecipada, a doutrina admite a configuração de excludente de culpabilidade, por inexigibilidade de conduta diversa. (3) AGRESSÃO CONTRA DIREITO PRÓPRIO OU DE TERCEIRO Observe que a legislação não exige que o bem defendido seja de propriedade do defensor autorizando que a defesa ocorre em relação a bens jurídicos de terceiros. Em relação aos bens jurídicos, é importante fazermos algumas observações: a) Bem jurídico. . Próprio ou de terceiros. . Não só a vida ou a integridade física são passíveis de proteção em legítima defesa. Toda a ordem de bens jurídicos pode ser tutelada e protegida pela legítima defesa. . É possível a legítima defesa contra-ataques a bens de pessoas jurídicas ou mesmo contra bens jurídicos do Estado. . É possível ainda a defesa, por meio de legítima defesa, inclusive contra-ataques atuais ou iminentes a fetos (nascituros). ● Pergunta-se: A conduta do sniper (atirador de elite) que atira no agressor que tem a vítima na condição de refém, é abrangida por excludente de ilicitude? R.: SIM. Veja que se enquadra perfeitamente nos requisitos que estamos analisando. Trata-se de agressão atual ou iminente contra direito de terceiro. Desse modo, majoritariamente a conduta do sniper que dispara contra o agressor que tem refém em sua posse sempre foi, doutrinariamente, tratada como legítimadefesa. É justamente nesse sentido que a alteração legislativa milita, vejamos: “Art.25. [...] Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes. ” (NR) NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 23 Desse modo, agora, expressamente o legislador optou por tratar a condição do agente de segurança pública que repele agressão atual ou iminente praticada por agressor que mantém a vítima na condição de refém. (4) MEIOS NECESSÁRIOS A repulsa a agressão deverá ser praticada se valendo dos meios necessários. Contudo, pergunta-se: O que são meios necessários? Os meios necessários são aqueles menos lesivos colocados à disposição do agente e que sejam capazes de repelir a agressão atual ou iminente. Observe assim os requisitos: Meio menos lesivo: . à disposição do agente que reage; . capaz de repelir a injusta agressão (deve ser eficiente). Desse modo, a análise deve ser feita a partir da situação concreta, pois a reação até pode ser desproporcional, quando o agente não possui outro meio menos lesivo apto a repelir a agressão que sofre. Acerca desse tema, curial a leitura de Bento de Faria: O homem que é subitamente agredido, não pode, na perturbação e na impetuosidade da sua defesa, proceder a operação de medir a sangue frio e com exatidão se há algum outro recurso para o qual possa apelar, que não o de infligir um mal ao seu agressor; se há algum meio menos violento a empregar na defesa, se o mal que inflige excede ou não o que seria necessário à mesma defesa. E preciso considerar os fatos como eles ordinariamente se apresentam, e reconhecer as fraquezas inerentes à natureza humana, não se exigindo dela o que ela não pode dar, reconhecer mesmo as exigências sociais, que podem justificar o emprego de certos meios de defesa, suposto não seja absoluta a necessidade desse emprego.3 Ex.: Rodolfo vai agredir Hugo com uma espada. Hugo tem à sua disposição, para repelir essa injusta agressão, uma metralhadora, um revólver, uma faca e suas habilidades físicas. Qual é o meio necessário? Deve ser o meio menos lesivo, dentre os capazes de repelir a injusta agressão. No exemplo, o meio menos lesivo está nas habilidades físicas de Hugo. Mas elas não são capazes de repelir a injusta a agressão. A faca também não é apta a repelir a injusta a agressão. Então, o meio necessário é o revólver, pois, embora é o meio menos lesivo entre os capazes de repelir a injusta agressão. OBS.: Inexistência do requisito “commodus discessus”. Observe que, ainda que o agente possa fugir da injusta agressão, essa conduta NÃO é exigida dele. A ordem jurídica não pode abranger situações ilícitas e não pode exigir de quem atacado a conduta de fugir. 3 FARIA, Bento, Código penal brasileiro comentado. Rio de Janeiro: Dísíríbuidora Reoord, 1S61. v. II, p. 192 NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 24 Desse modo, a doutrina se posiciona no sentido de não se exigir o que se convencionou chamar de commodus discessus. Em outras palavras: uma vez constatada a injusta agressão, o agredido pode rebatê-la, não se lhe exigindo a fuga do local, pois a lei não exige. Assim, na legítima defesa, o agredido não está obrigado a fugir ou mesmo a pedir socorro às autoridades. A lei penal apenas exige a utilização moderada do meio necessário para repelir a injusta agressão. COMMODUS DISCESSUS Não é requisito para a LEGÍTIMA DEFESA. É requisito para o ESTADO DE NECESSIDADE. Permanece divergência doutrinária sobre a provocação ou o desafio da vítima ter ou não condão de afastar a legítima defesa. Contudo, prevalece que a provocação ou o desafio não afastam, por si sós, a configuração da excludente de ilicitude. O STJ parece entender que a provocação pode ser seguida de uma conduta de defesa ou não, a depender: "Não há falar-se em incongruência na decisão do corpo de jurados que nega ter o réu agido em defesa própria, afastando a tese da legítima defesa, e, logo após, afirma que o réu praticara o delito sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. A emoção provocada não impede que a ação posterior seja realizada sem estar o agente se defendendo" (STJ), AgR no AREsp 463482/SP. CAIU EM PROVA - Delegado – PCPR/2021: A exigência do meio necessário para configurar a legítima defesa não corresponde à exigência de ‘paridade de armas’ como meio para repelir uma agressão injusta (item correto). (5) USO MODERADO DOS MEIOS NECESSÁRIOS O uso dos meios necessários deve ocorrer na estrita necessidade de repelir a injusta agressão, qualquer conduta que exceda o necessário para a defesa poderá ser tratada como excesso. Assim, o agente será responsabilizado caso aja com excesso, o qual poderá ser doloso ou culposo. Logicamente, não se exige que para essa análise cálculo matemático, até porque não é factível que se exija essa exatidão de pessoas que estarão submetidas a situação de estresse e nervosismo. Exige-se, no entanto, proporcionalidade no uso dos meios necessários de forma que não se desconstitua a ideia do instituto que é defender bens jurídicos da situação de risco. OBS.: Existia previsão no texto originário do pacote anticrime a esse respeito, contudo essa disposição não foi incluída no projeto aprovado. Legítima defesa x Estado de necessidade NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 25 ESTADO DE NECESSIDADE LEGÍTIMA DEFESA Conflito entre vários bens jurídicos diante da mesma situação de perigo. Ameaça ou ataque a um bem jurídico. NÃO tem destinatário certo. Possui destinatário certo. O perigo decorre de fato humano, animal ou natureza. Há uma agressão humana e injusta. Os interesses em conflito são legítimos (é possível estado de necessidade x estado de necessidade). Ex: Náufragos disputando coletes salva- vidas. Os interesses do agressor são ilegítimos (não é possível legítima defesa real de legítima defesa real). CAIU EM PROVA Delegado – PCRN/2021: Durante uma partida de futebol, Rogério agrediu Jonas com um soco, que lhe causou um leve ferimento no olho direito. No dia seguinte, Jonas vai tirar satisfação com Rogério e, no meio da discussão, saca uma arma de fogo e parte na direção de Rogério, que, então, retira de sua mochila um revólver que carregava legalmente e dispara contra Jonas, causando sua morte. Considerando a situação apresentada, com relação à morte de Jonas, Rogério não responderá por homicídio, pois agiu em legítima defesa, o que afasta a ilicitude de sua conduta (item correto). ATENÇÃO! ATAQUE DE ANIMAL: → Espontâneo: Configura perigo atual e estado de necessidade; → Provocado por terceiro: Há agressão injusta, pois o animal foi usado como instrumento, sendo o revide legítima defesa. Espécies: → Quanto à forma de reação: . Agressiva ou ativa: aquela em que a reação, contra a agressão injusta, configura um fato previsto em lei como infração penal; . Defensiva ou passiva: aquela em que a reação consiste em conter agressão, sem caracterizar fato típico. → Quanto à titularidade do bem jurídico protegido: . Própria: o agente defende um bem jurídico de sua titularidade; . De terceiro: o agente defende um bem jurídico de outra pessoa. → Quanto ao aspecto subjetivo de quem se defende: . Real: aquela em que estão presentes todos os requisitos do art. 25, CP. Exclui a ilicitude e, em consequência, o crime; . Putativa ou imaginária: o agente, equivocadamente, supõe presentes os requisitos da legítima defesa; NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 26 . Subjetiva ou excessiva: aquela em que o agente, por erro escusável na apreciação da situação fática, excede os limites da legítima defesa. O agentepoderá ou não responder pelo excesso, a depender do caso concreto; É o excesso derivado de erro de tipo escusável ou inevitável, a vítima exagera ao interpretar a realidade de forma equivocada, pensando em necessitar de meios mais gravosos do que realmente necessita. . Sucessiva: é o caso em que o sujeito que sofreu a agressão injusta, reage em legítima defesa, porém, com excesso na agressão. Como esse excesso é uma agressão injusta, o que inicialmente era agressor fará jus à legitima defesa, sendo possível, portanto, a legítima defesa sucessiva. PONTOS IMPORTANTES: (1) Estado de necessidade contra estado de necessidade É possível falar em estado de necessidade contra estado de necessidade – lembre-se da “tábua de salvação” em naufrágio para duas pessoas. Ambas podem lutar pela tábua para a sua sobrevivência, tirando, por exemplo, a vida da outra pessoa para proteger a sua – desde que não sejam causadoras dolosas do perigo, é claro, vez que possuem o mesmo interesse jurídico e direito de se proteger. (2) Erro na execução/aberratio ictus (art. 73, CP) x Estado de necessidade e legítima defesa São compatíveis. Havendo erro na execução em razão de estado de necessidade ou legítima defesa, a vítima que foi acertada será considerada como se fosse a vítima virtual (pretendida do agente), incidindo as excludentes no caso. (3) Legítima defesa recíproca Diferentemente do estado de necessidade, NÃO é possível legítima defesa contra legítima defesa de uma pessoa para outra, vez que um dos requisitos é a agressão injusta, de modo que uma delas inevitavelmente estará agindo ilegitimamente. Excepcionalmente seria possível legítima defesa real x legítima defesa putativa, legítima defesa sucessiva ou legitima defesa putativa recíproca. Mas duas legítimas defesas reais, não. Relembrando que, a legítima defesa sucessiva é aquela que a vítima da agressão injusta, ao se defender, se excede nos meios, o que enseja ao agente que iniciou a agressão injusta a possibilidade de se defender, isto porque o excesso configura também agressão ilegítima! Na legitima defesa putativa é aquela suposta, em que o indivíduo imagina que estão configurados os requisitos da legítima defesa. Na verdade, NÃO cabe legítima defesa real contra nenhuma outra causa excludente de ilicitude real (vez que não será agressão injusta). OBS.: Contudo, conforme já visto, é possível o estado de necessidade bilateral. (4) Legítima defesa putativa recíproca É possível que haja uma legítima defesa putativa de uma legítima defesa putativa. Pode ser por exemplo, que ambos os indivíduos que já se ameaçaram mutuamente, suponham estar em uma situação de NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 27 perigo atual ou iminente na presença do outro por um gesto como abrir a bolsa ou movimentos bruscos, e reagem como se estivessem em legítima defesa. (5) Legítima defesa culposa Não importa a postura subjetiva do agente em relação ao fato, mas somente a injustiça objetiva da agressão. É o caso, por exemplo, da legítima defesa real contra a legítima defesa putativa por erro de tipo evitável. Ex.: A confundindo B com um seu desafeto e sem qualquer cuidado de certificar-se disso, efetua diversos disparos em sua direção. Há uma agressão injusta decorrente de culpa na apreciação da situação de fato. Contra esse ataque culposo cabe legítima defesa real. (6) Legítima defesa contra quem age amparado por excludente de culpabilidade É possível a ocorrência da legítima defesa pois, ainda que não haja culpabilidade, ocorre um fato típico e ilícito. Ex.: um inimputável por doença mental agride alguém sem tem capacidade de entender o caráter ilícito do fato. Independentemente de sua capacidade de entendimento da ilicitude, sua agressão é injusta, ensejando a legítima defesa. (7) Legítima defesa em face de bens coletivos Em regra, NÃO admitem legitima defesa. É dever do Estado tutelar, não podendo o particular se sub- rogar no lugar daquele. Claus Roxin: bens vitais ao funcionamento do Estado permitem a legítima defesa. (8) Legítima defesa contra multidão 1ª posição: É possível. A agressão é injusta, sendo irrelevante se destinada a alguém individualizado ou não. 2ª posição: Não é possível. Configura estado de necessidade, visto que a agressão na legitima defesa tem que ter destinatário certo. OBS.1: A defesa contra agressão produzida em caso de um ataque epiléptico NÃO pode ser justificada pela legítima defesa, mas seria caso de estado de necessidade. OBS.2: É possível legítima defesa contra pessoa jurídica. OBS.3: Se alguém desafia outrem e a pessoa aceita, nenhum dos dois estará em legítima defesa. OBS.4: Os bens jurídicos supraindividuais NÃO são suscetíveis de legítima defesa. Hipóteses de NÃO cabimento de legítima defesa: • Legítima defesa real contra legítima defesa real; • Legítima defesa real contra estado de necessidade real; • Legítima defesa real contra exercício regular de direito; • Legítima defesa real contra estrito cumprimento do dever legal. É que em nenhuma dessas hipóteses possui agressão injusta!! Resumiremos as hipóteses de cabimento de legítima defesa: NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 28 É CABÍVEL... Legítima defesa Agressão injusta de inimputável ou acobertado por outra excludente de culpabilidade. Legítima defesa real Legítima defesa putativa Legítima defesa putativa Legítima defesa putativa Legítima defesa putativa Legítima defesa real Legítima defesa real Legítima defesa putativa por erro de tipo evitável (culposa) Legítima defesa real Legítima defesa subjetiva (excesso derivado de erro de tipo inevitável) Espécies de excesso: a) Doloso ou consciente: Quando o agente, ao se defender de uma injusta agressão, emprega meio que sabe ser desnecessário ou, mesmo sabendo da desproporção, atua com imoderação. Ex.: para se defender de um tapa, o sujeito mata a tiros seu agressor, caracterizando excesso doloso. Se constatado o excesso doloso, a consequência é a responsabilidade do agente pelo resultado, no exemplo citado o agente responderá pelo homicídio doloso. b) Culposo ou inconsciente: Não houve intensificação intencional, pois o sujeito imaginava-se ainda sofrendo o ataque, tendo o seu excesso decorrido de uma equivocada apreciação da realidade. c) Exculpante: Não deriva nem de dolo, nem de culpa, mas de um erro plenamente justificado pelas circunstâncias (legitima defesa subjetiva). 3. ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL Diz respeito à agressão a bens jurídicos pelos agentes públicos no exercício de suas atribuições (art. 23, III, CP). Haveria incoerência caso o ordenamento jurídico impusesse um dever a alguém e o punisse criminalmente por isso. Trata-se, portanto, de uma causa de exclusão da ilicitude que consiste na prática de um fato típico em razão de o agente cumprir uma obrigação imposta por lei, de natureza penal ou não. Ex.: o policial que priva o fugitivo de sua liberdade, ao prendê-lo em cumprimento de ordem judicial. O estrito cumprimento do dever legal beneficia os agentes públicos em geral, mas é possível que o particular também seja amparado pela excludente, desde que esteja cumprindo estritamente um dever legal. Ex.: advogado que omite informações, recusando-se a depor, em razão do segredo profissional estabelecido no EOAB. → O dever legal abarca a lei em sentido amplo, ou seja, qualquer ordem ou comando advindos do Estado. → Se o agente se exceder, responderá pelo excesso. Caberia, por exemplo, legítima defesa diante desse excesso. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 29 → NÃO é compatível com os crimes culposos¸ uma vez que a lei não obriga ninguém a ser imprudente, negligente ou imperito. → No concurso de pessoas, o estrito cumprimento do dever legal para um dos agentes se comunica aos demais queconcorreram para o fato. → O agente deve ter consciência que está agindo acobertado por excludente (elemento subjetivo). → O autor Cláudio Brandão expõe que esse dever legal deve decorrer de norma de caráter geral, caso seja uma norma individualizada, pode haver a exclusão da culpabilidade por obediência hierárquica, em que o agente atua em razão de ordem não manifestamente ilegal. → O cumprimento do dever deve ser estrito, ou seja, não abrange excessos ou desvios. A teoria da tipicidade conglobante de Zaffaroni promove o esvaziamento do instituto. Isso porque, o estrito cumprimento do dever legal é analisado na tipicidade, uma vez que não se verifica a antinormatividade da conduta. Para a teoria da imputação objetiva de Roxin, o estrito cumprimento do dever legal também pode ser analisado na tipicidade, estando dentro do risco permitido. DICA DD! O policial que mata o criminoso em uma troca de tiros NÃO age em estrito cumprimento do dever legal. Não é dever de ninguém matar alguém. Nesse caso, o agente de segurança pública age em LEGÍTIMA DEFESA, própria ou de terceiros. Não ocorre estrito cumprimento do dever legal na hipótese de policial matar criminoso em fuga. De acordo com o STJ, a lei proíbe a autoridade, seus agentes ou quem quer que seja, desfechar tiros contra pessoas em fuga (REsp 402.419/RO). Se esta fuga, contudo, estiver acoplada a uma agressão injusta, contudo, poderá a atuação do agente configurar legítima defesa. ● Excesso no estrito cumprimento do dever legal: Tanto no excesso doloso como no excesso culposo na atuação em estrito cumprimento do dever legal, temos a ruptura dos limites do dever. Nessas hipóteses, o agente deixa de estar amparado pelo estrito cumprimento do dever legal porque ele se excede, ou seja, ele ultrapassa os limites impostos pela norma. Pergunta-se: Quais seriam as consequências imediatas dessa ruptura dos limites, ou seja, desse excesso praticado pelo agente? R.: Exclui a licitude da conduta, ou seja, se ele se excedeu, ele deixa de estar em estrito cumprimento do dever legal, deixando de estar amparado uma causa excludente da ilicitude. Além disso, se ele deixa de agir em estrito cumprimento do dever legal, o excesso acaba permitindo a legítima defesa da pessoa agredida em seu direito (da pessoa que sofreu o excesso). Ex.: ‘A’ atuando em estrito cumprimento do dever legal, configura uma conduta lícita, de modo que ‘B’ (pessoa que está sofrendo os efeitos desse ato), não pode fazer nada, não pode repelir pois a conduta de ‘A’ é lícita. Se ‘A’ se excede nos limites do estrito cumprimento do dever legal, sua conduta se torna ilícita, o que abre a possibilidade para ‘B’ repelir essa injusta agressão, repelir esse excesso. Assim, ‘B’ pode atuar em NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 30 legítima defesa, pois ele está tendo seu direito agredido na medida em que a pessoa não está agindo em estrito cumprimento do dever legal (por causa do excesso). O estrito cumprimento do dever legal abarca o particular ou apenas funcionário público? Existe divergência doutrinária. Para grande parte o particular pode invocar esta excludente de ilicitude. Ex: Advogada que se nega a depor em juízo, sobre fatos confidenciais do cliente. Para o autor André Stefan como regra, aplica-se na conduta de agente público e, excepcionalmente, de particular. Como exemplo de dever legal incumbido a particular costuma-se lembrar do dever dos pais quanto à guarda, vigilância e educação dos filhos. 4. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO São as ações do cidadão comum autorizadas pela existência de direito definido em lei e condicionadas à regularidade do exercício desse direito. Exercício REGULAR de direito, ou seja, com proporcionalidade e observância de limites. Se houver excesso o agente deve ser responsabilizado. Ademais, deve, de fato, ser um “direito”, estando previsto direta ou indiretamente em lei. Conforme doutrina majoritária, NÃO pode ser baseado em costume (parte minoritária entende que seria possível). São requisitos: ● Proporcionalidade ● Indispensabilidade ● Elemento subjetivo Também é necessário que o agente tenha consciência que está agindo acobertado por excludente. Ex.: . Lesões em práticas esportivas; . Prisão em flagrante realizada por particular (flagrante facultativo); . Intervenções médicas ou cirúrgicas (que também podem caracterizar estado de necessidade a depender da situação, quando a intervenção médica não foi autorizada pelo paciente, por exemplo); . Direito de castigo dos pais em relação aos filhos. A teoria da tipicidade conglobante de Zaffaroni promove o esvaziamento do instituto. Isso porque, o exercício regular do direito é analisado na tipicidade quando envolver atividades fomentadas pelo Estado, uma vez que não se verifica a antinormatividade da conduta. Assim, cabe a distinção: . Exercício regular do direito incentivado (pelo ordenamento jurídico): exclui a tipicidade (ex.: cirurgia médica emergencial). . Exercício regular do direito permitido (pelo ordenamento jurídico): é antinormativo, porém tolerado, razão pela qual exclui a ilicitude (ex.: cirurgia médica estética). Estrito cumprimento de dever legal x Exercício regular de direito NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 31 ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO Compulsório: o agente é obrigado a cumprir o dever legal. Facultativo: o agente é autorizado a atuar pelo ordenamento jurídico, mas a ele pertence a opção entre exercer ou não o direito assegurado. Aprofundando para provas discursivas / orais: O estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito são considerados DESCRIMINANTES PENAIS EM BRANCO, vez que o conteúdo da norma permissiva (que impõe o dever ou permite a conduta como direito) precisa ser complementado por outra norma jurídica. Não está pré-definido no CP quais são os deveres legais ou os direitos que podem regularmente ser exercidos. Virão de outra fonte normativa. (Caiu na prova oral de Delegado SP) Fenômeno semelhante ao que ocorre nas estudadas “leis penais em branco” em que o conteúdo definitivo da norma se deduz de outra norma jurídica, da mesma hierarquia ou de hierarquia inferior. Isto porque o complemento destas excludentes decorre de normas extrapenais. Por exemplo, o possuidor de um bem imóvel, turbado ou esbulhado em sua posse, tem direito assegurado pela legislação civil de, com sua “própria força”, praticar atos tendentes a se manter ou se reintegrar na posse do bem. A atitude de quem proceder dessa maneira não será considerada criminosa, por força do art. 23, III, do CP, combinado com o art. 1.210 do CC. ATENÇÃO: OFENDÍCULOS a) Nomenclatura: Doutrina MAJORITÁRIA: ofendículos = ofensáculos = defesas pré-dispostas. Doutrina minoritária: diferencia ofendículos e ofensáculos de defesas pré-dispostas: - Defesas mecânicas pré-dispostas: Estariam ocultas e seriam ignoradas pelo agressor. Seriam engenhos, armadilhas ocultas, com o intuito de que o engenho funcionasse de forma oculta sem que o agressor tivesse conhecimento. Nesse sentido, se ela estiver oculta, ela não estaria abrangida pela causa de justificação. - Ofendículos: Estão aparentes e podem ser percebidos facilmente. b) Conceito: Os ofendículos são aparatos pré-ordenados para defesa do patrimônio. Meio que as pessoas utilizam para defender principalmente a propriedade e a inviolabilidade domiciliar (ex.: cacos de vidros nos muros, cerca elétrica, pontas de lanças no portão etc.). → Devem ser visíveis, caso contrário, estará configurado excesso. c) Natureza jurídica: ☞ Doutrina MAJORITÁRIA: Enquanto o ofendículo não é acionado, o indivíduo age em exercício regular de um direito. NÚCLEO DURO SEMANA 04/18 32 ☞ Porém, quando é acionado o aparato protetor, a fim de