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A EVASÃO DA E NA ESCOLA: AS EXPERIÊNCIAS DE VIDA DOS JOVENS EVADIDOS DA EJA

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UNIVERSIDADE FEEVALE 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO 
EM DIVERSIDADE CULTURAL E INCLUSÃO SOCIAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ROSANA SILVEIRA DORNELES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A EVASÃO DA E NA ESCOLA: AS EXPERIÊNCIAS DE VIDA DOS JOVENS 
EVADIDOS DA EJA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Novo Hamburgo 
2018 
ROSANA SILVEIRA DORNELES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A EVASÃO DA E NA ESCOLA: AS EXPERIÊNCIAS DE VIDA DOS JOVENS 
EVADIDOS DA EJA 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Diversidade Cultural e Inclusão 
Social da Universidade Feevale como requisito 
a obtenção título de Mestre em Diversidade 
Cultural e Inclusão Social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Prof.ª Dr.a Lisiane Machado de Oliveira Menegotto 
 
 
 
 
Novo Hamburgo 
2018 
 
ROSANA SILVEIRA DORNELES 
 
 
 
 
A EVASÃO DA E NA ESCOLA: AS EXPERIÊNCIAS DE VIDA DOS JOVENS 
EVADIDOS DA EJA 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Diversidade Cultural e Inclusão 
Social da Universidade Feevale como requisito 
a obtenção título de Mestre em Diversidade 
Cultural e Inclusão Social. 
 
 
Aprovado em __/__/____ 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
______________________________________________________________________ 
Prof.ª Dr.ª Lisiane Machado de Oliveira Menegotto (Orientadora) 
Universidade Feevale 
 
______________________________________________________________________ 
Prof.ª Dr.ª Eliana Perez Gonçalves de Moura 
Universidade Feevale 
 
______________________________________________________________________ 
Prof.ª Dr.ª Helena Venites Sardagna 
Universidade Estadual do Rio Grande do Sul 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Aos sonhos, sobretudo aos sonhos dos jovens 
pobres, que mesmo parecendo tão distantes se 
fazem presentes no olhar destes que lutam por 
eles em batalhas desiguais. Quisera eu que os 
sonhos destes jovens fossem assim realizados, 
como hoje realizo o meu. Fica aqui minha 
dedicação para que esses sonhos se realizem! 
AGRADECIMENTOS 
 
Sozinha, esta conquista não seria possível! 
Por isso, começo agradecendo ao meu pai (in memoriam) que nos deixou meses antes 
do meu ingresso no mestrado. Homem que me deixou de herança o que há de mais 
importante, valores humanos. Sei que fizeste de tudo, enquanto estava neste plano, para que 
seguisse os meus estudos. Sei do teu orgulho aí de cima pai, e fico feliz em poder estar 
correspondendo todo teu esforço e dedicação. 
À minha mãe um agradecimento especial, por compreenderes minha distância física, 
em momentos que mais precisou de mim. Volto-te a olhar, mãe, agora com mais tempo, e 
vejo que ele passa depressa demais. Obrigada por sua luta, por acreditar em mim, por ter 
sempre me exigido o melhor. Obrigada por me autorizar a sonhar, a voar! Prometo-te sempre 
valer a pena cada suor teu derramado! 
Aos meus irmãos, Marta e Cito, e a minha cunhada, Nega, que são meus amigos fiéis e 
que se mantiveram na torcida, obrigada! 
Agradeço a Jô, que inscreveu em mim o desejo de “ser mais”, no sentindo freiriano, 
agradeço pelo apoio para o ingresso no mestrado. 
Muito obrigada aos meus amigos, àqueles que permaneceram à minha espera, 
compreendendo que o afastamento tinha uma causa sensível e de extrema relevância. Um 
agradecimento especial a Rose, ao Japa, a Dani e a Carol. 
A minha colega Tati, meu presente do mestrado. Obrigada por sua amizade, pelas 
trocas, pela cumplicidade. 
Ao grupo de colegas “Sou Vagabundo eu Confesso”, Rosa, Chiquinho, Sílvia e Orson, 
que deram mais sabor e cor a estes dois anos. Obrigada por me proporcionarem momentos tão 
bons e inesperados. 
Obrigada às professoras Eliana e Helena, que aceitaram prontamente compor a banca 
deste trabalho e que contribuíram de forma muito enriquecedora durante a qualificação. 
Agradeço a minha orientadora Lisiane, que me acolheu tão bem desde o nosso 
primeiro contato. Agradeço por ter me aceitado como orientanda, ter acreditado no meu 
potencial, por ter compartilhado seus conhecimentos e por toda dedicação para comigo. A tua 
postura, comprometida e sensível às minhas angústias, me deu segurança nesse desafio. 
Trilharemos, ainda juntas, novos caminhos. 
Agradeço de forma muito carinhosa aos quatro jovens que se dispuseram a participar 
da pesquisa. Aprendi muito com vocês e tenho hoje o compromisso de disseminar esse 
conhecimento, em prol de uma educação de qualidade. Espero que nunca deixem de acreditar 
nos seus sonhos e que tão logo possam retornar aos seus estudos. 
Obrigada a escola que abriu as portas para que pudesse desenvolver a pesquisa. Um 
agradecimento especial a Hilde e a Ana Paula, por toda receptividade e disponibilidade. 
E por fim, não menos importante, agradeço a uma força, a uma energia que me 
acompanha e que me protege. Obrigada, Deus! 
 
RESUMO 
 
A dissertação de mestrado, oriunda do Programa de Pós-Graduação em Diversidade Cultural e 
Inclusão Social, propõe uma reflexão sobre a relação que a Educação de Jovens e Adultos - 
EJA - estabelece com os alunos jovens, na intenção de problematizar essa modalidade de 
ensino como um espaço de construção de cidadania, de empoderamento na luta pelos direitos 
civis, políticos e sociais. No entanto, fragilizada, na medida em que vem perdendo a 
juventude para a evasão escolar. Assim, o estudo tem como objetivo investigar sobre os 
caminhos seguidos pelos jovens e as especificidades que permeiam esses percursos, 
considerando a evasão da EJA. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, do tipo 
estudo de caso, que se utilizou da entrevista não-diretiva como instrumento para a coleta dos 
dados. O tratamento dos dados ocorreu a partir da análise de conteúdo que oportunizou a 
definição da inclusão e exclusão, como macrocategorias de análise; a pobreza, a escola e o 
trabalho como categorias de análise; e o feminino e a Igreja como microcategorias de análise. 
À luz dos aportes teóricos referendados, a pesquisa sinaliza que anteriori a inserção dos 
jovens na EJA, estes perpassam por processos de exclusão no sistema educacional, já na 
escola regular diurna. Embora tenham consciência da importância da conclusão de seus 
estudos, evadem na EJA devido às desigualdades sociais enfrentadas durante suas vidas, 
materializadas através da necessidade de trabalhar, da gravidez precoce e da entrada para o 
mundo do crime. A pesquisa descortina inusitadamente que há atravessamentos do feminino e 
da Igreja na vida dos jovens após a última evasão escolar e que estes encontram nesses 
artefatos sentido e sonhos para suas vidas. Tal cenário aponta a necessidade de refletir sobre 
uma educação, desde a escola regular diurna, que trate a inclusão social como possibilidade 
mudança na sociedade, que sofre com as desigualdades. Também de repensar os objetivos da 
EJA, que vão para além da escolarização, na intenção de compreender a necessidade de 
acolher e dialogar com a juventude nesta modalidade de ensino. 
 
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Jovem. Evasão. Inclusão. Exclusão. 
ABSTRACT 
 
This master’s thesis, deriving from the Graduate Program in Cultural Diversity and Social 
Inclusion, offers a debate on the relation that Youth and Adult Education establishes with 
young students, discussing such teaching method as an environment for the construction of 
citizenship and for empowerment in struggles for civil, political, and social rights. 
Nonetheless, such education has been undermined as it loses young students to school 
evasion. Thus, the present work aims at investigating the paths taken by these students and the 
specificities presented by such paths concerning the Youth and Adult Education evasion. This 
is achieved through a qualitative approach, such as a case study, using unstructured interviews 
as a tool for collecting data. Data handling stemmed from content analysis, which allowed the 
definitions of inclusion and exclusion as macro-categoriesof analysis; poverty, school, and 
job as categories of evaluation; and feminine and Church as micro-categories of analysis. In 
the light of the theoretical references substantiating this thesis, the research points out that 
before entering the Youth and Adult Education program, students had already suffered 
processes of exclusion from the educational system when in regular day school. Even though 
students understand the importance of finishing their studies, they evade the program due to 
social inequalities faced throughout their lives, materialized in their need to work, in an early 
pregnancy, or in involvement in criminal activities. Unexpectedly, the research uncovered 
crossovers of the feminine and of the Church in the life of young people after the last school 
evasion, which lead them to find meaning and dreams for their lives. Such scenario points to 
the need for thinking about an education, since regular day school, that considers social 
inclusion as a possibility of change in society, which suffers under inequalities. In addition, 
there is also need for rethinking the goals of the Youth and Adult Education programs in the 
sense that such goals should extend beyond schooling to embrace and engage the youth in this 
teaching method. 
 
Key words: Youth and Adult Education. Youth. Evasion. Inclusion. Exclusion. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
O inédito-viável nos diz, claramente, que não há o reino do definitivo, 
do pronto e do acabado; do nirvana da certeza e da quietude perfeita 
dos sonhos possíveis. Ele se nutre da inconclusão humana, não tem 
fim, um termo definitivo de chegada. É sempre, pois devenir, pois 
alcançado o inédito viável pelo qual sonhamos e lutamos, dele mesmo, 
já não mais um sonho que seria possível, mas o sonho possível 
realizando-se, a utopia alcançada, ele faz brotar outros tantos inéditos 
viáveis quantos caibam em nossos sentimentos e em nossa razão 
ditadas pelas nossas necessidades mais autênticas. Isso diante da 
dinâmica que eles implicam porque sendo palavra/práxis eles estão 
radical e essencialmente ligados ao que há de mais ontologicamente 
humano em nós: a esperança do e nos movimentos de 
aperfeiçoamento de nós mesmos e de nosso construir social-histórico 
para a paz, a justiça e a democracia (FREIRE, 2010, p. 225). 
LISTA DE FIGURAS 
 
Figura 1 - Macrocategorias, Categorias e Microcategorias de análise ......................... 85 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
Gráfico 1 - Panorama da EJA no município de Novo Hamburgo .................................. 18 
Gráfico 2 - Matrícula inicial da escola pesquisada no 1º semestre de 2016 ................... 19 
Gráfico 3 - Evasões da escola pesquisada no 1º semestre de 2016 ................................ 20 
Gráfico 4 - Reprovações da escola pesquisada no 1º semestre de 2016 ......................... 21 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
Quadro 1 - Sínteses dos resultados dos seis Estudos selecionados .......................................... 37 
Quadro 2 - Categorias de análise dos Estudos selecionados .................................................... 39 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
DA JUSTIFICATIVA À INTRODUÇÃO: A NOSSA INVISIBILIDADE COMO 
DESENCADEADORA DA PESQUISA ............................................................................... 16 
1 A EVASÃO ESCOLAR NA EJA: O RETRATO DOS PROCESSOS HISTÓRICOS E 
DE EXCLUSÃO DO SISTEMA EDUCACIONAL ............................................................ 25 
1.1 DA COLONIZAÇÃO À DEMOCRATIZAÇÃO: TECENDO A HISTÓRIA DE 
SECUNDARIZAÇÃO DA EJA ............................................................................................... 25 
1.2 OS PROCESSOS DE EXCLUSÃO E A EVASÃO ESCOLAR ....................................... 33 
1.3 A EVASÃO ESCOLAR NA EJA: O QUE OS ESTUDOS SUGEREM? ......................... 36 
1.3.1 Gestão Democrática ......................................................................................................... 39 
1.3.2 Educação Popular ............................................................................................................ 42 
1.3.3 Fracasso Escolar .............................................................................................................. 44 
1.4 FRACASSO ESCOLAR: APROXIMANDO A LENTE ................................................... 45 
2 A MINHA, A TUA, A NOSSA: DE QUAL JUVENTUDE ESTAMOS FALANDO NO 
CONTEXTO DA EJA? .......................................................................................................... 52 
2.1 O JOVEM-ADOLESCENTE COMO SUJEITO DE DIREITOS NA EJA ....................... 54 
2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS E GESTÃO PARA A JUVENTUDE NA EJA ......................... 63 
2.3 O PERFIL JOVEM NA EJA .............................................................................................. 66 
2.4 O JOVEM NA EJA: INCLUÍDO OU EXCLUÍDO? ......................................................... 69 
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ..................................................................... 74 
3.1 MAPEANDO OS CAMINHOS INVESTIGATIVOS: A PESQUISA QUALITATIVA . 74 
3.2 DO PROCEDIMENTO: ESTUDO DE CASO .................................................................. 76 
3.3 A ENTREVISTA NÃO-DIRETIVA E O DIÁRIO DE CAMPO COMO DIPOSITIVOS 
PARA COMPOR AS NARRATIVAS DOS SUJEITOS DA PESQUISA .............................. 77 
3.4 CARACTERIZANDO O CAMPO EMPÍRICO ................................................................ 81 
3.5 A ANÁLISE DE CONTEÚDO .......................................................................................... 82 
4 PISANDO EM SOLO FÉRTIL: O CONTATO COM O EMPÍRICO .......................... 87 
4.1 NUNCA ME SONHARAM: A INCLUSÃO X EXCLUSÃO E SEUS 
DESDOBRAMENTOS NO CONTEXTO DA POBREZA, DA ESCOLA E DO TRABALHO 
DOS JOVENS EVADIDOS DA EJA ...................................................................................... 91 
5 AS IMPLICAÇÕES DO FEMININO E DA IGREJA NOS CAMINHOS SEGUIDOS 
PELOS JOVENS .................................................................................................................. 119 
5.1 O QUE QUER A (JOVEM) MULHER (POBRE)? ......................................................... 119 
5.2 “REVISÃO DE VIDA”: A IGREJA COMO SALVADORA DOS JOVENS ................. 127 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS: O OLHAR PANORÂMICO SOBRE A PESQUISA .. 135 
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 140 
APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
 ................................................................................................................................................ 153 
 
 
16 
DA JUSTIFICATIVA À INTRODUÇÃO: A NOSSA INVISIBILIDADE COMO 
DESENCADEADORA DA PESQUISA 
A presente pesquisa trata de um estudo que é fruto de inquietações que me ocorrem na 
posição de docente, gestora pedagógica e pesquisadora, no que se refere aos jovens da classe 
popular no campo da educação. A juventude, ao mesmo tempo em que é vista cotidianamente 
na escola pelo seu tom “barulhento”, pode facilmente se tornar invisível em seu potencial de 
criação, gerando, nesse cenário, problemas de convivialidade e rótulos, que, por sua vez, 
estereotipam e excluem de maneira hostil esses jovens da escola. 
Assim, faço uso das palavras de Veiga-Neto (2002, p.23, grifo nosso) para dizer por 
onde tudo começou: 
Todos nós que hoje exercemos a docência ou a pesquisa em Educação tivemos uma 
formação intelectual e profissional nos moldes iluministas. [...] penso que se deve 
desconfiar das bases sobre as quais se assentam as promessas e as esperanças nas 
quais nos ensinam a acreditar. Tudo indica que devemos sair dessas bases, para 
de fora, examiná-las e criticá-las. 
Sair da base, foi, de certa forma, o ocasionador de um turbilhão de questionamentos e 
de problematizações.Minha inserção temporária e esporádica na Educação de Jovens e 
Adultos, como Coordenadora Pedagógica, oportunizou que visse na outra ponta o problema 
que se inicia no meu consolidado campo de atuação profissional, nas séries iniciais do ensino 
regular. 
Fui lotada em uma escola de EJA após ter sido remanejada para o cumprimento da 
minha carga-horária de trabalho, uma vez que necessitava compensar dois turnos ausentes na 
escola de origem, para fins de estudo no mestrado. Ingressei no novo espaço a contragosto, 
pois a falta de experiência de trabalho nessa modalidade de ensino, a falta de tempo para me 
apropriar de suas demandas e as poucas horas que estaria exercendo a função soavam-me 
como limitadores para desempenhar um trabalho de qualidade. Hoje, compreendo que o 
sofrimento em me deslocar à EJA resultou de pré-conceitos que tinha sobre esta modalidade, 
quando a Secretaria de Educação dá eco ao meu sentimento de “não tem para aonde ir, então 
vai pra lá”. 
 Embora tenha sido muito bem acolhida pelos colegas e pela Equipe Diretiva, senti-me 
por um tempo invisível enquanto profissional, suportando, apenas, essa invisibilidade ao 
passo que ia compreendendo que minha passagem por “lá” não seria neutra. 
Assim, mapeia-se uma trajetória curta, mas que proporcionou o tempo necessário para 
enxergar os sujeitos que, como eu, eram invisíveis e pareciam estar na escola também a 
17 
contragosto. Refiro-me nesse contexto aos alunos jovens, mais especificamente dentre 15 a 20 
anos, que dialogavam comigo entre olhares marcados por uma empatia que apontavam para 
um sentimento de desamparo compartilhado, muitas vezes rompendo as regras como pedido 
de atenção. 
[...] as imagens que o mundo, principalmente, social, apresenta, a rigor, ele não 
apresenta isentamente, isto é, é o olhar que botamos sobre as coisas que, de certa 
maneira, as constitui. São os olhares que colocamos sobre as coisas que criam os 
problemas do mundo. Em outras palavras, não há problemas em si – seja de natureza 
científica, filosófica, estética, social, etc. – pairando numa exterioridade, inertes em 
um grande depósito à sombra, à espera de serem, antes, encontrados pela luz que 
lançamos sobre eles e, depois, solucionados pela razão (VEIGA-NETO, 2002, p. 
30). 
Sobre o olhar de cumplicidade com relação a estes jovens, por estar na mesma 
condição de invisibilidade e, sobretudo, sobre um olhar “inadaptado” à EJA, podendo-se 
dizer, sem estar viciado à rotina e percalços, inicia-se o processo de problematização da 
juventude na EJA. 
Como atuante em uma escola de séries iniciais de ensino fundamental, percebo que os 
adultos desse espaço passam a ver os alunos que vão entrando na adolescência como alunos 
indisciplinados, descomprometidos já nesta etapa do ensino quando esses começam a ganhar 
corpos, atitudes e jeitos não mais condizentes com a infância. A intenção nesse contexto é 
enquadrá-los em um estereótipo de aluno, que não se relaciona com as vivências, desejos e 
extravagâncias da adolescência que se inicia. Os processos de exclusão começam por aqui, 
pois a recusa desses adolescentes ao “enquadramento” é reforçada através das 
multirrepetências, evasões e revoltas. 
A EJA passa a ser uma nova opção para a escola regular diurna que não mais dialoga 
com esses alunos e para quem ainda tem o desejo em terminar seus estudos. No entanto, nessa 
modalidade de ensino o problema se torna ainda maior. Os jovens migrados da escola “do 
dia” para a “da noite” já carregam marcas de uma instituição excludente e segregadora. Já 
percebem para qual “time” os professores jogam e já estão fartos dos mesmos discursos, nada 
dialógicos com a realidade vivida por muitos deles. Fala-se de outro lugar, em um outro 
tempo. A escola, que antes exigia que esses alunos mantivessem uma postura infantil, quando 
adolescentes, alegando que eles estivessem cada vez mais precoces, agora requer atitudes 
adultas, pois justifica ser uma modalidade de ensino que historicamente se constituiu para 
atender adultos em processo de alfabetização. A juventude, nesse paradoxo, não é percebida 
com suas especificidades e necessidades, e se torna invisível a partir do momento que ora 
18 
“exigem-me ser criança” e que ora “exigem-me ser adulto”. Quando posso ser jovem na 
escola? 
Muitos sujeitos acabam abandonando, ainda no início da adolescência, a escola diurna 
em decorrência, na maioria das vezes, de questões indisciplinares, de multirrepetência, de 
fracasso escolar ou da necessidade de trabalhar para auxiliar a família. Acabam, na sequência, 
procurando a Educação de Jovens e Adultos, que, a partir de suas especificidades construídas 
sobre o enfoque de uma educação voltada aos adultos trabalhadores, não oportuniza o 
acolhimento necessário para mantê-los na escola. Nesse viés, vem-se descortinando a temática 
de pesquisa que se preocupa com esses sujeitos que não gozam de seus direitos garantidos por 
lei, em específico o direito pela educação; preocupa-se com a escola da EJA, que apresenta 
grandes estatísticas de matrículas, evasões e reprovações de alunos ainda muito jovens, e 
sobretudo, preocupa-se com o caminho trilhado por esses após o abandono da escola. 
Para fins de contextualizar as problemáticas apontadas acima, já no contexto do 
empírico, apresentar-se-á dados estatísticos sobre matrículas, reprovações e evasões da EJA 
no município de Novo Hamburgo e da instituição escolar pesquisada. A escola escolhida para 
ser desenvolvida a pesquisa é municipal, situada na cidade de Novo Hamburgo, região 
metropolitana de Porto Alegre. Sua escolha se concebeu pelo fato da minha passagem pelo 
espaço, de problematizações decorrentes dela e pela escola se constituir, dentre as quatro 
escolas que atendem EJA no município, a que mais matricula jovens, objeto de estudo da 
presente pesquisa. 
Usei-me dos dados disponibilizados pela Secretaria Municipal de Educação, entre o 
segundo semestre de 2014 ao primeiro semestre de 2016. Os dados a seguir se referem às 
quatro escolas municipais que atendem a EJA, sem a distinção de adultos e jovens. 
 
 
 
 
 
 
 
 
19 
Gráfico 1 – Panorama da EJA no município de Novo Hamburgo 
Fonte: A autora (2017) 
 
A partir da leitura do Gráfico 1, é possível perceber que houve um aumento de 
matrículas na EJA, levando em consideração o 2º semestre de 2014. O mesmo ocorreu com as 
reprovações que representam, respectivamente, 14,50%; 18,32%; 23,49% e 23,99% por 
período letivo. No que se refere às evasões, não se observou uma diminuição expressiva, 
obtendo, respectivamente, 27,51%; 35,48%; 25,20% e 28,22% de desistência dos alunos, por 
período letivo. 
Já para fins de contextualização da escola em pesquisa, no que diz respeito à matrícula 
dos jovens adolescentes, à evasão e à reprovação escolar, usei-me dos dados disponibilizados 
pela secretaria da instituição, através do Sistema Integrado de Gestão Administrativa 
Municipal (SIGAM), no período em que estive presente na escola. 
 
 
 
 
 
 
 
 
407
606
498
542
93
171
95
114
59
111 117
130
0
100
200
300
400
500
600
700
2º sem/2014 1º sem/2015 2º sem/2015 1º sem/2016
Matrícula Reprovações Evasões
20 
 
Gráfico 2 – Matrícula Inicial da Escola Pesquisada no 1º semestre de 2016 
 
Fonte: A autora (2017) 
 
A 2ª Etapa é composta por alunos em processo de alfabetização, caracterizando-se por 
serem alunos adultos e idosos, multirrepetentes ou com deficiência intelectual. Assim, 
constata-se que, devido ao fato de não haver jovens adolescentes na Etapa referida, esses 
adentram a EJA oriundos da escola diurna e já alfabetizados. Quando contabilizado o total de 
alunos matriculados na escola, temos uma representação de 67% de jovens adolescentes, 
estatística que aumenta para 75% quando se leva em consideração apenas os alunos a partir da 
3ª Etapa. 
 
 
 
 
 
 
 
 
0
5
10
15
20
25
30
2ª Etapa 3ª Etapa 4ªEtapa 5ª Etapa 6ª Etapa
Adolescentes Adultos
21 
 
 
Gráfico 3 – Evasões da Escola Pesquisada no 1º semestre de 2016 
0
1
2
3
4
5
6
2ª Etapa 3ª Etapa 4ª Etapa 5ª Etapa 6ª Etapa
Adolescentes Adultos
 
Fonte: A autora (2017) 
 
O Gráfico 3 possibilita analisar que 14% dos alunos evadem a escola e que 13% do 
total de jovens adolescentes matriculados no início do período letivo não concluem seus 
estudos. As evasões se concentram em maior quantidade na 4ª Etapa e na 5ª Etapa, podendo 
ser analisado o fato dos alunos terem maior persistência na frequência, no início das suas 
inserções na EJA e no semestre que antecede a formatura. Cabe destacar que as estatísticas 
apresentadas poderiam ser mais elevadas caso houvesse um investimento da Equipe Diretiva 
para o retorno dos alunos, conforme observado por mim, quando compunha o quadro 
funcional da escola. 
 
 
 
 
 
 
22 
0
2
4
6
8
10
12
14
2ª Etapa 3ª Etapa 4ª Etapa 5ª Etapa 6ª Etapa
Adolescentes Adultos
Gráfico 4 – Reprovações da Escola Pesquisada no 1º semestre de 2016 
 
Fonte: A autora (2017) 
 
Já o Gráfico 4 apresenta que 58% dos alunos reprovados são jovens adolescentes. No 
entanto, se levarmos em consideração que na 2ª Etapa, composta apenas por adultos cuja a 
retenção se encontra em uma “normalidade” em respeito ao tempo de aprendizagem da 
diversidade ali inserida, temos 100% dos alunos reprovados como jovens adolescentes, a 
partir da 3ª Etapa. 
Assim, constata-se que a evasão e a reprovação se destacam por serem, na maioria, de 
alunos jovens, que ainda não saíram da adolescência. Desta forma, os dados trazidos, 
corroboram os estudos que apontam para a migração significativa de adolescentes da escola 
diurna para a Educação de Jovens e Adultos – EJA (CARRANO, 2007) e que problemas de 
evasão e conflitos geracionais (SCHNEIDER; FONSECA, 2013) podem ser indicadores de 
que a escola não vem oportunizando espaço de amparo e tampouco oportunizando sentimento 
de pertencimento desses jovens na escola. Tratam-se de espaços educativos que não estão 
preparados para receber e trabalhar com esta faixa etária, que, para além das especificidades 
do seu desenvolvimento, carregam consigo características relacionadas à cultura da sociedade 
contemporânea, marcas e dores dos processos de exclusão, fatores esses relacionados aos 
contextos de marginalização. 
Cabe destacar que os dados apresentados acima fizeram-se na diferenciação entre 
jovens adolescentes, em idade compreendida entre 15 a 18 anos, e adultos, devido ao fato de 
23 
no momento estar implicada, em especial, com os alunos desta faixa etária, ou seja, sujeitos 
ainda adolescentes, que migravam prematuramente à EJA. Mesmo os jovens, objeto da 
presente pesquisa, estarem entre 18 a 22 anos, optei em manter essa contextualização sobre 
matrículas, reprovações e evasões, pois foram esses dados que me chamaram a atenção para a 
presente discussão. 
Ao encontro dessas questões trazidas neste texto introdutório, também percebi que o 
contexto escolar desconhece a perspectiva da inclusão, no viés social, abrindo espaço apenas à 
inclusão de pessoas com deficiência, ainda que de forma receosa. A escola, ao desconhecer a 
inclusão social, como um de seus objetivos educacionais, não consegue operar para minimizar 
os problemas sociais postos na sociedade e deste modo refletido na dinâmica escolar, como 
por exemplo a evasão dos jovens na EJA. Deste modo, compreendo que tal discussão é de 
extrema relevância, pois a escola, sobretudo a escola pública de periferia, precisa se 
reconhecer como uma instituição em potencial para os diferentes processos de inclusão, assim 
como propõem a presente pesquisa. 
Nesse cenário foi surgindo claramente o meu tema de pesquisa, que verte sobre as 
repercussões da evasão escolar, na modalidade da Educação de Jovens e Adultos, na vida dos 
jovens entre 18 e 22 anos, em uma escola pública no município de Novo Hamburgo. A 
escolha da idade dos sujeitos da pesquisa foi devido à dificuldade de acesso aos jovens 
menores de idade, pela desconfiança da família e do próprio sujeito em relação ao objetivo da 
pesquisa. Também pelo fato de uma parcela deste público, aqueles entre 15 e 17 anos, 
retornarem à escola antes do término do semestre, por imposição do Conselho Tutelar. 
Também se observou que no ano de 2017 houve menos evasões de jovens adolescentes, 
quando comparado ao ano de 2016. O corte de 22 anos se fez pela intenção da pesquisa 
ocorrer com alunos mais jovens. 
Com a temática de pesquisa já construída, a definição do problema foi um trabalho 
árduo, por entender, após muito estudo, que precisaria “sair” dos muros da escola para 
compreender as implicações de um percurso escolar acidentado na vida em sociedade desses 
jovens. Dar-me conta disso me levou a pensar que não só a escola torna a juventude invisível, 
uma vez que me deparei tomada de angústia na forma como encontraria meu objeto de 
pesquisa, resultando noutra inquietação: se não estão na escola, onde estão estes jovens em 
nossa sociedade? 
Assim, elucidou diante desse conflito e dos dados que apontam as evasões, o problema 
de pesquisa que questiona sobre “Quais são os caminhos seguidos pelos jovens, considerando 
as repercussões da evasão da educação básica, na modalidade EJA?”. Como objetivo geral, o 
24 
estudo se faz em investigar sobre os caminhos seguidos pelos jovens e as especificidades que 
permeiam esses percursos, considerando a evasão da Educação de Jovens e Adultos. Já os 
objetivos específicos perpassam em compreender os processos de exclusão que auxiliam na 
evasão de jovens na EJA; identificar fatores que motivaram a evasão dos jovens participantes 
da pesquisa; e identificar as formas como ocorrem o desligamento dos jovens na EJA. 
Desta forma, a presente pesquisa que se propõe a investigar sobre os caminhos 
seguidos pelos jovens após a evasão da EJA se justifica pela relevância do tema no que 
concebe: o papel social e político dessa modalidade de ensino; espaço educativo voltado à 
inclusão social; e o jovem enquanto sujeito em potencial, no entanto, sobre as arestas de riscos 
sociais, as quais possam servir de acolhimento a ele. 
Nesta conjuntura, a Dissertação de Mestrado é composta por cinco capítulos. O 
primeiro trata sobre a evasão dos jovens na EJA, adentrando aspectos relacionados à história 
desta modalidade de ensino, os processos de exclusão que influenciam na evasão escolar, um 
levantamento de pesquisas sobre a evasão na EJA, bem como um estudo acerca do fracasso 
escolar. O segundo capítulo tece sobre a juventude no contexto da EJA, em uma reflexão 
sobre jovem-adolescente como sujeitos de direitos, políticas públicas para a juventude nesta 
modalidade de ensino, perfil do jovem que compõem a EJA e a dicotomia inclusão e exclusão 
dos jovens que se inserem na EJA. O terceiro capítulo apresenta os caminhos metodológicos 
em uma abordagem qualitativa, na qual se optou, enquanto método de coleta de dados, pela 
entrevista não-diretiva e a análise de conteúdo como técnica de análise de dados. Já o quarto 
capítulo passa a apresentar ao leitor os resultados da pesquisa, narrando situações 
presenciadas e vividas na escola pesquisada – o contato com o empírico, fazendo relação com 
os processos de inclusão e exclusão. Ainda nessa sessão, busca-se discutir a inclusão e 
exclusão a partir das categorias de análise pobreza, escola e trabalho. E por fim, o quinto 
capítulo dá sequência na apresentação dos resultados, apresentando as especificidades da vida 
dos sujeitos da pesquisa, numa aglutinação de semelhança entre os dois jovens homens e as 
duas jovens mulheres, colocando em discussão as microcategorias do feminino e da igreja, no 
que tange as implicações destes nos caminhos seguidos pelos entrevistados após a evasão 
escolar. 
 
25 
1 A EVASÃO ESCOLAR NA EJA: O RETRATO DOS PROCESSOS HISTÓRICOS E 
DE EXCLUSÃO DO SISTEMAEDUCACIONAL 
 
A Educação de Jovens e Adultos –EJA é uma modalidade de ensino que busca, na 
contemporaneidade, compensar uma dívida histórica do Estado para com os sujeitos que não 
tiveram acesso à escolarização na idade adequada. Considerando o aspecto histórico, ela 
repercute, de um lado, pelos interesses das classes dominantes e de outro, pelas lutas da 
sociedade civil em prol de uma educação capaz de libertar os sujeitos dos macetes opressores. 
Marcada por ser uma modalidade de ensino secundária, a EJA sofre cotidianamente com altos 
índices de evasão escolar, não conseguindo cumprir seu objetivo que é de erradicar o 
analfabetismo no Brasil e escolarizar os sujeitos no ensino fundamental e médio, através de 
escola pública de qualidade. 
Compreendendo que a evasão escolar é um construto social, proponho no presente 
capítulo, inicialmente, problematizar o contexto histórico de secundarização e de políticas 
públicas compensatórias, às quais a EJA sempre esteve atrelada, impedindo-a de se tornar 
uma educação emancipatória, como outorga a educação popular. Na sequência, busco 
compreender os processos de exclusão que resultam na evasão, denunciando fatores como do 
sistema educacional que reforça a diferença de classes, como quer o poder dominante. Em 
seguida realizo um levantamento de pesquisas, cuja intenção é apresentar os aspectos e as 
dimensões em que a problemática da evasão escolar na EJA vem sendo discutida nos estudos 
empíricos. E por fim, compreendendo a necessidade de me aprofundar sobre as nuances do 
fracasso escolar, pelo fato dele ser um dos principais motivos pela evasão, realizo uma 
discussão problematizando o fracasso produzido pela escola e que, de forma errônea, 
culpabiliza o aluno. 
 
1.1 DA COLONIZAÇÃO À DEMOCRATIZAÇÃO: TECENDO A HISTÓRIA DE 
SECUNDARIZAÇÃO DA EJA 
 
A educação, em contexto histórico, está presente no Brasil desde sua colonização. No 
entanto, naquela época, poucas eram as escolas e quase nenhuma iniciativa do Estado, 
visando apenas a instrução escolar para os filhos das classes alta e média marcando, desde 
esse período, os processos de exclusão das camadas populares da sociedade (MOLL, 2011). A 
história da educação voltada aos jovens e adultos se inicia nesse mesmo período, com a 
chegada dos jesuítas, que tinham a pretensão de propagar a fé cristã e de doutrinar os 
26 
indígenas. Utilizavam o ensino como ferramenta para a disseminação catolicista, bem como o 
ensino da língua portuguesa como uma espécie de aculturação que, de acordo com Paiva 
(1983), refere-se ao surgimento de uma nova cultura, por apresentar elementos da cultura 
inicial e daquela absorvida. A intenção, nesse período, era “enquadrar” os indígenas nos 
costumes da Coroa Portuguesa (FRIEDRICH et al., 2010). 
Assim, dá-se início a uma lógica de educação voltada à exclusão dos pobres, bem 
como a um processo de escolarização que mapeia o caminho de sucesso para quem detém o 
poder e o saber. Cabe destacar que: 
A exclusão foi e é própria das sociedades tradicionais, das sociedades estamentais, 
como foi a nossa, aliás, durante todo o período colonial e o período imperial, e da 
qual sobrevivem fortes vestígios. Não só nas diferenças entre raças, entre brancos e 
negros e, até em uma certa época, oficialmente entre brancos e índios. Mas também 
nas regulamentadas diferenças entre brancos e brancos, entre nobres e pobres, entre 
cavaleiros e peões (MARTINS, 2008, p. 14). 
Após a expulsão dos jesuítas do Brasil, no século XVIII, houve uma desorganização 
do ensino, sendo somente com a Proclamação da Independência em 1822 e a primeira 
Constituição Brasileira, em 1824, que outorgou no seu artigo 179 – o direito “à instrução 
primária e gratuita para todos os cidadãos” –, que o Império passa a tomar as frentes sobre a 
educação. No entanto, mesmo diante dos marcos legais, pouco foi construído para a garantia 
da educação a todos, embora esse tenha sido o primeiro movimento jurídico na história da 
educação (HADDAD; DI PIERRO, 2000). 
Haddad e Di Pierro (2000) anunciam que o distanciamento entre a legislação e o 
executado se torna agravante diante dos fatores sociais daquele contexto: 
[...] no período do Império só possuía cidadania uma pequena parcela da população 
pertencente à elite econômica à qual se admitia administrar a educação primária 
como direito, do qual ficavam excluídos negros, indígenas e grande parte das 
mulheres (p.109). 
Complementando, Martins (2008, p. 15) afirma que 
A exclusão se dava aí: excluídos eram aqueles aos quais, pelo berço em que 
nasceram, não se reconhecia direitos ao respeito, à dignidade, ao decoro, ao 
tratamento digno próprio das pessoas de condição, como se dizia. 
 Em 1854, surgiu a primeira escola noturna, com o propósito de alfabetizar os 
trabalhadores. A partir de então, 117 escolas, dentre os próximos 20 anos, passaram a atender 
adultos; no entanto, o privilégio de acesso à educação continuava sendo das classes mais 
favorecidas, não proporcionando a escolarização para analfabetos, pois as escolas se 
localizavam em grandes centros urbanos ou tinham objetivos específicos, como por exemplo a 
27 
alfabetização de indígenas e esclarecimento de direitos e deveres dos colonos (PAIVA, 1983). 
Esse movimento, mesmo que em prol da alfabetização dos adultos, tornou-se um ato 
missionário e de caridade, deixando, no final do Império, um alarmante índice de 82% da 
população analfabeta (HADDAD; DI PIERRO, 2000). 
Já no início do século XX se ampliaram as redes escolares e as campanhas contra o 
analfabetismo, pois se passou a culpabilizar, de acordo com Strelhow (2010), as pessoas 
analfabetas pelo subdesenvolvimento do país. Nesse contexto, o analfabetismo era visto como 
um quadro de horror, pois ainda 72% da população, na década de 1920, não tinha domínio da 
leitura e da escrita. Acreditava-se que a alfabetização, diante disso, influenciaria diretamente 
no sucesso do desenvolvimento do Brasil (STRELHOW, 2010). 
Debates em torno da qualidade e otimização do ensino se acentuaram, ganhando ainda 
mais força com a Revolução da década de 1930. A EJA obteve espaço nas discussões, pois 
mudanças políticas e econômicas, a partir processo de industrialização, vinham acontecendo 
no país; no entanto, sofria-se com os precários índices de escolarização, comparados com os 
demais países da América Latina. Nesse contexto, iniciou-se a história da EJA na educação 
(FRIEDRICH et al., 2010). 
A nova Constituição, de 1934, a qual criou o primeiro Plano Nacional de Educação 
(PNE), determinou para as diferentes esferas públicas suas competências, reafirmando o 
direito de todos e o dever do Estado para com a educação, de frequência obrigatória e gratuita 
do ensino primário, extensiva para adultos (HADDAD; DI PIERRO, 2000; FRIEDRICH et 
al., 2010). Mesmo diante desses movimentos legais, de acordo com Haddad e Di Pierro 
(2000), até esse período não havia preocupações pedagógicas e políticas específicas em 
relação à EJA, pois a escola era pensada para crianças e adolescentes. 
Foi apenas na década de 1940 que transformações mais significativas foram 
ocorrendo, com “verbas vinculadas e atuação estratégica e ações em todo território brasileiro” 
(HADDAD; DI PIERRO, 2000, p. 111). Começou-se a pensar sobre o material didático da 
educação de adultos, fomentado a partir da Campanha de Educação de Adolescentes e 
Adultos (CEAA) e, ainda no mesmo período, ocorreram eventos de debates importantes para 
a EJA, como o 1º Congresso Nacional de Educação de Adultos, em 1947 e o Seminário 
Interamericano de Educação de Adultos, em 1949 (FRIEDRICH et al., 2010). 
Tais transformações vinham ao encontro dos interesses capitalistas. Vinculou-se à essa 
educação o ensino profissionalizante por se fazer necessário, diante da industrialização, a mão 
de obra qualificada, criando-se o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). 
28 
Assim, conforme asconsiderações de Martins (2008, p. 121), que descreve a relação do 
capitalismo com a força de trabalho: 
O que faz o capitalismo, ao desenraizar as pessoas, é transformá-las em proprietárias 
de uma única coisa: a sua força de trabalho. O desenraizamento do camponês não 
está simplesmente em sua expulsão da terra. É reduzi-lo à única coisa que interessa 
o capitalismo, que é a condição de vendedor de força de trabalho. Se alguém vai 
comprar essa força de trabalho já é outra história. Mas ele passa a ser um potencial 
vendedor de força de trabalho, a ser um trabalhador à procura de trabalho. 
Mesmo diante desse cenário, pode-se dizer, perverso, era notório que a EJA passava a 
se tornar uma preocupação política. No entanto, de tal forma sabido que as estratégias não 
estavam sendo suficientes, pois ainda o analfabetismo era visto como um problema para a 
economia que se encontrava estagnada no momento, visto que no final da década de 1940, 
56% da população ainda era analfabeta (NAIFF; NAIFF, 2008). 
A organização de mais escolas e suas extensões às zonas rurais, cuja ação foi nomeada 
como “Educação de Várzea”, demonstravam a preocupação durante o governo Vargas com o 
problema do analfabetismo (FRIEDRICH et al., 2010), embora essa preocupação também 
perpassasse pelo interesse de refazer as bases eleitorais naquele momento histórico. Já o 
governo de Juscelino Kubitscheck de Oliveira voltou o olhar para as camadas mais pobres da 
sociedade, manifestando insatisfação com a forma com que se conduzia a alfabetização de 
adultos. Foi durante esse período, em 1958, que ocorreu o Congresso de Educação de 
Adultos, no qual um grupo liderado pelo educador Paulo Freire contribuiu com suas 
experiências. Realizou-se críticas em relação ao método mecanicista de alfabetizar e se passou 
a discutir que para o progresso do país é necessário consciência e participação do povo 
(FRIEDRICH et al., 2010). 
Ao longo da história da EJA, o cenário de interesses políticos foi o pano de fundo nas 
discussões e nas ações para essa modalidade de ensino. Diante das turbulências políticas, 
entendia-se que somente a educação era capaz de rebelar os sujeitos das classes pobres e 
disseminar a ideologia que estavam embutidas nas propostas políticas às camadas populares. 
Desta maneira, surgiram programas e projetos de alfabetização de adultos que 
acreditavam na educação como um ato político. Portanto, o trabalho se voltava para princípios 
da educação popular, que, para além de alfabetizar os sujeitos, tinham a pretensão de lhes 
conceder a emancipação e a autonomia necessárias para se deslocarem da condição de 
oprimidos. Foi assim que movimentos como Movimento de Cultura Popular, o Centro 
Popular de Cultura, o Movimento de Educação de Base, da CNBB, e o Programa Nacional de 
Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, que contava com a contribuição do 
29 
professor Paulo Freire, foram implantados em prol das camadas populares (HADDAD; DI 
PIERRO, 2000). 
Paulo Freire, como um dos principais militantes da educação popular, engajava-se na 
tarefa de teorizar a EJA, desenvolvendo, nessa perspectiva, uma proposta metodológica 
própria para o processo de alfabetização de adultos, a qual, contextualizada com a vida dos 
sujeitos, alfabetizava-os partir de palavras geradoras que, de forma ideológica, estendia o 
método dentro de uma educação libertadora e de conscientização (PAIVA, 1983). 
Esses movimentos, ocorrentes entre o período de 1958 a 1964, são marcos na história 
da EJA, quando a partir disso, problematiza-se a educação como forma de gerência da classe 
dominante e se denuncia a reprodução de classes através da exploração dos sujeitos menos 
favorecidos socialmente. Demarca em um momento histórico a educação como “instrumento 
de ação política” (HADDAD; DI PIERRO, 2000), cujos saberes populares são motores para a 
democratização. Rompe-se com a ideia de que o aluno analfabeto é um sujeito improdutivo e 
ignorante, legitimando-o como um agente de extrema importância para os grupos populares 
que buscavam um lugar de protagonismo na sociedade. 
A exclusão, nesse viés, é vista na educação popular como um problema possível de ser 
superado a partir da tomada de consciência dos sujeitos. Martins (2008, p. 23) afirma que 
Exclusão é muito mais um desafio à compreensão do que um diagnóstico sólido. 
Cumpre, portanto, uma função importante na percepção e no conhecimento das 
contradições da sociedade contemporânea, a função de ser o ponto de partida da 
possibilidade da reflexão crítica e da consciência crítica. 
Embora bandeiras militantes em prol da EJA, numa perspectiva de educação popular, 
hasteavam-se no país, o Golpe Militar de 1964 interrompe essa caminhada. Nenhum 
movimento de interesse popular era autorizado e sob repreensão se silenciavam as vozes do 
povo. Apenas programas conservadores, assistencialistas e de interesse do governo militar, 
como a Cruzada de Ação Básica Cristã (ABC), ocorriam (HADDAD; DI PIERRO, 2000). 
No entanto, devido às críticas a respeito dessas ações, criou-se, de acordo com a Lei 5.379, de 
15 de dezembro de 1967, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), cujo 
objetivo era a alfabetização de sujeitos entre 15 e 30 anos, em um período de 9 meses, bem 
como a oportunidade de justificativa pelo ato da ditadura e uma aproximação do atual 
governo com o povo, demonstrando que o interesse pela alfabetização de adultos se mantinha 
(PAIVA, 1983). O movimento tinha a pretensão de erradicar o analfabetismo do país em 10 
anos. Era, de acordo com Haddad e Di Pierro (2000), uma forma de juntar a demanda de 
30 
escolarização e de interesses políticos, como também a possibilidade de controle da população 
nesse período tenso. 
Nessa conjuntura, é pertinente se referir a Santos (2003), o qual traduz a atuação do 
Estado como uma forma de fascismo social, cujas ações se diferem claramente entre as 
diferentes zonas da sociedade: 
Nas zonas civilizadas, o Estado actua de uma forma democrática, comportando-se 
como um Estado protector, ainda que muitas vezes ineficaz e não fiável. Nas zonas 
selvagens ele actua de uma forma fascizante, comportando-se como um Estado 
predador, sem a menor consideração, nem se quer na aparência, pelo estado de 
direito (p. 21). 
O MOBRAL, como todo este período histórico, era uma proposta inflexível do Estado, 
a qual previa treinamentos de supervisores para a garantia de que se efetivassem os planos do 
governo. O movimento implementou diversos programas, como o Programa de Alfabetização 
e o Programa de Educação Integrada, tendo esse segundo o objetivo de compactar a 
escolarização de 1ª a 4ª séries. Permaneceu enquanto plano do Estado até a reforma política 
de 1985 (HADDAD; DI PIERRO, 2000). 
Ainda no período ditatorial, houve a implementação do Ensino Supletivo, que visava o 
suprimento dos estudos de quem passou pelo MOBRAL ou dos sujeitos que não deram 
sequência à escolarização. Permanecia a ideia capitalista de qualificar a mão de obra para o 
progresso do país e se distanciava de uma educação popular por não se caracterizar pela classe 
do seu alunado. “A sociedade que exclui é a mesma sociedade que inclui e integra, que cria 
formas também desumanas de participação, na medida que delas faz condição de privilégios e 
não de direitos” (MARTINS, 2008, p.10). 
 Assim, cabe destacar que a EJA, nesse cenário, não foi legitimada como direito dos 
cidadãos, mas sim, uma proposta governamental, que se utilizava de uma lógica capitalista 
para fins de transparecer preocupação com quem não teve as mesmas condições de acesso à 
escolarização. 
A democratização do país, em 1985, demarca no cenário brasileiro uma nova história, 
que passou a ser construída através de forças da sociedade civil pela busca de seus direitos. 
Nessa conjuntura, buscou-se, através de marcos legais, legitimar a EJA como direito para 
quem não cursou o ensino regular na idadecerta e também como “pagamento” de uma dívida 
de Estado para com esses sujeitos, gerada ao longo da história. Nessa perspectiva 
compensatória, inscreveram-se políticas públicas que tentaram amenizar os efeitos 
desastrosos de um passado em que sempre prevaleceram os interesses da classe dominante. 
Ao encontro disso, Martins (2008, p. 14) alerta: 
31 
A alternativa tem sido políticas públicas compensatórias, sem dúvidas necessárias 
nessa circunstância, por meio das quais se procura atenuar os efeitos danosos do 
modelo econômico. Elas apenas confirmam e legitimam a exclusão por meio de 
benefícios que não constituem legítima apropriação social dos resultados da 
economia. São apenas débito a fundo perdido, preço a pagar pela sustentação e uma 
economia cuja a dinâmica bane e descarta parcelas da população. 
Sobre um pano de fundo compensatório, após a democratização do país, passaram a 
haver mudanças no contexto educacional da modalidade de ensino em questão. Com a “caída” 
do MOBRAL, movimento de propostas pedagogicamente fracas e que lembrava um período 
autoritário que qual o país enfrentara, a Fundação para a Educação de Jovens e Adultos 
(EDUCAR) passou a substituí-lo e se caracterizou por suas novas diretrizes político-
pedagógicas (HADDAD; DI PIERRO, 2000). Nesse período, foram retomados os estudos, 
discussões e trabalhos, que antes aconteciam clandestinamente, sobre a educação popular. 
Aparece, assim, na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 208, a educação como direito 
de todos, ao garantir o ensino fundamental público e gratuito para crianças, jovens e adultos. 
Embora os primeiros anos, após o fim da ditadura no Brasil, se apresentassem de 
forma positiva para a EJA, o início da década de 1990, mediante a crise política do governo 
Fernando Collor de Mello, é demarcada pela extinção do EDUCAR e pela descentralização da 
sua responsabilidade, ficando a cargo dos órgãos públicos e entidades sua efetivação 
(HADDAD; DI PIERRO, 2000). Ainda durante esse governo, houve a tentativa frustrada de 
implementação do Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), o qual tinha 
como promessa a transferência de recursos da esfera federal para os órgãos públicos e 
instituições que trabalhassem em prol da elevação do nível de escolaridade do país. 
Em 1996, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, foi implementada a Lei 
de Diretrizes e Bases Nacionais (LDBN), documento que retratava, naquele período, 
importantes reformas na educação. No entanto, para a EJA, pouco houve mudanças, apenas a 
afirmação do direito público e gratuito dos jovens e adultos ao ensino, sendo apto para se 
submeterem a exames para a suplência do ensino fundamental jovens com no mínimo 15 anos 
e, para ensino médio, jovens com no mínimo 18 anos. A lei também esboça a importância de 
o ensino respeitar as peculiaridades dos jovens e adultos trabalhadores, colocando sob a 
responsabilidade do Estado sua oferta. O único avanço mais significativo, trazido pelo 
documento, foi a integração da educação de jovens e adultos ao ensino regular comum, 
mesmo que no artigo 38, o texto ainda traga a expressão “exames de suplência” (HADDAD; 
DI PIERRO, 2000; RUMMERT; VENTURA, 2007). 
Uma nova expectativa sobre a EJA se firmou a partir do Plano Nacional de Educação 
(PNE) que, no decênio de 2001 a 2011, enunciou 26 metas entre cinco objetivos. Alguns 
32 
movimentos em prol das metas foram percebidos pelo governo de Luís Inácio Lula da Silva, 
que incrementou a colaboração da União entre os estados e munícipios, investiu na assistência 
dos estudantes com o transporte escolar, alimentação e livros didáticos. Os programas, de 
diferentes responsabilidades governamentais, articulados entre si, também foram importantes 
nessa administração: 
Programa Brasil Alfabetizado, coordenado pela Secretaria de Educação Continuada, 
Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação (MEC); o Programa 
Nacional de Inclusão de Jovens – PROJOVEM, gerido pela Secretaria Nacional de 
Juventude; o Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a 
Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos, mantido pela 
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC; o Programa Nacional 
de Educação na Reforma Agrária, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento 
Agrário; e o Exame Nacional de Certificação de Competências, realizado pelo 
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) (DI PIERRO, 2010, 
p. 946). 
No entanto, tais inciativas não foram capazes de reverter o quadro de analfabetismo e 
da falta de escolarização de muitos jovens e adultos, percebendo-se que ainda houve carência 
de políticas públicas que garantissem o financiamento adequado às necessidades da EJA, da 
formação docente e da avaliação bienal, uma das metas propostas. Esses fatores influenciaram 
para que não se conseguisse alcançar nenhum dos objetivos propostos pelo PNE para a 
década. 
Diante desse cenário político ineficaz, pensado de forma isolada e não dialética com as 
demais políticas públicas, as principais vítimas continuam sendo as mesmas ao longo da 
história: população pobre, por vezes marginalizada e suscetível aos riscos sociais. Santos 
(2003) localiza essa população do lado oposto a quem lidera a destruição e criação social, 
referindo-se a ela como uma esmagadora maioria que está “ocupada ou atarefada com 
adaptar-se, resistir ou simplesmente substituir, para sequer ser capaz de perguntar, quanto 
mais responder a questões complexas acerca do que fazem e porquê” (p.3). 
Ao encontro disso, Bauman (2011) propõe uma reflexão sobre a dinâmica social que 
se encontra na sociedade contemporânea, num estado frágil e de luta para sobreviver em um 
modelo capitalista fundado nos princípios da transitoriedade, constantes começos, de 
autoafirmação, da quantidade em detrimento a qualidade e da conexão. Os pobres, “a 
esmagadora maioria da população” como referiu-se Santos (2003), sujeitos sem escolarização, 
procuram demasiadamente meios de sobrevivência dentro dessa lógica de mercado, sofrendo, 
por ineficácia de políticas públicas, a violação pelo seu direito à educação, colocando-se ainda 
mais acentuada sua condição de pobreza e de exclusão social. 
33 
Pensando sobre os processos de inclusão/exclusão dos alunos adolescentes, candidatos 
a ocuparem vagas na EJA, a CONAE, durante a construção do novo PNE (o qual entraria em 
vigência em 2012), foi marcada pela discussão da elevação da idade mínima de ingresso nessa 
modalidade de ensino. Vale lembrar que: a LDBN/1996 estipula a idade mínima para a 
conclusão da EJA no Ensino Fundamental em 15 anos e Ensino Médio em 18 anos; porém, 
não regulamenta a idade mínima de ingresso nessa modalidade de ensino, nos dois níveis da 
educação básica; o Conselho Nacional de Educação – CNE, pelo parecer 11/2000, a fim de 
suprir essa lacuna, define a idade mínima de ingresso em 14 anos no Ensino Fundamental e 
17 anos para o Ensino Médio. 
Durante os encontros da CONAE, educadores e pesquisadores defendem a ideia de 
elevar a idade mínima de ingresso para 18 e 21 anos, respectivamente, alegando que a EJA 
“não pode continuar a acolher toda a diversidade social e cultural rejeitadas pela escola 
comum, que precisaria rever os processos de exclusão dos adolescentes com defasagem na 
relação idade-série” (DI PIERRO, 2010, p. 951). 
Em sequência, o Ministro, manifestando-se ao contrário dessa posição e alegando que 
a elevação da idade mínima de ingresso na EJA “produziria ainda mais exclusão educacional, 
penalizando novamente os adolescentes, ao invés de induzir as mudanças desejáveis no 
sistema escolar educacional seletivo que os rejeitou” (DI PIERRO, 2010, p. 951), não 
homologou a resolução aprovada. Em 2010, o CNE definiu a idade mínima de ingresso no 
ensino fundamental em 15 anos e, no ensino médio, em 18 anos. 
Embora o objetivo inicial da EJA fosse erradicaro analfabetismo, constata-se que 
mesmo passado mais de um século, isso não se efetivou, pois de 2004 a 2013 houve uma 
tímida elevação na alfabetização de sujeitos maiores de 15 anos – de 88,5% para 91,5% 
(HADDAD; DI PIERRO, 2015). Hoje a EJA não traz consigo somente essa proposta inicial, 
mas também o fardo de dar continuidade no processo de escolarização de adolescentes e 
jovens que, por falhas do ensino regular diurno, acabam transferidos para essa modalidade de 
ensino. 
 
1.2 OS PROCESSOS DE EXCLUSÃO E A EVASÃO ESCOLAR 
 
O cenário histórico de desigualdades, desde o Brasil Colônia, reforçado por uma 
sociedade capitalista e por um Estado cujos interesses operam pela lógica da globalização 
hegemônica, descortina a exclusão social e educacional de muitos sujeitos que não tiveram 
seus direitos garantidos. Martins (2008, p. 27) anuncia que “a categoria exclusão é resultado 
34 
de uma metamorfose nos conceitos que procuravam explicar a ordenação social que resultou 
do desenvolvimento capitalista”. Assim, o texto aborda algumas implicações da exclusão 
social e educacional na evasão escolar, visando compreender esse fenômeno como um 
construto social. 
 A escola pública, inserida em territórios demarcados pela pobreza, tem a difícil e a 
ideológica tarefa de não só estar nesse lugar, mas sim de se firmar como uma instituição que 
busca, através da educação, a inclusão social. No entanto, antes desse processo, necessita 
garantir que os sujeitos ali atendidos sejam incluídos no sistema educacional, fomentando, 
para além da garantia do acesso, a permanência. 
Entretanto, a escola, na história, foi constituída para atender às classes dominantes, 
sendo a educação um bem disponível apenas ao público elitizado. “A distribuição do saber 
escrito do Brasil é marcada, historicamente [...] pela exclusão das camadas populares do 
processo escolar e no processo escolar” (MOLL, 2011, p. 35). Tal exclusão se fortalece a 
partir da falta de vagas, da inexistência de políticas públicas eficazes no que se refere às 
necessidades sociais presentes na escola, da forma paternalista e assistencialista das práticas 
escolares. 
Quando aberta às camadas populares, a instituição escolar esteve à serviço das 
intenções do Estado, se formatando, por muito tempo, sobre a lógica Fordista e Taylorista, 
para a produção de mão de obra e reprodução de classes (BORGES; 2011). Visando uma 
performance educacional homogênea, a escola não dialogava com a diversidade, excluindo do 
sistema público educacional pobres, trabalhadores, mulheres, negros, deficientes, 
homossexuais, entre outros, que não correspondiam ao padrão estabelecido de pessoas 
merecedoras do conhecimento. 
Intrigado com os processos de exclusão no campo da educação, Gentili (2013) 
identifica a escola como uma instituição de poder, denunciando as relações que se 
estabelecem nela na forma de controle, como por exemplo a relação professor e aluno, a 
obrigatoriedade de frequência, as notas escolares e a escolarização como pré-requisito para o 
emprego. Assim destaca que: 
As pessoas pobres, de modo geral, compreendem essa característica da escola. Ela 
está centralmente presente em suas mais desagradáveis experiências de educação. A 
experiência vivida pelos estudantes pobres de hoje não é, contudo, única. Os 
sistemas de educação de massa foram criados no século XIX como uma forma de 
intervenção do Estado na vida da classe trabalhadora, para regular e em parte 
assumir a educação das crianças. A obrigatoriedade legal era necessária porque tal 
intervenção era amplamente rejeitada (GENTILI, 2013, p. 21). 
35 
Esse cenário educacional, voltado à população pobre, constrói episódios de fracasso 
escolar, que, de acordo com Mattos (2012, p. 219), são “perpassados em estigmas e 
estereótipos de carência cultural, de déficit de inteligência, de deficiência intelectual e das 
dificuldades de aprendizagem, passados pelo imaginário social e individual”. 
Dessa forma, na escola contemporânea, são perceptíveis os reflexos desse sistema 
educacional o qual, em camufladas práticas, exclui e segrega as camadas populares. Em uma 
sociedade dividida em classes, considera-se as evidências históricas relevantes, no momento 
que a escola não se desprende do seu modelo reprodutivista, relacionando classe social com 
rendimento escolar (MOLL, 2011). Ao encontro disso, Gentili (2013) salienta que há uma 
competição no sistema escolar ao referir-se que, de acordo com o desempenho, melhor serão 
as oportunidades. Reforça que essa organização enfatiza a diferença de classes, uma vez que 
ratifica as vantagens dos privilegiados e confirma a exclusão dos pobres. 
Outro fator que fomenta a exclusão educacional é a falta de qualidade no ensino, 
embora se tenha ampliado as vagas na rede pública de educação. Haddad e Di Pierro (2000, p. 
126) fazem o contraponto dessa problemática sinalizando que “antes as crianças não podiam 
frequentar a escola por ausência de vagas, hoje ingressam na escola, mas não aprendem e dela 
são excluídas antes de concluir os estudos com êxito”. 
Sobre essa lógica, caminha-se para a superação do analfabetismo, no qual os índices 
mostram que houve, ao longo do tempo, ampliação de vagas nas escolas públicas e com isso, 
a diminuição de pessoas que não dominavam o sistema de leitura e escrita. No entanto, a 
exclusão educacional continua a perpetuar, afetando os sujeitos que tiveram a oportunidade de 
se inserir no sistema educacional, mas que, diante da falta de qualidade no ensino, 
condicionam-se ao fracasso escolar e, na sequência, contribuem com os índices de evasão. 
Desta forma, muitos alunos abandonam o ensino regular com domínio precário da leitura, da 
escrita e do cálculo, inscrevendo-se na categoria de analfabetos funcionais. 
 São, em sua maioria, os sujeitos que sofreram com os processos de exclusão 
educacional, evadidos do ensino regular diurno e oriundos de camadas populares, os atuais 
alunos da EJA (HADDAD; DI PIERRO, 2000). Alunos que retornam aos bancos escolares 
em uma nova tentativa, acreditando que o término dos estudos possa ser uma tentativa para 
“uma vida melhor”, quando buscam, na verdade, por detrás dessa frase, seus direitos como 
cidadãos e sua inclusão social, através do emprego. 
No entanto, a busca dos estudantes pela escolarização se rompe a partir do momento 
que o sistema educacional se mantem configurado nos moldes tradicionais de ensino e 
inoperante sobre o fomento da cidadania. Moll (2011) considera a exclusão educacional como 
36 
um processo que atinge a todos devido a carência de políticas públicas adequadas às 
demandas sociais do ensino fundamental, a ineficiência da escola no processo de ensino e 
aprendizagem, gerando “mecanismos de seletividade intraescolar, denominados de 
reprovação, repetência e ‘deserção’ ou ‘evasão’ escolar” (p. 35). 
Diante desse quadro, compreende-se que os interesses da classe dominante estão 
embutidos no sistema educacional e que tal dominação exclui uma parcela da sociedade que 
evade da escola, primeiramente do ensino regular diurno e, em muitos casos, posteriormente 
da EJA. Assim, passa-se a compreender também que a evasão escolar é um construto social, 
fenômeno que não está condicionado à falta de interesse dos alunos, mas sim condicionado ao 
sistema educacional no nível governamental e institucional, sendo esse um resultado das 
desigualdades sociais e de uma lógica perversa de interesses. 
 
1.3 A EVASÃO ESCOLAR NA EJA: O QUE OS ESTUDOS SUGEREM? 
 
Após a reflexão teórica acerca dos processos de exclusão que perpassam toda a 
história da EJA e as relações desses com a evasão escolar, fez-se necessário tomar posse de 
dados que retratem o cenário empírico dessa problemática nesta modalidade de ensino. Para 
isso, realizou-se o levantamento de publicações científicas que possibilitaram averiguar o que 
vem sendo discutido nas pesquisas sobre a evasão naEJA. 
Para o levantamento destes dados, buscou-se publicações científicas, dos últimos seis 
anos, transcritas na língua portuguesa, na base de dados Scielo e no Google Acadêmico, no 
mês de janeiro do ano de 2017. Utilizou-se na base de dados Scielo a busca pelos artigos 
através do descritor EJA e Educação de Adultos; posteriormente pelo cruzamento dos 
descritores “EJA and evasão”. No Google Acadêmico a busca ocorreu através dos descritores 
“evasão escolar and EJA”. Filtrou-se as produções pelo ano de publicação, sendo este a partir 
de 2011, pela transcrição em língua portuguesa, pela categoria de artigos científicos. Como a 
busca proporcionou uma quantidade excessiva de publicações, foi realizada a primeira seleção 
através dos títulos dos artigos excluindo, nessa etapa, títulos que faziam relações com 
disciplinas específicas ou com outras modalidades de ensino. Posteriormente, leu-se os 
resumos, adotando critérios de exclusão para artigos que não apresentaram objetivos claros e 
explicações metodológicas bem descritas, pesquisas relacionadas à EJA no campo, na prisão, 
na formação do pedagogo e docente, como extensão universitária e na educação profissional. 
A aplicação dos critérios de inclusão e exclusão permitiu a seleção de seis artigos, que foram 
lidos e analisados na íntegra. 
37 
Para a síntese dos resultados foram identificados os itens conforme as seguintes 
variáveis: título, autores, ano, objetivos, método, principais resultados, conforme Quadro 1: 
 
Quadro 1 - Sínteses dos resultados dos seis Estudos selecionados 
Título Autores/Ano Objetivos Método Principais 
resultados 
ESTUDO A 
Gestão 
democrática e os 
mecanismos de 
ação coletiva: 
uma contribuição 
para a redução da 
evasão na EJA 
Suzana do 
Rocio 
Marcelino 
Silva 
 
Mary Sylvia 
Falcão 
 
2012 
Promover ações 
de intervenção 
que ensejem o 
envolvimento 
da comunidade 
escolar em 
participar de 
discussões e 
ações que visam 
desvelar os 
problemas que 
envolvem a 
evasão escolar 
na Educação de 
Jovens e 
Adultos, 
buscando 
soluções para a 
permanência 
com qualidade. 
Pesquisa-ação Efetivação de uma 
comissão, instituída e 
aprovada pelo 
Conselho da escola 
pesquisada, para o 
trabalho de dialogar 
com a comunidade 
escolar, com foco a 
diminuir a evasão, 
numa perspectiva de 
gestão democrática. 
A falta de 
participação na 
perspectiva da gestão 
democrática 
influencia na evasão 
escolar na EJA 
Constatou-se que 
numa ação coletiva, 
na qual a 
comunidade escolar 
se envolve nas 
discussões das 
problemáticas 
escolares, podem-se 
encontrar algumas 
alternativas para a 
permanência dos 
alunos na 
EJA. 
ESTUDO B 
Evasão escolar na 
Educação de 
Jovens e Adultos: 
problematizando 
fenômeno 
com enfoque na 
cultura escrita 
Rosângela 
Pedralli 
 
Mary 
Elizabeth 
Cerutti-
Rizzatti 
 
2013 
Estudo de Caso, 
tipo etnográfico 
Discutir o problema 
da evasão em 
espaços de EJA; 
compreender em que 
medida a constituição 
identitária pode 
implicar no 
movimento de 
permanência/evasão 
no/do espaço escolar; 
estabelecer relações 
possíveis entre as 
práticas de 
letramento 
e esse movimento; e 
refletir sobre a 
aproximação da 
condição de insider 
As justificativas para 
a evasão se referem à 
natureza laboral e 
saúde; 
estabelecimento de 
relações de diferentes 
ordens no espaço 
escolar pode ser 
determinante no que 
diz respeito à 
permanência ou não 
nesse espaço; a 
construção identitária 
do aluno influencia 
na sua 
permanência/evasão 
na EJA; não se 
identificar com o 
38 
ou de outsider por 
parte dos estudantes 
no espaço escolar e 
as implicações para a 
evasão. 
grupo pode ser um 
fator de desistência; 
documentos 
parametrizadores e os 
esforços da gestão 
municipal não dão 
conta de diminuir a 
evasão; práticas de 
letramento 
oportunizam a leitura 
extraescolar, 
favorecendo para a 
permanência dos 
sujeitos na escola; a 
condição de insider e 
outsider influencia na 
permanência e evasão 
da EJA, na medida 
que insider diz 
respeito ao 
reconhecimento dele 
mesmo como 
membro de um grupo 
e exige do grupo esse 
mesmo 
reconhecimento. 
ESTUDO C 
Evasão Escolar 
na EJA: uma 
escolarização 
questionável 
Kelber Abrão 
Ruhena 
 
Daiane Costa 
de Jesus 
 
2016 
Analisar a 
Educação de 
Jovens e 
Adultos a partir 
de questões 
reais que levam 
à evasão 
escolar, 
analisando a 
história da EJA 
e as causas que 
levam 
os alunos a 
evadirem. 
Estudo de Caso Constatou-se que a 
evasão ocorre devido 
a metodologias 
inapropriadas, falta 
de preparação e 
incentivo aos 
professores, fazendo 
com que estes não 
consigam aliar a 
teoria da práxis, 
baixa qualidade dos 
livros didáticos 
oferecidos pelo 
Ministério da 
Educação – com 
padrão escolarizado 
de educação e 
infantilizados –, 
relação entre 
professor e aluno e o 
mercado de trabalho 
 
ESTUDO D 
A evasão escolar 
na Educação de 
Jovens e Adultos: 
Estudo de Caso 
de uma escola 
pública no 
munícipio Acará, 
Pará 
Marcos 
Jonatas 
Damasceno 
da Silva 
 
Silmara 
Izabel da 
Silva 
 
2016 
Analisar quais 
os principais 
motivos que 
levaram os 
alunos dessas 
quatro turmas a 
não concluírem 
o ano letivo de 
2015 
Estudo de Caso Os motivos que 
levaram aos alunos a 
não concluir o ano 
letivo foram a 
necessidade de 
trabalhar (cansaço), 
professores (greve), 
falta de interesse nos 
estudos e 
dificuldades em 
39 
acompanhar os 
conteúdos escolares 
(baixo rendimento). 
ESTUDO E 
Os fatores 
motivadores da 
evasão escolar na 
educação de 
jovens e adultos 
na Escola 
Municipal 
Caminhos do 
Aprender no 
munícipio de 
Grajaú-MA 
Francisca da 
Silva Leite 
 
Neusani O. 
Ives Félix 
 
2016 
Investigar os 
possíveis 
fatores 
relacionados ao 
alto índice de 
evasão escolar 
na EJA. 
Abordagem 
quantitativa e 
qualitativa, através 
de entrevistas e 
observações 
Professores com 
jornadas de trabalho 
exaustiva acabam 
cansados e 
desmotivados para 
preparar boas aulas; 
metodologias 
inadequadas, com o 
uso excessivo do 
livro didático e 
quadro 
ESTUDO F 
A evasão escolar 
na perspectiva 
dos ex-egressos 
da EJA: a 
Educação de 
Jovens e Adultos 
como um direito 
e a incoerência 
desse direito no 
recorrente 
fenômeno da 
evasão escolar 
Amós Santos 
Silva 
 
2016 
Compreender os 
motivos que 
tornam a evasão 
escolar na EJA 
recorrente a 
partir das razões 
apresentadas 
por alunos 
outrora 
egressos, bem 
como, analisar 
se tais causas 
são fatores 
determinantes 
ou não na 
permanência 
dos alunos no 
presente 
momento 
Pesquisa do tipo 
etnográfica de 
abordagem 
qualitativa e 
exploratória por meio 
de um estudo 
de campo 
A evasão ocorre 
devido a fatores 
externos: 
dificuldades em 
conciliar trabalho e 
escola; falta de tempo 
para os estudos; 
cuidado com a 
família; 
Fatores internos: 
dificuldades em 
aprender 
 
Fonte: A autora (2017) 
 
Os dados encontrados possibilitaram a divisão de três categorias de análise, conforme 
o Quadro 2: 
Quadro 2 - Categorias de análise dos Estudos selecionados 
Categoria Temática Estudos 
Gestão Democrática A, B 
Educação Popular B, C, E 
Fracasso Escolar D, F 
Fonte: A autora (2017) 
 
1.3.1 Gestão Democrática 
 
O modelo administrativo do ensino ocorreu de forma centralizadora, autoritária e 
excludente, durante muito tempo. Era centrado na figura do diretor as tomadas de decisões e, 
40 
conforme período histórico, no qual repercutia a era industrial, as instituições escolares 
tinham um funcionamento semelhante às da fábrica: produção em série, controle e reprodução 
capitalista. Assim, a escola servia para a reprodução de classes, no momento que se visava 
preparar as camadas populares para a mão de obra (BORGES, 2011). Embora estudos 
repudiem essa forma dominante de administrar o ensino e as políticas educacionais legitimem 
a gestão democrática como de suma importância para a qualidade da educação, ainda se 
percebe fortemente reflexos desse contexto histórico, na forma de gerenciar a educação 
básica.Silva e Falcão (2012) sinalizam que o acesso e a permanência dos sujeitos na escola já 
estão garantidos em lei, conforme a Constituição Brasileira (BRASIL, 1988) e a LDBN 
(BRASIL, 1996); no entanto, a gestão democrática é capaz de articular ações para que se 
viabilize a condição de frequência escolar. Problematiza também a inclusão dos alunos na 
escola, pois a mesma pode promover e produzir exclusões do sistema de ensino, trazendo em 
sua discussão a qualidade da educação, principal objetivo da gestão democrática, quando 
metodologia, currículo e avaliação ocorrentes de forma inapropriada, juntamente com a 
precariedade que se encontra o ensino público no Brasil, podem ser desencadeadores da 
evasão escolar. Essa problemática se amplia quando se refere à EJA, pois, conforme já 
discutido no presente trabalho, esta ocupa o lugar de secundarização, inscrita em uma política 
compensatória. 
As pesquisas (SILVA; FALCÃO, 2012; PEDRALLI; RIZZATTI, 2013) apontam que 
é possível diminuir o índice da evasão através da categoria participação, embora Pedralli e 
Cerutti-Rizzatti (2013) apresentem esta discussão de forma subjetiva. Ambos citam projetos 
que são planejados no coletivo escolar, CASE (Contrato de Ação no Combate à Evasão) e 
Nenhum a Menos, com a finalidade de diminuir os índices da evasão. Na perspectiva da 
gestão democrática, percebe-se que a evasão não é apenas uma problemática do diretor, mas 
também uma problemática de ordem social, que envolve a comunidade escolar. Nesse viés, os 
projetos com a participação efetiva dos diferentes segmentos da escola são de suma 
importância, pois os seus diferentes pontos de vistas podem contribuir para compreender os 
motivos que levam à evasão escolar, as formas preventivas dessa problemática e até mesmo o 
resgate dos alunos que já deixaram os bancos da EJA. Cabe destacar que a pesquisa de Silva e 
Falcão (2012) propiciou a formação de uma comissão com representantes da comunidade 
escolar para a implementação do CASE. Essa comissão passou por formações que discutiram 
sobre gestão democrática e evasão de alunos na EJA. 
41 
Luck (2005) ressalta que o conceito de gestão participativa envolve a comunidade 
escolar, compreendida como todos os interessados na escola e na melhoria do processo 
pedagógico. Complementa afirmando que este trabalho é uma mobilização de esforçados 
coletivos e organizados. 
Nesta perspectiva a gestão democrática e participativa se apresenta como 
possibilidade de contribuir no enfrentamento da evasão da escola, pois esta só pode 
ser transformada com a participação da comunidade, portanto o fator das 
desistências dos alunos é algo a ser debatido, entendido e enfrentado de forma 
coletiva (SILVA; FALCÃO, 2012, s/p). 
A participação é um elemento importante para a democratização da sociedade e serve 
como ferramenta capaz de romper com a tradição elitista e excludente da mesma. Freire 
(2005) se refere a participação como possibilidade dos sujeitos se autoeducarem na medida 
que participam da vida da sociedade, sendo a escola uma importante instituição que 
desencadeia o senso de participação dos sujeitos, tornando-os mais atuantes e críticos. 
Pedralli e Cerutti-Rizzatti (2013) apresentam, a partir das observações realizadas, uma 
comunidade escolar unida, onde gestores, professores, funcionários e alunos praticam 
atividades conjuntamente, como lanche e esportes. Esse aspecto traz a forma horizontal das 
relações dentro do ambiente escolar, também característica da gestão democrática, se 
distanciando de posturas autoritárias e de hierarquização, nas quais Luck (2005) propõe em 
sua teoria a superação. A pesquisa também faz referência à maneira como a coordenação 
pedagógica conduzia os dias em que, devido ao inverno chuvoso, os alunos tinham 
dificuldades de acesso à escola. Na ocasião, a profissional se disponibilizava a buscar os 
alunos em casa. Longe de atribuir essa atitude à sua função, no entanto, é digno de destaque 
que a atitude transparece o olhar afetuoso, comprometido e preocupado, necessário quando se 
refere a evasão escolar. 
Cabe trazer a discussão posta por Pedralli e Cerutti-Rizzatti (2013) acerca da 
identidade, pois quando não estabelecido o vínculo necessário entre aluno e escola, a 
identificação desse sujeito com a instituição não se constitui, acarretando em distanciamento e 
até mesmo na sua desistência das aulas. É sabido que para se criar identidade escolar se 
necessita de sentimento de pertencimento ao espaço, o qual somente será gerado no momento 
em que o sujeito possa operar nele através de sua voz. Nesse sentindo, mais uma vez a gestão 
democrática pode favorecer, pois oportuniza os espaços legítimos de participação, autonomia 
e criação da comunidade escolar. 
Democracia e participação são conceitos inseparáveis, embora, segundo Luck (2009), 
no contexto escolar, possa ocorrer a participação sem espírito democrático, o que resulta num 
42 
“significado limitado e incompleto de participação” (p. 54), resultando desta maneira, numa 
pseudoparticipação. A participação, para ser democrática necessita assumir uma dimensão 
política, onde haja uma atuação consciente e de influência para com o meio. 
Cabe lembrar que toda pessoa tem o poder de influência sobre o contexto de que faz 
parte, exercendo-o independentemente de sua consciência desse fato e da direção e 
intenção de sua atividade. Todavia, a falta de consciência dessa interferência resulta 
em uma falta de consciência do poder de participação que têm [...] (LUCK, 2009, 
p.30). 
Assim, a problemática da evasão escolar, dividida com a comunidade e a ela atribuída 
a participação no que se refere a pensar sobre estratégias nesse campo, torna-se política e de 
relevância social, devolvendo à comunidade escolar, em contrapartida dos esforços, a 
consciência do poder político e participativo enquanto cidadãos. 
 
1.3.2 Educação Popular 
 
A educação popular é uma corrente teórica que surgiu com força entre os anos 1950 e 
1960, com o propósito de problematizar a educação naquele período, promovendo práticas 
educativas liberadoras à classe popular. Essas práticas, ainda com sentido contemporâneo, 
almejam a transformação da sociedade através do deslocamento do sujeito da condição de 
oprimido, para uma condição crítica e autônoma (FREIRE, 2000). Deste modo, a educação 
popular ocorre através de “uma especificidade de procedimentos educacionais que construa 
junto com o povo todas as possibilidades de decisão política e ação coletiva, a partir dos 
interesses dos grupos populares” (PACHECO JÚNIOR; TORRES, 2009, p 25). 
De acordo com Freire (2000), as práticas educativas que se alinham à perspectiva da 
educação popular apresentam uma estreita relação com a política por ter o propósito de 
emancipar o sujeito para o exercício da sua cidadania. O autor critica severamente a educação 
bancária, a qual, em uma concepção de educação tradicional, não leva em consideração os 
saberes dos sujeitos e tampouco faz relação com o meio que os cerca, transcorrendo as aulas 
através da transferência de saberes entre professor e alunos. 
Ruhena e Jesus (2016) relacionam a evasão com o fato de os professores não 
conseguirem aliar a teoria à práxis. Essa situação pode ocorrer devido à falta de tomada de 
consciência dos professores sobre as problemáticas de ordem social que emergem no 
cotidiano dos alunos da EJA. Assim, em condição de alienação, os professores, munidos da 
teoria, não a utilizam para ações transformadoras. Rossato (2010, p. 325), ao conceituar a 
práxis, de acordo com a teoria freiriana, coloca que: 
43 
A práxis implica a teoria como um conjunto de ideias capazes de interpretar um 
dado fenômeno ou momento histórico, que, num segundo momento, leva um novo 
enunciado, em que o sujeito diz a sua palavra sobre o mundo e passa a agir para 
transformar essa mesma realidade. 
De posse no que anunciam Ruhena e Jesus (2016) sobre a fragilidade

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