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PARASITOLOGIA AULA 1 Profª Mariana Forgati 2 CONVERSA INICIAL Introdução à parasitologia Nesta aula da disciplina de Parasitologia você irá conhecer o objeto de estudo da Parasitologia, que é a relação entre parasitos e seus hospedeiros. Ao mesmo tempo, entraremos em contato com a terminologia utilizada na Parasitologia e com conceitos gerais da Epidemiologia. Ao final da nossa aula, você será capaz de compreender a importância do estudo da Parasitologia e perceberá como ela está presente em seu cotidiano. Na sequência, você conhecerá as principais técnicas utilizadas no diagnóstico das infecções parasitárias. Você conhecerá, também, as principais características dos protozoários e duas das principais parasitoses causadas por esses organismos: leishmaniose e doença de Chagas. Em aulas posteriores, daremos continuidade ao estudo das infecções parasitárias humanas causadas pelos protozoários. Você verá as principais características da giardíase, tricomoníase, malária, toxoplasmose e amebíase. Nas próximas aulas, veremos as características gerais dos helmintos, bem como as principais parasitoses humanas causadas pelos platelmintos: esquistossomose, faciolíase, teníase e cisticercose. Mais adiante, continuaremos o estudo das parasitoses causadas pelos helmintos, como maior ênfase às infecções causadas pelos nematódeos: ascaridíase, enterobiose, estrongiloidíase, ancilostomíase e filariose. Por fim, conheceremos os principais artrópodes vetores e parasitos do ser humano (pulgas, carrapatos, piolhos e ácaros), moluscos hospedeiros de helmintos e as parasitoses emergentes. TEMA 1 – A PARASITOLOGIA Os seres vivos relacionam-se entre si de diversas maneiras. Essas relações, também chamadas de interações ecológicas, são fundamentais à manutenção da vida, já que todos os seres vivos dependem de outros para a sobrevivência e a reprodução. As interações ecológicas podem ser: • positiva para ambos os organismos em interação, como ocorre nas colônias, sociedades, protocooperação e mutualismo; 3 • positiva para um dos organismos, neutra para o outro, como no comensalismo e inquilinismo; • prejudicial para ambos os organismos, como na competição; • positiva para um dos organismos e prejudicial para o outro, como no parasitismo e predatismo. O parasitismo é a relação ecológica estudada na Parasitologia que envolve a relação de um parasito com um hospedeiro, conforme veremos na seção seguinte. Embora vários organismos possam ser considerados parasitos, uma vez que prejudicam seu hospedeiro, muitos deles são estudados pela Microbiologia. É o caso dos vírus (que são parasitos intracelulares obrigatórios), bactérias e fungos patogênicos. Além disso, não podemos nos esquecer dos parasitos vegetais, ou fitoparasitos (ex.: erva de passarinho e cipó chumbo), que são estudados na Botânica. Então, nessa disciplina de Parasitologia estudaremos as principais relações parasita-hospedeiro entre protozoários, helmintos, artrópodes e moluscos que participam do ciclo parasitário envolvendo os seres humanos, não nos esquecendo de que muitas das doenças causadas pelos parasitos são zoonoses. TEMA 2 – PARASITISMO A Parasitologia é a ciência que estuda a relação desarmônica interespecífica, em que há unilateralidade de benefícios, chamada de parasitismo. Nesse tipo de relação íntima e duradoura, um dos organismos, o parasito, beneficia-se utilizando o hospedeiro como hábitat, onde obtém nutrientes e se reproduz (Rey, 2008). A origem do termo parasito é grega, sendo pará (ao lado, junto) e sîtos (alimento), significando “aquele que come ao lado de outro”. Essa expressão era originalmente utilizada para se referir a alguns cidadãos pensionistas do Estado que participavam de banquetes oficiais misturados às classes dos magistrados e outros integrantes das classes superiores. O termo parasito passou a ser depreciativo, designando pessoas que viviam à custa dos outros (Gonçalves; Minuzi-Souza, 2008). O significado biológico do termo parasito é ser vivo, ou vírus, de menor porte, que vive associado a outro ser vivo de maior porte, retirando matéria para 4 sua nutrição e causando-lhe danos variáveis a pequenos distúrbios, ou doenças graves que levam à morte (Soares, 1993). 2.1 Adaptações parasitárias A origem do parasitismo ocorreu quando, na evolução das espécies, um organismo menor se beneficiou da associação ao seu hospedeiro, seja pela proteção, seja pela obtenção de alimento. A princípio, essa associação provavelmente foi ao acaso. Mas, com o passar do tempo, a seleção natural agiu para que houvesse um melhor relacionamento do parasito com seu hospedeiro. Dessa forma, com o passar do tempo, houve uma seleção de alterações metabólicas, estruturais e morfológicas que assegurassem maior probabilidade de associação dos parasitos aos seus hospedeiros. Essas adaptações foram classificadas por Neves (2016) em morfológicas e biológicas. Dentre as adaptações morfológicas podemos citar a degeneração, que consiste na perda ou atrofia de estruturas vitais, como sistema digestório, sistema locomotor etc. Isso justifica a dependência metabólica, em grau variável, que os parasitos têm de seus hospedeiros. A hipertrofia também é uma adaptação morfológica que pode ser observada em alguns parasitos. A hipertrofia consiste no aumento de estruturas que facilitam a interação com o hospedeiro, como estruturas de fixação (lábios, ventosas etc.), estruturas alimentares (ex.: aparelho bucal de insetos hematófagos é hipertrofiado, favorecendo o acesso ao sangue do hospedeiro) e que aumentem o sucesso reprodutivo do parasito, como hipertrofia de estruturas reprodutoras, como ovários e testículos. Em relação às adaptações biológicas dos parasitos podemos citar a estratégia reprodutiva, que consiste na produção de grandes quantidades das formas infectantes (ex.: ovos e cistos), que garantem maior sucesso na interação com o hospedeiro. Além disso, uma diversidade de tipos de reprodução (como hermafroditismo, partenogênese e poliembrionia) favorece o encontro de machos e fêmeas e, consequentemente, a perpetuação da espécie. A capacidade de resistir às agressões do hospedeiro também é uma adaptação parasitária relevante. Ser capaz de resistir à ação do suco gástrico, de anticorpos e células de defesa, por exemplo, também garantem um maior sucesso do parasito. 5 Por fim, temos a diversidade de tropismos, que são sinais utilizados pelos seres vivos para sua orientação espacial. Temos, por exemplo, o geotropismo (que é a orientação vertical na terra, podendo ser positivo, quando o organismo busca abrigar-se na terra, ou negativo, quando o organismo procura a superfície), termotropismo (orientação por temperatura), quimiotropismo (orientação pela presença de substâncias químicas específicas, como nutrientes), heliotropismo (orientação pela luz solar) etc. A diversidade de tropismos favorece a sobrevivência e reprodução dos parasitos, logo, também é considerada uma adaptação relevante. 2.2 Tipos de parasitos, ciclo biológico, hospedeiro e vetor Para um maior aproveitamento e compreensão da relação parasito- hospedeiro, é necessário que você compreenda alguns termos que veremos com frequência nessa disciplina. Você poderá, também, consultar glossários bem completos da terminologia da Parasitologia nos livros de Rey (2008) e Neves (2016). Os parasitos podem ser classificados de acordo com o número de células, podendo ser acelulares (vírus), unicelulares (bactérias, protozoários, alguns fungos) e multicelulares (helmintos e artrópodes, por exemplo). Além disso, os parasitos podem ser classificados como endoparasitos, quando vivem dentro do corpo do hospedeiro, ectoparasitos, quando vivem externamente ao corpo do hospedeiro, hiperparasitos, quandoo parasito habita outro parasito (ex.: o protozoário Entamoeba histolytica pode ser parasitado por fungos ou bactérias). Ainda em relação aos parasitos, sua especificidade em parasitar hospedeiros também é variável. Os parasitos eurixenos possuem muitas espécies de hospedeiros naturais, enquanto os estenoxenos possuem apenas um, ou um número muito reduzido de hospedeiros. O parasitismo também pode ser ocasional ou acidental, sendo denominado parasito facultativo. Os hospedeiros podem ser de dois tipos: hospedeiro intermediário ou definitivo. O hospedeiro intermediário é aquele que apresenta o parasito em sua fase imatura (larval, por exemplo) ou quando o parasito se reproduz assexuadamente. O hospedeiro definitivo é aquele que apresenta o parasito em sua fase adulta ou quando ele se reproduz de forma sexuada. 6 Em relação aos tipos de ciclos biológicos, temos o ciclo monoxênico (ou monogenético), quando ocorre a participação de apenas o hospedeiro definitivo. Já o ciclo heteroxênico (ou digenético), envolve tanto o hospedeiro intermediário (em que se desenvolvem as formas infectantes) quanto o definitivo. Por fim, precisamos compreender o papel dos vetores no parasitismo. Vetor, para a Parasitologia, é o veículo capaz de transmitir o parasito entre hospedeiros. O vetor pode ser biológico, quando um ser vivo (artrópode ou molusco) está envolvido no ciclo de vida do parasito, além da sua transmissão para o hospedeiro definitivo. O vetor pode ser mecânico, quando ele está envolvido apenas com o transporte do parasito. Por fim, o vetor pode ser fômite (ou inanimado), quando o transporte do parasito ocorre por meio de objetos (seringas, copos etc.). TEMA 3 – PARASITOSES Como consequência da relação parasito-hospedeiro, pode ocorrer o desenvolvimento de uma parasitose (ou infecção parasitária), que prejudica a saúde do hospedeiro, podendo, inclusive, levá-lo à morte (Gonçalves; Minuzi- Souza, 2008). 3.1 Mecanismos de transmissão e vias de infecção Antes de abordarmos os mecanismos de transmissão e vias de infecção propriamente ditos, precisamos diferenciar os seguintes termos, que são comumente confundidos entre si: contaminação, infecção e infestação. A contaminação refere-se à presença de um agente infeccioso na superfície de objetos, corpos etc. Por exemplo, a superfície de uma folha de alface pode estar contaminada com ovos de helmintos e precisa ser higienizada antes do consumo. Infecção refere-se à entrada, desenvolvimento ou proliferação de um parasito (inclusive vírus, bactérias e fungos) no corpo do seu hospedeiro. Por sua vez, infestação refere-se a alojamento, desenvolvimento ou multiplicação de artrópodes na superfície de objetos, corpos etc. (Neves, 2016). Ou seja, refere-se a ectoparasitos. Por exemplo, um cão pode estar infestado de carrapatos, uma criança pode ter sua cabeça infestada de piolhos etc. 7 Os mecanismos de transmissão das parasitoses dependem da via de entrada do parasito em seu hospedeiro e pela forma em que se deu essa infecção. Os principais mecanismos de transmissão são: • pessoa a pessoa, por meio do compartilhamento de objetos contaminados (fômites); • pela água, alimentos, mãos ou poeira contaminados; • pelo solo contaminado; • por vetores ou hospedeiros intermediários; • mecanismos diversos. Existem, no entanto, alguns fatores que limitam a transmissão dos parasitos aos seus hospedeiros. Climas secos, por exemplo, dificultam a eclosão de ovos ou o desenvolvimento larval de helmintos que dependem da umidade do solo. Baixas temperaturas diminuem a viabilidade dos parasitos, em todas as suas fases de vida, e de seus vetores (Rey, 2008). As vias de infecção consideram as formas pelas quais os parasitos penetram no corpo do seu hospedeiro. Neves (2016) e Rey (2008) propuseram a seguinte classificação para as vias de infecção: oral, quando o parasito é ingerido por seu hospedeiro; cutânea, mucosa ou genital, quando o parasito penetra pela pele, mucosa ou trato genital, respectivamente; transplacentária, quando o parasito ultrapassa a membrana placentária da mãe gestante atingindo o feto; transfusional, quando o parasito é inoculado via transfusão sanguínea. Por fim, as formas de infecção do parasito em seu hospedeiro podem ser passiva, quando não há gasto energético, ou ativa, quando há gasto energético (Avelar, 2016). 3.2 Ações do parasito em seu hospedeiro As parasitoses manifestam-se de diferentes formas porque cada parasito tem uma ação específica sobre seu hospedeiro. Veja, a seguir, as principais ações do parasito em seu hospedeiro, segundo Neves (2016). Por exemplo, durante sua migração no hospedeiro, um parasito pode obstruir estruturas, como intestino e fígado, sendo essa uma ação mecânica. É possível que o parasito cause uma ação irritativa, ou até mesmo traumática, quando o parasito danifica estruturas do corpo do hospedeiro. 8 O parasito pode ter ação espoliativa em seu hospedeiro. Nesse caso, o parasito espolia, isto é, retira nutrientes importantes do hospedeiro, principalmente daqueles que se alojam no intestino delgado. A resposta do sistema imune do hospedeiro pode se intensificar diante da presença do parasito, intensificando também a gravidade da parasitose, sendo essa ação denominada imunogênica. Além disso, a presença do parasito ou dos produtos do seu metabolismo podem estimular uma resposta inflamatória do hospedeiro. A inflamação constitui a principal lesão nas parasitoses, seja na fase aguda ou crônica, cujas principais características serão abordadas na sessão 4.1. Alguns parasitos utilizam enzimas para conseguir atingir as estruturas- alvo em seus hospedeiros, sendo essa ação denominada enzimática. Por meio da ação tóxica, produtos do metabolismo do parasito podem prejudicar o hospedeiro de alguma forma. Por fim, alguns parasitos podem provocar um quadro de anóxia, ou seja, privação de oxigênio nos tecidos, em seu hospedeiro, principalmente os parasitos de hemácias. 3.3 Fatores para a ocorrência das parasitoses A ocorrência de parasitoses depende de algumas condições indispensáveis, que são particulares para cada espécie de parasito. Primeiramente, cada parasito possui uma especificidade parasitária, relacionada tanto à região geográfica a qual o parasita está adaptado, como também ao órgão de preferência em seu hospedeiro (Neves, 2016). Ou seja, um parasito adaptado a uma região de clima tropical dificilmente irá parasitar um hospedeiro de clima temperado. Assim como um parasita do trato gastrointestinal não parasitará, na maioria dos casos, o coração, por exemplo. Outros fatores a serem considerados na ocorrência de parasitoses são aqueles que aumentam a probabilidade de interação do parasito com seu hospedeiro. Os mais relevantes são: • coincidência de hábitats entre os parasitos, vetores e hospedeiros; • quantidade suficiente de hospedeiros e vetores; • quantidade suficiente de parasitos; 9 • condições ambientais favoráveis para a transmissão facilitam a interação parasito-hospedeiro e, consequentemente, a ocorrência da parasitose (Neves, 2016). Diante de condições favoráveis ao parasito, a parasitose manifesta-se no hospedeiro. Porém, a evolução dessa parasitose não ocorre sempre da mesma maneira, sendo necessário considerar fatores inerentes ao parasito e ao hospedeiro. Como fatores inerentes ao parasito temos, por exemplo, o número de exemplares que atingiu o hospedeiro, virulência da cepa parasitária (virulência é a gravidade das lesões decorrentes do parasitismo, nesse caso) e localização. Já os fatores inerentes ao hospedeiro são: idade, nutrição, qualidade da resposta imune (Neves, 2016). Uma pessoa subnutrida, vivendo em condições de higiene precárias, idosa e exposta a uma grande quantidade de parasitos irá desenvolver uma parasitose muitomais severa e debilitante que uma pessoa jovem, bem nutrida e saudável. Além disso, as manifestações clínicas, frente a uma infecção parasitária, não ocorrem em todos os casos. Nesses casos, temos infectados assintomáticos. Porém, quando ocorre um desequilíbrio na relação parasito- hospedeiro, as lesões causadas pelos parasitos são significativas e/ou as agressões do próprio sistema imune do hospedeiro são intensas. Nesses casos, os hospedeiros desenvolvem um quadro clínico da parasitose, com sinais e sintomas característicos de determinada doença parasitária (Neves, 2016). TEMA 4 – EPIDEMIOLOGIA As parasitoses são consideradas problemas médico-sanitários importantes nos países em desenvolvimento, mesmo com todo o conhecimento científico-tecnológico e sanitário do século XXI. Segundo a Organização Mundial da Saúde, as infecções parasitárias são as principais causadoras de óbito no mundo, principalmente nos continentes africano e americano (Rey, 2008). Neves (2016) afirmou o seguinte: “A maioria dos parasitos é ao mesmo tempo causa e consequência do subdesenvolvimento”. Ou seja, as populações mais carentes não conseguem se desenvolver devido às parasitoses, que prejudicam o desenvolvimento adequado de crianças, limitam as atividades dos adultos e oneram o Estado, com custos elevados de assistência médica e social. 10 Ao mesmo tempo, nas comunidades mais carentes, os parasitos encontram condições propícias para sua transmissão, tais como: inexistência ou deficiência de saneamento básico, moradias em condições precárias, práticas inadequadas de higiene e baixa qualidade na água, por exemplo (Vieira; Benetton, 2013). Então, ao estudarmos Parasitologia, precisamos ter em mente quais os fatores de risco envolvidos na distribuição, transmissão e desenvolvimento de doenças, de uma forma geral. Sendo assim, precisamos conhecer alguns conceitos de Epidemiologia, que é a ciência que estuda a distribuição de doenças e suas determinantes para a população humana. Lembrando que as definições a seguir valem, também, para outros tipos de agentes infecciosos e doenças, não apenas para as parasitoses. 4.1 Aplicação de conceitos epidemiológicos na Parasitologia Agente etiológico é o ser vivo causador ou responsável pela origem da doença. Quando a doença é exclusiva de seres humanos, é denominada antroponose. As doenças transmitidas entre humanos e outros vertebrados é denominada zoonose, sendo que pode ser anfixenose (quando a doença circula entre humanos e animais de forma indiferente. Ex.: Trypanosoma cruzi circula entre humanos e animais silvestres), antropozoonose (quando a doença é primariamente de outros animais e passa a ser transmitida a humanos. Ex.: brucelose, que é uma doença de bovinos e pode ser transmitida aos humanos de forma acidental), ou zooantroponose (quando o ser humano é reservatório da doença, mas ela pode ser transmitida a outros animais. Ex.: esquistossomose no Brasil, cujo hospedeiro definitivo é o ser humano, mas pode infectar roedores, bovinos e outros primatas). Reservatório é qualquer local ou ser vivo onde determinado parasito vive e se multiplica, ou seja, é o hábitat do parasito. É a partir do reservatório que ele é transmitido a outros hospedeiros. Por exemplo, a capivara é um reservatório do Trypanosoma evansi. Em relação à evolução das patologias (doenças), precisamos definir os seguintes conceitos: profilaxia, período de incubação, período pré-patente, período patente, fase aguda, fase crônica, quadro clínico e quadro subclínico (Neves, 2016). Profilaxia é o conjunto de medidas de prevenção, controle ou erradicação de uma doença. 11 O período de incubação é definido como o intervalo entre a exposição ao agente infeccioso (parasito, no caso) e o aparecimento dos sintomas. O período de incubação depende, entre outros fatores, do agente infeccioso e da imunidade do hospedeiro. Já o período pré-patente é o intervalo de tempo entre a penetração do parasito em seu hospedeiro e o aparecimento das primeiras formas detectáveis em exames laboratoriais (fezes, sangue, imunológicos etc.). Já o período patente é o intervalo entre a fase adulta e morte do parasito. Nesse período, é possível a detecção dos ovos, cistos, oocistos e larvas por meio de exames laboratoriais simples e, geralmente, coincide com o período sintomático (fase aguda) da parasitose. A fase aguda de determinada doença ocorre logo após a infecção. Os sintomas, nessa fase, costumam ser bem evidentes. A doença pode evoluir para uma fase crônica ou levar o indivíduo a óbito. A fase crônica procede da aguda, caracterizada pelo equilíbrio na relação parasito-hospedeiro, o que resulta em sintomas mais discretos, sendo capaz de ser diagnosticada apenas por exames laboratoriais específicos. Um princípio fundamental na relação parasito- hospedeiro é o de que os efeitos negativos tendem a ser menores quando a interação é mais antiga (crônica), enquanto as associações recentes (aguda) estão mais sujeitas a uma patogenia mais severa (Odum, 2012). Indivíduos com quadro clínicos são aqueles que manifestam os sintomas da doença, sendo, usualmente, os indivíduos responsáveis pela maior transmissão da doença. Enquanto os indivíduos infectados que apresentam quadro subclínicos não desenvolveram sintomas da doença em questão. Normalmente, a proporção de indivíduos com quadro subclínico é maior que os com quadro clínico. Infecções assintomáticas podem ser comuns em algumas enfermidades e têm papel fundamental nos casos de epidemias, já que os indivíduos assintomáticos podem transmitir a doença. Em relação à dinâmica da distribuição das doenças, podemos classificá- las como endemias, epidemias ou pandemias. Endemia é a prevalência usual de uma enfermidade em determinada área. Normalmente, considera-se como endêmica a doença cuja incidência permanece constante por vários anos, dando uma ideia de equilíbrio entre a doença e a população (Neves, 2016). Na epidemia, os casos aumentam de forma progressiva, inesperada e descontrolada, acima do observado nas endemias, sem especificação sobre a 12 região geográfica afetada (bairro, cidade, estado ou país), podendo estender-se por diferentes períodos (horas, como nas infecções alimentares, semanas, como nas gripes, ou vários anos, como a Aids). Por fim, pandemias são epidemias que ocorrem simultaneamente em vários locais do planeta (Moura; Rocha, 2012). TEMA 5 – PRINCIPAIS PARASITOS DO HOMEM E SEUS VETORES A diversidade de parasitos na natureza é imensa. Em todos os reinos dos seres vivos existem representantes adaptados ao parasitismo. Antes de iniciarmos o estudo dos principais parasitos dos seres humanos, precisamos compreender como os seres vivos estão organizados. 5.1 Classificação biológica A classificação biológica, ou sistemática, tem como objetivo organizar os organismos vivos segundo suas características e padrões. Para separar os seres vivos em grupos, são usados diversos critérios, como semelhanças nos vários níveis de organização, do indivíduo ao material genético. O agrupamento básico para a classificação dos seres vivos é a espécie, seguida pelo gênero, família, ordem, classe, filo e reino. Ao escrever um nome científico, você deverá seguir as seguintes normas, elaboradas pelo naturalista sueco Carolus Linnaeus (1707-1778), em 1735. Os nomes científicos das espécies devem ser escritos em itálico (quando digitados), sendo que o nome de cada espécie é composto de duas palavras: a primeira palavra deve indicar o gênero, e a segunda é chamada epíteto específico. O nome do gênero deve iniciar com letra maiúscula, enquanto o epíteto específico deve ser escrito com letras minúsculas. Ex.: Trypanosoma cruzi. Quando uma espécie possuir subespécie, essa palavra virá em seguida à do epíteto específico. Exemplo: Culex pipiens fatigans. Quando a espéciepossuir subgênero, este nome estará entre o gênero e o epíteto específico, entre parênteses. Ex.: Anopheles (Kerteszia) cruzi. Os organismos vivos estão atualmente divididos em três grandes domínios: bactérias (Bacteria), aquebactérias (Archaea), ambos procariotos, e eucariotos (Eukarya). Dentro do domínio Eukarya temos os seguintes grandes reinos: 13 • Protoctista, que inclui os eucariotos unicelulares, coloniais e multicelulares simples. Ex.: protozoários e algas. • Plantae, que inclui os eucariotos multicelulares autótrofos. Ex.: plantas terrestres (briófitas, pteridófitas, gimnospermas e angiospermas). • Fungi, que inclui os eucariotos multicelulares e heterótrofos (absorvem seus nutrientes do ambiente). Ex.: bolores, leveduras e cogumelos. • Animalia, que inclui os eucariotos multicelulares, heterótrofos (ingerem alimentos) e que se movimentam em alguma fase do seu ciclo de vida. Ex.: invertebrados e vertebrados. É importante ressaltar que a classificação dos organismos se encontra em constante reestruturação. Isso porque novos estudos, principalmente que utilizam ferramentas da biologia molecular, reavaliam o que já era conhecido, trazendo novas considerações. Por isso, é comum que, ao pesquisar bibliografias mais antigas, você se depare com uma classificação dos organismos diferentes da apresentada nessa disciplina. Nas demais aulas da nossa disciplina de Parasitologia estudaremos com mais detalhes as principais espécies de interesse parasitológico no Brasil. NA PRÁTICA Para finalizarmos nossa aula, gostaria de propor a seguinte atividade: leia o texto abaixo e responda às questões propostas. A giardíase é uma doença causada pelo protozoário Giardia lamblia. A cidade fictícia de Mato Belo, Paraná, com cerca de 20 mil habitantes, registrou aumento do número de casos da doença no segundo semestre de 2020. A vigilância sanitária de Mato Belo fez um levantamento de dados sobre a incidência de giardíase na cidade, entre os anos de 2017 e 2020. Os resultados podem ser verificados no Gráfico 1. 14 Com base na análise dos dados epidemiológicos do município fictício de Mato Belo, Paraná, e no que discutimos nessa aula, responda: - Qual o agente etiológico da giardíase? - Qual o período de epidemia de giardíase na cidade de Mato Belo? - Pode-se afirmar que a giardíase é uma doença endêmica na cidade de Mato Belo? Justifique. FINALIZANDO Nessa nossa primeira aula, você entrou em contato com os conceitos básicos da Parasitologia. Vamos, então, retomar os principais pontos abordados nessa aula. Os aspectos relacionados ao parasitismo, definidos como relação ecológica desarmônica entre um parasito e hospedeiro, são os principais objetos de estudo da Parasitologia. O processo evolutivo selecionou adaptações nos parasitos de forma a otimizar sua interação com o hospedeiro. A classificação desses parasitos pode ser realizada com base nos seguintes critérios: número de células, localização em seu hospedeiro, ou número de hospedeiros. Já os hospedeiros podem ser classificados em hospedeiro intermediário ou definitivo. Quando a relação parasito-hospedeiro é estabelecida, pode ocorrer o desenvolvimento de uma parasitose, cuja evolução depende de vários fatores, como: mecanismos e vias de transmissão, ação do parasito em seu hospedeiro e fatores inerentes ao parasito e ao hospedeiro. Ao estudarmos a Parasitologia, é preciso considerar os fatores envolvidos na distribuição, transmissão e desenvolvimento de doenças, inclusive de 15 parasitoses. Logo, precisamos entrar em contato com alguns conceitos de Epidemiologia que serão mais bem explorados ao longo da nossa disciplina. Vimos, também, a importância da classificação biológica e regras de nomenclatura científica, bem como a classificação dos principais parasitos do ser humano. Por fim, vimos uma aplicação prática dos conceitos abordados em nossa aula de Parasitologia. 16 REFERÊNCIAS GONÇALVES, R. G.; et al. (2008). O que é um parasito? Uma análise etimológica e semântica do termo parasito em diferentes idiomas. Acta Scientiarum. Human and Social Sciences, Maringá, v. 29, n. 2, p. 151-161. 2008. MONTEIRO, S. G. Parasitologia na medicina veterinária. 2. ed. Rio de Janeiro: Roca, 2017. MOURA, A. S.; ROCHA, R. L. Endemias e epidemias: dengue, leishmaniose, febre amarela, influenza, febre maculosa e leptospirose. Belo Horizonte: Nescon/UFMG, 2012. NEVES, D. P. Parasitologia humana. 16. ed. São Paulo: Atheneu, 2016. ODUM, E. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. REY, L. Parasitologia: parasitos e doenças parasitárias do homem nos trópicos ocidentais. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. SOARES, J. L. Dicionário etimológico e circunstanciado de biologia. São Paulo: Scipione, 1993. VIEIRA, D. E. A.; BENETTON, M. L. F. N. Fatores ambientais e socioeconômicos associados à ocorrência de enteroparasitoses em usuários atendidos na rede pública de saúde em Manaus, AM, Brasil. Bioscience Journal, Uberlândia, v. 29, n. 2, p. 487-498. 2013.