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Identidade Cultural Afro-Brasileira

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 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 1 
 
CAPÍTULO I 
A ETIMOLOGIA DE TERMOS DA CULINÁRIA AFRO-BAIANA: 
um retrato da herança africana na cultura brasileira 
 
Samantha de Moura Maranhão 
Universidade Federal do Piauí 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Este estudo tem por objeto a origem da terminologia da 
culinária afro-baiana, com o objetivo de correlacionar a etimologia 
do vocabulário do campo semântico da culinária afro-baiana às 
etnias e línguas que a economia escravagista fez chegar à Bahia, 
bem como analisar a época de introdução deste vocabulário no 
português brasileiro, segundo a lexicografia nacional. 
Busca responder à questão: “a etimologia dos termos da 
culinária afro-baiana é indicativa da origem dos pratos que 
designa?”. A hipótese testada é a de que a culinária afro-baiana é 
designada em línguas oeste-africanas, notadamente em iorubá, por 
termos introduzidos no português do Brasil no século XIX. 
Buscaram-se os termos culinários típicos da mesa afro-
baiana (designativos de pratos e temperos, de alimentos e bebidas) 
no texto Os Alimentos Puramente Africanos, extraído da obra A Arte 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 2 
 
Culinária na Bahia de Manuel Querino e compilado na Antologia do 
Negro Brasileiro (CARNEIRO, 2005, p. 467-472). Verificou-se, 
então, o registro dessa terminologia na versão eletrônica das obras 
Dicmaxi Michaëlis: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa 
(MICHAËLIS, 1998); Novo Aurélio Século XXI: O Dicionário da 
Língua Portuguesa (FERREIRA, 1999) e no Dicionário Houaiss da 
Língua Portuguesa (HOUAISS; VILLAR, 2001); no Dicionário 
Etimológico Resumido (NASCENTES, 1966) e no Dicionário 
Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa (CUNHA, 1982), 
bem como nos Falares Africanos na Bahia: um vocabulário afro-
brasileiro (PESSOA DE CASTRO, 2009) e na Enciclopédia Brasileira 
da Diáspora Africana (LOPES, 2004). 
A apresentação dos dados se dá por ordenação alfabética em 
verbetes que trazem os termos encontrados, sua etimologia, 
datação e acepção, a que segue uma interpretação destes dados, 
considerando-se a língua como reflexo da cultura de seus usuários 
e a importação de material léxico estrangeiro como consequência 
natural do contato de culturas, particularmente da necessidade 
designativa decorrente da aquisição de novos referentes 
proporcionados por este contato. 
Deste modo, é na Sociolinguística do contato 
intercomunitário (WEINREICH, 1967) que se colheram os 
fundamentos teóricos deste trabalho, ao abordar a herança 
africana na língua e na cultura brasileiras, que, porquanto 
inegável, nem sempre é suficientemente conhecida. 
 
O contato linguístico-cultural e sua consequência na língua 
 
Define-se contato de línguas como uma situação em que 
línguas ou variedades de língua se influenciam, devido a, por 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 3 
 
exemplo, coexistirem em áreas de fronteira, serem de uso de 
distintos grupos sociais que interagem, ou, ainda, em virtude de 
conquistas e migrações, situação de que pode resultar a mistura 
dos falantes em uma única comunidade. Verifica-se, também, em 
razão de viagens ou da exposição a meios de comunicação de 
massa (CRYSTAL, 1988, p. 64; TRASK, 2006, p. 65-66; NEUVEU, 
2008, p. 80). 
De acordo com Crystal (1988, p. 64), resultam do contato 
linguístico empréstimos de palavras, alterações fonológicas e 
gramaticais, misturas de línguas (pidgins e crioulos) e o 
crescimento do bilinguismo em várias escalas. 
Segundo Trask (2006, p. 65-66), o alcance da interferência é 
proporcional aos diferentes graus (mais ou menos duradouro, mais 
ou menos intenso) do contato de línguas: 1. se superficial, ocorrem 
a adoção de palavras e a incorporação destas, geralmente 
designativas de referentes novos, mas também podem resultar de 
prestígio; 2. se profundo, afeta a gramática e a pronúncia; 3. se 
extremo, resulta no abandono de uma língua em favor de outra. 
Weinreich (1967, p. 05) afirma que alguns antropólogos veem 
o contato de línguas como um aspecto do contato de culturas, 
constituindo, portanto, a interferência linguística uma faceta da 
difusão cultural e da aculturação. Para ele, o empréstimo lexical 
pode ser explicado a partir da análise dos pontos em que 
determinado vocabulário é inadequado no ambiente cultural em 
que o contato ocorre (WEINREICH, 1967, p. 03). 
Para Sapir (1980, p. 154), sendo o empréstimo vocabular o 
tipo mais simples de influência interlinguística, verificando-se 
sempre que há empréstimo de elementos da cultura, o seu estudo 
permite esclarecer a própria história da cultura, apontando o papel 
de vários povos no desenvolvimento e na difusão de ideias 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 4 
 
culturais, por meio da análise do grau de infiltração dos seus 
léxicos em outras línguas. 
A depender do tipo de contato verificado entre os grupos de 
línguas distintas, se por coincidência ou contiguidade geográfica 
ou se à distância, classificam-se os empréstimos, respectivamente, 
como íntimos ou culturais (BLOOMFIELD, 2005, p. 461; CÂMARA 
JR., 1988, p. 105, 111; VARGENS, 2007, p. 35). 
Segundo Trask (2006, p. 66), “Poucas línguas estão – ou já 
estiveram – suficientemente isoladas para evitar todo tipo de 
proximidade, e, portanto, virtualmente, toda língua mostra alguma 
prova de contato antigo ou moderno entre línguas.” Vejamos como 
se deu a interação do português brasileiro (PB) com línguas 
africanas na Bahia oitocentista, período em que se verificou a 
aquisição dos termos da culinária afro-baiana. 
 
Presença africana na Bahia e culinária afro-baiana 
 
De acordo com Oliveira (1997, p. 40), Luiz Viana Filho 
aponta 04 ciclos na periodização do comércio negreiro na Bahia: 1. 
ciclo da Guiné (a partir da segunda metade do século XVI); 2. ciclo 
de Angola (no século XVII); 3. ciclo da Costa da Mina e do Golfo do 
Benin (do século XVIII até 1815) e 4. fase da ilegalidade (1816-
1851). Esta periodização é parcialmente alterada por Pierre Verger, 
que subdivide o terceiro ciclo em dois: 3.1. ciclo da Costa da Mina 
(três primeiros quartos do século XVIII) e 3.2. ciclo da baía do 
Benin (de 1770 a 1850). 
Assim, a partir das últimas décadas do século XVIII e ao 
longo do século XIX, foi o Sudão Central, região interiorana em 
relação à Baía do Benin, a procedência de africanos, muitos dos 
quais islamizados (haussás, nupes, iorubás, bornos, borgus, etc.), 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 5 
 
levados como escravos para a Bahia em decorrência da jihad 
promovida, a partir de 1804, pelo xeque Usman dan Fodio, 
fundador do Califado de Sokoto, de cujas guerras expansionistas 
resultou o cativeiro de habitantes das áreas próximas à baía do 
Benin, particularmente no período compreendido entre os anos de 
1804 e 1810. A presença de escravos islamizados na Bahia está 
relacionada, portanto, a complexo desdobramento da história da 
África, em que se misturam religião e política, uma jihad e disputas 
por expansão territorial (LOVEJOY, 2000, p. 11-12). 
Segundo Reis (2003, p. 174): 
 
[...] desde pelo menos o início da jihād de Usuman dan Fodio, 
levas de escravos de diferentes grupos étnicos, comprometidos em 
maior ou menor grau com o Islã, vieram dar na Bahia. Durante as 
primeiras duas décadas do século XIX, eles eram principalmente 
haussás, capturados de um ou de outro lado dos conflitos que 
levaram à formação do Califado de Sokoto, em 1809, seguidos de 
rebeliões ocasionais de reinos e lideranças submetidos ou ainda 
não conquistados. 
 
Quanto às etnias islamizadas encontradas na Bahia, quando 
da grande revolta escrava de 1835, afirma Reis (2003, p. 178): 
 
Foram os haussás que na Bahia se tornaram prontamente 
identificadoscom o Islã: haussá e malê, apesar da origem iorubá 
deste termo, se tornaram sinônimos. Seria, de quebra, mais um 
atestado da pouca importância numérica dos fulanis na Bahia, 
eles que na África eram tidos como muçulmanos mais bem 
treinados. 
 
Embora, na Bahia, fossem os haussás os africanos mais 
intensamente islamizados, os nagôs (iorubás) os sobrepunham, em 
muito, numericamente. Segundo Reis (2003, p. 179): 
 
Não duvido, inclusive, que por volta de 1835 os 
muçulmanos baianos fossem nagôs na sua maioria e não 
filhos de nações minoritárias na Bahia, como a haussá e, 
menor ainda, a tapa, ou a minúscula fulani. De qualquer 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 6 
 
modo, os malês-nagôs tinham poder e prestígio na 
comunidade africana, pelo menos entre os de sua nação. 
 
Segundo Vianna Filho (2008, p. 150-151), o número de 
escravos importados para a Bahia até 1830 é estimado em cerca de 
um milhão e cem mil indivíduos, assim distribuídos: 50,6% de 
escravos oeste-africanos e 47,5% de escravos bantos. 
 
Tabela 01 – Tráfico Atlântico: sudaneses e bantos entre os séculos XVI e XIX. 
 
Séculos 
 
Sudaneses 
 
Bantos 
Média 
Anual 
 
Total 
XVI 
XVII 
XVIII 
XIX 
(até 1830) 
61.545 
402.800 
75.480 
143.605 
252.200 
111.450 
2.051 
6.550 
6.231 
20.0001 
205.150 
655.000 
186.930 
 
Total 
durante o 
tráfico 
 
539.825 507.255 
 
 
1.067.080 
Fonte: VIANNA FILHO, 2008, p. 151. 
 
A análise da origem sudanesa ou banta dos escravos levados 
à Bahia nos séculos XVIII e XIX, em dados registrados em 
diferentes fontes, aponta, para o período, clara predominância de 
oeste-africanos (Vianna Filho, 2008, p. 147-150). 
 
 
 
1 O total do século XVI se pauta em 33% do total de importações do século XVIII, 30% dos 
quais relativos à imigração oeste-africana (VIANNA FILHO, 2008, p. 151). 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 7 
 
Tabela 02 – Importação de sudaneses e bantos no século XVIII. 
 
Observações 
 
Ano 
Entradas 
da Costa 
da Mina 
 
Entradas 
de Angola 
Média 
anual 
para a 
Costa da 
Mina 
 
Média 
anual 
para 
Angola 
 
Carta do 
Conde de 
Atouguia 
em 06-09-
1753 
 
 
 
Certidão do 
Escrivão 
José Inácio 
Alvarenga 
Abreu de 
Souza em 
20-02-1756 
 
 
 
 
 
 
Certidão do 
Escrivão 
Diogo 
Pereira 
Marinho em 
26-11-1765 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1728 
a 
1748 
 
1751 
1752 
1753 
1754 
1755 
 
1759 
1760 
1761 
1762 
1763 
1764 
1765 
 
1785 
1786 
1787 
1788 
1789 
1790 
1791 
1792 
 
99.808 
 
 
7.496 
3.655 
4.295 
1.443 
3.953 
 
4.209 
3.319 
4.071 
4.012 
3.427 
2.651 
2.863 
 
 
 
12.233 
 
 
 
2.222 
2.934 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 8 
 
 
 
 
 
Docs. 
15.155 e 
15.157, Cf. 
Calógeras in 
Política 
Exterior, v. 
1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Calógeras. 
Idem. Mapa 
Imp. da 
Bahia, 
1798, 
Calógeras, 
idem. 
 
1793 
1794 
1795 
 
1797 
1798 
1799 
1800 
 
3.055 
4.558 
4.170 
 
4.600 
4.903 
8.200 
6.250 
 
4.039 
3.327 
3.615 
3.498 
2.910 
 
2.850 
2.411 
300 
08 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
4.028 
 
 
2.522 
 
Fonte: VIANNA FILHO, 2008. p. 147-148. 
 
 O século XIX vê aumento na importação de mão-de-obra 
banto, que então constitui cerca de 60% dos escravos baianos: 
59,6% de bantos contra 40,4% de sudaneses. 
 
Tabela 03 – Importação de sudaneses e bantos no século XIX. 
 
Observações 
 
 
Ano 
 
Entradas da 
Costa da 
 
Entradas de 
Angola 
 
Total 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 9 
 
Mina 
 
Calógeras. 
Política 
Exterior do 
Império. 
 
 
 
 
 
Livro de 
Visitas em 
embarcações 
da África 
Col. Ms. do 
Arq. da 
Prefeitura da 
Bahia 
 
 
 
 
 
 
 
Cf. 
Estatística de 
Nina 
Rodrigues 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1801 
 
1803 
1804 
1805 
1806 
1807 
1808 
1809 
1810 
 
1812 
1813 
1814 
1815 
1816 
1817 
1818 
1819 
1820 
 
1821 
1822 
 
1823 
1824 
 
1825 
1826 
1827 
 
5.250 
 
5.486 
4.214 
4.615 
6.322 
6.361 
5.443 
7.348 
7.725 
 
 
17.307 
 
 
 
 
 
384 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
1.450 
 
3.250 
652 
1.747 
2.717 
2.140 
00 
95 
893 
 
 
20.952 
 
 
 
 
 
17.580 
 
 
6.689 
8.418 
 
1.600 
1.877 
 
4.259 
7.858 
10.186 
 
6.700 
 
8.736 
4.866 
6.362 
9.039 
8.501 
5.443 
7.443 
8.618 
 
 
3.645 
 
 
 
 
 
17.196 
 
 
6.689 
8.418 
 
1.600 
1.877 
 
4.259 
7.858 
10.186 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 10 
 
Cf. 
Estatística de 
Miguel 
Calmon 
 
 
Livros de 
entrada de 
embarcações 
da África 
Arq. Pref. 
Bahia 
 
 
 
Estatística de 
Miguel 
Calmon, in 
Góes 
Calmon, Vida 
Econômico-
Financeira da 
Bahia 
1828 
1829 
1830 
 
 
 
8.127 
12.808 
8.425 
8.127 
12.808 
8.425 
 
 
 
TOTAL 
 
 
70.455 
 
104.032 
 
174.487 
Fonte: VIANNA FILHO, 2008, p. 149-150. 
 
A partir da análise do nome de 102 escravos originários do 
Sudão Central2, Lovejoy (2002, p. 26-27) aponta que 41 (40%) 
tinham nomes muçulmanos; 12 (12%) eram seguramente 
muçulmanos e 04 (4%), provavelmente muçulmanos, o que 
corresponde a cerca de 56% de afro-muçulmanos. 
 
Tabela 04 – Antroponímia e filiação religiosa de escravos centro-sudaneses. 
Nome dos Escravos Número Porcentagem 
Muçulmanos 
Seguramente 
41 
12 
40 
12 
 
2 A amostragem analisada por Lovejoy traz, na verdade, 117 indivíduos, 15 dos quais, 
entretanto, não têm o seu nome registrado, figurando apenas desconhecido na coluna 
reservada para nome. 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 11 
 
muçulmanos 
Talvez muçulmanos 
Cristãos e africanos 
não-muçulmanos 
Somente africanos 
Somente cristãos 
Sub-total 
Sem indicação 
Total 
04 
37 
 
03 
05 
102 
15 
117 
04 
36 
 
03 
05 
100 
--- 
 
Fonte: LOVEJOY, 2002, p. 27. 
 
Segundo Lovejoy (2002, p. 27), 
 
Embora não se saiba, dentre os escravos com nomes africanos 
não-muçulmanos, quantos de fato eram islâmicos; nem quantos, 
dentre detentores de nomes africanos e cristãos, também o 
fossem, é razoável concluir que pelo menos 56% dos centro-
sudaneses eram islamizados. É possível que tal porcentagem fosse 
ainda mais alta. 
 
Escravos de origem não-muçulmana (indicada no registro) 
com nome muçulmano pode indicar conversão posterior à captura 
ou à venda, talvez até mesmo na Bahia, assim como nomes 
africanos não-muçulmanos de escravos originários de regiões 
islamizadas, como Iorubás e Nupes, não excluem a possibilidade 
de que os seus portadores fossem islamizados. 
Para Lovejoy (2002, p. 27), 
 
Apesar desta análise de filiação religiosa de escravos e libertos 
centro-sudaneses ser apenas preliminar, parece que o processo de 
conversão no Sudão Central, resultante da jihad, tinha 
continuidade na Bahia. Nomes muçulmanos eram adscritos a 
escravos de origem não-muçulmana, como “Keuta” [Kyauta], “So-
Allah” [Filho de Alá] e “Meidassara” {Mai Nasara], indicando que 
alguns cativos haviam recebido rudimentos doutrinários 
islâmicos, normalmente oferecidos por ocasião da captura e 
venda. Os nomes africanos não islâmicos na origem incluíam 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 12 
 
escravos que claramente eram de origem Ioruba ou Nupe, sendo 
plausível que alguns deles fossem muçulmanos. 
 
 Observa-se,do exposto, que, a par da presença banto na 
Bahia, cuja contribuição linguística e cultural foi objeto de 
pesquisa em várias áreas, estando fartamente documentada na 
literatura especializada em Antropologia, Linguística e áreas afins 
(LOPES, 2006; PESSOA DE CASTRO, 2009), a escravidão afro-
muçulmana se deu intensamente ao longo de três séculos e seu 
legado linguístico-cultural está preservado em hábitos cotidianos, 
quais o do vestuário e da culinária, objeto deste estudo. 
 Segundo Querino (1928, p. 01), “A cozinha bahiana, como a 
formação ethinica do Brasil, também apresenta a fusão do 
português, do indígena e do africano.” O elemento africano, 
entretanto, concorreria para a excelência da culinária nacional, ao 
introduzir, nesta, ingredientes e temperos novos. 
 No dizer de Querino (1928, p. 03-04), 
 
É notório, pois, que a Bahia encerra a superioridade, a 
excellencia, a primazia, na arte culinaria do paiz, pois que o 
elemento africano, com a sua condimentação requintada de 
exoticos adubos, alterou profundamente as iguarias portuguesas, 
resultando dahi um producto todo nacional, saboroso, agradavel 
ao paladar mais exigente, o que excelle a justificada fama que 
precede a cozinha bahiana. 
 
 Radel (2006, p. 27) afirma serem inverossímeis as 
informações disponíveis acerca da culinária africana do século XVI, 
dado registrarem ingredientes brasileiros introduzidos na África na 
segunda metade daquele século. Assim, a culinária africana de que 
temos notícia não seria propriamente do século XVI, mas do XVII. 
 A atual culinária oeste-africana tem por base a afro-baiana, 
que transpôs o Atlântico na bagagem cultural dos alforriados 
retornados à África-Ocidental (e não podemos esquecer os 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 13 
 
deportados das revoltas malês verificadas em Salvador e arredores 
nas 03 primeiras décadas do século XIX). 
 De acordo com Radel (2006, p. 29), 
 
A atual cozinha africana das costas do ocidente, de onde veio a 
maior leva de escravos, tem base significativa em pratos 
brasileiros, denominação dada aos pratos que no Brasil são 
chamados da cozinha afro-baiana. O preparo destes pratos 
brasileiros se tornou possível com a ida para a África de vários 
ingredientes brasileiros, como o milho, o feijão fradinho, o 
amendoim, a castanha de caju, o jiló, o maxixe, a farinha de 
mandioca, o aipim, a pimenta-de-cheiro, o sal, o açúcar, e alguns 
procedimentos que eles não conheciam como a fritura. Os 
escravos libertos voltaram à África e para lá levaram o caruru feito 
com quiabo, as moquecas de peixe e de crustáceo, a feijoada, o 
mugunzá, a galinha de caçarola, o mocotó e o lombo de porco 
assado. Os últimos três pratos eram de origem portuguesa já 
adaptados ao Brasil e que depois migraram para a cozinha 
sertaneja e para a cozinha africana. 
 
 Querino (1928, p. 04), por sua vez, dá a conhecer a 
contribuição africana para a culinária brasileira, “Fôra o africano o 
introductor do azeite de cheiro, do camarão secco, da pimenta 
malaguêta, do leite de côco e de outros elementos, no preparo das 
variadas refeições domesticas da Bahia.” 
 Embora a presença africana se verifique em diversos estados 
brasileiros, uma culinária brasileira de base africana surgiu 
apenas na Bahia, o que se credita à homogeneidade de origem 
(oeste-africana) dos escravos, que importavam consigo uma base 
culinária simples, mas com um cardápio completo, e que 
praticavam uma religião com traços comuns, o candomblé jeje-
nagô. A culinária afro-baiana estaria ainda diretamente 
relacionada ao culto dos orixás, cujas comidas votivas se 
estenderam às mesas nativas. 
Segundo Radel (2006, p. 29), 
 
Assim surgiu uma cozinha nova, feita para servir inicialmente aos 
escravos nas senzalas, passando para as casas dos capatazes, 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 14 
 
chegando, após subir os degraus da entrada dos sobrados, à mesa 
do amo, do senhor. No século XIX, comiam-se todos os dias os 
pratos, da cozinha nova, nas casas da Cidade do Salvador, no 
Recôncavo e no litoral. No meado do século XX, esta frequência 
baixou para uma ou duas vezes por semana e, hoje, são poucas 
casas que os fazem uma vez por mês ou, em casos especiais, 
como em recepção para visitantes de outros estados. 
 
 E ainda (RADEL, 2006, p. 29), 
 
A cozinha africana derivaria da cozinha dos terreiros do 
candomblé. Os orixás eram homenageados nos banquetes rituais 
exigidos pelo culto e cada orixá tinha a sua própria comida votiva. 
(...) deve ser citado que os brancos aceitaram essas comidas 
votivas e levaram-nas para a Semana Santa, para a festa de São 
Cosme e São Damião, para a festa de Santa Bárbara, quando 
servem caruru, vatapás, efós, feijão fradinho e preto feitos no 
azeite, ochim-chin de galinha, arroz branco, mucunzá, abará, 
acarajé, rapadura, rolete de cana e pedaços de coco seco. Dos 
pratos dos orixás, o da galinha d’Angola, de guiné, tofraco, saqüé, 
capote, não ficou no cardápio da cozinha afro-baiana, migrou para 
a sertaneja e é um dos pratos fortes da cozinha nordestina, onde 
impera, sob a forma de ensopado ou de cabidela, no vale do 
Cariri, no Ceará, e em todo o Piauí. 
 
 Uma terceira justificativa para o desenvolvimento da 
culinária afro-baiana está no cultivo do dendê em solo baiano, 
único local em que a sua produção vingou. 
 Entretanto, hoje a maioria dos pratos desta culinária tão rica 
não é sequer lembrada. Para Radel (2006, p. 28), 
 
No passado [século XIX], eram conhecidos os seguintes pratos: 
abará acaçá, acarajé, abo ambrazô, anduzada, anguzô, arros de 
hauçá, axoxó, badofe, bamba, bobó, caruru, curu, denguê, 
doburu, ebó, ecuru, efó, efun-oguedê, erampaterê, fufu, 
humulucu, ipete, latipá, lelê, moqueca, mungunzá, oguedê, obíbó, 
quibabá, quibebê, quibombo, quimana, quimano, quimbebê, 
quimassã, quitandê, quitute, quizibu, sabongo, uado, vatapá, 
xinxim. 
 
E, em seguida (RADEL, 2006, p. 28), “Alguns deles nem de 
nome se conhece mais. É preciso consultar Costumes africanos no 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 15 
 
Brasil de Manuel Querino para saber que estes pratos existiram e 
saber como eles eram preparados (...).” 
 
Metodologia 
Colheram-se os termos culinários típicos da mesa baiana no 
texto Os Alimentos Puramente Africanos, extraído da obra A Arte 
Culinária na Bahia de Manuel Querino e compilado na Antologia do 
Negro Brasileiro (CARNEIRO, 2005, p. 467-472). 
Consideraram-se termos designativos de pratos, ingredientes 
e temperos; formas sinônimas (a exemplo de feijão-de-cheiro e 
humulucu) e variantes fonéticas (como aluá e aruá). 
Organizou-se o vocabulário por ordenamento alfabético com 
a forma-entrada registrada por Querino. O verbete elaborado para 
este estudo traz datação, ou registro mais antigos de que se tem 
notícia, de acordo com Houaiss (2001); etimologia, segundo Pessoa 
de Castro (2005); acepção textual, isto é, extraída do próprio texto 
de Querino; variantes lexicais, fonéticas ou gráficas documentadas 
seja no texto de Querino seja nos dicionários consultados, além 
dos étimos africanos. 
A seleção dos dicionários brasileiros se deu pela natureza 
dos mesmos, primeiramente dicionários gerais, quais o Dicmaxi 
Michaëlis: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa (MICHAËLIS, 
1998); o Novo Aurélio Século XXI: O Dicionário da Língua Portuguesa 
(FERREIRA, 1999) e o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa 
(HOUAISS; VILLAR, 2001), que têm por objetivo descrever o léxico 
de uma língua, considerando, para tanto, variedades diatópicas 
(regionais), diastráticas (sociais, profissionais inclusive), 
diacrônicas (históricas) e diafásicas (mais ou menos formais). Em 
seguida, verificou-se o registro do vocabulário estudado em 
produtos lexicográficos etimológicos, a saber o Dicionário 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS:AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 16 
 
Etimológico Resumido (NASCENTES, 1966) e o Dicionário 
Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa (CUNHA, 1982). 
Por fim, foram buscados, ainda, nas obras Enciclopédia Brasileira 
da Diáspora Africana (LOPES, 2004) e Falares Africanos na Bahia: 
um vocabulário afro-brasileiro (PESSOA DE CASTRO, 2005), pela 
descrição que fazem, respectivamente, da presença africana no 
Brasil e do seu legado linguístico. 
As obras supracitadas são identificadas, neste estudo, pelas 
siglas seguintes: 
 
DEA: Dicionário Eletrônico Aurélio 
DEH: Dicionário Eletrônico Houaiss 
DELP: Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua 
Portuguesa 
DEM: Dicionário Eletrônico Michaëlis 
DER: Dicionário Etimológico Resumido 
EBDA:Enciclopédia Brasileira da Diáspora Africana 
FABA: Falares Africanos na Bahia 
 
 Na análise dos dados coletados, inserida na mesma seção em 
que estes são apresentados, correlacionam-se, por um lado, 
etimologia dos termos da culinária afro-baiana, etnias e línguas 
africanas presentes na Bahia e, por outro lado, a data mais antiga 
do registro dos referidos termos no português brasileiro e a história 
externa da língua, notadamente a sócio-história da presença 
africana na Bahia. Trata-se, portanto, de compreender a herança 
cultural africana nesta região, a partir das informações 
lexicográficas que diferentes obras viabilizam. 
 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 17 
 
A terminologia da culinária afro-baiana e a herança africana na 
Bahia 
 
Abará – 1871. (kwa). Bolinhos de massa de feijão-fradinho 
temperada com cebola, sal e azeite-de-cheiro envoltos em folhas de 
bananeira e cozidos em banho-maria. Var. abalá. Fon. ablá. 
Aberém – 1853. (kwa). 1. Bolas de massa de milho envoltas em 
folhas secas de bananeira atadas com fibras tiradas do tronco da 
referida árvore. O prato é servido com caruru ou com mel de 
abelha. 2. Aberém preparado com açúcar e ingerido sem 
acompanhamento. 3. Dissolvido o aberém em água com açúcar, 
tem-se bebida refrigerante. Var. abarém (1899). Fon. Àblohlèn. 
Acaçá – 1871. (kwa). Bolinho de massa de milho cozida envolto em 
folhas de bananeira. Fon. Akasá, acasã. 
Acarajé – 1899. (kwa). Bolinho de massa de feijão fradinho, 
temperada com cebola e sal ralados, frito no azeite de dendê e 
acompanhado de molho a base de pimenta-malagueta seca, cebola 
e camarões fritos no azeite de dendê. Fon. àklajε. Ior. Àkàrà jε. Var. 
carajé. 
Ado – (kwa). Milho torrado reduzido a pó, temperado com azeite-
de-cheiro, a que se pode acrescentar mel de abelha. Var. Adum 
(séc. XIX); uado; dundundum. 3 
Aluá – 1578. (banto/hauçá). Água na qual se fermenta o milho por 
03 dias, em que, coada, acrescem-se pedaços de rapadura, os 
quais, diluídos, tornam a bebida um refrigerante. O milho pode ser 
substituído pela casca do abacaxi. Var. Aruá; ualuá. 
Kik./kimb./umb. Wala, walwa. Hau. àlewà. 
Amori – séc. XX. Mesmo que latipá. Origem obscura. 
 
3 Pessoa de Castro (2005, p. 141, 142) distingue os vocábulos ado e adum. O primeiro 
designa prato votivo e prato da culinária afro-baiana (< ior. Àádun); o segundo, qualifica-
os enquanto ‘doces’ ou ‘saborosos’ (ior. adùn). 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 18 
 
Arroz-de-hauçá – Arroz cozido em água sem sal encorpado com 
pó-de-arroz, consumido com molho elaborado com pimenta-
malagueta seca, cebola e camarões ralados e cozidos em azeite-de-
cheiro, a que se podia acrescer pequenos pedaços de charque 
fritos.4 Var. arroz-de-auçá; arroz-de-uçá. 
Aruá – (banto/hauçá). Mesmo que aluá. 
Ataró – (kwa). Condimento também conhecido como pimenta da 
costa. Var. atarê, ataré, atacum. Ior. ataare, atayε’.5 
Azeite-de-cheiro – Mesmo que azeite-de-dendê. 
Azeite-de-dendê – Óleo obtido do fruto do dendezeiro de uso 
frequente na culinária afro-brasileira. Var. azeite-de-cheiro; dendê 
(1836, do banto, especificamente do kik./kimb./umbundo 
(o)ndende). 
Bejerecum – (kwa). Mesmo que pejerecum. 
Bolas de Inhame – Bolas grandes de inhame lavado com limão, 
cozido no sal e pisado em pilão, servido com caruru ou efó.6 
Bobó de Inhame – Inhame cortado em pequenos pedaços cozido 
com água e temperado com o efó.7 
Caruru – 1836. (banto). Massa de quiabo, mostarda ou taioba cujo 
preparo é semelhante ao do efó, a que se acrescem garoupa, peixe 
assado ou charque e um pouco de água. É ingerido com acaçá ou 
farinha de mandioca. Var. Calulu, cariru. Kik./kimb. kalulu/kalalu. 
Dengué – (banto/kwa). Milho branco cozido acrescido açúcar. Kik. 
Kimb. (di)lenge. Ior. dènguε. 
 
4 Segundo Lopes (2004, p. 74), há quem não associe o termo hauçá à etnia oeste-africana, 
creditando-o antes a vocábulo iorubá designativo da pimenta-malagueta usado por nagôs 
baianos (ior. wúsà ‘fruto semelhante à noz’). 
5 Em verdade, a forma atarê é a que se encontra como entrada dos verbetes nos produtos 
lexicográficos consultados, nenhum dos quais registra a forma documentada por 
Querino. 
6 O DEH aponta, para inhame, etimologia africana de origem controversa, citando Lopes, 
segundo o qual nyam em línguas não-bantas é raiz do verbo ‘comer’, embora haja quem a 
considere raiz banta. O DEA traz étimo ior. iyã ou mandinga iyambi. 
7 De acordo com o DEH, bobó tem o registro mais antigo em 1899 e origem jeje no étimo 
bo’bo ‘comida de origem africana feita com feijão’. Segundo Pessoa de Castro (2005, p. 
176), tem étimo fon abƆbƆ. 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 19 
 
Ebó8 – (kwa). Preparado com milho branco pilado e cozido a que se 
adicionam azeite-de-cheiro e ori. Pode ser preparado, ainda, a 
partir da mistura de milho e feijão-fradinho torrado fervidos com 
um pouco de água e a que se juntam sal e azeite-de-cheiro. Ior. 
ègbo. 
Ecuru – (kwa). Farofa de massa de feijão fradinho cozida em 
banho-maria e diluída em mel de abelha ou em azeite-de-cheiro 
com sal. Var. cuduru. Ior. èkuru. 
Efó – 1899. (kwa). Folha de língua de vaga, mostarda ou taioba 
tornada massa mediante fervura em pouca água, depois que esta é 
escoada e a folha, espremida, a que se acrescem pimenta-
malagueta seca, cebola, sal e camarões ralados e azeite-de-cheiro. 
Pode ser preparado também com peixe assado ou garoupa. Var. 
caruru-de-folha. Ior. ε’fƆ’. 
Efun-Oguedê – (kwa). Farinha de banana de São Tomé, que, ainda 
verde, é fatiada, seca ao sol e, ao cabo de dias, pisada em pilão e 
passada em peneira. Ior. guεdε, ‘banana’. 
Egussi – (kwa). Pevide de abóbora ou melancia empregado como 
condimento. Fon gùsí/Ior. εgusí. 
Éran-patere – séc. XX. (kwa). Naco de carne verde fresca, salgada e 
frita no azeite-de-cheiro. Var. arampatere, erampatere, erampaterê, 
arampaterê, paterê. Ior. eran kpaterèé ‘pedaços de carne destinados 
à venda`. 
Feijão-de-azeite – Mesmo que humuculu.9 
Humuculu – (kwa). Feijão-fradinho temperado com cebola, sal, 
camarões ralados e azeite-de-cheiro cozidos. Var. omolucum, 
omolucu, omulucu, umulucu, feijão-de-azeite. Fon/Ior. likún. 
 
8 Pessoa de Castro (2005, p. 225) distingue ebó de ebô, pertencendo apenas este último 
ao campo semântico da culinária. Não constituem as formas citadas, portanto, variantes 
lexicais. 
9 As obras consultadas não registram essa unidade fraseológica (DEA, DEH, DEM, EBDA, 
FABA). 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 20 
 
Ierê – (kwa). Semente utilizada para condimentar caruru, peixes e 
galinhas. Ior. iyèré. 
Ipete – (kwa). Inhame fervido até perder a consistência, temperado 
com azeite-de-cheiro, camarões, cebola e pimenta ralados. Var. 
apeté, peté, ipeté. Ior. ikpètε’. 
Iru – 1587. (kwa). Fava usada como condimento. Ior. irú. 
Latipá – séc. XX. (kwa).Folhas inteiras de mostardeira fervidas 
temperadas com efó e fritas no azeite-de-cheiro. Ior. ìšakpá. 
Massa – 1. Pequenas bolas de arroz cozido e ralado envolvidas em 
polvilho de arroz. Os afro-muçulmanos fritavam as bolas de arroz 
no azeite-de-cheiro ou no mel de abelha e consumia o prato em 
cerimônias religiosas. 2. Dissolvidas as bolas de arroz em água 
com açúcar, obtém-se bebida refrigerante. 
Oguedê – (kwa). Banana da terra frita no azeite-de-dendê. Ior. 
Ɔ’gε’dε’. 
Olubó – (kwa). Pirão obtido da mistura de farinha da raiz de 
mandioca com água fervente. Fon. libƆ’/Ior. èlùbƆ’. 
Ori – séc. XX. (kwa). Gordura obtida de fruto africano que na 
culinária substitui o azeite-de-cheiro. Ior. ori. 10 
Pejerecum – (kwa). Fava usada para temperar o caruru. Var. 
Bejerecum, pijiricum. Fon/Ior. kpejerecun. 
Pimenta da costa – 1899. Mesmo que ataró. 
Xinxin – séc. XX. (kwa). Galinha cortada em pequenos pedaços, 
cozida com sal, alho e cebola ralados, a que se acrescem camarões 
secos em quantidade, sal, cebola, sementes ou pevides de abóbora 
ou melancia ralados e azeite-de-cheiro. Var. Oxinxim. Ior. ‘Ɔšinšin. 
 
 
10 O DEH traz o ior. ori ‘manteiga de emi’ como étimo de ori. O DEA também indica origem 
africana para o termo, sem, entretanto, identificar a língua ou o étimo. O FABA apresenta 
a acepção de ‘cabeça’ para o vocábulo, sem qualquer relação com o termo culinário. 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 21 
 
A análise dos dados mostra que, dos 36 itens lexicais 
levantados, 28 ou 77,8% do total são de origem africana (abará, 
aberém, acaçá, acarajé, ado, aluá, aruá, ataró, bejerecum, bobó de 
inhame, caruru, dengue, ebó, ecuru, efó, efun-oguedê, egussi, éran-
patere, humulucu, ierê, ipete, iru, latipá, oguedê, olubó, ori, 
pejerecum e xinxim); 03 ou 8,3% são híbridos português-língua 
africana (arroz-de-hauçá, azeite de dendê e bolas de inhame); 
outros 04 itens ou 11,1% são formas portuguesas (azeite de cheiro, 
feijão de azeite, massa e pimenta da costa) e apenas 01 vocábulo 
ou 2,8% do total (amori) tem origem incerta. 
Dentre os 28 africanismos, 24 itens ou 85,7% do total são 
originados em língua da família kwa ou no hauçá (abará, aberém, 
acaçá, acarajé, ado, ataró, bejerecum, bobó de inhame, ebó, ecuru, 
efó, efun-oguedê, egussi, éran-patere, humulucu, ierê, ipete, iru, 
latipá, oguedê, olubó, ori, pejerecum, xinxim); 01 termo ou 3,6% do 
total resulta da evolução de étimo banto (caruru) e 03 formas ou 
10,7% delas têm origem simultaneamente creditada a língua(s) 
banto(s), kwa(s) ou ao hauçá (aluá, aruá, dengué). 
Dentre as línguas kwa, citam-se o iorubá 21 vezes (acarajé, 
ataró, bejerecum, bobó, dengué, ebó, ecuru, efó, efun-oguedê, egussi, 
éran-petere, homulucu, ierê, ipete, iru, latipá, oguedê, olubó, ori, 
pejerecum, xinxim) e o fon 10 vezes (abará, aberém, acaçá, acarajé, 
bejerecum, bobó, egussi, humulucu, olubó, pejerecum). Ado traz 
simplesmente origem kwa, sem identificação de étimo. 
No hauçá, outra língua oeste-africana, pertencente, 
entretanto, à família afro-asiática, na classificação de Greenberg 
(apud Pessoa de Castro, 2005, p. 27), originam-se 02 variantes de 
um mesmo item lexical (aluá ~ aruá). 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 22 
 
Dentre as línguas bantas, citam-se o quicongo e o 
quimbundo 04 vezes (aluá ~ aruá, caruru e dengué), a par do 
umbundo, 02 vezes (aluá ~ aruá). 
Quanto à datação, observa-se que a introdução do maior 
número de termos se deu efetivamente no século XIX, quando 08 
vocábulos passaram a integrar o léxico do português brasileiro 
(abará, aberém, acaçá, acarajé, dendê, caruru, efó, pimenta da 
costa), o que corresponde a 53,4% dos itens datados no DEH. No 
século XX deu-se a aquisição de 05 formas (amori, éran-patere, 
latipá, ori, xinxim) ou 33,3% destas, verificando-se no século XVI a 
introdução de outros 02 itens (aluá e iru) ou 13,3% dos datados. 
A forte presença sudanesa em Salvador no século XIX ratifica 
a origem oeste-africana da terminologia da culinária africana na 
Bahia. A importação lexical no século seguinte pode indicar 
perpetuidade da referida cozinha na região, ao apontar a 
continuidade da sua prática. Embora a introdução em massa de 
iorubás no Brasil tenha se dado nos século XVIII e XIX, o DEH 
indica antigo registro do termo iru na língua portuguesa já no 
século XVI, equivalente, entretanto, ao ciclo da Guiné (Pessoa de 
Castro, 2005, p. 45). Caberia, neste caso, uma investigação da 
sócio-história do termo, para elucidar tal correlação de origem e 
datação. 
 
Considerações finais 
 
Estudo teve por objetivo correlacionar a etimologia do 
vocabulário do campo semântico da culinária afro-baiana às etnias 
e línguas introduzidas na Bahia escravagista, considerando, ainda, 
a datação dos termos, indicativa da sua importação pelo português 
brasileiro. Considerou, para tanto, o contexto sócio-histórico da 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 23 
 
importação de mão-de-obra escrava nos séculos em que, segundo a 
lexicografia nacional, deu-se a aquisição dos africanismos 
culinários, e a etimologia, com a identificação das línguas-fonte 
deste vocabulário, na perspectiva da sociolinguística do contato de 
línguas, que compreende a introdução de estrangeirismos em 
qualquer sistema linguístico como natural na designação de 
referentes importados. 
No que concerne à questão norteadora desta breve 
investigação, se a etimologia dos termos da culinária afro-baiana é 
efetivamente indicativa da origem dos pratos que designa, podemos 
dizer que sim, uma vez que reflete a intensa interação da Bahia 
com o oeste africano e, mesmo que alguns ingredientes e temperos 
sejam brasileiros, foram os escravos que os (re)introduziram nas 
mesas baianas nas diversas iguarias com que enriqueceram a 
culinária nacional. 
A hipótese testada, de que a culinária afro-baiana é expressa 
por línguas do Oeste Africano, sobretudo o iorubá, por termos 
introduzidos no português brasileiro no século XIX, é corroborada 
pela etimologia e pela datação registradas na lexicografia nacional, 
uma vez que a maioria dos africanismos levantados se origina em 
língua da família kwa (iorubá e/ou fon) ou no hauçá (27 de 28 
africanismos ou 96,4% destes, considerando-se as formas 
simultaneamente creditadas a línguas bantas e oeste-africanas). Já 
a análise da datação apontou introdução dos termos da culinária 
afro-baiana no português brasileiro no século XIX (08 vocábulos), 
no século seguinte (05 formas) e 300 anos antes (02 itens datados 
como integrados no século XVI). 
Seria interessante analisar o conteúdo semântico destes 
termos, comparando a descrição do seu preparo feita por Manuel 
Querino e em tratados modernos de culinária afro-baiana, para 
 NARRATIVAS E IDENTIDADES CULTURAIS: AFRODECENDÊNCIA, AFRICANIDADE E INDÍGENA 24 
 
observar fenômenos de mudança semântica, a exemplo da 
expansão semântica, uma vez que a descrição de alguns pratos em 
Manuel Querino não corresponde ao conhecimento do baiano que 
frequenta carurus oferecidos em homenagem a aniversariantes ou 
às conquistas da vida cotidiana (ingresso na universidade, 
emprego, etc.) ou que regularmente recorre aos tabuleiros das 
baianas para ali abandonar a fome. 
 Também seria adequado investigar a culinária oeste-
africana, para conhecer a existência e a evolução dos pratos que a 
compõem, as convergências com a culinária afro-baiana e mesmo a 
finalidade de alguns ingredientes. Por exemplo, o emprego da 
farinha tem por objetivo o sustento do consumidor ou “secar” a 
comida, de modo a permitir o seu consumo sem o concurso de 
talheres. 
 A cultura africana está mais arraigada em nosso cotidiano do 
que em geral nos damos conta e a sua retomada em pesquisas 
linguísticas,antropológicas, históricas ou sociais permite reavivá-la 
em nossa consciência, possibilitando melhor identificar quem 
somos nós, os brasileiros. 
 
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DICMAXI Michaëlis Português: Moderno Dicionário da Língua 
Portuguesa, Versão 1.1. Amigo do Mouse Software Ltda., set. 2000. 
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