Prévia do material em texto
IMUNOLOGIA AULA 4 Profª Stephanie Von Stein Cubas Warnavin 2 2 CONVERSA INICIAL Antígenos e Anticorpos Nesta aula, vamos iniciar os estudos sobre antígenos e anticorpos, e como ocorre a relação antígeno-anticorpo na resposta imune. Desse modo, iremos conhecer os tipos de antígenos, anticorpos e imunoglobulinas. Por fim, abordaremos os anticorpos monoclonais. Por essa razão, a aula está dividida nos seguintes temas: 1. Antígeno: considerações gerais; 2. Anticorpo – estrutura e funções; 3. Imunoglobulinas; 4. Resposta imune; 5. Anticorpos monoclonais. TEMA 1 – ANTÍGENO: CONSIDERAÇÕES GERAIS Entre as diversas funções do sistema imunológico, uma das que se destacam é estabelecer uma diferenciação muito precisa entre os componentes próprios e não próprios dos organismos vertebrados, bem como reagir frente às substâncias estranhas e não destruir o patrimônio orgânico do corpo – a diferenciação entre as substâncias que nos são próprias e aquelas estranhas ao organismo é exercida pelos linfócitos imunocompetentes B e T e suas células correspondentes. A imunidade contra as doenças infecciosas causadas por microrganismos desenvolve-se em resposta a antígenos (Ag). Os antígenos são definidos como moléculas que são reconhecidas pelo sistema imunológico e induzem uma resposta imunológica. O antígeno estimula a produção de anticorpos e/ou resposta imunológica celular, a qual reagirá especificamente com o antígeno. A reação entre o antígeno e o anticorpo é similar àquela que ocorre entre a chave e a fechadura. É específica, e os anticorpos produzidos contra um antígeno não reagem (ou reagem fracamente), com outros antígenos. No Quadro 1 é possível observar as diversas denominações de antígenos e seus respectivos conceitos. 3 3 Quadro 1 – Denominações dos antígenos Antígenos/Imunógenos/ Antígenos completos Substâncias capazes de promover resposta imunológica Haptenos/ Antígenos incompletos Não conseguem promover a resposta imunológica, apenas inte- ragem com substâncias pré-formadas durante a reposta imuno- lógica. Carreadores Unem-se a haptenos, tornando-os antígenos completos. Adjunvantes Substâncias que, quando se unem a imunógenos, aumentam o poder antigênico. Alérgenos Antígenos que promovem resposta imunológica exacerbada, como em hipersensibilidades (alergias). O antígeno pode ser uma substância solúvel produzida por um microrganismo, como uma toxina, por exemplo, ou uma substância presente em um vírus, uma bactéria ou outra célula de superfície, ou na parede celular. A maioria dos antígenos são proteínas, porém algumas são polissacarídeos de cápsulas bacterianas, ou glicolipídios. A parte do antígeno à qual o anticorpo se liga é chamada de determinante antigênico, epítope ou epítopo (Figuras 1 e 2). Na maioria dos casos, os antígenos contêm muitos determinantes que podem ser diferentes entre si ou ter estruturas moleculares repetidas. Um determinado microrganismo contém muitos antígenos diferentes. Protozoário, fungos e bactérias contêm centenas de milhares de antígenos. Alguns vírus contêm poucos antígenos (o vírus polyoma contém 3 antígenos); outros, chegam a mais de 100 antígenos (hipersvirus e poxvírus). A resposta imunológica se desenvolve para muitos desses antígenos durante a infecção. A resistência à infecção, entretanto, depende principalmente da resposta imunológica a um menor número de antígenos de superfície do microrganismo. Os antígenos de superfície relevantes encontram-se isolados e caracterizados para algumas viroses. Pouco se conhece sobre os antígenos que induzem resistência a bactérias, fungos e protozoários. Figura 1 – Representação esquemática do epítopo (ou epítope) ou determinante antigênico – parte do antígeno que promove a resposta imunológica, geralmente constituído por grupos de aminoácidos 4 4 Figura 2 – Representação básica da interação anticorpo e antígeno; imunidade humoral e complexo antígeno-anticorpo; nota-se a presença de duas bactérias com epítopos e anticorpos diferentes Crédito: Designua/Shutterstock. Os antígenos são substâncias que podem ser reconhecidas pelas células T, células B ou ambas, por meio de receptores representados por anticorpo ou TCR (receptor de célula T) particular. Além disso, há dois grupos de antígenos: T-dependentes e T-independentes. Os antígenos que requerem a intervenção de linfócitos T para desencadear a produção de anticorpos pelo linfócito B são denominados “antígenos T-dependentes”. A maioria dos antígenos do tipo proteína está enquadrada nessa categoria. Os antígenos T-independentes são 5 5 capazes de estimular os linfócitos B para produzirem anticorpos sem o auxílio dos linfócitos T. Os antígenos T-independentes são normalmente grandes compostos com múltiplas subunidades repetidas, como aqueles da cápsula polissacarídica das bactérias Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae tipo b, ou estreptococos do grupo B. Os antígenos T-independentes são imunógenos fracos nas pessoas com menos de dois anos de idade. A imunogenicidade dos antígenos T- independentes é aumentada quando eles são transformados em antígenos T- dependentes pela sua junção a uma proteína carreadora. Este fenômeno é utilizado na preparação de vacinas conjugadas, como a vacina contra H. influenza tipo b, na qual o polissacarídeo relevante (T-independente) é unido ao toxóide diftérico, toxóide tetânico, ou outra proteína carreadora (T-dependente). Quando ocorre uma falha no reconhecimento de um componente próprio, o nosso organismo passa a reagir contra ele, originando as doenças autoimunes, como a tireoidite de Hashimoto, a anemia perniciosa, a esclerose múltipla, a infertilidade, o Lúpus eritematoso sistêmico, a atrite reumatoide, a síndrome de Sjögren, entre outras doenças que serão abordadas posteriormente. O Quadro 2 mostra a classificação dos antígenos quanto à sua origem, espécie e natureza. Quadro 2 – Classificação dos antígenos Origem Exógenos – origem do meio externo Endógenos – origem do próprio organismo Espécie Xenoantígeno – própria espécie Aloantígeno – próprios de alguns membros da espécie Autoantígeno – próprio indivíduo Natureza Complexos químicos Proteínas Polissacarídeos Lipídeos TEMA 2 – ANTICORPO – ESTRUTURA E FUNÇÕES Anteriormente, estudamos que os linfócitos B, junto com os linfócitos T, constituem a resposta imune adaptativa (Figura 3). Os linfócitos B são as células responsáveis pela produção de anticorpos. Os anticorpos e o sistema complemento (que será abordado futuramente) formam a imunidade humoral, que se trata de substâncias solúveis. 6 6 Figura 3 – Células do sistema imune adaptativo (resposta imune) Crédito: Designua/Shutterstock. Os linfócitos são produzidos na medula óssea. São oriundos de células- tronco da linhagem hematopoiética. Os linfócitos T concluem a sua maturação no timo, enquanto os linfócitos B completam o processo na própria medula óssea. Após completarem sua maturação, são conduzidos para os órgãos linfoides secundários, permanecendo lá até que sejam ativados por um Ag. Os linfócitos B que já se encontram amadurecidos são chamados de “plasmócitos”, e são eles que formam os anticorpos. Importa saber que os linfócitos B (ou células B), são chamados de “células B naïve” quando ainda não ativados. Os anticorpos são biomoléculas que desempenham duas funções principais na defesa do organismo: reconhecimento de antígenos (Ag) e iniciar as reações que levam à destruição do Ag. Para desenvolver o reconhecimento de Ag, os anticorpos necessitam se conectar a moléculas que ficam na superfície do Ag invasor. Essas moléculas são chamadas de “epítopos” (estudas anteriormente). Os anticorpos são capazes de reconhecer e agir contra uma grande variedade de epítopos,o que possibilita reagir até mesmo com antígenos artificiais e mudanças moleculares ocorridas em agentes patógenos, resultado de recombinações e mutações de seu material genético. Isso se deve pelo fato de as células B guardarem propriedades específicas para essas ações, como diversidade, memória e 7 7 especificidade. A especificidade e diversidade se devem pelos receptores de células B (BCRs), que são os receptores de Ag. Agora que conhecemos as principais funções dos anticorpos, precisaremos entender como eles são formados, além de suas principais estruturas utilizadas em suas funções no sistema imunológico. Cada linfócito B possui um receptor específico para um Ag (Figura 4). Ao ser ativado, o linfócito passa por diversos ciclos de divisões celulares (mitose), produzindo células- filhas, clamadas de “clones”, que contêm receptores de Ag com a mesma especificidade do BCR da célula mãe. Figura 4 – Cada anticorpo liga-se a um antígeno específico; interação semelhante a uma fechadura e chave Crédito: Aldona Griskeviciene/Shutterstock. A estrutura do anticorpo é semelhante à letra grega gama ϒ (ou à letra “Y”), por isso, são também denominados “ϒ-globulinas”. A parte do anticorpo responsável pelo reconhecimento do Ag está situada em cada uma das extremidades dos “braços” do Y. Há também o hinge, semelhante a dobradiças próximas à junção dos braços e da haste. As dobradiças são flexíveis, permitindo que os braços se movam para reconhecer o Ag. A haste, por sua vez, possibilita a interação do anticorpo com o sistema imunológico (Figura 5). Para entender mais claramente como essa interação ocorre, é preciso saber que, em grande parte das vezes que as “invasões” de Ag acontecem, os anticorpos são eficientes 8 8 para a inativação e/ou neutralização dos agentes patógenos, porém, em outros casos, isso não ocorre de maneira tão eficaz. Quando os anticorpos não conseguem combater o antígeno a ponto de neutralizá-lo, o anticorpo ativa um tipo de programa de destruição do invasor. Para isso acontecer, as moléculas efetoras ligam-se ao conjunto composto pelo antígeno e anticorpo por meio dessa haste, acionando mecanismos complexos que levam à eliminação do invasor, como a fagocitose realizada pelos neutrófilos e macrófagos. Os sistemas efetores têm ação bastante agressiva, podendo ser acionados pelos agrupamentos de anticorpos que se formam em torno das substâncias ou células invasoras, e não por anticorpos livres. Figura 5 – Estruturas do anticorpo Crédito: Akor86/Shutterstock. De modo geral, a haste do anticorpo é responsável direta pelas suas funções efetoras. Importante ressaltar que as hastes dos anticorpos são conservadas entre si. Entretanto, há diferenças que possibilitam agrupar anticorpos em classes, denominadas “isotipos”. Esses isotipos são chamados de 9 9 IgG, IgM, IgE, IgA e IgD (Figura 6), que serão estudados de forma mais detalhada no próximo tema. Figura 6 – Isotipos de anticorpos Crédito: Yuliam/Shutterstock. TEMA 3 – IMUNOGLOBULINAS Os anticorpos compreendem uma família de proteínas globulares, chama- das de “imunoglobulinas” (Ig). As imunoglobulinas são grupos de glicoproteínas (GPs) que representam o sistema imune humoral e estão espalhadas pelo sis- tema circulatório. Sistema imune humoral é o conjunto de produtos do sistema imune que abrange os líquidos corporais, tais como saliva, linfa, plasma e outros. Como já mencionado, há cinco classes distintas de imunoglobulinas identifica- das. Essas distinções são baseadas nas diferenças estruturais na composição de suas cadeias pesadas. Cada molécula de Ig é composta por duas cadeias pesadas e duas cadeias leves ligadas por pontes. Há duas regiões na imunoglobulina, a região aminoterminal (N-Terminal) e região carboxiterminal (C- Terminal). Na Figura 7 é possível observar as várias estruturas das Imunoglobulinas. 10 10 Figura 7 – Estruturas que compõe a Ig. Em laranja destaca-se a parte variável da Ig, que garante a especificidade da molécula. Nela, encontram-se variantes conforme o tipo de antígeno a ser combatido. A parte em azul é a parte constante, que não se modifica. Pode-se dividir a Ig ao meio, em FAB (porção onde se encaixa o antígeno) e FC (porção que encaixa às células do sistema imune) Parte Constante leve Constant Light - CL Constante Constante pesada Constant Heavy - CH Parte Variável leve Variable Light – VL Variável Variável pesada Variable Heavy - VH As constantes leves podem ser de dois tipos: κappa (κ) e lambda (λ). Já as constantes pesadas podem ser de cinto tipos distintos: α, γ, δ, ε e μ, dando origem às classes conhecidas de imunoglobulinas (IgA, IgG, IgD, IgE e IgM). 11 11 A porção FAB, constituída pela união das regiões variáveis das cadeias leve e pesada, é a porção que se encaixa ao antígeno e a porção onde se encaixa a células. Podemos analisar as propriedades dos isotipos de Ig no Quadro 3. Quadro 3 – Classificação das imunoglobulinas e suas propriedades Classe Estrutura Propriedades IgA Dimérica Monomérica Encontrada em mucosas do trato gastrointestinal, respiratório e urogenital. Previne colonização por patógenos. Presente também na saliva, lágrimas e leite. IgG Monomérica Principal Ig da imunidade adquirida. Tem capacidade de atravessar a barreira placentária. IgD Monomérica Ig de membrana. Faz parte do receptor de membrana de linfócitos B virgens (BCR). IgE Monomérica Envolvida em processos alérgicos e parasitários. Sua interação com basófilos e mastócitos causa liberação de histamina. IgM Monomérica Pentamérica Faz parte do receptor de membrana de linfócitos B virgens (BCR). Forma encontrada no soro, secretada precocemente na resposta imune adquirida. Fonte: Mesquita Júnior et al., 2010. As imunoglobulinas mais abundantes são IgG, IgM e IgA. O tipo IgE é protagonista nos episódios de reações alérgicas, tema que será abordado futuramente. O IgD ainda não está completamente esclarecido, sendo necessário ser mais bem estudado e pesquisado. Sabe-se que não é um anticorpo circulante e que não está presente nos vasos sanguíneos. Dessa forma, nesse momento iremos concentrar nossa atenção nos três tipos mais expressivos do sistema imunológico. A IgG é um monômero que possui quatro cadeias. A IgM, por sua vez, é um pentâmero composto de cinco unidades básicas mais uma cadeia adicional, na qual o seu peso molecular é de aproximadamente seis vezes mais que o peso da IgG. A IgA existe sob duas formas: uma no sangue, e outra nas secreções. A IgA do sangue é um monômero, com uma única unidade básica. A IgA secretória 12 12 é dimérica, composta de duas unidades, mais a cadeia J e um componente secretório (Figura 8). Figura 8 – IgG, IgA e IgM: os três tipos de imunoglobulinas mais abundantes Crédito: Joshya/Shutterstock. O tamanho da molécula de imunoglobulina é um dos fatores determinantes em sua distribuição tissular. A IgG é a principal imunoglobulina no sangue, representando cerca de 80% da imunoglobulina total circulante. A IgG está também se encontra presente nos espaços tissulares. Passa facilmente pela placenta e é responsável pela neutralização de vírus e toxinas de bactérias, facilitando a fagocitose e a lise das células bacterianas. A IgM, que é a maior imunoglobulina, está confinada principalmente na corrente sanguínea e, justamente por seu tamanho, é menos capaz de passar através das paredes dos capilares. Diferentemente da IgG, não atravessa a barreira placentária. Com seu local de combinação com o antígeno de valência 13 13 10, essa imunoglobulina apresenta alta afinidade, ou seja, tem grande habilidade de unir-se firmemente com antígeno. É particularmente eficaz nas lises de microrganismos mediadas por complemento. A IgA é a segunda imunoglobulina maisabundante na circulação sanguínea. Está presente predominantemente nas secreções dos tratos gastrointestinal e respiratório, bem como no colostro e leite humanos. A IgA promove imunidade mucosa local contra vírus e limita o crescimento bacteriano nas superfícies mucosas. Funciona no trato gastrointestinal e mostra uma resistência maior a enzimas proteolíticas que outras classes de anticorpos. TEMA 4 – RESPOSTA IMUNE Sobre as respostas imunes, ressaltamos que as respostas primárias e secundárias dos anticorpos frente aos antígenos são distintas de forma tanto qualitativa quanto quantitativamente. Dessa forma, vamos abordar esses dois tipos de respostas e fazer uma comparação entre elas. 4.1 Resposta primária A primeira exposição a um antígeno, seja ela de maneira natural ou por vacinação, leva à ativação de Linfócitos B virgens, que se diferenciam em plasmócitos produtores de anticorpos e também em células de memória, o que resulta na produção de anticorpos específicos contra o antígeno ao qual foi exposto. Após o início da resposta, há uma fase em que se observa aumento exponencial dos níveis de anticorpos, seguida por outra fase chamada de “platô”, na qual os níveis não se alteram. Assim, segue-se para a última fase da resposta imune primária, a fase de declínio, em que, como o próprio nome sugere, ocorre uma diminuição progressiva dos anticorpos específicos circulantes. 4.2 Resposta secundária Ao entrar em contato com um antígeno pela segunda vez, já há uma população de linfócitos B com capacidade de reconhecimento deste antígeno, devido à expansão clonal e células de memória que foram geradas durante a resposta primária. 14 14 As principais diferenças da resposta imune secundária quando comparada à reposta imune primária são: • Menor dose de antígeno necessária para induzir a resposta; • Duração da fase de latência é mais curta e a fase exponencial é mais longa; • Produção de anticorpos mais rápida; • Níveis de anticorpos mais elevados; • Fase de platô é mais duradora e alcançada mais rapidamente; • Fase de declínio é mais lenta e persistente. A magnitude da resposta secundária depende também do intervalo de tempo desde o contato inicial com o antígeno. Quando o intervalo for muito curto ou muito longo, a resposta será menor. Quando o intervalo é muito curto, os anticorpos ainda presentes formam complexos Ag/Ac (antígeno/anticorpo) que são rapidamente eliminados; quando é muito longo, é possível que as células de memória tenham diminuído gradualmente com o passar do tempo, embora a capacidade para deflagrar uma resposta secundária possa persistir por meses ou anos. O período ótimo para a indução de resposta secundária é logo após a queda do nível de anticorpos da resposta primária abaixo dos limites de detecção. Há a produção dos isótipos IgM e IgG, nos dois tipos de resposta (primária e secundária). Entretanto, na resposta primária, a IgM é a principal imunoglobulina, e a produção de IgG é menor e mais tardia. Já na resposta secundária, a imunoglobulina predominante é a IgG (Figura 9). Figura 9 – Produção das principais imunoglobulinas nas respostas primária e secundária 15 15 Crédito: Art of Science/Shutterstock. Nas duas respostas, a concentração de IgM sérica diminui rapidamente, de modo que, após 7 a 15 dias, nota-se queda acentuada, enquanto a produção de IgG ainda se mantém persistente. É importante enfatizar que os testes imunoenzimáticos muito sensíveis podem registrar, em alguns casos, níveis baixos ou residuais de IgM por meses, possibilitando encontrar resultados não tão realistas quanto ao quadro de presença momentânea do antígeno. Funções importantes dos anticorpos na resposta imune: • Opsonização: cobrir microrganismos e outras partículas para que sejam mais facilmente reconhecidos pelos fagócitos/macrófagos. • Neutralização: preencher receptores de superfície num vírus ou local de ativação de enzima microbiana para impedir seu funcionamento próprio. • Aglutinação: se agregam e juntam várias células em um aglomerado (ex.: tipos sanguíneos diferentes). • Fixação do sistema complemento: ativação de via clássica que resulta em ruptura de células e vírus, entre outros fatores. • Precipitação: agregação de antígenos em partículas. 16 16 TEMA 5 – ANTICORPOS MONOCLONAIS Os anticorpos monoclonais são imunoglobulinas derivadas de um mesmo clone de linfócito B, cuja clonagem e propagação são efetuadas em linhas de células contínuas. Essa categoria é produzida com o intuito de reagir com antígenos específicos de certos tipos de células, tendo maior capacidade de preservar as células saudáveis quando comparados às terapias citotóxicas padrão. Por este motivo, os anticorpos têm sido indicados como a tecnologia inovadora para o tratamento de alguns tipos de tumores e cânceres, sendo promissor quanto à possibilidade de alvejar e matar seletivamente células tumorais. Em outras palavras, são tipos de anticorpos preparados em laboratórios para serem usados em principalmente em: • Diagnóstico, identificação de patógenos e tratamento (trastuzamabe, bevacizumabe, palivizumabe, rituximabe – Figura 10); • Descritos como imunomuladores – modulam a resposta imune para uma ação específica; • Uso para diagnóstico de doenças: sorologia. Figura 10 – Vetor de nomenclatura de tipos de anticorpos monoclonais terapêuticos isolado Crédito: Visuta/Shutterstock. 17 17 A terapêutica utilizando os anticorpos como recurso iniciou-se após a descoberta de que o uso de soro animal imunizado com toxinas patógenas ou vírus, era uma terapia com eficácia para tratar doenças causadas pelos mesmos agentes em humanos. Desde sua descoberta, o uso dos anticorpos é condicionado por alguns fatores importantes: • A dificuldade em definir as múltiplas reações antígeno-anticorpo ocorridas quando se administra um anticorpo em um antígeno complexo; • Oferta limitada; • Incapacidade de purificação dos anticorpos que constituem o soro administrado; • Falta de padrões entre os laboratórios. Dessa forma, os anticorpos monoclonais possibilitaram uma resolução para tais questões, tendo em vista que o conceito usado na preparação de soros à base de anticorpos monoclonais é bastante simples: em vez de coletar soro que contém a mistura de todos os anticorpos sintetizados pelos linfócitos B, utiliza-se coleta individual de cada linfócito B e seu respectivo produto. Uma vez que cada linfócito B produz anticorpos que se ligam a um antígeno particular, é necessário obter um clone da célula B de interesse e as suas sucessivas linhagens de células-filhas permitem efetuar a produção de grandes quantidades de anticorpos específicos para um antígeno, designados por anticorpos monoclonais. A produção dos anticorpos monoclonais inicia-se da seguinte maneira (Figura 11): 1. Imunização de um animal, do qual são retirados os linfócitos; 2. Isolamento de linfócitos B a partir do baço; 3. Células “imortais” de mieloma múltiplo; 4. Fusão dos linfócitos B com células “imortais” de mieloma múltiplo; 5. Fusão entre células específicas imunizadas e células imortais formando células híbridas; 6. Crescimento clonal dos hibridomas; 7. Purificação dos anticorpos monoclonais; 8. Isolamento dos anticorpos monoclonais; 9. Hibridomas clonados são mantidos em culturas permanentes. 18 18 Figura 11 – Produção dos anticorpos monoclonais Crédito: Jefferson Schnaider NA PRÁTICA Com a chegada da pandemia do novo Coronavírus (Sars-Cov-2), muito se ouviu falar sobre os diferentes testes para detectar o contato com esse vírus. Vamos abordar agora as diferenças dos principais tipos de testes realizados nesta pandemia. 19 19 Testes moleculares RT-PCR É considerado o padrão ouro no diagnóstico da Covid-19. O RT-PCR constataa presença do material genético viral do Sars-Cov-2 na amostra do paciente. Por esse motivo, recomenda-se que seja feito na primeira semana de sintomas e que, de preferência, não ultrapasse o 12º dia. Esse período, para o exame, justifica-se pelo fato de que é nesse período que a carga viral está mais elevada, possibilitando detectar o RNA do SARS-CoV-2 na amostra analisada. O material de escolha para análise é a secreção respiratória, colhida no nariz e na garganta por meio do swab (Figura 12). O grau de confiabilidade é acima de 90%, e dificilmente apresenta um resultado falso positivo. Os laudos costumam sair em até 2 dias. Figura 12 – Teste Covid-19: swab Crédito: Cryptographer/Shutterstock. POCT-PCR O point of care test para PCR é um exame também realizado pela coleta de secreção do nariz e da garganta utilizando um swab. Ele é capaz de detectar o material genético do vírus e tem a vantagem de os resultados saírem em minutos. 20 20 Testes imunológicos Sorologia Esse tipo de teste não detecta a presença do vírus, mas sim a presença de anticorpos, resultado da resposta do organismo frente à infecção, identificando quem já teve contato com o Sars-Cov-2. Após alguns dias do aparecimento da doença, a quantidade de vírus vai diminuindo e começam a surgir os anticorpos – por essa razão, nesse exame a amostra de sangue deve ser coletada após sete ou dez dias do início dos sintomas (Figura 13). Figura 13 – Teste Covid-19: sorológico Crédito: diy13/Shutterstock. Os testes sorológicos para Covid-19 detectam a presença dos anticorpos dos isotipos IgA e IgM (que aparecem mais precocemente – 10 dias após a infecção) e também o IgG (chamados de memória tardia – aparecem quando a exposição ao agente infeccioso ocorreu há mais tempo, ou seja, depois de 15 dias). Interessante ressaltar que, na Covid-19 notou-se a presença de sincronismo, ou seja, o aparecimento de diferentes tipos de anticorpos em um mesmo momento. Esta característica tem gerado um grande desafio na interpretação destes exames. 21 21 O teste sorológico é realizado por meio de diferentes tecnologias. O imunoensaio enzimático (ELISA) revela a presença IgA e IgG. Já o sorológico por quimioluminescência (CLIA) é baseado na emissão de luz produzida por reações químicas e discrimina IgM (fase aguda da doença) e IgG (os anticorpos de memória). A sorologia eletroquimioluminescência (ECLIA) identifica os anticorpos totais. Testes rápidos Esse teste é chamado tecnicamente de imunocromatografia de fluxo lateral, pois o resultado corresponde a uma alteração de cor quando o sangue colhido entra em contato com o reagente. A amostra é obtida por meio de uma pequena incisão na ponta do dedo e colocada num kit, com indicação visual do resultado (Figura 14). Esse tipo de teste para a Covid-19 apresenta vários vieses, e assim, os resultados não conclusivos. Figura 14 – Teste rápido para Covid-19 Crédito: danielmarin/Shutterstock. FINALIZANDO Nesta aula, estudamos como ocorre a relação antígeno-anticorpo, bem como os tipos de imunoglobulinas e como se dá a resposta imune. 22 22 O termo antígeno, também chamado de imunógeno, significa toda espécie molecular de origem biológica isolada ou constituída por uma célula, vírus, liquido biológicos ou sintética que, quando introduzida em um receptor ou hospedeiro (vertebrado), é capaz de produzir uma reação imune. Se o organismo for imunocompetente, ele pode manifestar uma resposta imune ou uma tolerância. Os antígenos são macromoléculas não obrigatoriamente imunogênicas. As macromoléculas antigênicas (imunogênicas) são basicamente proteínas e polissacarídeos. As moléculas chamadas de imunoglobulinas são encontradas no plasma sanguíneo e em outros fluidos corporais, como o leite materno e a linfa. Essas moléculas atuam de forma específica com diferentes determinantes antigênicos. Quando se entra em contato com um antígeno pela primeira vez, leva aproximadamente de 10 a 12 dias após a exposição para iniciar a produção de IgM, que é o primeiro anticorpo na linha de frente ao combate ao antígeno. Ao chegar ao pico da produção de IgM, inicia-se a produção de IgG e, quando a infecção é resolvida, fica-se com um número menor deste anticorpo, mas ele ainda está presente caso ocorra um novo ataque desse antígeno para que essa resposta seja mais rápida. O quadro que vemos em uma segunda exposição do antígeno é mais rápido que a primeira, no qual a produção de IgM e IgG já irá se iniciar nos primeiros três dias, chamada de resposta anamnéstica, na qual os impactos no sistema imunológico são bem menores e, clinicamente, o indivíduo não apresentará sintomas, ou apenas terá sintomas leves. 23 23 REFERÊNCIAS ABBAS, A. K.; LICHTMAN, A. H; POBER, J. S; FARIAS, A. dos S. (Trad.). Imunologia celular e molecular. 7. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012 ELLA, C. C. S. et al. Imunologia da mucosa intestinal: da bancada ao leito. São Paulo: Atheneu, 2010. FORTE, W. C. N. Imunologia: do básico ao aplicado. 3. ed. São Paulo: Atheneu, 2015. LEVINSON, W. Microbiologia médica e imunologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010. MARTINS, M. de A. et al. Clínica médica: volume 7. São Paulo. Manole, 2009. REECE, J. B. et al. Biologia de Campbell. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015. SCUTTI, J. Fundamentos da imunologia. São Paulo: Rideel, 2016. SEHNEM, N. T. (Org.). Microbiologia e imunologia. São Paulo: Pearson, 2015. TORTORA, G. J.; FUNKE, B. R.; CASE, C. L. Microbiologia. 12. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.