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Profa. Dra. Angela Donato Oliva Conceitualização Cognitiva Enfoque top-down e Enfoque bottom-up Aula 07 Enfoques top-down e bottom-up na avaliação da Conceitualização TÓPICOS 01. Avaliação de teorias 02. Enfoque top-down 03. Enfoque bottom-up 01. Avaliação de teorias Cada indivíduo e cada transtorno psicológico exigem uma conceitualização cognitiva específica e individualizada, pois se relacionam a um conjunto determinado de PAs, crenças intermediárias e crenças centrais. O plano de tratamento da TCC deve basear-se na conceitualização cognitiva do cliente e no modelo cognitivo específico de cada psicopatologia. (Knapp, 2004). 1) É necessário ter uma teoria psicoterápica de um transtorno “X”. Como criar uma teoria? Os fatos não falam por si mesmos. Os fatos são crivos para as teorias, mas não são eles que originam a teoria. Os fatos funcionam como evidências contrárias. (A teoria sobre a qual está fundamentada a conceitualização está baseada - ou é derivada de - em evidências oriundas da observação clínica sólida?) Ø Quais são os critérios que avaliam nossas teorias? Os elementos descritivos e explanatórios da teoria cognitiva são sustentados pela pesquisa? Os critérios para avaliar a conceitualização baseada em evidências são classificados em top-down e bottom-up. - As conceitualizações cognitivas de caso são sustentadas pela teoria baseada em evidência? - Modelo teórico dos transtornos se aplica ao que é trazido pelo cliente? - É fidedigna? Há concordância entre os terapeutas? - As conceitualizações cognitivas de caso são confiáveis, clinicamente válidas e positivamente relacionadas ao resultado da terapia? Enfoque top-down Questões: Enfoque bottom-up Critérios de avaliação de uma teoria: Os critérios seguem os cânones da investigação científica? Os terapeutas usam efetivamente a conceitualização? concordam nos aspectos descritivos (lista de problemas) mas a fidedignidade se perde em inferência sobre mecanismos explanatórios (crenças) 02. Enfoque top-down A agenda da pesquisa top-down examina perguntas de pesquisa que vinculam a TCC com a conceitualização. 1) A teoria (criada) se ajusta ao cliente? ou O modelo dos transtornos emocionais da TCC está fundamentado em concordância ao sofrimento que as pessoas relatam? Os mecanismos dos transtornos emocionais de fato correspondem ao que as pessoas deprimidas ou ansiosas descrevem? 2) Como o terapeuta usa a teoria, ela é um guia, uma verdade sobre o cliente? (Kuyken et al., 2010) A agenda da pesquisa top-down examina perguntas de pesquisa que vinculam a TCC com a conceitualização. Leito de Procusto (dilema) Representa a imposição inflexível de um padrão. Beck e ellis não conseguiam aplicar a teoria psicanalítica aos seus clientes (ela se mostrava “procustiana”). Dilema: para se adequar à teoria psicanalítica Beck e Ellis também tinham que desconsiderar/ignorar o que as pessoas diziam sobre sua depressão e ansiedade. Beck se contrapôs a isso e construiu um modelo dos transtornos baseado no sofrimento que as pessoas descreviam (quando acometidas por esses transtornos). (Kuyken et al., 2010) Critério top-down: 3) A teoria da qual a conceitualização é derivada está baseada em (evidências oriundas de) observações clínicas sólidas? Se a resposta for “Sim”, então atende ao critério top-down. 4) Os elementos descritivos e explicativos da teoria cognitiva são sustentados pela pesquisa empírica? Se a resposta for “Sim”, então atende ao critério top-down. 5) Os protocolos da TCC para os transtornos são construídos a partir de uma base empírica? Se a resposta for “Sim”, é apenas um indício para serem considerados eficazes. 3, 4, 5) A TCC tem uma teoria derivada de elementos identificados no relato das pessoas, em evidências identificadas por sistemas conceituais testáveis. O modelo de Beck considera na história de desenvolvimento a vinculação entre: a) os modos de processamento de informação (da teoria cognitiva); b) dois níveis de crenças: as centrais e os pressupostos condicionais subjacentes; c) pensamentos automáticos, imagens, lembranças (carregados de significados); d) estratégias comportamentais. As estratégias utilizadas pelas pessoas nas situações estão vinculadas ao modo de processar a informação, às crenças e aos pressupostos ativados. Os modos, as crenças centrais, os pressupostos subjacentes e as estratégias comportamentais estão interligados pela história de desenvolvimento individual. Os pensamentos automáticos refletem pensamentos, lembranças e imagens carregados de significados e que surgem na mente das pessoas a cada momento. 6) Qual a base de evidência para a conceitualização (dos transtornos) em TCC? R: Observação clínica “sólida”, pesquisas (não experimentais). Lembrando que: Observação clínica apresenta vieses do terapeuta. 7) Quais os elementos da teoria cognitiva que servem de base para explicar os transtornos? R: Hipóteses sobre o funcionamento cerebral de processamento de informações, reações emocionais. 8) Os mecanismos dos transtornos (reais) são descritos no modelo teórico da TCC e são contemplados nas conceitualizações de caso individuais? 9) Quais são as nuances desses mecanismos ou como eles se desenvolvem no nível individual da conceitualização de caso? Como podemos entender as diferenças individuais? Inicialmente, o foco da intervenção da TCC voltou-se para o comportamento problemático (o sintoma) e desenvolver uma hipótese diagnóstica era fundamental para realizar o plano de tratamento. A partir dos anos 2000, David Barlow desenvolveu o protocolo unificado transdiagnóstico (Barlow, 2016). Eficaz em casos com comorbidades, evidencia fatores comuns entre os transtornos e essas semelhanças podem ser usadas no tratamento. O modelo transdiagnóstico pressupõe que aspectos das habilidades de regulação emocional seriam comuns a certos casos, permitindo o tratamento integrado (queixa principal e comorbidades). São frequentes os casos em que ansiedade e depressão coexistem. Como o terapeuta escolhe o protocolo de tratamento (qual critério utiliza para decidir usar um protocolo especifico ou um protocolo unificado)? R: O terapeuta deve iniciar fazendo a conceitualização cognitiva do caso. Kuyken, Dudly e Padesky (2010) e J. Beck (2022) – mudam o foco das crenças disfuncionais e usam as forças dos clientes. O ponto é que as pessoas, antes do transtorno ou dos problemas, eram razoavelmente funcionais, se relacionavam de maneira satisfatória. Possivelmente as crenças flexíveis e úteis sobre si, sobre o mundo, sobre as pessoas e sobre o futuro poderiam estar ativadas. O modelo que se apoiava em crenças negativas se beneficia (se completa) com a introdução das crenças positivas em um papel importante. O cerne do enfoque top-down O modelo teórico se aplica ao que o cliente apresenta como problema? Estou explicando/entendendo o fenômeno trazido pelo cliente, estou conseguindo integrar o que é dito à teoria? Essa é uma questão importantíssima, pois é uma maneira de avaliar a robustez de um modelo. Isso também possibilita refletirmos sobre o surgimento de novos enfoques, que parecem, de certa forma, complementar aspectos do modelo da TCC. O enfoque top-down se preocupa com essa correspondência entre o modelo teórico que está conduzindo o terapeuta e os eventos da vida, as leituras e as reações da pessoa. 03. Enfoque bottom-up Uma conceitualização de caso satisfaz os critérios bottom-up se ela for fidedigna, válida (isto é, tiver uma relação significativa com as experiências dos clientes e puder ser validada no cruzamento com outras medidas das experiências e do funcionamento dos clientes), afetar significativamente os processos e os resultados da terapia e se for encarada como aceitável e útil pelos clientes, pelos terapeutas e pelos supervisores. Existem evidências de que as conceitualizações da TCC satisfazem estes critérios bottom-up? (Kuyken et al., 2010, p. 37)Critérios bottom-up buscam responder as seguintes perguntas: O processo de conceitualização é confiável? Os clínicos concordam quando fazem a mesma conceitualização? A conceitualização é válida? Ela triangula com a experiência do cliente, com as medidas padronizadas e com as impressões do terapeuta e do supervisor? A conceitualização tem impacto na prática clínica e melhora a intervenção e os resultados da terapia? A conceitualização é útil para clientes e terapeutas? Critérios bottom-up: A conceitualização cognitiva de um caso satisfaz os critérios bottom- up de fidedignidade e validade quando: Ela se relaciona com as experiências dos clientes. (há concordância entre os terapeutas na conceitualização de um caso) Ela se correlaciona com outras medidas das experiências e funcionamento dos clientes. (Kuyken et al, 2010, p. 37) Critérios bottom-up – avaliando a fidedignidade. Para saber se a conceitualização de caso é fidedigna pergunta-se: - Os terapeutas concordam um com o outro em relação à conceitualização de um determinado caso? Estudo (Kuyken et al., 2005) indica: a) Que os terapeutas concordam nos aspectos descritivos da conceitualização (lista de problemas do cliente), mas a fidedignidade é fraca quando são formuladas hipóteses (inferências) sobre os mecanismos explicativos cognitivos e comportamentais subjacentes (crenças-chave e estratégias associadas). b) Que a concordância para níveis inferenciais (pressupostos disfuncionais) foi mais alta entre terapeutas experientes (comparando a conceitualização com a da própria J. Beck). (Kuyken et al, 2010, p. 37) O estudo (Kuyken et al., 2005) nos coloca a questão da fidedignidade, um índice de confiabilidade ou confiança, na conceitualização. Ø Em que medida as informações obtidas na conceitualização se afastam (ou refletem) a realidade do cliente? A fidedignidade (psicométrica) se refere à precisão de um instrumento (no caso a conceitualização); se relaciona com a consistência dos resultados obtidos por terapeutas distintos (em momentos/situações diferentes). Um instrumento é fidedigno se as repetidas mensurações e os resultados forem os mesmos. A fidedignidade é um pré-requisito da validade (capacidade de um instrumento estar medindo aquilo a que se propõe). Critérios bottom-up – avaliando a validade. As evidências que apoiam o critério de validade estão surgindo mais recentemente, visto que as pesquisas que tratam desses critérios bottom-up são mais limitadas. Estudo de Mumma e Mooney (2007) - Foram apresentadas informações que variavam ao longo do tempo. Foi pedido aos terapeutas que explicassem as mudanças na angústia. Os clínicos mais experientes conseguiram explicar melhor essa variação. Estudo de Kuyken et al. (2005) – A qualidade das conceitualizações foram avaliadas e as que apresentaram maior qualidade foram as produzidas por terapeutas mais experientes. (Kuyken et al, 2010, p. 37) Critérios bottom-up – avaliando se a conceitualização é benéfica para o resultado da terapia. Há evidências que apoiam o critério de (a conceitualização) beneficiar a terapia e seus resultados? Sem evidências, a utilidade clínica da conceitualização torna-se questionável. Tradicionalmente se diz que conceitualizações de caso individualizadas fortalecem o processo e os resultados da TCC porque elas orientam as intervenções e ajudam a prever problemas que precisam ser tratados na terapia. (Kuyken et al., 2010, p. 39, grifo nosso). Estudos (Chadwick et al., 2003; Ghaderi, 2006) não indicaram diferença significativa para abordagem individualizada ou manualizada em casos de fobia, resultados melhores para condição individualizada em casos de depressão e bulimia. Há poucas evidências, mas preliminarmente a abordagem individualizada parece ser mais promissora. (Kuyken et al, 2010, p. 37) Critérios bottom-up – avaliando se a conceitualização é benéfica para o resultado da terapia. Cautela em relação aos resultados apresentados por Chadwick et al., (2003) e Ghaderi (2006): a) As diferenças entre as condições individualizadas e manualizadas foram observadas em subgrupos. b) Os avaliadores no estudo de follow-up não estavam cegos à condição do tratamento. c) Os estudos (que examinam a relação entre a conceitualização e os resultados da terapia) apresentam pouco apoio aos benefícios frequentemente alegados para a conceitualização). d) Tratamento individualizado e o manualizado não são mutuamente excludentes. e) Manuais devem ser usados de forma flexível, guiados pela teoria, buscando uma abordagem empírica para a tomada de decisão clínica. f) Conceitualizações criadas em conjunto com os clientes parecem oferecer boas justificativas para as intervenções terapêuticas. (Kuyken et al, 2010, p. 37) Critérios bottom-up – avaliando se a conceitualização é aceitável e útil. Conceitualizar é útil para terapeutas, supervisores e pesquisadores clínicos? Chadwick et al., (2003): a) Reações dos clientes: positivas - indicam melhor compreensão e trouxeram esperança para os clientes; negativas - alguns relatam que a conceitualização fizeram a pessoa se achar “louca”. b) A conceitualização é considerada uma habilidade fundamental para os terapeutas (Flitcroft et al., 2007). Será que a conceitualização é sempre benéfica? Será que o terapeuta está conduzindo bem a conceitualização? Será que a reação negativa pode favorecer uma mudança? (Evans & Parry, 1996). Há poucos trabalhos empíricos sobre conceitualização. Para os terapeutas, é um método útil para individualizar os manuais de TCC nos casos específicos. Há pouca evidência de que os clientes experienciem a conceitualização de caso como uma parte central da TCC. Parece ajudar no engajamento do cliente na terapia (Kuyken et al., 2010). Em Síntese... A partir desses critérios, o que se pode concluir sobre a conceitualização: (Kuyken et al, 2010, p. 37) A partir desses critérios, o que se pode concluir sobre a conceitualização: a) Deve-se eliminar a conceitualização na TCC? b) De acordo com o enfoque top-down, as teorias cognitivas se baseiam em observação clínica cuidadosa, acumulam evidências e suas hipóteses são testáveis. Um bom terapeuta de TCC utiliza essas teorias cognitivas para planejar e orientar seu trabalho. Terapeutas de TCC e programas de treinamento estão fortemente comprometidos com conceitualização. Contudo, faltam evidências para isso. Porque abordagens baseadas em protocolos não se mostram eficientes nos casos complexos, não significa que a conceitualização é a única alternativa. São necessárias mais pesquisas sobre conceitualização. (Kuyken et al., 2010). A partir desses critérios, o que se pode concluir sobre a conceitualização: (Kuyken et al, 2010, p. 37) c) De acordo com o enfoque bottom-up, a conceitualização é útil e as pesquisas têm apontado para a validade e a fidedignidade em algum nível. Conceitualização pode servir como uma ponte entre teoria e prática. Fornece um formato à terapia e, ao mesmo tempo, se submete a teste empírico (ou ao “tribunal dos fatos”). Empirismo colaborativo engaja o cliente à terapia. Referências bibliográficas MUMMA, G. H., & MOONEY, S. R. (2007). Comparing the validity of alternative cognitive case formulations: A latent variable, multivariate time series approach. Cognitive Therapy and Research, 31, 451-481. KUYKEN, W., PADESKY, C. A., & DUDLEY, R. (2010). Collaborative Case Conceptualization: Working Effectively with Clients in Cognitive-Behavioral Therapy. New York: The Guilford Press. CHADWICK, P, WILLIAMS, C., & MACKENZIE, J. (2003). Impact of case formulation in cognitive-behaviour therapy for psychosis. Behaviour Research and Therapy, 41, 671-680. GHADERI, A. (2006). Does individualization matter? A randomized trial of standardized (focused) versus individualized (broad) cognitive-behavior therapy for bulimia nervosa. Behaviour Research and Therapy, 44, 273-288. FLITCROFT, A., JAMES, I. A., FREESTON, M., & WOOD-MITCHELL, A. (2007).Determining what is important in a good formulation. Behavioural and Cognitive Psychotherapy, 35, 325-333. KUYKEN, W., FOTHERGILL, C. D., MUSA, M., & CHADWICK, P. (2005). The reliability and quality of cognitive case formulation. Behavior Research and Therapy, 43, 1187-1201. KNAPP, P. (2004). Terapia Cognitivo-Comportamental na Prática Psiquiátrica. Porto Alegre: Artmed. BECK, J. (2022). Terapia Cognitivo-comportamental: Teoria e prática (3ª edição). Porto Alegre: Artmed. ______ (1997). Idem, 1ª edição. BARLOW, D. (2016). Manual Clínico dos Transtornos Psicológicos: Tratamento passo a passo. Porto Alegre: Artmed.
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