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Disciplina: Geotecnia Experimental (CIV-2553) Prof. Vitor Nascimento Aguiar aguiar@puc-rio.br Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Departamento de Engenharia Civil e Ambiental Curso de Pós-graduação em Engenharia Civil Aula 5: Atrito no interior da massa de solo e Critério de ruptura de Mohr Coulomb 1 21- O fenômeno do atrito entre corpos sólidos Leis de atrito de Coulomb (1781) 1ª Lei do atrito: “A força tangencial necessária a vencer o atrito entre dois corpos sólidos é independente da área de contato entre eles.” Ver (Lambe & Whitman, 1969), capítulo 2 2ª Lei do atrito: 3Leis de atrito de Coulomb (1781) “A força tangencial necessária a vencer o atrito entre dois corpos sólidos é proporcional à força normal entre eles.” Matematicamente, as leis de Coulomb são traduzidas como: T � f N , onde: T: força tangencial necessária para promover o movimento relativo entre dois corpos sólidos N: força normal entre os corpos sólidos f: coeficiente de proporcionalidade f � T N 4 Visão microscópica do atrito segundo Bowden & Tabor (1950) Olhando em um microscópio, mesmo a mais polida das superfícies apresentam ainda várias irregularidades. Quando em contato tais superfícies se tocam através apenas do topo de algumas irregularidades. A área real de contato é apenas uma fração muito pequena da área de contato aparente. Ocorre uma grande concentração de tensões nos pontos de contato, ainda que a força normal seja relativamente pequena. Tal concentração provoca o escoamento do material nos pontos de contato, formando a chamada “solda fria” (Bowden & Tabor, 1950). Levando-se em consideração que a tensão de escoamento (σy) para um determinado material é constante, e que em cada ponto de contato a resultante de forças é vertical (o que é uma hipótese), o equilíbrio de forças na direção vertical leva a: 5 N � � σ� A �� � Onde: n: número de contatos σy: tensão de escoamento Ai: área do contato i Como σy é constante: N � σ� � A �� � Assim, a área de contato real é proporcional à força normal N. N: força normal Admitindo-se que a resistência ao cisalhamento por unidade de área vale (r), então a força externa T necessária para romper os contatos vale: T � r � A �� � E o coeficiente de atrito (f) vale: f � T N f � r σ� Hipótese utilizada por Terzaghi (1925) no livro pioneiro de Mecânica dos Solos “Erdbaumechanik”. 6Abordagem macroscópica de Taylor (1948) N: força vertical total agindo sobre o corpo (incluindo o seu peso próprio). R: força que a superfície faz no bloco. Bloco em repouso sobre uma superfície Essas forças verticais, tornam disponíveis uma força Tf , sendo que: T� � N tan ∅ � f N f é o coeficiente de atrito e φ é o ângulo de atrito. Ambos são características dos materiais em contato e, para a maioria dos materiais, independe do valor de N. f � tan ∅ A força Tf não é chamada a agir enquanto não for aplicada uma força horizontal T. TfTf R = N 7 (A) (B) (C) (D) Situação (A): como não há força horizontal aplicada, não há mobilização da força de atrito. Situação (B): uma pequena força horizontal T’ é aplicada ao corpo. A resultante entre N e T’ é a força P’. O ângulo θ entre P’ e N é chamado de ângulo de obliquidade da resultante do sistema de forças. Como T’ < Tf (θ < φ), então não há escorregamento. Situações (C e D): uma força horizontal T é aplicada ao corpo. Como T = Tf (θ = φ) , toda a força de atrito é mobilizada e o escorregamento é iminente. θ : ângulo que a resultante do sistema de forças faz com a normal à superfície de contato (A) (B) (C) (D) 8 Se a força normal (N) ou o ângulo de atrito (φ) for zero, não há força de atrito disponível. Conclui-se que: Se o ângulo de obliquidade da resultante do sistema de forças (θ) for menor que o ângulo de atrito (φ), somente uma parcela da força de atrito disponível é chamada a agir e não há perigo de deslizamento. Quando o ângulo de obliquidade (θ) for igual a φ, todo o atrito estará mobilizado e o escorregamento é iminente. O critério de escorregamento é dado por uma obliquidade igual ao ângulo de atrito. 92- Atrito interno em uma massa de solo Um dado estado de tensões qualquer na massa de solo (mesmo o hidrostático) provoca o aparecimento de forças de contato normais (N) e cisalhantes (T) entre os grãos. Forças de contato provocam deformações elásticas e plásticas nos grãos individualmente (principalmente nas regiões de contato), podendo eventualmente ocorrer quebra de grãos. Em alguns pontos de contato, as forças cisalhantes T podem superar a resistência por atrito dado por N tan(φµ), onde φµ é o ângulo de atrito mineral-mineral, provocando o movimento relativo entre os grãos (deslizamento e rolamento). A deformação da massa de elemento de solo como um todo será dado, então por: Deformação do elemento de solo = Deformação dos grãos + quebra dos grãos + movimento relativo entre os grãos (de longe o mais importante) A depender do estado de tensões imposto ao elemento de solo, podem ocorrer a formação de zonas bem definidas dentro da massa, com a tendência de se deslocarem, umas em relação as outras. 1010 A resistência ao cisalhamento ao longo de planos no interior da massa de solo é análogo ao deslizamento entre corpos rígidos. Mas, no caso dos solos, tal resistência ao cisalhamento depende da tensão normal efetiva (σ’) atuante no plano potencial de deslizamento e do ângulo do atrito interno do solo (φ’). Ângulo de atrito interno do solo (φ’) Propriedade do conjunto de grãos Ângulo de atrito mineral-mineral (φµ) Propriedade do mineral que forma os grãos A resistência ao cisalhamento nos solos, embora análoga a resistência ao cisalhamento entre corpos sólidos, é um pouco mais complexa. 1111 Nas areias, por exemplo: Resistência ao cisalhamento ou o ângulo de atrito interno (φ’) é composto por: Atrito por deslizamento e rolamento entre os grãos Entrosamento ou travamento (“interlocking”) O ângulo de atrito interno (φ’) assume valores que, mesmo para uma determinada areia, variam significativamente com o estado de compacidade das areias, afetando principalmente o “interlocking”. O ângulo de atrito mineral-mineral (φµ) do quartzo é da ordem de 26º. O ângulo de atrito (φ’) das areias é, em geral, superior a 26º. 12123 - Resistência ao cisalhamento dos solos A ruptura dos solos é quase sempre por cisalhamento. As tensões cisalhantes (macroscópicas) impostas por um estado de tensões aplicado provocam deformações cisalhantes que, vão mobilizando resistência por atrito entre os grãos (rolamento e deslizamento + interlocking). A resistência ao cisalhamento (s) é máxima tensão por cisalhamento (τmáx) que um solo é capaz de suportar no plano de ruptura. A ruptura por cisalhamento ocorre quando o solo passa a deformar-se sem acréscimos de tensões cisalhantes. Os materiais rompem por cisalhamento ou separação. Diz-se que um solo encontra-se em um estado de ruptura quando: 1313 Martins (1992): (a) Em um ensaio com velocidade deformação controlada (constante): dq dε� ≤ 0 (b) Em um ensaio com tensão controlada: d�ε� dt� ≥ 0 Para um dado q aplicado constante (q = cte): e dε� dt > 0 14144 – Critério de ruptura de Mohr-Coulomb Critérios de ruptura são formulações que procuram refletir as condições em que ocorre a ruptura do material (Sousa Pinto, 2002). Critério de ruptura Mohr para um material qualquer Não há ruptura enquanto os círculos se encontrarem no interior de uma região do plano τ x σ, delimitada por uma curva chamada de envoltória, relativos a estados de ruptura observados experimentalmente para o material. A ruptura ocorre quando o círculo de maior diâmetro (σ1 - σ3) encosta na envoltória. σ2 não exerce nenhuma influência no critério de ruptura Mohr. O plano de ruptura é sempre paralelo à direção de σ2. 1515Cada material possui a sua própria envoltória de resistência, sendo sua determinação feita por ensaios de laboratório. Se umdado par (σ, τ) que atua em um dado plano do material provoca a ruptura então o mesmo ocorrerá com (σ, - τ). Portanto existem duas envoltórias de Mohr, simétricas em relação ao eixo σ. Se o estado de tensões em um ponto deste material for dado pelo círculo de Mohr 1, não há ruptura em nenhum plano. Se o estado de e tensões em um ponto deste material for dado pelo círculo de Mohr 2, há ruptura no plano onde o par (σ,τ) é o ponto G. Não é possível aplicar o estado de tensões dado pelo círculo de Mohr 3. τ B σ AF O G M C N E G' M' C' N' E' envoltória de resistência de Mohr 1 2 3 1616 Quando a envoltória de Mohr puder ser representada por uma reta ela é chamada de Mohr-Coulomb, pois combina o critério de ruptura de Mohr com a 2ª lei de atrito de Coulomb, isto é: Admite-se que o melhor critério que representa a ruptura dos solos é o critério de Mohr-Coulomb. τ � f σ Sendo f o coeficiente de proporcionalidade ou coeficiente de atrito (coeficiente angular da reta). De acordo com a segunda parte do princípio das tensões efetivas: “Todos os efeitos mensuráveis oriundos da variação do estado de tensões, tais como compressão, distorção e variação da resistência ao cisalhamento, são devidos exclusivamente à variação do estado de tensões efetivas.” Quem comanda o comportamento dos solos são as tensões efetivas. Portanto, as análises que ligam os efeitos (deformações e ruptura) às causas (variações dos estados de tensões) devem ser feitas em termos de tensões efetivas, ou seja, usando-se o círculo de Mohr das tensões efetivas. 1717 Logo, a envoltória de Mohr-Coloumb é escrita em termos de tensões efetivas. τ�� � σ��� tan ∅� + c� f: failure c’: pode ser coesão verdadeira (cimentação entre os grãos) ou meramente o coeficiente linear fruto do ajuste (sem significado físico), chamado de intercepto de coesão. s � τ�� Resistência ao cisalhamento sob σ’ = 0 Em um ponto de uma massa de solo, as tensões normal efetiva (σ’) e cisalhante (τ) em um dado plano cujo vetor normal faz um ângulo α com a direção principal maior, são dadas por: 1818 σ� � σ � + σ#� 2 + σ � − σ#� 2 cos 2α e τ � σ � − σ#� 2 sen 2α Alternativamente, em qualquer plano, a tensão cisalhante τ pode ser expressa por: τ � σ� tan θ Onde θ é o ângulo de obliquidade. τ σ'3 σ'σ'1 φ' θA θB θC 2α C B A envoltória de resistência 1919A obliquidade representa o atrito mobilizado. A obliquidade varia de plano pra plano atingindo o seu máximo no ponto C. Admitindo-se um solo sem coesão verdadeira ou intercepto coesivo, equação da envoltória de resistência é expressa por: τ � σ� tan ∅� φ’: ângulo de atrito interno do solo que representa o ângulo de obliquidade limite. Neste caso, mesmo a obliquidade máxima θc é menor que a obliquidade máxima limite (φ’). Assim, não há perigo de deslizamento em nenhum plano no ponto representado por este estado de tensões. τ σ'3 σ'σ'1 φ' θA θB θC 2α C B A envoltória de resistência Só haverá ruptura por cisalhamento quando a obliquidade máxima do círculo de Mohr for igual à obliquidade máxima limite, ou seja, quando o círculo de Mohr tangenciar a envoltória de ruptura de Mohr-Coulomb. 2020 A inclinação dos planos de ruptura α é dada por: α � 45° + ∅� 2 τ σ'3 σ'1 α φ' plano de ruptura σ'1 σ'3 α 2α planos de ruptura 45+φ' φ' φ' 2 45+φ' 2 σ' OP 2121 Relações entre σσσσ’1, σσσσ’3 e φφφφ’ na ruptura para solos não cimentados Observa-se que: sen ∅� � AB OA Como AB vale o raio do Círculo de Mohr: AB � σ � − σ#� 2 Como OA vale a abcissa do centro do Círculo de Mohr: OA � σ � + σ#� 2 Logo: sen ∅� � σ � − σ#� σ � + σ#� ou: σ � σ#� � 1 + sen ∅� 1 − sen ∅� τ σ'3 σ'σ'1 φ' 45º+φ' φ' círculo de Mohr das tensões efetivas círculo de Mohr das tensões totais σ'1 σ'3 (poro-pressão) u B AO 2 90ºOPφ' φ' 2222 Repetindo: σ � σ#� � 1 + sen ∅� 1 − sen ∅� Denotando-se por σ’f e τf as tensões normal e cisalhante no plano de ruptura, obtêm-se: σ0� � OA − AB sen ∅� e 10 � AB cos ∅� Logo: σ0� � σ � + σ#� 2 − σ � − σ#� 2 sen ∅� e 10 � σ � − σ#� 2 cos ∅� τ σ'3 σ'σ'1 φ' 45º+φ' φ' círculo de Mohr das tensões efetivas círculo de Mohr das tensões totais σ'1 σ'3 (poro-pressão) u B AO 2 90ºOPφ' φ' 2323 sen ∅� � AB OA e tan β� � AC OA Mas: AB = AC = raio do círculo Então: tan β� � sen ∅� Para envoltória de resistência sem coesão verdadeira ou intercepto coesivo Relações entre os parâmetros de resistência determinados em termos de σσσσ e τ τ τ τ e em termos de p’, q. τ σ'3 σ'σ'1 β' φ' q' p' B C AO 2424Para envoltória de resistência com coesão verdadeira ou intercepto coesivo tan ∅� � OF EO EO � OF tan ∅� EO � c� tan ∅� tan β� � OG EO Da mesma forma: tan β� � sen ∅� EO � OG tan β� EO � b� tan β� b� tan β� � c� tan ∅� b� � c� tan β� tan ∅� b� � c� sen ∅� tan ∅� b� � c� cos ∅� τ σ'3 σ'σ'1 c' = OF b' = OG β' φ' β' φ' β' φ' AE G F B C E O O F G