Buscar

Politizar as relações entre jovens e adultos A construção da experiência escolar pelos estudantes

Prévia do material em texto

ISSN (versão eletrônica): 1678-4669 Acervo disponível em: www.scielo.br/epsic
Politizar as relações entre jovens e adultos? A construção da 
experiência escolar pelos estudantes1
Lúcia Rabello de Castro
Emilia Matos do Nascimento
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Resumo
O presente trabalho parte de uma dupla problematização. Primeiro, do questionamento das formas 
convencionais da ação política juvenil que dificultam inquirir sobre novos espaços do político imbricados 
em uma política da vida cotidiana; segundo, questiona o enquadramento da escola como espaço pré-político 
avesso a qualquer atravessamento político. Em pesquisa empírica realizada com 1291 jovens em escolas 
públicas e particulares do Rio de Janeiro investigou-se como os jovens empreendiam, a despeito da prevalente 
lógica da subordinação que os posiciona como sujeitos da aprendizagem, movimentos instituintes de um 
novo lugar para si. As categorias analíticas resultantes da análise - o enquadramento do agir do estudante na 
escola, a construção de um ponto de vista do estudante e o perfil político-ideológico do jovem e sua atuação 
na escola - mostram as dificuldades e a potência do processo de politização das relações entre jovens e 
adultos na escola.
Palavras-chave: jovens; escola; politização das relações; lógica da subordinação.
Abstract
Politicize youth and adults’ relationships? Students’ construction of their school experience. The present 
work departs from the problematization of two aspects. Firstly, a conventional view about youth’s political 
action which deters from investigating new forms and spaces of activism in youth’s daily life; secondly, 
the view of the school as a pre-political space unsuitable for the political. In an empirical investigation 
conducted with 1,291 students of private and state schools of Rio de Janeiro, we looked for the ways 
whereby they created a new position for themselves at school despite the prevalent logic of subordination 
which locates them as learners. The analytical categories resulting from the analysis – the modelling of 
students’ action, the construction of the students’ point of view and youth’s political-ideological profile and 
their action at school – show the difficulties and the potentialities of the process of politicizing youth and 
adults’ relationships at school.
Keywords: youth, school; the politicization of relationships; logic of subordination.
Resumen
Politizar la relación entre los jóvenes y los adultos? La construcción de la experiencia escolar para los 
estudiantes. Este trabajo parte de un doble cuestionamiento. En primer lugar, el cuestionamiento de las formas 
convencionales de la acción política de los jóvenes que dificultan la investigación sobre nuevos espacios 
políticos imbricados en la política de la vida cotidiana; y en segundo lugar, cuestiona el marco de la escuela 
como un espacio pre-político contra cualquer transición política. En la presente investigación empírica con 
1.291 jóvenes de las escuelas públicas y privadas de Río de Janeiro, se investiga de qué manera los jóvenes 
han instituido movimientos instituyentes de un nuevo lugar para sí mismos a pesar de la lógica predominante 
de subordinación que les posiciona como sujetos de aprendizaje. Las categorías analíticas resultantes del 
análisis - la clasificación de la acción del estudiante en la escuela, la construcción del punto de vista del 
joven y el perfil político ideológico - y su desempeño en la escuela - muestran las dificultades y la potencia 
del proceso de politización de las relaciones entre jóvenes y adultos en la escuela.
Palabras clave: juventud; escuela; politización de las relaciones; lógica de subordinación.
A participação social e política dos jovens está 
frequentemente associada a suas manifestações na rua, 
nos espaços públicos, ou ainda como parte de ações 
programáticas e convencionais dos movimentos estudantis e dos 
partidos políticos. No Brasil, e em outros países, quando se fala 
de participação política juvenil se tem em mente, em geral, a 
Estudos de Psicologia, 18(2), abril-junho/2013, 359-367
360
aparição dos jovens como protagonistas de ações que interpelam 
o governo em questões, tais como educação ou emprego. No 
entanto, este cenário tem se modificado bastante no sentido de 
que as aparições juvenis de reivindicação nos espaços públicos 
têm assumido uma pluralidade de formas contrariando a tradição 
de que elas se dão, ou devam se dar, como expressões de um 
coletivo organizado e institucionalizado que é movido por 
objetivos e estratégias claras de ação e mobilização. A própria 
concepção do que seria participar social e politicamente no 
âmbito dos estudos da juventude sofre da visão de delimitar a 
participação política a coletivos como partidos políticos, e, no 
máximo, centros acadêmicos estudantis (Forbrig, 2005).
Em pesquisas anteriores (Mayorga, Castro, & Prado, 
2012), discutimos como a participação social e política juvenil 
pode ser concebida de um ponto de vista mais molar em que 
se problematizam as interconexões presentes entre a vida 
cotidiana e a esfera pública de decisões. Desta forma, pareceu 
importante construir outros parâmetros teóricos para analisar 
como muitas ações juvenis, hoje, interrogam a sociedade e 
suas práticas de opressão em novos espaços que não têm a 
pretensão de se autonomear como políticos, ou de produzir 
efeitos sobre as instituições políticas. Essas ações lançam, então, 
desafios à própria concepção teórica do agir político enquanto 
considerada apenas sob sua forma convencional, provocando os 
pesquisadores a refletir sobre as novidades do contemporâneo 
no que dizem respeito às relações entre participação social e 
política e juventude.
Partir dos espaços frequentados pelos jovens e das ações 
que eles empreendem em seu cotidiano desmistifica a política 
como a ação daqueles destinados a exercê-la, como os adultos, os 
governantes, os políticos e, os poderosos, para recuperá-la como 
o ato que institui o dissenso, e, neste sentido, desvela outras e 
novas formas de opressão e constrangimento (Rancière, 1996). 
Neste sentido, o esforço da investigação sobre a participação 
social e política juvenil deve ir na direção de buscar as formas 
inusitadas de os jovens demonstrarem e viverem os antagonismos 
e conflitos, o que se revela como um desafio uma vez que se 
esbarra em questões importantes: o que vem a ser a participação 
hoje? Que ações juvenis podem se qualificar como ações 
políticas, e como?
Essas perguntas tornam-se difíceis de responder, levando-
se em consideração as novas dimensões de valores que se 
tornam presentes na vida dos jovens hoje, e tingem de outros 
matizes sua participação na sociedade. Por exemplo, diversas 
pesquisas (Norris, 2001; Novaes, 2002; Pais, 2005; Riley, 
Morey, & Griffin, 2010) vão mostrar como é importante se dar 
conta de que à dimensão de luta pela transformação social os 
jovens agregam outros valores igualmente importantes, como 
sua própria realização pessoal, sua relativa independência para 
assumir posições que possam ser dissonantes dos coletivos em 
que se encontram e a importância da própria gestão sobre como 
fazer e o quê fazer em detrimento da delegação da decisão a 
representantes. Estamos, portanto, diante de um outro cenário 
em que a individualização como processo e como destino (Beck 
& Beck-Gernsheim, 2002), e a via da subjetividade (Pleyers, 
2010) se fazem notórias e presentes no modo de participação 
social e política dos jovens. Neste sentido, a participação política 
hoje não se faz como antes, tanto no sentido de que são outros 
os recursos internos e externos de que os sujeitos lançam mão, 
tanto no sentido da natureza dos objetivos que movem sua ação.
Tematizar uma política da vida cotidiana significa 
considerar que a ação e mobilização dos jovens pode ser exercida 
nos espaços em que eles habitam e convivem, como a escola 
por exemplo. Essa não tem sido considerada como um espaço 
político.Arendt (2003) afirma que na escola não existe paridade 
de posições (entre aluno e professor), tampouco ausência de 
constrangimentos sobre o primeiro para que sua ação possa ser 
política. Para Arendt (2007), política e liberdade se equivalem, 
no sentido de que a primeira só pode acontecer pela ação livre 
dos sujeitos.
Neste trabalho buscamos investigar as formas de participação 
juvenil no espaço escolar questionando os pressupostos 
arendtianos de que o espaço escolar consiste em uma arena pré-
política, e que, por conseguinte, as ações estudantis se enquadram 
no âmbito de uma lógica hierarquizada de subordinação que 
não as qualificaria como políticas. Problematizamos a posição 
arendtiana no sentido de que a posição de sujeito do estudante 
na escola hoje parece se ordenar por várias lógicas, inclusive 
aquela que o subordina no âmbito das relações professor-aluno. 
Como “jovem”, “sujeito de direitos”, “consumidor”, posições 
vividas simultaneamente com a de estudante, o estatuto do 
aluno se torna múltiplo, susceptível de regulação por lógicas 
além daquelas convencionais do espaço escolar. Neste sentido, 
cabe perguntar como, sob o impacto das múltiplas posições de 
sujeito do estudante, suas ações na escola mostram as tensões e 
contradições de um lugar social que não pode ser visto apenas 
no âmbito do enquadre da subordinação. Assim, o estudante faz 
sentido de sua existência na escola, não somente como aluno que 
responde à demanda social de aprendizagem, mas como colega 
que usufrui das amizades feitas na escola (Dayrell, 2001), como 
jovem ou criança que cria modos específicos de estar no mundo 
com sua cultura escolar (Muller, 2008). Sabemos que as escolas 
hoje são cenário de disputas de valores e normas, onde estudantes 
e professoras nem sempre convergem sobre o que é considerado 
bom, justo e adequado e o que rumos a escola deve tomar.
Assim, nosso intuito é averiguar como as ações dos jovens 
na escola politizam as relações com os adultos, no caso suas 
professoras. Neste momento, há uma ultrapassagem – ainda que 
incipiente - do enquadre hierárquico que subordina os jovens 
como aprendizes naturalizando a inferioridade de sua posição 
de fala. Assim, um lugar de enunciação distinto daquele do 
aluno que responde à demanda social da aprendizagem pode ser 
experimentado. A politização das relações entre jovens e adultos 
na escola é considerada aqui um ponto de partida teórico que 
pode iluminar como a escola, longe de ser um santuário que 
realiza a transmissão de um saber universal e incontestável, 
permanece como um campo de embates, conflitos e disputas 
geracionais, ainda que esses sejam passíveis de coalizões e 
cooptações. Interessa-nos, portanto, analisar como os estudantes 
constroem uma percepção do seu lugar na escola, distinto 
daquele enquadrado pela relação de aprendizagem, e avaliam 
esse lugar justamente em virtude de experimentarem injustiças 
e constrangimentos conduzindo-os a questionar a ordem de 
coisas na escola e demandar o que acham justo e razoável. 
L.R.Castro,&E.M.Nascimento
361
Certamente, da injustiça sofrida, individual ou coletivamente, até 
a reivindicação de um ‘nós’ endereçada ao outro, há um longo 
caminho a ser percorrido pelos estudantes o que implica em 
riscos a serem enfrentados, perdas a serem vividas e embates a 
serem travados. Um campo de disputas e conflitos pode ser aberto 
cujos resultados não são de antemão previsíveis. Neste sentido, 
a politização das relações entre jovens e adultos permanece tão 
somente uma potência que pode ou não encontrar formas de 
enunciação, superando as incontáveis dificuldades para que o 
agir político possa se concretizar.
Das contradições da instituição escolar ao questio-
namento sobre o status quo
Ao se considerar a escola como campo de ações 
potencialmente políticas, sabemos que a interpelação ao 
engajamento nas causas coletivas não atingem homogeneamente 
os estudantes, mas, talvez, um número reduzido que, a despeito 
da maciça individualização e normalização dos processos 
escolares, encontra fôlego e entusiasmo para se empenhar em 
causas que aparentemente não se coadunam com os objetivos 
estritamente escolares. Em pesquisas anteriores (Castro, 2008; 
Castro & Mattos, 2009) nos debruçamos sobre o engajamento 
dos jovens, em geral com idade superior aos 18 anos, em 
organizações formais como os partidos políticos, e também 
em grupos informais e autônomos investidos de uma práxis de 
transformação social pela via da ação direta e não mediatizada 
por instituições. No entanto, cabe a pergunta: o que acontece 
com os jovens – adolescentes - antes desse momento? Como 
participam e se interessam pelas questões e problemas da vida 
em comum?
O foco na escola, como cenário de disputas e conflitos 
que acometem o processo da transmissão, põe em evidência a 
necessidade de se considerar que a emergência do político não se 
restringe às ações dirigidas aos centros convencionais de poder – 
o Estado e suas instituições. Com Rancière (1995) identificamos 
uma concepção alvissareira que nos convoca a pensar o político 
como ato de reclassificação da realidade que cria modos de ver, 
sentir e falar e institui uma nova fronteira do real posicionando 
os sujeitos em uma condição limítrofe entre não ser o que se é 
e ser o que não se é.
A organização da ação coletiva na escola articula-se de 
maneira ambígua com a existência formal do grêmio estudantil. 
Alguns estudos (Alderson, 2000; Cellier, 2001) mostram a 
importância dessa instância como dispositivo que desloca os 
alunos para uma posição coletiva que lhes possibilita falar aos 
professores de um lugar um pouco diferente daquele de aluno. 
Em outros estudos (Devine, 2002), se constata que a posição 
coletiva do grêmio estudantil pode estar completamente cooptada 
pelas demandas da direção escolar e instrumentalizada pelos 
seus interesses. Neste sentido, é preciso ter em vista que a 
simples formalização de uma instância de expressão estudantil 
nem sempre dá conta de contribuir efetivamente na produção 
de uma identidade e um lugar real de um ‘nós estudantes’ na 
escola. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 
(Lei 9.394/1990) estabelece que as escolas deverão ter uma 
gestão democrática. Significa que os Conselhos Escolares 
deverão ter alunos representantes na sua composição, além 
de representantes da comunidade escolar e extraescolar. Os 
conselhos estão incumbidos da elaboração do projeto pedagógico 
na escola e da fiscalização dos recursos financeiros. A partir dos 
nove anos, as crianças já podem votar em seus representantes. 
O direito de organizar grêmios está previsto na Lei federal 
7.398/1985, e na lei estadual 1949/1992 do Rio de Janeiro. 
Essas leis preveem que os estudantes poderão se organizar em 
“entidades autônomas representativas dos seus interesses”... 
“com finalidades educacionais, culturais, cívicas esportivas e 
sociais”. O que é interessante notar é que as leis asseguram o 
direito de organização estudantil, e não exatamente afirmam sua 
necessidade ou obrigatoriedade. Um outro aspecto é que a lei 
federal é omissa quanto à finalidade política do grêmio.
Neste trabalho examinamos, portanto, a emergência de uma 
posição coletiva de estudante – um ‘nós estudante’ – a partir 
de como os jovens problematizam diversos aspectos de sua 
vivencia escolar, principalmente aqueles que os afetam mais 
profundamente, lhes trazendo algum tipo de constrangimento ou 
humilhação. Essas situações, que inflexionam o cotidiano escolar 
positiva ou negativamente, resultam em intensas experiências 
emocionais e busca de sentido para compreender o que se passa. 
Investigamos como essas experiências contribuem para que os 
estudantes construam sentidos coletivos da vivencia escolar, e 
se daí resulta algum endereçamento à direção ou aos professores 
da escola.
A pesquisa empírica junto aos jovens estudantes
Os resultados apresentados aqui fazem parte de um projeto 
de pesquisa mais abrangente que visou investigar os modosde participação dos estudantes, crianças e jovens, nas escolas 
públicas e privadas do Rio de Janeiro. Nessa investigação, vários 
procedimentos metodológicos foram utilizados, compondo um 
processo de investigação como “teoria embasada empiricamente” 
(Glaser & Strauss, 1979), quando a análise dos resultados de cada 
etapa da investigação possibilita o desenho da etapa seguinte de 
modo a um aprofundamento das questões de interesse teórico.
No presente trabalho focamos alguns dos resultados obtidos 
junto ao grupo de 1.291 jovens com idades entre 13 e 21 anos 
matriculados em escolas públicas (municipais, estaduais e 
federais) e particulares do Rio de Janeiro. Embora a investigação 
principal tenha abarcado outros procedimentos, aqui nos 
utilizamos dos resultados da aplicação de um questionário de 
respostas fechadas construído a partir das entrevistas realizadas 
em etapa anterior da pesquisa. Além dos resultados obtidos por 
meio dos questionários, utilizamos as análises das discussões 
em grupos focais sobre algumas perguntas que consideramos 
mais relevantes do questionário.
Os questionários continham 14 perguntas sobre aspectos 
teoricamente relevantes da participação do jovem na escola, 
como: a natureza de seu vínculo à escola; sua forma de dar 
opinião; sua visão sobre o que precisaria mudar na escola; os 
principais problemas da escola; os tipos de constrangimento que 
os alunos sofrem; as formas de reagir ao constrangimento; em 
quais decisões escolares os estudantes deveriam participar; a 
relação dos estudantes com as questões da cidade e do mundo; 
sua visão sobre a política e os políticos. O questionário continha 
cinco a oito opções de respostas, conforme o caso, e apenas uma 
Politizar as relações entre jovens e adultos?
362
resposta poderia ser assinalada por questão. Em forma de um 
caderno ilustrado dado a cada estudante, ele foi aplicado nas salas 
de aula, a todos os jovens que quiseram participar, após uma 
explicação inicial dada por uma pesquisadora assistente sobre 
o que tratava a pesquisa. Todos os outros cuidados relevantes à 
ética em pesquisa com crianças foram observados.
Os grupos de discussão com os jovens foram realizados após 
uma análise parcial dos resultados dos questionários. Alguns 
resultados pareciam sugerir linhas distintas de interpretação, 
demandando um maior aprofundamento. Assim, optou-se por 
conduzir grupos focais de discussão sobre essas perguntas 
levando-se aos jovens os próprios resultados parciais obtidos 
para que eles pudessem comentá-los e discutí-los.
Com o intuito de discutirmos a emergência de um ‘nós 
estudantil’ na escola, a análise a seguir incidiu sobre três 
aspectos principais: o enquadramento do agir do jovem na 
escola; a construção de um ponto de vista do estudante; e, o 
perfil político-ideológico do jovem e sua atuação na escola. 
Exploramos as vias pelas quais os jovens tentam transcender 
o lugar unívoco de aprendiz subordinado à voz e comando do 
professor para construir a experiência escolar de um ponto de 
vista distinto. Os aspectos ressaltados mostram a complexidade 
das interações entre jovens e adultos na escola, na medida em 
que outras demandas juvenis se acrescem àquelas de aprender, 
se dar bem na escola e conquistar a aprovação dos mais velhos.
O enquadramento do agir do jovem na escola. Estar 
na escola significa responder à demanda dos adultos que 
circunscreve a participação juvenil ao bom desempenho 
acadêmico e, quando muito, à “ajuda” que os estudantes podem 
dar nas atividades extraclasse, como quermesses, comemorações 
escolares, passeios etc. Essa seria uma participação convencional 
e conservadora esperada pelos professores e pela direção fiel aos 
objetivos a que se propõem as escolas de transmitir os conteúdos 
relevantes estipulados pela legislação. Desta forma, a demanda 
escolar modela as condutas estudantis no sentido de obter a 
aquiescência dos jovens em prol de um projeto que se lhes 
impõe. Nem sempre, ou melhor, quase nunca, há concordância 
entre alunos e professores, sendo que o controle disciplinar das 
mentes e dos corpos se torna um fator preponderante para obter 
a adesão dos alunos. Aliado ao efeito coercitivo da disciplina, 
os discursos da capacitação, da obtenção de ganhos futuros e do 
cultivo de si também se juntam como elementos persuasivos da 
legitimação do projeto escolar.
Uma das perguntas do questionário perguntava ao estudantes 
qual, na sua visão, consistia a “situação mais difícil para o aluno 
na escola”. Dentre as respostas elencadas estavam: ser reprovado, 
levar bronca injusta, ser pego colando na prova, desrespeito do 
professor, briga com amigos, traição dos amigos, ter aulas ruins, 
frequentar uma escola suja e ser zoado pelos pares. Todas as 
opções de respostas tinham a ver com situações relatadas pelos 
próprios alunos em uma etapa anterior da pesquisa como sendo 
momentos difíceis que geravam indignação, medo e, ou, revolta. 
Parte das opções retratavam situações difíceis entre pares, 
outra parte entre alunos e seus professores, e outra, aspectos da 
institucionalidade escolar, como regras, ou infraestrutura.
A Tabela 1 mostra a distribuição das percentagens nas 
diferentes opções de respostas segundo o tipo de escola.
Os resultados mostram que para os estudantes de qualquer 
tipo de escola a reprovação escolar consiste, de longe, a situação 
mais penosa na escola (p < 0,0001, da opção reprovação em 
relação a todas as outras opções). Para os alunos, ser reprovado 
significa não corresponder às expectativas escolares e falhar. De 
Tabela 1
Distribuição Percentual das Respostas para a ‘Situação Mais Difícil na Escola’ por Tipo de Escola.
Municipal Estadual Particular Federal Geral
Reprovação 42,1% 42,1% 57,7% 58,1% 47,6%
Bronca injusta 14,3% 7,2% 9,7% 2,9% 10,9%
Ser pego colando 3,3% 1,4% 2,0% 1,0% 2,4%
Brigar com amigo 4,4% 0,5% 2,0% 1,0% 2,8%
Desrespeito do professor 10,1% 22,2% 13,1% 10,5% 13,0%
Traição do amigo 2,9% 2,3% 2,3% 0,0% 2,4%
Escola suja 2,9% 3,6% 1,1% 2,7% 2,6%
Aula ruim 6,2% 15,4% 3,4% 20,0% 8,1%
Ser zoado 12,7% 3,6% 8,3% 3,8% 9,2%
Mais de uma resposta 0,0% 0,9% 0,3% 0,0% 0,3%
Resposta em branco 1,1% 0,8% 0,1% 0,0% 0,7%
Total 100% 100% 100% 100% 100%
 
modo mais significativo para os alunos das escolas particulares e 
federais (p = 0,004), onde o ensino é melhor que nas estaduais e 
municipais, ser reprovado significa não poder repetir de ano na 
mesma escola e o prejuízo financeiro para os pais. Nas discussões 
em grupos focais, procuramos entender o imaginário que cerca a 
reprovação escolar. Essa foi relacionada a várias consequências 
difíceis para os alunos: o atraso em se formar e sair da escola, a 
vergonha frente aos colegas e a perda do convívio estreito com 
eles, o currículo “manchado” com a reprovação e uma possível 
consequência negativa sobre as chances de emprego futuro, a 
bronca dos pais, e ainda, a extensão inútil da vida escolar por 
mais um ano. A reprovação é vista como “um fantasma”, “um 
bicho de sete cabeças” que assombra os estudantes e os deixa 
em vigilância a respeito do que pode acontecer de ruim na 
escola. Nas discussões dos grupos a reprovação foi vista como 
um fracasso pessoal, uma falta de responsabilidade do aluno, 
um “vacilo”, como eles próprios colocam. Foram poucas às 
vezes em que alguma voz, em geral discordante, se aventurava 
L.R.Castro,&E.M.Nascimento
363
em sugerir que as aulas ruins ou a falta de professores tinha a 
ver com a reprovação.
Portanto, tida como a experiência difícil, a reprovação tem, 
certamente, efeitos subjetivantes enquadrando a conduta e as 
disposições juvenis na lógica da subordinação. Ela racionaliza e 
individualiza o processo de transmissão no sentido de determinar 
o empenho pessoal de cada aluno como causa, primeira e 
última, do resultado que ele irá obter. Como os próprios alunos 
relatam, “são os próprios alunos que se reprovam”. Além disso, a 
reprovação dá concretude sancionatória à normatividade escolar 
moralizando as condutas juvenis comoboas, más, adaptadas 
ou não.
Assim, a participação dos estudantes na escola parece estar 
referida a este enquadramento normativo mais amplo sobre o 
qual não há o que se contestar, uma vez que parece legítimo que 
ao não assumir a responsabilidade pelo que devem, estes alunos 
sejam punidos. A reprovação expõe, assim, a lógica do sistema 
na sua inexorabilidade. Além disso, individualiza o sofrimento do 
aluno que deve sozinho arcar com as consequências do seus (mal) 
feitos. Eventualmente, reforça a internalização de valores como 
a competição e o sucesso pessoal como elementos importantes 
para se dar bem na escola.
No entanto, na Tabela 1 também observamos sinais de que o 
sofrimento do aluno tem outras origens, a notar, o desrespeito do 
professor e as broncas injustas. Essas duas opções de respostas, 
cujo percentual é significativamente diferente em relação aos 
demais (p < 0,0001 para todas as outras opções), sinalizam 
que a relação com os mestres é passível de conter injustiças e 
ofensas descabidas. Isso é fonte de sofrimento para os alunos 
que, frequentemente, se queixaram ao longo das discussões nos 
grupos focais, que “contra o professor nada se pode fazer”. Só 
que, mesmo sem poder reagir de forma paritária, o jovem se 
posiciona criticamente, tendo claro para si como um aluno deve 
ser tratado pelo professor. Nas discussões eles observaram que 
não é o fato de levar bronca que os indigna, mas como a bronca 
é dada, por exemplo, de forma autoritária sem que eles possam 
se defender, ser ouvidos ou falar.
Portanto, vemos que em alguns momentos a subordinação 
aos mais velhos só conta com a aquiescência aparente e fingida, 
e não exatamente com a adesão do aluno a uma autoridade 
inconteste. A situação de se ver impossibilitado de contestar 
e se defender gera, por outro lado, raiva e revolta, como 
pudemos observar nos grupos de discussão, o que gera um 
saldo de ressentimento e humilhação nos alunos podendo levar 
a comportamentos destrutivos e explosivos (Palshikar, 2008).
A construção de um ponto de vista do estudante. Uma 
outra pergunta do questionário pedia para os estudantes se 
posicionarem frente à situação de falta sistemática de uma 
professora para alguma disciplina. Essa situação é, infelizmente, 
bastante frequente nas escolas públicas do nosso estado. 
Por meio dessa pergunta objetivamos avaliar as reações dos 
estudantes quando do que consideramos o rompimento do pacto 
educacional. Espera-se, de um lado, que os estudantes estudem 
e cumpram seus deveres como estudantes, e de outro, que a 
escola funcione, os professores deem suas aulas e transmitam 
o conteúdo que os alunos devem aprender. A situação de falta 
sistemática de um(a) professor(a) sinaliza que a base normativa 
que regula e legitima a reciprocidade de relações entre alunos e 
professores se fragiliza frente ao não cumprimento dos deveres 
de uma das partes. Por essa pergunta, também procuramos avaliar 
como uma situação de injustiça pode resultar em movimentos 
coletivos em torno de uma questão comum: não ter as aulas 
de que todos precisam. Sobretudo, a indignação frente a essa 
situação teria uma conotação de ser legítima porque está apoiada 
na demanda de reassegurar o pacto educacional entre as gerações.
As opções de resposta do questionário mapearam as reações 
possíveis que surgiram na etapa anterior da pesquisa, ao longo 
das entrevistas.
Tabela 2
Distribuição Percentual das Respostas para ‘Reação à Falta de Professor’ por Tipo de Escola.
Municipal Estadual Particular Federal Geral
Solução da direção 22,3% 22,2% 13,4% 24,8% 20,1%
Procurar o grêmio 10,4% 8,1% 6,9% 14,3% 9,4%
Distância do problema 20,0% 12,2% 8,9% 8,6% 14,7%
Reclamação com a direção 22,1% 24,4% 31,1% 28,5% 25,5%
Abaixo assinado 25,0% 33,0% 39,4% 23,8% 30,2%
Mais de uma resposta 0,2% 0,0% 0,3% 0,0% 0,1%
Resposta em branco 0,0% 0,1% 0,0% 0,0% 0,0%
Total 100% (615) 100% (221) 100% (350) 100% (105) 100% (1.291)
A Tabela 2 nos mostra que os alunos reagem de modo 
significativamente diferente nesta situação, sendo que a forma 
preferencial de reagir é “fazer um abaixo-assinado para reclamar” 
(p < 0,0001 e p < 0,03). Em segundo lugar, a reação por meio da 
“demandas diretas à direção” também se mostrou significativa 
em relação às demais (p = 0,0004 e p < 0,0001). Interessante notar 
que o recurso à instância ‘grêmio estudantil’ não provou ser uma 
maneira relevante, frente às outras, de reagir frente às injustiças. 
Parece que os grêmios estudantis não estão sendo vistos como 
porta-vozes das reivindicações estudantis nas escolas, públicas 
ou particulares. A opção de resposta “distância do problema” 
pode ser vista como mostrando o nível de envolvimento que 
os alunos não desejam ter com um problema que os afeta. Essa 
não parece ser uma posição endossada pela maioria, embora 
para os estudantes das escolas públicas municipais seja uma 
possibilidade relevante, ainda que o abaixo-assinado venha em 
primeiro lugar.
Estes resultados parecem indicar que nas situações de 
ruptura do pacto educacional os jovens se veem como uma 
força – aglutinada em torno de uma petição coletiva, o abaixo-
Politizar as relações entre jovens e adultos?
364
assinado – insurgente e reivindicativa. Mesmo que esta postura 
divida as opiniões entre os estudantes, ela é, em geral, a que 
mais sobressai para as escolas públicas (municipais e estaduais) 
e particulares. Por outro lado, as opções que reforçam a posição 
de subordinação e apelam à autoridade da direção para resolver 
os problemas que os afetam também foram escolhidas. Sem 
dúvida, há ambivalências e hesitações quanto à formação de um 
‘nós estudantil’ que posicione os jovens fora do enquadramento 
da subordinação. No entanto, podemos afirmar que uma fala do 
ponto de vista do aluno, e construída a partir de seu lugar, se 
esboça mesmo que incipiente.
Uma outra maneira de se acercar da construção do lugar 
de enunciação do estudante diferente daquele originário das 
posições institucionalizadas de poder na escola – a direção e 
os professores, foi trazido por outra pergunta do questionário. 
Nela procuramos avaliar como a opinião do estudante pode ser 
um dispositivo importante para ele construir uma interpretação 
singular da sua experiência escolar alinhada com seu modo 
distinto de viver e estar na escola. Conforme entendemos com 
Rancière, “a opinião não é o espaço homogêneo do pensamento 
menor mas o da disputa sobre o que é pensável sobre uma 
circunstância e sobre as consequências que esse pensamento 
engendra.”(2009, p. 9).
A Tabela 3 nos mostra a distribuição das respostas dos 
jovens à pergunta sobre os modos de dar sua opinião na escola. 
As opções de resposta mostram possibilidades mais afeitas à 
Tabela 3
Distribuição Percentual das Respostas para ‘Formas de Dar Opinião na Escola’ por Tipo de Escola.
Municipal Estadual Particular Federal Geral
Jornal dos alunos 23,4% 19,0% 14,6% 20,0% 20,0%
Conversa direta com autoridades 34,3% 38,9% 48,6% 44,8% 39,8%
Mural de opiniões 29,8% 20,4% 16,3% 13,3% 23,2%
Mediação dos pais 4,4% 1,4% 7,1% 3,8% 4,6%
Não fazer nada 7,8% 19,9% 12,9% 18,1% 12,1%
Mais de uma resposta 0,2% 0,0% 0,5% 0,0% 0,2%
Resposta em branco 0,1% 0,4% 0,0% 0,0% 0,1%
Total 100% (615) 100% (221) 100% (350) 100% (105) 100% (1.291)
construção de um ponto de vista estudantil, como o “jornal dos 
alunos” e o “mural de opiniões” e outras alinhadas à lógica da 
subordinação, como “conversa com as autoridades escolares” e 
“buscar a mediação dos pais”. Do mesmo modo que a pergunta 
anterior, verificamos uma ambivalência grande que se expressa 
na divisão entre uma proporção grande de jovens que busca 
dar sua opinião na escola a partir do referencial adulto, e outra 
equivalente, que busca construir o ponto de vista dos estudantes 
a partir do coletivo de pares.
É importante notar a este propósito que a posição 
diferenciada do jovem enquanto sujeito que pensa e fala, 
expressando um ponto de vista singular sobre sua experiência, 
está ancorada em mecanismos coletivosde expressão: o jornal 
e o mural de opiniões. Ambos requerem, minimamente, uma 
organização e gestão coletivas mesmo que se expressem 
aí opiniões individuais, como no caso do mural, além de 
propiciarem o investimento psíquico na direção da formação de 
um ‘nós estudantil’, como no caso do jornal, que se apresenta 
como algo construído pelos estudantes.
O perfil político-ideológico do jovem e sua atuação na 
escola. Em algumas perguntas do questionário se buscou 
delinear o perfil político-ideológico dos estudantes, configurado 
tanto pelo tipo de escolha de um deputado, como por sua visão 
a respeito das prioridades dos problemas sociais. Esse perfil foi 
relacionado com o modo como os estudantes se posicionavam em 
relação às injustiças na escola, pergunta analisada anteriormente.
Em primeiro lugar, se tentou verificar a relação entre a 
visão dos jovens sobre os problemas sociais e o tipo de escolha 
política que fariam. Utilizou-se para isso um tipo de análise 
estatística não paramétrica chamada “árvore de classificação” 
(Breiman, Friedman, Stone, & Olshen, 1984; Everitt & Hothorn, 
2006) que verifica, através de um processo de particionamento 
recursivo das co-variáveis, como se relacionam as classes de 
resposta das variáveis dependente e independente. Assim, no 
nosso caso, consideramos que a visão sobre a prioridade dos 
problemas sociais consistiu na variável independente, e a escolha 
do deputado, a variável dependente. No questionário, a pergunta 
sobre os problemas sociais tinha oito opções de resposta o que 
tornaria a análise estatística escolhida inviável. No entanto, 
as opções de resposta ofereciam a possibilidade de um certo 
agrupamento temático dos problemas sociais em categorias. 
Optou-se, então, por trabalhar com as opções de respostas 
agrupadas em três categorias: problemas da juventude (incluindo 
as opções sobre drogas, desemprego, pouco acesso à educação, 
criminalização dos jovens), problemas relativos à corrupção e o 
problema do desmatamento da Amazônia. A variável dependente 
consistiu na escolha política de um deputado, o que na pergunta 
do questionário foi trazida por meio de três discursos diferentes: 
um que defendia leis para a educação, outro que arrolava 
melhorias feitas no bairro e outro que defendia a gestão pública 
com honestidade.
A Figura 1 nos mostra que, em um primeiro nível de partição, 
dois grupos distintos de jovens emergem em relação à sua visão 
sobre os problemas sociais: um que prioriza os problemas da 
juventude e outro que engloba aqueles que priorizam o problema 
da corrupção na política e o desmatamento da Amazônia. Esses 
dois últimos se distinguem, em um segundo nível de partição 
dos grupos. De forma absolutamente nítida, esses três grupos 
se diferenciam em relação à sua opção política na escolha de 
um deputado. Todos os jovens (n = 589) que escolheram como 
prioritários os problemas da juventude fazem a opção política por 
um deputado que tem uma plataforma ligada à educação. Todos 
L.R.Castro,&E.M.Nascimento
365
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 1 
Problemas da sociedade e escolha política 
P10
p < 0.001
1
0 {1, 2}
Node 2 (n = 589)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
P10
p < 0.001
3
2 1
Node 4 (n = 118)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
Node 5 (n = 512)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
0: problemas 
da juventude 
2: problema 
da corrupção 
1: desmatamento 
da Amazônia 
2: melhorias 
locais 
0: leis para 
a educação 
1: bom uso do 
dinheiro público 
P10 (variável): problemas da sociedade 
P14 (variável): escolha política 
Figura 1
Problemas da sociedade e escolha política.
os jovens (n = 118) que escolheram como prioritários o problema 
da corrupção, optam pelo deputado que defende as melhorias 
locais. E finalmente, todos aqueles (n = 512) que escolheram o 
desmatamento da Amazônia, tiveram como deputado preferido 
aquele que defendia o bom uso do dinheiro público.
Ora, a priorização dos problemas da juventude indica 
uma identificação dos jovens com suas próprias condições e 
dificuldades de existência – materiais e simbólicas – o que parece 
coerente com a escolha política do deputado que defende a luta 
pela educação. Essa constitui a reivindicação legítima da geração 
mais jovem em relação a mais velha a respeito de seu direito à 
herança cultural. Por outro lado, o desmatamento da Amazônia 
pode ser um problema prioritário para o jovem na medida em 
que ele se desloca de uma identificação com as questões mais 
próximas da sua vida para assumir uma adesão a causas mais 
remotas que talvez não lhe exijam também uma ação. No caso 
desses jovens, também a escolha do deputado recai sobre aquele 
que vai lutar contra os desvios do dinheiro público, o que nos 
parece também um discurso de apelo midiático ao qual muitos 
políticos recorrem que não parece muito propositivo em termos 
das causas e ações para a transformação social. E por fim, 
a preocupação dos jovens com a corrupção como problema 
prioritário se relaciona com sua escolha política de um deputado 
que faz sua plataforma em termos de melhorias locais. O discurso 
moralizante contra a corrupção parece bastante sedutor, assim 
como aquele do deputado que diz que melhorou as ruas de seu 
bairro. Em ambos, a política desaparece porque passa a ser ou a 
“moral dos homens” (Wolff, 2007) pela qual eles são julgados, 
ou a forma de satisfazer interesses locais em detrimento de uma 
visão republicana sobre o destino comum.
Esses resultados parecem convergir com uma outra análise 
realizada em que se buscou relacionar a reação contra a injustiças 
na escola (a falta sistemática de um professor) e os problemas 
sociais considerados prioritários. O mesmo tipo de análise – a 
árvore de classificação – foi utilizada. As opções de resposta na 
variável considerada independente – as reações contra a injustiça 
– também foram agrupadas em três níveis: mobilização dos 
alunos (incluindo as opções, discutir com o grêmio a injustiça e 
organizar um abaixo-assinado); o recurso à direção (incluindo, 
esperar a direção resolver e reclamar com a direção); não fazer 
nada.
A Figura 2 mostra que todos os jovens (n = 700) que 
reagiriam contra a falta do professor pela mobilização dos 
alunos, julgam como prioritários os problemas enfrentados pelos 
jovens (drogas, criminalização, desemprego, falta de acesso à 
educação). Os jovens que escolhem a mobilização dos alunos 
são os que mais diferem dos outros dois, quais sejam, os que 
escolhem não fazer nada perante tal injustiça e os que preferem 
se dirigir à direção ou esperar que ela resolva a questão da falta 
do professor. Todos os jovens (n = 205) que dizem que não 
fariam nada, veem como problema social mais preocupante o 
da corrupção. E todos os jovens (n = 314) que usariam o recurso 
à direção para a falta do professor, veem como problema mais 
grave o desmatamento da Amazônia.
Parece se confirmar que a identificação dos jovens com os 
problemas que os afligem diretamente, encaminhando talvez uma 
“visão coletiva de si mesmos”, está relacionada à construção 
de um ponto de vista coletivo dos estudantes na escola sobre 
as dificuldades que eles sofrem. Por outro lado, o grupo dos 
que preferem se omitir frente à injustiça, não fazendo nada, 
considera como o problema mais grave a corrupção. Interessante 
notar como o problema da corrupção se conjuga com uma 
contemplação da política vista como uma atividade do outro, o 
político; por isso mesmo, os que acham que esse é o problema 
Politizar as relações entre jovens e adultos?
366
Figura 2
Reações à falta do professor e problemas da sociedade.
 
 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 2 
Reações à falta do professor e problemas da sociedade 
 
P8
p < 0.001
1
0 {1, 2}
Node 2 (n = 700)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
P8
p < 0.001
3
2 1
Node 4 (n = 205)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
Node 5 (n = 314)
0 1 2
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
2: não fazer nada 
P8 (variável): reação à falta de professor 
P10 (variável):problemas da sociedade 
0: mobilização dos 
alunos abaixo assinado 
1: recurso à direção 
0: problemas 
da juventude 
2: problema da 
corrupção 
1: desmatamento 
da Amazônia 
social mais grave não querem se comprometer com as injustiças 
da vida cotidiana. Os jovens que escolhem o desmatamento da 
Amazônia como problema mais grave se preocupam com uma 
questão relevante, mas que está distante do seu dia a dia, cuja 
dimensão é, frequentemente, fabricada segundo o repórter de 
plantão. O que se quer assinalar é que existe um distanciamento 
real do jovem em relação a essa questão. Esses jovens preferem 
reagir frente a falta do professor recorrendo à direção: ainda que 
manifestem sua insatisfação e reajam, não ousam arriscar e/ou 
subverter sua posição de estudantes, reiterando a ordenação 
cristalizada de lugares sociais na escola.
Considerações finais
Procuramos neste trabalho por em evidência a potencialidade 
política do espaço escolar que se manifesta na construção, 
ainda que tentativa e ambivalente, de um ponto de vista dos 
estudantes sobre sua experiência na escola. Vemos que a lógica 
da subordinação enquadra prevalentemente seu agir na medida 
em que a sanção da reprovação, de um lado, e os discursos 
individualizantes da capacitação e do sucesso futuro, modelam 
os processos de subjetivação do jovem na escola.
No entanto, para além do remanso que se pretende 
harmonioso nas relações entre jovens e adultos na escola, a 
construção de um ponto de vista dos estudantes explicita uma 
separação e uma afirmação de si que levam a embates e conflitos. 
Vemos, nesta pesquisa, que os movimentos insurgentes, mesmo 
que modelados pelo medo da retaliação, enunciam um lugar 
distinto de interpretação da situação escolar daquele fornecido 
pela posição de subordinação como aluno. Esse lugar ancora-se 
sobre uma visão coletiva do jovem sobre si, mas, o que parece 
mais importante, ele é capaz de articular de modo significativo 
seu modo de agir na escola com um perfil político-ideológico 
claro que traduz opções políticas condizentes com demandas e 
interesses da geração mais nova.
Referências
Alderson, P. (2000). School students’ views on school councils and daily life at 
school. Children & Society, 14, 121-134.
Arendt, H. (2003). A condição humana (10a ed.). Rio de Janeiro: Forense.
Arendt, H. (2007). Entre o passado e o futuro. São Paulo: Editora Perspectiva.
Beck, U., & Beck-Gernsheim, E. (2002) Individualization: Institutionalized 
Individualism and its Social and Political Consequences. Londres: Sage.
Breiman, L., Friedman, J. H., Stone, C. J., & Olshen, R. A. (1984) Classification 
and Regression Trees. California: Wadsworth.
Castro, L. R. (2008). Participação política e juventude: Do mal-estar à 
responsabilização frente ao destino comum. Revista de Sociologia e Política, 
30, 253-269.
Castro, L. R., & Mattos, A. (2009). O que a política tem a ver com a transformação 
de si? Considerações sobre a ação política a partir da juventude. Análise 
Social, 44, 193, 787-817.
Cellier, H. (2001). Citoyenneté, école et projets fédérateurs: nouvelle coherence 
sociale? Quelle citoyenneté à l’école? In A. Vulbeau (Org.), La jeunesse 
comme resource (pp.187-198). Paris: Éres.
Dayrell, J. (2001). Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: 
UFMG.
Devine, D. (2002). Children’s citizenship and the structuring of adult-child 
relations in the primary school. Childhood, 9(3), 303-320.
Everitt, B. S., & Hothorn, T. (2006). A handbook of statistical analyses using R. 
Boca Raton, Fl: Chapman & Hall/CRC Press.
Forbrig, J. (Org.) (2005). Revisiting youth political participation: challenges 
for research and democratic practice in Europe. Strasbourg: Council of 
Europe Publishing.
Glaser, B., & Strauss, A. (1979). The discovery of grounded theory. Nova Iorque: 
Aldine.
L.R.Castro,&E.M.Nascimento
367
Lei estadual 1949/1992 do Rio de Janeiro (1992, 08 de janeiro) Assegura a livre 
organização dos estudantes na forma que menciona. Recuperado de http://
www.mortalcombate.net/Leiestadual1949.htm
Lei federal 7.398/1985 (1985, 04 de novembro) Dispoe sobre a organizacao 
de entidades representativas dos estudantes de 1 e 2 graus e da outras 
providencias. Recuperado de https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/
l7398.htm
Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. (1996, 23 de dezembro). Estabelece as 
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, seção 1.
Mayorga, C., Castro, L. R., & Prado, M.A.M. (2012). Juventude e a experiência 
da política no contemporâneo. Rio de Janeiro: Contra-capa/Faperj.
Muller, F. (2008). Socialização na escola: transições, aprendizagem e amizade 
na visão das crianças. Educar em Revista, 32, 123-141.
Norris, P. (2001). Democratic Phoenix: political activism worldwide. Cambridge: 
Cambridge University.
Novaes, R. (2002). Juventude e participação social: apontamentos sobre a 
reinvenção da política. In H. Abramo, M. Freitas & M. Sposito. (Orgs.), 
Juventude em debate (pp. 46-69). São Paulo: Editora Cortez.
Pais, J. M. (2005) ‘As múltiplas “caras” da cidadania’. In L. R. Castro & J. Correa 
(Orgs.), Juventude contemporânea: perspectivas nacionais e internacionais 
(pp. 107-133). Rio de Janeiro: Editora Nau.
Palshikar, S. (2008). Understanding humiliation. In G. Guru (Org.), Humiliation: 
claims and contexts (pp.79-92). Delhi: Oxford.
Pleyers, G. (2010) Alter-globalization: becoming actors in the global age. 
Cambrige: Polity Press.
Rancière, J. (1995). Politics, identification and subjectivization. In J. Rajchman 
(Org.), The identity in question (pp. 63-72). Nova Iorque: Routledge
Rancière, J. (1996). O desentendimento. São Paulo: Editora 34.
Rancière, J. (2009). Moments politiques. Paris: La Fabrique.
Riley, S., Morey, Y., & Griffin, C. (2010) ‘The ‘pleasure citizen’: analyzing 
parting as a form of social and political participation’, Young, 18(1), 33-54.
Wolff, F. (2007). Esquecimento da política ou desejo de outras políticas? In A. 
Novaes (Org.), O esquecimento da política (pp. 107-126). Rio de Janeiro: 
Agir.
Nota
1. Agradecemos o financiamento do CNPq e FAPERJ.
Lúcia Rabello de Castro, Ph.D em Psicologia pela Universidade de Londres, com pós-doutorado no 
Centro de Estudos de Sociedades em Desenvolvimento em Delhi (India), é professora Titular do Instituto 
de Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 
Bolsista Produtividade do CNPq. Endereço para correspondência: NIPIAC Instituto de Psicologia, Pavilhão 
Nilton Campos, Av. Pasteur, 250, Rio de Janeiro, RJ – Brasil, CEP: 22290-902 Caixa Postal 56056 – CEP: 
22290-970. Telefone/Fax: +55 (21) 2295-3208. E-mail: lrcastro@infolink.com.br
Emilia Matos do Nascimento, Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, é professora Colaboradora do Instituto de Matemática,Universidade Federal do Rio de Janeiro e da 
Hemo-Rio. E-mail: emiliamatos@yahoo.com
Recebido em 11. Nov. 12
Revisado em 02. Jun. 13
Aceito em 03. Jun. 13
Politizar as relações entre jovens e adultos?

Mais conteúdos dessa disciplina