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1 Disciplina: Práticas de intervenção comportamental, comunicativa, psicomotora e sensorial junto a estudantes com TGD Autor: Esp. Viviane Possa Patrício Revisão de Conteúdos: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm Designer Instrucional: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm Revisão Ortográfica: Esp. Lucimara Ota Eshima Ano: 2020 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais. 2 Viviane Possa Patrício Práticas de intervenção comportamental, comunicativa, psicomotora e sensorial junto a estudantes com TGD 1ª Edição 2020 Curitiba, PR Faculdade UNINA 3 Faculdade UNINA Rua Cláudio Chatagnier, 112 Curitiba – Paraná – 82520-590 Fone: (41) 3123-9000 Coordenador Técnico Editorial Marcelo Alvino da Silva Conselho Editorial D.r Alex de Britto Rodrigues / D.ra Diana Cristina de Abreu / D.r Eduardo Soncini Miranda / D.ra Gilian Cristina Barros / D.r João Paulo de Souza da Silva / D.ra Marli Pereira de Barros Dias / D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd / D.ra Wilma de Lara Bueno / D.ra Yara Rodrigues de La Iglesia Revisão de Conteúdos Alexandre Kramer Morgenterm Designer Instrucional Alexandre Kramer Morgenterm Revisão Ortográfica Lucimara Ota Eshima Desenvolvimento Iconográfico Juliana Emy Akiyoshi Eleutério FICHA CATALOGRÁFICA PATRÍCIO, Viviane Possa. Práticas de intervenção comportamental, comunicativa, psicomotora e sensorial junto a estudantes com TGD / Viviane Possa Patrício. – Curitiba: Faculdade UNINA, 2020. 57 p. ISBN: 978-65-86092-53-0 1. Comunicação. 2. Criança. 3. TGD. Material didático da disciplina de Práticas de intervenção comportamental, comunicativa, psicomotora e sensorial junto a estudantes com TGD – Faculdade UNINA, 2020. Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 4 PALAVRA DA INSTITUIÇÃO Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) à Faculdade UNINA! Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão Universitária. A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas também brasileiros conscientes de sua cidadania. Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e grupos de estudos, o que proporciona excelente integração entre professores e estudantes. Bons estudos e conte sempre conosco! Faculdade UNINA 5 Sumário Prefácio ..................................................................................................... 06 Aula 1 – O aluno com TGD e a escola ....................................................... 07 Apresentação da aula 1 ............................................................................. 07 1.1 TGD: o que é e quais são as suas características ......................... 07 1.2 Inclusão escolar do estudante com TGD ...................................... 12 1.2.1 Adaptações de pequeno porte ................................................... 16 Conclusão da aula 1 .................................................................................. 17 Aula 2 – Estabelecendo a comunicação: uso da PECS ............................. 18 Apresentação da aula 2 ............................................................................ 18 2.1 Linguagem e comunicação ........................................................... 18 2.2 PECS ............................................................................................ 20 2.2.1 Benefícios .................................................................................. 20 2.3 As figuras utilizadas na PECS ...................................................... 21 2.4 Como utilizar a PECS? ................................................................. 24 Conclusão da aula 2 .................................................................................. 29 Aula 3 – PECS ........................................................................................... 30 Apresentação da aula 3 ............................................................................ 30 3.1 Introduzindo novas figuras ............................................................ 30 Conclusão da aula 3 .................................................................................. 41 Aula 4 – Avaliação e intervenção ............................................................... 41 Apresentação da aula 4 ............................................................................. 41 4.1 Avaliação ...................................................................................... 41 4.2 Intervenção e substituição de comportamentos ............................ 43 4.2.1 Métodos de intervenção ............................................................. 44 4.3 Substituição de comportamentos .................................................. 47 4.4 Rotinas diárias .............................................................................. 49 4.4.1 Atividades sociais ...................................................................... 49 4.4.2 Atividades esportivas ................................................................. 50 4.4.3 Participação da família e da equipe ........................................... 51 Conclusão da aula 4 .................................................................................. 52 Conclusão da disciplina ............................................................................. 54 Índice Remissivo ........................................................................................ 55 Referências ............................................................................................... 57 6 Prefácio Lidar com estudantes que apresentam Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD) pode ser um desafio para os educadores, isso pode ocorrer devido às singularidades e inconstâncias que são apresentadas pelos alunos com TGD. Por este motivo, é importante que se conheça quais são as principais características que podem aparecer nos casos de TGD, além de suas diferentes formas de apresentação. Assim é possível fazer as adaptações necessárias para promover a inclusão no ambiente escolar. Esses tópicos são trabalhados já na primeira aula. Devido à importância de estabelecer uma forma de contato para compreender o mundo interior da criança e fazê-la acessar o mundo externo, diminuindo assim as barreiras comunicacionais, na segunda aula diversos aspectos da comunicação serão abordados. Uma importante ferramenta nesse processo, a PECS, será explicada com detalhes na segunda e terceira aulas, tornando possível a aplicação deste método no dia a dia para interver no âmbito comunicacional. Por fim, na quarta aula, a avaliação bem como as práticas para intervenção e substituição de comportamentos serão trabalhados, abordando as rotinas da vida diária e as atividades sociais e esportivas, assim como a importância do envolvimentoda família e da equipe multidisciplinar nas intervenções. Bons estudos! 7 Aula 1 – O aluno com TGD e a escola Apresentação da aula 1 Nesta primeira aula serão abordadas a classificação e as características importantes do TGD que devem ser observadas para que a inclusão de um aluno com essas características no ambiente escolar ocorra de maneira a diminuir as dificuldades, tanto para os professores e equipe, quanto para o próprio aluno e sua família. 1.1 TGD: o que é e quais são as suas características O TGD (Transtorno Global do Desenvolvimento) abriga diversos diagnósticos que apresentam características semelhantes e, por este motivo, apresentam-se em subgrupos relacionados a ele. No CID-10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas relacionados à Saúde) os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD, código F84) abrangem os seguintes diagnósticos: ➢ Autismo infantil (F84.0); ➢ Autismo atípico (F84.1); ➢ Síndrome de Rett (F84.2); ➢ Transtorno Desintegrativo da Infância (F84.3); ➢ Transtorno com Hipercinesia associada a retardo mental e a movimentos estereotipados (F84.4); ➢ Síndrome de Asperger (F84.5); ➢ Outros TGD (F84.8); ➢ TGD sem outra especificação. (F84.9). Embora atualmente ainda seja utilizado o CID-10, o CID-11 entrará em vigor no início do ano de 2022, por isso é interessante estar atento a essas mudanças de classificação. No CID-11 todos esses diagnósticos serão agrupados no Transtorno do Espectro do Autismo (6A02), subdividindo-se de acordo com os prejuízos 8 apresentados na linguagem funcional e deficiência intelectual, da seguinte forma: ➢ Transtorno do Espectro do Autismo sem deficiência intelectual (DI) e com comprometimento leve ou ausente da linguagem funcional (6A02.0); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com comprometimento leve ou ausente da linguagem funcional (6A02.1); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo sem deficiência intelectual (DI) e com linguagem funcional prejudicada (6A02.2); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com linguagem funcional prejudicada (6A02.3); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo sem deficiência intelectual (DI) e com ausência de linguagem funcional (6A02.4); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo com deficiência intelectual (DI) e com ausência de linguagem funcional (6A02.5); ➢ Outro Transtorno do Espectro do Autismo especificado (6A02.Y); ➢ Transtorno do Espectro do Autismo, não especificado (6A02.Z). Assim, embora vá haver uma mudança nas classificações, as características comuns a esses transtornos permanecem as mesmas, porém, na nova versão, elas ficam mais evidentes. O CID-11 também apresentará maior coesão com as descrições encontradas no DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), pois alguns pontos apresentavam incongruências entre os dois. Por esse motivo, neste material serão elucidadas as características de linguagem funcional e deficiência intelectual, juntamente com as outras características que se apresentam normalmente, como estereotipias e problemas de comportamento. Após uma breve elucidação sobre essas características, a inclusão do aluno com TGD no ambiente escolar será abordada, enfatizando como superar as barreiras que podem advir dessas características. 9 Linguagem funcional: a linguagem funcional se refere à habilidade de comunicação mais básica, na qual um indivíduo consegue expressar as suas necessidades ou vontades de maneira simples. São exemplos de linguagem funcional frases como: “Estou com fome”, “Estou machucado!” e “Quero ir ao banheiro!”. A linguagem funcional não expressa pensamentos complexos, críticos ou subjetivos. Além disso, a linguagem funcional não precisa ser necessariamente falada, mas também pode ser expressa por gestos, figuras, desenhos, linguagens de sinais e toda e qualquer ferramenta alternativa ou aumentativa de comunicação. A linguagem funcional é aquela apresentada pelas crianças logo nos primeiros anos de vida, porém, crianças que apresentam dificuldades ou deficiências de linguagem podem trabalhar para a aquisição da linguagem funcional até idades mais avançadas. Crianças não verbais podem ter grandes benefícios de comunicação com o uso de ferramentas que permitam sua interação com o meio, diminuindo suas frustrações e melhorando seu comportamento. Deficiência Intelectual: a deficiência intelectual vem passando por mudanças quanto a sua denominação e classificação nos últimos anos, sendo cada vez mais interpretada como uma dificuldade na capacidade de adaptação e no uso da inteligência prática. Pode ser dividida em leve, moderada, grave ou profunda, sendo que essa classificação está atrelada ao Quociente de inteligência (QI), principalmente relacionada aos desvios padrão abaixo da média populacional. Ou seja, ela se apresenta de formas diferentes de acordo com o contexto e ambiente, mas leva em consideração os domínios sociais e se baseia na funcionalidade de cada indivíduo, nas capacidades que tem, nas funções que realiza de forma independente e dos apoios que são necessários para a realização de determinadas atividades. Isso se deve às discussões que têm havido em torno do tema, que trazem um paradigma no qual as capacidades e potencialidades do indivíduo devem ser valorizadas ao invés de focar nos déficits e deficiências. Assim, há também uma classificação que é baseada na classificação de níveis de suporte, a escala SIS (Do inglês, Supports Intensity Scale, ou Escala de Intensidade de Apoio ou Suporte). 10 Os apoios ou suportes são as estratégias ou recursos dos quais o indivíduo depende para que possa melhorar seu funcionamento individual, esses apoios buscam desenvolver seus interesses, sua educação e o próprio bem-estar. Essa escala avalia se há necessidade de apoios esporádicos, de alta ou baixa intensidade, ou ainda se os apoios são permanentes e se tornam necessários de maneira constante para permitir que se realizem atividades de vida diária. Estereotipias: as estereotipias são comportamentos repetitivos que não apresentam uma relação com a situação durante a qual se manifestam, podem ser verbais ou motoras. As estereotipias verbais são aquelas que se apresentam por intermédio da fala, o tipo mais comum de ser observado são as ecolalias, que são repetições de sons, palavras, sílabas e até mesmo frases de forma constante ou intermitente. Sua principal característica, junto da repetição, é a ausência de significado do que está sendo repetido pela criança. As ecolalias podem se manifestar por meio de gritos, sussurros (até mesmo de forma praticamente inaudível em alguns casos) ou mesmo de maneira falada. Já as estereotipias motoras são as mais conhecidas e podem ser observadas pela repetição de movimentos que ocorrem de forma rítmica, estereotipada e sem algum tipo de finalidade aparente. Essa movimentação não é involuntária, ou seja, a criança tem controle sobre esses movimentos e, embora eles não apresentem um significado, muitas vezes podem ser uma maneira da criança descarregar suas emoções ou se afastar de vivenciar alguma situação que a desagrade. Por isso é comum ver o aumento na frequência e ritmo de alguns movimentos quando a criança experiencia uma atividade de que não gosta, como tomar banho, por exemplo, pois muitas vezes faz uso desse recurso para evitar a atividade. Os movimentos estereotipados podem ser apresentados de diferentes formas, como rocking (quando a criança balança o corpo para frente e para trás) e flapping (abanar ou sacudir as mãos), além de estalar os dedos ou sacudir outras partes do corpo, como a cabeça, pernas ou braços, além de movimentações laterais, dentre diversos outros tipos. 11 Algumas vezes asestereotipias motoras podem tomar características de comportamentos autoagressivos e até mesmo chegar à automutilação, quando a criança se bate, se morde, arranca os próprios cabelos (tricotilomania), aperta os olhos com os dedos com força ou se bate contra a parede. Esses comportamentos violentos podem se direcionar a colegas, cuidadores, familiares, professores e terceiros de forma geral. Ataques violentos podem ocorrer em situações nas quais a criança é contrariada ou se sente frustrada por algum motivo. Nesses casos, é importante tentar prever e evitar esses ataques, observando situações nas quais a criança tende a se mostrar irritada ou impaciente e levar a criança para um ambiente confortável e tentar distraí-la com algum objeto ou brinquedo de que ela goste até que ela se acalme. Alguns profissionais indicam abraçar a criança durante essas crises para acalmá-la, mas deve-se tomar cuidado com perfis que não toleram toque ou sensação de aperto, pois isso pode deixá-los ainda mais irritados. De qualquer modo é importante, nesses momentos, afastar a criança de janelas, móveis com quinas proeminentes, estruturas de vidro, objetos pontiagudos e qualquer outra estrutura na qual ela possa se ferir ainda mais. Essas manifestações podem se apresentar de maneira muito variada, sendo mais leves em algumas crianças e mais graves em outras. Além disso, é possível que reações anormais de sensibilidade à luz ou ao som possam se manifestar, tanto uma hipersensibilidade, quando a criança apresenta-se mais sensível aos estímulos e tende a evitá-los, quanto uma hipossensibilidade, quando a sensibilidade é diminuída a tal ponto que a criança aproxima-se de luzes fortes ou se posiciona muito próxima a aparelhos sonoros, por exemplo. Da mesma forma que ocorre com a luz e o som, as sensibilidades olfatória, tátil e gustativa também podem se mostrar alteradas. É o caso de crianças que não toleram cheiros fortes, sensação de aperto, são intolerantes a certas roupas ou alimentos (sabores) ou ainda têm uma preferência por determinadas texturas, alimentos ou cheiros. As dificuldades no estabelecimento de contato visual também podem ser experienciadas, além de resistências na socialização, aversão ao toque, dificuldade na compreensão de regras, dentre outros aspectos. 12 É importante atentar que cada caso é um caso, uma criança com TGD pode manifestar preferências diametralmente opostas a outra criança com um quadro semelhante. Para conhecer os pormenores do comportamento de cada um, deve-se, se possível, conversar com os pais, os cuidadores ou os profissionais que fazem o acompanhamento da criança. A atuação da equipe permite ao professor dirimir suas apreensões ao acolher estes alunos em sala e melhor compreender como lidar com cada característica. A observação também é fundamental no dia a dia e pode revelar detalhes importantes que, às vezes, passam despercebidos. 1.2 Inclusão escolar do estudante com TGD Os debates sobre escola inclusiva foram ganhando espaço nos últimos trinta anos, criando uma cisão entre a educação especial e a inclusão de alunos com qualquer característica de necessidade especial no ensino regular. Esse fenômeno fez com que muitos professores acabassem por se sentir confusos e desconfortáveis por não saber qual a melhor forma de acolher crianças com um perfil tão diversificado como o TGD ou TEA. Afinal, agora o professor precisa lidar com crianças que apresentam características e comportamentos peculiares e nem sempre tem o conhecimento ou formação adequada para acolher esses estudantes. Isso pode levar o professor a um comportamento de acolhimento muito permissivo ou até mesmo a frustração por não obter resultados satisfatórios, levando ao abandono do aluno. É comum que os professores tenham dificuldades em adaptar o aluno com TGD às rotinas escolares e, por vezes acabem privilegiando o aluno com uma postura permissiva, permitindo a eles atitudes que não seriam permitidas a outros alunos. Por isso, logo no começo, é importante não focar apenas em agradar o aluno na tentativa de diminuir as suas estereotipias. Permitir a ele acesso a brinquedos, por exemplo, em momentos em que os outros alunos não podem brincar, apenas reforça os comportamentos que não são desejados. 13 Além disso, pode criar situações de conflito com outros estudantes, educadores e outros membros da equipe. Mas, principalmente, prejudica o próprio estudante com TGD. O estabelecimento de rotinas pode ser difícil no começo, mas essas crianças têm um apego muito grande à rotina. Assim, uma vez estabelecida, será fácil manejar esse aluno para as rotinas de sala de aula, entrada, saída, lanche e intervalo. Seu acolhimento em sala de aula tem um forte viés para facilitar seu processo de criação de vínculos afetivos, construção e desenvolvimento do aprendizado. Embora crianças com TGD tenham um desenvolvimento peculiar na linguagem, como dificuldade em expressar suas vontades, sentimentos e necessidades, essas barreiras podem ser superadas com uso de diversas estratégias disponíveis, como a PECS, por exemplo, que será abordada mais adiante nessa disciplina. Devido à singularidade presente nesse perfil de aluno, é importante considerar suas capacidades, habilidades e preferências para estimular o desenvolvimento de suas potencialidades. Primeiramente, deve-se verificar quais são as áreas nas quais o aluno apresenta suas maiores dificuldades, pois uma vez bem avaliado, as intervenções poderão ser pontuais e mais efetivas. Além disso, é sempre importante lembrar que a avaliação deve ser feita de forma periódica, como um processo, para estabelecer as conquistas do aluno e verificar suas dificuldades e a eficiência da intervenção. Durante todo esse processo, o professor deve contar com o apoio da equipe pedagógica, da família e dos profissionais da saúde envolvidos no cuidado da criança, para que possam atuar em conjunto a fim de estabelecer o melhor manejo de cada caso, em particular. Uma criança com TGD pode apresentar déficits em diferentes áreas da cognição que devem ser identificados para servirem como base do trabalho, algumas dessas áreas são: ➢ Comunicação; 14 ➢ Socialização; ➢ Comportamento. Comunicação: as dificuldades de estabelecer um diálogo com crianças com TGD, em especial aquelas que apresentam mutismo seletivo ou alguma outra dificuldade verbal, pode levar o professor ao uso de ferramentas alternativas para estabelecer a comunicação. Em muitos casos, a família já trará para a escola as informações a respeito das ferramentas que são utilizadas para que não haja uma quebra na rotina da criança. A comunicação não depende da linguagem falada. Porém, em outros casos, caberá à escola instruir os pais sobre a existência dessas ferramentas e iniciar a sua aplicação. A comunicação com um estudante com TGD deve partir dos interesses do aluno, para tentar captar sua atenção, estabelecer vínculos e estimular a sua autonomia nesse aspecto. Dessa forma, o mais importante é, inicialmente, achar meios pelos quais seja possível se comunicar com a criança. Esses meios devem ser fáceis para que ela os utilize e que sejam compreensíveis. O professor pode contar com vários métodos, que podem diferir de uma criança para a outra, de acordo com seus interesses e personalidade. Alguns métodos que podem ser aplicados são: ➢ Linguagem de sinais; ➢ PECS (Picture Exchange Communication System); ➢ Caderno de signos / figuras; ➢ Aplicativos para dispositivos móveis ou tablets. Essas ferramentas levam algum tempo para serem implementadas, mas seu uso permite estabelecer a comunicação e, em muitos casos, também estimula a linguagem falada, como em casos de mutismo seletivo, como será abordado mais profundamente na aula 2, em que a aplicação da PECSserá explorada. 15 Socialização: é um dos aspectos mais complexos de serem trabalhados, pois as relações interpessoais são um grande desafio para os alunos com TGD, socializar com seus pais, familiares e aqueles que participam de suas rotinas. O convívio com crianças da mesma idade e com interesses similares pode auxiliar esse aspecto, desde que respeitando os interesses e a forma de comunicação estabelecida com o estudante com TGD. Uma conversa franca com a classe, demonstrando a forma de comunicação que deve ser utilizada e explicando as características do TGD, pode despertar nos colegas o interesse em cooperar para auxiliar o aluno com Transtorno Global de Desenvolvimento em sua socialização. Comportamento: além das estereotipias motoras e verbais, um aluno com esse transtorno pode apresentar comportamentos agressivos contra si mesmo e contra terceiros, sendo necessário um cuidado especial nessa esfera para evitar qualquer tipo de dano. As barreiras para a socialização e a falta de compreensão do espaço do outro, somadas a interesses monotemáticos podem tornar difícil a criação de vínculos afetivos e amizades. Essas características dificultam a inclusão do aluno com TGD em atividades e brincadeiras de grupo. Nem por isso deve-se deixar de lado a socialização da criança e permitir apenas brincadeiras ou jogos individuais, sua socialização e comunicação deve ser estimulada de maneira gradativa, inicialmente em duplas ou trios, indo de grupos pequenos a grupos maiores. Como já mencionado, o aluno com TGD tem um apego às rotinas, assim, sua dificuldade inicial de se adaptar ao ambiente escolar se deve a uma mudança em sua rotina anterior (que poderia ser ficar em casa, por exemplo), para uma nova rotina (a rotina escolar). Por isso, deve-se estabelecer limites e deixar claro as regras e normas, além da ordem das atividades que devem ser, sempre que possível, explicadas com antecipação. A utilização de figuras para o estabelecimento dessas rotinas pode ser de grande auxílio para o profissional e para o aluno, pois com o tempo e a associação da figura com a atividade, mesmo as pequenas trocas de ordem na rotina, podem ser um pouco facilitadas. 16 1.2.1 Adaptações de pequeno porte Deve-se lembrar que o professor tem a liberdade de estabelecer adaptações de pequeno porte em sala de aula, que podem facilitar bastante a inclusão e o convívio do aluno com TGD, além de proporcionar conforto e segurança a ele. As adaptações de pequeno porte (também chamadas de adaptações não significativas) são as adaptações que o próprio professor pode fazer tanto no currículo como dentro de sua sala de aula, para facilitar a inclusão de alunos que apresentam alguma necessidade especial no seu processo de construção do conhecimento. Por isso, conhecer as particularidades do aluno é fundamental para perceber quais as adaptações que podem ser feitas e de que forma, como o uso de cortinas escuras em determinada parte da sala para reduzir a luminosidade, por exemplo. O professor pode alterar o método de ensino, os objetivos e o conteúdo a fim de facilitar a compreensão e o acesso ao aluno que apresenta alguma dificuldade. Assim, se houver muita dificuldade para adaptar um aluno porque a turma se senta com as carteiras posicionadas em U, pode-se posicioná-las em fileiras, de forma individual, para que o aluno fique mais à vontade. Ou posicioná-las duas a duas, frente a frente, para que se trabalhem em duplas, estimulando o contato visual e a socialização, dependendo da tolerância do aluno. O método de ensino pode passar a ser mais visual, utilizando mais desenhos e figuras para facilitar a compreensão e a memorização, além de despertar mais interesse no conteúdo. Pode-se utilizar adaptações comunicativas como a PECS para que o aluno participe das aulas, ou livros de figuras para que ele se expresse de uma maneira facilitada. Essas adaptações também devem ser observadas na flexibilização de tempo para a realização de atividades e sempre utilizadas nos momentos de avaliação para manter o padrão utilizado pelo aluno no seu dia a dia escolar. 17 Assim, se o aluno sempre utiliza figuras para se comunicar, no momento de avaliação essa adaptação deve ser mantida para não prejudicar o aluno que faz uso desse recurso no dia a dia e depende dele para se expressar durante a avaliação. Ou seja, há muito o que pode ser feito no dia a dia, dentro de sala de aula, para tornar o ambiente mais confortável para o aluno e facilitar seu processo de aprendizagem, e o professor tem a liberdade de fazer essas e outras alterações. Por fim, deve-se lembrar que, caso o professor observe a necessidade de adaptações maiores para atender as necessidades de algum aluno, como modificações na estrutura de banheiros, áreas comuns como pátio ou corredores (adaptações de grande porte), deve comunicar à direção da escola, que deverá verificar essas possibilidades de alteração junto às secretarias municipal ou estadual de educação. Assim, embora a inclusão do aluno com TGD possa assustar um pouco os professores e a equipe, até mesmo os pais, em um primeiro momento, ela deve ser levada adiante com calma e respeitando o ritmo da criança, conhecendo suas características e tentando oferecer a ela um bom ambiente com os estímulos adequados para desenvolver suas potencialidades. Conclusão da aula 1 Nesta primeira aula foram abordadas as formas de classificação do Transtorno Global do Desenvolvimento, além de suas principais características e a variação e diversificação das manifestações dessas características. Na segunda parte da aula, foram comentados aspectos da inclusão do aluno com TGD no ensino regular. Atividade de Aprendizagem Escreva um pequeno texto descrevendo alterações de pequeno porte possíveis de serem feitas observando as características do TGD vistas nessa aula. Não esqueça de relacionar a adaptação às características exibidas pelo aluno. 18 Aula 2 – Estabelecendo a comunicação: uso da PECS Apresentação da aula 2 Como visto na aula anterior, a criança com TGD apresenta dificuldades na linguagem funcional. Por esse motivo, estabelecer uma forma de comunicação para criar uma ponte entre a criança e o mundo é fundamental e uma das ferramentas para tornar isso possível é a PECS. 2.1 Linguagem e comunicação No dia a dia, linguagem e comunicação são utilizadas como sinônimos, porém a comunicação pode se estabelecer de diferentes formas, não necessariamente utilizando a linguagem. Por exemplo, quando um recém-nascido chora e é atendido pelos pais, ele percebe que dessa forma ele consegue modificar seu ambiente e, assim, estabelece uma forma de comunicação. Posteriormente, o choro o auxiliará no desenvolvimento da linguagem falada, pois a fala é uma evolução do choro. Crianças pequenas, que estão desenvolvendo ou ainda não desenvolveram a linguagem falada, também utilizam o corpo para se comunicar, apontando para aquilo que desejam, como quando querem beber água ou ir ao banheiro. Percebe-se que mesmo na ausência da linguagem, a comunicação se estabelece quando, ao emitir uma mensagem (choro, apontar o copo de água etc.) há uma modificação no ambiente (os pais dão colo ou servem água, por exemplo). Para que a comunicação e, consequentemente, a linguagem se desenvolvam de maneira adequada, vários fatores devem ser levados em consideração. Na criança com TGD, algumas dessas etapas podem apresentar problemas, por isso, é importante saber como os órgãos dos sentidos se relacionam com o ambiente e como o corpo reage aos estímulos externos. Esse tipo de problema pode estar presente em diferentes pontos, que variam de indivíduo para indivíduo, mas são alterações que tornam um indivíduo 19 mais sensível (hipersensível) ou menos sensível(hipersensível) a sons ou luzes, por exemplo. As alterações de percepção e sensação podem prejudicar também essa interação com o ambiente que estabelece a comunicação e consequentemente, o desenvolvimento da linguagem. As sensações são um processo pelo qual os estímulos que são captados no ambiente pelos órgãos dos sentidos são transmitidos ao cérebro. Assim, ao tocar em um bichinho felpudo, o tato (órgão de sentido) envia ao cérebro uma sensação (felpudo). Já a percepção é o processo realizado pelo cérebro para organizar, elaborar e interpretar as informações recebidas. Nesse mesmo exemplo, o cérebro reconhece a sensação “felpudo”, a associa com outros sentidos (por exemplo um som de ronronar e a visão de um gato), organiza essas informações (acariciar um gato) e interpreta (eu gosto de acariciar o gato / o gato gosta de ser acariciado). Os órgãos dos sentidos trabalham constantemente para oferecer essas informações ao cérebro, que, por sua vez, processa essas informações de forma contínua. Por esse motivo, a comunicação se dá de forma que as sensações (ouvir as palavras, o tom de voz, ver a linguagem não verbal e a movimentação do corpo) possam ser processadas e gerar a percepção de que a mensagem foi ou não compreendida, se vai ou não alterar seu ambiente. A falha ao emitir a mensagem (mutismo seletivo, por exemplo) pode trazer frustrações para a criança, por não conseguir se comunicar, e, às vezes, por não conseguir processar adequadamente e perceber o motivo pelo qual sua mensagem não foi compreendida. A falha no desenvolvimento da linguagem funcional e mesmo da linguagem falada nas crianças com TGD, urge por um método que torne possível o estabelecimento da comunicação. Por esses motivos, a PECS surge como uma ferramenta que auxilia no desenvolvimento da comunicação, estabelecendo-a inicialmente. Com seu uso frequente, a linguagem funcional também tende a se desenvolver, bem como serve de estímulo facilitador para a aquisição da linguagem falada. 20 A dificuldade de socialização e interação social também pode se beneficiar da utilização da PECS, pois retira a criança e seu interlocutor do papel central da comunicação e o direciona a um objeto externo a ambos: a figura. 2.2 PECS A PECS (do inglês, Picture Exchange Communication System, que significa Sistema de Comunicação por Troca de Figuras) é um método que utiliza figuras para estabelecer a comunicação. Esse método valoriza aqueles indivíduos que têm uma facilidade maior de compreender o que veem, como as pessoas com um estilo de aprendizagem mais visual. Esse sistema é categorizado como uma intervenção comunicacional alternativa e ampliada e faz uso de cartas com figuras que representam uma gama de objetos, cores e até mesmo adjetivos e verbos para tornar possível o estabelecimento da comunicação. Seu desenvolvimento ocorreu no ano de 1985, baseado no trabalho de Skinner e dos princípios da ABA, que serão abordados mais adiante nesta disciplina. O objetivo da sua criação foi ensinar habilidades de comunicação funcional, com foco particular no estímulo ao desenvolvimento da comunicação espontânea. Dentre suas vantagens se encontra o custo reduzido dos materiais, a facilidade de sua aplicação e a variabilidade de contextos e situações nas quais pode ser utilizada. Uma vez que a criança mostre aderência ao método, os pais, familiares, professores e profissionais da saúde podem fazer uso do método para estabelecer a comunicação. 2.2.1 Benefícios Como sua utilização é muito ampla, diversos testes e pesquisas foram realizados para verificar a sua eficiência em diferentes populações, ou seja, em pessoas com diferentes graus de comprometimento, idade, sexo e em diversas comunidades pelo mundo. 21 Por meio dessas pesquisas, foi se comprovando sua eficiência na melhora da comunicação em diversos tipos de condições, como TGD, TEA (Transtorno do Espectro Autista), surdez e paralisia cerebral. Por esse motivo, em 2008, ela foi considerada pelo NPDC (The National Professional Development Center on Autism Spectrum Disorder, em português Centro Nacional de Desenvolvimento Profissional sobre Transtorno do Espectro Autista), uma das 24 práticas baseadas em evidência, reforçando assim seu papel como uma prática eficiente. Porém, sua utilização não é apenas para desenvolver uma forma eficiente de comunicação, mas o uso desse método proporciona ainda benefícios que podem ser observados em outros campos. Com a utilização frequente da PECS pode-se observar uma melhora no contato visual e nos comportamentos sociais, além disso, ela desenvolve e estimula o matching, que se refere à correta associação entre um objeto e seu nome. Além disso, esse método tem um papel importante no desenvolvimento da independência e da tomada de iniciativa, já que por meio de sua utilização, é possível que a criança tome a iniciativa para se comunicar, podendo expressar seus desejos e vontades. Por fim, uma das principais críticas ao método é que a utilização de figuras para se comunicar pode atrasar, dificultar ou mesmo impedir a criança de utilizar a linguagem verbal. Essa crítica se mostra infundada, devido ao aumento de vocabulário proporcionado pelo método e ao estímulo para o desenvolvimento da fala que é proporcionado ao utilizar o método da maneira adequada. Por fim, um grande benefício da utilização desse método é a inclusão da criança no meio escolar e na vida em sociedade, o que é indispensável para o desenvolvimento de novas habilidades. 2.3 As figuras utilizadas na PECS Como já foi comentado anteriormente, um dos benefícios da utilização da PECS é o seu baixo custo, um dos motivos para que se obtenha esse benefício é porque não há uma padronização para a utilização das figuras. 22 Assim, as figuras podem ser confeccionadas pelos professores, pais ou profissional da saúde, utilizando-se dos materiais aos quais podem ter acesso, utilizando diferentes cores ou tamanhos que sejam mais fáceis de visualizar ou portar. É possível também adquirir os kits com figuras prontos, há kits mais completos indicados para iniciantes que apresentam figuras de brinquedos, comida, móveis e partes do corpo, além de palavras de ação. Os kits podem variar em abrangência ou ênfase, além do número de figuras de que são compostos ou material de que são feitos. Há vários critérios que podem ser utilizados para escolher o kit de figuras, já que existem diversas opções disponíveis com diferentes ênfases, como emocional (para expressar felicidade, raiva, tristeza, dentre outros), calendários (com dias da semana) e diversas outras opções que podem ser escolhidas de acordo com as preferências da criança ou dos pais, custo, abrangência, nível no qual a criança se encontra, dentre outros. Embora não exista uma padronização nas figuras em si, é importante que as figuras sejam claras e específicas, o que as deve tornar claramente distinguíveis uma da outra. Por exemplo, uma figura com o desenho de uma casa pode designar tanto a casa em que a criança vive, como a casa em que um familiar vive, mas uma vez que a figura seja designada para uma finalidade (casa da criança) ela não poderá mais ser utilizada para qualquer outro fim (representar a casa da vovó, por exemplo). Deve-se evitar confusões fazendo figuras específicas para cada caso, por exemplo: A casa em que a criança vive aparece desenhada com um telhado vermelho, a casa da vovó é representada por um telhado verde e assim por diante. Isso deve ser feito para evitar confusões de comunicação, assim, se ao sair da escola com a criança um dos pais apresentar a figura da casa com telhado verde, a criança saberá que estão indo para a casa da vovó e não para a sua própria casa. Por isso, ao decidir confeccionar os próprios kits de figuras, é possível fazê-lo tirando fotos da própria casa, da casa da vovó, da escola e de um biscoito de que a criança goste, no lugar de utilizar figuras genéricas. 23 Esses processos de confecção levam tempo para elaboração e exigem dedicação, mas pode-se atualmente utilizar softwares que permitem criar ou modificar as figuras com a finalidade de transformá-las em figuras comunicativas, porém nem sempre é possível encontrá-los gratuitamente. Ao confeccionar as próprias figuras, deve-se ter o cuidado de recortá-las cuidadosamente (evitando arestas pontiagudas) e plastificá-las para que possam ter maior durabilidade. A forma como serão expostas ou organizadas também deve ser levada em consideração, pois assim é possível colar imãs ou velcro na parte posterior da figura, de forma que seja possível posicionar e reposicionar cada figura de acordo com a necessidade. Assim, caso se decida demonstrar para a criança uma rotina que vai ocorrer ao acordar pela manhã, as figuras podem ser coladas na contracapa de um caderno demonstrando a ordem dos eventos. No caso de apresentação de rotinas, é importante deixar óbvio a sequência dos eventos utilizando-se de setas. Por exemplo: “Trocar de roupa -> Pentear os cabelos -> Escovar os dentes [...]” e assim por diante. Em alguns casos, talvez seja necessário ser ainda mais específico para que a criança compreenda. Nesses casos, o ato de trocar de roupa, se transforma em: “Retirar a calça do pijama -> Colocar a calça de uniforme da escola -> Colocar as meias [...]”. É importante que os locais nos quais as rotinas são expostas também tenham o tamanho adequado, como nos casos em que as rotinas precisam ser mais detalhadas, os quadros precisarão ser maiores. Além do cuidado ao confeccionar as figuras, deve-se também ter um local adequado para armazená-las e que possa ficar sempre ao alcance da criança (e ela saiba onde está e que pode pegar sempre) para estimular o desenvolvimento da autonomia dela em se comunicar. 24 Uma forma muito comum de armazenar as figuras é em fichários com sacos plásticos, dentro dos quais ficam as figuras, que podem ser divididas por categorias (comidas, brinquedos, cores etc.). Assim, quando a criança quiser brincar com determinado brinquedo, por exemplo, pode ter acesso fácil às figuras para poder comunicar o que deseja. 2.4 Como utilizar a PECS? Para que a PECS seja implementada, deve-se seguir um protocolo que é dividido em 6 fases, são elas: Fase 1: como se comunicar; Fase 2: distância e persistência; Fase 3: discriminação de figuras Fase 4: estrutura de sentença; Atributos e expansão do vocabulário: Fase 5: respondendo a perguntas; Fase 6: comentário espontâneo e responsivo. Antes de começar a implementar essa ferramenta é importante que a pessoa responsável por dar início a esse processo seja um familiar, cuidador ou professor, que elabore um inventário do que a criança mais gosta. Com base nas preferências particulares da criança, é possível iniciar com a criação de figuras que apresentem o brinquedo favorito ou as comidas e atividades de que a criança mais gosta. As figuras criadas nessa etapa serão fundamentais para dar início ao processo e serão utilizadas nas três primeiras fases. Apenas depois desse inventário e criação das figuras é que se desenvolve a primeira fase. Também é importante destacar, logo no início, que crianças diferentes podem apresentar tempos diferentes em cada uma dessas fases, algumas progredindo mais rapidamente do que outras. 25 Para isso, há critérios específicos de habilidades que devem ser observados para passar de uma fase a outra, respeitando o ritmo de aprendizagem de cada criança. ➢ Fase 1: como se comunicar Utilizando as figuras desenvolvidas com os itens favoritos da criança, ela será ensinada a trocar essas figuras pelo item que deseja. Assim, há algo que a criança deseja, mas não tem acesso. Um brinquedo, por exemplo. Para poder ter acesso ao brinquedo ela deverá entregar a figura que o represente para o seu parceiro de comunicação. O parceiro de comunicação é a pessoa responsável por iniciar a criança na prática da PECS, podendo ser um professor, um dos pais, um irmão ou qualquer outra pessoa que receba as figuras da criança e lhe dê os itens relacionados às figuras. A comunicação pela troca de figuras se dá com a pessoa que entrega a figura “falando” e aquela que as recebe “ouvindo”, ou seja, uma das pessoas transmite a mensagem e a outra a recebe e compreende, modificando o meio para o emissor da mensagem (ex. entregando o brinquedo), reforçando assim o processo comunicativo, ou seja, a troca. Nessa fase, o parceiro de comunicação não deve fazer perguntas para a criança (“O que você quer?”, “Quer o brinquedo?”), pois a criança demonstrará o que quer entregando a figura. Para estimular a fala e a associação, toda vez que apresentar a figura, deve-se dizer o nome do objeto que ela representa. Por exemplo, ao apresentar uma figura que representa uma bala, deve-se dizer em voz alta “bala” ao apontar ou pegar a figura. Para que esse processo se estabeleça, deve-se de início deixar a figura em um local visível e de fácil acesso à criança, por exemplo, utilizar um imã para afixar a figura na porta da geladeira. O parceiro de comunicação leva a criança até a figura, aponta a figura e diz o que está nela (“sorvete!”, por exemplo). Junto com a criança, a figura é retirada da geladeira e a criança receberá um pouco de sorvete. 26 Uma outra forma de demonstrar que a figura pode ser trocada por algo é sentar-se frente a frente com a criança. Dispor, de um lado, uma figura (“bala” por exemplo) e do outro lado a bala. Direcionar a mão da criança para pegar a figura da bala e, depois, lhe entregar a bala. Deve-se fazer a criança compreender que só terá acesso ao doce se pegar a figura primeiro. Embora simples, essa fase é muito importante e deve ser repetida quantas vezes forem necessárias, até que a criança compreenda a associação entre pegar a figura e receber sua recompensa. Sabe-se que a criança está pronta para a próxima fase a partir do momento em que, sem auxílio ou sugestão, ela leva a imagem até seu parceiro de comunicação, mostrando-a ou entregando em mãos. Resumo da Fase 1: ➢ Associar uma figura ao seu significado; ➢ Trocar uma figura por aquilo que deseja; ➢ Levar a figura espontaneamente ao seu parceiro. ➢ Fase 2: distância e persistência Essa fase também pode ser chamada de expansão da espontaneidade. Aqui, a criança vai aprender a generalizar a habilidade aprendida na fase 1, aplicando o que aprendeu em contextos diferentes, com outras pessoas e em distâncias maiores. Além disso, essa fase faz com que aprenda a ter persistência na comunicação e conheça o triângulo da comunicação, que é composto pela criança, pelo livro de comunicações e pelo parceiro de comunicações. O livro de comunicações é o fichário no qual se encontram as figuras da criança. As figuras podem ser dispostas tanto com velcro nas páginas, como colocadas dentro de saquinhos plásticos, da forma que seja mais fácil para a criança ter acesso. É importante destacar que, nesta fase, ainda será utilizada apenas uma figura de cada vez para que a criança demonstre o que deseja, mas agora entenderá que pode trocar informações com diferentes parceiros. 27 Assim, poderá utilizar o sistema de troca de figuras na escola, com professores, na casa dos avós, com outros parentes, além de outros ambientes que farão a criança se deslocar mais. Se anteriormente a figura estava na cozinha (afixada na geladeira), ela pode agora estar no quarto da criança, em um local de fácil acesso. A criança deve perceber que a figura se encontra no seu fichário ou caderno de comunicação. A criança deverá pegar a figura do ficháriopara levar ao parceiro de comunicação ou mesmo levar o fichário para que o parceiro a auxilie a pegar a figura, se for necessário. Nesse último caso, deve-se observar qual a dificuldade da criança ao retirar a figura e verificar o que é possível fazer para que ela supere essa dificuldade, já que é fundamental que ela desenvolva a independência para retirar as figuras por si mesma. Em alguns casos, quando a habilidade motora fina da criança ainda não está bem desenvolvida ou em caso de limitações de movimentação, as figuras podem ser dispostas em um mural com velcro na parede ou atrás da porta, por exemplo, para que a criança consiga ter acesso a elas mais facilmente. O importante nessa fase é que a criança tenha acesso e desenvolva a independência para pegar a figura e poder se expressar, além de compreender que a figura da bala, por exemplo, funcionará tanto em sua casa quanto em outros contextos, como na casa de sua avó ou na escola. Para isso, é preciso que a figura comece a ser utilizada em outros contextos e que os parceiros de comunicação propositalmente se afastem do lugar no qual a figura está disposta. Assim, a criança compreenderá que precisa ser persistente para conseguir o que deseja, saindo do quarto dela e indo até o pátio para levar a figura para seu parceiro de comunicação, por exemplo. Além disso, pode-se treinar essa habilidade quando, ao visitar a vovó, por exemplo, a criança tenha acesso ao seu livro de figuras e possa utilizá-lo em diferentes ambientes e com diferentes pessoas. Para que essa fase seja considerada concluída e possa se passar para a fase 3, é necessário que a criança consiga encontrar seu livro e possa passar a figura ao seu parceiro de comunicação 28 Resumo da fase 2: ➢ Conhecer e identificar seu caderno de comunicação; ➢ Trocar figura com diferentes parceiros; ➢ Trocar figura em diferentes contextos; ➢ Encontrar o livro e entregar figura a um parceiro de comunicação. É importante ressaltar que, até esse momento, a criança utilizou apenas uma figura que foi escolhida com base nos seus interesses e preferências. Por isso, é importante que a figura represente algo de que a criança realmente goste e não vá se cansar muito facilmente, pois a intenção é que ela a utilize por diversas vezes e se sinta estimulada para tal. Assim, caso a figura escolhida seja “bala”, ela deverá ser utilizada nas duas primeiras fases. Caso o uso da figura “bala” não funcione, é possível utilizar outra para despertar o interesse da criança, como “chocolate”, por exemplo. É importante que, embora seja apenas uma, ela seja colocada dentro do fichário da criança ou no local no qual todas as figuras serão armazenadas. Isso faz com que a criança reconheça o local no qual deverá buscar sempre as suas figuras. Essas duas primeiras fases podem levar dias ou horas, por isso, é importante ter as figuras previamente confeccionadas para não atrasar a fluidez do desenvolvimento da criança. Na fase 3, que será abordada na próxima aula, a criança aprenderá a distinguir figuras e, para isso, serão utilizadas outras figuras, mas não apenas aquelas que apresentam preferências da criança. Assim, para iniciar a fase 3 é importante dispor de figuras neutras e indesejadas, além daquelas com itens de que a criança gosta. Figuras neutras são aquelas que não despertam nem reações positivas, nem negativas, como a figura de uma mesa, por exemplo. Já uma figura indesejada será aquela que apresenta uma atividade de que a criança não goste, como uma figura que represente uma escova de dente, caso a criança não goste de escovar os dentes. 29 É importante que se conheça os pormenores da criança para que a aplicação do método seja eficiente, por isso deve-se conhecer essas especificidades. Dispondo dessas diferentes figuras e tendo a criança concluído a fase 2, pode-se iniciar então a fase 3, que será apresentada na sequência. A comunicação não depende apenas da linguagem falada e pode ser estabelecida de diferentes formas. A PECS se mostra como uma excelente alternativa de comunicação para crianças que apresentam dificuldades no desenvolvimento da linguagem funcional, pois conseguir desenvolver a comunicação, apresenta benefícios nas áreas comportamentais de socialização, entre outras. Conclusão da aula 2 Nesta aula foram abordadas as diferenças entre comunicação e linguagem, estabelecendo a PECS como uma forma alternativa para que a criança possa manifestar suas vontades. Nesta aula foram abordadas as duas primeiras fases da PECS para que ela possa ser implementada no dia a dia da criança com TGD. Atividade de Aprendizagem Baseando-se no que foi aprendido até agora sobre a PECS, elabore um pequeno resumo explicando os principais aspectos para implementação da PECS nas duas primeiras fases. 30 Aula 3 - PECS Apresentação da aula 3 Nesta aula serão abordadas as fases restantes da PECS, partindo da fase 3 que diz respeito à discriminação das figuras, apresentando a continuidade do método para que possa ser implementado com sucesso. 3.1 Introduzindo novas figuras Uma vez que a criança tenha concluído as duas primeiras fases da PECS conforme o esperado, pode-se então dar início a fase 3, que diz respeito à discriminação de figuras. Como mencionado na aula anterior, para que a fase 3 seja implementada adequadamente, é preciso dispor de figuras neutras e figuras indesejadas, para que a criança possa aprender como fazer escolhas entre as figuras. Essa é uma parte fundamental do treinamento, pois evita que haja confusão e sobreposição de ideias na comunicação e faz com que a criança consiga decidir o que é mais importante em determinado momento. ➢ Fase 3: discriminação de figuras Nesta fase a criança irá aprender a discriminar as figuras, ou seja, entre duas figuras, deverá escolher aquela que representa o que ela mais deseja naquele momento. Dessa forma, a comunicação irá se desenvolver de forma fluida e mais organizada, facilitando as fases posteriores, como as formações de frases, por exemplo, devido ao processo de raciocínio e decisão ser mais claro. Assim, primeiramente, a criança deverá discriminar entre um item desejado e um indesejado. Para isso serão utilizadas duas figuras, por exemplo, a figura “escova de dentes” (considerando nesse exemplo que a criança não gosta de escovar os dentes) e a figura “bala” (de que a criança gosta). 31 O procedimento se dá de forma similar ao visto na fase 1. Sentando-se frente a frente com a criança, se dispõe as duas figuras para ela: “bala” de um lado e “escova de dentes” do outro. Nesta etapa, é interessante, se possível, contar com uma outra pessoa para auxiliar o processo, que pode estar sentada atrás ou do lado da criança. Isso torna possível direcionar o braço da criança para a figura desejada, caso seja necessário. Deve-se prestar atenção para que o uso de toques seja suave, mas firme, preferencialmente pouco acima do cotovelo, sem machucar a criança, mas também de forma que ela compreenda que o toque está direcionando seu movimento para a figura desejada. Durante a apresentação das figuras, deve lembrar-se de pronunciar o nome de cada uma das figuras ao apontá-las, isso faz com que a criança associe o estímulo visual ao auditivo. Nessa primeira etapa, ao mostrar a criança uma figura com algo que ela deseja e algo de que ela não gosta, ela tem uma falsa sensação de escolha (já se espera que ela escolha aquilo de que mais gosta) e será recompensada pelo ato de escolher uma das figuras. A progressão se dá com a apresentação de uma figura desejada e uma figura neutra, como “bala” e “caneco”, por exemplo, considerando que mesa não é algo indesejado, mas algo neutro, que não desperta sentimentos negativos ou positivos na criança. Casoa criança escolha a figura “errada” (como o caneco ou a escova de dentes), o parceiro de comunicações pode entregar a ela a escova ou o caneco, mesmo sabendo que não é o que ela quer, para que ela compreenda a consequência natural de suas escolhas. No caso de escolher a figura esperada, a criança será, novamente, recompensada pela escolha que ela acredita ter feito. Novamente, é uma falsa escolha, já é esperado de antemão que ela escolha aquilo de que gosta para ser recompensada pela escolha. Caso a criança escolha a figura não desejada ou neutra, deve-se dizer “não” e mostrar à criança a figura que ela deve escolher, nomeando-a. Quando a criança aponta a figura corretamente, deve ter um reforço positivo, como “muito bem”, por exemplo. 32 Por fim, serão apresentados à criança dois itens considerados desejados, como por exemplo “bala” e “chocolate”. Aqui a criança realmente fará uma escolha, sendo que as tentativas anteriores foram utilizadas para que ela compreenda que deve escolher uma entre duas. Para compreender se a figura escolhida corresponde ao item que a criança realmente deseja, pode-se mostrar os dois itens representados nas figuras (por exemplo, dinossauro de pelúcia e chocolate) e dizer para a criança: “Aqui”, “me mostre” ou “vá em frente.”. Caso o item escolhido seja equivalente à figura apontada, a criança deve ser recompensada com o item, que deve ser nomeado, como “Muito bem! Dinossauro!”. Aqui, há grandes chances de a criança escolher as duas figuras. É neste momento que a criança aprenderá o “não”, ou seja, ela não pode escolher as duas figuras, apenas uma delas. Nesta fase, além do “não”, será possível aplicar o “espera”, quando a criança não pode ter o item que deseja naquele momento. Por exemplo, se durante o almoço a criança usa a figura “sorvete”, deve-se utilizar o “espera” para que ela o ganhe apenas ao final da refeição. Esta fase pode apresentar algumas dificuldades, como a resistência da criança ao compreender “não” ou “espera”, por isso as fases que incluem falsas escolhas (com figura indesejada e figura neutra) podem ser repetidas até que a criança compreenda que deve escolher apenas uma figura de cada vez. Outras estratégias podem ser utilizadas alternativamente para facilitar a escolha de uma das figuras, como, por exemplo: ➢ Fazer as figuras desejadas com um tamanho maior do que as indesejadas; ➢ Fazer as figuras desejadas coloridas e as indesejadas em escala de cinza (ou preto e branco); ➢ Utilizar marcadores de texto coloridos para dar ênfase na figura desejada; ➢ Utilizar uma figura em branco (sem desenho); ➢ Deixar a figura desejada próxima e onde o objeto desejado está sendo mantido. 33 Uma vez que a criança consiga compreender como discriminar os objetos, deve-se retirar gradualmente as figuras adaptadas (como as maiores, as que não são coloridas etc.) do seu portifólio de figuras. Também nessa fase, a criança deve ter a oportunidade de treinar em diferentes contextos, oportunidades e com diferentes parceiros. Assim, mais figuras são adicionadas em seu fichário ou caderno de comunicações. Isso possibilita à criança discriminar as figuras por si mesma, tendo mais oportunidades de prática. As figuras devem ser adicionadas gradualmente para que a criança se acostume e, caso ela pareça confusa, deve-se retornar ao número anterior até que ela consiga manejar mais figuras. Essa fase poderá ser considerada como concluída, passando-se para a próxima fase, quando a criança conseguir discriminar as figuras, escolhendo o que mais deseja no momento. Para chegar a esse ponto, a criança deverá escolher no seu livro de figuras ou caderno de comunicação uma figura dentre as outras, levando-a a seu parceiro de comunicação. Para que seja considerado que a criança consiga discriminar entre as figuras, espera-se que ela seja apta a escolher e usar corretamente algo entre 12 e 20 figuras. Resumo da fase 3: ➢ Escolher entre uma figura de que gosta e uma de que não gosta (indesejada); ➢ Escolher entre uma figura de que gosta e uma figura neutra; ➢ Escolher entre duas figuras de que gosta, qual deseja no momento; ➢ A criança tem autonomia para escolher uma figura dentre outras em seu livro ou fichário. ➢ Fase 4: estrutura de sentença Nesta fase a criança vai aprender a construir sentenças simples, utilizando-se de duas figuras, sendo uma dessas figuras a “eu quero”, seguida de outra que representa o que a criança quer naquele momento. 34 Esta fase é importante para ensinar à criança outras funções comunicativas, como o “eu quero” para algo que ela deseja ou o “eu ouço” para algo que ela ouviu. Além disso, aprender como ocorre a construção das sentenças facilita a compreensão da estrutura para a linguagem falada e para a linguagem escrita. Durante essa etapa, será possível: ➢ Começar a estruturar sentenças; ➢ Promover a verbalização; ➢ Monitorar o progresso da criança. Assim, as figuras poderão ser montadas na contracapa do caderno de comunicação, utilizando velcro, ou em um pequeno mural ou quadro confeccionado para esse fim. As figuras devem respeitar a seguinte ordem: primeiro a figura “eu quero”, seguida da figura que expressa o que a criança deseja naquele momento, “sorvete”, por exemplo. O parceiro de comunicações posiciona a figura “eu quero” à esquerda do caderno de comunicações e aguarda que a criança escolha uma figura e a posicione ao lado direito de “eu quero”, podendo, para isso, auxiliar a criança a colocar a figura no local correto. O parceiro de comunicações deve ler a primeira figura “eu quero”, aguardar cerca de cinco segundos para incentivar a criança a ter resposta verbal, e só então concluir “sorvete”, recompensando a criança. Isso é importante para encorajar e estimular uma resposta verbal na criança, além de sempre ler as figuras ao apontá-las, agora são introduzidas pequenas pausas para estimular a criança. Caso ela vocalize de forma adequada, respondendo “sorvete” depois do parceiro ler “eu quero”, a criança deve ter um reforço positivo, obtendo uma recompensa (“muito bem!”), para que saiba que esse é o comportamento esperado dela nessa situação. Conforme essa etapa for praticada, o auxílio motor para que a criança posicione a figura corretamente vai diminuindo à medida que ela compreende o posicionamento correto para ordenar a sentença. 35 Embora no começo as frases possam ser montadas na capa ou contracapa do fichário ou caderno de comunicações, com o passar do tempo, conforme a criança se acostuma com a formação de frases, elas podem ser montadas dentro do fichário. Para isso, podem ser utilizadas páginas de plástico ou papel de maior gramatura, como cartolina, para colar tiras de velcro sobre as quais as figuras podem ser coladas. A criança estará apta para prosseguir para a fase 5 ao conseguir construir sua própria sentença, dispondo as figuras na ordem adequada. Ao atingir esse nível, as frases passarão a ser mais complexas. Resumo da fase 4: ➢ Criar sentenças simples com: “Eu quero”; ➢ Estimular e recompensar a resposta verbal da criança; ➢ A criança consegue construir sentenças usando as figuras na ordem adequada. ➢ Atributos e expansão de vocabulário Esta parte não é propriamente uma fase de implementação da PECS, mas sim uma etapa evolutiva que ocorre naturalmente durante o processo de aprendizado, entre as fases 4 e 6. Nesse momento, a criança irá aprender como expandir as suas frases, criando frases que expressam de forma mais completa aquilo a que ela deseja ter acesso. Para isso, o parceiro de comunicações deve adicionar progressivamente verbos e adjetivos, além de novas figuras que representem objetos ou cores ao portifólio da criança, estimulando-a a se expressar. Assim, uma vez que a criança compreenda estruturascomo: “Eu quero” + “chocolate” “Eu quero” + “lápis” 36 Ela conseguirá elaborar: “Eu quero” + “chocolate” + “branco” “Eu quero” + “lápis” + “verde” De forma que as frases irão naturalmente progredindo para estruturas mais complexas e mais específicas, como: “Eu quero” + “desenhar” + “lápis” + “verde” + “papel” + “branco” “Eu quero” + “comer” + “doce” + “roxo + “redondo” E assim a complexidade das sentenças que a criança elabora aumenta progressivamente, de acordo com as figuras que são disponibilizadas para a criança, do nível de compreensão dela e do estímulo que ela tem para construir frases, além da fase na PECS, na qual ela está. Assim, espera-se que ao final da implementação do método a criança possa, de forma espontânea, elaborar perguntas e comentar coisas que viu ou ouviu. Por isso, o seu parceiro de comunicação deve estar atento para estimular a associação de figuras a fim de que a criança elabore frases mais específicas sobre o que deseja e que associe as figuras de forma correta. Por não ser uma fase em si, esse momento deve ser trabalhado entre as fases 4 e 6, sendo um processo que vai se desenvolvendo e refinando com o tempo. Assim, não é preciso se deter nesse ponto, ao sair da fase 4 a criança já pode entrar na fase 5, tendo em mente esse aspecto da expansão de vocabulário que deve ir sendo estimulado no processo. Fase 5: respondendo a perguntas A partir dessa fase o parceiro de comunicação será responsável por dar início ao diálogo direcionando perguntas para a criança, tais como “O que você quer?”, por exemplo. 37 Nesta fase a criança terá diversas oportunidades espontâneas para responder as perguntas que foram dirigidas a ela, bem como continuar a fazer os seus pedidos habituais. Aliás, é natural que, neste ponto, a maioria das crianças que aprendem o método já estejam utilizando as figuras para requisitar uma grande variedade de objetos ou atividades. Aproveitando-se dos pedidos que a criança já realiza utilizando “eu quero”, o parceiro de comunicações deve apontar para essa figura e perguntar à criança: “O que você quer?”. Assim que a criança apontar ou montar a sequência de figuras com o que quer, deve receber uma recompensa verbal, além daquilo que está sendo pedido naquele momento. O parceiro de comunicações ou outras pessoas podem, durante alguma atividade, perguntar à criança o que ela quer. Ao ser perguntada sobre o que quer, a criança deverá buscar o seu caderno de comunicação e elaborar suas respostas com “eu quero”, seguido das figuras que representam aquilo que deseja. Pode-se evoluir para a fase seguinte quando a criança passar a responder perguntas como “O que você quer?”, com “eu quero”, além de espontaneamente fazer pedidos sobre o que quer, elaborando corretamente as frases. Resumo da fase 5: ➢ O parceiro de comunicações passa a perguntar “o que você quer?”; ➢ A criança responde às perguntas realizadas corretamente “eu quero”; ➢ A criança elabora pedidos espontaneamente. Fase 6: Comentário espontâneo e responsivo Até este momento, o treinamento da PECS foi centralizado na função comunicativa de realizar pedidos, com a criança expressando aquilo que queria. A partir de agora, ela aprenderá a nomear ou categorizar as coisas. 38 Na última fase de aplicação desse método, a criança irá aprender a elaborar respostas mais complexas às perguntas que são feitas a ela, além de acrescentar comentários as suas respostas. Ao final dessa fase, o objetivo será eliminar as questões para que a criança comece a tecer seus comentários de maneira espontânea. Componentes importantes dessa fase são: ➢ Preparação; ➢ Introduzir comentários como resposta a perguntas; ➢ Ensinar diferentes respostas às perguntas; ➢ Ensinar comentários espontâneos; ➢ Monitorar o progresso da criança. Inicialmente, o parceiro de comunicações deve providenciar diferentes itens (não itens desejados), juntamente com as figuras que os representam, além de uma nova figura que represente “eu vejo”. A figura “eu vejo” é posicionada à esquerda da tira de velcro, onde a frase será iniciada. Na sequência, o parceiro de comunicações segura um item e pergunta “O que você vê?”, enquanto aponta a figura “Eu vejo”. O parceiro deve aguardar a reação da criança, em torno de 5 segundos, para verificar se a criança escolherá a figura correta e a posicionará na sequência de “eu vejo”, formando a frase. Caso a criança complete a sentença adequadamente, o parceiro de comunicações lê a frase e dá um reforço verbal positivo. Por exemplo: “Muito bem! Eu vejo a caneta!”. Caso a criança não complete a sequência, ela deverá ser guiada, como nos passos anteriores, para fazê-lo de forma adequada, junto da verbalização da frase: “Você vê a caneta”. Isso deverá ser repetido com diferentes itens, mas a criança não deverá ser recompensada com eles e sim com reforço positivo verbal ou algum outro, como um brinquedo, por exemplo. Isso é importante para que a criança compreenda a diferença de nomear um item (matching) e de querer aquele item. 39 Conforme a criança responda corretamente, mais item e mais figuras podem ser adicionados de forma progressiva, fazendo-a expandir seu vocabulário e melhorar a discriminação dos itens. Uma vez que a criança aprenda a responder corretamente a pergunta “o que você vê?”, ela terá capacidade de responder outras perguntas como “O que você ouviu?”, ou “O que é isso?”, adequadamente utilizando respostas com “eu ouvi [...]” ou “isso é[...]”, adicionando comentários mais específicos para as suas respostas. As perguntas são intercaladas em “o que você quer?” com “o que você vê?”, para que a criança aprenda a responder cada pergunta de forma específica, e assim progressivamente, adicionando novas perguntas. Por exemplo, sentando-se frente a frente com a criança, o parceiro de comunicação utiliza um aplicativo ou um brinquedo específico para reproduzir o som de um cavalo, por exemplo. Assim, o parceiro pergunta à criança: “O que você ouve?” E a criança deve responder dispondo figuras da seguinte maneira: “Eu ouço” + “cavalo”. Assim, caberá ao parceiro de comunicação estimular a criança com perguntas variadas, bem como permitir e incentivar que a criança faça suas próprias perguntas. Esse tipo de treinamento também deverá ser generalizado, propiciando a prática em diferentes situações, contextos e com diferentes pessoas, usando diferentes perguntas. Por ser a última etapa de aprendizado do método, é importante que o parceiro de comunicação continue a estimular a criança, criando situações propícias para o uso da técnica. Embora as perguntas devam diminuir de forma progressiva para que a criança desenvolva autonomia para estabelecer a comunicação e realizar seus próprios comentários. Diferentes situações devem ser criadas para estimular a criança a dizer o que ela vê, por exemplo: 40 ➢ Pendurar objetos interessantes no teto, como bichos de pelúcia; ➢ Colocar brinquedos de borracha onde a criança toma banho; ➢ Utilizar livros com figuras em relevo (pop-up ou 3D) ou interativos (dedoches); ➢ Em uma caminhada, perguntar o que a criança viu na escola. Até aqui, a criança já consegue se comunicar relativamente bem, tendo alcançado todos os pontos desejados: reconhece figuras, as discrimina, forma frases, expressa o que quer, o que vê e ouve, dentre outros. O método deve ser utilizado e aprimorado enquanto a criança se sentir confortável com o seu uso. Assim, pode-se dar prosseguimento da seguinte forma: ➢ Continuar adicionando novas figuras ao livro de comunicação; ➢ Disponibilizar à criança mais de um livro (para usar em casa, na escola, na casa de algum parente etc.); ➢ Continuar criando oportunidades de prática em diferentes contextos; ➢ Apresentara PECS a outras pessoas ligadas a criança (profissional de saúde, funcionários de comércios que a criança frequente etc.); ➢ Dar reforços positivos quando a criança se comunica espontaneamente; ➢ No caso de crianças que aprendem o método rapidamente, é importante continuar dando estímulos, expandido o vocabulário e permitindo que elas elaborem frases mais complexas. Quando a criança começa a desenvolver a linguagem falada, a PECS não deve ser removida abruptamente, pois representa para a criança, uma segurança ao se comunicar e saber que será compreendida. A PECS deve permanecer à disposição da criança até que ela mesma a rejeite ao perceber que não é mais necessária e que consegue se comunicar tão bem verbalmente que não sinta mais a necessidade de utilizar as figuras. 41 Sabendo da importância da comunicação funcional para estabelecer a socialização, a PECS se mostra como uma importante ponte que estabelece a comunicação das crianças com TGD. Conclusão da aula 3 Esta aula apresentou detalhadamente as fases de implementação da PECS, dando continuidade à aula anterior, começando pela terceira fase até a sua finalização, na sexta fase. Atividade de Aprendizagem Agora que já se conhece a importância da PECS para o estabelecimento da comunicação, elabore um pequeno resumo evidenciando os principais aspectos das fases 3, 4, 5 e 6 para a implementação do método com sucesso. Não esqueça de comentar sobre como ocorre a expansão do vocabulário. Aula 4 – Avaliação e intervenção Apresentação da aula 4 Uma vez conhecendo as características do TGD e estabelecendo uma forma de comunicação com a criança, é possível avaliar e intervir junto à família e a equipe multidisciplinar para substituir comportamentos inadequados e estabelecer rotinas em diferentes contextos. 4.1 Avaliação Antes de realizar qualquer tipo de intervenção com intuito de modificar comportamentos indesejados, é importante que a criança seja avaliada de maneira adequada, utilizando ferramentas específicas. 42 Isso possibilita que as intervenções se desenvolvam com base nas características individuais (particulares) presentes em cada criança, o que faz com que as intervenções sejam endereçadas às necessidades particulares, sendo assim mais eficientes do que métodos genéricos que podem não surtir efeitos ou ainda surtir efeitos negativos. Dentre as várias ferramentas disponíveis para realizar avaliação de pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento, algumas das mais utilizadas são: ➢ SSRS-BR, do inglês, Social Skills Rating System, em sua versão brasileira é chamada de: Sistema de Avaliação das Habilidades Sociais; ➢ Inventário de Habilidades Sociais para Adolescentes (IHSA-Del- Prette); ➢ Escala Matson de Habilidades Sociais para Adolescentes. MESSY, do inglês, Matson Evaluation of Social Skills with Youngsters; ➢ Inventário de Habilidades Sociais-Del Prette (IHS2-Del-Prette). As avaliações devem ser realizadas por um profissional treinado em sua aplicação, para verificar se o método tem validade em território nacional e para que as particularidades de sua aplicação sejam seguidas à risca, além da adequação ao público alvo. Por exemplo, a SSRS-BR avalia crianças em idade escolar, já a IHSA- Del-Prette avalia adolescentes entre 12 e 17 anos. Assim, a primeira apresenta um enfoque maior nas competências demonstradas em leitura e matemática, enquanto a segunda se volta a avaliação das dificuldades de interação social. Cada método de avaliação apresenta características específicas e traz resultados que irão determinar o nível de intervenção, bem como as áreas nas quais há necessidade de fazê-lo. 43 4.2 Intervenção e substituição de comportamentos Existem diversos métodos por meio dos quais é possível modular os comportamentos indesejados e promover uma melhor adaptação de comportamentos e integração social de crianças com TGD. Esses métodos ou práticas de intervenção podem ser aplicados pelos pais, por terapeutas ou profissionais de saúde e educação para que os comportamentos indesejados sejam substituídos por comportamentos adequados. Com essas substituições de comportamentos, a criança colherá benefícios em diversas áreas de sua vida, superando, por exemplo, dificuldades de linguagem, melhorando suas habilidades sociais, diminuindo a frequência e a intensidade das crises, dentre outros aspectos que acabam melhorando a qualidade de vida da criança de forma global. As modificações de comportamento têm origem na escola Behaviorista (do inglês, behavior, que significa comportamento) ou comportamental, sendo uma corrente da psicologia que visava justamente trabalhar o controle do comportamento e se desenvolveu entre os séculos XIX e XX. Por meio de pesquisas realizadas pelo psicólogo B. F. Skinner, com reforços positivos e negativos, verificou-se que novos comportamentos podem ser aprendidos. Os reforços positivos, mencionados ao longo da abordagem da PECS, referem-se às recompensas positivas que são recebidas como palavras de incentivo, carinho ou guloseimas. Já os reforços negativos envolvem desde privações, como proibir a criança de realizar alguma atividade de que ela goste, até punição física. Já na época, Skinner observou que reforços positivos apresentavam os melhores resultados. Essas recompensas reforçam a compreensão de que determinado comportamento é desejado, levando o indivíduo a repeti-lo, de forma que ele acabe por se transformar em um hábito. Embora aparentemente simples, este mecanismo deu espaço para o desenvolvimento de inúmeros métodos que utilizam os mesmos princípios ou 44 que são derivados de alguma forma dessas observações, como é o caso da ABA (que será abordada em breve) e da PECS. 4.2.1 Métodos de intervenção Existem diversas formas de intervenção visando à modificação de comportamentos. Algumas das intervenções utilizadas são as seguintes: ➢ ABA (do inglês Applieded Behavior Analysis), Análise de Comportamento Aplicada; ➢ PRT (do inglês, Pivotal Response Treatment), Treinamento da Resposta Dinâmica; ➢ ESDM (do inglês, Early Start Denver Model), Método de Denver para Intervenção Precoce; ➢ EIBI (do inglês Early Intensive Behavioral Intervention), Intervenção Comportamental Intensiva Precoce; ➢ RDI (do inglês Relationship Development Intervention), Intervenção para o Desenvolvimento do Relacionamento; ➢ TEACCH (do inglês Treatment and Education of Autistic and related Communication-handicapped Children), Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits relacionados à Comunicação; ➢ Son-rise; ➢ Floortime (floor = chão, time = tempo, sendo traduzido literalmente por tempo no chão). Como esta disciplina não tem por objetivo exaurir o assunto, mas sim informar sobre os métodos, servindo como um guia para direcionar futuras consultas, serão comentados brevemente apenas aqueles mais amplamente utilizados e que apresentam validação científica. Os outros métodos listados podem ser pesquisados, de acordo com o interesse do aluno, para expandir seu arcabouço de conhecimento a respeito do 45 tema, sendo que além dos métodos listados, há ainda diversos outros não listados. É importante manter-se atualizado, verificando a disponibilidade de novos métodos, bem como as atualizações que ocorrem nos métodos apresentados, conforme novas evidências surgem. ➢ ABA A ABA surgiu no behaviorismo e é um método largamente utilizado e que, quando aplicada de maneira adequada, apresenta resultados eficazes para a substituição de comportamentos inadequados. Sua aplicação dura no mínimo 5 horas por dia, sendo uma intervenção continua e intensa, que pode ser aplicada em diferentes contextos. Visa às atividades de vida diária e objetiva a melhorade habilidades motoras, sociais e cognitivas, além de melhorar habilidades que envolvem a comunicação, atenção e memória, repercutindo no desempenho escolar. Além disso, trabalha os déficits de comportamento, ajudando na redução das estereotipias e de comportamentos agressivos, além de ampliar o repertório de comportamentos adequados. ➢ ESDM – Método Denver Este modelo, que apresenta forte influência na ABA, tem como diferencial a abordagem voltada a crianças com idade entre 12 e 48 meses, dando enfoque na criação de vínculos das crianças e auxiliando o seu desenvolvimento social precocemente. Por meio de brincadeiras, a criança é encorajada a interagir e se comunicar com os pais, que devem estar envolvidos e emocionalmente disponíveis para demonstrar afeto para com a criança. ➢ TEACCH Embora seu nome (tratamento e educação para autistas e crianças com déficits relacionados à comunicação) sugira que é um método voltado para 46 crianças, ele é utilizado em todas as faixas etárias, pois é um programa com grande potencial adaptativo. O método é centrado nas características individuais, utilizando avaliações para desenvolver as atividades que serão realizadas e possui um enfoque voltado às habilidades de comunicação, visando desenvolver a independência individual. A comunicação é realizada utilizando estratégias visuais e por este motivo o método é muito utilizado em associação com a PECS, tendo sido desenvolvido com bases na terapia comportamental, mas incluindo elementos cognitivos, que trazem sofisticação na compreensão de porque determinados comportamentos ocorrem. É um dos métodos que apresenta grande quantidade de pesquisas científicas que demonstram seu sucesso, como Jordan (1998), Fletcher- Campbell (2003) e a meta-análise de Virues-Ortega et al (2013). Os resultados que podem ser observados com sua utilização incluem uma comunicação mais eficiente, melhora da colaboração e cooperação com os outros, além da melhora do processamento sensorial. ➢ Escolhendo um método A escolha do método varia de acordo com as informações obtidas nas avaliações, além das características individuais da pessoa com TGD e da situação e contexto no qual se encontra. É fundamental ser criterioso na escolha do método, utilizando métodos que apresentem pesquisas confiáveis e demonstrem ser baseados em evidências, evitando assim a utilização de ferramentas ou métodos que possam causar danos à criança. Além disso, cada método apresenta particularidades para a sua aplicação, como treinamentos específicos ou ser realizado por profissionais de determinadas áreas ou em determinados contextos, além da disponibilidade de tempo ou financeira. Por este motivo, métodos diferentes podem ser mais ou menos adequados para crianças diferentes, embora seja preciso ter cautela com métodos que não apresentam validade científica. 47 Com o avanço da influência das redes sociais e a disseminação das chamadas fake News (notícias falsas), deve-se estar atento a métodos “milagrosos” que prometem “curas” fáceis. Em caso de dúvidas, pode-se entrar em contato com agências como a Anvisa, Ministério ou Secretarias estaduais e municipais de saúde, evitando colocar em risco a saúde e o bem-estar das crianças. 4.3 Substituição de comportamentos Além das estereotipias motoras e verbais, abordadas na primeira aula, é comum que crianças com TDG apresentem outros tipos de comportamentos difíceis ou inesperados. Na maioria das vezes esses comportamentos resultam da dificuldade de se comunicar, expressando o que sentem ou o que precisam ou ainda não sendo capazes de compreender o que se passa no mundo a sua volta. Gritos, choro intenso, comportamentos violentos ou mesmo isolamento que não parece ter motivo pode ser melhor compreendido utilizando a PECS, por exemplo. Assim, uma vez que se compreendam os estímulos que desencadeiam essas reações na criança, é possível saber como evitá-los. Em geral, esses comportamentos advêm do estresse causado na criança, que não sabe como lidar com ele. Caso a criança ainda não tenha a capacidade de se comunicar, os pais e a equipe devem observar cuidadosamente as situações nas quais esses comportamentos ocorrem com maior frequência. Devido às alterações de sensibilidade, situações que apresentem luzes intensas, sons altos ou cheiros fortes podem desencadear crises em crianças que apresentem hipersensibilidade a algum desses elementos. Algumas situações, como um shopping lotado em um dia de liquidação podem apresentar além de um excesso de informações, situações inesperadas, nas quais a criança pode apresentar dificuldades para se adaptar rapidamente, tais como pessoas gritando ou músicas que começam inesperadamente, cheiros de comida muito fortes, movimento intenso de pessoas passando, dentre outros, quando em conjunto, podem causar grande estresse na criança. 48 Outras situações que podem ser estressantes envolvem a quebra da rotina, quando a criança é exposta a ambientes ou pessoas desconhecidas, além de todo o estímulo envolvido nisso (cheiros diferentes, iluminação diferente, socializar com desconhecidos etc.). Essas situações podem causar ansiedade e medo do desconhecido, o que causa frustração na criança, causando assim crises que podem envolver gritos, choro e até mesmo comportamentos violentos. Crises muito intensas podem exaurir a criança a ponto de fazê-la dormir profundamente quando a crise tiver passado. Esse tipo de evento pode afetar o sono da criança, que pode trocar o dia pela noite, dando preferência por estar acordada à noite, quando o ambiente fica naturalmente mais escuro e mais silencioso. Em outros casos nos quais a criança é submetida a fatores estressantes, a autoestimulação pode ser observada por meio dos movimentos repetitivos (como as estereotipias) ou repetições verbais (ecolalias) e é uma das formas utilizadas pela criança para se acalmar frente aos estímulos estressantes. Um bom exemplo para compreender como a autoestimulação funciona sobrepujando um estímulo estressante é pensar em quando uma pessoa bate o mindinho na quina de um móvel e sente dor (estímulo estressante), em seguia é comum que se massageie ou esfregue a área que sofreu o impacto, de modo que o novo estímulo reduza o anterior. Assim, lidar com as crises pode variar de uma criança para a outra, pois cada uma reage de uma maneira diferente ao mesmo estímulo e essa compreensão vem da observação dos comportamentos da criança. Em geral, para acalmar uma crise ou evitar que ela aconteça, deve-se afastar a criança dos estímulos estressantes tão logo quanto possível e tentar acalmá-la em um ambiente tranquilo e seguro. É importante observar os comportamentos e verificar em quais momentos eles ocorrem, identificando os estímulos que perturbam a criança para poder afastá-la deles. Deve-se também conversar com o médico ou o profissional de saúde responsável pelo caso sobre a necessidade da utilização de medicações específicas para regulação de sono ou sensibilidade. 49 Caso sejam necessárias, as medicações devem ser tomadas conforme a prescrição e não devem ser suprimidas ou ter sua dose alterada sem o conhecimento do profissional que as receitou. 4.4 Rotinas diárias Devido à tendência natural do indivíduo com TGD de apresentar um apego às rotinas, estabelecer rotinas diárias é fundamental para facilitar o dia a dia, trazendo maior segurança e tranquilidade para a realização das atividades determinadas. As rotinas podem ser explicitadas com as mesmas figuras que são utilizadas na PECS, observando o uso de setas e a necessidade de especificação de cada tarefa. Quando a criança conhece sua rotina de antemão, sente-se mais tranquila ao segui-la, evitando problemas de comportamento ou crises. Além disso, com a utilizaçãodas figuras é mais fácil explicar à criança quando algo novo será adicionado à rotina de forma antecipada, o que evita mudanças bruscas no esquema mental, consequentemente, o estresse que se origina do medo ou incompreensão do desconhecido. Mudanças de rotina são inevitáveis, assim, quando se sabe que haverá uma mudança de rotina muito grande, se possível, essa mudança deve ser feita de maneira progressiva, para minimizar o seu impacto. Assim, ao incluir novas atividades na rotina da criança, como a realização de um esporte, frequentar um clube ou ir à escola, se possível, a permanência nesses ambientes deve ser realizada de maneira progressiva. 4.4.1 Atividades sociais As atividades sociais podem ser desafiadoras tanto para as crianças com TGD quanto para seus pais ou cuidadores. Muitas situações costumeiras, como ir ao mercado, podem apresentar variáveis estressantes que não podem ser previstas e podem acarretar crises. 50 Compreender os déficits que a criança apresenta, além de observar seu comportamento, pode dar indícios de como será o comportamento em diferentes situações. Algumas interações podem se mostrar muito proveitosas para a criança, caso sejam bem planejadas, por exemplo, uma festa infantil com crianças da mesma idade quando a criança com TGD está preparada para o que irá acontecer: conhece o cenário, quem estará presente, quais atividades serão realizadas, dentre outros aspectos. Muito embora a criança possa ter experiências proveitosas em determinada situação, nem sempre aquela situação será proveitosa. Isso pode ocorrer por diversos motivos, mas especialmente pelas imprevisibilidades dos ambientes e, por vezes, do humor da criança naquele momento. O limite da criança quanto ao volume de interações ou atividades sociais deve ser respeitado para evitar desgastá-la e fazê-la desenvolver associações negativas ou entrar em crise. Quando possível, informe previamente a criança dando-lhe o máximo de informações sobre a atividade a ser realizada, não oculte os fatores estressantes que podem estar presentes e combine com a criança mecanismos de proteção. Por exemplo: “Vamos ao shopping. Lá pode ter música alta, se te incomodar me avise (com a PECS: “me sinto” + “irritado” pode ser usado), que nós voltaremos para casa”. 4.4.2 Atividades esportivas As atividades físicas e esportivas são uma importante ferramenta para auxiliar no desenvolvimento psicomotor das crianças, além de auxiliar na atenuação das estereotipias motoras e mesmo de comportamentos. Em geral, 1 hora de exercício diário é adequado para crianças, mas esse valor pode ser maior ou menor de acordo com as características da atividade e da tolerância da criança às atividades realizadas. Atividades desenvolvidas em grupo podem melhorar aspectos relacionados a socialização e comunicação, muito embora, várias crianças prefiram realizar atividades individuais. 51 Em geral, exercícios individuais são bem tolerados, conforme afirma a pesquisadora, psicóloga e diretora clínica da Clínica de Transtorno do Espectro Autista da Saúde (Health’s Autism Spectrum Disorder Clinic) na Universidade de Utah, Julia Connelly, PhD. Connelly evidencia os cinco melhores esportes para serem realizados por este público, que são: ciclismo, natação, ginástica, equitação e atletismo. Embora apresentem características de esportes de equipe (como as corridas de revezamento dentro do atletismo), a comunicação entre os membros não é essencial para sua realização. Embora crianças com TEA e TGD apresentem boa adaptação a esses esportes, outros fatores devem ser levados em consideração, das preferências individuais a disponibilidade e custos que a prática demanda. Assim, embora a maioria das crianças com dificuldades de comunicação e socialização possam se desenvolver bem em esportes individuais, esportes coletivos não precisam ser descartados totalmente. O mais importante é que a criança realize uma atividade que não cause frustrações e lhe traga prazer, para isso vários esportes ou atividades podem ser testadas até que a criança se engaje naquela que lhe é mais conveniente. Caso a criança não se engaje naturalmente em algum esporte formal, é importante mantê-la fisicamente ativa para desenvolver seu repertório motor e neurológico por meio de jogos e brincadeiras, variando de brincadeiras lúdicas e adaptadas aos jogos pré-desportivos. 4.4.3 Participação da família e da equipe Para que as intervenções tenham sucesso e a criança consiga se desenvolver de maneira apropriada, eliminando comportamentos indesejados e superando suas dificuldades, o manejo deve ser realizado de forma adequada e colaborativa entre todos aqueles que lidam com a criança regularmente. Assim, pais, cuidadores, parentes, professores, colegas de classe, amiguinhos, profissionais de saúde, dentre outros, devem estar atentos para observar os comportamentos da criança, buscando quais são os estímulos que servem de gatilho para comportamentos impropriados, violentos, estereotípicos, frustração, estresse e crises. 52 O manejo deve ser orientado de forma tal que a criança esteja no centro das atividades, no caso em que ela se comunica por meio da PECS, por exemplo, todos os envolvidos deverão utilizá-la para estabelecer o contato com ela. Assim, a criança pode melhorar sua socialização, por exemplo, ao estabelecer uma forma de comunicação que lhe permita expandir seu mundo para todos a sua volta, eliminando barreiras. No caso das atividades e intervenções que buscam a modificação de comportamentos, também é importante que todos sejam informados sobre quais os tipos de recompensas a serem utilizados quando a criança exibe determinado comportamento desejado ou como se deve proceder para eliminar um comportamento indesejado, como a autoagressão. Desta maneira é possível que a criança colha diversos benefícios durante o seu desenvolvimento, evitando que padrões inapropriados sejam reforçados por desconhecimento das práticas adequadas. Para que as intervenções realizadas obtenham sucesso, vários aspectos devem ser observados, desde uma avaliação adequada até a participação de todas as pessoas envolvidas no convívio da criança, que devem contribuir para o manejo adequado, visando à melhora de cada caso. Conclusão da aula 4 Nesta aula se abordou a Avaliação dos déficits apresentados por indivíduos com TGD, bem como as intervenções que são utilizadas para a realização da substituição dos comportamentos, além de diferentes métodos de Intervenção. Para a substituição de comportamentos, foram abordadas diferentes situações, como as rotinas de vida diária, as atividades sociais e as atividades físicas. Por fim, a importância da participação da família e da equipe multidisciplinar para a realização do manejo adequado da criança foi evidenciada. 53 Atividade de Aprendizagem Elabore um pequeno texto relacionando os seguintes tópicos: (a) a importância de uma avaliação adequada para a (b) substituição de comportamentos em diferentes contextos ou situações e (c) porque a família e a equipe devem estar envolvidas. 54 Conclusão da disciplina Nesta disciplina foram abordadas inicialmente as principais características que se apresentam nos indivíduos com Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), além de como esse público pode ser incluído na rede de ensino regular de maneira adequada. Na segunda aula, a comunicação foi o ponto central, abordando a diferença de comunicação e linguagem, além do seu desenvolvimento, sendo fundamental a eliminação das barreiras comunicacionais, integrando o indivíduo com TGD e estimulando sua socialização. A PECS, por ser uma importante ferramenta de comunicação, além de trazer diversos outros benefícios, foi abordada detalhadamente nas aulas dois etrês. Por fim, na última aula, foram trabalhadas as características da avaliação, assim como brevemente abordados alguns métodos para realizar a intervenção e substituição de comportamentos. Alguns aspectos relativos às rotinas da vida diária, às atividades sociais e esportivas também foram assunto da aula, que foi finalizada evidenciando a importância do envolvimento da família e da equipe multidisciplinar, bem como de todos no convívio da criança, para que o manejo seja o mais adequado, estimulando o seu desenvolvimento. 55 Índice Remissivo Adaptações de pequeno porte ................................................................... (Adaptações; liberdade; necessidade) 16 As figuras utilizadas na PECS ................................................................... (Aceso; cores; visualizar) 21 Atividades esportivas ................................................................................. (Atividades; desenvolvimento; ferramenta) 50 Atividades sociais ...................................................................................... (Atividades; crianças; situações) 49 Avaliação ................................................................................................... (Avaliação; ferramentas; transtorno) 41 Avaliação e intervenção ............................................................................. (Comunicação; criança; TGD) 41 Benefícios .................................................................................................. (Benefícios; comunidades; testes) 20 Como utilizar a PECS? .............................................................................. (Distância; estrutura; PECS) 24 Estabelecendo a comunicação: uso da PECS ........................................... (Dificuldades; funcional; linguagem) 18 Inclusão escolar do estudante com TGD ................................................... (Debates; educação especial; inclusão) 12 Intervenção e substituição de comportamentos ........................................ (Comportamento; integração; método) 43 Introduzindo novas figuras ......................................................................... (Discriminação; fases; figuras) 30 Linguagem e comunicação ........................................................................ (Comunicação; linguagem; sinônimos) 18 Métodos de intervenção ............................................................................. (Comportamentos; intervenção; modificação) 44 O aluno com TGD e a escola ..................................................................... (Características; classificação; inclusão) 07 Participação da família e da equipe ........................................................... (Criança; dificuldades; intervenção) 51 PECS ......................................................................................................... (Figura; intervenção; método) 20 56 PECS ......................................................................................................... (Discriminação; figuras; PECS) 30 Rotinas diárias ........................................................................................... (Apego; tendência; TGD) 49 Substituição de comportamentos ............................................................... (Comportamentos; choro; gritos) 47 TGD: o que é e quais são as suas características ..................................... (Classificação; doença; transtornos) 07 57 Referências DE SOUZA, R. Dal Ben; JULIANI, J. Psicologia e autismo. Revista Terra & Cultura: Cadernos de Ensino e Pesquisa, v. 29, n. 56, p. 139-152, 2018. FLETCHER-CAMPBELL, F. Treatment and Education of Autistic and related Comunications Handicapped Children (TEACCH). in: Review of the research literature on educational interventions for pupils with autistic spectrum disorders. National Foundation for Educational Research. 2003. JORDAN, R. JONES, G. MURRAY, D. Educational Interventions for Children with Autism: A literature review of Recent and Current Research. Sudburry: DfEE. 1998. SMITH, D. D. Introdução à Educação Especial: Ensinar em Tempos de Inclusão. 5ª edição. Porto Alegre. Artmed. 2008 SUCHOWIERSKA, M. et al. Picture Exchange Communication System (PECS): A Short “tutorial” for the doctors. Postępy Nauk Medycznych, 2012. THOMPSON, J. R. et al. Conceptualizing supports and the support needs of people with intellectual disability. Journal of Intellectual & Developmental Disability, v. 47, n. 2, p. 135-146, 2009 VIRUES-ORTEGA, J. JULIO, FM. PASTOR-BARRIUSO, R. The TEACCH program for children and adults with autism: a meta-analysis of intervention studies. Clin Pasychol Rev. 2013. WHO. ICD-11: International Classification of Diseases 11th Revision. Disponível em: https://icd.who.int/en Acesso em: 17/03/2020 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais.