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Ilicitude (Antijuridicidade) 1 – Conceito - É o segundo substrato do conceito analítico de crime. - É a conduta típica não justificada, espelhando a relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico como um todo. De tal forma que, a antijuridicidade surge de toda ordem jurídica, porque a antinormatividade pode ser neutralizada por uma permissão que pode provir de qualquer parte do direito. - Ou seja, é o choque da conduta com a ordem jurídica, entendida não só como ordem normativa, mas como ordem normativa de preceitos permissivos. Pode um fato, tipicamente penal, ser classificado com lícito num âmbito do ordenamento e ilícito no outro? Não, em detrimento do princípio sistemático da coerência do ordenamento jurídico, conforme o qual o Direito não pode conter antinomias. Tal princípio impede a autonomia absoluta das diversas esferas de regulamentação jurídica e, consequentemente, evita a instauração de antinomias. Não há ilicitude especificamente civil ou penal, mas somente consequências jurídicas distintas. Licitude Irrelevância Produz efeito em relação a todos os âmbitos no ordenamento jurídico. Pode ser restrita a um âmbito do ordenamento. 2 – Relação entre Tipicidade e Ilicitude - Excluída a ilicitude, o fato continua típico? Teoria da Autonomia ou Absoluta Independência - Defendida por Ernst Ludwig von Beling (1906) - Fato típico não desperta juízo de valor no campo da ilicitude. Dessa forma, a tipicidade não tem qualquer relação com a ilicitude, sendo substratos totalmente independentes. Teoria da Indiciariedade ou da “Ratio Cognoscendi” - Idealizada por Mayer (1915) - A existência do fato típico gera uma presunção (relativa) de que é também ilícito. Há uma relativa dependência. Entretanto, o fato típico continua íntegro quando excluída a ilicitude. Teoria da Absoluta Dependência ou “Ratio Essendi” - Defendida por Mezger (1930) - Cria o conceito do tipo penal do injusto, levando a ilicitude para o campo da tipicidade. Há dependência. - Não havendo ilicitude, não há fato típico. Teoria dos Elementos Negativos do Tipo - O tipo penal é composto de elementos positivos (expressos) e elementos negativos (implícitos), quais sejam causas excludentes de ilicitude. - Para que o comportamento do agente seja típico, não basta realizar apenas os elementos positivos, mas também deve não realizar nenhum elemento negativo. Há uma absoluta relação de dependência. Ex.: O homicídio deve ser lido: “matar alguém (elemento positivo), desde que não esteja presente uma excludente de ilicitude (elemento negativo)” Qual teoria norteia o nosso ordenamento jurídico? - A teoria da indiciariedade ou da ratio cognoscendi. - O fato típico é, em princípio, um fato ilícito. A tipicidade (classificação jurídica do fato como típico), estabelece a antijuridicidade (como sua consequência jurídica), devido à violação da norma penal. - No nosso ordenamento jurídico existem normas proibitivas (que incidem de forma genérica em relação às hipóteses típicas) e normas permissivas (que incidem de forma específica, excluindo a ilicitude). Tendo isso em vista, quando não ocorrer uma hipótese específica correspondente à incidência de uma norma permissiva, os fatos típicos serão ilícitos. - O ônus da prova sobre a existência da causa de exclusão da ilicitude é da defesa (de quem alega). O que acontece quando há dúvida em relação a excludente de ilicitude? - Foram relativizados os efeitos da teoria da indiciariedade no ônus probatório. Ficou a dúvida se o fato típico está (ou não) justificado Ficou a dúvida razoável se o fato típico está (ou não) justificado O juiz condena (não se aplicando o in dubio pro reo). O juiz deve absolver o réu, com fundamento no art. 386, VI, parte final, do CPP. 3 – Causas Excludentes da Ilicitude - A conduta humana formal e materialmente típica é somente indício de ilicitude, que pode ser excluída diante da prova (ou fundada dúvida) da presença de alguma causa excludente da antijuridicidade. Art. 13 – Não crime quando o agente pratica fato: I – em estado de necessidade; II – em legítima defesa; ll – em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito. É possível encontrá-las espalhadas no ordenamento jurídico? Sim, por ex.: art. 128, CP (aborto justificado); art. 1470, CC (apropriação justificada). É possível sustentar a existência de causas de justificação que não se encontrem em lei? Sim. O consentimento do ofendido é causa supralegal excludente de ilicitude pacificamente reconhecida, apesar da divergência doutrinária. A decisão de arquivamento do IP com fundamento na exclusão da ilicitude faz coisa julgada material? Com a nova redação do art. 28, do CPP, o arquivamento por atipicidade ou por extinção da punibilidade deve continuar demandando respeito absoluto. Hipóteses em que a jurisprudência demandava estabilidade da decisão, leia-se coisa julgada material. Entretanto, como o juiz não faz mais parte no cronograma da promoção de arquivamento, não se trata mais de fundamentá-lo na coisa julgada, pois, se a denúncia exuma investigação arquivada por esses fundamentos, o que revela é a falta de pressuposto processual, objeto de rigorosa análise do juiz no momento do recebimento da inicial (art. 395, CPP) ou da absolvição sumária (art. 397, CPP). Os outros fundamentos de arquivamento costumavam configurar coisa julgada formal. 4 – Estado de Necessidade - Previsto no art. 24, CP: “considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir- se.” - Remete a ideia de sopesamento de bens: se há dois bens em perigo, permite-se que seja sacrificado um deles. O estado de necessidade é faculdade ou direito? Nélson Hungria Faculdade, pois, diante do perigo, abre- se a possibilidade de ação para preservação do bem jurídico. Não se pode ter como direito o estado de necessidade, pois este corresponde a uma obrigação e nenhum dos titulares dos bens jurídicos envolvidos está obrigado a suportar a lesão. Aníbal Bruno Direito, mas exercido contra o Estado (não contra o titular do bem jurídico lesado), que está obrigado a reconhecer a inexistência do crime. Rogério Sanches Traduz uma faculdade entre os titulares e um direito perante o Estado. 4.1 – Requisitos do Estado de Necessidade Perigo Atual Risco presente, real, gerado por fato humano, comportamento animal (não provocado pelo dono) ou fato da natureza, sem destinatário certo. Quanto ao estado de perigo, pode ser classificado em: Perigo Real Perigo Putativo A situação de perigo efetivamente existe (exclui a ilicitude). O sujeito atua em face de perigo imaginário (não exclui a ilicitude). Que a situação de perigo não tenha sido causada voluntariamente pelo agente Indica o dolo, não abrangendo a culpa em sentido estrito. Salvar direito próprio ou alheio Estado de Necessidade Próprio Estado de Necessidade de Terceiro Busca salvar direito próprio. Busca salvar direito alheio. Inspira-se no princípio da solidariedade humana. Na salvaguarda do direito interesse alheio é dispensável a autorização ou posterior ratificação do titular do direito ameaçado, pois a vontade do terceiro em perigo não é levada em consideração. É substituída pela vontade do agente. Inexistência de dever legal de enfrentar o perigo De acordo com o art. 24, §1, CP: “Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.” E o perigo iminente? Diante do silêncio da lei, a maioria da doutrina indica que que o perigo iminente não autoriza a descriminante. Quem possui esse dever?O dever legal é o resultante da lei. Tomando a expressão (dever legal) em seu sentido amplo, abarca-se o conceito de dever jurídico, para que alcance o dever que advém de outras relações previstas no ordenamento jurídico, como o contrato de trabalho ou mesmo uma promessa feita por um garantidor de uma situação qualquer. Assim, evita-se que pessoas obrigadas a vivenciar situações de perigo, ao menor sinal de risco, se furtem ao seu compromisso. Ademais, Inevitabilidade do Comportamento Lesivo É preciso que o único meio para salvar o direito próprio ou de terceiro seja o cometimento do fato lesivo, sacrificando-se bem jurídico alheio. Quanto ao terceiro que sofre a ofensa, o estado de necessidade classifica-se em: Defensivo Agressivo Quando o agente sacrifica bem jurídico do próprio causador do perigo. Quando o bem sacrificado é de terceiro que não criou ou participou da situação de perigo. Inexigibilidade de Sacrifício do Interesse Ameaçado Impõe-se a análise de ponderação de bens: o protegido e o sacrificado. Duas teorias discutem a matéria: Teoria Diferenciadora Teoria Unitária O bem jurídico sacrificado tem valor menor ou igual ao salvaguardado, haverá estado de necessidade justificante (excludente de ilicitude); O bem sacrificado tiver valor maior que o bem protegido, haverá estado de necessidade exculpante (excludente da culpabilidade). O bem jurídico sacrificado tem valor menor ou igual ao salvaguardado, haverá estado de necessidade justificante (excludente de ilicitude); Não reconhece estado de necessidade exculpante. Portanto, se o bem sacrificado tiver valor maior que o bem protegido, haverá redução de pena. Qual a adotada pelo CP? A teoria unitária. Art. 24, §° 2, CP: “Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.” O que deve ser considerado no julgamento do grau de importância do bem jurídico protegido em confronto com o sacrificado? Deve ser considerado um sistema objetivo, de hierarquia de bens jurídicos em abstrato de acordo com princípios, regras e valores constitucionais, sem ignorar as circunstâncias do caso concreto, em especial, o estado de ânimo do agente. O que fazer em caso de conflito entre deveres de igual valor? Predomina a situação preexistente. Conhecimento da Situação de Fato Justificante De todos, é o único de caráter subjetivo. É a consciência e vontade de salvar direito próprio ou alheio. Cabe estado de necessidade em crime habitual e permanente? Não, pois a lei exige como requisitos o perigo atual, a inevitabilidade do comportamento lesivo e a não razoabilidade de exigência do sacrifício do direito ameaçado. Ex.: não pode alegar estado de necessidade quem submete o filho a cárcere privado (crime permanente) para impedi-lo de continuar usando drogas. Embora típicos e ilícitos, alguns casos podem configurar inexigibilidade de conduta diversa, excluindo a culpabilidade do seu autor. O furto famélico é crime? Entendido como o furto para saciar a fome, tem sido reconhecido pela jurisprudência como exemplo típico de conduta praticada em estado de necessidade, desde que presentes os seguintes requisitos É possível estado de necessidade contra estado de necessidade? (Estado de Necessidade Recíproco) Sim. Quando duas pessoas enfrentam o mesmo perigo, não se exige do titular do bem em risco o dever de permitir o sacrifício ao seu direito quando diante da mesma situação de perigo do outro. Ex.: dois náufragos que disputam um único salva-vidas. O estado de necessidade é comunicável? Se o fato típico for cometido por mais de um agente em coautoria ou participação, todos serão beneficiados pela excludente. O que acontece quando há o estado de necessidade e o erro na execução? É possível que o agente, no momento em pratica o fato para salvar de perigo direito próprio ou alheio, acabe atingindo, por erro na execução, bem jurídico de terceiro. Considerando que, em relação ao que visava, o agente estava acobertado pela justificante, não há crime. Que o fato seja praticado para mitigar a fome. Que seja o único e derradeiro recurso do agente (inevitabilidade do comportamento lesivo). Que haja a subtração de coisa capaz de diretamente contornar a emergência. A insuficiência de recursos adquiridos pelo agente com o trabalho ou a impossibilidade de trabalhar. Essa situação não se confunde com o estado de necessidade agressivo. Nesse último caso, não há erro. Diante da impossibilidade de salvaguardar o direito por outro meio, o agente dirige sua conduta contra bem jurídico alheio. 5 – Legítima Defesa - Está disposto no art. 25, CP: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.” - Os fundamentos da descriminante (Nucci): Prisma Jurídico- Individual Prisma Jurídico- Social É o direito que todo homem tem de proteger seus bens juridicamente tutelados. Deve ser exercida no contexto individual, não sendo cabível invocá-la para a defesa de interesses coletivos, como a ordem pública ou o ordenamento jurídico. O ordenamento jurídico não deve ceder ao injusto, de tal forma que a legítima defesa só se manifesta quando necessária. Deve cessar quando desaparece o interesse de afirmação do direito ou, ainda, em caso de manifesta desproporção entre os bens em conflito. É daqui que se extrai o princípio de que a legítima defesa deve ser exercida da forma menos lesiva possível. 5.1 – Requisitos da Legítima Defesa Agressão Injusta Agressão: a conduta (ação ou omissão) humana que ataca ou coloca em perigo bens jurídicos de alguém. Essa conduta é dolosa ou culposa? Luiz Flávio Gomez – ambas Sanches – dolosa, pois deve ser dirigida, com destinatário certo. Caso contrário, caracteriza perigo atual (sem destinatário certo) e agirá em estado de necessidade. Injusta: é a agressão contrária ao direito, não necessariamente típica. Independe de consciência do agressor. Quanto a existência de injusta agressão, classifica- se em: Real Putativa Quando o ataque efetivamente existe (exclui a ilicitude). Quando o sujeito atua em face de agressão imaginária (não exclui a ilicitude). Há duas hipóteses em o provocador não pode invocar a legítima defesa: 1) Quando a provocação constitui verdadeira agressão. 2) Quando a provocação constitui pretexto de legítima defesa, ou seja, tem o escopo de criar uma situação de legítima defesa para justificar a morte do provocado. Atual ou Iminente Não se admite legítima defesa contra agressão passada ou futura. Exige que se determine o momento no qual dita agressão começa e termina, para fins de legítima defesa. Qual seria o momento do começo? Uma parte da doutrina exige a realização do delito em grau de tentativa, mas essa posição exclui determinadas condutas, como alguns atos preparatórios que evidenciam uma tentativa iminente (Roxin). Assim, deve-se incorporar a fase final dos atos preparatórios, mas não os momentos anteriores, nem a tentativa idônea. Legítima Defesa Postergada É a extensão da percepção do que constitui a agressão atual. Se a agressão cometida pelo agente enseja a reação imediata da vítima, ainda que, na esfera do tempo do crime, tenha havido consumação, é justo que se viabilize a excludente da ilicitude. Já que se aplicado a literalidade do art. 25, faltaria um dos requisitos da legítima defesa, porém tratar- se-ia de clara falta de equidade. Ex.: alguém, que despojado de seus bens pelo roubador, o ataca logo em seguida para recuperar objetos subtraídos. Conclui-se, de acordo com a corrente dominante, que o roubo estava consumado, e, portanto, a agressão havia cessado. Legítima Defesano Crime de Rixa Há duas situações: 1) Em regra: Não há a possibilidade de legítima defesa porque as agressões cometidas uns contra os outros, são todas injustas. 2) Exceção: Sim, quando um extrapola os limites e passa a atuar de modo que destoe do ânimo conflitivo dos demais, o que altera a perspectiva de injusta agressão, que se antes era generalizada, agora se concentra na conduta que extrapolou. Ex.: um dos rixosos se apossa de uma arma de fogo. Claus Roxin: Não se deve conceder a ninguém um direito ilimitado de legítima defesa à agressão de um inimputável. Ex.: agressão praticada por criança de 05 anos contra adulto, é melhor evitar o embate. Uso Moderado dos Meios Necessários Assegurar a proporcionalidade entre o ataque e a defesa. Meio necessário: o meio menos lesivo à disposição do agredido no momento da agressão, porém capaz de repelir o ataque com eficiência. A apreciação pelo magistrado deve ser feita objetivamente, sem desconsiderar as condições de fato do caso concreto, segundo um critério de relatividade ou um cálculo aproximativo. Entretanto, também não se pode ignorar as peculiaridades subjetivas do agente. Ou seja, devem ser ponderadas as circunstâncias concretas do fato e as características pessoais do sujeito. O ato de repelir injusta agressão pode ocorrer por omissão? Há na doutrina quem saliente que sim (Fernando de Almeida Pedroso). Ex.: suas pessoas estão em um iate em alto-mar. O agente, fraco e magro, é agredido pelo seu companheiro de viagem, forte e musculosos. Eles começam a lutar e o agressor, que não sabia nadar, cai na água, O agente não o salva, omitindo-se e o deixa afogar-se. Proteção do Direito Próprio ou de Outrem Admite-se legítima defesa no resguardo de qualquer bem jurídico próprio (legítima defesa própria ou in persona) ou alheio (legítima defesa de terceiro ou ex persona). Não há proporcionalidade entre os bens, mas entre a forma que se deu o ataque e a forma como ocorre a defesa. Legítima defesa de terceiro depende de autorização? 1) Não, quando o bem jurídico que se pretende defender seja indisponível. Ex.: a vida. 2) Sim, quando o bem jurídico for disponível. O agente que atue contra a vontade do titular, o fará ilicitamente, embora, nesse caso, o mais provável seja que proceda em legítima defesa putativa. Conhecimento da Situação de Fato Justificante Deve o agente conhecer as circunstâncias do fato justificante, demonstrando ter ciência que está agindo diante de ataque atual ou iminente. O pacote anticrime inseriu, no art. 25, um parágrafo único que dispõe sobre o instituto da legítima defesa no dia a dia dos agentes policiais e de segurança pública: “Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.” Legítima Defesa e Erro Na Execução É possível, já que a infeliz reação deve ser considerada como se praticada contra o real agressor, não descaracterizando legítima defesa. Ex.: atirador de elite que atinge a vítima ao invés do agressor. Sofre consequências na esfera civil, mas na criminal está acobertado pela descriminante da legítima defesa. É possível legítima defesa recíproca? Não, pois considerando injusta a agressão, não é possível duas pessoas, simultaneamente, agirem uma contra a outra. E a legítima defesa sucessiva? Sim, caso em que o agressor se vê obrigado a se defender do excesso dos meios defensivos utilizados pelo agredido. É admitida a legítima defesa da legítima defesa putativa? Sim, pois por ser injusta, a legítima defesa putativa pode ser contida por quem se vê atacado por alguém que fantasiou situação que de fato não existe. E a legítima defesa putativa recíproca? Não se descarta a possibilidade, seguindo a mesma linha de raciocínio. Admite-se legítima defesa contra quem age em estado de necessidade? Não, pois no caso do estado de necessidade não há uma situação injusta, mas um perigo atual. Da mesma forma, a legítima defesa não é compatível com o estrito cumprimento de um dever legal nem com o exercício regular de um direito. Já que, em ambos os casos, se a ação é lícita, não pode ser considerada injusta de forma a admitir que o agente a repila. 6 – Estrito Cumprimento de um Dever Legal - O agente público, no desempenho de suas atividades, não raras vezes é obrigado, por lei (em sentido amplo), a violar um bem jurídico. Dessa forma, o estrito cumprimento do dever legal é essa intervenção lesiva, dentro de limites aceitáveis. - Ao contrário do que ocorrer no exercício regular de direito, aqui a lei obriga o agente a atuar. - As condutas, apesar de típicas, estão justificadas pelo estrito cumprimento do dever legal. Da onde decorre o dever legal que fundamenta a descriminante? Da lei em sentido lato, ou seja, de qualquer diploma normativo emitido pela autoridade competente para deliberar a respeito. Assim, pode ser justificada pela lei em sentido estrito, pelo decreto ou pelo regulamento. Também pode ser justificada por ato administrativo, quando dotado de efeitos gerais. O particular pode invocar a descriminante do estrito cumprimento do dever legal? Mirabete Maioria da doutrina Não, sendo exclusiva dos agentes. Sim. Ex.: o advogado processado por delito de falso testemunho, porque se recusou a depor sobre fatos envolvendo segredo profissional, pode invocar o estrito cumprimento de dever legal. 7 – Exercício Regular de um Direito - Condutas do cidadão comum autorizadas pela existência de direito definido em lei. - “Onde existe o direito não há crime” Ex.: a execução de prisão em flagrante, permitida a qualquer um do povo. - São requisitos desta justificante: a proporcionalidade, a indispensabilidade e o conhecimento do agente de que atua concretizando seu direito previsto em lei, Como são tratados os ofendículos? Representam o aparato preordenado para defesa do patrimônio. Se enquadra em ambas as excludentes, em momentos distintos: Exercício Regular de Direito Legítima Defesa Enquanto aparato não é acionado. É a proteção da posse, incluído no direito de tapagem, disciplinado no art. 1.297, CC. Ao funcionar repelindo a injusta agressão 8 – Consentimento do Ofendido Elementar do Crime Não Elementar do Crime O consentimento exclui a tipicidade. O consentimento pode servir como causa extralegal de justificação. 8.1 – Requisitos para que o Consentimento do Ofendido atue como Causa Supralegal de Exclusão da Ilicitude 1) O dissentimento (não consentimento) não pode integrar o tipo penal Se o dissentimento integrar a norma penal, desaparece o próprio fato típico. Ex.: art. 150, CP. 2) O ofendido tem que ser capaz Se o ofendido for incapaz, será invalido. 3) O consentimento deve ser válido A validade reside na liberdade e consciência no momento da sua emissão. 4) O bem deve ser disponível Não se admite quando versa sobre bem jurídico indisponível. 5) O bem deve ser próprio Não se pode consentir lesão a bem alheio. 6) O consentimento deve ser prévio ou simultâneo à lesão ao bem jurídico O consentimento posterior não exclui a ilicitude, podendo, entretanto, gerar efeitos no campo da punibilidade. Pode valer como renúncia ou perdão nos casos de APPrivada. 7) O consentimento deve ser expresso A doutrina clássica não admite o consentimento tácito ou presumido. A moderna sim. 8) Ciência da situação de fato que autoriza a justificante Exige-se que o agente aja sabendo estar autorizado pela vítima A integridade física é um bem jurídico disponível? Sim, portanto que trate de lesão corporal de natureza leve e que o consentimento não contrarie a moral e os bons costumes. É possível oconsentimento do ofendido nos crimes culposos? Nada impede a incidência da causa supralegal justificante nos delitos culposos. 8 – Ticking Bomb Scenario Theory: o emprego da tortura na iminência de um ato terrorista - A Teoria do Cenário da Bomba-Relógio é definida como a atuação extrema e emergencial na qual um agente estatal, com o propósito de obter informações específicas e essenciais, tortura suspeitos de conhecer ou integrar planos de ataques terroristas iminente, que expõem a perigo a vida de um grande número de pessoas, a fim de que se possa prevenir a ocorrência de tais ataques - Há duas situações: 1) Quem sustente ser admissível o uso da tortura: diante de situações nas quais dezenas de vidas são expostas a perigo iminente, justifica-se a flexibilização da tutela dos direitos humanos, para a preservação de um bem maior. 2) Quem sustente ser inadmissível o uso da tortura: ainda que se trate de prevenir um ataque terrorista iminente, sustenta-se que o sistema de proteção aos direitos humanos não admite nenhuma exceção para a imposição de métodos cruéis de investigação. O emprego da tortura, para além de simplesmente atingir a integridade física e psíquica do torturado, transforma- o num objeto, razão pela qual a dignidade humana lhe impõe um obstáculo intransponível. Qual a natureza jurídica da medida? Tendo em vista que o ataque terrorista preste a acontecer é normalmente provocado por uma agressão injusta, seria legítima defesa. 9 – Excesso nas Justificantes - Art 23, § único, CP: “o agente, em qualquer das +hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.” Doloso O agente se propõe a ultrapassar os limites da causa justificante. Culposo Inobservância do dever de cuidado do agente quanto atua respaldado por alguma das causas excludentes da ilicitude. Acidental Irrelevante penalmente, pois decorre de caso fortuito ou força maior. Exculpante Relacionado a profunda revolta de ânimo que acomete o agente. Pode ter a culpabilidade afastada por inexigibilidade de conduta diversa. 10 – Descriminante Putativa - São as causas excludentes de ilicitude fantasiadas pelo agente. - Estamos diante de um erro. Há duas espécies: tipo (art. 20) e proibição (art. 21) As descriminantes putativas retratam qual espécie de erro? 1) O agente supõe agir sob o manto de uma justificante em razão de erro quanto à sua existência ou seus limites. Apesar de conhecer a situação de fato, ignora a ilicitude de seu comportamento. Erro de proibição 2) O agente engana-se quanto aos pressupostos fáticos do evento. Supõe estar diante uma situação de fato que, na verdade, não existe. Erro de Tipo ou Erro de Proibição? Teoria Extremada ou Estrita da Culpabilidade Deve ser tratado como erro de proibição. É erro escusável e elimina a culpabilidade do sujeito que sabe exatamente o que faz. Teoria Limitada da Culpabilidade Tem a mesma natureza de erro de tipo. Inevitável – além do dolo, exclui a culpa (isentando o agente de pena). Evitável – exclui o dolo, mas pune a título de culpa (imprópria). É a adotada pelo CP, se encontra no §1°, do art. 20 (erro de tipo) Teoria Extremada Sui Generis Quando inevitável, segue a teoria extremada isentando o agente de pena, não excluindo o dolo ou a culpa. Quando evitável, obedece a teoria limitada, punindo a título de culpa, não atenuando a culpa.