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TOXICOLOGIA PROF.A DRA. LIANA INARA DE JESUS DOS SANTOS Reitor: Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira Pró-Reitoria Acadêmica Maria Albertina Ferreira do Nascimento Diretoria EAD: Prof.a Dra. Gisele Caroline Novakowski PRODUÇÃO DE MATERIAIS Diagramação: Alan Michel Bariani Thiago Bruno Peraro Revisão Textual: Fernando Sachetti Bomfim Marta Yumi Ando Simone Barbosa Produção Audiovisual: Adriano Vieira Marques Márcio Alexandre Júnior Lara Osmar da Conceição Calisto Gestão de Produção: Cristiane Alves © Direitos reservados à UNINGÁ - Reprodução Proibida. - Rodovia PR 317 (Av. Morangueira), n° 6114 Prezado (a) Acadêmico (a), bem-vindo (a) à UNINGÁ – Centro Universitário Ingá. Primeiramente, deixo uma frase de Sócrates para reflexão: “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida.” Cada um de nós tem uma grande responsabilidade sobre as escolhas que fazemos, e essas nos guiarão por toda a vida acadêmica e profissional, refletindo diretamente em nossa vida pessoal e em nossas relações com a sociedade. Hoje em dia, essa sociedade é exigente e busca por tecnologia, informação e conhecimento advindos de profissionais que possuam novas habilidades para liderança e sobrevivência no mercado de trabalho. De fato, a tecnologia e a comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, diminuindo distâncias, rompendo fronteiras e nos proporcionando momentos inesquecíveis. Assim, a UNINGÁ se dispõe, através do Ensino a Distância, a proporcionar um ensino de qualidade, capaz de formar cidadãos integrantes de uma sociedade justa, preparados para o mercado de trabalho, como planejadores e líderes atuantes. Que esta nova caminhada lhes traga muita experiência, conhecimento e sucesso. Prof. Me. Ricardo Benedito de Oliveira REITOR 33WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 01 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................................................5 1. HISTÓRIA DA TOXICOLOGIA ...................................................................................................................................6 1.1 ANTIGUIDADE .........................................................................................................................................................6 1.2 IDADE MÉDIA ..........................................................................................................................................................6 1.3 RENASCIMENTO..................................................................................................................................................... 7 1.4 ILUMINISMO ........................................................................................................................................................... 7 1.5 IDADE MODERNA ...................................................................................................................................................8 2. CONCEITOS BÁSICOS .............................................................................................................................................8 2.1 DEFINIÇÃO DE TOXICOLOGIA E TOXICIDADE ......................................................................................................8 2.2 OUTROS CONCEITOS IMPORTANTES .................................................................................................................9 3. DIVISÃO DA TOXICOLOGIA ..................................................................................................................................... 11 INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICA PROF.A DRA. LIANA INARA DE JESUS DOS SANTOS ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICA 4WWW.UNINGA.BR 3.1 TOXICOLOGIA ANALÍTICA ..................................................................................................................................... 11 3.2 TOXICOLOGIA CLÍNICA ........................................................................................................................................ 11 3.3 TOXICOLOGIA EXPERIMENTAL ........................................................................................................................... 11 4. ÁREAS DE ATUAÇÃO ............................................................................................................................................... 11 5. FASES DA INTOXICAÇÃO ........................................................................................................................................ 12 5.1 EXPOSIÇÃO ............................................................................................................................................................. 12 5.2 TOXICOCINÉTICA .................................................................................................................................................. 12 5.3 TOXICODINÂMICA ................................................................................................................................................ 12 5.4 CLÍNICA .................................................................................................................................................................. 12 6. FASE I – EXPOSIÇÃO ............................................................................................................................................... 13 7. FASE II – TOXICOCINÉTICA .................................................................................................................................... 15 7.1 MECANISMOS DE TRANSPORTE ATRAVÉS DAS MEMBRANAS ....................................................................... 16 7.1.1 TRANSPORTE PASSIVO E ATIVO ........................................................................................................................ 16 7.1.2 PINOCITOSE ......................................................................................................................................................... 17 7.2 ABSORÇÃO ............................................................................................................................................................. 18 7.3 DISTRIBUIÇÃO .......................................................................................................................................................20 7.4 BIOTRANSFORMAÇÃO .......................................................................................................................................... 21 7.4.1 REAÇÕES DE FASE I ............................................................................................................................................22 7.4.2 REAÇÕES DE FASE II ..........................................................................................................................................24 7.4.3 FATORES QUE INFLUENCIAM A BIOTRANSFORMAÇÃO ................................................................................26 7.5 EXCREÇÃO ..............................................................................................................................................................28 7.5.1 EXCREÇÃO RENAL ...............................................................................................................................................28 7.5.2 EXCREÇÃO PELO TRATO GASTRINTESTINAL .................................................................................................29 7.5.3 EXCREÇÃO PELA VIA PULMONAR ...................................................................................................................29 7.5.4 EXCREÇÃO POR OUTRAS VIAS .........................................................................................................................30 7.5.5 PARÂMETROS BIOLÓGICOS DE ELIMINAÇÃO ...............................................................................................30CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................................................................32 5WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO A toxicologia, como ciência, evoluiu lentamente. O conhecimento científico enfrentou obstáculos, como a superstição e metodologias duvidosas, que, ao invés de promoverem cura, conduziam ao sofrimento e morte do paciente. Contudo, o estudo e a persistência de dedicados pesquisadores formaram os fundamentos que estudamos hoje. No século XX, houve grande avanço no desenvolvimento de substâncias químicas, impulsionado, principalmente, pelas Grandes Guerras Mundiais. Entretanto, essas substâncias não tinham finalidade exclusivamente terapêutica, mas também apresentavam toxicidade. A toxicologia tem como objetivo estudar as interações das substâncias químicas com o organismo por meio de diferentes modelos experimentais, sendo seu objeto de estudo a intoxicação. Para que o mecanismo da intoxicação seja conhecido, é necessário entender os complexos eventos envolvidos, desde a exposição ao agente toxicante até à manifestação de sinais e sintomas. As características físico-químicas das substâncias exercem grande influência no processo de intoxicação, assim como a suscetibilidade individual. Como finalidade didática, a intoxicação é dividida em quatro fases: exposição, toxicocinética (absorção, distribuição, biotransformação e excreção), toxicodinâmica e clínica. Cada uma das fases possui particularidades na análise da interação da substância química em diferentes compartimentos biológicos para prever seus efeitos (principalmente tóxicos). Nesta unidade, iremos conhecer a história da toxicologia, compreender seus principais conceitos e estudar, detalhadamente, as fases de exposição e toxicocinética. 6WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1. HISTÓRIA DA TOXICOLOGIA A toxicologia é uma ciência prática muito antiga, e sua história acompanha a própria história da civilização. Há muito tempo, o homem estuda sobre os efeitos tóxicos de venenos, tanto de origem animal como de origem vegetal. O conhecimento dos venenos animais e dos extratos vegetais era empregado para caça, guerra e assassinatos. 1.1 Antiguidade Um dos registros mais antigos na História é de origem egípcia, denominado Papiro de Ebers (1500 a.C.). Esse documento contém uma lista de, aproximadamente, 800 ingredientes ativos, incluindo metais (como chumbo, cobre e antimônio) e venenos, conhecidos como cicuta, acônito e ópio. Hipócrates, Teofrasto Dioscórides, Avicena e Mitrídates se destacaram pela sua contribuição para a formulação de princípios de toxicologia clínica e para a identificação de novos agentes tóxicos e terapêuticos. Hipócrates estudou sobre a biodisponibilidade e sobredosagem de venenos. Teofrasto publicou um livro chamado Plantarum, que é referência sobre plantas tóxicas. Dioscórides elaborou o tratado De Materia Medica, contendo a descrição de cerca de 600 plantas medicinais, além de produtos minerais e animais. Avicena introduziu discussões sobre mecanismos de ações de venenos. Mitrídates foi o primeiro a realizar experimentos de intoxicação aguda, em que testava vários tipos de venenos em escravos, na tentativa de encontrar seus antídotos. Sua busca pelo antídoto resultou em um composto denominado Mithridaticum, uma mistura de gordura de víbora e enxofre. Com o passar do tempo, surgiu o termo mitridático, que designava o fenômeno de tolerância adquirida. Nesse período, os envenenamentos eram muito frequentes, sendo muito empregados para crimes com fins políticos. Na cidade de Roma, o uso indiscriminado de venenos ganhou proporções epidêmicas a ponto de o sistema jurídico da época criar a primeira lei para punir envenenadores, denominada Lex Cornelia (82 a. C.), elaborada pelo estadista Lúcio Cornélio Sula. 1.2 Idade Média Caracterizada pelo obscurantismo científico, neste período da História, os envenenamentos continuavam sendo frequentes e eram aceitos pela sociedade europeia como risco trivial do cotidiano. Durante a Idade Média, existiam inúmeros envenenadores profissionais a serviço de políticos que viam no envenenamento uma alternativa para ascensão ao poder e sua manutenção. Nessa época, destacou-se um médico árabe chamado Maimonides, o qual organizou um tratado abordando medidas terapêuticas para envenenamentos causados por cobras, insetos e cachorros loucos. Seu estudo destacou o uso do leite, manteiga e gorduras como efeito protetor contra venenos pelo fato de esses alimentos retardarem sua absorção intestinal. 7WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3 Renascimento No início do Renascimento, o uso do veneno continuava com finalidade criminal. Envenenadoras profissionais, como Catarina de Médici, Madame Toffana, Marquesa de Brinvillers e Catherine Deshayes, destacaram-se na história pelo seu “trabalho”, sendo responsáveis por inúmeras mortes, que incluem desde escravos (utilizados para experimentação) e inimigos políticos até familiares e crianças. Na França, o rei Luís XIV instalou uma comissão judicial, intitulada Chambre Ardente, para punir envenenadores. Nesse período, despontou um médico suíço-alemão que revolucionou a história da ciência. Seu nome é Paracelsus. Seu postulado mais conhecido é “Todas as substâncias são venenos; não há nenhuma que não seja um veneno. A dose correta diferencia o veneno do remédio”. O médico utilizou seus conhecimentos de alquimia para elaborar conceitos como a relação de dose-resposta e medicamentos para as mais diversas doenças que assolavam a população na época, como sífilis e doenças derivadas da mineração. Sua maior obra foi Doenças das minas e outras doenças dos mineiros, publicada em 1567. Com a Revolução Industrial (1760-1840), emergiram várias doenças associadas ao trabalho. Pesquisadores como Ramazzini e Pott foram precursores da toxicologia ocupacional. Ramazzini foi o autor da obra Discurso sobre as doenças dos trabalhadores, a qual discorreu sobre os riscos das principais profissões da época. Posteriormente, Pott realizou o primeiro relato de câncer, associando a exposição dos limpadores de chaminés à fuligem. 1.4 Iluminismo Nesse período (século XIX), houve um grande desenvolvimento da toxicologia como ciência. Pesquisadores como Fontana, Magendie, Bernard, Erlich e Orfila formaram os pilares da área com seus estudos científicos. Fontana é considerado o fundador da toxicologia moderna em razão da expansão do conhecimento sobre veneno de serpentes. Magendie descreveu os mecanismos de ação da estricnina e da emetina. Bernard (discípulo de Magendie) introduziu o conceito de toxicidade dos compostos químicos em órgãos-alvo, sendo o seu principal estudo sobre o curare (veneno de flechas, utilizado para caça pelos índios). Erlich sugeriu que as substâncias ativas possuem pontos específicos de “ataque” no organismo, dando origem ao conceito de receptores. Orfila é considerado o pai da toxicologia, porque ele foi o primeiro toxicologista a analisar material de autópsia e a utilizar os resultados de sua análise como prova legal de envenenamento. 8WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.5 Idade Moderna O século XX é marcado por grande avanço no campo das ciências farmacêutica (fármacos e excipientes), alimentícia (conservantes, corantes e aromatizantes) e agrária (praguicidas e herbicidas). O contato da humanidade com os mais variados compostos químicos aumenta potencialmente o risco de intoxicações acidentais. Alguns casos foram de grande repercussão, como a intoxicação causada pelo antibiótico sulfanilamida (1937) e o medicamento para enjoo, talidomida (1960). A sulfanilamida provocou a morte de centenas de pacientes devido ao solvente dietilenoglicol, usado na formulação do elixir. A talidomidafoi utilizada por mulheres grávidas para o combate do enjoo matinal, mas acarretou o nascimento de centenas de bebês com algum tipo de deficiência. Esses acidentes levaram à elaboração de projetos de lei para o controle e avaliação de segurança mais rigorosos quanto ao uso de fármacos, alimentos e pesticidas pela população. Ao mesmo tempo, esse período foi marcado também pelo uso indiscriminado de armas químicas em situações de conflitos. Na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), agentes químicos (como fosgênio, cianeto e gás mostarda) foram utilizados, resultando em milhares de mortes. Após o término da Guerra, países que vivenciaram os efeitos devastadores desses ataques químicos assinaram um acordo que proibia o uso de armas químicas e bacteriológicas em conflitos armados. Já na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), não foram utilizadas armas químicas durante as batalhas. Porém, a Alemanha nazista empregou o uso do gás Zyklon-B para ocasionar a morte rápida de milhões de judeus, ciganos, homossexuais, deficientes e prisioneiros soviéticos. O potencial de destruição das armas químicas é preocupante, e há grande interesse de grupos civis e militares para banir, definitivamente, seu uso em situações de conflito. 2. CONCEITOS BÁSICOS 2.1 Definição de Toxicologia e Toxicidade É a ciência que estuda os efeitos nocivos decorrentes das interações de substâncias químicas com o organismo, sob condições específicas de exposição. A toxicologia estuda experimentalmente a ocorrência, a natureza, os mecanismos e os fatores de risco dos efeitos deletérios de agentes químicos. É uma ciência que incorpora quase todas as ciências básicas (como química, biologia, física, matemática, bioquímica, genética, fisiologia e farmacologia) para testar suas hipóteses. Os objetivos da toxicologia são o diagnóstico, o tratamento e a prevenção das intoxicações, sendo seu objeto de estudo a intoxicação. A toxicidade é a capacidade de o agente tóxico ocasionar efeito nocivo, ou seja, prejuízo a organismos vivos. O fenômeno da toxicidade não é um evento molecular isolado, mas vem acompanhado da exposição, distribuição, biotransformação e interação da substância química com o alvo (que pode ser uma célula, um tecido ou um órgão). Seu efeito pode ser local (sucedendo-se no sítio onde houve o primeiro contato com o agente tóxico) ou sistêmico (o agente tóxico passa pelo processo de absorção e distribuição, e seu efeito ocorre em um local distante do primeiro contato). 9WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A toxicidade pode ser classificada segundo o tempo e o grau de resposta. De acordo com o tempo de resposta, temos: a. Aguda: os efeitos tóxicos são gerados por uma única ou por múltiplas exposições a uma substância por um curto período (horas), cujos sintomas aparecem rapidamente. b. Subcrônica: os efeitos tóxicos de um composto químico são produzidos por exposições repetidas (dias ou meses). c. Crônica: os efeitos tóxicos se manifestam após repetidas exposições por um longo período de tempo (meses ou anos). De acordo com o grau de resposta, temos: a. Leve: os efeitos prejudiciais produzidos são rapidamente reversíveis e desaparecem com o término da exposição. b. Moderada: os distúrbios gerados são reversíveis e não são suficientes para provocarem danos sérios. c. Severa: o efeito nocivo provoca mudanças irreversíveis no organismo, resultando em lesões graves ou em morte. A toxicidade pode ainda ser classificada como imediata e retardada. Aquela é caracterizada pelo aparecimento dos efeitos tóxicos imediatamente ou após uma única administração ou contato com uma substância química. Nesta, o dano ocorre algum tempo depois da exposição. 2.2 Outros Conceitos Importantes - Efeito nocivo É o ponto em que determinado efeito biológico passa a ser considerado prejudicial ao organismo. Para que um efeito seja considerado nocivo, ele deve obedecer a alguns critérios, como: 1. Ser produzido numa exposição prolongada, que resulte em prejuízos à capacidade funcional. 2. Diminuição da capacidade do organismo de manter a homeostasia. 3. Aumento da sensibilidade aos efeitos indesejáveis. - Agente tóxico ou toxicante Entidade química capaz de causar dano a um sistema biológico. - Xenobiótico Toda substância estranha ao organismo. Nem sempre é um agente tóxico. - Droga versus fármaco Droga pode ser definida como toda substância química capaz de modificar o sistema biológico, com ou sem intenção de benefício ao organismo receptor. Já o fármaco é toda substância com estrutura química definida, com a intenção de promover benefício ao organismo receptor. Para melhor entendimento, citemos a Cannabis sativa (maconha), que é uma droga enquanto seu principal composto ativo, o 9Δ-tetrahidrocanabinol, é considerado um fármaco. 10WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Reação alérgica e idiossincrática A alergia é uma reação do sistema imunológico a uma substância química, como resultado de uma sensibilização prévia a esta (primeiro contato). Pode ocorrer após a exposição de um determinado agente químico a doses muito baixas. Diferentemente da alergia, a reação idiossincrática corresponde às respostas a determinadas substâncias químicas, promovidas por alterações genéticas. Nesse caso, o efeito adverso pode ocorrer com doses baixas e não tóxicas e/ou apresentar uma resposta extremamente intensa com doses mais elevadas. - Tolerância É a diminuição do efeito de fármaco ou droga embora a dose habitual seja a mesma ou quando se torna necessário o aumento de dose para se alcançar o mesmo grau de efeito. - DL50 e DL10 A sigla DL significa dose letal média de uma substância e expressa o grau de toxicidade aguda de substâncias químicas. A DL50 corresponde a doses que matam 50% dos animais de um lote utilizado para estudo. Por sua vez, a DL10 corresponde a doses que matam 10% dos animais de um experimento para determinação de toxicidade aguda. São valores calculados estatisticamente a partir de dados obtidos de ensaios clínicos. Na prática, esses valores indicam o grau de toxicidade de uma substância: quanto menor o valor de DL50 e DL10, maior a toxicidade do composto. A explicação é que a concentração necessária para matar 50% e 10% (respectivamente) dos animais em experimento é menor. - Perigo versus risco Os termos perigo e risco são facilmente confundidos na prática, mas, na toxicologia, são termos que designam acontecimentos diferentes. Perigo é a capacidade inerente de uma substância causar efeito adverso. Risco é a probabilidade de um evento nocivo ocorrer; é a soma de perigo e exposição. Para entender melhor esses conceitos, pense no seguinte exemplo: a ingestão de bebida alcoólica é perigosa, porque é comprovado que o álcool é tóxico ao organismo; porém, o indivíduo que decide voluntariamente se expor ao álcool assume o risco de sofrer os efeitos adversos causados por ele. - Sinergismo, potenciação e antagonismo Na toxicologia, há sinergismo quando o efeito tóxico produzido pela associação de dois ou mais agentes químicos é maior do que a soma dos efeitos isolados de cada um deles. Efeitos tóxicos sinérgicos são frequentes quando há combinação de compostos que possuem toxicidade nos mesmos órgãos e tecidos. Como exemplo, temos a associação de álcool com paracetamol (analgésico e antitérmico): ambos são prejudiciais ao fígado, e a soma dos seus efeitos provoca graves problemas nesse órgão (hepatotoxicidade). A potenciação ocorre quando uma substância química não tem ação sobre um órgão, mas aumenta a ação de um outro agente sobre o mesmo. Um exemplo é a exposição ocupacional ao isopropanol (solvente industrial) associado ao tetracloreto de carbono (gás extintor e refrigerante), gerando hepatotoxicidade. Nesse caso, o isopropanol não é hepatotóxico, mas, em associação com o tetracloreto de carbono, provoca intoxicação hepática. 11WWW.UNINGA.BR TO XICO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA No antagonismo, a reação de uma substância química é suprimida ou reduzida na presença de outra substância, muitas vezes, em razão da competição delas pelo mesmo local de ação (sítio receptor), podendo ser uma reação benéfica e normalmente desejável na toxicologia. O antagonismo como resposta benéfica é o emprego de substâncias para tratar quadros de intoxicação. Um exemplo é o medicamento naloxone (antagonista opioide) para reverter quadros de superdosagem de heroína ao deslocar a droga do receptor. 3. DIVISÃO DA TOXICOLOGIA 3.1 Toxicologia Analítica Essa divisão da toxicologia tem como finalidade detectar o agente tóxico por meio da análise instrumental de substratos, como ar, água, solo, alimentos e fluidos orgânicos (sangue, plasma e saliva). 3.2 Toxicologia Clínica A toxicologia clínica visa ao atendimento do paciente intoxicado por meio de uma abordagem rápida e criteriosa para diagnóstico e escolha do tratamento. A identificação do agente tóxico é realizada por análise dos sintomas físicos apresentados e por exames laboratoriais. 3.3 Toxicologia Experimental É o estudo do mecanismo de ação do agente químico sobre o organismo e avaliação sobre os efeitos decorrentes dessa ação. A avaliação da toxicidade é efetuada a partir de ensaios in vivo (com animais), seguindo critérios rigorosos de um comitê de ética. Dentro dessa divisão, temos a ecotoxicologia, que pesquisa os efeitos nocivos provocados por praguicidas e herbicidas ao meio ambiente, testando essas substâncias nos diversos organismos vivos que compõem a fauna e flora locais, como algas, bactérias, abelhas e peixes. 4. ÁREAS DE ATUAÇÃO - Toxicologia ambiental Na toxicologia ambiental, são avaliados os efeitos causados por agentes tóxicos no meio ambiente (água, solo e ar) e de que forma as consequências geradas por essa interação impactam o ser humano. - Toxicologia ocupacional A toxicologia ocupacional é o estudo dos efeitos tóxicos gerados pela interação entre os agentes químicos existentes no local de trabalho e os indivíduos expostos a eles. - Toxicologia de alimentos Essa área da toxicologia investiga os efeitos provocados por alimentos contendo substâncias químicas potencialmente tóxicas nos seres humanos. Adicionalmente, a área contribui para a prevenção de intoxicação alimentar por intermédio da regulamentação de parâmetros que promovem segurança no consumo de alimentos. 12WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Toxicologia de medicamentos e cosméticos É o ramo da toxicologia que analisa os efeitos adversos produzidos pelo uso de medicamentos e cosméticos pela população. Esses efeitos podem se manifestar pela utilização indevida ou por suscetibilidade individual (alérgica ou genética). - Toxicologia social A toxicologia social pesquisa os danos acarretados pelo uso abusivo e/ou não médico de drogas e fármacos pela população, desde o ambiente que favorece seu consumo até a suscetibilidade de cada indivíduo para fazê-lo. 5. FASES DA INTOXICAÇÃO 5.1 Exposição É a fase em que o organismo entra em contato com o agente tóxico. Os parâmetros a serem considerados são: a) Dose ou concentração. b) Frequência e duração. c) Via de introdução. d) Suscetibilidade individual. e) Propriedades físico-químicas do toxicante. 5.2 Toxicocinética Compreende todos os eventos envolvidos entre a absorção do toxicante até sua concentração final nos diferentes órgãos e tecidos do organismo. As etapas que que envolvem essa fase são as seguintes: a) Absorção. b) Distribuição. c) Biotransformação (metabolismo). d) Excreção. 5.3 Toxicodinâmica Nessa área, aborda-se a interação entre o agente tóxico e o sítio de ação dos diferentes locais do organismo (células, tecidos e órgãos). Maiores detalhes virão na Unidade 2. 5.4 Clínica A fase clínica é caracterizada pela observação e estudo dos sinais, sintomas e doenças relacionadas à interação do toxicante com o organismo. Maiores detalhes virão na Unidade 2 também. 13WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 6. FASE I – EXPOSIÇÃO A exposição está diretamente relacionada à disponibilidade química do agente tóxico, sendo uma fase que antecede a absorção. Quanto maior a dose ou a concentração do toxicante, maior é a quantidade de moléculas a serem absorvidas pelo organismo. O mesmo ocorre em relação à frequência e duração: quanto maiores a repetição e o tempo de exposição, maior é a disponibilidade do agente tóxico no sistema biológico. Quanto à via de introdução, podemos enumerar as seguintes vias: parental, pulmonar, cutânea e digestiva. A via parental é a administração direta de fármaco ou droga na corrente sanguínea, sendo rápida a absorção da substância já que essa via não apresenta barreiras biológicas. A via pulmonar se dá por meio da inalação de partículas, gases e vapores. Para que ocorra absorção, é necessário, primeiramente, a molécula atravessar a superfície do trato respiratório para, então, chegar à corrente sanguínea. A absorção por essa via é rápida, porém, mais lenta que na via parental. A via cutânea é a administração na pele. Para que ocorra a absorção, é necessário atravessar as barreiras desse órgão para alcançar os capilares e atingir a corrente sanguínea. Dessa forma, sua absorção é mais lenta. A via digestiva é o contato da substância química a partir da ingestão de fármacos ou drogas por via oral. O perfil de absorção por essa via é o mais lento de todas as vias de introdução já que é necessário passar pela barreira gastrintestinal primeiro para, daí, chegar à corrente sanguínea. De acordo com as vias existentes, a disponibilidade do agente tóxico possui a seguinte sequência: Figura 1 - Sequência de biodisponibilidade de agentes químicos de acordo com a via de introdução. Fonte: A autora. A via parental apresenta a maior biodisponibilidade, e a via digestiva, a menor biodisponibilidade. A suscetibilidade individual à toxicidade pode ser devido a causas genéticas, sexo, peso e idade. A genética influencia diretamente na expressão de enzimas responsáveis pelo metabolismo de fármacos e drogas: quanto menor a quantidade de enzimas expressas, menor a metabolização do toxicante, e maior é a toxicidade. O sexo também influencia: mulheres possuem maior probabilidade de sofrer sintomas de intoxicação do que homens. Isso ocorre, porque normalmente mulheres possuem maior concentração de gordura corporal que homens, e o tecido adiposo serve de depósito para xenobióticos. Pelo mesmo motivo do sexo, o peso também induz maior toxicidade: quanto maior o peso, maior é a camada de gordura, e maior será a retenção de substâncias lipossolúveis. A idade é outro fator que interfere na toxicidade: crianças e idosos são mais suscetíveis a sofrer intoxicação do que adultos. Entretanto, dentre esses fatores citados, o mais importante para a toxicologia é a variação genética. As propriedades físico-químicas das moléculas impactam diretamente a biodisponibilidade dos toxicantes, sendo os seguintes parâmetros a serem considerados: solubilidade, grau de ionização, tamanho da molécula e pressão de vapor. 14WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A solubilidade é definida pelo coeficiente de partição óleo/água (Cpo/a) ou lipossolubilidade (solubilidade em meio oleoso ou lipofílico). Trata-se da relação das concentrações da substância em óleo e em água. A equação a seguir descreve a solubilidade de um determinado composto químico em óleo e em água. As membranas celulares são predominantemente lipofílicas; por isso, quanto maior a lipossolubilidade, maior a possibilidade de as substâncias atravessarem a membrana, e maior será a absorção. Conforme descrito na equação anterior, quanto maior a fração da molécula solúvel em óleo, maior será a absorção. O grau de ionização é expresso pela porcentagem de moléculas de um determinadocomposto que estão dissociadas em solução aquosa com a formação de íons (cátions e ânions), a depender do pH do meio e do pKa do composto. Lembre-se de que o pH é a concentração de íons hidrogênio, e seu valor determina a acidez, a neutralidade ou a alcalinidade de uma solução. O pKa é o valor de pH que provoca 50% de dissociação do ácido e, quanto maior o valor do pKa, menor é a acidez do composto. A concentração de íons hidrogênios em líquidos biológicos e em soluções é de fundamental importância já que os processos biológicos são altamente sensíveis às suas alterações. A maioria dos fármacos são ácidos ou bases fracas e a maioria sofre ionização em meio aquoso. Entretanto, seu grau de ionização está diretamente relacionado a seu pKa e ao pH do meio ao qual está exposto. As substâncias de natureza ácida em meio ácido encontram- se na forma não ionizada ou molecular, ou seja, não apresentam carga elétrica e, portanto, são mais lipossolúveis e atravessam a membrana plasmática com maior facilidade. O inverso também ocorre: substâncias de natureza básica em meio básico encontram-se na forma não ionizada ou molecular e atravessam a membrana plasmática. A Figura 2 é uma representação esquemática da influência do pH sobre o grau de ionização dos agentes químicos nos sistemas biológicos. Figura 2 - Representação esquemática do grau de ionização de acordo com o pH e pKa. Fonte: A autora. 15WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O tamanho da molécula e a pressão de vapor são propriedades físico-químicas que influenciam diretamente a disponibilidade do agente tóxico no seu sítio de ação. Quanto menor o tamanho, maior é a facilidade de atravessar a membrana plasmática. A pressão de vapor é uma característica a ser considerada para toxicantes na forma de gás. Quanto maior a pressão de vapor, maior é o número de partículas presentes no ar, e maior é a probabilidade de o agente químico ser inalado e produzir seu efeito tóxico no sistema respiratório. 7. FASE II – TOXICOCINÉTICA É o estudo que relaciona os processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção do toxicante no organismo. O efeito tóxico é proporcional à quantidade do agente químico no sítio de ação, e o conhecimento de sua concentração permite analisar o dano local ocasionado. Figura 3 - Esquema relacionando as fases da toxicocinética. Fonte: Milhomem Filho (2014). Como vimos anteriormente, na fase I (exposição) um dos fatores que mais influenciam a chegada do toxicante no seu tecido-alvo é o seu potencial para atravessar as membranas plasmáticas, o qual depende de suas propriedades físico-químicas. Os xenobióticos atravessam as membranas por diferentes mecanismos, como veremos a seguir. 16WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 7.1 Mecanismos de Transporte através das Membranas As membranas celulares são formadas por uma dupla camada de fosfolipídios (grupo de moléculas de carga neutra) e grupos polares (conjunto de moléculas que possuem carga elétrica e afinidade com a água), voltados para a face externa, e ácidos graxos, voltados para o espaço celular interno. Além desses grupamentos, observam-se também moléculas de proteínas que atravessam a bicamada lipídica, as quais formam poros. Figura 4 - Membrana plasmática. Fonte: Câmara (2018). 7.1.1 Transporte passivo e ativo O transporte passivo é um mecanismo dependente do gradiente de concentração e sem gasto de energia (ATP). Esse processo inclui a difusão simples, difusão facilitada e osmose. Na difusão simples, as moléculas com caráter lipossolúvel (não ionizadas) atravessam a membrana na sua porção lipídica enquanto que, na difusão facilitada, a passagem das moléculas é realizada com o auxílio de proteínas carreadoras específicas. A osmose é o movimento das moléculas pelo solvente (água), de uma área com alta concentração de moléculas para uma área com baixa concentração. Essa permeabilidade ocorre devido à difusão simples da água, que acontece através da membrana e pela presença de canais proteicos. Figura 5 - Mecanismos de transporte passivo pela membrana: (I) difusão simples; (II) difusão facilitada e (III) osmose. Fonte: Fundamentos em Bio-Neuro Psicologia (2020). 17WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O transporte ativo é um mecanismo marcado pelo consumo de energia (ATP), cujo movimento das moléculas é contra gradiente de concentração, sendo realizado por proteínas carreadoras saturáveis, as quais possuem seletividade. Figura 6 - Mecanismos de transporte ativo pela membrana. Fonte: Fundamentos em Bio-Neuro Psicologia (2020). 7.1.2 Pinocitose Neste processo, a molécula é transportada por um carreador; porém, não há consumo de energia, e a passagem da substância é a favor de um gradiente de concentração. Esse transporte é um tipo de endocitose em que a molécula é englobada pela membrana plasmática por meio de uma modificação estrutural desta. Tal modificação se dá por meio de uma invaginação que forma uma vesícula (pinossomo), que se fecha com a substância em seu interior, a qual é impulsionada para o interior da célula (citoplasma). Figura 7 - Mecanismos de transporte - pinocitose. Fonte: Dahmer (2017). 18WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 7.2 Absorção A absorção é a passagem do composto químico do local de contato para a circulação sanguínea. As principais vias de exposição e absorção são a dérmica, a respiratória e a oral. O órgão para a absorção dérmica é a pele, a qual é constituída por múltiplas camadas de tecidos: epiderme, derme e hipoderme. Na camada mais externa (epiderme), temos o estrato córneo, que é a barreira limitante para absorção. Contudo, a derme é formada por tecido gorduroso e conjuntivo, folículos pilosos e glândulas sudoríparas, sendo altamente irrigada. A pele é levemente permeável a moléculas ionizadas e soluções aquosas; no entanto, é altamente permeável a moléculas lipossolúveis, ou seja, com alto coeficiente de partição óleo/água. A passagem das substâncias é realizada por difusão lipídica através do estrato córneo e, em menor grau, através dos folículos pilosos e glândulas sudoríparas. A absorção pela via respiratória se dá por meio da inalação de partículas presentes no ar, assim como gases e outras substâncias voláteis que atingem as fossas nasais e seguem pela faringe, laringe, brônquios, traqueia e alvéolos pulmonares, atingindo a circulação sanguínea. O tamanho das partículas suspensas no ar determina o local onde serão depositadas: (a) partículas cujo diâmetro é menor que 1 μm podem atingir o alvéolo pulmonar e ser absorvidas para a circulação sanguínea e linfática, sendo, portanto, as que possuem maior potencial para intoxicação; (b) partículas entre 2 e 5 μm, geralmente, ficam retidas na região traqueobronquilar e, posteriormente, são removidas pelo muco por meio de movimentos ciliares; (c) por fim, partículas maiores que 5 μm são depositadas na região nasofaríngea e, em seguida, podem ser facilmente removidas por processos mecânicos, como assopro, espirro ou limpeza do nariz (Quadro 1). Quadro 1 - Absorção de material particulado pela via respiratória de acordo com o tamanho. Fonte: Adaptado de Oga, Camargo e Batistuzzo (2008). A absorção de gases e compostos voláteis depende também da sua solubilidade no sangue. Vapores ou gases com característica hidrossolúvel são retidos parcialmente pela mucosa nasal. À medida que as moléculas dos gases e vapores atingem os alvéolos, elas se propagam para o sangue e, depois de algum tempo, estabelecem um equilíbrio entre as moléculas presentes no ar inspirado e as que estão dissolvidas no sangue. Essa relação de solubilidade entre os dois meios (sangue e ar) é chamada de coeficiente de partição sangue/ar (Cps/a), sendo uma constante específica para cada gás. Substâncias pouco solúveis no sangue atingem o equilíbrio (sangue/ar) mais rapidamente,e as substâncias que apresentam maior solubilidade estabelecem esse equilíbrio mais lentamente. Quanto maior o Cps/a, maior é a facilidade de passar do ar para o sangue. Como exemplo, temos o clorofórmio (Cps/a = 15). Por outro lado, as substâncias com baixo Cps/a difundem-se em pequena quantidade no sangue já que apresentam rápida saturação. Como exemplo, temos o etileno (Cps/a = 0,14). Outros fatores que influenciam na absorção são o fluxo sanguíneo (perfusão pulmonar) e a frequência respiratória. 19WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O aumento da perfusão pulmonar beneficia principalmente a absorção de vapores e gases com baixo Cps/a, sendo um fator limitante para a sua absorção. No entanto, vapores e gases com alto Cps/a têm a sua absorção favorecida pelo aumento da frequência respiratória, sendo este um fator limitante para a mesma. A absorção oral se dá por meio do trato digestivo, e a intoxicação pode ocorrer de forma acidental (a partir da ingestão de água e alimentos contaminados) ou de forma voluntária (por meio do consumo de drogas ilícitas por indivíduos dependentes ou por ato suicida). A absorção pode ocorrer tanto no estômago como no intestino e é dependente da variação de pH, circulação local, característica anatômica de cada órgão e das propriedades físico-químicas do agente tóxico. No sistema digestivo, o intestino é o responsável pela maior parte da absorção de toxicantes, o que se dá pelo fato de esse órgão apresentar microvilosidades altamente irrigadas, as quais aumentam de forma significativa a superfície de contato. Os agentes químicos com alto coeficiente de partição óleo/água (na forma molecular ou lipofílicos) são facilmente absorvidos por difusão passiva enquanto que substâncias na sua forma ionizada (polares ou hidrofílicas) são pouco absorvidas. O grau de ionização dos xenobióticos presentes no trato digestivo irá depender do pKa de cada composto e do pH do meio (ver tópico 6, anteriormente). Outra peculiaridade na absorção de agentes químicos pelo sistema digestivo é a ocorrência do ciclo entero-hepático, conhecido também como metabolismo de primeira passagem. Esse evento consiste na reabsorção de uma substância já excretada. Isso ocorre com agentes químicos que já foram metabolizados pelo fígado e que são excretados pela bile no intestino na sua forma conjugada (com grupamento químico adicionado na etapa metabólica). No intestino, o composto conjugado entra em contato com micro-organismos da flora intestinal, os quais interagem com o composto, removendo o grupamento químico adicionado na etapa de metabolização. Dessa forma, o composto que, antes, estava pronto para ser excretado volta para a sua forma absorvível e é reabsorvido no trato gastrintestinal, voltando para a circulação sanguínea e passando novamente no fígado para ser metabolizado. Para melhor compreensão, o metabolismo de primeira passagem está esquematizado na Figura 8. Figura 8 - Esquema do ciclo entero-hepático. Fonte: A autora. A absorção pela via oral também é influenciada pela presença de alimentos que podem alterar a velocidade e a quantidade de absorção do toxicante. Por exemplo: o leite pode aumentar a absorção de metais, como o chumbo, pela formação de complexos mais lipossolúveis. 20WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 7.3 Distribuição A distribuição é o transporte dos compostos químicos pelo organismo. Eles são transportados pelo sangue e pela linfa aos diversos tecidos. A distribuição é influenciada pelos seguintes parâmetros: a) Fluxo sanguíneo e linfático. b) Ligação a proteínas plasmáticas. c) pH e coeficiente de partição óleo/água. d) Barreiras biológicas. O equilíbrio na distribuição de um xenobiótico é muito influenciado pelo fluxo sanguíneo e linfático. Tecidos e órgãos que possuem grande circulação sanguínea, como coração, cérebro e fígado, atingem mais rapidamente o equilíbrio de distribuição de agentes químicos enquanto que aqueles que recebem menor fluxo (ossos, dentes, unhas e tecido adiposo) alcançam o equilíbrio mais lentamente. No início, os órgãos mais irrigados recebem grande quantidade do toxicante; contudo, com o passar do tempo, órgãos menos irrigados apresentam o potencial de acumular maior quantidade do toxicante, os quais são denominados tecidos de depósito. Para exemplificar: experimentos com animais envolvendo o chumbo demonstraram que, duas horas após sua administração, 50% da dose encontravam-se no fígado (órgão altamente irrigado) e, após 30 dias, 90% do metal encontravam-se depositados no tecido ósseo. Outro parâmetro que influencia a distribuição de compostos químicos no organismo é a taxa de ligação com proteínas plasmáticas. Dentre as principais proteínas, temos a albumina, as lipoproteínas e a alfa-1-glicoproteína ácida. A albumina é a mais importante, por ser abundante no sistema biológico e apresentar maior afinidade com uma grande variedade de substâncias. A porção de toxicante complexada com proteínas é temporariamente inativa e incapaz de transpor a membrana plasmática. Já a porção livre ou não complexada atravessa a membrana sem dificuldade. Quanto maior o grau de ligação do xenobiótico, maior o tempo de permanência na circulação sistêmica, e menor a sua distribuição para outros compartimentos do corpo (Figura 9). Outro aspecto a ser considerado é que dois agentes químicos podem competir pelo mesmo sítio de ação de uma proteína e, consequentemente, impedir mutuamente a fixação de ambas e aumentar suas porções livres. Esse mecanismo é importante na interação medicamentosa: a administração simultânea de 2 fármacos pode resultar no aumento do efeito terapêutico ou tóxico ou na ineficiência da terapia. Portanto, somente xenobióticos livres podem ser transportados para os tecidos e órgãos e atravessar a membrana. A concentração em cada tecido ou órgão dependerá da irrigação e da afinidade química do toxicante nos componentes biológicos. A intensidade e a duração do efeito terapêutico ou tóxico depende da concentração do xenobiótico no seu sítio de ação. Para que essa interação ocorra, é necessário que a substância esteja livre de ligação de proteínas, em um pH que favoreça sua forma não ionizada e que possua um alto coeficiente de partição (ver item 6 desta unidade). As membranas plasmáticas constituem uma barreira seletiva na passagem de compostos químicos do sangue para os tecidos. Dentre as barreiras que podemos destacar, temos a hematoencefálica e a placentária. Ambas apresentam mecanismo de transporte ativo para absorção e efluxo de substâncias, protegendo, de forma seletiva, o sistema nervoso central e o feto contra a ação de toxicantes. 21WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 9 - Esquema da distribuição de um xenobiótico de acordo com o grau de ligação a proteínas plasmáticas. Fonte: A autora. 7.4 Biotransformação A biotransformação é definida como toda alteração que ocorre na estrutura química da substância no organismo. Essa alteração é mediada por reações químicas catalisadas por enzimas inespecíficas. Os compostos de caráter lipofílico atravessam facilmente a membrana plasmática (absorção), porém, não apresentam a mesma facilidade para serem eliminados (excreção). Para que esses compostos sejam excretados, é necessário passar por mecanismos de reações bioquímicas que convertam as substâncias lipossolúveis ou apolares em substâncias hidrofílicas ou polares. As reações de biotransformação são divididas em reações de fase I e reações de fase II. As reações de fase I consistem na oxidação, redução e hidrólise, e sua finalidade é aumentar a hidrofilicidade ou polaridade das substâncias por meio da exposição ou adição de grupamentos químicos. Como resultado, temos metabólitos que possuem maior toxicidade em relação à substância original por apresentarem um caráter eletrofílico (carga negativa), nucleofílico (carga positiva)ou radicalar, sendo compostos altamente reativos com os componentes biológicos. Esse processo é denominado bioativação. 22WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA As reações de fase II são a glicuronidação, sulfatação, acetilação, metilação e conjugação com a glutationa e com aminoácidos. Essas reações possuem como característica a inclusão de cofatores endógenos. As enzimas de biotransformação estão distribuídas por todo o organismo; entretanto, o órgão que possui maior concentração é o fígado. Outros órgãos, como pulmões, rins, adrenais, pele e intestino, também contêm enzimas metabolizadoras. Figura 10 - Esquema demonstrando como a biotransformação está inserida no contexto da farmacocinética de fármacos e agentes tóxicos e de que forma ela prepara as substâncias para serem excretadas. Fonte: Faria (2019). 7.4.1 Reações de fase I - Oxidação A reação de oxidação é catalisada por uma enzima chamada oxidase, a qual necessita de um cofator NADPH e de oxigênio para agir. A reação consiste na incorporação de um átomo de oxigênio à substância química, com a formação de um composto oxidado e uma molécula de água. O principal sistema enzimático responsável pela oxidação é o citocromo P-450 (CYP-450). O citocromo P-450 é uma hemoproteína com um átomo de ferro no seu núcleo, cujo complexo formado entre a sua forma reduzida e o monóxido de carbono apresenta uma absorbância no comprimento de onda de 450 nm. A substância química (substrato) complexa-se com a forma oxidada do CYP-450 e, após complexação, a enzima recebe elétrons provenientes do NADPH. O CYP-450 é reduzido e se liga ao oxigênio e ao substrato, promovendo a oxidação do composto. Como exemplo de oxidação, temos a biotransformação do etanol pela enzima álcool desidrogenase. Figura 11 - Reação de metabolismo do etanol. Fonte: Faria (2019). 23WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Redução Além das reações de oxidação, o complexo enzimático CYP-450 também é responsável pelas reações de redução. Uma das condições para essa reação ocorrer é a baixa concentração de oxigênio. Diferentemente da oxidação, o CYP-450 transfere o elétron diretamente ao substrato, reduzindo-o. Compostos químicos que apresentam grupamentos aldeído, cetona, dissulfeto, sulfóxido, quinonas, N-óxidos, alquenos, azo, nitro e metais passam por redução in vivo. Na Figura 12, temos um exemplo de reação de redução de um derivado de benzeno (composto com grupamento nitro), cujo produto é reativo com a molécula de DNA, provocando danos e toxicidade (bioativação). Figura 12 - Nitrorredução do derivado de benzeno. Fonte: Tavares, Serrano e Paula (2009). - Hidrólise A hidrólise é a lise, ou seja, é a quebra de uma substância química por meio da molécula de água. Essa reação é catalisada pelas enzimas carboxilesterases, pseudocolinesterases e paraxonases. Compostos químicos com grupamentos funcionais éster, ácido carboxílico, amidas, tio-ésteres e ésteres de ácido fosfórico são passíveis de sofrerem reação de hidrólise no organismo. Um exemplo é a hidrólise do ácido acetilsalicílico, gerando o ácido salicílico com remoção do grupo acetil da molécula. Figura 13 - Reação de hidrólise do ácido acetilsalicílico. Fonte: Pós em Revista (2012). 24WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 7.4.2 Reações de fase II As reações de fase II possuem duas etapas: síntese do composto endógeno, que será ligado à substância química e catalisado pelas enzimas sintetases, e a transferência do composto endógeno para o substrato a ser biotransformado, realizada pelas enzimas transferases. - Glicuronidação A glicuronidação consiste na conjugação da substância química com o ácido glicurônico, formando os glicuronatos (glicuronil conjugados), os quais posteriormente são excretados pelos rins e pelo fígado, reação catalisada pela enzima glicuroniltransferase. Os principais substratos são drogas ácidas, básicas, fenóis e álcoois. Os glicuronil conjugados formados são substratos da enzima β-glicuronidase, encontrada na microflora intestinal. Consequentemente, os glicuronatos excretados pela bile passam pela ação dessas enzimas no intestino, formando agliconas, as quais são reabsorvidas, conduzindo ao ciclo entero-hepático (voltar à Figura 8). Exemplos de substâncias químicas que utilizam essa via de metabolização são: esteroides, morfina, cloranfenicol, salicilatos e propofol. A Figura 14 mostra o metabolismo da codeína e da morfina, que, após ação da enzima glicuroniltransferase, forma conjugados que podem ser inativos ou ativos. Figura 14 - Reação de glicuronidação da codeína e da morfina. Fonte: UFES (2017). - Sulfatação Uma outra reação importante para o metabolismo de mamíferos é a conjugação com o ácido sulfúrico, a qual é catalisada por sulfotransferases. O doador do grupo sulfato é a 3’-fosfoadenosina-5’-fosfosulfato (PAPS), formada a partir do ATP e sulfato inorgânico. O produto gerado pela reação é um sulfato orgânico ionizado e excretado principalmente pela via renal. Exemplos de substâncias químicas biotransformadas por essa via são: fenóis, esteroides sexuais e cloranfenicol. Na Figura 15, temos o exemplo da biotransformação do prenalterol (fenol), medicamento indicado para o tratamento de insuficiência cardíaca congestiva crônica. 25WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 15 - Metabolismo do prenalterol. Fonte: Emery (2020). - Metilação A metilação é caracterizada pela transferência do grupo metila (-CH3) para o substrato, sendo uma reação catalisada por metiltransferases. O doador do grupamento metila é a S-adenosilmetionina, a qual é formada no fígado. Diversas substâncias são biotransformadas pelo processo da metilação, como as que apresentam os grupamentos químicos amina alifática e aromática, fenol, N-heterocíclico e sulfidrila. Catecolaminas, como a serotonina, anfetaminas e piridina, também sofrem metilação, em que o grupo metila é transferido para o nitrogênio, oxigênio ou enxofre da substância. - Acetilação A acetilação é catalisada pela enzima N-acetiltransferase e consiste na adição do grupo acetil ao composto químico. O cofator dessa reação é o acetilcoenzima-A (acetil-CoA). É a principal via de biotransformação de compostos arilaminas, mas também atua em aminas, hidrazinas, hidrazidas e sulfonamidas. A Figura 16 mostra a reação com o antibiótico sulfonamida. Outros fármacos, como a isoniazida e o clonazepam, também utilizam a mesma via. Figura 16 - Reação de metabolismo da sulfonamida. Fonte: Adaptado de Toxoer Television (2017). 26WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Conjugação com a glutationa A glutationa é um tripeptídeo que contém os aminoácidos glicina, cisteína e ácido glutâmico. A conjugação com a glutationa é catalisada pela enzima glutationa S-transferase, e a reação ocorre entre a porção nucleofílica do complexo enzimático e o carbono eletrofílico do substrato. A enzima processa a reação com uma grande variedade de toxicantes eletrofílicos, evitando a interação com constituintes teciduais, como lipídios, DNA e proteínas e, portanto, protegendo-os contra danos provocados por metabólitos reativos. Os produtos conjugados com a glutationa sofrem hidrólise, formando a N-acetilcisteína (ácido mercaptúrico). O paracetamol (Figura 13) é um exemplo de fármaco que, ao ser metabolizado pelo fígado, produz um metabólito intermediário, o N-P-acetilbenzoquinonaimina (NAPQI), o qual é reativo. Caso esse metabólito não seja conjugado com a glutationa, ele irá reagir com as células hepáticas, causando necrose no fígado. Portanto, qualquer fator que diminua a concentração de glutationa irá ocasionar o aumento de toxicidade de substâncias reativas, como o NAPQI. Figura 17 - Metabolismo do paracetamol. Fonte: Paracetamol Ffup (2020). 7.4.3 Fatores que influenciam a biotransformação As condiçõesque interferem no metabolismo podem ser internas (espécie e raça, genética, gênero, idade, estado nutricional e patológico) ou externas (indução e inibição enzimática). - Fatores internos A espécie e a raça são fatores que podem influenciar a biotransformação, porque estão diretamente relacionados à presença ou ausência de enzimas e à concentração de cada uma delas. Por exemplo: o hexobarbital é oxidado com uma velocidade variável, em diferentes espécies de ratos, de modo que o tempo de sono induzido por essa substância será variável. 27WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A influência da genética é referente à capacidade de metabolização, que varia de um indivíduo para outro conforme suas condições fisiológicas ou doenças preexistentes. A isoniazida, por exemplo, é um fármaco utilizado no tratamento da tuberculose. Sua biotransformação se dá por meio da acetilação da molécula, contudo, a velocidade com que essa reação ocorre é variável. Há variação também na concentração de enzimas conforme o gênero. Em ratos machos, devido ao hormônio masculino, há 40% a mais de CYP-450 do que nas fêmeas. Isso impacta na intensidade dos efeitos causados pelos metabólitos gerados. Metabólitos inativos apresentarão uma ação menor em machos do que em fêmeas, entretanto, metabólitos mais ativos terão efeitos mais acentuados em machos. A suscetibilidade aos compostos químicos está associada à idade também. Bebês recém- nascidos são praticamente desprovidos da capacidade de biotransformar toxicantes, e idosos apresentam uma queda significativa na capacidade de biotransformação e excreção renal. Esses dois grupos da população são mais suscetíveis aos efeitos tóxicos de um xenobiótico. Um estado nutricional deficiente favorece a diminuição de proteínas importantes para a atividade metabólica. Uma dieta pobre em proteínas aumenta a toxicidade de compostos químicos, porém, diminui a toxicidade daqueles que necessitam de biotransformação para se tornarem ativos. Elementos químicos, como o ferro, cobre, magnésio, cálcio, zinco e vitaminas, são importantes para o funcionamento do complexo enzimático CYP-450. O jejum, por exemplo, diminui extremamente a glutationa hepática e, consequentemente, aumenta a toxicidade do paracetamol. O estado patológico impacta diretamente a atividade das enzimas associadas ao metabolismo. Um exemplo disso é quando há a presença de uma doença hepática. Quando há um comprometimento da função do fígado, principal órgão metabolizador, há uma diminuição da atividade enzimática e, consequentemente, um aumento do efeito tóxico. Outro exemplo é quando o indivíduo apresenta uma doença que resulta no comprometimento da atividade cardiovascular, o qual resulta na diminuição do fluxo sanguíneo para órgãos como fígado e rim e, dessa forma, altera a biotransformação e a eliminação de substâncias químicas. - Fatores externos Dentre os fatores externos, estão as substâncias que atuam nos sistemas enzimáticos, responsáveis pela biotransformação, atuando como indutores ou inibidores enzimáticos. A indução enzimática é a aceleração da biotransformação dos xenobióticos, causada por substâncias químicas. A estimulação ocorre pelo aumento da síntese proteica, resultando em tolerância metabólica. Esse mecanismo diminui o tempo de permanência do fármaco no organismo (tempo de meia-vida), diminui os efeitos farmacológicos se os metabólitos forem inativos e aumenta a toxicidade se os metabólitos forem tóxicos (paracetamol, por exemplo). Os inibidores enzimáticos consistem na redução da biotransformação dos xenobióticos pelas substâncias químicas. A redução pode ser provocada pela inibição da síntese proteica e/ou competição dos substratos pelo sítio ativo das enzimas. Esse processo aumenta o tempo de meia-vida da droga no organismo, aumenta a intensidade dos efeitos farmacológicos/tóxicos se os metabólitos forem inativos ou promove a perda do efeito se o metabólito for ativo. Na psiquiatria, por exemplo, medicamentos antidepressivos inibem a enzima monoaminoxidase (MAO), resultando no aumento da concentração de neurotransmissores (como a dopamina, norepinefrina e serotonina) no sistema nervoso central. 28WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA No Quadro 2, temos exemplos de alguns fármacos que atuam como indutores ou como inibidores enzimáticos. Quadro 2 - Relação de indutores e inibidores enzimáticos. Fonte: Ferreira Neto (2005). 7.5 Excreção A excreção é a eliminação do composto químico do organismo. As substâncias são excretadas pelas vias renal, gastrintestinal e pulmonar. Os produtos formados após as reações de fase I e II do metabolismo são mais hidrossolúveis, sendo essa uma característica físico-química favorável à excreção. 7.5.1 Excreção renal Os rins desempenham a função de excretar substâncias polares e hidrossolúveis por meio de três mecanismos: filtração glomerular, reabsorção tubular e secreção tubular. Na filtração glomerular, não há gasto de energia. Os glomérulos possuem poros com diâmetro grande e, portanto, passam elementos de tamanhos variados (exceto macromoléculas e compostos químicos complexados com proteínas). As substâncias hidrossolúveis são excretadas pela urina; já as de caráter lipossolúvel são reabsorvidas no túbulo proximal. Na secreção tubular, há a passagem das substâncias químicas presentes no sangue para a urina a partir do transporte ativo, envolvendo gasto de energia. O mecanismo de transporte está suscetível à saturação; portanto, depende de um gradiente de concentração entre o sangue e a urina. Pode acontecer também de haver competição de substâncias de mesma natureza química pelo mesmo sítio ativo do transportador. Por exemplo: o uso concomitante de penicilina e probenicida. Ambos os fármacos competem pelo mesmo sistema de secreção tubular e, como resultado, há o aumento do tempo de permanência da penicilina no organismo e, consequentemente, uma ampliação do seu tempo de ação. A reabsorção tubular pode ocorrer por transporte passivo ou ativo, e a excreção das substâncias químicas sofre influência do pH da urina. Substâncias na forma molecular ou lipofílicas são reabsorvidas pelo túbulo proximal. 29WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O aumento do pH da urina (alcalinização) promove a excreção de substâncias ácidas, porque, em pH alcalino, os compostos de natureza ácida estarão na sua forma ionizada e não serão reabsorvidos. Exemplos são o fenobarbital e o ácido acetilsalicílico. A mesma lógica é válida para compostos básicos: a diminuição do pH da urina (acidificação) proporciona a excreção de substâncias de caráter básico, pois elas estarão na sua forma ionizada. Exemplos são a anfetamina e a procainamida. Figura 18 - Esquema demonstrando a influência do pH da urina na excreção de substâncias de caráter ácido ou básico. Fonte: Faria (2019). 7.5.2 Excreção pelo trato gastrintestinal A excreção dos compostos químicos pelo trato gastrintestinal ocorre quando eles não são absorvidos pelo sistema digestivo, sendo eliminados juntamente com as fezes. Por essa via, são excretados também produtos de biotransformação procedentes do fígado e da vesícula biliar (Figura 8). Parte das substâncias biotransformadas no fígado vai para a vesícula e, depois, prossegue para o duodeno juntamente com a bile. No intestino, os agentes químicos podem ser excretados com as fezes ou ser reabsorvidos (ciclo entero-hepático). A reabsorção de toxicantes favorece o aumento de seu tempo de vida no organismo, o que eleva consideravelmente a intoxicação. 7.5.3 Excreção pela via pulmonar As substâncias gasosas e voláteis são excretadas pelos pulmões, sendo que a velocidade de excreção depende da solubilidade do composto químico no sangue. É uma relação inversamente proporcional: quanto maior a solubilidade do gás no sangue, menor é a excreção pelas vias aéreas. Como exemplo, o gás etilenopossui baixa solubilidade no sangue e, portanto, é rapidamente excretado pelos pulmões. O clorofórmio apresenta alta solubilidade no plasma e, dessa forma, é excretado mais lentamente pela via pulmonar. O fator limitante para a excreção de substâncias altamente solúveis no sangue é a respiração: quanto maior a frequência respiratória, maior é a eliminação do gás. Já a condição limitante para gases pouco solúveis no plasma é a frequência cardíaca: quanto maior é a frequência cardíaca, maior é a circulação, e maior é a excreção do gás pelo pulmão. 30WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 7.5.4 Excreção por outras vias Outras vias de excreção são o suor, as lágrimas, o leite e a saliva. A excreção por essas vias é dependente do pH do meio, do pKa, da lipossolubilidade dos agentes químicos e da presença de mecanismos de transporte ativo. A ingestão do leite materno pode trazer agentes tóxicos e levar à intoxicação do bebê. Substâncias lipossolúveis dissolvem-se na gordura do leite e são excretadas por difusão simples. O mesmo ocorre com substâncias básicas. O pH do leite é levemente ácido, favorece a forma ionizada ou hidrossolúvel desses compostos e, portanto, sua excreção. A saliva também possui pH menor que o sangue, e substâncias básicas tendem a ser eliminadas por essa via. Dessa forma, a saliva é um importante material biológico para a detecção de drogas de abuso, como etanol, cocaína e anfetaminas. 7.5.5 Parâmetros biológicos de eliminação Os parâmetros biológicos para eliminação são o tempo de meia-vida (t1/2) e a depuração ou clearance. O t1/2 é o tempo necessário para que a concentração de uma substância química seja reduzida a 50% após total absorção e distribuição. O clearance é a capacidade de o organismo eliminar uma substância do plasma. Os principais órgãos responsáveis pelo processo de depuração são o fígado e os rins. A depuração total é a soma dos valores das depurações individuais por vários órgãos e tecidos. Por muitos anos, o medicamento dissulfiram foi empregado no tratamento do alcoolismo crônico. Sua ação consistia na inibição da enzima aldeído- desidrogenase pelo seu princípio ativo (dissulfeto de tetraetiltiuram). Quando o fármaco era consumido, provocava sintomas de intoxicação, como náuseas, vômito e hipotensão devido ao acúmulo do metabólito tóxico aldeído. A ideia era o paciente associar o mal-estar com o uso do álcool e, consequentemente, abandonar o consumo de bebida alcoólica. Para mais informações sobre o metabolismo de fármacos e como esse estudo pode auxiliar na elaboração de compostos químicos de eficácia terapêutica comprovada, leia o artigo: PEREIRA, D. G. Importância do metabolismo no planejamento de fármacos. Química Nova, v. 30, n. 1, 2007. 31WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Após a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais, a população presenciou o horror dos conflitos armados, em especial, o uso de armas químicas. A evolução no direito internacional humanitário não conseguiu impedir que novos conflitos armados ocorressem, mas estabeleceu normativas para classificar os crimes de guerra. A utilização de armas químicas é considerada crime de guerra, e seus efeitos destrutivos se dão devido à toxicidade das substâncias presentes nelas. As armas químicas causam sofrimento desproporcional à vantagem militar, reforçado pela dimensão psicológica dos seus efeitos. Infelizmente, o desenvolvimento da química farmacêutica não está apenas voltado à produção de drogas para efeito terapêutico. O mundo presenciou seu potencial destrutivo de vidas. E, infelizmente, temos registros na história recente de tragédias causadas pelo seu uso, como na guerra entre Irã e Iraque e o conflito na Síria. Enquanto a indústria química servir aos interesses políticos e bélicos de alguns países que não seguem as normas estabelecidas, haverá ainda a possibilidade de ocorrerem desastres como os já citados. A toxicologia como ciência está marcada por incidentes que serviram como base para o desenvolvimento e regulamentação de testes clínicos que garantem a segurança e eficácia das substâncias químicas em humanos. A introdução da talidomida foi um dos maiores desastres toxicológicos registrados na história. O documentário intitulado Tá faltando alguma coisa relata a história da talidomida no Brasil e a luta pelos direitos das pessoas que foram afetadas por essa tragédia. Adicionalmente, o documentário faz uma dura crítica ao fato de o País ser o único no mundo a ter uma terceira geração com deformidades geradas pelo uso da droga. Depois de assistir ao filme, você compreenderá os riscos do uso incorreto de medicamentos e o papel dos estudos toxicológicos para evitar que acidentes como esse ocorram. 32WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 1 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade, vimos que a história mostra diversos obstáculos para o desenvolvimento da toxicologia como ciência. O estudo que se iniciou com o uso de venenos e com a observação de sintomas relacionados ao trabalho levou a descobertas precursoras para o estabelecimento desta disciplina como ciência. É uma ciência complexa, e suas áreas (ambiental, ocupacional, alimentos, medicamentos, cosméticos e social) abrangem diversas outras ciências, como a farmacologia e a biologia. Seu estudo propõe-se não apenas a analisar sinais e sintomas provocados por agentes tóxicos, mas também os mecanismos envolvidos no processo da intoxicação, como a exposição e a toxicocinética. O conhecimento dos mecanismos é adquirido a partir de ensaios biológicos enquanto que a identificação e a quantificação de substâncias tóxicas são realizadas por exames toxicológicos dos fluidos corporais (saliva, sangue, urina e fezes). Esses conhecimentos são de fundamental importância ao estabelecimento de uma terapêutica segura, da regulamentação do uso de substâncias tóxicas e de medidas que possam prevenir intoxicações. 3333WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 02 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................................................35 1. TOXICODINÂMICA ...................................................................................................................................................36 1.1 CONCEITOS .............................................................................................................................................................36 1.1.1 REAÇÃO ADVERSA VERSUS INTOXICAÇÃO .......................................................................................................36 1.1.2 DE50 E DE90 ...........................................................................................................................................................37 1.2 AGENTES TÓXICOS E SUA SELETIVIDADE DE AÇÃO .........................................................................................37 1.3 MECANISMOS GERAIS .........................................................................................................................................38 1.3.1 INTERAÇÕES DE AGENTES TÓXICOS COM RECEPTORES .............................................................................38 1.3.2 INTERFERÊNCIAS NAS FUNÇÕES E MEMBRANAS EXCITÁVEIS .................................................................39 1.3.3 INIBIÇÃO DA FOSFORILAÇÃO OXIDATIVA ....................................................................................................... 41 TOXICODINÂMICA, TOXICOLOGIA CLÍNICA E TESTES TOXICOLÓGICOS PROF.A DRA. LIANA INARA DE JESUS DOS SANTOS ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICA 34WWW.UNINGA.BR 1.3.4 COMPLEXAÇÃO COM BIOMOLÉCULAS ...........................................................................................................42 2. TOXICOLOGIA CLÍNICA...........................................................................................................................................47 3. AVALIAÇÃO DA TOXICIDADE ..................................................................................................................................49 3.1 RELAÇÃO DOSE E CONCENTRAÇÃO DO AGENTE QUÍMICO VERSUS RESPOSTA ..........................................50 3.2 TIPOS DE TESTES TOXICOLÓGICOS ...................................................................................................................50 3.2.1 INFORMAÇÕES PRELIMINARES ...................................................................................................................... 51 3.2.2 TOXICIDADE AGUDA .......................................................................................................................................... 51 3.2.3 TOXICIDADE SUBCRÔNICA...............................................................................................................................52 3.2.4 TOXICIDADE CRÔNICA ......................................................................................................................................52 3.2.5 MUTAGENICIDADE E CARCINOGÊNESE .........................................................................................................52 3.2.6 EMBRIOFETOTOXICIDADE E REPRODUÇÃO ..................................................................................................53 3.2.7 TOXICOCINÉTICA ...............................................................................................................................................53 3.2.8 EFEITOS LOCAIS SOBRE A PELE E O OLHO ....................................................................................................54 3.2.9 SENSIBILIZAÇÃO CUTÂNEA .............................................................................................................................55 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................................................................57 35WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO O estudo da toxicodinâmica permite adquirir informações a respeito dos mecanismos de ação ligados aos agentes tóxicos em contato com o organismo. É uma área que ampara as pesquisas científicas no intuito de desenvolver métodos para avaliar o potencial tóxico de cada agente, prevenção da intoxicação e tratamento. Além disso, a compreensão obtida pelo estudo serve como base para o desenvolvimento de produtos químicos específicos, os quais possuem seletividade para serem aplicados sem prejuízos à saúde humana. Os mecanismos de ação são os mais variados; entretanto, o efeito tóxico depende de a substância química atingir e permanecer no local de ação. Como vimos na Unidade 1, isso depende de uma série de fatores relacionados à farmacocinética, até que se alcance o sítio de ação. Nesse local, a interação da substância química ocorre por diferentes reações que são estabelecidas de acordo com as particularidades físico- químicas da substância e do seu sítio de ação. Os mecanismos de intoxicação discutidos nesta unidade são capazes de originar efeitos adversos e/ou morte celular, acarretando perda da função de tecidos e órgãos. A toxicologia clínica contribui para a abordagem de casos relacionados à intoxicação, servindo como suporte para a rápida recuperação do paciente. Seu trabalho consiste na observação de indivíduos que foram expostos a algum agente tóxico, com o intuito de prevenir, diagnosticar e elaborar medidas terapêuticas específicas. A avaliação da toxicidade está relacionada ao estabelecimento da dose-resposta, a qual analisa a relação entre a intensidade do efeito, a concentração e o tempo de exposição. No caso de organismos como o embrião e o feto, os cuidados devem ser maiores ainda já que são altamente sensíveis à exposição de substâncias potencialmente tóxicas. Para caracterizar o potencial de toxicidade de um agente químico, é importante conhecer não apenas a dose e o tipo de efeito que produz, mas também levar em conta a elucidação das propriedades físico-químicas do agente, as condições de exposição e a sua cinética no sistema biológico. Para obter esse conjunto de informações, são realizados testes toxicológicos que incluem informações preliminares a respeito da substância química em estudo, a pesquisa sobre seu grau de toxicidade, potencial mutagênico, sua toxicocinética e os possíveis efeitos no organismo que podem ser provocados por contato direto. 36WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1. TOXICODINÂMICA A toxicodinâmica é o estudo que compreende os mecanismos de interação entre o toxicante e os sítios de ação do organismo, assim como a toxicidade provocada como resultado dessa interação. O estudo da toxicodinâmica serve como referência para a avaliação de risco, para a elaboração de metodologias com vistas a prevenir e tratar intoxicações e para o desenvolvimento de produtos com maior seletividade. Essa área da toxicologia está conectada à toxicocinética já que a manifestação do efeito tóxico no sistema biológico distante do seu local de exposição apresenta duas características: a absorção e o alcance do sítio alvo, com os eventos celulares provenientes do contato do xenobiótico no local de ação. Figura 1 - Relação entre a toxicocinética e a toxicodinâmica. Fonte: A autora. 1.1 Conceitos 1.1.1 Reação adversa versus intoxicação A reação adversa é o efeito provocado com doses terapêuticas do medicamento e acontece devido ao fato de o medicamento não apresentar seletividade para apenas o sítio alvo desejado ou por estar distribuído em diferentes tecidos do corpo. A intoxicação é a manifestação dos efeitos tóxicos (sinais e sintomas), sendo um processo patológico causado por xenobióticos. No caso de medicamentos, a intoxicação é ocasionada por uma dose excessiva (que pode ser acidental ou intencional). 37WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.1.2 DE50 e DE90 Como visto na Unidade 1, a toxicidade aguda é avaliada pelos valores de DL50 e DL10, obtidos experimentalmente (dose letal para 50% e 10% dos animais em experimento, respectivamente). Adicionalmente, é possível definir as doses efetivas que proporcionam efeitos terapêuticos desejáveis em 50% (DE50) e 90% (DE90) nos animais em estudo. Quando os valores de doses efetivas são relacionados aos valores das doses letais, é possível estabelecer o índice terapêutico (IT) e a margem de segurança (MS), os quais podem ser expressos da seguinte forma: Quanto maior é o valor do índice terapêutico e/ou da margem de segurança, menor é a probabilidade de uma substância provocar intoxicação. 1.2 Agentes Tóxicos e sua Seletividade de Ação Os agentes tóxicos apresentam uma ampla variedade de estruturas químicas e, por isso, são classificados de acordo com a sua classe química, com o seu estado físico (sólido, líquido e gás) e com a ação bioquímica e farmacológica. Todos os agentes tóxicos modificam a homeostasia do organismo, sendo alguns mais seletivos em sua ação, e outros, não. Ácidos e bases, por exemplo, não possuem seletividade para uma estrutura alvo específica, provocando danos nos tecidos de contato. A seletividade de ação também varia de acordo com a espécie: pesticidas e derivados são empregados na agricultura para atuarem especificamente no combate às pragas que atingem as lavouras, sem ocasionarem danos para outros organismos vivos. Inseticidas na forma de spray também possuem a mesma finalidade. Os antibióticos possuem toxicidade seletiva para atuar sobre os micro-organismos responsáveis pela doença, atingindo estruturas celulares que estão presentes exclusivamente neles e ausentes nos seres humanos. Outro fator que conduz à seletividade é a diferença na quantidade de enzimas expressasde uma espécie para outra. Um exemplo são os ratos, que tendem a desenvolver tumor no fígado em contato com a aflatoxina B; porém, em camundongos esse efeito não é observado. Isso ocorre, porque os camundongos possuem maior concentração da enzima glutationa S-transferase, responsável pela biotransformação do metabólito produzido por esse xenobiótico. A característica físico-química de xenobióticos também influencia a seletividade para tecidos e órgãos. O flúor é um exemplo de agente químico que, acima dos níveis recomendados, possui afinidade com o tecido ósseo, levando ao desenvolvimento da fluorose. A intensidade da intoxicação depende da seletividade e do tecido atingido: o fígado possui uma capacidade de regeneração muito maior que outros tecidos diante de uma agressão química. Por outro lado, células nervosas apresentam limitação para regenerar-se e, portanto, os danos causados por um ou mais agentes químicos são muito maiores e permanentes. 38WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3 Mecanismos Gerais O conhecimento do mecanismo de ação de xenobióticos e do seu local de ação fornece a base para a prevenção e tratamento de intoxicações. 1.3.1 Interações de agentes tóxicos com receptores O receptor é o componente celular responsável pela comunicação e função química da célula, podendo estar presente na membrana plasmática, no citoplasma ou no núcleo. A resposta biológica se dá a partir da estimulação dos receptores, podendo ela ser rápida ou lenta de acordo com os mecanismos envolvidos. A interação entre o receptor e o agente tóxico (ligante) geralmente é reversível. A extensão da resposta depende da concentração do agente e da quantidade de receptores ocupados por ele. A interação é altamente seletiva, e qualquer alteração estrutural que possa ocorrer na estrutura do ligante tende a fazer variar ou anular o efeito. Como exemplo de intoxicação provocada por esse mecanismo, temos o d-tubocurarina (curare), um alcaloide extraído de plantas nativas da América do Sul, utilizado pelos índios como veneno posto na ponta de suas flechas. O curare é empregado na caça de animais selvagens, sendo um potente bloqueador da musculatura estriada. Ele atua na junção neuromuscular como antagonista competitivo do neurotransmissor acetilcolina: suas moléculas interagem com os receptores nicotínicos da acetilcolina e impedem a ligação desse neurotransmissor no local, impedindo o processo de despolarização da membrana da célula. Consequentemente, a musculatura torna-se progressivamente flácida, começando pelos músculos da face, progredindo para tronco e membros e, por último, atingindo os músculos respiratórios. Outro exemplo é a nicotina proveniente do cigarro, que também atua nos receptores nicotínicos da acetilcolina: seu efeito estimulante nos receptores dos órgãos (como coração, vasos sanguíneos e trato gastrintestinal) causa despolarização permanente das membranas. Como resultado, a nicotina aumenta o risco de ataque cardíaco, eleva a pressão arterial e contribui para o desenvolvimento de diversas doenças no sistema digestivo, como refluxo, úlceras, pancreatite e cálculos biliares. Figura 2 - Representação da interação do curare e da nicotina nos receptores nicotínicos da junção neuromuscular. Fonte: Silva (2020). 39WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3.2 Interferências nas funções e membranas excitáveis A homeostasia das membranas excitáveis é fundamental para as funções de órgãos e tecidos, entretanto, compostos químicos podem causar modificações nesse sistema a partir da alteração do fluxo de íons nos canais presentes na membrana. É o caso do bloqueio dos canais de íons na liberação da acetilcolina, responsável pela contração dos músculos esqueléticos. A liberação desse neurotransmissor está condicionada à entrada de íons sódio e à saída de íons potássio pelos canais presentes na membrana. Espécies de peixes, como fugu e baiacu, contêm uma toxina chamada tetrodotoxina, a qual bloqueia os canais de sódio, impedindo as trocas iônicas e, consequentemente, a liberação da acetilcolina. Como resultado desse bloqueio, há intensa fraqueza muscular, que pode evoluir para paralisia completa e morte. Dessa forma, para o consumo desses peixes, é necessário que haja um cuidado especial na sua preparação para evitar intoxicação e acidentes fatais. Figura 3 - Representação da interação do tetrodotoxina nos canais de sódio da membrana. Fonte: Gregório, Freitas e Macedo (2020). 40WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Outro exemplo é a toxina botulínica produzida pelo micro-organismo Clostridium botulinum, a qual atua no axônio terminal colinérgico, bloqueando a liberação da acetilcolina. O botulismo pode ocorrer a partir da ingestão das toxinas em alimentos contaminados e que foram produzidos ou conservados de maneira inadequada. No caso do botulismo infantil, sua principal causa é a ingestão de mel de abelha no primeiro ano de vida. E uma das causas mais raras é o botulismo causado por meio de locais de ferimentos contaminados pela bactéria C. botulinum. A intoxicação pela toxina botulínica pode apresentar os mais variados sintomas, desde os mais leves (como dores de cabeça, vertigem, tontura, sonolência, diarreia, náuseas, vômitos) até manifestações mais graves (como visão turva, dificuldade para respirar e paralisia da musculatura respiratória). Figura 4 - Representação do bloqueio efetuado pela toxina botulínica no axônio terminal, responsável pela liberação da acetilcolina. Fonte: Melgaço (2020). 41WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3.3 Inibição da fosforilação oxidativa A fosforilação oxidativa é o estágio final da respiração celular e representa o fim da rota metabólica da produção de energia em organismos aeróbios, sendo o principal sítio de produção de ATP, com consumo de oxigênio e formação da molécula de água. Esse processo de produção de ATP é realizado por meio de complexos proteicos que formam a cadeia transportadora de elétrons e enzimas específicas. Há agentes tóxicos capazes de interferir na síntese de ATP ao bloquearem a distribuição de oxigênio aos tecidos. Esse fornecimento de oxigênio pode ser bloqueado a partir da oxidação do ferro da hemoglobina pelo toxicante, convertendo-a em metemoglobina, a qual não consegue carregar o oxigênio pelos tecidos. A utilização do oxigênio na síntese de ATP pode ser bloqueada por agentes tóxicos (como cianeto, sulfeto e azida) pelo fato de eles apresentarem afinidade com uma enzima específica, chamada citocromo oxidase. A interação do cianeto e outros toxicantes na respiração celular se dá por meio de sua complexação com o citocromo oxidase, bloqueando a transferência de elétrons para a molécula de oxigênio. A depleção de ATP resulta na perturbação da homeostasia da membrana, no mau funcionamento das bombas e canais iônicos e na deficiência da síntese de proteínas. A diminuição significativa da energia resultará na perda das funções e morte celular. Figura 5 - Bloqueio da enzima citocromo oxidase na fosforilação oxidativa pelo cianeto e outros agentes tóxicos e a deficiência no transporte do oxigênio para a cadeia transportadora de elétrons, realizado pela metemoglobina, com consequente depleção de ATP. Fonte: Adaptado de Mirandela (2015). 42WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3.4 Complexação com biomoléculas Os agentes tóxicos possuem a capacidade de atuar sobre biomoléculas, como enzimas, proteínas, lipídios e ácidos nucleicos, inibindo esses componentes biológicos, com consequente prejuízo de suas funções. - Enzimas Os inseticidas organofosforados são exemplos de toxicantes que interagem com enzimas, inibindo sua atividade. Esses agentes tóxicos possuem como alvo as enzimas colinesterases, inativando-as e potencializando os efeitos decorrentesdo neurotransmissor acetilcolina endógeno. A colinesterase atua na quebra da acetilcolina em acetato e colina. Com a inibição enzimática irreversível, há o acúmulo do neurotransmissor nas terminações nervosas, com consequente efeito tóxico. Dentre os sintomas de toxicidade, podemos listar: fraqueza neuromuscular, paralisia, depressão do sistema nervoso central e morte. Figura 6 - Bloqueio da enzima colinesterase por inseticida organofosforado, com consequente acúmulo de acetilcolina. Fonte: Munhoz (2014). 43WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Metais como o chumbo, mercúrio, cádmio e arsênio também são inibidores enzimáticos. No caso do chumbo, sua toxicidade é caracterizada por sintomas gastrintestinais (cólicas abdominais, constipação intestinal e vômitos) e renais (insuficiência), no sistema nervoso central (retardo mental, convulsões e irritabilidade) e hematopoiéticos (anemia). A anemia é um parâmetro importante para o diagnóstico clínico de intoxicação por chumbo. O monitoramento biológico é realizado a partir da dosagem do ácido delta aminolevulínico no sangue e na urina. O acúmulo desse ácido está relacionado ao mecanismo de ação desse metal. O chumbo inibe a enzima ácido δ-aminolevulínico desidratase (ALA-D), responsável pela produção do grupamento heme da hemoglobina. Dessa forma, esse metal interfere na capacidade funcional das hemácias de transportar o oxigênio pelo organismo e na concentração delas. Figura 7 - Bloqueio da enzima ácido δ-aminolevulínico desidratase pelo chumbo com comprometimento da síntese do grupo heme da hemoglobina. Fonte: Educação Infoco (2020). Outros metais, como cobalto, berílio e cádmio, são inibidores das diferentes isoformas da enzima citocromo P-450, o que impede a metabolização de toxicantes de caráter lipofílico, dificultando sua eliminação. Dessa forma, o tempo de permanência dessas substâncias aumenta, amplificando o efeito tóxico no organismo. O monóxido de carbono é um gás liberado na combustão incompleta da matéria orgânica, sendo uma das intoxicações mais comuns. A via de introdução do gás no corpo é a pulmonar e, por ele ser inodoro e incolor, sua inalação pode ocorrer facilmente em locais que possuem aquecedores a gás e a querosene, fornos, fogões à lenha ou carvão, em casos de incêndio e automóveis vedados. Após ser inalado, o gás alcança a corrente sanguínea e se liga ao ferro da hemoglobina, formando a carboxi-hemoglobina. Ocorre a redução do transporte de oxigênio para os tecidos e órgãos. Adicionalmente, o gás é capaz de interagir com a enzima citocromo oxidase, a qual faz parte da cadeia transportadora de elétrons, reduzindo a energia liberada pela respiração celular (tópico 1.3.3). Os principais sintomas são náuseas, dor de cabeça, confusão mental, insuficiência respiratória, coma e morte. 44WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Proteínas Na fase da toxicocinética, a biotransformação de substâncias químicas na fase I do metabolismo resulta na formação de metabólitos mais reativos e, portanto, com maior toxicidade. Esses metabólitos geralmente possuem caráter eletrofílico e ligam-se a componentes celulares nucleofílicos, como proteínas, RNA e DNA, sendo que tal ligação é responsável por processos tóxicos, como mutagenicidade, carcinogenicidade e necrose. Agentes inibidores e indutores das enzimas da fase I podem acarretar maior toxicidade: a inibição conduz ao aumento da concentração do toxicante sem ser metabolizado no organismo, e a indução acarreta o aumento da concentração de metabólitos reativos produzidos nessa fase. As reações de fase II do processo de biotransformação conjugam os radicais altamente reativos formados na fase I com cofatores endógenos, convertendo-os em substâncias não reativas (inativação), com característica mais hidrofílica para a excreção do organismo. Como exemplo, temos o anti-inflamatório paracetamol, que é metabolizado no fígado por uma reação catalisada pelo citocromo P-450 na fase I. O metabólito gerado por essa reação é o N-P-acetilbenzoquinonaimina (NAPQI), o qual apresenta maior toxicidade que o substrato (paracetamol), sendo altamente reativo com as células hepáticas, causando carcinogenicidade no local. Em seguida, na fase II, esse metabólito é conjugado com a glutationa, formando o ácido mercaptúrico, o qual é um produto metabólico inativo (Figura 17 - Unidade 1). Qualquer alteração que resulte em significativa diminuição da concentração da glutationa conduz ao aumento da hepatotoxicidade. Outras substâncias, como o cloranfenicol, o bromobenzeno e o tetracloreto de carbono, promovem intoxicação por mecanismo semelhante. No caso do cloranfenicol, o metabólito resultante de sua biotransformação na fase I é reativo com diversos componentes biológicos. Uma das consequências é a interação desse radical com a medula óssea e o desenvolvimento de anemia aplástica. O uso prolongado e excessivo desse medicamento causa acúmulo desse fármaco no organismo, saturando o sistema enzimático responsável pelo seu metabolismo e excreção. O bromobenzeno e o tetracloreto de carbono são solventes hepatotóxicos, atuando principalmente na região onde há maior concentração de enzimas da fase I. Quando a concentração de glutationa encontra-se baixa, a inativação dos metabólitos reativos desses agentes tóxicos diminui, aumentando sua concentração no tecido hepático e gerando toxicidade. 45WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Lipídios A peroxidação de lipídios é um dos principais mecanismos responsáveis pela morte celular. A peroxidação lipídica é caracterizada pela oxidação dos fosfolipídios presentes na membrana, sendo uma série de reações químicas que fazem parte do estresse oxidativo. Como consequência, esse processo acarreta o comprometimento da integridade da estrutura celular, levando à necrose e apoptose das células. Metabólitos eletrofílicos formados na primeira etapa de reações de biotransformação são os responsáveis por desencadear a peroxidação e levar à morte celular. Como exemplo de metabólito intermediário, temos o triclorometil (derivado do tetracloreto de carbono), que apresenta grande capacidade de reagir com o oxigênio molecular, causando a destruição dos componentes celulares por esse mecanismo. Figura 8 - Mecanismo de peroxidação lipídica. Fonte: A autora. - Ácidos nucleicos A molécula de DNA possui vários sítios nucleofílicos, que podem interagir com toxicantes eletrofílicos derivados das reações de biotransformação da fase I. Como consequência dessa interação, ocorre o aparecimento de mutações e câncer. A ligação do DNA com agentes eletrofílicos modifica a expressão de genes essenciais para a sobrevivência da célula. Se essa ligação ocorrer com uma molécula de RNA, haverá comprometimento da síntese proteica. Entretanto, a célula possui meios para reparar as alterações provocadas por essas substâncias. Se a reparação for bem sucedida, a célula sobreviverá à agressão sem sequelas. Porém, se o reparo não ocorrer ou se for realizado incorretamente, haverá o início de um processo de mutação, que servirá de precursor para o desenvolvimento de câncer. Figura 9 - Interação do agente nucleofílico com a molécula de DNA. Fonte: Doyle (2015). 46WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Perturbação da homeostase cálcica O cálcio é o segundo mensageiro envolvido na sinalização celular, fazendo parte da regulação de atividades intracelulares essenciais para a célula. Para a utilização do cálcio na transdução celular, é necessário que ocorra o influxo desse íon para o interior da célula através de canais específicos. Algumas proteínas da célula possuem sítios de ligação para o cálcio, e essa interação acarreta a resposta de diversas funções celulares. A perturbação da homeostase cálcica acontece quando ocorre elevado influxo de cálcio, liberação do íon doestoque intracelular e inibição de seu efluxo pela membrana. Todas essas ações aumentam a concentração de cálcio no interior da célula. Uma das funções desempenhadas pelo cálcio é a ativação de fosfolipases, as quais são responsáveis por remover fosfolipídios peroxidados de membranas danificadas. O aumento da concentração desse íon promove o aumento da atividade das fosfolipases, que não somente removem os fosfolipídios peroxidados, como também retiram fosfolipídios não danificados. Essa atividade ampliada e exacerbada acarreta danos à membrana ou morte celular. Alguns agentes tóxicos, como nitrofenóis, quinonas, peróxidos, aldeídos, hidrocarbonetos e alguns íons metálicos, promovem desequilíbrio na concentração de cálcio intracelular e, consequentemente, danos para a célula. Figura 10 - Sinalização celular, utilizando o cálcio como segundo mensageiro. Fonte: Khan Academy (2020). 47WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 2. TOXICOLOGIA CLÍNICA A toxicologia clínica aborda o conhecimento dos agentes tóxicos, suas características de toxicidade, mecanismos de ação e o quadro clínico que produzem. A avaliação adequada dos pacientes permite obter o diagnóstico para realizar o tratamento de desintoxicação. Não obstante, a análise do perfil epidemiológico auxilia no desenvolvimento de medidas de controle e prevenção de intoxicações. Toda suspeita de intoxicação necessita ser tratada como uma situação clínica potencialmente grave, porque, mesmo em pacientes que não manifestam sintomas inicialmente preocupantes, a evolução pode ser rápida e fatal. Assim sendo, a abordagem inicial deve ser feita de forma rápida e criteriosa. O atendimento de um indivíduo intoxicado deve passar primeiramente por uma avaliação inicial, um exame físico, para adotar as medidas necessárias para estabilizar o indivíduo e evitar piora clínica. O exame físico consiste na análise de: ◦ Odores característicos: hálito etílico, que caracteriza uso de álcool, ou, por exemplo, odor de alho, que indica intoxicação por organofosforados. ◦ Pele: presença de sudorese, vermelhidão, palidez, cianose, desidratação, edema ou secura de mucosas. ◦ Temperatura corporal: hipotermia ou hipertermia. ◦ Alterações de pupilas: miose ou midríase. ◦ Alterações da consciência: agitação, sedação, confusão mental, alucinação, delírio ou desorientação. ◦ Anormalidades neurológicas: convulsões, alteração do reflexo ou tônus muscular ou perda da consciência. ◦ Alterações cardiovasculares: bradicardia, taquicardia, hipertensão ou hipotensão. ◦ Respiração: insuficiência respiratória ou presença de ruídos pulmonares. ◦ Trato gastrintestinal: produção excessiva de saliva, vômitos, diarreia, rigidez abdominal, aumento ou diminuição de ruídos abdominais. Esses sinais e sintomas descritos, quando agrupados, podem caracterizar uma determinada síndrome tóxica. Dependendo do agente tóxico envolvido, podem ser solicitados para confirmar a suspeita de intoxicação os seguintes exames complementares: eletrocardiograma, exames de imagem, endoscopia digestiva e laboratorial toxicológico (análise do sangue, plasma, soro, urina e fluidos gástricos). 48WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O tratamento adequado de um paciente com suspeita de intoxicação depende do agente envolvido e da sua toxicidade, assim como do tempo decorrido entre a exposição e o atendimento. O tratamento envolve medidas específicas, como descontaminação, administração de antídotos e técnicas de eliminação. A descontaminação tem como objetivo remover o toxicante do organismo com a finalidade de diminuir sua absorção. De acordo com a via de exposição, os procedimentos de descontaminação são: - Cutânea: remoção da roupa contaminada pelo agente tóxico e lavagem da superfície exposta com água. - Respiratória: administração de oxigênio. - Ocular: instilar uma ou duas gotas de colírio anestésico no olho afetado e proceder à lavagem com soro fisiológico ou água filtrada. - Gastrintestinal: remoção do agente tóxico por lavagem gástrica, administração de carvão ativado e lavagem intestinal. Figura 11 - Fluxograma com o procedimento de descontaminação de paciente intoxicado. Fonte: COVISA (2017). Os antídotos são substâncias que visam a neutralizar o agente tóxico no organismo. A administração desses medicamentos não é a primeira conduta a ser tomada na maioria das situações de intoxicação: a maior parte dos casos pode ser tratada apenas com medidas de suporte. Contudo, algumas situações específicas exigem a administração de antídotos. Os principais antídotos e medicamentos auxiliares no tratamento das intoxicações são: anticorpo antidigoxina, ácido fólico, ácido folínico, atropina, azul de metileno, bicarbonato de sódio, biperideno, bromocriptina, carvão ativado, ciproeptadina, dantroleno, deferoxamina, diazepam, dimercaprol, ácido 2,3-dimercaptosuccínico, edetato de cálcio dissódico, emulsão lipídica lipofundin, etanol, fisostigmina, flumazenil, gliconato de cálcio, glucagon, hidroxocobalamina, L-carnitina, penicilamina, piridoxina, polietilenoglicol, protamina, tiamina e tiossulfato de sódio. 49WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA As medidas de eliminação são utilizadas para intensificar a excreção do agente tóxico no organismo. As principais medidas utilizadas são o carvão ativado, a alcalinização urinária e a hemodiálise ou hemoperfusão. O carvão ativado em dose múltipla é indicado em casos de intoxicação por medicamentos, como fenobarbital, dapsona e carbamazepina. A alcalinização urinária é recomendada para ácidos fracos e lipossolúveis, como fenobarbital e salicilatos. Ao alcalinizar a urina, ocorre a conversão dessas substâncias à sua forma ionizada (hidrofílica), impedindo a sua reabsorção pelo túbulo renal, favorecendo sua eliminação (Figura 18 - Unidade 1). A hemodiálise ou hemoperfusão são técnicas raramente utilizadas: sua indicação é para casos em que se constata que o quadro clínico do paciente piora consideravelmente, e os níveis séricos da substância nos fluidos biológicos permanecem altos, indicando um prognóstico ruim. Sendo assim, esses métodos são úteis para aumentar a velocidade de depuração dos agentes tóxicos por remoção extracorpórea. A hemodiálise é benéfica nos casos de intoxicação por fenobarbital, teofilina, lítio, salicilatos e álcoois tóxicos, sendo mais eficaz na remoção de compostos com baixo peso molecular, que possuem pequeno volume de distribuição e baixa afinidade com proteínas plasmáticas. O emprego da hemoperfusão é restrito pelo fato de sua disponibilidade nos centros de emergência ser limitada. Logo, a hemodiálise, quando necessária, é a técnica mais utilizada. 3. AVALIAÇÃO DA TOXICIDADE Segundo a toxicologia, toda substância possui capacidade para ser um agente tóxico, a depender das condições de exposição (dose, tempo, frequência e via de introdução) e do grau de absorção. Esses são fatores importantes a serem considerados na avaliação da toxicidade. Portanto, é fundamental estudar as condições que promovem o uso seguro de substâncias químicas, sem impacto nas saúdes humana e ambiental. Todas as substâncias, apesar do seu potencial tóxico, podem ser empregadas de forma segura desde que as condições de exposição sejam respeitadas. Um dos maiores desafios é estabelecer o nível de exposição tolerável já que há dificuldade em se estabelecer o que é considerado dano ou efeito adverso. Essa dificuldade ocorre devido ao fenômeno de adaptação que o organismo apresenta frente a agressões do agente tóxico. Esse processo envolve um conjunto de modificações fisiológicas às condições adversas de exposição, sem manifestação de sintomas. Os seres vivos exibem a capacidade de responder a circunstâncias desfavoráveis, adaptando sua resposta e mantendo a sua homeostasia, sem inicialmente exibir toxicidade. Apesar do potencial de adaptação, essa capacidadeé limitada e, quando não é o suficiente para contornar o efeito tóxico do agente químico, os sintomas de toxicidade são expressados. 50WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.1 Relação Dose e Concentração do Agente Químico versus Resposta A dose é definida como a quantidade de substância administrada a um organismo, e a concentração expressa a quantidade de agente químico a que o sistema biológico está exposto. A concentração necessária para produzir danos ao organismo depende de diversas condições, dentre elas, as propriedades físico-químicas do toxicante. A relação dose-resposta ou concentração- resposta representa a associação entre a exposição e os efeitos tóxicos, sendo representada por uma curva calculada estatisticamente. Essa curva é utilizada para calcular a dose letal a 50% (DL50) ou a concentração letal a 50% (CL50), sendo a dose ou concentração necessária para matar 50% dos animais em experimento toxicológico. Os seguintes critérios de toxicidade são adotados pela comunidade europeia: Quadro 1 - Classificação de toxicidade de substâncias químicas. Fonte: Oga, Camargo e Batistuzzo (2008). Como se pode ver no Quadro 1, os valores de DL50 são normalmente expressos em quantidade de agente químico por quilo de peso corpóreo, mas também podem ser encontrados por cm2 de área de superfície corpórea. Se houver manifestação de toxicidade sem morte, a substância é classificada como nociva; se, em doses menores, causar toxicidade sem mortalidade, é considerada tóxica; e se, em doses muito menores, causar toxicidade e/ou morte, é apontada como muito tóxica. As informações provenientes da curva servem como base para a seleção de doses para os testes de exposição a médio e longo prazos. 3.2 Tipos de Testes Toxicológicos Além da formulação da curva dose/concentração-resposta, é indispensável a realização de testes toxicológicos com animais para o entendimento dos efeitos tóxicos provocados por substâncias químicas. Os testes ocorrem depois de uma triagem farmacológica, que garante que apenas os fármacos que demonstram potencial efeito terapêutico serão testados. Após os graves incidentes da sulfanilamida e da talidomida, diversos países passaram a exigir maior rigor nos ensaios biológicos de fármacos para estimar seus efeitos tóxicos. Os testes toxicológicos não são planejados necessariamente para garantir a segurança no consumo de medicamentos, mas servem para estimar o efeito tóxico que um agente químico é capaz de produzir. Os testes toxicológicos são um conjunto de estudos que podem ser listados da seguinte forma: ◦ Informações preliminares. ◦ Toxicidade aguda. ◦ Toxicidade subcrônica (curta duração). ◦ Toxicidade crônica (longo prazo). ◦ Mutagênese e carcinogênese. 51WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ◦ Embriofetotoxicidade e reprodução. ◦ Toxicocinética. ◦ Efeitos locais sobre a pele e olhos. ◦ Sensibilização cutânea. 3.2.1 Informações preliminares As informações preliminares são o conhecimento da estrutura química da substância em estudo. Para isso, é essencial que a substância já esteja quimicamente caracterizada e sem impurezas. Caso impurezas sejam detectadas, elas devem ser conhecidas já que possuem a capacidade de alterar a toxicidade. Por inúmeras vezes, as impurezas presentes na substância em teste são responsáveis pelo efeito tóxico. As propriedades físico-químicas analisadas são: ◦ Odor. ◦ Cor. ◦ Ponto de fusão. ◦ Ponto de ebulição. ◦ Pressão de vapor. ◦ Densidade. ◦ Viscosidade. ◦ Solubilidade. ◦ Volatilidade. As informações obtidas da caracterização química e do estudo das propriedades de cada substância servem como base para determinar a forma como vai ser conservada, manipulada e dissolvida e as vias pelas quais pode ser administrada. 3.2.2 Toxicidade aguda O estudo de toxicidade aguda prevê os efeitos tóxicos que podem ocorrer após administração de uma dose única ou múltiplas dentro de um período curto (24 horas). Geralmente, a dose única serve para caracterizar o potencial de toxicidade de uma substância após ingestão ou envenenamento acidental enquanto que as doses múltiplas são utilizadas para avaliar o efeito cumulativo. A toxicidade aguda é caracterizada pela relação dose-resposta que conduz ao cálculo da DL50, o qual é útil para determinar a toxicidade relativa de uma substância. Os dados obtidos do estudo de toxicidade aguda servem também para entender o mecanismo de ação de um composto químico, identificar possíveis tecidos ou órgãos-alvo e definir se os efeitos tóxicos identificados são reversíveis. A avaliação não consiste apenas na observação da quantidade de animais mortos, mas também avalia o início, a característica e a duração da intoxicação que causou a morte. Adicionalmente, essa avaliação é complementada por exames anatomopatológicos, que contribuem à determinação de tecidos e órgãos-alvo. 52WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.2.3 Toxicidade subcrônica Os resultados obtidos de toxicidade aguda são utilizados para a formulação dos estudos de toxicidade subcrônica, porque, a partir das informações obtidas na primeira análise, é possível delimitar as doses a serem utilizadas para a próxima fase de estudo. A toxicidade subcrônica fornece informações sobre o composto químico após doses repetidas com o objetivo de estabelecer os níveis em que não se observam efeitos tóxicos, identificar os tecidos e órgãos afetados e a gravidade dos sintomas após exposições repetidas. Nessa fase do estudo, não há avaliação do potencial mutagênico, carcinogênico e embriofetotóxico de uma substância. Sobre os efeitos observados, o estudo leva em consideração se eles foram provocados pelo acúmulo da substância no organismo ou não, se eles são reversíveis e se há necessidade, após o término do estudo, de realizar testes complementares mais específicos. O teste deve ser realizado em, pelo menos, duas espécies de animais, sendo uma roedora e outra não. Exames anatomopatológicos e análise bioquímica no sangue e na urina complementam os dados para fundamentar os estudos de toxicidade crônica. 3.2.4 Toxicidade crônica O estudo de toxicidade crônica é realizado para determinar o efeito tóxico após exposição prolongada, ou seja, o efeito de doses cumulativas da substância em teste. Nesse estudo, é possível avaliar também o potencial carcinogênico. A duração do teste é superior a 3 meses, podendo chegar a 2 anos. Nesse estudo, também se utilizam duas espécies de animais por um período semelhante ao tempo de vida deles. A escolha da dose é o ponto crítico do teste de longa duração já que a ocorrência prematura da morte dos animais descaracteriza o estudo. Os exames clínicos nos animais são realizados diariamente, e parâmetros bioquímicos (como sangue e urina, além dos hematológicos) devem ser analisados em intervalos de tempo definidos. O acompanhamento histopatológico também deve ser realizado. 3.2.5 Mutagenicidade e carcinogênese A mutagênese é definida como a capacidade que uma substância química apresenta de alterar o material genético celular. Essa alteração é transmitida às gerações seguintes de células. Dependendo das mutações que forem feitas, pode haver desde a morte do embrião ou feto até o desenvolvimento de anormalidades congênitas, que podem ser transmitidas hereditariamente. São inúmeros os testes in vitro (células) e in vivo (animais) para se avaliarem as características mutagênicas de um determinado toxicante. A avaliação in vitro visa à identificação de mutações pontuais enquanto que o ensaio in vivo analisa os danos dos cromossomos. Infelizmente, os resultados obtidos são difíceis de serem extrapolados para os seres humanos. Contudo, podem ser utilizados para prever o desenvolvimento de câncer, sendo empregados como testes de triagem para prever o potencial carcinogênico de um dado composto químico. Porém, essesestudos conseguem avaliar apenas as substâncias que interagem diretamente com o material genético (genotóxicas), não contemplando agentes que atuam por mecanismos não genotóxicos. Como exemplo de mecanismo não genotóxico, mas que conduz ao desenvolvimento de câncer, temos: citotoxicidade por regeneração, aumento da síntese de DNA, desequilíbrio hormonal, imunossupressão e aumento na expressão de oncogenes. Portanto, os testes de mutagênese apresentam a limitação de não englobarem todas as substâncias com potencial carcinogênico. Os testes de carcinogênese devem ser empregados nos casos em que ocorra exposição humana prolongada. 53WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Uma característica desses estudos é a utilização da maior dose tolerada: dose administrada durante o período médio de vida dos animais, que não causa morte nem perda de 10% do peso corporal. Figura 12 - Esquema sobre os eventos que ocorrem para a carcinogênese química. Fonte: Rosa (2017). 3.2.6 Embriofetotoxicidade e reprodução A embriofetotoxicidade analisa as alterações induzidas durante o desenvolvimento do feto (entre a concepção e o nascimento), e a toxicologia da reprodução estuda a toxicidade de substâncias químicas nos sistemas reprodutores. A soma desses dois estudos é denominada toxicologia do desenvolvimento, a qual analisa os efeitos provocados por toxicantes antes da concepção, na fase perinatal ou pós-natal até a puberdade. Os testes realizados visam a examinar os efeitos teratogênicos dos agentes químicos. Nos ensaios in vivo, espécies do gênero masculino são tratadas com determinados toxicantes e são acasaladas com fêmeas não expostas ao agente tóxico ou vice-versa (ou ambos os gêneros são tratados antes do acasalamento). O composto químico que está sob avaliação é aplicado nas fêmeas prenhes, já a análise do ciclo reprodutivo exige a observação das gerações posteriores. 3.2.7 Toxicocinética Como vimos em detalhes na Unidade 1, a toxicocinética fornece informações sobre os processos de absorção, distribuição, biotransformação e excreção de fármacos e drogas. Muitos compostos químicos produzem toxicidade por meio dos seus produtos de biotransformação (metabólitos mais reativos). Os metabólitos eletrofílicos tendem a agir nos componentes celulares nucleofílicos, como a molécula de DNA. A atividade de várias enzimas que catalisam as reações de fase I e II do metabolismo pode sofrer indução ou inibição de diversas substâncias. Como resultado, ocorrem alterações da capacidade catalítica ao promoverem aumento ou diminuição de sua atividade, afetando a metabolização da própria substância ou de substâncias administradas concomitantemente. A variação do grau de biotransformação é diretamente afetada pela concentração de enzimas presentes no tecido hepático (principalmente), que pode oscilar de acordo com a espécie e gênero, levando em conta a suscetibilidade individual. O estudo toxicocinético em animais fornece dados que servem para estimar a toxicidade em humanos. 54WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 13 - Relação da toxicocinética com a toxicodinâmica. Fonte: Santos Junior (2015). 3.2.8 Efeitos locais sobre a pele e o olho Os efeitos tóxicos de um agente químico também são avaliados sobre olhos e pele. A exposição direta sobre esses órgãos ocorre principalmente por meio de cosméticos ou por acidentes com produtos químicos. Os animais de escolha para esses testes são o coelho e a cobaia. Para a pele, são levados os seguintes parâmetros em consideração: eritema, escara, edema, corrosão. Já, para os olhos, os seguintes critérios são ponderados: alterações da conjuntiva, da córnea, da íris e do cristalino. Esses testes proporcionam uma margem de segurança para a utilização de diversos produtos que entram em contato direto com a pele e olhos. Figura 14 - Testes sobre a pele e os olhos, utilizando o coelho como modelo experimental (Teste de Draize). Fonte: Leite (2020). 55WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.2.9 Sensibilização cutânea O estudo de sensibilização cutânea também utiliza como animais-modelo o coelho e a cobaia, sendo realizado quando há a possibilidade da exposição repetida com a pele. O animal é submetido ao tratamento, com doses repetidas da substância por um período de uma a duas semanas. Após esse tempo, dá-se um intervalo de duas a três semanas, uma nova dose da substância é aplicada, e o aparecimento do eritema é monitorado. Os dados de sensibilização cutânea obtidos são extrapolados para humanos. O tabagismo é considerado uma doença relacionada ao sistema colinérgico, assim como o Alzheimer, epilepsia e esquizofrenia. A nicotina presente no cigarro é um agonista seletivo dos receptores colinérgicos nicotínicos, e sua exposição crônica causa dessensibilização desses receptores. Para mais detalhes da farmacodinâmica da nicotina sobre o sistema colinérgico, leia o seguinte artigo: VENTURA, A. L. M. et al. Sistema colinérgico: revisitando receptores, regulação e a relação com a doença de Alzheimer, esquizofrenia, epilepsia e tabagismo. Revista de Psiquiatria Clínica, v. 37, n. 2, 2010. O material está disponível em https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0101-60832010000200007. Os testes toxicológicos fazem parte da rotina de pesquisa clínica de laboratórios responsáveis pelo desenvolvimento de medicamentos e cosméticos. Os estudos são realizados com o uso de animais, em especial os camundongos, cobaias, coelhos e cães. Com o crescente aumento da pressão de grupos ativistas em defesa dos animais e do estilo de vida vegano, empresas (especialmente de cosméticos) estão em busca de novas alternativas para avaliar a margem de segurança no uso de seus produtos. O resultado é uma grande variedade de produtos lançados no mercado e que não são testados em animais, sendo que alguns não apresentam excipientes de origem animal em sua formulação. Entre algumas marcas brasileiras que aderiram a essa iniciativa, estão: Eudora, Impala, Granado, Phytoervas e Natura. 56WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A procura pelos medicamentos de venda livre é a primeira opção da população para resolver os problemas de saúde. Tais medicamentos apresentam ampla margem de segurança e, por isso, podem ser comercializados sem prescrição médica. Na toxicologia clínica, observa-se que o medicamento é a principal causa de intoxicação na população brasileira. Dentre os medicamentos mais amplamente utilizados, temos o paracetamol. O uso inadequado desse analgésico e antitérmico pode acarretar sérios problemas de saúde, resultando em possíveis intoxicações. Apesar da baixa incidência de efeitos colaterais, a overdose aguda do paracetamol pode causar lesão hepática grave e envenenamento acidental. Os ensaios que envolvem o uso de animais para pesquisa e desenvolvimento de medicamentos são bem consolidados. A descoberta e o controle de qualidade de vacinas, anestésicos, antibióticos, anti-inflamatórios, bem como medicamentos para o controle da hipertensão arterial e diabetes, só foram possíveis devido ao teste em animais. Contudo, nas últimas décadas, houve uma crescente preocupação com o bem-estar dos animais, e alternativas para reduzir seu uso em pesquisas têm sido prioridade. Infelizmente, o uso de animais para testes toxicológicos continua sendo imprescindível já que ainda não é possível reproduzir em laboratório os complexos sistemas biológicos do corpo humano. O vídeo sugerido mostra uma alternativa para essa questão: um chip orgânico que simula órgãos humanos, o qual permite testar medicamentos e simular doenças. O vídeo está disponível no link https:// www.dw.com/pt-br/chip-org%C3%A2nico-pode-substituir-testes-em-animais/ av-18797697. 57WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 2 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CONSIDERAÇÕES FINAIS A toxicodinâmicaestuda os mecanismos de ação envolvidos na interação do agente tóxico com o seu sítio de ação e a toxicidade resultante desse contato. O conhecimento obtido nessa área serve como base para a avaliação de risco, prevenção e tratamento de intoxicações. A toxicodinâmica está interligada à toxicocinética já que depende do processo de absorção para que o toxicante alcance o local de ação. Os agentes químicos que apresentam toxicidade possuem diferentes estruturas e apresentações químicas, além de distintos graus de seletividade. A atuação do agente tóxico no organismo altera seu estado de equilíbrio. Dentre os mecanismos de ação estudados, temos a interação com receptores, a interferência na homeostasia das membranas excitáveis, a inibição da fosforilação oxidativa, a complexação com enzimas, proteínas, lipídios e ácidos nucleicos e a interação com canais iônicos, resultando na alteração da concentração de cálcio intracelular. A toxicologia clínica trata do conhecimento do agente tóxico, das particularidades do processo de intoxicação e dos sintomas relacionados. A situação clínica de um indivíduo intoxicado é avaliada por meio de um exame físico, o qual é um indicativo para providenciar medidas de descontaminação e eliminação do agente tóxico. O diagnóstico é realizado agrupando-se os sintomas físicos apresentados com exames complementares, como eletrocardiograma, exames de imagem, endoscopia e análise laboratorial dos fluidos corporais. Na avaliação da toxicidade, fatores como exposição e absorção são os mais importantes, assim como os dados obtidos com testes toxicológicos. Os testes toxicológicos utilizam animais como modelo experimental, extrapolando os dados para os humanos. Informações preliminares da substância química, a avaliação da toxicidade aguda, subcrônica e crônica, a análise do potencial mutagênico, a caracterização toxicocinética e a determinação dos efeitos tóxicos sobre a pele e olhos fornecem o conhecimento do efeito tóxico. Nem sempre o resultado desses estudos consegue prever todos os efeitos tóxicos provocados pelos agentes químicos no homem. Entretanto, são uma forte evidência do potencial de toxicidade previsto para cada substância química. O conhecimento adquirido pode ser empregado para a elaboração de medidas para prevenir intoxicações e aumentar a margem de segurança no uso de produtos químicos. 5858WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 03 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................................................60 1. AVALIAÇÃO DE RISCO ............................................................................................................................................. 61 1.1 IDENTIFICAÇÃO DO PERIGO.................................................................................................................................. 61 1.2 CARACTERIZAÇÃO DO PERIGO ............................................................................................................................62 1.3 AVALIAÇÃO DA EXPOSIÇÃO ..................................................................................................................................64 1.4 GERENCIAMENTO DO RISCO ...............................................................................................................................65 2. TOXICOLOGIA AMBIENTAL ....................................................................................................................................65 2.1 ECOTOXICOLOGIA ..................................................................................................................................................65 2.2 POLUIÇÃO DO AR ..................................................................................................................................................66 2.2.1 AVALIAÇÃO DA POLUIÇÃO DO AR ....................................................................................................................67 AVALIAÇÃO DE RISCO, TOXICOLOGIA AMBIENTAL E TOXICOLOGIA OCUPACIONAL PROF.A DRA. LIANA INARA DE JESUS DOS SANTOS ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICA 59WWW.UNINGA.BR 2.2.2 POLUENTES DO AR ............................................................................................................................................68 2.3 CONTAMINANTES DA ÁGUA E DO SOLO ............................................................................................................ 70 2.3.1 FONTES DE EXPOSIÇÃO ..................................................................................................................................... 71 2.3.2 TRANSPORTE E DISTRIBUIÇÃO DE CONTAMINANTES ................................................................................ 71 2.3.3 PROCESSOS DE DEGRADAÇÃO ....................................................................................................................... 73 2.3.4 ACUMULAÇÃO DOS CONTAMINANTES PELA BIOTA ..................................................................................... 74 2.3.5 PRINCIPAIS CONTAMINANTES ....................................................................................................................... 74 3. TOXICOLOGIA OCUPACIONAL ............................................................................................................................... 75 3.1 MONITORAMENTO AMBIENTAL .......................................................................................................................... 76 3.2 MONITORAMENTO BIOLÓGICO .......................................................................................................................... 78 3.2.1 INDICADORES DE DOSE INTERNA ................................................................................................................... 78 3.2.2 INDICADORES DE EFEITO ................................................................................................................................. 79 3.2.3 INDICADORES DE SUSCETIBILIDADE .............................................................................................................80 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................................................................................82 60WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO Na toxicologia, o conceito de risco é muito importante, porque, por meio de sua avaliação, é possível analisar a relação do potencial de um agente químico de causar toxicidade e os efeitos adversos provocados pela sua exposição. A partir da avaliação de risco, é possível estabelecer os níveis de segurança para serem aplicados pelas agências regulatórias, indústrias de alimentos, medicamentos, cosméticos e organizações ambientais. A avaliação de risco é composta por identificação e caracterização do perigo, avaliação da exposição e gerenciamento do risco. A soma dos dados obtidos em cada estudo serve como base para o estabelecimento de níveis de riscos aceitáveis. A toxicologia ambiental estuda os efeitos tóxicos provocados pela exposição de substâncias químicas contaminantes presentes no meio ambiente (ar, solo e água) com os organismos humanos. Um dos aspectos abordados é a interação dos poluentes no ecossistema, ou seja, sua distribuição e bioacumulação no ambiente. A partir da análise desses fatores, é possível prever a biodisponibilidade da substância química para exercer toxicidade. Outras condições observadas são os mecanismos de biotransformação, as respostas bioquímicas e fisiológicas de organismos expostos a poluentes, os efeitos tóxicos na população e ecossistema, a avaliação da ecotoxicidade e o uso de biomarcadores em ambientes poluídos. A toxicologia ocupacional analisa a exposição de substâncias químicas presentes no ambiente de trabalho e seupotencial efeito tóxico nas pessoas que trabalham nesses locais. Seu principal objetivo é a prevenção de alterações da saúde dos trabalhadores expostos a fatores de risco no ambiente de trabalho. Para tanto, a exposição é avaliada sistematicamente por intermédio do monitoramento ambiental e biológico. 61WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1. AVALIAÇÃO DE RISCO Como visto na Unidade 1, o perigo é a capacidade de uma substância causar efeito adverso; o risco é a probabilidade de um evento nocivo ocorrer devido à exposição a um agente químico e/ou biológico (perigo + exposição). A avaliação de risco é uma metodologia de estudo na qual o perigo, a exposição e o risco são identificados e quantificados. Esse método envolve a análise dos efeitos adversos resultantes da exposição humana aos agentes químicos. Com os dados obtidos, é possível estabelecer medidas que visam a reduzir o risco que determinado agente químico representa à saúde da população. A avaliação de risco é dependente da toxicidade da substância química e da característica da exposição. Relembrando-se que a exposição depende da dose ou concentração do agente químico, da frequência e duração, da via de introdução, da suscetibilidade individual e das propriedades físico-químicas do toxicante. Os limites de exposição segura foram fortalecidos com a evolução da avaliação de risco, sendo empregados pelas agências reguladoras governamentais em diversas áreas, como na ambiental, ocupacional, alimentos e cosméticos. Figura 1 - Áreas de estudo na avaliação do risco. Fonte: A autora. 1.1 Identificação do Perigo Nesta fase, é realizada uma análise da substância química, ou seja, seu potencial de causar efeito adverso, avaliando-se as características desses efeitos em uma população ou ecossistema. Esse conhecimento é adquirido a partir de testes toxicológicos realizados com animais e estudos clínicos ou epidemiológicos das populações expostas. Os testes toxicológicos com animais foram explicitados na Unidade 2, sendo que a abordagem tradicional define o limiar de toxicidade por meio da determinação da dose. A dose em que não são observados efeitos adversos é denominada NOAEL, do inglês No Observable Adverse Effect Level, e a menor dose na qual são observados efeitos adversos é intitulada LOAEL, do inglês Lowest Observed Adverse Effect Level. A Benchmark Dose (BMD) é a dose correspondente à resposta, sendo uma alternativa para a determinação da dose efetiva em um estudo de toxicidade. Ela consiste na aplicação de um modelo matemático nas informações obtidas na avaliação de dose-resposta para um determinado endpoint (efeito crítico de relevância). Uma exceção a essas determinações é a DL50, a qual estabelece a dose letal em 50% dos animais em experimento. No estudo da identificação do perigo, os seguintes fatores são levados em consideração: 62WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ◦ Qualidade dos dados. ◦ Tipo de estudo. ◦ Exposição. ◦ Doses utilizadas. ◦ Reprodutibilidade do estudo. A investigação do potencial de toxicidade de um agente químico deve seguir protocolos de entidades internacionais reconhecidas e deve ser conduzida seguindo as boas práticas laboratoriais. Adicionalmente, análises bioquímicas e celulares auxiliam na extrapolação do efeito tóxico para o homem. A toxicidade pode ser prevista também a partir da similaridade estrutural entre a substância em estudo e outra, cuja estrutura e efeito tóxico são conhecidos. 1.2 Caracterização do Perigo A caracterização do perigo é a avaliação da dose-resposta, sendo essa uma relação quantitativa entre a exposição a uma substância química e a ocorrência da resposta adversa. Essa etapa possui como base a escolha da dose NOAEL, que deverá ser empregada no processo de caracterização do perigo que uma substância oferece à saúde humana. Quando os dados de exposição a uma substância química não são suficientes para prever a resposta, os dados provenientes de ensaios com animais são requeridos para se obter a dose-resposta. São dois os tipos de extrapolação utilizados: o quantitativo e o qualitativo. O primeiro abrange a extrapolação de altas doses utilizadas em experimentos para as doses presentes no ambiente (geralmente, baixas doses do toxicante estão presentes no meio). O segundo é qualitativo, o qual implica a extrapolação dos resultados em animais para o homem. Dessa maneira, levam-se em consideração fatores de variabilidade, como: ◦ Diferença entre as espécies e variações dentro de uma mesma espécie. ◦ O emprego do valor de LOAEL ao invés de NOAEL. ◦ Utilização de informações provenientes do estudo de toxicidade subcrônica no lugar do estudo crônico. ◦ Ponderação da exposição a longo prazo. Os fatores de variabilidade, somados com o conhecimento dos mecanismos de ação do agente tóxico e da análise criteriosa dos dados obtidos por meio de ensaios com animais, resultam em uma avaliação de risco de maior confiabilidade. A escolha dos endpoints é realizada a partir da avaliação das informações biológicas estatisticamente significativas para uma determinada substância química. Os efeitos não carcinogênicos possuem limiares de dose abaixo dos quais o efeito não ocorre; já nos efeitos carcinogênicos, não há a existência de um limiar. Dessa forma, o risco de exposição a uma substância com potencial carcinogênico em baixas doses é calculado a partir de modelos matemáticos com uma probabilidade de ocorrência (por exemplo, 1 caso em 100.000). Para as substâncias que apresentam um limiar de resposta, é realizado o cálculo da dose de referência (RfD - Reference Dose), que é a dose à qual a população pode estar exposta diariamente sem apresentar risco de aparecimento de efeitos tóxicos. 63WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Esse conceito pode ser aplicado para o cálculo da Ingestão Diária Aceitável (IDA), para o nível de risco mínimo (MRL - Minimal Risk Level) e para os valores-limite de exposição, como o TLV (Threshold Limit Values), PEL (Permissible Exposure Level), MOE (Margin of Exposure) e AOEL (Acceptable Operator Exposure Levels). Figura 2 - Curva estatística de dose-resposta, mostrando as diferenças entre NOAEL e LOAEL. Fonte: Kim (2011). 64WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.3 Avaliação da Exposição Essa avaliação consiste na determinação da intensidade, frequência e duração da exposição a uma determinada substância química presente no meio ambiente ou pelo seu uso. De forma mais ampla, abrange a via de exposição e a população exposta. O contato do agente tóxico pode ocorrer pela pele, pulmões ou trato gastrintestinal. A dose que irá atingir algum tecido ou órgão alvo será proporcional à quantidade de agente químico que atravessou as barreiras biológicas e que foi absorvida (dose interna). A substância química com potencial tóxico pode estar presente na água, no solo, no ar, nos alimentos, medicamentos, cosméticos ou outros produtos de uso doméstico ou industrial. A avaliação da exposição leva em consideração também a característica da população exposta. Alguns grupos são mais vulneráveis aos efeitos tóxicos, como crianças, idosos, gestantes ou portadores de doenças crônicas. A exposição pode ser quantificada de três formas: a partir da medição direta do contato do agente químico com as barreiras biológicas, pela medição da concentração da substância química no meio ambiente e do tempo de exposição e pela estimativa da dose potencial determinada por biomarcadores (tecidos, secreções, ar expirado ou metabólitos) ou dose interna. Todas as formas de quantificação são independentes e possuem suas limitações. O uso concomitante aumenta a confiabilidade dos dados. Questionários e modelos matemáticos são dados qualitativos que também complementam a avaliação de exposição. Figura 3 - Processo de avaliação da exposição. Fonte: Adaptadode Oga, Camargo e Batistuzzo (2008). 65WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.4 Gerenciamento do Risco O gerenciamento constitui a etapa final da avaliação do risco e compreende a previsão da frequência e da gravidade dos efeitos tóxicos numa determinada população exposta. A gestão do risco engloba os dados obtidos com os estudos de identificação do perigo, caracterização do perigo e da avaliação da exposição. Assim, formam-se indicadores sobre o risco de exposição a uma substância química sob condições específicas. O risco elevado está relacionado à probabilidade maior de ocorrência de efeitos adversos. De acordo com a intensidade dos efeitos adversos e a possibilidade de ocorrência, é possível determinar se o risco avaliado é negligenciável, tolerável ou intolerável. A avaliação do risco é de cunho científico, contudo, sua interpretação está relacionada à percepção pessoal. Há vários aspectos que envolvem o gerenciamento do risco. Dentre eles, estão as considerações legais e políticas, fatores sociais, disponibilidade tecnológica e condições econômicas. A definição de risco a partir dos estudos científicos serve como base para as decisões políticas e governamentais quanto à regulamentação e comunicação do risco, em especial durante o desenvolvimento de produtos químicos e processo de registro para a comercialização dos mesmos. Portanto, o gerenciamento do risco implica a utilização de medidas de controle adequadas e o estabelecimento de níveis de riscos aceitáveis. 2. TOXICOLOGIA AMBIENTAL A toxicologia ambiental estuda as interações tóxicas de substâncias químicas no ecossistema e sua capacidade de afetar a fisiologia normal de organismos vivos. O risco potencial em toxicologia ambiental é baseado na probabilidade de substâncias químicas provocarem danos, doenças e/ou morte nos seres vivos quando se encontram em concentrações superiores àquelas que o organismo é capaz de metabolizar e eliminar. 2.1 Ecotoxicologia A ecotoxicologia é uma área da toxicologia ambiental que estuda os efeitos nocivos provocados por contaminantes ao meio ambiente. Possui como objetivo geral estimar a ocorrência e os efeitos da exposição nos vários níveis da organização biológica. Neste tópico, vamos destacar apenas um dos aspectos desse estudo, que é a monitorização biológica, a qual se baseia na avaliação do impacto dos agentes químicos do ambiente nos organismos vivos expostos a eles. Os efeitos tóxicos nas espécies expostas são a deficiência enzimática e anomalias genéticas. Um exemplo é a morte de abelhas produtoras de mel, causada pelo uso excessivo de praguicidas. Os líquens são outro exemplo de monitoração ambiental da poluição por dióxido de enxofre. Sua distribuição no ambiente reflete a poluição por esse gás. Dentre diversos fatores que devem ser considerados para se avaliar o risco ambiental, destaca-se o potencial de bioacumulação. Substâncias de caráter lipossolúvel tendem a se acumular e persistir no ambiente, sendo um problema que pode atingir diversas espécies ao longo da cadeia alimentar, inclusive o ser humano. Como exemplo, temos o metilmercúrio e compostos organofosforados, os quais atingem populações humanas por meio do consumo de peixes contaminados. Para que o estudo de ecotoxicologia possa ser realizado, é necessário elaborar uma estimativa do agente tóxico presente no ambiente. 66WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Em seguida, estabelecer os possíveis danos que esses agentes possam causar ao organismo (dose- efeito) sob determinadas condições de exposição. A combinação desses dados fornece a margem de segurança e somente quando ela é grande é que se justifica o uso e descarte dos agentes químicos no ambiente. Portanto, os testes toxicológicos são realizados para a avaliação de risco da substância química presente no ambiente para o homem e outras espécies de animais, desde que sejam definidos os seguintes parâmetros: característica química da substância, condição de exposição e a espécie que foi exposta. 2.2 Poluição do Ar A poluição atmosférica é uma realidade decorrente do estilo de vida atual, sendo que, geralmente, a baixa qualidade do ar está presente nas grandes áreas urbanas. Nessas áreas, a população está exposta a complexas misturas fotoquimicamente transformadas de emissões industriais. A poluição do ar pode ser diferenciada de acordo com a característica química de seus componentes. A atmosfera do tipo redutora está relacionada aos processos de combustão incompleta do carvão, formando uma névoa ácida, a qual reage com diferentes superfícies, corroendo metal e alvenaria. Por outro lado, os produtos de reação atmosférica da exaustão de automóveis formam compostos oxidantes. As grandes áreas metropolitanas apresentam atmosferas com ambos os tipos de poluentes, redutores e oxidantes. Crianças e trabalhadores externos estão mais suscetíveis à poluição do ar, porque passam mais tempo em ambientes externos durante o período diurno, o qual apresenta níveis mais elevados de poluentes. Entretanto, os ambientes internos podem apresentar ar mais complexo que o ambiente externo devido à reduzida troca de ar, à possibilidade de o ar externo poluído adentrar no interior do ambiente fechado e à probabilidade de haver uma fonte interna independente de contaminação. Os efeitos tóxicos causados pelos poluentes presentes no ar são difíceis de serem definidos, pois as condições de exposição e as respostas individuais são muito variadas. Podem ocorrer episódios de intoxicação aguda em casos acidentais ou em situações desfavoráveis à dispersão dos poluentes, como a inversão térmica. Mas, geralmente, os efeitos observados são decorrentes da exposição a longo prazo. Os principais tipos de efeitos tóxicos apresentados pela população exposta são: ◦ Exposição aguda: lacrimejamento, insuficiência respiratória e fadiga. ◦ Exposição crônica: alteração da acuidade visual, asma, bronquite, enfisema pulmonar, câncer pulmonar e complicações cardiovasculares. 67WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Além dos grupos citados anteriormente, a população de idosos e os portadores de deficiência respiratória ou cardíaca apresentam maior suscetibilidade à ação dos poluentes no organismo. Figura 4 - Fatores internos e externos que contribuem para a exposição do poluente presente na atmosfera. Fonte: Klaassen e Watkins (2012). 2.2.1 Avaliação da poluição do ar A monitorização ambiental é utilizada como procedimento de controle da qualidade do ar. Por meio dela, é possível estipular a concentração de um determinado poluente e mensurar o grau de exposição na população. No intuito de prevenir a intoxicação provocada pelos poluentes, são propostos padrões de qualidade que estabelecem limites de concentração desses agentes no ar. Existem múltiplos fatores que dificultam a implantação desses padrões de qualidade, tais como: suscetibilidade individual, heterogeneidade da população exposta, dificuldade na reprodução das condições ambientais nos ensaios biológicos e a limitação da avaliação de toxicidade para múltiplos agentes químicos. A monitorização ambiental é restrita a um número de poluentes, os quais são considerados como indicadores da qualidade do ar: dióxido de enxofre (SO2), material particulado em suspensão (MPS), monóxido de carbono (CO), hidrocarbonetos (HC), óxidos de nitrogênio (NO e NO2) e ozônio (O3). Os objetivos da monitorização ambiental são: avaliar a qualidade do ar em relação aos limites legais; propor ações adequadas (inclusive emergência); acompanhar as alterações e as tendências da qualidade do ar em função do tempo. O uso de bioindicadores é empregado para detecção dos efeitos dos poluentes atmosféricos sobre os organismos vivos, os quais podem ser utilizados como biomonitores. Dessa forma, o biomonitoramento utiliza organismos e materiais biológicos para obter informações qualitativasou quantitativas sobre a biosfera. Líquens, musgos e folhas de vegetais superiores são exemplos de biomonitores empregados na detecção e avaliação de poluentes atmosféricos. Os efeitos observados nesses organismos servem como base para estimar a concentração ambiental do poluente. O biomonitoramento também é aplicado nos seres humanos com o objetivo de promover proteção em caso de exposição a substâncias químicas presentes no ar, sendo necessária a estipulação de bioindicadores ou biomarcadores. Sua avaliação consiste no acompanhamento de padrões bioquímicos e biológicos, podendo ser dividida da seguinte forma: 68WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Monitoramento de dose interna: determinação do próprio poluente ou dos seus produtos de biotransformação em amostras biológicas. - Monitoramento de efeito bioquímico: quantificação dos produtos de reação de agentes químicos com biomoléculas, como DNA ou proteínas. - Monitoramento de efeito biológico: avaliação dos efeitos biológicos causados por poluentes (alteração da atividade enzimática, por exemplo). 2.2.2 Poluentes do ar - Dióxido de enxofre (SO2) O dióxido de enxofre é um gás que apresenta solubilidade em água e é predominantemente absorvido pelas vias aéreas, podendo provocar efeitos irritantes, como broncoconstrição e secreção de muco em diversas espécies, inclusive no homem. Uma vez depositado, o SO2 é dissolvido nos fluidos das vias aéreas e no pulmão sob a forma de sulfito ou bissulfito, o qual é rapidamente distribuído pelo corpo. A broncoconstrição é provocada pela interação do sulfito ou bissulfito com os receptores presentes nas vias aéreas. Nos ensaios com animais, foi demonstrado que, além da broncoconstrição, o SO2 é capaz também de comprometer os mecanismos imunológicos para combater bactérias e, assim, reduzir a capacidade do corpo de combater infecções. - Ácido sulfúrico e sulfatos relacionados O SO2 é convertido em sulfato no ambiente, e o ácido sulfúrico é formado a partir de reações fotoquímicas que ocorrem na troposfera. Durante o processo de combustão do óleo e do carvão, o ácido sulfúrico reage com os íons metálicos e o vapor d’água presentes no ar, formando microcinzas voláteis sulfatadas. Esses sulfatos contribuem para a formação da chuva ácida. O ácido sulfúrico apresenta efeito irritativo no sistema respiratório. Isso ocorre devido ao seu potencial de protonar substâncias que se ligam aos receptores dos tecidos das vias aéreas, acarretando danos à membrana e respostas inflamatórias. Uma das consequências da exposição crônica ao ácido sulfúrico é o desenvolvimento de bronquite. Esse ácido também diminui a depuração mucociliar ao alterar a capacidade de remoção de partículas pelo pulmão e, dessa forma, interferir no mecanismo de defesa desse órgão. 69WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 5 - Esquema simplificado da formação e consequências da chuva ácida. Fonte: Química e Meio Ambiente (2020). - Material particulado O material particulado é composto por uma mistura de componentes orgânicos, inorgânicos e biológicos, e sua composição química depende das fontes poluidoras locais. Os metais podem ser encontrados no material particulado ambiental, o qual possui potencial oxidante. Os mais comumente encontrados são aqueles provenientes da combustão de petróleo e carvão (metais pesados e de transição), os derivados da crosta terrestre em forma de poeira (ferro, sódio e magnésio) e os liberados por motores desgastados. A toxicidade dos metais é influenciada pela sua solubilidade: quanto maior a solubilidade, maior é a sua biodisponibilidade. Entretanto, a insolubilidade também interfere no grau de toxicidade uma vez que aumenta o tempo de retenção dentro dos pulmões. O material particulado também pode apresentar substâncias gasosas, as quais interagem com as partículas presentes na atmosfera, acarretando o aumento da intensidade dos efeitos tóxicos. Essa combinação aumenta a distribuição de xenobióticos no organismo ou resulta na formação de um produto mais tóxico. Os poluentes gasosos também podem afetar a depuração mucociliar, a interação celular com as partículas depositadas nos pulmões ou seu metabolismo. A matéria orgânica constitui boa parte do material particulado. O diesel, por exemplo, é composto por partículas de carbono ultrafinas, associadas a vários compostos contendo nitrogênio e enxofre na sua estrutura, além de aldeído e derivados. A mistura de escape do diesel é altamente inflamatória e citotóxica para as células das vias aéreas. - Monóxido de carbono (CO) O monóxido de carbono é um gás inodoro e incolor, formado pela combustão incompleta da matéria orgânica. É o poluente lançado em maior quantidade na atmosfera, sendo que grande parte provém da combustão dos automóveis. O CO é considerado um asfixiante químico, porque ele possui afinidade com o ferro da hemoglobina, formando a carboxi-hemoglobina, comprometendo o transporte de oxigênio pelo organismo. 70WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Outros poluentes: ozônio, compostos de nitrogênio (NOx), hidrocarbonetos, aldeídos e nitratos de peroxiacetila (PAN) A poluição fotoquímica é derivada de uma série de reações na troposfera, ativadas pelos raios ultravioletas (UV) da luz solar. Ela é composta por uma mistura de ozônio (O3), óxidos de nitrogênio (NOx), aldeídos, nitratos de peroxiacetila (PAN) e hidrocarbonetos. Dos poluentes gasosos, o O3 é o mais reativo e, portanto, mais tóxico. O O3 possui baixa solubilidade em água e tende a se acumular no pulmão: quanto maiores o volume e o fluxo de inalação, maior é a sua penetração. Ele produz lesões nas células epiteliais do trato respiratório por ser fortemente oxidante e provocar peroxidação lipídica nas membranas celulares. O acúmulo desse gás na troposfera é uma ameaça ao trato respiratório; contudo, na estratosfera ele exerce um papel importante e essencial à proteção contra a incidência da radiação UV. Os hidrocarbonetos influenciam as reações fotoquímicas que conduzem à formação de smog (fumaça + neblina) ou neblina oxidante. Próximo à superfície, o dióxido de nitrogênio (NO2), derivado dos processos de combustão, absorve a luz UV, clivando um átomo livre de oxigênio e, dessa forma, iniciando uma cascata de reações com a formação de O3. Essas reações são favorecidas quando a intensidade do sol é maior, ao meio-dia, em que há a utilização do NO2 proveniente do tráfego de veículos. Os aldeídos e seus derivados (formaldeído e acroleína) são os principais subprodutos dessas reações. O formaldeído e a acroleína contribuem para o odor e irritação dos olhos, provocados pelo smog fotoquímico. O nitrato de peroxiacetila presente nas atmosferas urbanas também é derivado da reação com NO2, em que os radicais peroxiacetila interagem com dióxido de nitrogênio. O PAN é mais solúvel que o O3, sendo altamente reativo nas membranas mucosas. Esse composto é o principal responsável pela ardência nos olhos provocada pelo smog. Figura 6 - Poluentes da atmosfera. Fonte: Planeta Biologia (2020). 2.3 Contaminantes da Água e do Solo A disponibilidade de uma substância em um compartimento ambiental depende da sua concentração e natureza química, assim como das características do ambiente: pH, potencial de oxirredução, composição (presença de constituintes orgânicos ou inorgânicos) e a população de micro-organismos. A adsorção de poluentes aos constituintes da água ou do solo favorece a persistência deles nessas matrizes. A adsorção pode ser entendida como a adesão das moléculas de uma substância química a uma superfície. A bioacumulação pode ser entendida como a absorção dos agentes químicos pelos micro-organismos, plantas ou animais presentes nos arredores no ambiente (água, ar, sedimento, solo e dieta). A extensão da bioacumulação depende tanto da característica físico-química da substância como dasdiferenças nas velocidades de absorção e excreção entre plantas e animais. 71WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 2.3.1 Fontes de exposição A liberação de agentes tóxicos para o meio ambiente pode ser não intencional (como nos casos em que ocorrem acidentes ou derramamentos) ou deliberada (como na aplicação de venenos agrícolas e no descarte de resíduos industriais sem tratamento). Processos naturais, como a degradação de rochas, atividades vulcânicas e incêndios florestais (não causados pelo homem), também favorecem a liberação de contaminantes para o meio. Atividades como mineração e fundição liberam metais para o ambiente. O lançamento de esgoto nas águas é a maior fonte de contaminação desse meio. Esse sistema pode conter tanto lixo doméstico quanto solventes, praguicidas e medicamentos. A contaminação do solo ocorre a partir da deposição de materiais transportados por via aérea ou do alagamento de áreas por rios ou mar poluídos. Contaminantes presentes na atmosfera podem se depositar no solo ou na água a partir de sua condensação. 2.3.2 Transporte e distribuição de contaminantes A movimentação dos contaminantes na água, solo, ar e, por interface, entre os diferentes compartimentos está condicionada às propriedades químicas do agente tóxico e do meio ambiente. Em relação ao contaminante, podemos considerar os seguintes fatores: ◦ Polaridade e hidrossolubilidade: quanto mais polar e mais hidrossolúvel uma substância, maior a sua capacidade de ser distribuída na água já que dificilmente sofre volatilização. ◦ Coeficiente de partição: quanto maior o coeficiente de partição ou lipossolubilidade, maior é a adsorção da substância química aos constituintes do solo, menor a sua disponibilidade e, consequentemente, menor sua bioconcentração nos organismos vivos. ◦ Pressão de vapor: quanto maior a pressão de vapor, maior é a tendência da substância a se volatilizar e permanecer na atmosfera. O aumento da temperatura favorece a volatilização. Esse processo auxilia na remoção do contaminante do meio aquoso. ◦ Tamanho da partícula/molécula. ◦ Estabilidade da molécula: o tempo de permanência de uma substância química no meio e a distância que percorre a partir do ponto de emissão dependem da estabilidade. A estabilidade da substância está associada à sua estrutura química e a fatores ambientais, como: temperatura, nível de radiação solar, pH e concentração da matéria orgânica. Esses fatores determinam a velocidade de degradação da substância no ambiente. Moléculas resistentes à degradação apresentam meia-vida longa nos seres vivos, solo, sedimentos e água, acarretando maior impacto ambiental. O processo de degradação acarreta tanto a atenuação dos efeitos como pode acentuá-los devido à possibilidade de resultar na formação de produtos mais tóxicos que o precursor. Os contaminantes presentes no meio aquoso podem se encontrar em solução ou em suspensão. O material em suspensão pode estar na forma de partícula ou de gotículas, e os contaminantes apresentam-se dissolvidos ou adsorvidos a essas gotículas e partículas sólidas. Compostos mais estáveis e em solução tendem a percorrer maiores distâncias, dependendo do fluxo do rio ou da corrente marítima. O destino das substâncias depende também da sua lipossolubilidade e da pressão de vapor. Substâncias mais lipofílicas tendem a se associar ao material particulado (especialmente sedimento) enquanto que as substâncias de caráter hidrofílico são solúveis no meio aquoso, favorecendo sua distribuição. 72WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A pressão de vapor pode ser entendida como a tendência de uma substância a se volatilizar: quanto maior é o processo de volatilização, maior é a sua remoção do meio aquoso. O grau de contaminação por metais no meio aquoso depende de propriedades físico-químicas, como pH, salinidade do meio, estado de oxirredução, atividade microbiológica, distribuição de matéria orgânica, correntes de água, temperatura e localização. O solo é uma matriz complexa composta por partículas de diferentes tamanhos, matéria orgânica e poros, contendo água, fluidos, ar, gases e seres vivos. O transporte de contaminantes pelo solo depende da sua difusão no meio. A difusão é realizada por meio da movimentação de fluidos ou água nos espaços entre as partículas. Esse processo é influenciado por uma série de fatores, como a constituição do solo, seu peso molecular, temperatura e pH. O gradiente de concentração do contaminante, assim como a lipossolubilidade e a pressão de vapor, também interferem no seu transporte. Os metais, de forma geral, são encontrados nas camadas mais superficiais do solo, sendo que o pH e o potencial redox do meio determinam se o metal será adsorvido, precipitado, complexado ou se sofrerá uma reação de oxirredução. Metais como cádmio, chumbo e zinco apresentam aumento da solubilidade quando ocorre diminuição do pH (acidificação do meio). Os poluentes orgânicos apresentam alta lipossolubilidade e estabilidade e, por isso, são persistentes no meio ambiente. Esses compostos adsorvem-se fortemente nas partículas do solo: quanto maior a concentração de matéria orgânica do meio, maior a adsorção e menor a lixiviação. Portanto, dependendo das características físico-químicas do solo e do contaminante, é possível prever se ele irá passar pelo processo de volatilização, difusão, diluição, adsorção, biodegradação ou estabilização química. Figura 7 - Processos que afetam a disponibilidade de contaminantes no meio, como a degradação, adsorção e volatilização. Fonte: Caldas (1999). 73WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 2.3.3 Processos de degradação O processo de degradação de um contaminante é caracterizado pela alteração química da substância presente no meio ambiente. No caso de compostos orgânicos, ocorre a decomposição com a formação de moléculas menores, dióxido de carbono, sais e água. Para compostos inorgânicos e metais, sucede-se uma transformação química, que resulta em espécies que podem ser mais ou menos reativas. A velocidade de degradação está associada à característica estrutural da substância, bem como a propriedades do meio em que está inserida: pH, presença de micro- organismos, concentração de substratos e constituição química. De forma geral, substâncias não biodegradáveis possuem potencial de causar maior toxicidade sobre a biota por persistirem por mais tempo no meio. Contudo, em alguns casos, a degradação pode resultar na formação de produtos mais tóxicos. A degradação pode ser dividida em abiótica ou biótica. A degradação abiótica abrange as transformações químicas e fotoquímicas, que geralmente resultam em novos compostos orgânicos. As transformações químicas mais relevantes são a hidrólise, fotólise e reações de oxirredução. - Degradação abiótica A degradação abiótica é caracterizada por um conjunto de transformações químicas e fotoquímicas, que geralmente resultam em novos compostos orgânicos. As transformações químicas mais relevantes são a hidrólise, fotólise e reações de oxirredução. Os contaminantes da atmosfera sofrem degradação por fotólise direta, por reações com radicais hidroxilas ou por reações com o ozônio. Já a transformação química dos poluentes da água e do solo pode ser realizada por degradação fotoquímica, hidrólise, fotodissociação de íons nitrato e adsorção com constituintes orgânicos. - Degradação biótica A degradação biótica é conhecida também por biodegradação, sendo um processo importante e fundamental para a degradação de compostos orgânicos na natureza. É a eliminação dos contaminantes, sem dissipá-los nos diferentes compartimentos ambientais. Os produtos finais desse processo são o dióxido de carbono, água e biomassa microbiana. Os processos podem ser aeróbios ou anaeróbios, sendo que os fatores que os influenciam são: - Temperatura. - pH. - Potencial redox. -Teor de água no solo. - Concentração do contaminante. - Concentração e espécie microbiana. - Composição química do solo (nutrientes, vitaminas e traços de metais). - Teor de água no solo. 74WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Qualquer transformação química é afetada pela temperatura. De modo geral, o aumento da temperatura acarreta o aumento da atividade biológica. O pH ideal para a biodegradação é próximo da neutralidade (entre 6 e 8), sendo que bactérias apresentam maior atividade em pH ligeiramente básico, e fungos, em pH ligeiramente mais ácido. O teor de oxigênio somado ao potencial redox determina a espécie de micro-organismos predominante no local. A concentração do contaminante acima dos valores-limite estimula uma resposta enzimática, e o poluente passa a ser utilizado como substrato primário da microbiota local. A biodegradação só irá ocorrer se a concentração de micro-organismos competentes estiver em número suficiente e se a espécie presente for capaz de degradar a substância. A quantidade e a qualidade dos nutrientes presentes no solo devem ser adequadas para favorecer o crescimento microbiano. Dentre os nutrientes essenciais, destacam-se o nitrogênio, fósforo, potássio, sódio, enxofre, cálcio, magnésio, ferro, manganês, zinco e cobre. O nitrogênio é o principal nutriente limitante para a biodegradação de hidrocarbonetos do petróleo. O teor de água no solo afeta a biodegradação, porque promove a dissolução de componentes residuais do poluente. Contudo, a água é essencial para o metabolismo microbiano, além de afetar a locomoção dos micro-organismos, a difusão do soluto e o suprimento do substrato. 2.3.4 Acumulação dos contaminantes pela biota A concentração das substâncias na biota está diretamente relacionada à farmacocinética do organismo. Logo, há agentes químicos que possuem tendência de acumular maior que outros. A bioconcentração é caracterizada pela maior concentração da substância no organismo se comparada aos compartimentos ambientais (água, sedimento ou solo). Para ocorrer, é necessário que a substância esteja presente no meio ambiente, seja de caráter lipossolúvel e que o organismo tenha contato seguido de absorção. O potencial de bioacumulação está relacionado à capacidade de absorção e/ou velocidade de excreção. Propriedades que influenciam a disponibilidade do contaminante no meio irão afetar a bioconcentração. Dentre elas, temos a degradação, volatilização e adsorção. Esses fatores diminuem o tempo de contato entre a substância e o organismo. Dentre as condições que afetam a absorção, temos: o tamanho do organismo e da molécula, disponibilidade e fatores ambientais. A absorção das substâncias é maior em organismos cujos tamanho e peso são menores, pois o equilíbrio é atingido mais rapidamente. O tamanho também afeta a velocidade de excreção, cujo equilíbrio é rapidamente alcançado. Quanto maior é o tamanho da molécula, menor é a sua difusão e, consequentemente, menor é a sua absorção. Substâncias que tendem a ser adsorvidas às partículas orgânicas ou complexadas com íons presentes no meio estão menos disponíveis para serem absorvidas pela biota. O processo de excreção é afetado pela polaridade e metabolismo. As substâncias mais apolares (lipossolúveis) tendem a se acumular mais pelo maior grau de afinidade com os compartimentos celulares e, portanto, sua excreção é menor. A biotransformação tem a finalidade de formar produtos hidrossolúveis para serem excretados. Qualquer alteração nesse sistema afeta diretamente o processo de excreção. 2.3.5 Principais contaminantes A principal fonte de contaminação humana é a água para consumo. A presença de determinadas substâncias químicas nesse meio ocorre devido ao processo de tratamento ou ao sistema de distribuição, o qual fora contaminado com produtos químicos, como praguicidas. Essas substâncias podem atingir a fonte de água por meio da chuva ou por infiltração do solo. Outra fonte de contaminação é a ingestão de alimentos que apresentam substâncias tóxicas para a saúde. 75WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - Trihalometanos (THM) A exposição humana aos THM não está restrita à ingestão de água contaminada já que esses compostos são altamente voláteis e lipossolúveis. A utilização da água para atividades como lavagem de roupa e banho pode ser uma via importante de exposição. Os principais THM e seus efeitos adversos são: - Triclorometano (clorofórmio): causa neoplasia hepática e renal. - Bromofórmio: indução de neoplasias. - Dibromoclorometano: provoca tumores. - Bromodiclorometano: câncer de bexiga e de cólon. - Fluoretos O fluoreto está presente nas águas superficiais e subterrâneas e é empregado na indústria de fertilizantes. Ele é adicionado à água durante o tratamento para potabilização, na forma de ácido fluorsilícico, hexafluorosilicato de sódio e fluoreto de sódio. O efeito tóxico mais importante do fluoreto contra a saúde humana é a fluorose óssea. - Nitrato e nitrito Os íons nitrato e nitrito são íons de ocorrência natural, que fazem parte do ciclo do nitrogênio. O nitrato é usado principalmente em fertilizantes inorgânicos, e o nitrito de sódio é usado na preservação de alimentos, especialmente nas carnes curadas. O principal efeito adverso resultante da exposição do nitrato e nitrito é a interação com a hemoglobina, levando à formação de metemoglobina, a qual é incapaz de transportar oxigênio para os tecidos. 3. TOXICOLOGIA OCUPACIONAL É a área da toxicologia que identifica e quantifica as substâncias tóxicas presentes no ambiente de trabalho e os riscos que elas oferecem. Nesse contexto, são consideradas as propriedades físico-químicas dos agentes tóxicos, a interação entre a substância química e o organismo, as vias de introdução, a ocorrência da intoxicação e os limites de tolerância. As alterações do estado de saúde relacionadas ao ambiente de trabalho podem ser prevenidas por medidas que incluam a substituição da substância responsável pelo efeito tóxico. Dependendo do local e do tipo de trabalho, nem sempre é possível remover o agente responsável pelo desenvolvimento da doença; contudo, é viável reduzir a exposição. A exposição pode ser avaliada pelo monitoramento ambiental e biológico, o qual atua no controle dos fatores de risco existentes quando são conhecidos os valores-limite e níveis de ação. Dessa forma, o monitoramento da exposição ocupacional não é uma atividade isolada, mas que envolve diversos fatores presentes no ambiente e aspectos biológicos (dose interna e efeitos). 76WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.1 Monitoramento Ambiental O monitoramento ambiental é caracterizado pela determinação dos agentes químicos presentes na atmosfera do ambiente de trabalho, que possuem potencial de causar danos à saúde, comparando-se os resultados obtidos com referências existentes. Dentro desse tipo de avaliação, temos a higiene ocupacional, que é definida como a ciência dedicada ao reconhecimento, avaliação e controle dos riscos ocupacionais. Os agentes químicos representam a maioria dos riscos existentes na atualidade, mas, além deles, há também os agentes físicos (ruídos, calor e radiação), mecânicos (esforço físico) e biológicos (micro-organismos). Figura 8 - Agentes avaliados no monitoramento ambiental. Fonte: Sampaio (2016). A higiene ocupacional lida com os agentes tanto de forma isolada quanto combinada. Como exemplo, temos a exposição simultânea a solventes e ao ruído. A avaliação consiste na amostragem de trabalhadores segundo critérios estatísticos durante um determinado tempo para estimar a exposição. O monitoramento ambiental baseado na amostragem não assegura que todos os trabalhadores estão nas mesmas condições de exposição. Portanto, os dados obtidos devem ser complementados com o monitoramento biológico e com o emprego da vigilância da saúde em todos os trabalhadorespara promover a proteção à saúde. A origem da doença provocada por um agente químico se dá devido ao contato do trabalhador com o agente no ambiente onde exerce sua atividade. O contato pode ou não produzir efeitos sobre a superfície do organismo (pele e mucosas), seguido de absorção e chegada do toxicante ao seu sítio de ação, com produção de efeitos sistêmicos, que podem ser de curto, médio ou longo prazos. A avaliação do monitoramento ambiental considera os seguintes parâmetros: - Atividade exercida pelo trabalhador. - Local. - Quantidade de trabalhadores expostos. - Fluxo dos trabalhadores e materiais. - Ventilação. 77WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA De acordo com esses parâmetros estabelecidos, é possível determinar o método estatístico e o tipo de amostragem. A análise estatística dos parâmetros permite a comparação dos dados ao longo do tempo e sua reprodução enquanto existir a empresa. Os limites de exposição ocupacional são os limites de tolerância estabelecidos na legislação, a qual fornece uma tabela de valores. O nosso País se baseia nas referências estrangeiras, os Threshold Limit Values (TLVs), que determinam a concentração de substância química dispersa no ar e as condições estabelecidas para que os trabalhadores possam estar expostos sem efeitos adversos. A referência leva em conta apenas os trabalhadores que estão aptos a exercerem a atividade, excluindo os suscetíveis ou sensíveis, idosos, crianças, grávidas e doentes. Dependendo do potencial de intoxicação inerente ao agente químico e do tipo de efeito que ele possa causar, as TLVs podem ser divididas em: - TLV-TWA (Time Weighted Average - média ponderada pelo tempo): aplicada para substâncias que produzem efeitos adversos a médio e longo prazos de exposição. A maioria das substâncias se encaixa nesse perfil. A exposição pode ser um pouco acima do TLV estabelecido desde que seja por um curto período de tempo. Na média, o limite deve ser obedecido. - TLV-STEL (Short Term Exposure Limit - limite de exposição de curto período): relacionada a substâncias que provocam efeitos adversos a curto período de tempo de exposição. Refere-se à concentração do agente químico a que os trabalhadores podem estar expostos por um curto período de tempo, sem efeitos adversos à saúde. Os valores de TLV-STEL são um complemento aos de TLV-TWA. - TLV-C (Ceiling - teto): todas as substâncias químicas que possuem elevada toxicidade ou potencial para produzir efeitos adversos em curto período de tempo possuem um teto, o qual não pode ser ultrapassado, sob hipótese alguma, durante a jornada de trabalho. Os limites de exposição ocupacional são estabelecidos individualmente e não consideram a soma de efeitos produzidos no organismo para duas ou mais substâncias. Entretanto, no local de trabalho, é comum a presença de duas ou mais substâncias, as quais podem apresentar efeitos tóxicos adicionais à saúde do trabalhador. Em termos práticos, a simples comparação dos limites de exposição de cada substância apenas não é o ideal. Contudo, a exposição geral a todos os agentes pode ser estimada por meio da somatória dos índices de exposição de cada substância. Os estudos de monitoramento aliados à epidemiologia e estatística não podem ser generalizados, porque esse conhecimento varia de acordo com as condições de vida do trabalhador. Dados obtidos da análise de um trabalhador braçal exercendo atividades mais agressivas à saúde não podem ser comparados com um trabalhador com alta qualificação, o qual desempenha sua atividade em um local de trabalho com sofisticada infraestrutura e cujos salário e nível socioeconômico são elevados. Para o primeiro grupo, a alimentação, segurança pública e saneamento básico são prioritários enquanto que, para o segundo caso, a higiene ocupacional e segurança do trabalho são fundamentais. 78WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.2 Monitoramento Biológico O monitoramento biológico baseia-se na determinação dos toxicantes presentes no ambiente de trabalho ou de seus metabólitos nos tecidos, secreções e ar expirado dos indivíduos expostos. O objetivo é identificar alterações biológicas precoces do estado de saúde do trabalhador já na fase pré-clínica. Consequentemente, oferece uma estimativa mais direta dos riscos e efeitos nocivos à saúde em comparação com o monitoramento ambiental. Os dados obtidos são comparados com referências pré-estabelecidas e servem para estimar a exposição e avaliação do risco. Os parâmetros estudados são definidos como indicadores biológicos, bioindicadores ou biomarcadores. A variável que expressa o indicador pode ser desde uma alteração molecular ou uma doença clinicamente evidente até à morte. Há três tipos de indicadores: dose interna, efeito e suscetibilidade. Figura 9 - Aspectos envolvidos no monitoramento biológico. Fonte: Sampaio (2016). 3.2.1 Indicadores de dose interna Os indicadores de dose expressam a exposição a uma substância química e seu acúmulo no organismo, ou seja, sua dose interna. Logo, refletem a quantidade de xenobiótico absorvida pelo organismo. Uma limitação desse tipo de indicador é a realização de análises em materiais biológicos, como líquido cefalorraquidiano, órgãos e determinados tecidos, os quais reproduzem melhor esse parâmetro em relação à intensidade dos efeitos biológicos observados nos indivíduos. O indicador de dose interna pode representar a concentração da substância química presente no ambiente de trabalho. Um exemplo: a determinação de ácido hipúrico na urina está relacionada à concentração de tolueno existente no meio. Entretanto, muitos bioindicadores não são seletivos e não representam apenas a exposição do agente químico no ambiente. Alguns bioindicadores de dose interna são adutos (compostos formados a partir da ligação covalente de compostos carcinogênicos ao DNA), os quais são específicos para cada substância química. Compostos genotóxicos podem ser monitorados a partir da formação de adutos e indicar, entre outros fatores, o tempo de exposição. Por exemplo: o aduto com a hemoglobina representa a dose interna acumulativa por exposição repetida já que o eritrócito apresenta meia-vida longa. Em contrapartida, o aduto formado com a albumina expressa menor período de exposição (em torno de 20 dias). 79WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A vantagem do aduto formado com a albumina em comparação com o DNA é que metabólitos ativos interagem com a proteína ao serem liberados na corrente sanguínea, sem permear membranas celulares ou serem biotransformados. Há diferentes tipos de indicadores de dose interna, que podem ser exemplificados da seguinte forma: - Indicador de dose usual: a detecção de cádmio no sangue está correlacionada à presença desse metal no ambiente de trabalho, assim como a determinação do tricloroetanol está correlacionada ao tricloroetileno no meio. - Indicador de exposição cumulativa: expressa o acúmulo dos agentes químicos nos diferentes tecidos e órgãos. Substâncias de caráter lipofílico possuem a tendência de se acumularem nos diferentes compartimentos do organismo. Como exemplo, temos inseticidas organofosforados que se acumulam no tecido adiposo e o chumbo, que se acumula nos ossos. Entretanto, esses indicadores não são usuais em razão da dificuldade de obtenção de amostras, como tecido adiposo e ósseo. - Indicador de dose interna real: avalia a concentração de substância química metabolicamente ativa. Como exemplo, citemos a determinação de chumbo na forma livre no plasma (não ligado aos eritrócitos), o qual está prestes a alcançar o seu sítio alvo para exercer seu efeito tóxico. O chumbo na sua forma livre está em equilíbrio com a quantidade do metal que foi absorvida, eliminada e acumulada. Além da plumbemia (dosagem de chumbo no sangue), é possível dosar esse metal na urina (plumbúria) por meio da administraçãode quelantes como versenato de cálcio, o qual irá se ligar ao metal, e o complexo formado será eliminado na urina. Consequentemente, essas formas de análise auxiliam a determinação da dose real. 3.2.2 Indicadores de efeito A avaliação dos efeitos é efetuada a partir da determinação de alterações biológicas precoces e reversíveis no tecido ou órgão alvo. Ou seja, são alterações não nocivas e que ainda não acarretam disfunções celulares. Os dados servem para avaliar o risco de exposição do indivíduo no seu ambiente de trabalho e, para que sejam utilizados, é necessário conhecer os mecanismos de ação que conduzem à toxicidade da substância química. - Indicadores de efeito crítico: outra forma de determinar a concentração de chumbo no organismo é a partir de parâmetros de efeito desse metal na cadeia de formação da hemoglobina. Seu mecanismo de ação consiste na inibição da atividade da enzima delta-aminolevulínico desidratase (ALA-D). A partir desse conceito, a determinação do ácido deltaminolevulínico (sangue ou urina) e da protoporfirina eritrocitária no sangue são indicadores de efeito crítico. - Indicadores de efeito pré-clínico: indicadores como a β2-microglobulina e a proteína de ligação ao retinol são proteínas de baixo peso molecular, que mostram alterações renais resultantes da exposição ao cádmio. 80WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 3.2.3 Indicadores de suscetibilidade O indicador de suscetibilidade revela uma condição adquirida ou congênita, demonstrando a capacidade limitada do organismo de enfrentar uma exposição a um agente tóxico específico. São indicadores que revelam alterações nos processos de absorção e distribuição, interações com macromoléculas e a capacidade de produzir modificações no organismo. Por exemplo: indivíduos que apresentam menor concentração da enzima glicose 6-fosfato desidrogenase (G6PD) são mais vulneráveis à lesão oxidativa nas hemácias. Esse grupo é mais suscetível a desenvolver anemia hemolítica mediante exposição a agentes oxidantes, como compostos nitroaromáticos. A enzima glutationa s-transferase (GST) desempenha um papel importante na metabolização de xenobióticos, os quais apresentam metabólitos potencialmente tóxicos. Essa enzima promove a associação da glutationa com metabólitos reativos, diminuindo sua toxicidade ou inativando-os. A diminuição da concentração dessa enzima no organismo compromete a resposta ao estresse oxidativo causado por agentes tóxicos, como óxido de etileno e compostos alifáticos halogenados. Dessa forma, populações com menor concentração de GST apresentam maior probabilidade de desenvolver câncer em diferentes órgãos. Portanto, a glicose 6-fosfato desidrogenase e a glutationa s-transferase são consideradas indicadores que apontam a suscetibilidade individual que cada organismo apresenta diante da exposição a substâncias químicas. A doença de Crohn é uma síndrome que afeta o trato gastrintestinal. Os sintomas manifestados incluem dor abdominal associada à diarreia, febre, perda de peso e enfraquecimento por causa da dificuldade para absorver os nutrientes. A doença está relacionada a um desbalanço no sistema imune e tem origem genética e ambiental. Pesquisadores da Unicamp e do Hospital de Clínicas de Barcelona analisaram os tecidos de pacientes e realizaram o sequenciamento do RNA. Durante o estudo, foram localizados pelo menos 17 genes diferencialmente expressos em relação ao tecido de pessoas sem doenças intestinais inflamatórias. Foi observada principalmente uma super expressão de genes ligados à atividade de plasmócitos, que são células de defesa, produtoras de anticorpos. A expressão desses genes pode servir para identificar bioindicadores que auxiliem na prevenção da evolução clínica da doença e no desenvolvimento de tratamentos mais precisos de acordo com o perfil do paciente. Para mais informações sobre a avaliação qualitativa de riscos químicos e seus princípios básicos para o controle das substâncias nocivas à saúde do homem no seu ambiente de trabalho, leia o seguinte artigo: KATO, M.; GARCIA, E. G.; WUNSCH FILHO, V. Exposição a agentes químicos e a saúde do trabalhador. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, São Paulo, v. 32, n. 116, 2007. 81WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A intoxicação ocorre pela exposição ao veneno por intermédio da água, solo e ar contaminados. O documentário Brincando na chuva de veneno narra o acidente em uma escola municipal da cidade de Rio Verde, no Estado de Goiás. Para pulverizar uma plantação de soja e milho, uma aeronave sobrevoou a escola rural e atingiu com veneno estudantes, professores e funcionários da instituição, que, no momento, encontravam-se na área externa do prédio, no horário do intervalo das atividades. Os sintomas da intoxicação pelo contato direto com o agrotóxico incluíam dores de cabeça, náusea, vômitos, irritação cutânea, tontura, formigamento dos membros, falta de ar e desmaios. O filme serve para você refletir sobre o papel da toxicologia ambiental nos casos de intoxicação, provocados por contaminação ambiental e como seu estudo pode influenciar no gerenciamento do uso de produtos químicos no ambiente. O vídeo está disponível no link https://outraspalavras.net/outrasaude/brincando- na-chuva-de-veneno-o-documentario/. O processo de ascensão do setor industrial no mundo proporcionou diversos benefícios, como a geração de empregos, o desenvolvimento de tecnologias e produtos que se tornaram essenciais no cotidiano da humanidade e o crescimento socioeconômico. Contudo, com a produção em escala industrial, surgiu também um obstáculo: como descartar os resíduos gerados durante o processo de produção? Essa não era a preocupação inicial da maioria das empresas. A conscientização ambiental sobre a possibilidade de esgotamento de recursos naturais e o risco de catástrofes surgiu muito tempo depois. Diversos acidentes causados pelo descarte irregular de resíduos químicos, com consequente intoxicação da população, ficaram marcados na história. Citemos a baía de Minamata (Japão), Cidade dos Meninos (Brasil), Love Canal (Estados Unidos) e Césio 137 (Brasil). Esses acidentes servem de alerta sobre como o descarte inadequado de uma substância química no ambiente pode impactar a saúde humana. O descarte correto leva em consideração o potencial efeito tóxico do resíduo químico gerado, o qual é classificado de acordo com o seu grau de toxicidade. Seu descarte envolve processos de tratamento, acondicionamento, rotulagem e armazenamento em local separado e que não ofereça risco. 82WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 3 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CONSIDERAÇÕES FINAIS O processo de avaliação de risco é composto pelos processos de identificação e caracterização do perigo, avaliação da exposição e gerenciamento. A identificação do perigo tem como objetivo analisar o potencial da substância química de causar efeito adverso e o impacto gerado em uma determinada população ou ecossistema. A caracterização do perigo está relacionada à determinação da dose-resposta, cuja extrapolação dos dados provenientes dos experimentos com animais leva em consideração a variabilidade, o mecanismo de ação do agente tóxico e o estudo estatístico. A avaliação da exposição é de fundamental importância para a avaliação de risco já que, na ausência de exposição, até mesmo uma substância altamente tóxica não acarretará ameaça para a saúde humana ou prejuízos para o meio ambiente. O gerenciamento de risco é a soma dos estudos anteriores e é empregado internacionalmente com o propósito de prevenir danos à saúde e ao meio ambiente, que podem acontecer a partir do contato, uso ou manuseio de substâncias químicas. A toxicologia ambiental é uma área multidisciplinar, que estuda os efeitos tóxicos de contaminantes ambientais sobre os organismos vivos. O monitoramento ambiental é realizado a partir do estudode ecotoxicidade, da avaliação da poluição do ar a partir de indicadores de qualidade (poluentes mais comuns) e da análise de contaminantes presentes na água e/ou solo. Nesses compartimentos ambientais, é importante considerar as fontes de exposição, o tipo de contaminante e sua distribuição no meio, os processos de degradação e o potencial de bioacumulação. A toxicologia ocupacional identifica e quantifica as substâncias tóxicas presentes no ambiente de trabalho a partir do monitoramento ambiental e biológico. O primeiro tipo de monitoramento emprega os princípios de higiene ocupacional e avalia se os limites de exposição ocupacional estão sendo cumpridos. Já o biomonitoramento humano é realizado a partir da coleta de amostras biológicas para análises das concentrações de poluentes ou de seus produtos de biotransformação através da observação de seus efeitos específicos e não adversos. A avaliação de risco e as áreas da toxicologia ambiental e ocupacional visam a estimar o perigo e a exposição, assim como conhecer os agentes tóxicos presentes no meio ambiente e no local de trabalho para estabelecer medidas eficazes na prevenção de intoxicação e minimizar danos às populações. 8383WWW.UNINGA.BR U N I D A D E 04 SUMÁRIO DA UNIDADE INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................................................85 1. TOXICOLOGIA SOCIAL E DE MEDICAMENTOS .....................................................................................................86 1.1 DEPENDÊNCIA VERSUS ABSTINÊNCIA ...............................................................................................................86 1.2 SISTEMA DE RECOMPENSA E MECANISMOS DE ATUAÇÃO DE FÁRMACOS/DROGAS ................................88 1.3 POTENCIAL DE REFORÇO DE UM FÁRMACO ....................................................................................................89 1.4 TOLERÂNCIA ..........................................................................................................................................................89 1.5 OPIÁCEOS ..............................................................................................................................................................90 1.6 ESTIMULANTES: COCAÍNA E ANFETAMINAS .................................................................................................... 91 1.6.1 COCAÍNA .............................................................................................................................................................. 91 1.6.2 ANFETAMINAS ...................................................................................................................................................93 1.7 BARBITÚRICOS E BENZODIAZEPÍNICOS ............................................................................................................94 TOXICOLOGIA SOCIAL E DE MEDICAMENTOS E TOXICOLOGIA DE ALIMENTOS PROF.A DRA. LIANA INARA DE JESUS DOS SANTOS ENSINO A DISTÂNCIA DISCIPLINA: INTRODUÇÃO À TOXICOLOGIA E TOXICOCINÉTICA 84WWW.UNINGA.BR 1.7.1 BARBITÚRICOS .................................................................................................................................................... 95 1.7.2 BENZODIAZEPÍNICOS ........................................................................................................................................ 96 1.8 ETANOL ................................................................................................................................................................... 98 1.9 TABACO ...................................................................................................................................................................102 1.10 CANNABIS .............................................................................................................................................................104 2. TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS ...........................................................................................................................106 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................................................................................110 85WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA INTRODUÇÃO A toxicologia social estuda os efeitos nocivos decorrentes do uso não médico e não terapêutico de fármacos ou drogas. Essas substâncias produzem um efeito sobre o cérebro, que é percebido como desejável. Isso dará início a um comportamento de procura pela droga. A dependência relacionada a drogas está entre os maiores problemas de saúde que impactam profundamente a sociedade. Pesquisadores acreditam que um estudo mais aprofundado dos seus mecanismos de ação poderá conduzir ao avanço de medidas para a prevenção do uso e tratamento da dependência química. A dependência é facilmente confundida com a abstinência, mas são eventos distintos: a dependência é caracterizada pela perda de controle do consumo enquanto que a abstinência representa os sintomas expressos após interrupção abrupta do uso. O sistema de recompensa contribui para o potencial de reforço do uso de fármacos/drogas e para a manutenção do vício. A tolerância a um fármaco/droga ocorre quando essas substâncias são utilizadas repetidamente ou por um longo período de tempo, buscando-se que o aumento da dose produza o mesmo efeito inicial. Na toxicologia social e de medicamentos, as substâncias são classificadas em opiáceos e opioides (morfina, heroína e codeína), estimulantes (cocaína, anfetaminas, nicotina e cafeína), depressores do sistema nervoso central (barbitúricos, benzodiazepínicos e etanol), canabinoides (maconha), alucinógenos (LSD, psilocibina e mescalina) e inalantes (tolueno, hexano e acetato de etila). Nesta unidade, não serão abordados os alucinógenos e os inalantes, sendo apresentada a história, os efeitos, a toxicocinética, os mecanismos de ação e o potencial de reforço, dependência e tolerância das outras classes de substâncias citadas anteriormente. Os alimentos são uma mistura complexa de macro e micronutrientes essenciais à vida e de substâncias químicas adicionadas durante o seu processo de produção. A preocupação com a segurança alimentar envolve a prevenção dos potenciais riscos que um aditivo químico, resíduos de praguicidas e medicamentos possam provocar para a saúde. Efeitos nocivos nem sempre são provocados por essas substâncias, mas podem ser decorrentes da suscetibilidade individual a determinados constituintes alimentares e à presença de toxinas e micro-organismos advindos de preparo e armazenamento indevidos. As boas práticas de preparação e manipulação de alimentos são fundamentais para evitar intoxicações pela população durante o consumo. 86WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1. TOXICOLOGIA SOCIAL E DE MEDICAMENTOS A toxicologia social é o estudo dos efeitos tóxicos derivados do uso não terapêutico de fármacos e/ou drogas que causam danos não somente ao indivíduo como também à sociedade. A toxicologia de medicamentos estuda as reações adversas a doses terapêuticas dos medicamentos; entretanto, inclui também intoxicações causadas por doses excessivas pelo uso inadequado ou acidental. Reações adversas durante a utilização terapêutica de um medicamento podem ocorrer, por exemplo, pela incapacidade de o organismo biotransformar e eliminar o medicamento. A avaliação do paciente intoxicado consiste na realização de exames clínicos e laboratoriais para a identificação dos agentes tóxicos em amostras biológicas. 1.1 Dependência versus Abstinência Indivíduos escolhem começar a usar um fármaco ou uma droga pelos mais diversos motivos, sendo, portanto, uma decisão voluntária. Entretanto, há um ponto em que o usuário do medicamento/droga podese tornar dependente. Quando se ultrapassa o limite invisível da dependência, perde-se o controle e a capacidade de retornar a um consumo ocasional. Esse limite varia de acordo com a suscetibilidade individual. A dependência pode ser definida como uma anormalidade comportamental, caracterizada pela perda de controle (compulsão) sobre o consumo de um fármaco ou droga (“fissura”), independentemente de acarretar prejuízos individuais e sociais. O comportamento de dependência produz alterações em sistemas neuronais específicos, persistentes e possivelmente irreversíveis. É uma doença crônica, incurável e sujeita à recaída mesmo após anos sem contato com a substância química. Consequentemente, a dependência não é uma questão de escolha, vontade ou moralidade e, sim, uma alteração neuronal, que conduz o indivíduo ao uso compulsivo do fármaco ou droga de forma incontrolável. Nesse caso, a vontade é sempre maior que a prudência, superando até mesmo o medo de adquirir doenças infectocontagiosas ou morrer. Dentre os fatores que influenciam a dependência, temos: ◦ Genética. ◦ Personalidade. ◦ Transtornos mentais. ◦ Ambiente. Estima-se que de 40% a 60% da vulnerabilidade à dependência é atribuída a fatores genéticos. Por exemplo, filhos de alcoólatras apresentam maior probabilidade de desenvolver alcoolismo ao longa da vida, mesmo sendo adotados por pais que não apresentam o vício. É bom esclarecer que essa é apenas uma estimativa, ou seja, um risco aumentado, e não um determinismo. Alguns traços de personalidade são mais propensos à dependência, caracterizados por indivíduos que buscam novidade e sensações intensas. Esse grupo de pessoas apresenta maior disposição a correr riscos físicos, sociais, legais e, inclusive, financeiros para ter experiências novas e prazerosas. 87WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A fase mais suscetível é a adolescência, marcada pelo comportamento impulsivo e pela busca de novidade. Indivíduos que possuem transtornos mentais, como depressão, ansiedade e esquizofrenia, apresentam maior chance de se exporem a fármacos de abuso ou drogas. Nesse grupo, há uma tendência de se automedicar e usar nicotina ou etanol para atenuar os efeitos da doença e, dessa forma, desenvolver dependência. Já fatores ambientais, como a disponibilidade do fármaco/droga de abuso, a dinâmica familiar, a classe social e o estresse, influenciam no desenvolvimento da dependência. Quanto maior a disponibilidade do fármaco/droga de abuso, maior é o grau de dependência da população. Classes socioeconômicas menos favorecidas e precário suporte dos pais são condições que aumentam a propensão ao uso abusivo de substâncias químicas. O estresse agudo ou crônico provoca alterações no sistema nervoso central por meio da liberação de neurotransmissores específicos na região mesolímbica, a qual é sensível ao abuso de fármacos ou drogas. O comportamento de dependência não deve ser confundido com a abstinência uma vez que são fenômenos independentes. É possível ser dependente sem apresentar abstinência e ocorrer abstinência sem dependência. Por exemplo: é provável ser dependente de cocaína ou etanol mesmo sem ocorrerem sintomas de abstinência no intervalo entre cada episódio de uso. É o caso de dependentes que realizaram tratamento em clínicas de recuperação, já estão há bastante tempo sem usar fármacos/drogas de abuso, mas têm recaídas. Esse fato não está associado ao desconforto provocado por sintomas de abstinência, porque há muito tempo esses efeitos já acabaram. O uso médico e prolongado de medicamentos pode provocar sintomas de abstinência na interrupção do tratamento. Contudo, os pacientes não são considerados dependentes já que atravessam as reações de abstinência sem manifestarem comportamento compulsivo de consumo. Tal fenômeno ocorre tanto para medicamentos que apresentam alto potencial para causar dependência (morfina e benzodiazepínicos) como para fármacos que usualmente não causam dependência. Por exemplo: um paciente hipertenso que interrompe abruptamente seu tratamento com anti-hipertensivos pode apresentar sintomas de abstinência, como o aumento temporário da pressão arterial. Quando o fármaco é retirado, ocorre uma hiperexcitabilidade de órgãos e tecidos (efeito rebote), porque esses compartimentos biológicos estavam adaptados à presença constante do fármaco. Essa adaptação consiste numa cascata de eventos fisiológicos opostos às alterações causadas pela substância química, de forma a contrabalancear seu efeito, o que se denomina contra-adaptação. A excitabilidade observada após a retirada do fármaco é uma síndrome de abstinência, que pode variar desde sonolência, tremores e irritabilidade até convulsões. Portanto, a síndrome de abstinência pode ser definida como o conjunto de sintomas que ocorrem após a interrupção do uso de um fármaco ou droga. Essas manifestações estão associadas à resposta do organismo decorrente do fenômeno de adaptação fisiológica reversível, provocada pela exposição à substância química. As características da síndrome de abstinência dependem das mudanças adaptativas provocadas pelo fármaco ou droga. A intensidade da reação de abstinência depende do tempo de permanência do fármaco no organismo: fármacos que possuem efeitos prolongados devido à sua lenta distribuição, alta porcentagem de ligação às proteínas plasmáticas e processos de biotransformação e excreção demorados geralmente produzem sintomas de abstinência menos intensos. Isso ocorre devido ao maior tempo de permanência do fármaco no sistema biológico, o qual permite uma readaptação fisiológica do organismo enquanto a concentração da substância química está diminuindo. 88WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.2 Sistema de Recompensa e Mecanismos de Atuação de Fármacos/ Drogas As recompensas naturais (como alimento, água, sexo e maternidade) transmitem para a memória cerebral a informação de que esses são acontecimentos felizes, servindo como reforçadores naturais para que o indivíduo repita o comportamento. O sistema mesolímbico dopaminérgico é uma via do sistema nervoso central, que foi identificada como circuito de recompensa. Essa via é composta pelos neurônios dopaminérgicos na área tegmental ventral, com projeções no núcleo accumbens, na amígdala, hipocampo, córtex frontal e pallidum ventral. Dentre as estruturas citadas, as que se projetam no núcleo accumbens formam a base central do sistema de recompensa. A experiência de recompensa é acompanhada pela ativação da via mesolímbica dopaminérgica. Portanto, alimento, água, sexo, maternidade, fármacos e drogas de abuso produzem liberação de dopamina no núcleo accumbens. Devido à recompensa, os efeitos de fármacos ou drogas podem funcionar como reforçadores para um comportamento de autoadministração dessas substâncias químicas. Essas recompensas incluem a sensação de prazer, o alívio da tensão, a melhora da percepção e do humor. Os fármacos/drogas de abuso se diferem dos reforçadores naturais (alimento, água, sexo e maternidade), porque seus efeitos estimulantes sobre a liberação de dopamina no núcleo accumbens são significativamente maiores. Para se ter uma ideia da dimensão do estímulo, os alimentos aumentam em 45% os níveis de dopamina no núcleo accumbens enquanto que a cocaína e a anfetamina elevam em 500% a concentração desse neurotransmissor na mesma região. Diante desse poderoso estímulo no sistema mesolímbico dopaminérgico, ocorre o reforço do comportamento de consumir essas substâncias químicas. Os fármacos e drogas de abuso aumentam a concentração de dopamina no núcleo accumbens de forma direta ou indireta. A cocaína e a anfetamina aumentam a quantidade desse neurotransmissor de forma direta: a cocaína inibe a recaptação de dopamina, o que prolonga os efeitos desse neurotransmissor nessa via; por sua vez, a anfetamina não somente inibe a recaptação de dopamina, como também aumentasua liberação no terminal sináptico. Opiáceos, como morfina e codeína, aumentam a quantidade de dopamina no núcleo accumbens, tanto de forma direta como indireta. De forma direta, essas substâncias estimulam os receptores opioides presentes no núcleo accumbens. Já seu mecanismo indireto consiste na inibição de interneurônios GABAérgicos, o que acarreta o aumento da concentração de receptores opioides, os quais são responsáveis pela ativação de neurônios dopaminérgicos na área tegmentar ventral. A nicotina possui mecanismo de ação direto e indireto: o primeiro interage diretamente com os receptores colinérgicos nicotínicos existentes na área tegmentar ventral, com consequente liberação da dopamina; o segundo mecanismo consiste na estimulação dos receptores colinérgicos nicotínicos nas terminações glutamatérgicas, as quais inervam as células de dopamina. O etanol atua de forma indireta, interagindo com o receptor GABAA, o qual tem o potencial de inibir os terminais GABAérgicos na área tegmentar ventral e, dessa forma, ativar os neurônios dopaminérgicos na área tegmentar ventral. Outra forma de ação é a inibição das terminações glutamatérgicas, as quais inervam os neurônios no núcleo accumbens, com consequente liberação de dopamina. Canabinoides, como o tetrahidrocanabinol, ativam os receptores CB1 nas terminações GABAérgicas e glutamatérgicas, além dos próprios neurônios do núcleo accumbens, acarretando aumento de dopamina. 89WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 1 - Esquema simplificado da ação das principais drogas de abuso na via mesolímbica dopaminérgica. Fonte: Carvalho (2015). 1.3 Potencial de Reforço de um Fármaco O potencial de reforço, ou farmacodependência, é definido pela capacidade de um fármaco de provocar a autoadministração repetida, sem influência de fatores como personalidade, transtornos mentais, estresse e situação familiar e/ou socioeconômica. Os fármacos ou drogas que produzem efeitos gratificantes mais rápidos e de forma mais intensa são maiores reforçadores e, portanto, apresentam maior potencial de induzir à dependência. A cocaína, heroína, morfina e a nicotina apresentam maior potencial de reforço, seguidas pela anfetamina, etanol, solventes e barbitúricos. Os benzodiazepínicos possuem uma resposta moderada enquanto que canabinoides demoram mais tempo para produzir efeitos centrais. A via de administração também exerce influência na velocidade de reforço. A via intravenosa apresenta maior potencial de reforço, seguida da via pulmonar, intranasal e oral, sendo esta última a mais lenta de todas, porque o fármaco/droga não somente demora para alcançar a circulação, como também sofre efeito de primeira passagem (biotransformação pelas enzimas do estômago, intestino e fígado). 1.4 Tolerância O fenômeno de tolerância é caracterizado pela diminuição do efeito do fármaco/droga diante de uma mesma dose, tornando necessário o aumento da dose para alcançar o mesmo grau de efeito. A tolerância pode ser classificada em: ◦ Tolerância inata ou natural: sensibilidade, ou falta dela, determinada geneticamente a um fármaco ou droga observada no primeiro uso. ◦ Tolerância farmacodinâmica: necessidade de maiores doses de fármaco/droga no sítio de ação para alcançar a mesma intensidade e duração de efeito, estando relacionada a modificações no receptor (alteração na quantidade ou dessensibilização). 90WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ◦ Tolerância metabólica ou farmacocinética: alterações farmacocinéticas após uso crônico, consequência da indução enzimática no fígado, sendo necessária uma dose maior para manter a concentração do fármaco/droga no organismo. ◦ Sensibilização ou tolerância reversa: aumento da resposta ao efeito de um fármaco/ droga após administração repetida devido à sensibilização do sistema mesolímbico dopaminérgico. ◦ Tolerância cruzada: o indivíduo que exibe tolerância a um determinado fármaco/droga pode também ser tolerante a outro, podendo ocorrer em substâncias com mecanismos de ações semelhantes ou pela indução da enzima CYP-450 por um determinado fármaco, acarretando aumento da velocidade de biotransformação de outro, que nunca havia sido administrado antes. ◦ Tolerância condicionada ou ambiente-específica: é um mecanismo aprendido, no qual o fármaco/droga é sempre administrado mediante um estímulo ambiental específico (odor ou visão da seringa, por exemplo), ocorrendo nas situações em que a substância é esperada. 1.5 Opiáceos Opiáceos são substâncias derivadas do ópio, podendo ser naturais (como a morfina, codeína e tebaína) ou semissintéticas, resultantes de modificações químicas parciais (como a heroína, hidromorfona, oxicodona e hidrocodona). Opioides são todos os compostos associados ao ópio, tanto de origem natural quanto sintética, como a meperidina, pentazocina e propoxifeno. O ópio é obtido do exsudato leitoso da incisão de cápsulas imaturas contendo sementes da papoula, sendo uma planta nativa da Ásia. O conhecimento das propriedades terapêuticas e euforizantes do ópio é milenar, e a difusão do seu uso no Ocidente se deu graças aos árabes. Para produzir efeitos euforizantes e analgésicos, o ópio é usualmente consumido sob a forma de goma de mascar, solução ou pelo fumo. Nos Estados Unidos, por exemplo, o problema do vício intensificou-se pela chegada de imigrantes chineses fumadores de ópio, pela larga utilização da morfina por soldados feridos na guerra e pela disponibilidade da droga. Nesse contexto, a disponibilidade era grande já que complicações comuns (como diarreia, tosse e dores em geral, além de agitação em crianças) eram tratadas com medicamentos contendo ópio e seus derivados. Atualmente, o contato com opioides pode ser por intermédio de receita médica ou pressão social de usuários ilegais. A iniciação ao consumo dessa classe de droga pode se dar por curiosidade, pela disponibilidade e pela possibilidade de autoadministração. O opioide de escolha dos dependentes é a heroína. Com o uso crônico da droga, ocorre o desenvolvimento de tolerância, e doses cada vez maiores são necessárias para se obterem efeitos, como euforia e bem-estar. A tolerância aos opiáceos se instala rapidamente, e a característica é a tolerância cruzada, independentemente da estrutura química dessa classe. Dessa forma, um usuário de heroína apresenta também tolerância para a morfina ou fentanil, por exemplo. Os opiáceos/opioides produzem alto grau de dependência, caracterizada por compulsão e tendência crescente de aumentar a dose. A retirada abrupta da droga/fármaco causa intensa síndrome de abstinência. A maioria das drogas de abuso possui mecanismo de recompensa, o qual reforça o comportamento que induz à autoadministração. A morfina, por exemplo, produz uma intensa sensação de bem-estar (comparada ao orgasmo), e é justamente esse efeito o procurado pelos usuários. A manutenção do vício ocorre devido à sensação de prazer gerada pela droga e, também, para evitar o aparecimento de efeitos desagradáveis em virtude da retirada. 91WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Esses sintomas podem aparecer em tempos variáveis após a última utilização e dependem do opioide usado. Os mais comuns são irritabilidade, insônia, anorexia, intensa ansiedade, depressão, violentos bocejos, coriza, náuseas, vômitos, espasmo intestinal, diarreia, aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca, sensação de frio alternada com ruborização e sudorese excessiva. O cérebro possui opioides endógenos, encefalinas e endorfinas, os quais são peptídeos que atuam como neurotransmissores em células nervosas que contêm receptores opioides (μ, 𝒦, σ e δ). Consequentemente, os opiáceos produzem seus efeitos a partir da interação com os receptores opioides, os quais estão distribuídos em diversas regiões do sistema nervoso central. A medula espinhal, a substância cinzentaperiaquedutal e as amígdalas estão envolvidas no efeito analgésico. O núcleo coeruleus e a amígdala são responsáveis pelos sintomas físicos da retirada dos opiáceos, e a área tegmentar ventral e o núcleo accumbens constituem o sistema de recompensa. 1.6 Estimulantes: Cocaína e Anfetaminas O estimulante pode ser definido como toda substância química que possui potencial de estimular o sistema nervoso central, utilizada com o objetivo de produzir estado de euforia. Dentre os exemplos dessa classe de compostos, temos a cocaína e as anfetaminas. 1.6.1 Cocaína A cocaína é um alcaloide com potente efeito analgésico local, sendo considerado o mais poderoso estimulante do sistema nervoso central de ocorrência natural. A prática de utilizar folhas de coca com finalidades terapêutica e religiosa é milenar e, após o isolamento e caracterização da cocaína, foi empregada para combater a depressão e curar a dependência à morfina. A droga passou a fazer parte da composição de vários elixires, medicamentos e bebidas como a Coca Cola, o que levou ao aumento de seu consumo, resultando em intoxicações. Mediante as consequências do seu uso, ela foi proibida e passou a ter restrições semelhantes à morfina. A cocaína ilícita é encontrada na forma de pó cristalino, sendo comumente autoadministrada por aspiração nasal, via oral ou intravenosa. A forma mais comum de comercializar sua base livre é sob a forma de pedras (crack), mas ela pode ser encontrada como pasta de coca. O crack é administrado pela via respiratória (pelo ato de fumar). Essa droga possui alto potencial de abuso devido à rápida ocorrência de intensos efeitos prazerosos, baixo custo e segurança em relação ao contágio de doenças transmissíveis pelo fato de não ser injetável. A população potencialmente exposta é jovem, do sexo masculino e com baixa condição socioeconômica. Uma das substâncias mais comumente utilizadas em associação com a cocaína é o etanol, resultando em um produto com ação no sistema nervoso central. Outras associações relatadas são com a maconha e com o cigarro: a primeira aumenta a sensação de prazer ou diminui a compulsão pelo uso continuado, e a segunda funciona como um veículo para ser fumado publicamente. Outra combinação é com ansiolíticos e antidepressivos com o objetivo de diminuir os sintomas de ansiedade, agitação ou depressão após o uso. O uso de cocaína por mulheres grávidas resulta em graves consequências para o feto, como retardamento do desenvolvimento, malformações congênitas, placenta abrupta, cardiomiopatias, microcefalia e morte. A absorção depende da via de introdução, sendo que a respiratória (inalação pelo ato de fumar) apresenta maior penetração na corrente sanguínea por conta da absorção pelos alvéolos pulmonares. Dessa forma, os efeitos experimentados pelo usuário, em especial do crack, levam segundos para ocorrer. A cocaína liga-se a proteínas plasmáticas, contudo, apenas a sua fração livre é absorvida. Sua velocidade de distribuição é relativamente rápida. Apresenta tendência a se acumular no fígado, porque esse órgão possui receptores de alta afinidade com a cocaína. Sua presença no cabelo ocorre devido à difusão passiva para o folículo piloso. 92WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O caráter lipofílico dessa droga facilita sua passagem pela barreira hematoencefálica, com possibilidade de acumular-se no sistema nervoso central. A cocaína também possui potencial para atravessar a barreira placentária e pode ser secretada no leite materno. Seu metabolismo é intenso, e apenas pequena quantidade é eliminada de forma inalterada na urina, sendo predominantemente encontrada sob a forma de seus produtos de biotransformação. Após a utilização da cocaína, ocorre o aumento provisório das concentrações de norepinefrina e dopamina, seguido pela redução desses neurotransmissores para abaixo do limiar da normalidade. Essas concentrações estão relacionadas à euforia e à depressão, respectivamente. O mecanismo de ação da cocaína baseia-se na sua interação com os sítios transportadores de dopamina, levando ao bloqueio da recaptação desse neurotransmissor nas fendas sinápticas, resultando no acúmulo de dopamina nos receptores pós-sinápticos. Esse mecanismo é responsável pela sensação de euforia. A consequência do acúmulo de dopamina é a indução dos receptores pré-sinápticos por meio do mecanismo de autorregulação, conduzindo à diminuição da concentração do neurotransmissor. Da mesma forma, a estimulação adrenérgica ocorre em relação à norepinefrina. O uso crônico de cocaína conduz à diminuição significativa das concentrações de norepinefrina e dopamina no cérebro. A tolerância é modesta se comparada a outros estimulantes, como as anfetaminas. Ela geralmente ocorre em usuários crônicos após o consumo de altas doses e é caracterizada pela diminuição dos efeitos eufóricos e fisiológicos. Figura 2 - Mecanismo de ação da cocaína. Fonte: SENAD (2014). A cocaína é considerada a substância com maior potencial de abuso devido à sua capacidade de produzir reforço positivo. As vias dopaminérgicas estão envolvidas com os mecanismos de euforia e do comportamento compulsivo. A diminuição da concentração de dopamina, após o aumento que ocorre com o início da exposição à droga, está diretamente relacionada ao comportamento de busca. O usuário crônico autoadministra a droga repetidamente para aumentar os níveis de dopamina, conduzindo a um ciclo de reforço/busca, expresso pelo aumento/diminuição do neurotransmissor, que resulta em euforia/depressão. O uso crônico e abusivo da cocaína gera efeitos tóxicos, como distúrbios psiquiátricos, respiratórios, cardiovasculares e hepáticos, sendo que o grau de toxicidade varia de acordo com as condições de exposição. A retirada da cocaína após uso crônico pode resultar em uma síndrome de abstinência caracterizada por depressão, fadiga, irritabilidade, impotência, tremores, dores musculares, distúrbios do apetite e mudanças nos padrões do sono. Esses sintomas constituem um reforço muito negativo, o qual dificulta o tratamento do usuário da dependência química. 93WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.6.2 Anfetaminas As anfetaminas são aminas simpatomiméticas, que têm a estrutura química básica da ꞵ-fenetilamina. São um grupo de substâncias compostas pela anfetamina e seus derivados, como a metanfetamina (speed ou cristal) e a metilenodioximetanfetamina (ecstasy). É uma classe de compostos que produz acentuada ação estimulante no sistema nervoso central, sendo até mesmo mais persistente que a cocaína. Seu principal efeito consiste no aumento do desempenho físico e mental. A anfetamina foi sintetizada em 1887 e, no início do século XX, era amplamente empregada no tratamento da obesidade, narcolepsia, hipotensão e hiperatividade em crianças. Já a metanfetamina foi sintetizada em 1919 e é considerada o derivado anfetamínico com maior potencial de abuso. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi muito utilizada para combater a fadiga e melhorar o estado de alerta dos soldados. No Japão, utilizavam em trabalhadores civis para aumentar sua produtividade. Devido ao uso maciço e disseminado, foi necessário grande esforço para conter sua utilização irrestrita por meio de medidas de controle rigorosas, que incluíam severas penalidades. Contudo, essa droga é geralmente detectada nos programas de verificação toxicológica nos ambientes de trabalho. No Brasil, essa é uma das principais substâncias de abuso entre os caminhoneiros que fazem uso de “rebites” para enfrentar a exaustiva jornada de trabalho. No nosso País, a anfetamina e seus derivados, como femproporex, dietilpropiona e metilfenidato, são empregados como anorexígenos ou nos distúrbios de hiperatividade em crianças (incapacidade de concentração e impulsividade), sendo a sua comercialização controlada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar do controle, osanorexígenos femproporex e dietilpropiona possuem potencial de abuso, porque são supressores do apetite e auxiliam na perda de peso. Dentre os anfetamínicos produzidos legalmente, 80% são destinados para o tratamento da obesidade. O abuso dessas substâncias é resultado do consumo excessivo de prescrições médicas. As anfetaminas também podem ser utilizadas por estudantes e esportistas devido a suas propriedades estimulantes, que proporcionam o aumento do desempenho nas atividades executadas. Porém, a detecção dessas substâncias no controle da dopagem provocou drástica diminuição do seu uso no esporte. Muitos indivíduos abusam de anfetaminas associadas com barbitúricos, ansiolíticos e álcool para combater efeitos colaterais, como a insônia e a agitação. As formulações contendo nafazolina, efedrina e fenilefrina presentes nos descongestionantes nasais são de venda livre. Os anfetamínicos com propriedades alucinógenas, como speed, ice e ecstasy, são formulações ilícitas que apresentam grande potencial de abuso, principalmente por jovens que frequentam festas denominadas “raves”. São drogas de abuso atrativas, porque aumentam a capacidade de comunicação, a empatia e a confiança. Indivíduos mais suscetíveis (personalidade mais tímida, por exemplo) apresentam maior vulnerabilidade para exposição. Os anfetamínicos são rapidamente absorvidos pelo trato gastrintestinal, e seu grau de ligação com proteínas plasmáticas não é tão grande (comparativamente com outras classes de substâncias), sendo amplamente distribuídos principalmente no cérebro. A alta concentração nesse órgão está relacionada a transportes especiais associados à difusão passiva, que permitem sua penetração na barreira hematoencefálica. Sua biotransformação ocorre principalmente no fígado, e o tipo de reação é de acordo com a estrutura química das anfetaminas e seus derivados. Geralmente, 30% da dose terapêutica são excretados de forma inalterada na urina, contudo, a excreção pela via renal depende do pH da urina. 94WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A anfetamina apresenta caráter básico (pKa ∼ 9,9). Quando ocorre a acidificação da urina, a droga está na sua forma ionizada ou hidrossolúvel, não é reabsorvida pelos túbulos renais e grande parte da dose é eliminada de forma inalterada. Já o aumento do pH da urina favorece a reabsorção tubular. Pelo fato de essa substância apresentar-se na sua forma não ionizada ou lipossolúvel, apenas de 3% a 7% da dose são excretados de forma inalterada no mesmo período. As anfetaminas aumentam a concentração da dopamina e norepinefrina, atuando na liberação direta dos neurotransmissores das vesículas sinápticas e na inibição da recaptação dos mesmos. Os efeitos comportamentais ocasionados pela anfetamina estão associados à liberação de dopamina enquanto que a norepinefrina cerebral é responsável pelo desempenho físico. A elevação da concentração de norepinefrina acarreta alterações cardiovasculares, como aumento da frequência cardíaca e pressão sistólica, hipóxia no músculo cardíaco, lesão necrótica e morte celular. Os anfetamínicos, em especial a anfetamina e a metanfetamina, apresentam alta capacidade de induzir ao uso abusivo e, consequentemente, acarretam dependência. O potencial de reforço está relacionado ao aumento da concentração de dopamina no núcleo accumbens na região mesolímbica assim como no núcleo caudado, localizado na área subcortical motora. A síndrome resultante da retirada do fármaco ou droga é caracterizada por fadiga, aumento anormal do apetite, apatia, letargia, ansiedade, distúrbios do sono e depressão profunda, que pode levar o indivíduo ao suicídio. O desenvolvimento da tolerância aos efeitos dos anfetamínicos geralmente é rápido, sendo maior para a ação anorexígena e mais lento para a estimulação motora, mental e euforia. Os derivados orais prescritos para redução de peso possuem eficácia curta por conta do desenvolvimento de tolerância. Os efeitos tóxicos do uso abusivo de anfetaminas ocorrem principalmente nos sistemas cardiovascular e neuropsíquico. O Quadro 1 descreve as principais manifestações clínicas relacionadas à intoxicação dessas drogas. Quadro 1 - Classificação da severidade da intoxicação por anfetaminas. Fonte: Oga, Camargo e Batistuzzo (2008). 1.7 Barbitúricos e Benzodiazepínicos Os barbitúricos e benzodiazepínicos são substâncias depressoras do sistema nervoso central e são receitados para o tratamento da ansiedade e distúrbios do sono. Cada classe possui mecanismo de ação, capacidade de tolerância e dependência diferentes. 95WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.7.1 Barbitúricos No final do século XIX, foram introduzidos os sais de brometo como ansiolíticos. Na época, utilizavam-se o etanol, o paraldeído e o hidrato de cloral como depressores do sistema nervoso central. O ácido barbitúrico foi sintetizado em 1862, porém, só no início do século XX, seus primeiros derivados foram introduzidos na prática médica. Na década de 1930, verificou- se que os brometos produziam efeito cumulativo e poderiam levar a quadros de intoxicação. Consequentemente, houve diminuição no consumo dessas substâncias. Paralelamente, despontavam os barbitúricos, os quais obtiveram grande aceitação médica e leiga. A busca por drogas com efeitos mais específicos conduziu à síntese de barbitúricos de curta e média ações, utilizados como hipnóticos: o secobarbital, o amobarbital, o pentobarbital e o butabarbital. O fenobarbital e o metilfenobarbital são barbitúricos que possuem longa ação, sendo utilizados como ansiolíticos e anticonvulsivantes. A via de administração dos barbitúricos pode ser oral, quando seu uso tem finalidade sedativo-hipnótica, ou intravenosa, com o objetivo de obter anestesia ou para tratamento de epilepsia. Sua absorção é rápida e completa, sendo realizada principalmente pelo intestino delgado. O processo de absorção depende da via de administração, das características físico- químicas da substância e da presença de alimentos no estômago. Os barbitúricos são amplamente distribuídos no organismo e possuem a capacidade de ultrapassar todas as barreiras biológicas, inclusive a placentária. Os fatores que influenciam sua distribuição são a lipossolubilidade, o grau de ligação com proteínas plasmáticas e seu grau de ionização. Os derivados de ação curta são altamente lipossolúveis e, devido a essa característica, são amplamente distribuídos no tecido cerebral. Já os derivados de ação longa, como o fenobarbital, são menos lipossolúveis, acumulando-se lentamente no cérebro. Permanecem por mais tempo no organismo devido à sua reduzida biotransformação e dependem da excreção urinária para o término de seus efeitos. Os barbitúricos sofrem redistribuição e, quando ocorre sua saída do sistema nervoso central para outros tecidos, o efeito depressor diminui ou encerra-se. O metabolismo dessas substâncias ocorre principalmente no fígado, no entanto, existem outros locais de biotransformação, como o rim, cérebro, coração, intestino, músculo e baço, sendo que a reação mais importante nesse processo é a oxidação. O fenobarbital é um importante indutor de enzimas hepáticas. Sua administração concomitante com outros fármacos específicos aumenta a taxa de biotransformação deles. A excreção se dá principalmente pela via renal. Barbitúricos com baixo coeficiente de partição óleo/ água (baixa lipossolubilidade) e de longa duração, como o fenobarbital, são excretados inalterados ou parcialmente biotransformados na urina. Já os de média e curta durações são excretados parcialmente inalterados e biotransformados. Os de ação ultracurta são eliminados na urina sob a forma de produtos de biotransformação. A eliminação é dependente do pH. O fenobarbital, por exemplo, possui pKa em torno de 7,3 e, por isso, é considerado um ácido fraco. A alcalinização da urina favorece a ionização não somente do fenobarbital como de outrosderivados barbitúricos e, dessa forma, dificulta a sua reabsorção tubular e favorece sua eliminação pela urina. Como citado anteriormente, os barbitúricos são depressores do sistema nervoso central, e seu mecanismo de ação consiste no aumento da atividade do neurotransmissor ácido gama- aminobutírico – GABA –, o qual atua na inibição do receptor GABAA. Adicionalmente, a atividade noradrenérgica pode ser seletivamente deprimida. A toxicidade depende do tipo de barbitúrico, sendo que os de ação mais curta são mais potentes e, portanto, mais tóxicos em relação aos de ação prolongada. Os efeitos provocados dependem da dose. A intoxicação leve à moderada é parecida com os sintomas de embriaguez por álcool (fala enrolada, descoordenação motora, vertigem e confusão mental). Outros sintomas clínicos incluem alteração da consciência, depressão dos sintomas respiratórios e vasomotores e coma. 96WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O uso contínuo de barbitúricos (em curtos intervalos de tempo) provoca tolerância, ou seja, resistência aos efeitos hipnóticos. Os tipos de tolerância observados são a farmacocinética (metabólica), a farmacodinâmica, a cruzada e a aguda. A tolerância farmacocinética é, em parte, provocada pelo aumento da atividade de algumas enzimas hepáticas, o que resulta na aceleração do processo de biotransformação e eliminação mais rápida. Dessa forma, diminui o tempo de ação terapêutica e, consequentemente, será necessária uma dose maior para manter as concentrações nos compartimentos biológicos. A tolerância a esses fármacos é diretamente proporcional à rapidez de seu efeito e inversamente proporcional à sua meia-vida. A tolerância farmacodinâmica consiste na neuroadaptação da substância, a qual envolve uma adaptação do tecido nervoso à presença do barbitúrico. Já a tolerância cruzada ocorre com outros depressores, como o álcool etílico e anestésicos gerais de inalação. A tolerância aguda pode acontecer após a administração de uma única dose elevada, em que o sistema nervoso central torna-se resistente aos efeitos da substância. As dependências física e psicológica advêm do uso a longo prazo. A retirada abrupta do fármaco pode gerar síndrome de abstinência, caracterizada por debilidade, ansiedade, alucinações, convulsões e irritabilidade gastrintestinal. A intoxicação por barbitúricos pode se manifestar por meio da tentativa de suicídio, perda do controle da quantidade de comprimidos ingeridos e de forma acidental (crianças). Não há antídoto, porém, o tratamento consiste na estabilização e manutenção dos sinais vitais (principalmente, ventilação), lavagem gástrica ou indução do vômito, administração de carvão ativado ou alcalinização da urina, hemodiálise ou hemoperfusão. 1.7.2 Benzodiazepínicos Os benzodiazepínicos estão entre os fármacos mais receitados em todo o mundo. Desde a introdução do clordiazepóxido, dezenas desses compostos foram sintetizadas. São empregados como ansiolíticos, anticonvulsivantes, relaxantes musculares e hipnóticos. No Brasil, há diversos derivados que são comercializados. Dentre eles, o bromazepam, camazepam, clonazepam, clorazepato, clordiazepóxido, diazepam, fludiazepam, flunitrazepam, flurazepam, flurazepam, lorazepam, lormetazepam, medazepam, nimetazepam, nitrazepam, oxazepam, prazepam e temazepam. Todos estão sujeitos à notificação de receituário B conforme Portaria 344. As vias de administração são oral, intramuscular, intravenosa e retal. Na via oral, os benzodiazepínicos são bem absorvidos pelo trato gastrintestinal e, na via intramuscular, geralmente possuem absorção lenta (exceto o lorazepam). Já a via intravenosa é um pouco arriscada, porque pode ocasionar um período de apneia ou insuficiência respiratória. A via retal só é utilizada nos casos em que a administração intravenosa é impraticável ou indesejável. Esses fármacos são bem distribuídos pelo organismo e possuem lipossolubilidade suficiente para atingir o cérebro. A maioria dos derivados interage com proteínas plasmáticas, sendo que a fração livre pode variar de 2% (diazepam) a 15% (clonazepam). Os benzodiazepínicos são biotransformados pelas enzimas hepáticas, e os produtos formados podem apresentar atividade farmacológica similar ao composto original, dando origem a outros compostos da classe durante a metabolização. A duração da ação depende do tempo de meia-vida e da presença ou ausência de metabólitos ativos. Quanto maior é o tempo de meia-vida, maior é a duração do efeito (sedação prolongada). O grau de biotransformação pode ser maior, na presença de indutores enzimáticos como os barbitúricos, e menor, na presença de fármacos como o dissulfiram e a cimetidina, os quais são inibidores enzimáticos. Os benzodiazepínicos são preferencialmente excretados pela via renal (metabólitos presentes na urina) e, em alguns casos, pela via gastrintestinal (fezes). Apenas uma pequena porcentagem aparece de forma inalterada na urina. 97WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Seu mecanismo de ação compreende sua interação com receptores benzodiazepínicos presentes no sistema nervoso central e a potencialização da ação inibitória do neurotransmissor GABA, o qual se liga ao seu receptor e promove a abertura dos canais de cloreto, resultando na hiperpolarização da membrana e na consequente inibição da excitação celular. Figura 3 - Ilustração esquematizada da atuação dos barbitúricos e benzodiazepínicos no receptor GABA. Fonte: Medeiros (2020). O uso crônico desses compostos conduz ao fenômeno de tolerância, sendo ela do tipo funcional, a qual envolve alterações no número ou sensibilidade de receptores de benzodiazepínicos e modificações na interação do GABA com os diferentes sistemas. Com o uso crônico dessas substâncias, é possível observar também a manifestação de dependência caracterizada por sintomas de abstinência. Pacientes tratados com doses terapêuticas de benzodiazepínicos por um período maior que 6 meses apresentam dependência física. Contudo, o risco é maior quando há o uso prolongado de doses maiores que as terapêuticas. A dose, a duração do tratamento, o tempo de meia-vida e a potência do fármaco, assim como a suscetibilidade individual, contribuem para a intensidade dos sintomas de abstinência. A abstinência pode acontecer por meio do rebote, que é caracterizado pelo retorno dos sintomas originais da doença ou pela síndrome de abstinência, que é o aparecimento de novos sintomas após redução da dose ou interrupção do tratamento. Os sintomas de abstinência resultantes da interrupção abrupta do uso são agitação, depressão, ansiedade, insônia, vertigens, anorexia, náuseas, vômitos, entre outros. Os benzodiazepínicos são fármacos relativamente seguros. Intoxicações graves e letais são raras e, geralmente, ocorrem quando há o uso concomitante com outras substâncias, como etanol e barbitúricos, já que tal associação conduz a um efeito aditivo de sedação. Os principais efeitos colaterais observados com o uso desses fármacos são sedação, letargia, incoordenação motora e, em doses mais elevadas, diminuição do tônus muscular e da força, pressão baixa e desmaios. Raramente, podem provocar comportamento agressivo e/ou suicida. Para o tratamento da intoxicação aguda, é administrado o antídoto flumazenil, o qual é um antagonista seletivo do receptor GABA, bloqueando por inibição competitiva os efeitos provocados pelos benzodiazepínicos. 98WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA 1.8 Etanol O álcool é uma das substâncias psicoativas mais consumidas pela sociedade. As consequências do seu uso implicam a alteração do comportamento, acidentes de trânsito e trabalho, doenças hepáticas e quadros de dependência. O abuso e a dependência do álcool são problemas de saúde pública em todo o mundo de tal forma que o alcoolismo foi reconhecido como doença psiquiátrica. A cachaça é a bebida mais popular noBrasil. Ela possui alto teor alcoólico e preço acessível, o que contribuiu para o agravamento do problema social gerado pelo consumo de álcool pela população. A concentração de álcool varia muito entre as bebidas: a cerveja apresenta concentração em torno de 5%, seguida dos vinhos (9-12,5%), licores, aguardentes e whiskies, com teores mais altos (40%). O etanol é uma substância de caráter hidrossolúvel e de baixo peso molecular, sendo bem absorvido no estômago (20%) e no intestino delgado (80%). Os principais fatores que influenciam o processo de absorção são o tempo de esvaziamento gástrico e o início da absorção intestinal. Se o tempo de esvaziamento gástrico é retardado pela presença de alimentos, o início da absorção intestinal será mais lento. Uma vez no intestino delgado, o etanol será rapidamente absorvido, independentemente da presença de alimentos. A distribuição do etanol absorvido é rápida. Por ser hidrossolúvel, ele estará presente em todos os compartimentos biológicos, variando de acordo com a composição hídrica de cada tecido. A maior concentração ocorre no sangue, depois no cérebro, seguido pelos rins, pulmões, coração, intestino e músculos estriados, apresentando-se em menores concentrações nos ossos e tecido adiposo. O etanol atinge o sistema nervoso central por atravessar a barreira hematoencefálica, sendo possível estabelecer uma relação entre os níveis plasmáticos e o comportamento. Essa substância é extensivamente metabolizada no fígado a partir da reação de oxidação, sendo que a biotransformação é constante ao longo do tempo e independe de suas concentrações plasmáticas. A quantidade de etanol oxidada em um determinado intervalo de tempo é proporcional ao peso tanto corporal quanto do fígado. A principal via de biotransformação é realizada pela enzima álcool desidrogenase, com a formação do produto acetaldeído. Essa enzima apresenta polimorfismo, e as variantes possuem diferentes propriedades catalíticas nos diferentes grupos raciais. Dessa forma, ocorrem variações nas taxas de biotransformação entre indivíduos diferentes. A deficiência de uma variante da álcool desidrogenase acarreta o acúmulo de acetaldeído e, como consequência, há a ocorrência de efeitos tóxicos após a ingestão de álcool. O uso crônico de etanol promove o aumento da atividade da álcool desidrogenase, ou seja, aumenta o metabolismo dessa substância, favorecendo sua eliminação em alcoolistas. O aldeído formado a partir da oxidação do etanol (acetaldeído) é oxidado a acetato por uma reação catalisada pela aldeído desidrogenase. Geralmente, uma pequena fração de etanol não é oxidada; contudo, se houver o consumo de uma grande quantidade, pode ocorrer aumento da concentração da substância não oxidada. O etanol na sua forma inalterada é excretado pelos rins, pulmões, suor e saliva. 99WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O etanol age principalmente na membrana celular, provocando desordem e modificações em funções específicas. Uma das alterações observadas é a fluidificação, ou seja, a dissolução dos componentes lipídicos presentes na membrana. O efeito depressor no sistema nervoso central é caracterizado pela fluidificação da membrana e pelo aumento da inibição sináptica mediada pelo neurotransmissor ácido gama-aminobutírico (GABA). Doses elevadas aumentam a permeabilidade de íons cloro na ausência do GABA. Além do sistema GABAérgico, o álcool atua também nos seguintes sistemas: ◦ Adrenérgico: aumento da síntese e liberação de noradrenalina. ◦ Opioide: modificação da concentração de dopamina no núcleo accumbens. ◦ Serotoninérgico: diminui a concentração de serotonina. ◦ Dopaminérgico: aumento da dopamina no núcleo accumbens. ◦ Colinérgico: redução da concentração de acetilcolina. ◦ Glutamatérgico: no uso agudo, diminui os níveis de glutamato no córtex e no cerebelo; no uso crônico, aumenta sua concentração no córtex, hipocampo e substância nigra. ◦ Cálcio: reduz o fluxo de cálcio através da membrana celular. As alterações no comportamento e nas funções cognitivas e motoras dependem de alguns fatores, como a dose ingerida, a velocidade de absorção, o peso, a suscetibilidade individual e o desenvolvimento de tolerância. A intoxicação aguda é caracterizada por sedação, incoordenação motora, movimento involuntário dos olhos, fala pastosa, rubor facial, irritabilidade, atenção prejudicada, falta de capacidade de julgamento e desinibição do comportamento. Dependendo da dose ingerida e do indivíduo, pode ocorrer também déficit da memória de curta duração. Geralmente, os efeitos provocados pelo etanol passam com o tempo, após a metabolização da substância no organismo. Contudo, nos casos em que o indivíduo encontra-se agitado ou violento, colocando em risco sua própria vida e a de outros, é necessária uma intervenção medicamentosa. A intervenção consiste na administração de agentes neurolépticos sedativos, tendo-se a cautela de não potencializar os efeitos depressores no sistema nervoso central. Os pacientes confusos ou em coma alcoólico devem receber o mesmo tratamento. Dependendo do estado do paciente, podem-se utilizar medidas de desintoxicação, como a lavagem gástrica, a administração de tiamina intramuscular e glicose via intravenosa, a ventilação mecânica, a hemodiálise e a administração de soluções hipertônicas. Em indivíduos saudáveis que consomem álcool com moderação, a maioria das alterações patológicas que ocorrem no organismo é reversível. Entretanto, quando ingerido de forma abusiva ou em indivíduos que possuem patologias prévias às lesões nos diversos órgãos, as alterações tornam-se mais graves e irreversíveis. A toxicidade crônica, decorrente do uso contínuo e abusivo do etanol, produz alterações orgânicas nos diversos sistemas biológicos. O Quadro 2 descreve as desordens fisiológicas provocadas por essa substância. 100WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Quadro 2 - Alterações orgânicas decorrentes do uso abusivo de etanol. Fonte: Oga, Camargo e Batistuzzo (2008). A tolerância causada pelo uso abusivo e contínuo aumenta os níveis plasmáticos necessários para que as reações ocorram. A tolerância é caracterizada por uma das seguintes situações: a) Necessidade de aumentar a quantidade da substância usada para obter o mesmo efeito. b) Diminuição do efeito com o uso contínuo da mesma quantidade da substância. A dependência pode ser caracterizada por um ou mais critérios, como: a) Uso frequente e cada vez maior, por períodos maiores do que o indivíduo deseja. b) Desejo persistente ou tentativas malsucedidas para diminuir ou controlar o uso. c) O indivíduo gasta boa parte do seu tempo em atividades para obter a substância, usá-la e recuperar-se dos seus efeitos. d) Atividades profissionais ou sociais são abandonadas devido ao uso da droga. e) O uso da substância é mantido apesar dos problemas físicos e psicológicos. Esses critérios de dependência podem ser observados para as drogas em geral, inclusive o álcool. O indivíduo pode ser dependente do álcool sem apresentar sintomas de tolerância ou abstinência, sendo que os parâmetros citados anteriormente são suficientes para realizar o diagnóstico de dependência. A ingestão contínua de álcool pode acarretar processos de tolerância e abstinência, decorrentes do fenômeno de adaptação do organismo e provocados pelo uso crônico. A síndrome de abstinência pode ocorrer após a interrupção abrupta do uso contínuo do álcool, sendo caracterizada por ansiedade, tremor, insônia, distúrbios gastrintestinais, desnutrição, irritabilidade, agitação, sudorese, febre, taquicardia, aumento da pressão arterial, náusea e vômitos. Em casos mais graves, podem ocorrer convulsões e infecções. 101WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A genética desempenha papel importante na dependência do álcool. Existem diversos genes que favorecem a predisposição de um indivíduoa ser dependente. Influências ambientais podem proteger ou exacerbar a vulnerabilidade genética. O tratamento do alcoolismo pode ser realizado com medicamentos nos casos em que o tratamento não farmacológico não apresentar resultados. O acamprosato e a naltrexona consistem em importantes recursos farmacológicos no tratamento da síndrome de dependência do álcool. Sob determinadas condições, o dissulfiram também é uma intervenção eficaz, contudo, o medicamento de primeira escolha é o naltrexona, cujas contraindicações são insuficiência hepática ou hepatite. Outras opções menos comuns, porém, com alguma evidência, são a gabapentina e o topiramato. Figura 4 - Mecanismo de tratamento do alcoolismo pela naltrexona. Fonte: Fernandes e Angelini (2016). O etanol pode interagir com outros fármacos devido à sua capacidade de induzir as enzimas do metabolismo hepático ou pela competição pelas enzimas do complexo citocromo P-450, responsáveis pela biotransformação dos compostos. Na primeira situação, ocorre a diminuição da concentração da substância no organismo devido ao aumento da sua metabolização. Já no segundo caso, há um aumento da quantidade de fármacos disponíveis na circulação, porque a concentração de enzimas disponíveis para biotransformação é menor. Dentre as interações do etanol com outros fármacos, podemos destacar: ◦ Dipirona: o fármaco potencializa o efeito do álcool. ◦ Paracetamol: a associação aumenta o risco de hepatite medicamentosa. ◦ Ácido acetilsalicílico: o álcool aumenta o risco de sangramentos no estômago, provocados por esse fármaco. ◦ Antibióticos: o uso concomitante com o álcool pode produzir efeitos colaterais, como vômitos, palpitação, cefaleia, hipotensão, insuficiência respiratória e morte. Exemplos: Metronidazol, trimetoprim-sulfametoxazol, tinidazole e griseofulvin. Outros antibióticos, como cetoconazol, nitrofurantoína, eritromicina, rifampicina e isoniazida, também não devem ser consumidos com álcool pelo risco de inibição do efeito e potencialização de toxicidade hepática. 102WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA ◦ Anti-inflamatórios: a associação provoca aumento do risco de úlcera gástrica e sangramentos causados por esses medicamentos. ◦ Antidepressivos: o álcool aumenta as reações adversas e o efeito sedativo, além de diminuir a eficácia dos antidepressivos. ◦ Benzodiazepínicos: o uso concomitante aumenta o efeito sedativo, o risco de coma e a insuficiência respiratória. ◦ Inibidores de apetite: o álcool intensifica os efeitos sobre o sistema nervoso central, como tontura, vertigem, fraqueza, confusão e desmaios. ◦ Insulina: a associação pode provocar hipoglicemia, porque o álcool diminui a disponibilidade de glicose no organismo. ◦ Anticonvulsivantes: o álcool aumenta os efeitos colaterais derivados do fármaco com potencial de intoxicação enquanto que diminui a eficácia contra as crises de epilepsia. 1.9 Tabaco O tabagismo é um dos principais problemas de saúde pública e a segunda causa de morte no mundo. Apesar da redução na quantidade de fumantes devido a medidas restritivas de publicidade e venda, assim como o maior esclarecimento sobre os danos causados pelo tabaco, o número de tabagistas aumenta a cada ano. O motivo é que grupos como mulheres e adolescentes aumentaram o consumo enquanto houve redução entre os homens adultos. Além dos problemas de saúde, o tabaco também é responsável por acidentes, como incêndios, e pela diminuição da produtividade dos trabalhadores. O tabaco é considerado uma droga de abuso perigosa devido aos danos físicos e sociais e a seu potencial de causar dependência. Dependendo da região de cultivo, do solo, da secagem e do armazenamento, a folha do tabaco pode conter mais de 500 constituintes, e a composição química da fumaça depende da qualidade do tabaco, do processo de embalagem, das características do filtro e do papel, da temperatura em que é queimado e da forma de fumar. A fumaça possui duas fases: a gasosa e a particulada. Na fase gasosa, os principais constituintes são monóxido de carbono, óxido de nitrogênio, amônia, aldeídos, nitrosaminas voláteis e nitrila. Já a fase particulada possui como principais componentes o alcatrão, a nicotina e a água. Algumas substâncias são adicionadas para aprimorar as características organolépticas, como umectantes, flavorizantes e aglutinantes. A detecção da presença de praguicidas é resultante da contaminação durante o processo de produção do tabaco, contudo, não são um composto intencionalmente adicionado. As formas mais comuns de uso são o cigarro, charuto, bidi, cachimbo, cigarro de palha, cigarrilha, bidi, tabaco para narguilé, rapé, fumo-de-rolo, tabaco de mascar, dispositivos eletrônicos para fumar e outros. O cigarro é a principal forma de uso do tabaco em todo o mundo. A nicotina é o ingrediente mais ativo da fumaça do cigarro e um dos agentes tóxicos mais potentes. As principais vias de introdução são a oral e a pulmonar. O pH é um fator que influencia na absorção. Na fumaça de charuto e cachimbo, a nicotina encontra-se alcalina, sendo facilmente absorvida pela mucosa bucal. Já na fumaça do cigarro, essa substância encontra-se na sua forma ácida, sendo mais bem absorvida pelos alvéolos pulmonares. Dessa maneira, a incidência de câncer na cavidade bucal é maior nos fumantes de charuto e cachimbo enquanto que há maior prevalência de câncer pulmonar entre os fumantes de cigarro. 103WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Após a administração oral, a nicotina é fracamente absorvida no estômago, sendo mais bem absorvida no intestino. A nicotina apresenta baixa ligação com proteínas plasmáticas e é amplamente distribuída nos sistemas biológicos. Apresenta capacidade de atravessar a barreira placentária e é excretada no leite. Sua biodisponibilidade é baixa, porque é extensivamente biotransformada no fígado por meio da reação de oxidação, formando a cotinina como principal produto, a qual possui tempo de meia-vida maior que seu próprio precursor. O tabaco promove a indução enzimática de diversos fármacos, metabolizando-os mais rapidamente. Dentre os fármacos afetados, temos a antipirina, cafeína, fenacetina, imipramina, propranolol, teofilina e varfarina. A excreção da nicotina pela via renal é dependente do pH, sendo que a acidificação da urina promove maior eliminação na sua forma inalterada do que em pH básico. Os principais efeitos tóxicos do tabagismo consistem na isquemia cardíaca, câncer de pulmão, bronquite crônica, enfisema pulmonar, comprometimento cardiovascular e toxicidade fetal. A isquemia cardíaca é produzida pelo monóxido de carbono, o qual possui alta afinidade com a hemoglobina e reduz o transporte de oxigênio no organismo, especialmente no tecido cardíaco. O potencial carcinogênico existe devido à inalação de hidrocarbonetos aromáticos, como o benzopireno e nitrosaminas. O tabagismo é fator de risco para o desenvolvimento dos seguintes tipos de câncer: leucemia mieloide aguda, bexiga, pâncreas, fígado, colo do útero, esôfago, rim e ureter, laringe (cordas vocais), cavidade oral (boca), faringe (pescoço), estômago, cólon e reto, traqueia, brônquios e pulmão, sendo este último o principal tipo de câncer causado pelo tabaco. As substâncias irritantes, como acroleína, fenóis, cresóis e ácidos orgânicos, inibem os movimentos ciliares do epitélio brônquico e, dessa forma, impedem a expulsão das impurezas inaladas. A contínua agressão, associada ao acúmulo de secreções e bactérias, é a base para o desenvolvimento da bronquite crônica e enfisema pulmonar. O comprometimento vascular é caracterizado pelo aumento da frequência cardíaca, da pressão arterial e vasoconstrição. Gestantes fumantes apresentam risco significativo de sofrer aborto e deslocamento de placenta. O tabaco não oferece risco apenas para o fumante, mas também para os não fumantes, expostos involuntariamente à fumaça. A exposiçãoagrava o quadro de indivíduos asmáticos e alérgicos, provoca irritação dos olhos e garganta, aumenta o risco de câncer pulmonar e intensifica enfermidades cardiovasculares. A tolerância farmacodinâmica da nicotina é caracterizada por tonturas, náuseas, vômitos, sudorese e hipotensão. À medida que os cigarros são fumados ao longo do dia, os efeitos tornam-se cada vez menores. A tolerância desenvolve-se em razão da alteração dos receptores nicotínicos da acetilcolina no sistema nervoso central e periférico. A nicotina é a responsável pela dependência ao tabaco, induzindo ao mesmo tipo de dependência que outras drogas psicoativas. O efeito euforizante é o agente reforçador do processo, porém, possui menor potencial de reforço que a anfetamina e a cocaína. A ação estimulante é mediada pelos neurônios noradrenérgicos do locus coeruleus e pelos neurônios dopaminérgicos da área tegumentar ventral. A interrupção abrupta do uso crônico do tabaco pode produzir uma síndrome de abstinência, que varia de um indivíduo para outro. Os principais sintomas são alterações do sono, náusea, irritabilidade, fadiga, cefaleia, ansiedade, dificuldade de concentração e na coordenação psicomotora, ganho de peso, aumento da tosse, dificuldade respiratória, redução da frequência cardíaca e da pressão arterial e aumento do fluxo sanguíneo periférico. As manifestações clínicas iniciam-se dentro de um período de 24 horas e podem estender-se por meses. Dessa forma, a dificuldade de o indivíduo abandonar o hábito de fumar está relacionada aos efeitos da abstinência, sendo que a retomada do fumo está mais associada ao alívio dos efeitos desagradáveis do que ao prazer. 104WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Figura 5 - Mecanismo de ação da nicotina no sistema nervoso central. Fonte: Remião (2015). 1.10 Cannabis A cannabis é a droga mais cultivada, traficada e consumida em todo o mundo. Com origem na Ásia, é uma substância milenar, estando um dos primeiros registros da sua existência já na farmacopeia chinesa (2753 a.C.). O termo canabinoide era relacionado aos fitocanabinoides presentes na Cannabis sativa L, contudo, atualmente refere-se a todos os compostos ligantes dos receptores canabinoides presentes no organismo. Já foram identificados mais de 400 compostos naturais na Cannabis sativa L, sendo que 70 são fitocanabinoides pertencentes a diferentes subclasses: canabidiol, tetrahidrocanabinol, canabicromeno, canabigerol, canabiciclol, canabielsoin, canabinol, canabinodiol, canabitriol e miscelânea. Dentre todos os fitocanabinoides contidos na Cannabis sativa L, o delta-9-tetra-hidrocanabinol (Δ9-THC) é a principal substância química com efeito psicoativo. Seu teor varia de acordo com as condições ambientais e métodos de cultivo. Suas principais preparações são feitas com as folhas e flores (maconha ou marijuana) e com a resina extraída das inflorescências (haxixe). As preparações de Δ9-THC são geralmente consumidas pela via pulmonar por meio do fumo e pela via oral a partir da ingestão da droga em alimentos, extratos ou bebidas. A absorção pulmonar é muito rápida devido à grande superfície alveolar e alto fluxo sanguíneo. Já a via oral é lenta e irregular, apresentando baixa biodisponibilidade em virtude de sofrer extensa biotransformação hepática, degradação no meio ácido do estômago e pelos micro-organismos presentes no trato gastrintestinal. O Δ9-THC possui alta afinidade pelas proteínas plasmáticas por causa de seu caráter lipossolúvel (pKa~10,6), sendo rapidamente distribuído para os tecidos e órgãos que apresentam alto fluxo sanguíneo, como cérebro, fígado, coração, rins e pulmões. Com o tempo, sofre redistribuição, apresentando acúmulo nos tecidos menos vascularizados, como o adiposo. Os canabinoides apresentam potencial para atravessar a barreira placentária e para serem excretados no leite. 105WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O Δ9-THC é biotransformado principalmente no fígado, porém, outros órgãos, como coração e pulmão, também possuem capacidade de metabolizar a droga. Os principais produtos de biotransformação são ativos, os quais sofrem inativação posteriormente a partir de reações de conjugação com o ácido glicurônico, por exemplo. A excreção é pela via renal (urina) e sistema digestivo (fezes), entretanto, os produtos de biotransformação são reabsorvidos e passam pelo ciclo entero-hepático, contribuindo para a sua lenta eliminação do organismo. O sistema endocanabinoide do cérebro de mamíferos é composto por: (a) pelo menos, dois receptores acoplados a uma proteína G, CB1 e CB2, presentes na membrana; (b) pelos seus ligantes endógenos (endocanabinoides, como a anandamida e o 2-araquidonoil glicerol; e (c) pelas enzimas responsáveis por sintetizá-los e metabolizá-los. Os receptores CB1 são expressos principalmente no sistema nervoso central, nas regiões responsáveis pelo controle motor, aprendizagem, memória, funções cognitivas e prazer. Já os receptores CB2 localizam-se em estruturas associadas à modulação do sistema imune e hematopoiese. A ativação dos receptores CB1 pelo Δ9-THC resulta na diminuição do influxo de cálcio nos terminais axônicos e, como consequência, observa-se a diminuição da liberação de neurotransmissores, como a acetilcolina, noradrenalina, dopamina, serotonina, GABA, glutamato e aspartato. Figura 6 - Mecanismo de ação dos canabinoides. Fonte: Castro (2018). Os efeitos tóxicos manifestados a curto prazo pelo uso da Cannabis incluem euforia, relaxamento, sonolência, depressão, perda da noção de tempo e espaço, coordenação motora diminuída, prejuízo da memória recente, falha nas funções intelectuais e cognitivas, intensificação dos sentidos (visual e audição), olhos vermelhos (hiperemia das conjuntivas), aumento do apetite e secura na boca e garganta. Essas alterações, especialmente as mentais, comprometem a execução de tarefas que exigem atenção e discernimento. Doses mais altas podem conduzir a uma psicose, acompanhada por alucinações. O uso crônico pode acarretar: bronquite; comprometimento cardiovascular em indivíduos com doenças coronárias; diminuição da imunidade, com consequente aumento do número de infeções bacterianas e tumores; e aumento da incidência de doenças mentais. 106WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA De maneira geral, a Cannabis não acarreta dependência, contudo, seu uso precoce (em menores de idade) pode aumentar a probabilidade de o indivíduo ter problemas com drogas no futuro. A tolerância se desenvolve para a maioria dos efeitos de canabinoides como resultado de alterações farmacodinâmicas. Nesse caso, a diminuição da expressão e/ou dessensibilização dos receptores. A síndrome de abstinência manifesta-se após o uso crônico e a exposição intensa à Cannabis, sendo caracterizada pelo desejo intenso pela maconha, distúrbios do sono (como insônia e pesadelos), perda de peso, irritabilidade, agressividade e inquietação. 2. TOXICOLOGIA DOS ALIMENTOS Alimentos são misturas muito complexas de substâncias que apresentam componentes de valor nutricional e não nutricional, cujos constituintes são heterogêneos devido a diferentes características físico-químicas. Os aditivos alimentares são substâncias adicionadas intencionalmente aos alimentos com a finalidade de modificar as características físicas, químicas, biológicas ou sensoriais do produto. Como exemplo, temos os corantes, edulcorantes, conservantes, antioxidantes, emulsificantes, espessantes e gelificantes. Existe uma discussão sobre o uso de aditivos na produção de alimentos, considerando a necessidade e a segurança de seu uso. Os padrões de segurança aplicados a substâncias adicionadas aos alimentos são regulamentados por órgãos de vigilância, como a Food and Drug Administration (FDA) e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Os órgãos reguladores permitem a adição de substâncias que sãoconsideradas como seguras. As agências reguladoras avaliam a segurança de aditivos em alimentos ao considerarem os seguintes parâmetros: finalidade, tipo de alimento, concentração utilizada e população que será exposta. A exposição é avaliada por meio da estimativa da ingestão diária dos alimentos contendo essas substâncias e leva em consideração a concentração adicionada. De acordo com o seu potencial de nocividade, os aditivos são classificados nas categorias A, B e C, sendo a categoria A a menos nociva, e a C, a mais prejudicial. O nível de alerta é estabelecido de acordo com a estrutura química e com a exposição. Um aditivo com alto grau de alerta possui maior probabilidade de apresentar risco de intoxicação se comparado a outro, de baixo grau. Uma vez definido o nível de alerta, testes toxicológicos são realizados para definir sua margem de segurança. Dentre os estudos realizados, temos os testes de genotoxicidade de curto e longo prazos, metabolismo e toxicocinética, toxicidade subaguda em roedores, toxicidade subcrônica em roedores e não roedores, estudos de reprodução e desenvolvimento embrionário e carcinogenicidade. A avaliação da segurança também considera os aditivos indiretos ou não intencionais, ou seja, os que não são adicionados diretamente aos alimentos. Essas substâncias podem estar presentes nos alimentos a partir de superfícies que estejam em contato direto, como embalagens, ou por meio de recipientes utilizados durante o processamento, armazenamento e transporte. Dessa forma, as agências reguladoras irão determinar o tipo de produto que pode ser utilizado em embalagens para determinados alimentos. Suplementos dietéticos são considerados alimentos ou constituintes de alimentos, os quais possuem parâmetros de segurança menores em relação aos aditivos. Esse conceito é baseado no fato de que os suplementos são utilizados por opção, e não ingeridos de forma involuntária, como no caso de aditivos alimentares. Os alimentos transgênicos são avaliados por meio de testes toxicológicos que visam a garantir a segurança no consumo, demonstrando que a modificação genética nas novas variedades de plantas produzidas não é tóxica ou alergênica. 107WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA A hipersensibilidade a alimentos (alergia) está relacionada às respostas do sistema imune, expressas por intermédio de reações cutâneas e efeitos sistêmicos, podendo até mesmo acarretar anafilaxia. Os componentes mais alergênicos são as proteínas contidas nos seguintes alimentos: leite de vaca, clara e gema de ovos, amendoins, soja, bacalhau, camarão, ervilhas, arroz, semente de algodão, algumas frutas (pêssego, goiaba, banana, tangerina e morango), tomate, trigo e quiabo. Efeitos adversos causados pela ingestão de alimentos sem envolverem mecanismos imunológicos são definidos como reações idiossincráticas, as quais se manifestam como resposta a aditivos ou substâncias presentes no produto. Um exemplo é o consumo de chocolate, que, para um determinado grupo de pessoas, produz cefaleia, e seu mecanismo de ação está relacionado à feniletilamina. Reações anafilactoides são caracterizadas pela resposta “tipo alérgica” resultante da ação direta da histamina. Podem ser induzidas a partir da ingestão de frutos do mar e queijo, por exemplo. As reações metabólicas causadas por alimentos são caracterizadas por efeitos tóxicos que só se expressam após o consumo exagerado ou quando esses alimentos são preparados de forma inadequada. A batata, por exemplo, é um dos alimentos mais populares do mundo; contudo, o tubérculo possui glicoalcaloides – especificamente, a solanina. É uma toxina natural que atua no sistema de defesa da batata, mas que, em alta concentração, é tóxica, podendo causar distúrbios gastrintestinais, alucinações, paralisia e até a morte. Resíduos de praguicidas e medicamentos utilizados nos alimentos também possuem potencial de causar intoxicações. No caso de alimentos derivados de animais (leite, queijo e carne), devem ser consideradas as características farmacocinéticas da substância tanto no animal como no ser humano para a avaliação de risco e determinação da segurança para consumo. A contaminação dos alimentos por metais pesados produz intoxicação pela ingestão destes pela população, podendo ocasionar sintomas neurológicos e câncer. Um exemplo é a contaminação de peixes por metilmercúrio, na baía de Minamata, no Japão, cuja população apresentou sintomas neurológicos, como fadiga, irritabilidade, dores de cabeça, falta de sensibilidade nos braços e nas pernas e dificuldade de deglutição. Os sintomas mais graves envolviam distúrbios sensoriais nas mãos e pés, danos à visão e audição, fraqueza e, em casos extremos, paralisia e morte. As toxinas produzidas por peixes e mariscos é de tolerância zero. Qualquer nível detectado pode acarretar sérios danos para a saúde do ser humano. A tetrodotoxina, por exemplo, pode ser ingerida a partir do consumo do peixe baiacu mal preparado, resultando em paralisia muscular, problemas respiratórios e morte. A maioria das doenças causadas por alimentos está relacionada a contaminações por micro-organismos. O botulismo é um exemplo de doença provocada por uma neurotoxina produzida pela bactéria C. botulinum em alimentos enlatados inadequadamente. A intoxicação por C. perfringens ocorre pelo consumo de carne contaminada pelo conteúdo intestinal do animal no momento do abate, cozimento e armazenamento inadequados, causando a morte de enterócitos (célula epitelial do intestino delgado) e a desidratação em função da diarreia que produz. A bactéria S. aureus faz parte da flora normal humana, porém, esse micro-organismo produz toxinas. Os alimentos podem ser contaminados pela manipulação e conservação inadequadas, provocando náuseas e vômitos intensos. A segurança alimentar deve estar voltada a evitar a contaminação microbiológica e preservar a integridade dos alimentos. 108WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O uso de substâncias com os objetivos de induzir ao sono e obter sedação e alívio para as tensões cotidianas é frequente ao redor do mundo. A busca por drogas que proporcionem esses efeitos resultou na síntese de diversos compostos, dentre eles, os barbitúricos. Essa classe de substâncias foi muito empregada como hipnóticos e ansiolíticos, tendo sido amplamente aprovada e receitada pela comunidade médica. Apesar de seu amplo uso, a capacidade de produzir tolerância e de causar dependência e síndrome de abstinência (semelhante ao do álcool) contribuiu para a queda do seu uso. Os benzodiazepínicos surgiram como uma alternativa mais segura e eficiente, contribuindo para a substituição dos barbitúricos por esses fármacos, dependendo da indicação clínica, em especial, como ansiolíticos. Informações detalhadas sobre as principais intervenções farmacológicas realizadas para o tratamento do alcoolismo podem ser encontradas no seguinte artigo: CASTRO, L. A.; BALTIERI, D. A. Tratamento farmacológico da dependência do álcool. Revista Brasileira de Psiquiatria, São Paulo, v. 26, n. 1, 2004. O artigo pode ser acessado em https://www.scielo.br/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462004000500011&lng=en&nrm=i so&tlng=pt. O sistema mesolímbico dopaminérgico é uma via do sistema nervoso central responsável pela recompensa. As estruturas que compõem essa via projetam-se no núcleo accumbens. Esse mecanismo promove o potencial de reforço na manutenção do vício a uma determinada droga. Baseado nisso, foi realizado um documentário chamado Accumbens: entre o prazer e a dependência. O link de acesso é o https://www.youtube.com/watch?v=kIm7hhe5Fz0. 109WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA O advento da biotecnologia moderna, permitindo introduzirem-se genes específicos em culturas de soja e milho, por exemplo, levou a comunidade científica e a sociedade em geral a questionaremas implicações do uso dessa tecnologia no consumo de alimentos provenientes dessas plantas. As preocupações com a biossegurança levam em consideração os riscos potenciais à saúde humana, animal e ao meio ambiente. Os defensores dos alimentos transgênicos alegam que o cultivo poderia reduzir o problema da fome visto que aumentaria a produtividade de variadas culturas. Contudo, diversos estudos revelam que a questão da fome no mundo não é ligada à escassez ou à baixa produção, mas à injusta distribuição de alimentos em função da baixa renda das populações pobres. Casos de reação alérgica a esses alimentos em humanos e animais já foram registrados, e os testes toxicológicos são realizados pelas próprias empresas de transgênicos, o que pode aumentar a exposição dos consumidores aos produtos modificados sem a garantia de que são realmente seguros. Por outro lado, grupos a favor dos alimentos transgênicos garantem que a sua segurança é muito maior quando comparada com alimentos convencionais, os quais são rigorosamente testados para avaliar seu potencial tóxico, seguindo protocolos aprovados por organismos internacionais. Há a alegação de que a sociedade de forma geral não tem conhecimento suficiente sobre o assunto e de que isso favorece a divulgação de informações não fundamentadas a respeito do tema, contribuindo para a disseminação da desconfiança no consumo desses produtos. 110WWW.UNINGA.BR TO XI CO LO GI A | U NI DA DE 4 EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA CONSIDERAÇÕES FINAIS A toxicologia social é caracterizada pela determinação dos danos provocados por fármacos/drogas quando de seu uso não terapêutico e abusivo pela população. A toxicologia de medicamentos abrange não somente as reações adversas a doses terapêuticas, mas também o uso excessivo ou acidental dos fármacos. A dependência desenvolvida por usuários de fármacos/ drogas vai muito além da força de vontade ou conscientização dos danos físicos e sociais: é um mecanismo molecular, caracterizado por modificações no sistema nervoso central, sendo que há indivíduos mais propensos a desenvolverem dependência do que outros. Nem sempre a dependência é acompanhada pela síndrome de abstinência, sendo fenômenos distintos e independentes. O sistema mesolímbico dopaminérgico é o circuito de recompensa responsável pelo prazer gerado com o uso de substâncias químicas, funcionando como um reforçador do comportamento de autoadministração. O uso abusivo de fármacos/ drogas acarreta tolerância nos mais diversos níveis, que podem englobar desde uma sensibilidade individual de ordem genética até mecanismos metabólicos, como a indução do processo de biotransformação. A manutenção do vício pode ocorrer por causa da sensação gratificante gerada pelo fármaco/droga e também para evitar o aparecimento de efeitos desagradáveis em virtude da retirada (sintomas de abstinência). Os opiáceos, como a morfina, são caracterizados pelo efeito analgésico enquanto que estimulantes, como a cocaína e anfetaminas, produzem euforia, ação anorexígena e estimulação motora e mental. Os barbitúricos e benzodiazepínicos são utilizados com o objetivo de obter sedação na diminuição da ansiedade e para tratar convulsão. O etanol e o tabaco são drogas lícitas de amplo consumo pela população, sendo o alcoolismo e o tabagismo considerados graves problemas de saúde pública. O etanol pode ser comumente associado a outros fármacos/drogas, o que pode acarretar a acentuação dos efeitos adversos ou a diminuição da ação terapêutica de um determinado medicamento. A maconha é a droga psicoativa mais consumida em todo o mundo e, apesar de seu baixo potencial de causar dependência, provoca efeitos adversos e serve como porta de entrada para o consumo de outras drogas. A toxicologia de alimentos aborda os efeitos tóxicos que podem ser provocados pelo uso de aditivos químicos, por constituintes alimentares alergênicos ou toxinas, por resíduos de praguicidas e medicamentos e pela contaminação microbiológica. Agências, como a FDA e a ANVISA, regulamentam o uso de aditivos, fiscalizam a presença de substâncias tóxicas e visam a implementar segurança no consumo de alimentos. A contaminação por micro-organismos é a principal causa de intoxicação por alimentos, sendo ela evitável por medidas que incluem boas práticas de higiene e manipulação. 111WWW.UNINGA.BR ENSINO A DISTÂNCIA REFERÊNCIAS CALDAS, L. Q. A. Risco potencial em toxicologia ambiental. In: BRILHANTE, O. M.; CALDAS, L. Q. A. Gestão e avaliação de risco em saúde ambiental. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999. CÂMARA, B. Membrana plasmática de células eucariontes. In: Biomedicina Padrão. 2018. Disponível em: https://www.biomedicinapadrao.com.br/2018/09/membrana-plasmatica-de- celulas.html. Acesso em: 6 out. 2020. CARVALHO, L. M. de. Regulação transcricional de genes envolvidos no sistema de recompensa em um modelo animal de ingestão de dieta hipercalórica e etanol. 2015. 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