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Política Fiscal pós-Pandemia

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ECONOMIA PÓS-PANDEMIA
Cap. 1 - Política fiscal, desigualdades e direitos humanos
A política fiscal é redistributiva por natureza uma vez que beneficia mais ou menos determinados indivíduos ou grupos. As leis tributárias quase sempre refletem ou mesmo aumentam quaisquer disparidades econômicas entre grupos de pessoas, sendo muito propensas a reproduzir desigualdades existentes.
A tributação direta (sobre a renda e a riqueza) tende a reduzir a desigualdade social por meio do uso de alíquotas progressivas. Já a tributação indireta (sobre o consumo de mercadorias, bens e serviços) tende a aumentar a desigualdade, uma vez que esses impostos são regressivos e incidem proporcionalmente mais sobre os mais pobres.
Os estudos sobre desigualdade fazem uso de mensurações relativas que comparam níveis de renda, riqueza, anos de educação, etc. Já os direitos humanos tratam de indicadores absolutos, por exemplo, ter ou não ter acesso à água potável, alimentos, saneamento básico ou um nível de renda mínimo para uma vida digna. 
A política fiscal é um importante instrumento para a garantia dos direitos humanos, uma vez que todos esses direitos, uns mais outros menos, exigem recursos para a sua garantia. As escolhas orçamentárias podem ser decisivas tanto para a garantia, quanto para a violação dos direitos humanos.
Três funções clássicas da política fiscal:
· A função alocativa da política fiscal se destina a prover necessidades públicas e decorre de um reconhecimento da ineficácia do sistema de mercado em prover determinado bens e serviços.
· A função distributiva da política fiscal é aquela destinada a distribuir uma parte da renda da sociedade para alcançar uma distribuição desejada pela sociedade. Do lado das despesas, os instrumentos que exercem a função distributiva são as transferências públicas monetárias para pessoas em situação de pobreza. Já do lado das receitas, a composição da carga tributária interfere diretamente na desigualdade de renda de mercado.
· A função estabilizadora da política fiscal é aquela que busca influenciar o nível de emprego e de preços. Ao exercer essa função, a política fiscal deve amenizar ciclos e prevenir crises, além de buscar o pleno emprego.
Os níveis mínimos essenciais de cada um dos direitos contêm elementos que são de cumprimento imediato e obrigatório para o Estado, e que devem ser prioritários na alocação de recursos públicos. A existência da necessidade ou insatisfação dos mais básicos níveis de direitos constitui forte evidência de descumprimento das obrigações estabelecidas nos tratados.
Uma das bases do pilar da realização progressiva dos direitos é o conceito de não retrocesso social.
As políticas econômicas, como as dotações orçamentárias e as medidas destinadas a estimular o crescimento econômico, devem garantir que os direitos sejam usufruídos sem nenhum tipo de discriminação.
Cap. 2 - Mitos fiscais, dívida pública e tamanho do Estado
Ajuste fiscal – corte de gastos públicos.
O aumento da dívida pública resultante da atuação do Estado na pandemia é pretexto para a intensificação do discurso da austeridade a partir de uma ideia que dialoga com o senso comum: teremos que pagar a conta da pandemia.
A tentativa de forçar uma redução da dívida pública por meio de cortes de gastos pode ser tão inconsequente socialmente quanto inútil do ponto de vista fiscal. Há uma falácia de composição no argumento, o que vale para uma empresa ou família, não vale para a sociedade como um todo: se formos todos austeros ao mesmo tempo a economia desaba para todos. A metáfora que compara o orçamento público ao familiar é dissimulada e desvirtua as responsabilidades que a política fiscal tem na economia em suas tarefas de induzir o crescimento e amortecer os impactos de crises e dos ciclos econômicos na vida das pessoas.
Ao gastar, o governo aumenta a renda do setor privado e realoca recursos. Ao se endividar, o governo pega dinheiro de quem tem riqueza sobrando e entrega um papel de dívida.
A austeridade por meio de cortes de gastos tem efeitos negativos no crescimento. Entretanto, de forma a tentar manter parcialmente seus argumentos originais, tentam mostrar que supostamente seria melhor cortar gastos do que subir impostos.
Empresários não investem porque o governo fez ajuste fiscal, mas quando há demanda por seus produtos e expectativas de lucro. Se o governo corta gastos no momento de crise contribui para a queda da demanda no sistema.
Mas se não há um limite de endividamento pré-estabelecido, isso significa que um governo pode aumentar sua dívida indefinidamente em relação ao tamanho de sua economia? Depende. E é aí que entram perguntas muito importantes. A primeira talvez seja: de que tipo de dívida estamos falando? Trata-se de uma dívida em moeda nacional ou em moeda estrangeira?
Ainda que haja distorções e ineficiências na forma como o Estado brasileiro gasta seus recursos, o fato é que a decisão expressa no pacto social de 1988 requer um total de gastos públicos superior ao dos países que não optaram por oferecer um sistema público de saúde ou de previdência à sua população, por exemplo. A boa notícia é que não há nenhuma evidência sólida de que países com uma carga tributária mais alta crescem menos, o que importa é a distribuição justa e eficiente dessa carga entre setores econômicos e classes sociais. O problema da carga tributária brasileira é a sua má distribuição, e não o seu tamanho.
Ampliar gastos sociais e aumentar a carga tributária incidente sobre altas rendas e patrimônios é uma opção compatível com a sustentabilidade da dívida pública e com a própria democracia.

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