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POSSE NA ACADEMIA MINEIRA ~ ITAÚNA DÉCADAS

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POSSE NA ACADEMIA MINEIRA
 13:30 CHARLES AQUINO DORNAS NO COMMENTS 
 João Dornas Filho
Discurso de recepção 1948
Pronunciado ao tomar possa na Academia Mineira de Letras (AML)
substituindo Carlindo Lelis Cadeira n°12 – Patrono: Alvarenga Peixoto
Senhores Acadêmicos.
Aqui estou para integrar-me na fortuna do vosso convívio, as mãos vazias de merecimento, mas repleta a alma do
desejo de ser, entre os menores, o mais diligente dos confrades. Venho de uma geração atormentada pela insânia dos
homens do meu século, e trazendo na alma o ressaibo do sofrimento e o calor da revolta. A guerra de 1914,
dividindo os homens pelo ódio e destruindo as possiblidades sociais dessa geração, plantou lhe no espírito a
esperança de recuperar essas possiblidades pela transformação radical dos quadros sociais políticos e estéticos que, a
nosso ver, eram os responsáveis pela hecatombe.
O movimento modernista que sacudiu todas as camadas espirituais do mundo pós-guerra, tem a sua raiz nessa
esperança de recuperação e ajustamento. Por ela, a minha geração se bateu com bravura e convicção sem limites. O
calor da refrega e a certeza da justiça de uma causa tão bela, justificam nos moços que a lidaram o excesso em
incorreram, excesso que não invalida a grandeza da sua missão e do papel que desempenhou na história espiritual
desta primeira metade do século XX.
Fui um dos mais severos acusadores no julgamento da geração anterior, porque estava convencido da sua
incapacidade em guardar o patrimônio mental que deveria nos ser transferido, senão aumentado, pelo menos intacto
na grandeza que o século XIX lhe fundira. Daí o meu desdém — o desdém da inexperiência e da revolta contra a
14/05/2024, 14:03 POSSE NA ACADEMIA MINEIRA ~ ITAÚNA DÉCADAS
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vossa Casa, cujo espírito, fundido pelo humanitarismo do grande século anterior, representava aos meus olhos
inexpertos um estado de coisas que era urgente modificar.
Os anos, a experiência dos homens e das coisas que é o primeiro generoso dos cabelos brancos, mostraram-me afinal
que fui excessivo e leviano. As causas são mais complexas, são mais profundas, são mais rebeldes à terapêutica
social do que supunham a ignorância e o ódio da minha geração.
Mas, é certo também que não foi perdido o vigor que imprimimos à nossa luta. Dela nasceu uma consciência mais
viva da supremacia do espírito humano — e tão viva, que a maior revivescência medieval que já subjugou os
homens em todos os séculos da História, foi esmagada implacavelmente pelas forças imponderáveis do espírito na
mais sangrenta batalha que sulca de luz os caminhos da Humanidade. Só está benemerência é bastante para situar o
movimento modernista, principalmente no Brasil, no mais destacado lugar da história social e política do século XX.
Feita esta ligeira explicação de penitência, proferida com a mesma sinceridade com que manejei o florete do
sarcasmo contra as instituições acadêmicas da minha terra, permiti, senhores, que inicie a minha oração, cumprindo
o dever estatutário de esboçar o elogio crítico do patrono da cadeira número 12, o poeta inconfidente Inácio José de
Alvarenga Peixoto, que me coube ocupar pela morte de outra expressiva figura de homem de letras que foi Carlinho
Lélis, seu fundador.
Quando em meados do século XVIII foram dadas à luz as duas primeiras manifestações literárias de Minas —
“Triunfo Eucarístico” (1734), escrito por Simão Ferreira Machado, e “Áureo Trono Episcopal” (1749), de autor
anônimo, ambas de valor literário apenas cronológico e histórico, já a conquista do nosso território havia se firmado
pela criação das vilas de Sabará, Vila Rica e Mariana (1711) e o grande rush do ouro havia cunhado na cera plástica
do indígena os caracteres psicológicos do negro paulista de origem lusa, fecundado o terreno de que nasceria a nossa
literatura popular consubstanciada no folclore. Ê o que podemos chamar com propriedade o início da nossa criação
literária, apesar de oral e tradicional como a dos rapsodos medievais.
Portanto, quando, ao descambar o século, surge a Escola Mineira, uma literatura popular já extinta por estes grotões
auríferos, sendo aquela apenas a manifestação erudita e nem sempre vernácula da alma do nosso povo. Por este
tempo já o sentido de pátria havia provocado todas as rebeliões dos mineiros como a dos Emboabas e a de Felipe dos
Santos, para citar as mais significativas, e a maioria dos bardos da América Mineira já eram brasileiros ilustres pela
pecúnia e pelas letras. Vila Rica, no dizer de Sílvio Romero, “era então no Brasil uma espécie de Weimar. Pequena
cidade de província, reunia em si, a um só tempo, homens como Cláudio Manuel da Costa, Tomaz Antônio Gonzaga,
Inácio José de Alvarenga Peixoto, Diogo Pereira de Vasconcelos, Luiz Vieira da Silva Mascarenhas, Francisco
Gregório Pires Monteiro, as maiores ilustrações brasileiras da época, residentes na Colônia”.
É o velho axioma sociológico do tropismo econômico, pois nas Minas Gerais estava o centro de interesses da Coroa
com o aparecimento do ouro e do diamante ... Inácio José de Alvarenga Peixoto, patrono da acadêmica que me
apontou o destino, foi um dos inconfidentes e um desses espíritos da Cumiada Intelectual da Weimar brasileira [...].
Senhores acadêmicos. Já vos disse que venho de uma geração tangida pelo infortúnio do ódio e do sofrimento, e que
teve a rebeldia como solução para os seus problemas morais. É isto que explica, em estética, o aparecimento do
modernismo, O modernismo foi a maneira pela qual rompemos com um mundo que supúnhamos apodrecido,
simplesmente porque não soubera resolver os problemas que lhe foram apresentados. Éramos muito moços e
ardentes para compreendermos a complexidade desses problemas, e daí a revolta, o sarcasmo, a ironia, a impiedade
— que foram o selo dessa geração torturada.
Os anos, os sofrimentos que se gravaram, uma compreensão mais justa das fraquezas e uma percepção mais humana
das reservas de energia e nobreza que palpitam no fundo de todas as almas — nos deram a consciência do nosso
papel no jogo de todo esse drama formidável. Não passávamos de um elo na imensa cadeia das gerações ...
Transmitimos a nossa mensagem, que não podia deixar de ser escarninha revolta e trouxemos a nossa colaboração de
esperança e de fé na construção de um mundo que virá certamente — mais legal e mais justo, e, portanto, mais belo
e amável ...
E a Academia Mineira de Letras, recebendo em seu seio mais de um desses rebeldes que a desdenhavam, nos dá a
imorredoura lição da perenidade do espírito no tumulto das paixões e na inanidade dos punhos crispados pelo ódio ...
14/05/2024, 14:03 POSSE NA ACADEMIA MINEIRA ~ ITAÚNA DÉCADAS
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MEMORIAL JOÃO DORNAS 
Referências:
Pesquisa e organização para o blog: Charles Aquino
Texto: João Dornas Filho (In memoriam)
Fonte impressa: FILHO, João Dornas. Discurso derecepção (Academia Mineira de Letras), Ed. Mantiqueira, 1952,
impressa oficial de Minas Gerais, BH, p.7-12,56-57.
Acervo: “Fotografia tirada na noite de 16 de novembro de 1948, ao tomar posse na cadeira de nº12 da Academia
Mineira de Letras” (informações no verso da imagem). Arquivo Público Mineiro. Disponível
em: http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=34008
AML - Academia Mineira de Letras: https://academiamineiradeletras.org.br/cadeiras/
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https://sites.google.com/view/memorialjoaodornas/in%C3%ADcio
http://www.siaapm.cultura.mg.gov.br/modules/fotografico_docs/photo.php?lid=34008
https://academiamineiradeletras.org.br/cadeiras/

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