Prévia do material em texto
NEUROCIÊNCIA APLICADA AO MARKETING OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Distinguir marketing de experiência e marketing sensorial. > Relacionar o conceito de neuromarketing à experiência do consumidor. > Analisar a aplicação da neurociência ao marketing de experiência. Introdução O marketing de experiência, ou marketing experiencial, está relacionado ao envol- vimento e à interação criativa que as marcas criam com seus consumidores para que essas situações sejam memoráveis. O objetivo do marketing de experiência é criar uma experiência realmente positiva para os consumidores, que aumente e agregue valor, para que eles próprios se tornem porta-vozes da marca e das ações estratégicas da marca. Neste capítulo, você vai estudar o que é marketing de experiência e como se diferencia do marketing sensorial, dois conceitos que, muitas vezes, acabam sendo usados como sinônimos. Vai estudar a importância do neuromarketing na criação da experiência do consumidor, além de como usar a neurociência para aplicar o marketing de experiência ao entendimento do comportamento do consumidor. Neuromarketing e marketing de experiência Irian Thais Costa O que é marketing de experiência Imagine que você está saindo de casa e fica com vontade de tomar um café. Perto da sua casa, há uma padaria que faz um café ótimo e barato, mas você soube que, um pouco mais à frente, abriu uma Starbucks, famosa rede de cafeteria norte-americana. Você decide ir à Starbucks e pagar mais caro, porque sabe que terá uma experiência muito mais interessante, desde o atendimento até o momento de pegar seu copo de café. O marketing de experiência é uma estratégia utilizada por muitas empre- sas atualmente, desde as eletrônicas de consumo, como a Apple, passando pelo ramo hoteleiro, até companhias aéreas, como a Emirates. Isso porque o marketing (sejam os gestores, seja a área acadêmica) percebeu que en- tender como os consumidores experimentam as marcas é fundamental para se diferenciar em um mercado competitivo, o que significa proporcionar experiências atraentes e únicas. O marketing de experiência não fica restrito ao produto (dos 4Ps — produto, preço, praça e promoção). Podem ser criadas estratégias que abarquem diferentes áreas da empresa. Exemplo disso é a Amazon, que fornece uma experiência de entrega/logística não necessariamente ligada a produtos, mas à entrega quase imediata, tornando esse o diferencial da empresa. A palavra “experiência” pode ser definida como todo conhecimento ad- quirido e acumulado ao passar do tempo por um indivíduo, seja por meio da prática, da observação ou da vivência (MICHAELIS, 2021). Alguns filósofos, como Søren Kierkegaard, defendem que as experiências, por serem subjetivas, estão vinculadas às emoções. A pesquisa de marketing, por sua vez, considera o afeto e as emoções como parte das experiências, aspectos que orientam a tomada de decisão dos consumidores (SCHMITT, 2010). O marketing de experiência tem como foco, portanto, a vivência do cliente, que acaba criando uma relação ou laços com determinadas marcas. É um campo do marketing que visa a proporcionar experiências aos consumidores por meio dos sentidos (ou sensoriais), das emoções, da cognição, dos compor- tamentos e da identificação com a marca e seus propósitos (SARGI; MATTOS, 2015; SCHMITT, 1999). Nesse campo, estuda-se como atividades e estímulos podem influenciar o cliente na tomada de decisão, seja pelo reconhecimento, seja pela compra dos produtos/serviços de uma marca ou empresa (FARIAS; AGUIAR; MELO, 2014). Neuromarketing e marketing de experiência2 Voltando ao exemplo do café da Starbucks. Podemos perceber que a marca se esforça para gerar e criar experiências únicas desde o momento que o cliente entra na cafeteria até o momento que sai. É, por isso, conhecida como “experiência Starbucks”. Por exemplo, a qualidade dos cafés está atestada nas embalagens dos grãos disponíveis para compra, além das informações de origem e história dos cafés. Isso permite agregar valor ao produto e criar um ambiente com experiências ao consumidor, pois conquista sua atenção. O cuidado que a Starbucks tem com o cliente também pode ser frisado, pois a marca já criou uma cultura em que os atendentes chamam os clien- tes pelo nome ao entregar pedidos, ao contrário de outras lanchonetes que normalmente chamam por uma senha. Assim, desde o momento que o cliente chega ao caixa, os funcionários são treinados para o atendimento de excelência, criando copos personalizados, que garantem a individualidade de cada consumidor. Caso o cliente não saiba o que escolher, os baristas fazem perguntas e auxiliam para a escolha certa. O espaço físico também é construído e decorado para transmitir a sensação de aconchego, com sofás e mesas confortáveis, bem como oferta de wi-fi e tomadas aos consumidores que desejarem ficar trabalhando ou fazer reuniões no espaço. Toda essa ambientação gera um marketing boca a boca positivo, o que faz com que a empresa não precise investir em publicidade em grandes mídias, pois os próprios clientes fazem a propaganda. O atendimento, o ambiente e a qua- lidade dos produtos acabam conquistando o consumidor. Tirar foto com um copo da Starbucks é sinônimo de status, incentivando mais e mais pessoas a criarem um vínculo com a marca, recomendando as lojas para os amigos, gerando sempre novos consumidores (SOBRE..., 2021). O marketing experiencial, para a construção das estratégias de marketing, deve considerar os principais fatores neurobiológicos e psicológicos de um indivíduo. Isso porque o comportamento do consumidor é compreendido partindo da teoria e da prática psicológicas para que as marcas e empresas possam desenvolver estratégias de comunicação e marketing com foco na criação de um ambiente de experiências (FRANCO et al., 2017). No marketing de experiência, normalmente temos a criação de uma atmosfera que propicia debates acerca das experiências, pois são esses debates que vão gerar o marketing de boca a boca. Quando os clientes falam positivamente sobre a marca como um todo ou sobre um produto/serviço específico, a empresa em questão ganha vantagens competitivas, tornando a conversão mais eficaz do que seria no caso das propagandas tradicionais. Isso porque o consumidor é visto como alguém que de fato experimentou o produto/a marca e está, Neuromarketing e marketing de experiência 3 diferentemente do vendedor, compartilhando sua vivência de maneira orgâ- nica e expressiva (ARONNE; VASCONCELOS, 2009). Confira a seguir alguns aspectos sobre o marketing de experiência. � Variáveis emocionais, como o hedonismo, os sonhos, as fantasias, os sentimentos e a diversão, são importantes no processo do comporta- mento do consumidor, abrangendo a visão do experiencial (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982). � As experiências ocorrem como resultado de um encontro ou vivência de coisas. São criadas com base em valores sensoriais, emocionais, cognitivos, comportamentais e relacionais (SCHMITT, 1999). � O marketing de experiência “[…] tem como foco estratégico as experiências, principalmente sensoriais, geradas para o consumidor antes, durante e após a compra” (SARGI; MATTOS, 2015, p. 2). � O marketing de experiências faz com que os consumidores reconheçam ou comprem o produto/serviço depois da ocorrência de atividades ou estímulos, que possibilitam uma tomada de decisões mais rápida e positiva em relação à marca (FARIAS; AGUIAR; MELO, 2014). � O marketing experiencial deve considerar os principais fatores neurobiológicos e psicológicos de um indivíduo, porque o comportamento do consumidor é desenvolvido com a teoria e a prática psicológicas, o que torna possível criar um ambiente de experiências (FRANCO et al., 2017). Com as dimensões sensoriais, emocionais, cognitivos, comportamentais e relacionais que envolvem as experiências — e, portanto, o marketing de experiência —, os clientes se tornam emocionalmente envolvidos com os ob- jetos da experiência(PALMEIRA et al., 2009). A primeira dimensão, a sensorial, diz respeito aos cinco sentidos, que afetam as percepções e avaliações de um indivíduo. Essa dimensão pode ser utilizada para avaliar as características de cores, sabores, texturas e cheiros (BARRIOS, 2012). Quando utilizados da maneira correta, os cinco sentidos podem atingir o subconsciente dos consumidores, fazendo com que as emoções remetam a alguma sensação, que vai além de palavras e imagens, pois está diretamente ligada aos órgãos sensoriais. Esses sentidos podem ser a visão, a audição, o olfato, o paladar e o tato. Na segunda dimensão, emocional, são utilizados estímulos emocionais, como o humor positivo e as emoções propriamente ditas do indivíduo, como orgulho, alegria e nostalgia. De maneira intuitiva, normalmente, quanto maior o número de experiências positivas com um produto, mais positivas serão as emoções desenvolvidas com uma marca. Os sentimentos e as emoções, desse Neuromarketing e marketing de experiência4 modo, determinam as experiências afetivas e emocionais com uma marca (SCHMITT, 2002), como quando vemos na televisão uma propaganda que nos faz rir ou nos emociona. Essa dimensão também envolve as experiências positivas que o indivíduo vai construindo ao longo do tempo com uma marca ou empresa, desenvolvendo uma sensação experiencial positiva. A terceira dimensão, cognitiva, está associada ao pensamento dos con- sumidores. Ela faz com que as pessoas mudem seus paradigmas e pensem sobre outra forma por meio de novas expectativas (SCHMITT, 1999), como as marcas que oferecem ao público novas perspectivas, instigando o consumidor a utilizar a criatividade e resolver problemas utilizando a colaboração. A quarta dimensão, comportamental, está relacionada a criar experiên- cias com que os consumidores se sintam à vontade de modificar padrões de comportamento ou estilos de vida, incentivando-os a colocar uma ação em prática (SCHMITT, 2002). Exemplo disso foi uma ação da marca de roupas The North Face. A empresa disponibilizou algumas jaquetas no topo de uma parede de escalada em suas lojas. Os clientes que conseguiam chegar até o topo ganhavam gratuitamente a jaqueta da marca, estimulando os compor- tamentos posteriores de adotar o estilo de vida. Por fim, a quinta dimensão, relacional, remete à identificação no público, criando relações mais profundas e próximas com os consumidores pela cone- xão com outras pessoas ou com grupos sociais (SCHMITT, 2002). As situações de compra não são tão utilizadas nesse contexto, mas a identificação com a marca e seus propósitos resulta na escolha por essa marca. Exemplo disso é o posicionamento das empresas, como a Nike ao apoiar o movimento Black Lives Matter. A Figura 1 apresenta de maneira condensada cada dimensão do marketing de experiência e em que cada uma tem efeito (SCHMITT, 1999). Figura 1. Dimensões do marketing de experiência. Neuromarketing e marketing de experiência 5 É a mesma coisa? Marketing de experiência e marketing sensorial O marketing sensorial faz parte da criação do marketing de experiência, mas, como vimos, o marketing de experiência não se limita apenas ao sen- sorial. O marketing sensorial tem como foco o estímulo dos cinco sentidos, visando a envolver os consumidores em um ambiente onde as experiências são construídas. É uma das formas utilizadas para construir um ambiente e, por consequência, o marketing de experiência (CARÙ; COVA, 2003). Portanto, não são a mesma coisa. As cinco dimensões do marketing de experiência podem ser utili- zadas individualmente ou em conjunto para gerar um ambiente e o marketing de experiência propriamente dito. Neuromarketing e sua importância para a experiência de consumo Em alguma vez que foi ao cinema, você já sentiu aquele cheiro de pipoca e ficou com vontade comprar o maior pacote disponível, mesmo estando sem fome? Ou assistiu a uma propaganda de tênis de corrida com músicas rápidas e frases motivadoras fortes e na hora teve vontade de comprar um tênis e correr por, pelo menos, 5 km? Essas sensações são geradas pelas dimensões do marketing de experiência, criadas com base no neuromarketing. O neuromarketing visa a entender a reação implícita dos consumidores quando são expostos a estímulos, sejam marcas, produtos, embalagens, experiências ou publicidade (SETTI, 2013). Apoiando-se interdisciplinarmente na psicologia, na neurociência, na economia e no próprio marketing, esses conhecimentos se complementam para compreender o comportamento do consumidor, seja nas suas decisões de consumo, seja nas suas relações com o mercado. Isso é essencial, visto que os consumidores, assim como o mundo, transformam-se, e compreender o que eles querem (e muitas vezes nem sabem que querem) é uma ferramenta poderosa para a vantagem com- petitiva. Considerando o neuromarketing, devido aos avanços da ciência, é possível desenvolver formas de investigar as experiências e as percepções inconscientes dos consumidores com técnicas de neuroimagem. Isso pode ocorrer se forma a complementar as tradicionais pesquisas qualitativas e Neuromarketing e marketing de experiência6 quantitativas, por apresentar minúcias que não são tangíveis em escalas (ZALTMAN, 2003). Compreender o cérebro dos consumidores é importante porque, segundo Wegner (2002), 95% dos pensamentos, emoções, aprendizados e sentimentos que levam à tomada de decisão ocorrem de forma inconsciente, assim como os processos mentais que ocorrem enquanto os indivíduos desenvolvem suas experiências de mundo (ZALTMAN, 2003). Pelos processos inconscientes, é possível compreender por que os consumidores preferem uma marca e não outra, suas crenças e como as experiências impactam suas decisões. Como as decisões acontecem antes mesmo de serem tomadas, os julgamentos e as avaliações inconscientes servem para orientação (BECHARA; DAMASIO, 2005; BERRY; CARBONE; HAECKEL, 2002). Por isso, é essencial que os profissionais de marketing compreendam a inconsciência da mente humana, considerando os aspectos psicológicos, sociológicos, antropológicos e neurológicos, tendo noção de mente, cérebro, corpo e sociedade, pois o cérebro é capaz de interagir com o mundo social e físico ao redor. Cada aspecto possui uma importância: o corpo capta as informações do mundo, produzindo as emoções e os comportamentos. Esses comportamentos são colocados em ação, mas passam pelas convenções e tradições sociais e culturais. Dessa forma, existe o desenvolvimento das habilidades cognitivas dos indivíduos, moldando o cérebro humano. Quando modificado, qualquer componente acaba por alterar os demais aspectos (ZALTMAN, 2003). O neuromarketing auxilia também no desenvolvimento do marketing. Embora esse tema tenha aparecido com bastante frequência em notícias, documentários e pesquisas atualmente, ele não é recente. Nos anos 1980, Holbrook e Hirschman publicaram o artigo “Os aspectos experienciais do consumo: fantasias, sentimentos e diversão do consumidor” defendendo que o paradigma sobre o processamento das informações não considerava os demais fenômenos do consumo, que envolvem fantasias, sentimentos e diversão, além dos lazeres lúdicos, do prazer sensorial, dos sonhos, do prazer estético e das respostas emocionais (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982). Portanto, a visão experiencial pode ser considerada um estado subjetivo da consciência, enfatizando os valores e significados simbólicos, os processos inconscientes e os sinais não verbais que advêm do consumo. Isso entra em consonância com o próprio objetivo do neuromarketing: explorar processos inconscientes do cérebro e da mente humana e suas relações com a realidade. A análise da experiência de consumo pode ser baseada em dois pilares. O primeiro se dá como oposição entre os acontecimentos padrões e extra- Neuromarketing e marketing de experiência 7 ordinários para o consumidor. O segundo demonstra uma polarização entre as forças exercidas pelo consumidor visando ase contrapor ao que é dado pela sociedade (CARÙ; COVA, 2003). Com isso, as análises da experiência do consumidor e de consumo podem ser visualizadas com base na relação e na interação entre os aspectos estruturais e funcionais, sendo classificadas nos quatro tipos a seguir (LANIER JUNIOR; RADER, 2015). � Experiências de desempenho: são experiências comuns, relacionadas à aceitação das estruturas da sociedade. Estão ligadas aos eventos esportivos, programas de televisão, feiras comerciais. � Experiências libertadoras: desenvolvem relações antiestruturas. São extraordinárias e promovem o transcender das estruturas, sejam elas a natureza de consumo da sociedade, a rotina da sociedade ou, até mesmo, os limites da vida humana. Os indivíduos se sentem livres para participar de algo que tenha um significado pessoal, com identidade de valores. A libertação ocorre ao viver aquela experiência, como participar de um grupo de motociclistas ou um evento de montanhismo, coisas que permitam a esses indivíduos desenvolverem novas habilidades, construírem significados pessoais e alterar suas identidades durante um período. � Experiências estocásticas: dizem respeito à forma que as experiências de consumo abordam as relações estruturais, de maneira antifuncional. Nesse tipo de experiência, não há busca pelo transcender, nem física nem espiritualmente, mas pela experimentação de situações ambíguas, inexplicáveis e não intencionais. Exemplo disso são os cassinos, bares e clubes, onde o objetivo é experimentar as consequências antifuncionais inerentes que ocorrem dentro dessas estruturas. � Experiências de aventura: visam a levar as pessoas para além do co- tidiano, engajando-as numa experiência indefinida, incerta e inde- terminada sobre a existência e transformando-as com uma relação histórica. Diferenciam-se das libertadoras, pois visam a transgredir as estruturas, distinguirem-se da vida cotidiana. Os clientes podem mudar o que pensam sobre a marca e sua lealdade a ela dependendo do tipo de emoção acionada na experiência de consumo (NUNESMAIA, 2011; SHAW; IVENS, 2002). Isso pode ser explicado pelo próprio conceito de emoção aplicado ao ambiente de consumo: uma reação afetiva causada por uma experiência de consumo muito particular (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982). Essas experiências de consumo criam um conjunto de Neuromarketing e marketing de experiência8 interações entre um cliente e um produto, ou marca, gerando uma reação. Essa experiência será algo extremamente pessoal e vai desenvolver o envol- vimento do cliente em diferentes níveis, como racional, emocional, sensorial, físico e espiritual (GENTILE; SPILLER; NOCI, 2007). Marketing de experiência não é o mesmo que construção associativa das marcas, como as avaliações gerais de “Gosto da marca” ou “Gosto muito desse produto”. No marketing de experiência há sensações, sentimentos, cognições e respostas comportamentais geradas por estímulos específicos ao consumidor, sendo que essas experiências podem resultar em avaliações da própria experiência, como “Gosto muito da experiência que tenho com a marca X” (SCHMITT, 2002). É interessante salientar que as experiências ocorrem em uma variedade muito grande de ambientes. Normalmente, ocorrem em um ambiente de com- pra, mas também podem ocorrer de forma indireta quando os consumidores são expostos a experiências de consumo em sites, aplicativos e mídias sociais. Como exemplo, temos a user experience (UX), área em constante expansão, que estuda a experiência do usuário com o objetivo de estimular melhorias de acesso e utilização de aplicativos e sites. O profissional que explora a UX busca compreender como é a relação do usuário com o produto/serviço no ambiente on-line e, de maneira mental e empática, coloca-se na posição do usuário. Estuda, também, o comportamento das pessoas com base em pesquisas, entrevistas e testes de usabilidade. Com isso, o profissional de UX pretende entender não apenas o que o usuário quer, mas também qual é a experiência que a marca/empresa deseja oferecer aos seus consumidores (UX..., 2019). O neuromarketing, portanto, está relacionado à geração de experiências ao consumidor, seja no ambiente de varejo propriamente dito, seja em ou- tros ambientes. Quando estamos ouvindo música em um aplicativo como o Spotify, acessando o Instagram ou o Facebook ou tomando um café na Starbucks, há estudo e criação de valor para o consumidor final. Por isso, é muito importante compreender o papel da neurociência para os estudos e as próprias estratégias de marketing de experiência. A UX se baseia em alguns pilares para criar uma experiência ao usuário ao utilizar um aplicativo ou site, quais sejam: modelo baseado em empatia, vieses cognitivos, teorias da fluência e disfluência, gatilhos mentais e teoria das cores, luzes e contraste. Neuromarketing e marketing de experiência 9 Importância da neurociência para o marketing de experiência Quando conhecemos o cérebro, as motivações e os desejos dos consumidores, é muito mais fácil ligá-los aos produtos e serviços compatíveis com suas necessidades, facilitando seu processo de escolha. Buscando compreender qual é a abordagem mais eficiente para compreender os consumidores, os profissionais de marketing utilizam muitas técnicas, como grupos focais e pesquisas de mercado, estratégias razoavelmente acessíveis e fáceis de captar dados, mas que, muitas vezes, apresentam ruídos na coleta. Essas duas técnicas se baseiam no processamento cognitivo humano e apresentam dois problemas: a possibilidade de o indivíduo não querer responder por diversas razões, como devido a filtros éticos e morais, ou a possibilidade de o indivíduo não saber responder com consciência sobre as reais motivações das suas decisões. A neurociência, pela coleta de dados com biomarcadores no comportamento humano, é uma solução viável para superar esses problemas. Os biomarcadores servem para coletar informações de maneira independente da cognição e da racionalidade humana (KENNING; PLASSMANN, 2008; PASTORE; MAFFEZZOLLI; MAZZON, 2018). Frente às limitações apresentadas anteriormente, o marketing pode utilizar as respostas fisiológicas dos indivíduos, com processos neurais subconscientes e inconscientes, eliminando o filtro do processamento cognitivo sobre suas respostas. Logo, a aproximação entre a neurociência e o marketing apresenta uma construção teórica integrativa desses dois campos. Uma dessas construções é a neurociência cognitiva organizacional, que propõe pensar sobre o negócio ao passo que considera a interação entre os sistemas biológicos do cérebro, as emoções, o processamento de informação da racionalidade humana, bem como as interações sociais (LEE; BUTLER; SENIOR, 2010). Já a neurociência da decisão explora os mecanismos do cérebro humano no âmbito das decisões, no caso descrito aqui, de con- sumo (SHIV et al., 2005), e a neurociência do consumidor usa conhecimentos e ferramentas neurobiológicas para compreender a mente do consumidor, baseando-se também na psicologia, com as terminologias de neuromarketing (JAVOR et al., 2013). Utilizar a neurociência é uma forma de compreender melhor os processos instintivos inconscientes de motivação dos seres humanos. Isso gera melhores insights (ideias e compreensão) para refinamento das experiências criadas para atingir a satisfação dos consumidores. A neurociência, condensada no neuromarketing, serve para entender a aplicação dos métodos neurocientí- Neuromarketing e marketing de experiência10 ficos visando ao estudo do comportamento dos seres humanos em relação aos mercados e suas relações comerciais. Outras áreas, como a computação e a engenharia, podem se beneficiar da neurociência, o que acaba impactando a área do marketing pelo uso, por exemplo, de ferramentas de machine learning. Essa ferramenta se baseia na estrutura cerebral sob a forma de redes neurais ou códigos genéticos. Dessa forma, utilizando a neurociência, omarketing pode compreender e analisar os consumidores estudando os fenômenos biológicos e psicológicos dos indivíduos quando expostos a estímulos variados (LEE; BRODERICK; CHAMBER- LAIN, 2007). Com esses estudos, é possível ter dados mais confiáveis, porque os métodos da neurociência identificam exatamente o que o consumidor sente e não apenas o que ele diz sentir. Assim, as decisões de compra estão centradas em sensações e emoções. Por mais racional que uma pessoa seja, suas escolhas são criadas com base em emoções e reações ao ambiente. É importante lembrar que o comportamento humano é muito complexo para ser compreendido apenas com os marcadores neurobiológicos ou rea- ções diversas. No entanto, essas ferramentas podem ajudar a compreender como os consumidores pensam e agem, além de poderem demonstrar novas interconexões, sendo benéficas para criar estratégias que visem às experi- ências dos consumidores (BUTLER, 2008). É possível, por exemplo, utilizar a neurociência para o desenvolvimento de um ambiente com o marketing de experiências, tornando tanto o espaço físico quanto o ato de comprar mais atrativos, resultando na fidelização por meio de respostas emocionais e comportamentais dos consumidores. As emoções têm papel fundamental, do ponto de vista tanto da neuro- ciência quanto do marketing de experiência, pois afetam o comportamento dos consumidores e permitem que sejam desenvolvidas experiências de consumo e estratégias que apelam para si (HOLBROOK; HIRSCHMAN, 1982). Como o marketing e a economia de experiências estão cada vez mais pre- sentes no âmbito do consumo, com empresas que baseiam suas vivências na experienciação, como vimos, é importante conhecer os consumidores. Para isso, é possível integrar tecnologias como inteligência artificial e machine learning de forma a obter melhores insights. Torna-se essencial que haja interações significativas entre consumidor e marca, e a neurociência pode ser usada para isso. Neuromarketing e marketing de experiência 11 A economia de experiências parte do pressuposto de que as empre- sas devem proporcionar momentos únicos e experiências que não comportem produtos e serviços isolados, mas sejam a combinação de outros produtos e outros serviços. Confira no exemplo a seguir como a empresa Emirates Airlines consegue englobar inúmeros aspectos para proporcionar aos seus clientes experiências memoráveis em todos as etapas do serviço prestado. A Emirates Airlines tem o objetivo de oferecer um atendimento seguro, inovador e de excelência. A empresa alcança isso com treinamentos extensivos para os funcionários, de modo a fornecer ao cliente um atendimento excepcional desde o check-in no guichê até o desembarque. É conhecida por oferecer atendimento premium à classe executiva e à primeira classe, mas também fornece uma experiência diferenciada para os passageiros da classe econômica. Desde o momento da aquisição de bilhetes, é possível utilizar serviços gratuitos que não são fornecidos por outras empresas aéreas, como tirar o visto para os Emirados Árabes diretamente no site. Mesmo na classe econômica, as poltronas são mais espaçosas se comparadas às de outras empresas, e o teto da aeronave muda de cor com o horário do voo. O serviço de bordo é o carro chefe da empresa para gerar experiências únicas, porque, desde a entrada, o cliente já recebe jornais e revistas de diversos países, e os comissários de bordo dão as boas-vindas aos passageiros em seu idioma nativo. Nas poltronas, no momento do embarque, ficam à disposição um cobertor, um travesseiro e um kit com fones de ouvido e adesivos, que servirão para que o passageiro informe aos comissários o que deseja, como “não me perturbe”, “me acorde para as refeições” ou “me acorde para o duty free”. Ainda no solo, é distribuído um menu com as opções de alimentação e toalhas para higienização das mãos. Após a decolagem, os comissários oferecem bebidas, como café, água, sucos e refrigerantes, e sempre estão disponíveis para atender qualquer necessidade dos passageiros. É perceptível que a Emirates se baseia em algumas das dimensões do marke- ting de experiência para proporcionar situações memoráveis, como a dimensão emocional, ao despertar o orgulho e a sensação de importância nas pessoas, e a dimensão sensorial, ao proporcionar conforto e alimentação diferenciados, que vão além das barrinhas de cereal que outras companhias aéreas oferecem aos seus passageiros. É importante frisar que o público da Emirates Airlines é de alto padrão e tem a possibilidade de pagar por esse tipo de experiência, mas o marketing de experiência pode ser aplicado para os mais variados públicos e classes sociais, indo desde um bom atendimento até uma situação de compra única. Neuromarketing e marketing de experiência12 Como podemos perceber pelo exemplo da Emirates, uma experiência não se faz apenas com a dimensão sensorial do marketing; ela é criada com base nos valores sensoriais, emocionais, cognitivos e de identificação. A dimensão sensorial, como vimos, é uma parte da criação do marketing de experiência, que ocorre quando há um resultado de encontro e vivência de situações. Também é possível compreender no exemplo a importância do neuromarketing para criação dos tipos de experiência, auxiliando para o desenvolvimento de experiências que levem em consideração as fantasias, os desejos e a diversão do consumidor, incluindo os prazeres sensoriais, lúdicos, estéticos e emocionais. Por fim, podemos notar a importância da neurociência, tanto para o neuromarketing quanto para a criação do marketing de experiência, que tornou possível compreender melhor o comportamento do consumidor, de maneira neurobiológica, superando a dificuldade de compreender de fato o processamento cognitivo das informações. Referências ARONNE, C. V.; VASCONCELOS, M. C. R. L. The impact of experiential marketing on the customer’s perception of a brand’s essence. In: ENCONTRO DA ANPAD, 33., 2009, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: EnANPAD, 2009. BARRIOS, M. Marketing de la experiencia: principales conceptos y características. Palermo Business Review, n. 7, p. 67-89, 2012. BECHARA, A.; DAMASIO, A. R. The somatic marker hypothesis: a neural theory of economic decision. Games and Economic Behavior, v. 52, p. 336-372, 2005. BERRY, L. L.; CARBONE, L. P.; HAECKEL, S. H. Managing the total customer experience. MIT Sloan Management Review, v. 43, n. 3, p. 85-90, 2002. BUTLER, M. J. R. Neuromarketing and the perception of knowledge. Journal of Consumer Behaviour, v. 7, p. 415-419, 2008. CARÙ, A.; COVA, B. Revisiting consumption experience: a more humble but complete view of the concept. Marketing Theory, v. 3, n. 2, p. 267-286, 2003. FARIAS, S. A.; AGUIAR, E. C.; MELO, F. V. S. Store atmospherics and experiential marketing: a conceptual framework and research propositions for an extraordinary customer experience. International Business Research, v. 7, n. 2, 2014. FRANCO, N. H. et al. A importância do marketing de experiência no fluxo logístico de um parque temático: estudo de caso: Walt Disney. South American Development Society Journal, v. 3, n. 8, 2017. GENTILE, C.; SPILLER, N.; NOCI, G. How to sustain the customer experience: an overview of experience components that co-create value with the customer. European Mana- gement Journal, v. 25, n. 5, p. 395-410, 2007. HOLBROOK, M. B.; HIRSCHMAN, E. C. The experiential aspects of consumption: consumer fantasies, feelings, and fun. Journal of Consumer Research, v. 9, n. 2, p. 132-140, 1982. Neuromarketing e marketing de experiência 13 JAVOR, A. et al. Neuromarketing and consumer neuroscience: contributions to neurology. BMC Neurology, v. 13, n. 1, p. 1-12, 2013. KENNING, P. H.; PLASSMANN, H. How neuroscience can inform consumer research. IEEE Transactions on Neural Systems and Rehabilitation Engineering, v. 16, n. 6, p. 532-538, 2008. LANIER JUNIOR, C. D.; RADER, C. S. Consumption experience: an expandedview. Marketing Theory, v. 15, n. 4, p. 487-508, 2015. LEE, N.; BRODERICK, A. J.; CHAMBERLAIN, L. What is ‘neuromarketing’? A discussion and agenda for future research. International Journal of Psychophysiology, v. 63, n. 2, p. 199-204, 2007. LEE, N.; BUTLER, M.; SENIOR, C. The brain in business: the case for organisational cognitive neuroscience? Nature Precedings, v. 49, n. 3, p. 129-131, 2010. MICHAELIS. 2021. Disponível em: http://michaelis.uol.com.br. Acesso em: 25 nov. 2021. NUNESMAIA, A. L. S. Consumidor injustiçado, consumidor emocionado? Uma análise das emoções em episódios de reclamação. In: ENCONTRO DA ANPAD, 35., 2011, Rio de Janeiro. Anais [...]. Rio de Janeiro: EnANPAD, 2011. PALMEIRA, M. et al. Experiential marketing in bookstores: an analyses of business strategy and customer experience. In: ENCONTRO DA ANPAD, 33., 2009, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: EnANPAD, 2009. PASTORE, C. M. A.; MAFFEZZOLLI, E. C. F.; MAZZON, J. A. O uso de biomarcadores em pesquisas de marketing. Revista de Administração Contemporânea, v. 22, n. 3, 2018. SARGI, L. P.; MATTOS, A. O marketing de experiência e a sua importância no cenário mercadológico atual. In: CONGRESSO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO NA REGIÃO CENTRO- -OESTE, 17., 2015, Campo Grande. Anais [...]. Campo Grande: Intercom, 2015. p. 1-10. SCHMITT, B. Experience marketing: concepts, frameworks and consumer insights. Foundations and Trends in Marketing, v. 5, n. 2, p. 55-112, 2010. SCHMITT, B. Experiential marketing. Journal of Marketing Management, v. 15, p. 53-67, 1999. SCHMITT, B. Marketing experimental. São Paulo: Nobel, 2002. SETTI, R. Pioneira do neuromarketing no Brasil, carioca Forebrain quer provar que o que faz é ciência. O Globo, 6 jun. 2013. SHAW, C.; IVENS, J. Building great customer-experiences. New York: Palgrave Macmillan, 2002. SHIV, B. et al. Decision neuroscience. Marketing Letters, v. 16, n. 3, p. 375-386, 2005. SOBRE a Starbucks. Starbucks, 2021. Disponível em: https://www.starbucks.com.br/ sobre. Acesso em: 25 nov. 2021. UX [user experience]: o que é, princípios básicos e cargos. FIA, 18 jun. 2019. Disponível em: https://fia.com.br/blog/ux-user-experience/. Acesso em: 25 nov. 2021. WEGNER, D. M. The illusion of conscious will. Cambridge: MIT, 2002. ZALTMAN, G. Afinal, o que os clientes querem. Rio de Janeiro: Campus, 2003. Neuromarketing e marketing de experiência14 Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Neuromarketing e marketing de experiência 15