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Diversidade Cultural e Cidadania Karen Eduarda Alves Venâncio Patrick Aparecido Trento INFORMAÇÕES SOBRE O AUTOR Karen Eduarda Alves Venâncio ● Graduada em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá. ● Mestra em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá. Sobre o Autor Mestra em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual de Maringá, na linha de Pesquisa Subjetividade e Práticas Sociais na Contemporaneidade (2019). Graduada em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringá (2016). Atualmente, realiza estudos nos seguintes temas: Gênero, Violências contra as Mulheres, Abrigamento de mulheres em situações de violências. É membra do grupo de pesquisa Hera, Grupo de Estudos em Psicologia Social dos Afetos. INFORMAÇÕES SOBRE O AUTOR Patrick Aparecido Trento ● Graduado em História pela Universidade Estadual de Maringá. ● Mestre em História pela Universidade Estadual de Maringá. Sobre o Autor Mestre em História pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade Estadual de Maringá (PPH-UEM), na Linha de Pesquisa Fronteiras, populações e bens culturais (2017). Graduado em História pela Universidade Estadual de Maringá (2014). Atualmente, é doutorando na linha de Linguagens e Identificações pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade do Estado de Santa Catarina (PPGH-UDESC), e professor da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná (Quadro Próprio do Magistério – 20 horas). INTRODUÇÃO DO LIVRO Caro(a) aluno(a), este livro tem como objetivo apresentar diferentes conteúdos sobre diversidade e cidadania, que são pertinentes para a formação de futuros profissionais de diferentes áreas do conhecimento. Na primeira unidade, você estudará como foram elaborados os projetos de construção da identidade nacional brasileira no período Imperial e Republicano. Veremos que, após a Independência do Brasil, em 1822, buscou-se construir o sentimento de pertencimento de diferentes regiões que compunham o território brasileiro, em um momento marcado, também, por conflitos separatistas. Após a Proclamação da República, em 1889, pretendeu-se construir um sentimento republicano na população, além da consolidação de uma forte identidade nacional. Por fim, estudaremos o que é multiculturalismo, as relações dele com a formação da identidade nacional brasileira e com a globalização que vivenciamos atualmente. Em nossa segunda unidade, estudaremos as relações étnico-raciais existentes no Brasil. Conheceremos como Gilberto Freyre e Florestan Fernandes, dois importantes pensadores brasileiros do século XX, compreenderam essas relações e a formação da sociedade Brasileira. Veremos, também, dois tipos de políticas afirmativas que buscam diminuir as desigualdades existentes no Brasil: as cotas sociais e as cotas raciais. A terceira unidade abordará a diversidade e a promoção de direitos. Conheceremos as principais diferenças entre o conceito de sexo e de gênero, estudaremos o que é identidade de gênero e orientação sexual, e diversos preconceitos com relação a diferentes identidades e sexualidades. Veremos algumas discussões sobre as desigualdades de gênero existentes, atualmente, as violências que as mulheres vivenciam, e as leis e políticas públicas existentes que visam propor enfrentamentos a essas violências. Por fim, em nossa quarta e última unidade, estudaremos diversos temas relacionados à cultura e à cidadania nos dias atuais. Aprenderemos os papéis do Estado, da sociedade e dos indivíduos na promoção e na garantia de direitos. Conheceremos o que são políticas públicas universais e específicas e, também, a importância da acessibilidade. Esperamos que os conteúdos abordados neste livro contribuam para sua formação profissional e pessoal. Bons estudos! UNIDADE I Identidade cultural brasileira e multiculturalismo Karen Eduarda Alves Venâncio Patrick Aparecido Trento Introdução Nesta unidade, estudaremos a construção da identidade cultural brasileira, em diferentes momentos da história do país. Inicialmente, compreenderemos o que é a identidade de uma nação e, posteriormente, estudaremos como esse processo ocorreu no período Imperial e Republicano no país. Veremos que, durante o Primeiro Reinado, diversos conflitos separatistas ocorreram no país, pois se tratava de um período em que não existia um sentimento de pertencimento nacional entre diferentes regiões. No Segundo Reinado, estudaremos algumas medidas que foram tomadas com o intuito de revalorizar a história nacional. No início do Brasil República, veremos como a construção da Identidade Nacional esteve atrelada à construção de um sentimento republicano na população brasileira. Veremos medidas, tomadas pelo governo de Getúlio Vargas, que contribuíram para a construção de uma identidade nacional, como as reformas educacionais realizadas na década de 1930. Aprenderemos o conceito de multiculturalismo e sua relação com a identidade nacional brasileira. Por fim, estudaremos algumas relações entre o multiculturalismo e o processo de globalização que o mundo vivencia atualmente. Fonte: rawpixel / 123RF. A construção da identidade nacional brasileira no Período Imperial (1822-1889) O Brasil possui um território de, aproximadamente, 8.516.000 km². Para termos uma ideia de comparação com outros países, o estado de Pernambuco tem uma extensão territorial semelhante à de Portugal, e a Bahia é quase do mesmo tamanho que a França. Nós, brasileiros, vivemos em um país extenso e temos semelhanças e diferenças. Considerando essa diversidade, podemos entender que, a priori, não existe uma única identidade brasileira definida, contudo, buscou-se, ao longo de diferentes períodos da história do país, construir uma identidade brasileira, utilizada também como estratégia política, econômica e social. Podemos compreender a identidade de um país como um conjunto de características, que podem ser étnicas ou culturais, que une diferentes pessoas que residem em um mesmo território. Contudo, não devemos compreendê-la como uma construção estática, e sim em constante movimento, em outras palavras, de acordo com Zila Bernd (1992 apud MARTINS, 2006), uma formação descontínua construída por meio de processos de reterritorialização e desterritorialização, sendo, aqui, território compreendido como as representações que um sujeito possui de si e do mundo. Uma identidade é uma representação, a qual define a ideia e o sentimento de pertença a um grupo. Dessa forma é, ao mesmo tempo, sentimento e ideia, é sentida e pensada enquanto formulação de uma imagem de si mesma, ou seja, como representação. A constituição da identidade é um processo por meio do qual o indivíduo situa-se enquanto indivíduo e enquanto ser social, ou seja, é um processo em que o indivíduo determina quem ele é em relação aos diversos grupos que estão presentes em seu imaginário. É o processo de representação de quem é o eu e de quem é o outro (KERBER, 2002, p.139). Estudaremos os processos de criação de uma identidade nacional em dois momentos diferentes da história do Brasil: Imperial e Republicano. O Brasil Império tem início com a Independência do Brasil, em 1822. Nesse período, o país possuía uma monarquia, cujo principal representante era o imperador, sendo o poder transmitido hereditariamente. O período Imperial teve fim com a Proclamação da República, no ano de 1889, marco que dá início ao Brasil Republicano, caracterizado pela forma republicana presidencialista de governo, que permanece até os dias atuais. É importante compreendermos que os períodos utilizam marcos iniciais e finais, como a Independência do Brasil (1822) e a Proclamação da República (1889), contudo, a transição entre esses diferentes períodos não ocorre por meio de rupturas instantâneas, e sim por meio de prolongados processos.Iniciaremos nossos estudos sobre a construção da identidade cultural brasileira tendo como marco a Independência do Brasil, ocorrida em 1822, pois foi a partir desse período que o território brasileiro, antes dividido em capitanias hereditárias, tornou-se um único território e deixou de ser colônia de Portugal. Império (1822-1889) O período Imperial é dividido frequentemente em três partes: Primeiro Reinado, quando Dom Pedro I foi imperador; Período Regencial, em que Dom Pedro I abdicou o trono brasileiro, contudo, seu sucessor, Dom Pedro II, tinha apenas 5 anos de idade; e Segundo Reinado, período em que o Brasil teve como imperador Dom Pedro II. O marco inicial do Brasil Império é a Independência do Brasil, em 1822, contudo, é importante compreendermos que esse processo não aconteceu de modo instantâneo, além disso foi ganhando novos significados ao longo da história brasileira. O chamado Brasil Império: Figura 1.1 – Independência ou Morte, Pedro Américo, 1888 Fonte: Américo / Wikimedia Commons. A pintura Independência ou Morte, criada por Pedro Américo1 (1843-1905), tornou-se a obra de arte mais famosa do chamado “grito” de Independência. É um exemplo de tentativa de construção de identidade nacional, por meio da exaltação posterior desse período, pois ela foi pintada pelo artista somente em 1888, ou seja, 66 anos após a data da Independência. Com o reconhecimento do Brasil como território emancipado de Portugal, percebe-se a necessidade da criação de uma identidade nacional, visto que muitas regiões eram diferentes entre si e não tinham muito contato. Dom Pedro I, imperador do Brasil na época, buscava construir um projeto de nação, contudo, essa tarefa foi permeada por conflitos, pois diversas regiões não se sentiam pertencentes. REFLITA Nação: o conceito é utilizado para fazer referência a um grupo de pessoas que compartilham a mesma origem étnica, o mesmo idioma e costumes semelhantes. Para ser considerada uma nação, não basta a existência dos aspectos pontuados, mas também o sentimento de pertencimento de todos que fazem parte desse grupo social. A busca pela construção de uma identidade cultural brasileira pretendia também conter diversos conflitos. O processo de autonomização do Brasil não se restringe ou esgota em 1822. A desagregação do mundo colonial se estende pelo início do século XIX com a reformulação do papel das câmaras, a criação da Guarda Nacional e o fim das tropas e milícias, além das tentativas de várias províncias de proclamar a república e se tornar independentes do próprio Brasil (SOUZA, 2000, p.11). 1 Pedro Américo foi um importante pintor, historiador, poeta e romancista do século XIX. Além da obra que retrata a Independência da República, pintou, também, outras que tornaram-se conhecidas, como Batalha do Avaí e Batalha do Campo Grande. Um desses conflitos foi a Confederação do Equador, movimento político, ocorrido inicialmente em Pernambuco, em 1824, que depois se espalhou por outros estados do Nordeste e que buscava, entre outros objetivos, a separação do território brasileiro. Outro exemplo de conflito enfrentado pela monarquia brasileira no Primeiro Reinado foi a Revolução Farroupilha, que ocorreu entre 1835 e 1845. Essa revolta foi uma das que mais representou ameaças à integridade do território brasileiro. Inicialmente, foi organizada principalmente por grupos de elite, que residiam no estado do Rio Grande do Sul, que estavam insatisfeitos com as taxas cobradas pelo governo na época. Com o intuito de construir um sentimento de nação comum a todos que viviam no território brasileiro, foi criado, no ano de 1838, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), que tinha a função de produzir relatórios científicos sobre as diferentes regiões brasileiras, visando construir uma identidade cultural, política e social brasileira. Na época, os membros que compunham o IHGB faziam parte da elite, assim como aponta Manoel Guimarães (1988): E, portanto, à tarefa de pensar o Brasil segundo os postulados próprios de uma história comprometida com o desvendamento do processo de gênese da Nação que se entregam os letrados reunidos em tomo do IHGB. A fisionomia esboçada para a Nação brasileira e que a historiografia do IHGB cuidará de reforçar visa a produzir uma homogeneização da visão de Brasil no interior das elites brasileiras. E de novo uma certa postura iluminista – o esclarecimento, em primeiro lugar, daqueles que ocupam o topo da pirâmide social, que por sua vez encarregar-se-ão do esclarecimento do resto da sociedade – que preside o pensar a questão da Nação no espaço brasileiro (GUIMARÃES, 1988, p. 6). De acordo com Guimarães (1988), a história seria um meio indispensável para forjar a nacionalidade. O IHGB, através de embasamentos teóricos e elitistas, pretendia utilizar o instrumentário da história e da geografia para criar uma identidade nacional. Como vimos, buscou-se construir o sentimento de nação nos povos que viviam no território brasileiro, pois, na época, as diferentes regiões não se sentiam pertencentes a um mesmo país. Além disso, após a Independência, o Brasil não era mais uma colônia de Portugal, era necessária a existência desse sentimento de independência, pois ele possibilitaria a unificação do país e, consequentemente, poderia conter as revoltas e conflitos de caráter separatista. De certo modo, esses projetos obtiveram sucesso, pois o sentimento de nação passou a ser criado por parte da população que vivia em território brasileiro, contudo, essa identidade de pertencimento nacional ainda era recente e não compartilhada por todos, desse modo, veremos que, no início do Brasil Republicano, buscou-se investir e consolidar o sentimento de uma identidade nacional. FIQUE POR DENTRO O Período Regencial foi um intervalo, entre os anos de 1831 e 1840, ocorrido no Brasil entre o Primeiro e o Segundo Reinado. O Primeiro Reinado ocorre quando o Brasil deixa de ser colônia de Portugal, tendo como imperador Dom Pedro I, responsável por “declarar” a independência do país. No ano de 1831, ele abdica de seu trono, contudo, seu filho, que deveria ser seu sucessor, tinha apenas 7 anos de idade. A Constituição de 1824 dizia que uma pessoa com menos de 18 anos não podia assumir o cargo, por isso, o Império foi delegado a uma Regência, até que Dom Pedro II pudesse assumir. Em 1840, o Período Regencial chegou ao fim, após o chamado “Golpe da maioridade”, que subverteu a Constituição de 1824 e possibilitou que Dom Pedro II, na época com apenas 15 anos de idade, assumisse o Império. Para saber mais, assista ao vídeo sobre o Período Regencial produzido pelo canal Brasil Escola, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=dIDLmZd3wEU>. Acesso em: 04 jun. 2019. No Segundo Reinado, período governado por Dom Pedro II, o IHGB intensificou ainda mais seus projetos de criação de uma integridade entre diferentes regiões brasileiras. Atualmente, o IHGB ainda existe, sendo a mais antiga entidade de incentivo à pesquisa no Brasil. ATIVIDADE 1- D. Pedro é representado por Pedro Américo, em segundo plano, mas no centro da cena, ligeiramente deslocado para a esquerda, no momento em que levanta sua espada, rompendo simbolicamente os laços com Portugal. O séquito de D. Pedro e os soldados repetem o gesto e, em vivas, acenam com seus chapéus e lenços. Em verdade, é o restante do conjunto – comitiva, soldados, caipira – que interage com ele e faz com que direcionemos nosso olhar ao herói. SCHLICHTA, C. A. B. D. Independência ou Morte (1888), de Pedro Américo: a pintura histórica e a elaboração de uma certidão visual para a nação. In: XXV Simpósio Nacional de História ANPUH, Fortaleza, 2009. O texto acima faz referência a um quadroque se tornou bastante conhecido pelos brasileiros: Independência ou Morte, pintado por Pedro Américo, em 1888. Pode-se afirmar, a respeito dos objetivos da obra: a. pretendia exaltar as vestes utilizadas pela corte Imperial, por exemplo, lenços e chapéus. b. busca realizar uma releitura gloriosa do passado brasileiro através da exaltação da Independência. c. fortalecer o sentimento de dependência artística do Brasil em relação a Portugal, que, na época, possuía diversos pintores famosos em território brasileiro. d. contribuir para a construção de um pensamento moderno, visto que o Brasil passava por um intenso processo de industrialização. e. e) dar visibilidade para a Semana de Arte Moderna realizada, na cidade de São Paulo, por pintores modernistas, como Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti. A construção da identidade nacional brasileira no Período Republicano Seguindo nossa trajetória pelos caminhos que buscaram construir uma identidade cultural brasileira veremos agora o Período Republicano, que contempla desde a Proclamação da República, em 1889, até os dias atuais. A Proclamação da República deu fim à Monarquia Constitucional Parlamentar e instaurou um novo regime governamental. O Brasil, antes governado por imperadores, passou a ser comandado por presidentes. Esse tipo de governo permanece até os dias atuais. Nosso objetivo é compreender como foi sendo construída a identidade cultural brasileira ao longo desse período. Primeira República A Primeira República (1889-1930), conhecida como “República Velha”, ocorreu de 1889 até a Revolução de 1930, liderada por Getúlio Vargas. Esse primeiro período republicano costuma ser dividido em República da Espada, período em que o Brasil teve como presidentes os militares Marechal Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, e a República Oligárquica, liderada pelas oligarquias rurais do estado de São Paulo e de Minas Gerais, conhecida como “República Café com Leite”, pois, na época, a economia paulista tinha o café como principal produto, e a mineira, o leite. Para compreendermos melhor a construção da identidade cultural brasileira no início do período republicano, é importante pontuar que o processo de transição do período imperial para a República ocorreu por meio de um golpe militar, propiciado, na época, por diversos fatores, ele não foi marcado por intensa participação popular, isso é, ocorreu principalmente devido a disputas de interesses entre as elites nacionais, e não necessariamente pelo interesse imediato da maior parte da população. O Brasil havia se tornado uma República, contudo, não existia um sentimento republicano compartilhado pela população. A tentativa de criação desse sentimento foi a principal diretriz da construção da identidade cultural brasileira no início do período republicano. REFLITA Sentimento republicano: sentimento de pertencimento e defesa do sistema republicano, que inclui a existência de uma constituição que regula outras legislações, existência de representantes que governam em nome da população e busca pelo bem comum, ao invés de satisfação de interesses particulares. O segundo momento da chamada República Velha, conhecido como República Oligárquica, como o próprio nome sugere, garantiu a manutenção do poder das oligarquias. Mesmo que parte da população tivesse direito ao voto (no início da Primeira República, as mulheres não podiam votar), ele era considerado moeda de troca, e não um direito democrático. FIQUE POR DENTRO# Você sabia que, até o ano de 1932, as mulheres eram proibidas de votar no Brasil? A partir desse ano, apenas mulheres casadas (com autorização do marido), viúvas e solteiras com renda própria tinham esse direito, sendo o voto estendido a todas as mulheres apenas em 1946. O processo de conquista do direito ao voto foi bastante longo e contou com a luta de diversas mulheres, como Bertha Lutz, responsável por fundar a Frente Brasileira pelo Progresso Feminino e liderar diversos movimentos pelo direito das mulheres ao voto; Isabel Dillon, responsável por realizar reivindicações pelo direito ao voto e também de ser votada, apresentando-se candidata à deputada; e a professora Celina Guimarães Vianna, que foi a primeira mulher a votar no Brasil. A luta pela democracia no Brasil foi marcada pela força e coragem de diversas mulheres. Quer conhecer a história de outras mulheres que ousaram lutar pelo direito ao voto no Brasil? Acesse: <https://www.huffpostbrasil.com/entry/mulheres-voto-feminino- brasil_br_5c703bcde4b06cf6bb256eb1>. Acesso em: 04 jun. 2019. O processo de rompimento da República Oligárquica ocorre devido a diversos conflitos e interesses. Desse modo, aprenderemos, de modo resumido, como ocorreu a transição, pois nosso principal objetivo é compreender como o projeto de construção de identidade cultural brasileira foi se modificando ao longo da história do Brasil. O fim da República Oligárquica ocorre após o rompimento do acordo entre São Paulo e Minas Gerais, que se revezavam com as eleições presidenciais. Em 1929, ano que ocorreu também a crise da Bolsa de Nova York, provocando queda nas exportações brasileiras de café, o então presidente, Washington Luís, indicou outro paulista, Júlio Prestes. Desse modo, o presidente (na época, chamava-se presidente, e não governador) do estado de Minas Gerais, Antonio Carlos, também recebeu apoio de governantes do Rio Grande do Sul e da Paraíba, formando a Aliança Liberal, tendo Getúlio Vargas e João Pessoa como líderes. Em 1930, Júlio Prestes venceu as eleições, contudo, não conseguiu assumir a presidência. João Pessoa, líder na Paraíba, foi assassinado, o que intensificou as justificativas para o golpe de estado que inseriu Getúlio Vargas como presidente. Na chamada República Velha, isso é, os anos iniciais do período republicano, buscou-se construir a identidade nacional brasileira, a partir, principalmente, do rompimento da valorização dos períodos anteriores, ou seja, de Portugal e da monarquia. Valorizava-se a ideia de que o Brasil era um país que teve influência portuguesa, mas sua existência cultural e política era, naquele momento, autônoma em relação a Portugal. Era Vargas Os anos seguintes ao governo de Getúlio Vargas até os dias atuais, como o regime militar, que ocorreu entre 1964 e 1985, o processo de redemocratização do Brasil e o período caracterizado como Nova República, também foram marcados por projetos que visavam construir e reformar aspectos da identidade nacional, contudo, focaremos nossos estudos no período varguista, visto que ele estruturou diversos aspectos do que conhecemos hoje como identidade cultural brasileira. O governo de Getúlio Vargas inicia-se na década de 1930 e busca criar mecanismos de controle e negociação política. Visando a esses objetivos, foram criados alguns departamentos, como o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), que veiculava imagens positivas do governo e controla diversos meios de comunicação. Departamentos como este foram responsáveis por criar aspectos da identidade cultural brasileira. Figura 1.2 – Getúlio Vargas (1882- 1954) Fonte: Governo do Brasil / Wikimedia Commons. Nesse período, a construção da nossa identidade passa, cada vez mais, a utilizar embasamentos de ciências como a História, as Ciências Sociais e a Geografia, pois é também nessa época que tais ciências passam a ganhar mais espaço no Brasil. Entre as principais diretrizes que contribuíram para a construção de uma identidade cultural comum aos brasileiros estão as reformas educacionais realizadas durante o governo de Getúlio Vargas. Na Primeira República, não existia um único ideal de educação, e sim diversos. Contudo, após a Proclamação da República, os governantes da oligarquia passaram a investir no processo de homogeneização do sistema escolar brasileiro,também com o intuito de contribuir para a construção de uma identidade nacional republicana. No período, o processo de escolarização também foi utilizado como instrumento para generalizar práticas higienistas disciplinadoras. A educação é vista como um campo capaz de modificar os indivíduos, desse modo, as elites pretendiam dominá-la e construí- la de acordo com seus interesses. A construção de um projeto nacional de educação também visa construir valores considerados civis e republicanos, sob a lógica de que era necessária “uma nova pessoa para um novo Brasil”. Pretendia-se construir uma identidade comum para a nação e fortalecer uma identidade nacional. Por exemplo, diversas reformas educacionais buscaram normalizar, profissionalizar e sistematizar o ensino das pessoas mais pobres, almejando, também, homogeneizar hábitos e vontades. A História foi utilizada como uma disciplina capaz de construir ideais de nacionalidade, por meio da revalorização de diferentes períodos do Brasil. Nas reformas curriculares de Francisco Campos, em 1931, e na de Gustavo Capanema, em 1942, em plena ditadura de Getúlio Vargas, a questão nacional continuou sendo o fio condutor do ensino de história e do sistema educacional tanto na formação política dos jovens como na formação da consciência nacional. A propaganda imagética, explorando as emoções, os sentimentos, a memória afetiva, os símbolos, imagens, rituais, reforçou o princípio da nacionalidade e facilitou a centralização política, divulgando a sua ideologia: nos livros didáticos, no rádio, nas paradas militares, nas apresentações de estudantes em praça pública, principalmente por ocasião das festas cívicas, na imprensa falada, escrita. O presidente Vargas criou o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) encarregado de organizar e controlar todas as manifestações públicas e divulgar as ações governamentais reforçando a ideia de uma identidade nacional comum (ZAMBONI, 2003, p. 370-371). Como aponta Zamboni (2003), durante o governo de Getúlio Vargas, o projeto de construção de uma identidade nacional também utilizou amplamente a publicidade, por meio de órgãos como o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP). Destaca-se a valorização do trabalho dos chamados sertanistas, como os irmãos Villas- Bôas2, que percorreram diversas regiões do território brasileiro, tarefa essa vista pelo governo como possível contribuição para o fortalecimento da nação e de sua identidade. Foi também durante o período do governo Vargas que surgiram obras importantes de intelectuais brasileiros que abordaram a identidade nacional, como Gilberto Freyre3, que estudaremos de modo mais aprofundado na segunda Unidade deste livro. Ocorre, também, a valorização e a criação de diversos aspectos, hoje considerados símbolos do Brasil, como o samba e o futebol. Nos anos 30, essas confluências – entre um esporte que cresce com força entre a população em geral e uma intencionalidade política de modernizar diversas instituições do país – geram as possibilidades de se enxergar no futebol e em todos seus corolários (estádios, torcida, federação e imprensa) o epicentro de um sentimento nacional. É nos anos 30 que se iniciam as copas do mundo, onde seleções com os melhores representantes de cada país passam a duelar para decidirem qual seria o melhor plantel mundial. No mesmo período, em 1933, institui-se o profissionalismo no país, indicando que o esporte não seria mais uma questão apenas de clubes ou chuteiras. O mundo do trabalho, ideia poderosa do período varguista, incorpora em suas bases seus novos heróis nacionais (SILVA, 2006, p. 135). Atualmente, o futebol é o esporte mais popular no Brasil, tendo a seleção brasileira conquistado cinco vezes o título de campeão do mundo em Copas. 2 Orlando Villas-Bôas, Cláudio Villas-Bôas e Leonardo Villas-Bôas foram brasileiros que fizeram parte da Expedição Roncador-Xingu, projeto desenvolvimento no período do governo de Getúlio Vargas, com o intuito de promover o processo de interiorização do Brasil. 3 Sociólogo e historiador brasileiro, nascido em Recife, Pernambuco, escreveu obras que tornaram-se bastante conhecidas e mudaram a forma de fazer pesquisas no campo da História no Brasil, como Casa Grande & Senzala, conhecida e debatida até os dias atuais. Figura 1.3 – Seleção Brasileira embarcando para a Copa do Mundo de 1934, realizada na Itália Fonte: Arquivo Nacional / Wikimedia Commons. Como vimos, o projeto de construção de uma identidade cultural brasileira atravessa diferentes momentos da história do país. No período do governo de Getúlio Vargas, buscou-se construir e consolidar o sentimento de uma identidade nacional, isso é, de que todas as pessoas que pertenciam às diferentes regiões do território brasileiro faziam parte de uma única nação. Para isso, diversas propostas foram realizadas, como a reforma no campo educacional, com o intuito de promover a padronização em diferentes estados, e a valorização de itens que se tornaram marcos da identidade nacional brasileira, como a música e o futebol. No próximo momento de nossos estudos, conheceremos elementos da música, da arquitetura, da literatura e da publicidade que contribuíram para a construção da identidade nacional. ATIVIDADE 2) Neste período da história do Brasil, houve um processo de unificação das políticas educacionais. A educação é vista como um campo que poderia provocar transformações no modo de pensar dos sujeitos, desse modo, as elites buscaram, também, construí-las de acordo com seus interesses. Esse processo de mudanças no campo educacional brasileiro também era uma importante estratégia para a construção de uma identidade nacional. O trecho apresentado faz referência ao período da história do Brasil chamado de: a) Primeiro Reinado. b) b) Era Vargas. c) c) Segundo Reinado. d) d) Brasil Colônia. e) e) Período Regencial. A ARTE NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE BRASILEIRA: LITERATURA, MÚSICA E PINTURA NO SÉCULO XX Vimos, anteriormente, diferentes períodos da história do Brasil e como eles construíram o projeto da criação da identidade nacional. Nosso foco, nesse momento, será apresentar como o campo das artes contribuiu com esse processo. Para compreendermos melhor, devemos busca fazer articulações com o que já estudamos anteriormente nesta Unidade, pois, assim, conseguiremos fazer aproximações entre o período histórico e as manifestações artísticas apresentadas. Literatura Compreender alguns aspectos da literatura brasileira também pode nos ajudar no processo de entendimento da construção de uma identidade nacional. De acordo com Pesavento (2000, p. 9): História e literatura apresentam caminhos diversos, mas convergentes, na construção de uma identidade, uma vez que se apresentam como representações do mundo social ou como práticas discursivas significativas que atuam com métodos e fins diferentes. A identidade, por sua vez, é um processo ao mesmo tempo pessoal e coletivo, onde cada indivíduo se define em relação a um ‘nós’ que, por sua vez, se diferencia dos ‘outros’. Destacaremos dois livros escritos por José de Alencar, Iracema e O Guarani, e o livro escrito pelo modernista Mário de Andrade, Macunaíma. José de Alencar (1829-1877) foi um autor do período caracterizado na literatura brasileira como Romantismo, movimento este que teve início na Europa, mas que também influenciou diversos outros países. A visão desse período colocava-se em oposição ao período anterior, caracterizado como Neoclassicismo, centrando-se no indivíduo e o valorizando. Diversos autores desse movimento artístico e filosófico escreveram romances que abordavam, por exemplo, tragédias de amores (muitas vezes, platônicos e/ou impossíveis) edramas pessoais. No Brasil, o Romantismo aproximou-se do sentimento nacionalista, pois, nesse período, década de 1820, o país vivenciava o processo de independência. REFLITA Sentimento nacionalista: refere-se à sensação de pertencimento, amor e valorização por uma nação. Como vimos anteriormente, nação refere-se a um grupo social que compartilha da mesma origem étnica, idioma e costumes parecidos, mas que também possui o sentimento de pertencimento. A obra Iracema, de José de Alencar, retrata a história de amor entre Martim, homem branco, de origem europeia, com Iracema, uma mulher indígena brasileira. No decorrer do livro, Iracema fica grávida de Martim, tendo um filho que é a “mistura” de um homem branco e de uma mulher indígena. O livro busca, entre outras interpretações, contar a história do Brasil e do povo brasileiro. A obra recebeu diversas críticas, visto que, no Brasil, as relações estabelecidas entre homens brancos, de origem europeia, e mulheres indígenas foram, na maior parte das vezes, violentas, e não amorosas, como relata Alencar em sua obra. Iracema é retratada como uma mulher sedutora, que provoca o amor de Martim e se coloca na posição passiva de esperar seu verdadeiro amor e é capaz de esperar por ele ou até mesmo morrer de saudades. Em O Guarani, a história se passa no século XVII, em uma fazenda do interior do estado do Rio de Janeiro. A figura indígena também aparece na obra, com o personagem Peri, pertencente à tribo dos Goitacases e amigo de um fidalgo português chamado Dom Antônio de Mariz, pai de Ceci. Peri era responsável por proteger Ceci, contudo, também era apaixonado por ela. A história narra diversos outros acontecimentos, mas sempre focando na devoção de Peri por sua amada e tendo como eixo também a vida de seu pai, Dom Antônio, que simboliza o homem branco colonizador. As críticas realizadas a esses livros de Alencar também sinalizam vieses do processo de construção de uma identidade nacional no Brasil Império, como o apagamento da população negra e a imposição da cultura branca europeia sobre a indígena. Naturalmente, o índio e o negro não contam nesse processo, pois não entram na história nesse momento de construção identitária. São invisíveis para a nação, seja pelo silêncio (caso do negro), seja pela incorporação mítica numa sociedade que os legitima como vencidos pelo branco colonizador (caso da narrativa histórica), seja como incorporados pelo amor romântico (caso do discurso literário, tal como Iracema ou O Guarani, de José de Alencar) (PESAVENTO, 1999, p.127). Conheceremos, agora, a obra Macunaíma, de Mário de Andrade, e seu papel no processo de construção da identidade brasileira. O livro foi escrito em outro período literário, denominado Modernismo, que teve como marco inicial a Semana de Arte Moderna de 1922, que estudaremos brevemente ainda nesta Unidade. Esse movimento literário ocorreu em um período de insatisfações políticas e buscou romper com tradicionalismos e formalidades, inclusive na escrita, por meio de versos livres e ausência de pontuações. No livro Macunaíma, Mário de Andrade também busca contar a história da formação do Brasil, através do personagem Macunaíma, considerado um herói sem caráter. O personagem nasce no mato virgem, sendo filho do medo e da noite, considerado uma criança preguiçosa e manhosa. Quando adulto, apaixona-se por Ci e acabam tendo um filho, que morre ainda bebê. Devido ao desgosto causado pela morte do filho, Ci sobe aos céus, virando uma estrela. A única recordação que Macunaíma possuía de Ci era um amuleto, contudo, ele acaba perdendo-o e sai em busca de reencontrá-lo. Na obra Macunaíma, Mário de Andrade busca construir a ideia do Brasil como unidade, uma única nação, ou seja, unir diversas características da cultura nacional. [...] Mário de Andrade pôde, através do sentimento nacional encontrado, pôr em prática duas teses suas: o primitivismo do povo brasileiro e a legitimidade estética da literatura popular e oral, para auxiliar a criação erudita. A elaboração do enredo usou dos três elementos formadores da nacionalidade: índio, português, negro (LOPEZ, 1974, p. 9). O movimento modernista buscou produzir obras que abordassem a identidade brasileira por meio da cultura afro-brasileira, contudo, existem também diversas críticas com relação à obra Macunaíma. Um homem negro é protagonista do livro, todavia, aparecem apontamentos caracterizados como racistas, como o banho tomado por Macunaíma e outros personagens, quase no fim da história. Mário de Andrade escreve que, ao sair da água, Macunaíma torna-se um branco de olhos azuis, assim, seu irmão, Jiguê, também entra na água, na tentativa de ficar da mesma forma, contudo, a cor de Macunaíma (colocada como “sujeira”) não permite que ele fique branco, e sim da cor de “bronze novo”. Por fim, quando o personagem Maanape entra na água, consegue clarear apenas os pés e as mãos. Nessa passagem, Mário de Andrade buscou retratar a diversidade do povo brasileiro, mas, na verdade, acabou reforçando visões racistas, com a ideia de que a cor da pele negra é uma “sujeira” que precisa ser “lavada”. Música A música também foi um campo que contribui para a construção de uma identidade nacional. Não seria possível abordarmos toda a diversidade musical brasileira e sua contribuição nesse processo, por isso veremos, aqui, dois destaques: um ritmo musical, o samba, de origem afro-brasileira; e uma artista que ficou bastante conhecida, a cantora Carmen Miranda. O samba é um ritmo musical brasileiro que tem origem na musicalidade de povos de origem africana que foram escravizados no Brasil. No século XIX, a cidade do Rio de Janeiro recebeu diversas pessoas negras que viviam em outras regiões do país. Aconteciam encontros em praças públicas no centro da cidade, como na Praça Onze, em torno das religiões iorubás. Nesses lugares, passaram a acontecer as rodas de samba, por meio da mistura de elementos do batuque africano, do maxixe e da polca. A história do samba no Brasil é bastante extensa e contempla diversas lutas e resistências dos povos de origem africana, desse modo, é importante sabermos que, nesta unidade, faremos apenas um resumo de sua influência na cultura brasileira e na construção de uma identidade nacional. O samba não foi utilizado inicialmente pelo governo como uma ferramenta para a construção de uma identidade nacional, pelo contrário, era bastante reprimido. Por ter suas raízes na cultura afro-brasileira, no início da Primeira República, segundo Soihet (1998), as rodas de samba eram alvo de estigmas, preconceito e repressão. O samba, ainda segundo a autora, era considerado um ritmo depravado, obsceno e inferior a outras manifestações musicais. Figura 1.4 – Batuque, 1835. Obra pintada por Johann Moritz Rugendas (1808-1858) Fonte: Johann Moritz Rugendas / Wikimedia Commons. No Estado Novo, período comandado por Getúlio Vargas, a figura do trabalho como formador da dignidade humana passa a ser cada vez mais defendida, uma vez que a industrialização no país era incentivada pelo governo. Nessa época, a figura do compositor passa a ser associada à figura do malandro, considerado uma pessoa vadia, conquistadora, briguenta e boemia. Com o passar dos anos, o samba passou a ser utilizado como uma espécie de “cartão postal” brasileiro, isso é, um ritmo típico também exportado para outros países. Nesse processo, houve também o chamado “embranquecimento” do samba, isso é, cantores brancos passaram cada vez mais a se apropriar do ritmo, que passou a ser visto pelo governo de outra forma. REFLITA Você já ouviu falar em apropriação cultural? É um termo utilizado para fazer referência à apropriação de ideias, músicas, símbolos, imagens, objetos etc. de uma cultura historicamentemarginalizada por outra, que é considerada dominante, por terem relações desiguais de poder. Um exemplo é o caso do samba. O ritmo sofreu diversas represálias e foi visto com muito preconceito. Contudo, quando virou lucrativo, passou a ser valorizado e “embranquecido” para a mercantilização. O termo ficou bastante conhecido nas redes sociais após alguns casos, como o uso de turbantes por pessoas brancas ou a utilização de símbolos indígenas como “fantasias”. As pesquisadoras Djamila Ribeiro (2016) e Stephanie Ribeiro (2017) defendem que o tema precisa ser compreendido a partir de uma perspectiva estrutural, e não individual. Para elas, existem problemáticas que precisam ser debatidas, pois nesses processos de aculturação diversos elementos são esvaziados de sentido de uma cultura, visando à mercantilização e “invisibilizando” populações que vivenciam diversos preconceitos e violências. Para Djamila Ribeiro (2016), a cultura negra acaba, muitas vezes tornando-se, mas as pessoas negras não. E você, o que pensa sobre isso? Fonte: Ribeiro (2016, on-line); Ribeiro (2017, on-line). Conheceremos, agora, uma cantora que se tornou símbolo do Brasil também fora do país: Carmem Miranda. Maria do Carmo Miranda da Cunha (1905-1955), conhecida popularmente como Carmem Miranda, foi uma cantora e atriz brasileira. Ficou famosa no Brasil e nos Estados Unidos da América, entre as décadas de 1930 e 1950. Vestia-se de forma bastante característica, utilizando figurinos coloridos e chapéus com diversas frutas. Figura 1.5 – Carmen Miranda, na capa da revista americana Click, 1939 Fonte: JKBRASIL / Wikimedia Commons. De acordo com Kerber (2002), as músicas cantadas por Carmen Miranda abordavam com frequência o nacionalismo, como a música “Eu gosto da minha terra”, escrita por Randoval Montenegro, que, em seus versos, diz: Deste Brasil tão famoso eu filha sou, vivo feliz Tenho orgulho da raça, da gente pura do meu país Sou brasileira reparem, no meu olhar, que ele diz E o meu sambar denuncia que eu filha sou deste país [...] https://commons.wikimedia.org/wiki/Carmen_Miranda#/media/File:Carmen_Miranda,_November_1939.jpg https://commons.wikimedia.org/wiki/Carmen_Miranda#/media/File:Carmen_Miranda,_November_1939.jpg Outro exemplo apontado por Kerber (2002) é a música “Bom dia, meu amor!”, escrita por Joubert de Carvalho e Olegário Mariano, que diz: Nas aulas de francês e de espanhol De inglês, de italiano, de alemão A gente aprende sempre a lição: Good-morning, good-morning my dear Buongiorno, bonjour mon amour Mas o que é melhor dos três é o português: Bom dia, meu amor, amor [...] De acordo com Kerber (2002), na música “Bom dia, meu amor!”, a comparação do Brasil com outras nações importantes no cenário mundial é realizada com o intuito de promover uma valorização do país. Evidentemente que o português representa o Brasil. Assim, a valorização da Língua Portuguesa representa, automaticamente, uma valorização da Nação brasileira. A comparação do Brasil com nações como a França, a Alemanha, os Estados Unidos e a Inglaterra, representa uma tentativa, também, de valorização deste Brasil. Note-se: o Brasil não está, nessas canções, sendo comparado com nações pobres ou pouco importantes no cenário internacional. Compara-se o Brasil justamente às nações mais ricas, importantes e avançadas no processo de construção de um imaginário sobre si daquele momento. Isso é, claramente, uma tentativa de colocar, dentro do imaginário popular, o Brasil em uma posição mais elevada e próxima às grandes nações do mundo (KERBER, 2002, p. 140). As músicas aqui citadas são exemplos de como Carmem Miranda abordava o nacionalismo nas canções que interpretava, contribuindo para a construção da identidade nacional na época. Além de cantora, ela ficou bastante conhecida, nos Estados Unidos da América, como atriz, nas décadas de 1940 e 1950. Algumas críticas apontam que, mesmo visando promover a identidade nacional, a imagem de Carmem Miranda não simbolizava a maior parte das mulheres brasileiras, uma vez que ela era uma mulher branca e de nacionalidade portuguesa. Pintura Nesta última parte de nossos estudos sobre a construção da identidade nacional a partir de vieses artísticos, conheceremos alguns pintores(as) brasileiros que, em suas obras, representaram a identidade cultural brasileira, no início do século XX. Utilizaremos, como recorte teórico para nossa aprendizagem, a Semana de Arte Moderna de 1922 e artistas da época, uma vez que ela está situada no início do Período Republicano que estudamos anteriormente. A Semana de Arte Moderna de 1922 ocorreu entre os dias 11 e 18 de fevereiro, do ano de 1922, na cidade de São Paulo. Diversos artistas participaram desse evento, como Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Tarsila do Amaral e Manuel Bandeira. O Modernismo é a primeira expressão do novo Brasil. O objetivo de artistas e intelectuais da época era o de colocar a cultura brasileira coerente com a nova época, além de torná-la um instrumento de conhecimento efetivo de seu país (ZILIO, 1997, p. 40). Tarsila do Amaral foi uma importante artista do movimento Modernista e também fez parte do chamado movimento Antropofágico. Pintou diversos quadros que se tornaram bastante conhecidos, como Abaporu (1928), símbolo do movimento Antropofágico, e Operários (1933). Na obra de Tarsila, reside a síntese do Modernismo. Na referência à cidade e ao campo, procura incorporar todos os aspectos do Brasil, dando a eles um sentido de temporalidade. O campo assume o valor de manutenção do passado, porque conserva os sinais da ‘infância’ do próprio país – e também uma referência à infância da artista. A cidade representa o presente e as transformações sociais pelas quais passa a nação (SANT’ANNA MULLER, 2006, p. 654). Figura 1.6 – Abaporu (1928), Tarsila do Amaral - obra símbolo do movimento Antropofágico Fonte: Tarsila do Amaral / Wikipedia. O Manifesto Antropofágico, publicado no ano de 1928, expressa diversos objetivos dos artistas que participaram da semana. Ele aborda a dependência cultural brasileira e cita diversos nomes importantes de nossa história, como o Padre Vieira e Dom João VI, por meio de uma escrita que utiliza metáforas e expressões de humor. O manifesto foi importante para o movimento Modernista no Brasil, uma vez que exaltou características brasileiras na arte, tanto na forma como era vista no Brasil quanto em outros lugares do mundo. ATIVIDADE 3) Leia, a seguir, um trecho da música “O que que a baiana tem?” escrita por Dorival Caymmi e gravada por Carmen Miranda, no ano de 1939: O que é que a baiana tem? O que é que a baiana tem? Tem torso de seda tem (tem) Tem brinco de ouro tem (tem) Corrente de ouro tem (tem) Tem pano da Costa tem (tem) Tem bata rendada tem (tem) Pulseira de ouro tem (tem) (Dorival Caymmi, 1939) A partir da letra e da relação da cantora com a construção de uma identidade nacional brasileira, pode-se afirmar que: a) a cantora Carmen Miranda buscava retratar apenas experiências da região Nordeste do Brasil, o que, na época, dificultou a construção de uma identidade nacional. b) a nacionalidade era tema frequente nas músicas interpretadas por Carmen Miranda, contribuindo para o projeto de construção da identidade nacional republicana. c) Carmen Miranda tornou-se um símbolo brasileiro, por decidir fazer sucesso apenas em território nacional, não estendendo sua carreira a outros países. d) a letra apresentada tem como objetivo retratar as dificuldades enfrentadas pela população nordestina, assim como diversas outras músicas, livros e pinturas do início do século XX, como o livro Vidas Secas, escrito por Graciliano Ramos. e) a origem baiana de Carmen Miranda fezcom que ela tivesse dificuldades para fazer sucesso no início de sua carreira, pois as diferentes regiões brasileiras não se entendiam como um único país. MULTICULTURALISMO, IDENTIDADE NACIONAL E GLOBALIZAÇÃO Nesse tópico, conheceremos as especificidades do multiculturalismo, da identidade nacional e da globalização. Vamos lá? O que é multiculturalismo? Multiculturalismo é um termo utilizado para fazer referência às chamadas sociedades multiculturais, isso é, locais em que diversas culturas existem em um mesmo território. Figura 1.7 – Sociedade multicultural: existência de diferentes culturas em um mesmo território Fonte: artqu / 123RF. As relações estabelecidas entre pessoas de diferentes culturas, em um mesmo território, podem ser de tolerância ou também de conflito e/ou rejeição. As discussões sobre essas relações não são assuntos apenas de sociólogos, historiadores ou outros pesquisadores das culturas e relações humanas, mas também de todos nós, pois estão presentes em nosso cotidiano. Vemos, com frequência, notícias, reportagens ou até mesmo conversas entre amigos que produzem e reproduzem diversos preconceitos, como comentários xenofóbicos e estereótipos de diferentes culturas. A xenofobia é o sentimento de hostilidade e ódio por pessoas estrangeiras. Um exemplo é o preconceito vivenciado por mexicanos que estão nos Estados Unidos da América. Aqui, no Brasil, podemos tomar como exemplo os haitianos e os venezuelanos, que, nos últimos anos, vieram para o país e acabaram sofrendo diversos preconceitos por parte dos brasileiros. Estereótipos são imagens preconcebidas de pessoas, grupos ou situações em que são traçados perfis simplificados e generalistas, com base em preconceitos. Um exemplo de estereótipo é a afirmação de que “toda menina gosta de rosa e de brincar de boneca”, o que não é verdade, pois diversas meninas preferem outras cores e brincadeiras. Considerando as informações apresentadas, entendemos que as discussões sobre multiculturalismo são importantes para a formação profissional em diferentes campos do conhecimento e, também, para a formação de sujeitos que saibam conviver e respeitar diferenças. O termo multiculturalismo pode ser compreendido por diferentes autores de formas diversas, assim como aponta Canen (1997, p. 92): Desta forma, críticos e defensores do mesmo travam, muitas vezes, lutas e discussões em torno de um conceito que, na verdade, pode estar sendo entendido de formas diferentes para os envolvidos em tais disputas. A começar pelo nome: alguns apontam que o interculturalismo seria um termo mais apropriado, na medida em que o prefixo ‘inter’ daria uma visão de culturas em relação, ao passo que o termo multiculturalismo estaria significando o mero fato de uma sociedade ser composta de múltiplas culturas, sem necessariamente trazer o dinamismo dos choques, relações e conflitos advindos de suas interações. Segundo os apontamentos de Canen (1997), alguns autores compreendem o multiculturalismo como a existência de diferentes culturas em um mesmo território, já outros buscam estudar as relações existentes entre diferentes culturas. O chamado multiculturalismo crítico, por exemplo, busca articular visões folclóricas com discussões sobre relações desiguais de poder entre diferentes culturas e refletir sobre a construção histórica de preconceitos e discriminações. Essa perspectiva tem sido criticada por alguns pesquisadores pós-modernos e/ou pós-coloniais, que pontuam a necessidade dos estudos irem além, isso é, não somente identificar esses discursos, mas também identificar, na própria linguagem e construção de tais discursos, as diferenças de poder construídas e exercidas. Em outras palavras, isso significa que algumas perspectivas pós-modernas e/ou pós-coloniais buscam, também, “descolonizar” discursos, identificar expressões preconceituosas e construções de linguagens que representam apenas perspectivas ocidentais, coloniais, brancas, masculinas etc. (CANEN, 1997). FIQUEPORDENTRO O conceito de etnocentrismo é importante para compreendermos estudos multiculturais. Pode ser definido como a visão sobre o mundo com base apenas no próprio grupo, ou seja, quando observamos e julgamos outras culturas somente a partir dos valores da nossa sociedade. Esse tipo de compreensão sobre o outro produz e reproduz preconceitos e estereótipos. Visões etnocêntricas nos fazem avaliar costumes de outras culturas, diferentes das nossas, como inferiores. Um exemplo que podemos citar é no campo culinário. As culturas utilizam diferentes vegetais, verduras e animais em seus preparos, como o escargot, caracol utilizado na culinária francesa. Para nós, brasileiros, pode ser diferente saber que pessoas se alimentam de caracóis, contudo, julgar uma cultura como inferior à nossa, devido aos seus hábitos alimentares, é uma visão etnocêntrica. Para saber mais sobre o conceito de etnocentrismo, acesse: <https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/etnocentrismo.htm>. Acesso em: 05 jun. 2019. Como mencionado por Canen (1997), o multiculturalismo pode ser compreendido a partir de diferentes vieses. Veremos, agora, como podemos compreender o tema articulado à identidade nacional brasileira. https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/etnocentrismo.htm Multiculturalismo e Identidade Nacional Vimos, no decorrer da Unidade 1, o processo de construção da identidade nacional em diferentes períodos da história do Brasil. Veremos, agora, as relações entre o multiculturalismo e a identidade nacional. O Brasil é um país que contempla diferentes culturas e etnias. Antes dos portugueses iniciarem o processo de colonização no país, diferentes povos viviam aqui. O termo mais adequado para nos referirmos aos povos originários da América é indígenas, e não índios, pois existiam diferentes povos, com diferentes culturas e tradições. Quem generalizou essas diferentes culturas, referindo-se a elas como índios, foram os europeus. REFLITA Cultura: de forma simplificada, podemos compreender que o conceito de cultura, no campo sociológico, refere-se a aspectos que os seres humanos adquirem ao longo da vida, a partir do contato social, como costumes, crenças, leis, artes, linguagens e conhecimentos. Tradição: transmissão de conhecimentos, hábitos, valores, costumes, crenças, lendas e memórias que são transmitidas para pessoas de diferentes gerações de uma comunidade. Ao retomarmos a história do Brasil, vemos que, além dos povos originários que existiam aqui, outros povos, de outras regiões do mundo, também vieram para cá, seja à força, como a diáspora africana, ou devido à possibilidade de oportunidades de vida, como os europeus, no século XIX, e os japoneses e sírio-libaneses, no século XX. Figura 1.8 – O Brasil é um país com diferentes culturas e etnias Fonte: rawpixel / 123RF. Muitos autores consideram o Brasil um país miscigenado, isso é, um território em que existem diferentes etnias. Contudo, é importante destacar que o estupro e outras violências contra as mulheres fizeram parte desse processo. A própria história brasileira se constitui mediante o estupro. Da chegada dos portugueses e do estupro das mulheres indígenas, que dá início à tão enaltecida miscigenação do povo brasileiro, à chegada de negros e negras para servirem em sistema de escravidão aos senhores da casa grande, no que se incluía a violência sexual, cujo fruto, se houvesse, seria mais um escravo da fazenda como todos os outros. Para o escravizador, mulheres negras eram bens móveis sub-humanos, apenas ‘carnes’ das quais eram proprietários (NIELSSON; WERMUTH, 2018, p. 178). A diversidade cultural existente no país também foi empecilho enfrentado pelos governos brasileiros, para a construção de uma identidade brasileira compartilhada por todos que aqui residiam.Como vimos no início da Unidade 1, houve diversos conflitos separatistas durante o Brasil Império, pois diversas regiões não se sentiam pertencentes a um mesmo território. FIQUEPORDENTRO A umbanda é uma religião afro-brasileira que sincretiza outras religiões, como o catolicismo, o espiritismo e religiosidades de origem africana, indiana e indígena. O local onde são realizadas as cerimônias da umbanda é chamado de Casa, Terreiro ou Barracão. Podem, também, ser feitas cerimônias em lugares abertos, como praias ou rios. Para a umbanda, existe um deus supremo, chamado de “Olorum” ou “Oxalá”, contudo, também existe adoração de personificações de elementos da natureza e de energia, chamados de orixás. Os orixás, segundo a umbanda, possuem guias espirituais, chamados também de “entidades”, como caboclos, pretos velhos, baianos, marinheiros e erês. Por ser uma religião de origem afro-brasileira, a umbanda ainda é vista com preconceito. Saber mais sobre essa religião é importante para repensarmos intolerâncias religiosas: <http://umbanda-orixas.info/o-que-e-umbanda.html>. Acesso em: 05 jun. 2019. Multiculturalismo e globalização A globalização pode ser definida como uma aproximação entre diferentes sociedades existentes no mundo, provocando diversas mudanças políticas, econômicas e sociais que ocorreram no mundo no último século. Esse processo resultou na maior proximidade entre locais distintos, fazendo, hoje, com que eles, mesmo diferentes, compartilhem de experiências comuns. Vemos, portanto, que, com o processo de globalização, o multiculturalismo, ou seja, a existência de diferentes culturas em um mesmo território, torna-se ainda mais presente e frequente. Podemos pensar, como exemplos de aproximações entre diferentes territórios do planeta, nas relações de dependência econômica entre diferentes nações. Outro exemplo é a existência de multinacionais em diversos países, como a rede de fast-food McDonald's, presente, atualmente, em 119 países. Existem diferenças entre as lanchonetes existentes no mundo, por exemplo, no México, local onde o McDonald’s já ofereceu, em seu cardápio, pão com feijões, queijo e salsa e, no Paquistão, onde são servidos sanduíches de frango no pão sírio. Mesmo existindo algumas adaptações dos lanches servidos em diferentes locais, a mesma rede está presente em diferentes culturas. Figura 1.9 – McDonald’s na cidade de Tóquio, Japão Fonte: Paul Vlaar / Wikimedia Commons. Outro exemplo recente é a Netflix, plataforma de streaming utilizada em diferentes países do mundo. Existem algumas diferenças na oferta de séries e filmes em alguns países, contudo, grande parte dos vídeos está disponível para a maior parte deles. Atualmente, por exemplo, podemos assistir, no Brasil, uma novela libanesa, disponível na Netflix, que é uma plataforma de origem estadunidense, ou seja, o mundo globalizado faz com que diferentes culturas estejam em contato. Diversos pesquisadores do século XX e XXI dedicaram-se a estudar as relações entre a globalização e a cultura. Um deles foi o teórico e sociólogo Stuart Hall (1932-2014), nascido na Jamaica e fundador do que é conhecido hoje como Estudos Culturais Britânicos; Néstor García Canclini (1939-atualmente), de nacionalidade argentina, que tem se dedicado a realizar estudos sobre a cultura a partir de pontos de vista latino- americanos; e Homi Bhabha (1949-atualmente), pensador de origem indiana que se dedica a estudos pós-coloniais. Os três teóricos dedicaram-se a pensar as relações culturais nas sociedades e abordaram concepções sobre o hibridismo cultural. A palavra hibridismo é um processo de união de duas ou mais palavras diferentes, ou seja, o hibridismo cultural refere-se ao intercâmbio entre diferentes culturas. O ir e vir do visível e do invisível, do qualitativo e do quantitativo, em um grupo ou grupos pelo intercambiar de conhecimentos, concepções, noções, interações políticas, econômicas e outros provoca aquilo que alguns autores denominam hibridismo cultural. Nesse cenário, Ortiz (2003, p. 83) aponta para o surgimento de culturas híbridas, pois ‘a mobilidade das fronteiras dilui a oposição entre o autóctone e o estrangeiro’. Soma-se a percepção da inexistência de um único modelo de organização mobilizável, mesmo na base, porque o mundo se caracteriza pela diversidade de populações e situações entrelaçadas em sistemas de crenças e práticas variadas no tempo e no espaço (BELINAZO, 2006, p. 7-8). Para Canclini (2011 apud SOUSA, 2014) o hibridismo cultural é uma prática multicultural que é possível a partir do encontro de diferentes culturas. O autor propõe dois conceitos-chave para a expressão do hibridismo cultural, são eles: desterritorialização e descolecionamento. O descolecionamento, segundo Canclini (2011 apud SOUSA, 2014) possibilita que um bem cultural seja produzido e disponibilizado para grande parte da população. O descolecionamento dá sentido, sobretudo, ao fim da produção de bens culturais colecionáveis resultando na quebra de divisões entre cultura elitista, popular e massiva. O descolecionamento seria possibilitado pelo uso de recursos tecnológicos como a fotocopiadora, o videocassete e o video game, que destituiriam as referências que ancoravam o sentido das coleções. Eles permitem que um bem cultural seja reproduzido e disponibilizado mais facilmente para a população (SOUSA, 2014, p. 2). A desterritorialização, considerada, por Canclini (2011 apud SOUZA, 2014), o segundo fator responsável pela desarticulação da América Latina, refere-se à “transnacionalização dos mercados simbólicos, ocasionada pela descentralização das empresas e a disseminação dos produtos pela eletrônica e telemática. O autor cita nesse processo, também, as migrações multidirecionais, referindo-se à experiência diaspórica” (CANCLINI, 2011 apud SOUSA, 2014, p. 2-3). Para Stuart Hall e Homi Bhabha, o hibridismo é visto como um processo em que existem ambivalências e antagonismos resultados de negociações culturais que possuem relações não hierárquicas de poder (2010 apud SOUSA, 2014). De acordo com Bhabha (2010 apud SOUSA, 2014), é uma ameaça à autoridade colonial. Diferentemente de Canclini, ele compreende o hibridismo como resultante de choques entre diferentes culturas. Resulta da contestação do discurso hegemônico dominante no qual a autoridade do colonizador é subvertida através da ironia do colonizado, que exige que suas diferenças culturais sejam observadas, produzindo assim, um discurso híbrido. Homi Bhabha (2010) propõe que o hibridismo não resolve o embate e o processo de tensão entre duas culturas, não é um novo elemento que surge da junção entre duas matrizes culturais distintas, conforme vemos em Canclini (2011). O hibridismo seria sob esse viés, um processo resultante do choque, do embate, não se trata de um simples processo de adaptação e ressignificação cultura (SOUSA, 2014, p. 5). Para Stuart Hall (2010 apud SOUSA, 2013) o processo de hibridização ocorre no contexto da diáspora e também nas traduções culturais vivenciadas por indivíduos, ao buscarem se adaptar a matrizes culturais diferentes da sua. O hibridismo não é um processo que traz ao sujeito a sensação de completude ao dialogar com outras culturas, pelo contrário, seria o momento onde o sujeito percebe que sua identidade está sempre sendo reformulada, ressignificada e reconstruída, num jogo constante de assimilação e diferenciação para com o ‘outro’ (SOUSA, 2014, p. 5). Não existe uma única visão sobre como ocorrem as relações entre diferentes culturas na contemporaneidade. Vimos, de forma breve, as principais considerações de alguns autores contemporâneos que se dedicaram a pensar o conceito de hibridização cultural, contudo, as reflexões estendem-se também a você, aluno(a), pois pensar as relaçõesculturais é uma atividade pertinente na formação de diferentes campos do conhecimento. ATIVIDADE 4) Leia o seguinte trecho escrito por Jacques d'Adesky (1997, p. 178): As bases democráticas de uma sociedade multicultural levam exatamente à exigência e à aceitação do reconhecimento de igual valor das diferentes culturas que a compõem. O desafio que tal sociedade coloca é conseguir tornar possível a convivência de culturas ou grupos muito variados. Trata-se, portanto, de instaurar um consenso democrático que seja respeitoso em relação a essa diversidade sem tomar-se um simples encontro de interesses divergentes. Pode-se afirmar, a partir do trecho apresentado e dos estudos sobre multiculturalismo, que: a) os estudos multiculturais buscam construir teorias para justificar a sobreposição de uma cultura por outra. b) os estudos multiculturais sinalizam que as relações estabelecidas entre diferentes culturas, em mesmo território, podem ser de tolerância ou também de conflito. c) o multiculturalismo impossibilita práticas democráticas nas sociedades contemporâneas. d) as sociedades contemporâneas enfrentam o desafio de conter o multiculturalismo, considerado forte ameaça à democracia. e) os interesses divergentes, segundo o trecho, sinalizam a impossibilidade de existência de sociedades multiculturais. INDICAÇÕES DE LEITURA Nome do livro: Manifesto antropófago Editora: Penguin - Companhia das Letras Autor: Oswald de Andrade ISBN: 8582850492 Comentário: Esse livro reúne quatro textos famosos de Oswald de Andrade, são eles: Manifesto da Poesia Pau Brasil, Manifesto Antropófago, Falação e Antologia. Trata-se de uma obra que permite que o leitor compreenda os principais ideais modernistas e o chamado “Movimento Antropofágico”, teorizado por Oswald de Andrade e também por Tarsila do Amaral. O movimento buscou, entre outros aspectos, questionar a dependência brasileira de outros países, sendo propostas obras de arte e literárias que fossem realmente nacionais e retratassem o povo brasileiro. INDICAÇÕES DE FILME Nome do filme: Babel Gênero: Drama/Suspense Ano: 2006 Elenco principal: Brad Pitt, Cate Blanchett e Gael Garcia Bernal Comentário: Ahmed (Said Tarchani) e Youssef (Boubker At El Caid) são duas crianças do Marrocos que estão com o rifle que seu pai lhes deu para proteger a criação de cabras da família. Eles acabam atingindo um ônibus de turistas que atravessa a região e Susan (Cate Blanchett), uma mulher americana, é atingida. O filme busca, a partir desse acontecimento, retratar as consequências desse fato para outras pessoas, em diferentes regiões do planeta. Trata-se de uma história repleta de suspense que nos faz refletir sobre as diferenças e as proximidades existentes entre diferentes regiões do planeta. UNIDADE II Relações étnico-raciais e desigualdade social Karen Eduarda Alves Venâncio Patrick Aparecido Trento Introdução Nesta unidade, caro(a) estudante, você aprenderá a respeito das relações étnico-raciais e das desigualdades sociais existentes no Brasil. Para isso, inicialmente, abordaremos algumas questões raciais, como o período escravocrata brasileiro e as consequências dele na sociedade atual, a importância da cultura africana na formação do Brasil e os preconceitos vivenciados pela população negra. Em seguida, apresentaremos os conceitos de um dos principais nomes dos estudos raciais no Brasil, Gilberto Freyre (1900-1987), e o impacto de sua obra mais conhecida: Casa grande e senzala. Assim, discutiremos as relações da obra com o contexto histórico em que foi construída, abordando os aspectos que sustentam o pensamento de Freyre, além de como suas ideias foram recebidas na época da publicação do livro e como é vista atualmente. Depois, apresentaremos outro importante pesquisador brasileiro: Florestan Fernandes (1920- 1995), considerado um dos maiores sociólogos brasileiros e da América Latina e que tem alcance internacional. Assim, discutiremos como Fernandes compreende as relações raciais no Brasil e propõe alternativas para a superação das desigualdades sociais brasileiras. Ademais, abordaremos as principais diferenças entre os pensamentos de Freyre e de Fernandes. Por fim, apresentaremos dois tipos de políticas afirmativas: as cotas sociais e as cotas raciais. Nesse contexto, defenderemos essas duas políticas afirmativas como propostas capazes de diminuir as desigualdades sociais e raciais existentes no Brasil. Fonte: Wilfredor / Wikipédia. QUESTÕES RACIAIS NO BRASIL De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2017, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, o salário de uma pessoa negra é em torno de R$ 1.570,00, e de uma pessoa branca é de R$ 2.814,00. Existe uma diferença de cerca de R$ 1.200,00 entre o salário de uma pessoa branca e uma pessoa negra. O desemprego também sinaliza a desigualdade. A PNAD de 2017 registrou uma taxa de desemprego mais alta entre pessoas não brancas, 28,1%, enquanto, no caso de pessoas brancas, a porcentagem era 9,5%. Além disso, a taxa de homicídio de pessoas negras no Brasil era de 40,2, enquanto a de não negros era de 16 por 100 mil habitantes. Esses dados mostram as desigualdades existentes entre pessoas negras e brancas no país e como o racismo está presente na sociedade brasileira. FIQUE POR DENTRO Para ter acesso aos dados citados acerca das questões raciais no Brasil, leia os textos “IBGE mostra as cores da desigualdade” e “Taxa de homicídios de negros é mais do que o dobro da de brancos no país”, que estão disponíveis, integralmente, nos links: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de- noticias/noticias/21206-ibge-mostra-as-cores-da-desigualdade> e <https://sao- paulo.estadao.com.br/noticias/geral,taxa-de-homicidios-de-negros-e-mais-do-que-o- dobro-da-de-brancos-no-pais,70002337809>. Acesso em: 6 jun. 2019. Na primeira parte desta unidade, apresentaremos os aspectos que envolvem algumas questões raciais no Brasil, como o processo de escravidão no país, as perseguições e os preconceitos em relação à cultura afro-brasileira e a importância das pautas levantadas pelos movimentos negros. A escravização negra no Brasil Para compreender e propor enfrentamentos para as desigualdades raciais existentes no Brasil, é necessário estudar aspectos históricos, com o intuito de realizar reflexões, caro(a) estudante, acerca dos diversos processos que resultaram nessa desigualdade. Assim, inicialmente, abordaremos o período escravocrata brasileiro, que ocorreu entre 1550 e 1888, perdurando por mais de três séculos. Contudo, mesmo com a abolição da escravatura, em 1888, muitas pessoas negras continuaram em situações de trabalho análogas à escravidão. FIQUE POR DENTRO O dia 13 maio é conhecido como o Dia da Abolição da Escravatura, porém diversos movimentos negros afirmam que não se trata de um dia de comemoração, mas de reflexão e luta, para que seja possível enfrentar o racismo. A Princesa Isabel, responsável por assinar a Lei Áurea em 1888, não realizou esse ato por ser abolicionista e querer o fim do processo da escravização de pessoas negras, mas por interesses políticos, que envolviam também pressões internas e externas. Assim, mesmo com a Lei Áurea, as pessoas negras não tiveram significativas melhoras nas condições de vida e trabalho. Até hoje, diversas pessoas negras ainda trabalham em situações análogas à escravidão. Para saber mais a respeito desse assunto, leia o texto “5 verdades e mitos sobre a abolição da escravatura no Brasil”, de Cinthya Oliveira, que pode ser lido, integralmente, no link: <https://www.geledes.org.br/5-verdades-e-mitos-sobre-abolicao-da-escravatura- no-brasil/>. Acesso em: 6 jun. 2019. Como principal referência para a discussãode alguns aspectos que envolveram o período escravocrata no país, utilizaremos o livro O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado, escrito por Abdias Nascimento, com prefácio de Florestan Fernandes. Antes, salientamos que, ao estudar uma obra, caro(a) aluno(a), é importante saber algumas informações sobre o(a) autor(a), como local e data de nascimento, período em que escreveu a obra, fatos importantes que marcaram sua vida, as principais diretrizes do seu pensamento, etc. No meio acadêmico, há poucos autores negros. Assim, alguns estudiosos expõem que, além do genocídio da população negra, há o epistemicídio, que, segundo Nogueira (2012), é a morte simbólica de pessoas negras, como em um processo de apagamento, colonização e assassinato do conhecimento de alguns povos. Para Carneiro (2005), há o epistemicídio quando a sociedade não considera o conhecimento das pessoas negras e, nesse contexto, diversas contribuições teóricas e científicas são deslegitimadas e apagadas. Abdias do Nascimento (1914-2011) é uma importante referência sobre as questões raciais no Brasil. Ele foi professor na Universidade do Estado de Nova York, conferencista visitante na Escola de Artes Dramáticas da Universidade Yale e professor convidado do departamento de Línguas e Literaturas Africanas da Universidade de Ife, na Nigéria. Além de escritor de importantes obras e professor universitário, ele foi também ator, artista plástico e político. Figura 2.1 - Abdias do Nascimento (1914-2011) Fonte: Ricardo Stuckert / Wikimedia Commons. O processo de escravização dos povos de origem africana está atrelado à história brasileira. De acordo com Nascimento (1978), no Brasil, há o trabalho de pessoas negras escravizadas desde o início da colonização pelos portugueses. Conforme expõe o autor, a imediata exploração da nova terra se iniciou com o simultâneo aparecimento da raça negra fertilizando o solo brasileiro com suas lágrimas, seu sangue, seu suor e seu martírio na escravidão. Por volta de 1530, os africanos, trazidos sob correntes, já aparecem exercendo seu papel de “força de trabalho”; em 1535, o comércio escravo para o Brasil estava regularmente constituído e organizado, e rapidamente aumentaria em proporções enormes. Como primeira atividade significativa da colônia portuguesa, as plantações de cana-de-açúcar se espalhavam pelas costas do nordeste, especialmente nos estados da Bahia e de Pernambuco (NASCIMENTO, 1978, p. 48). Como argumenta Nascimento (1978), o trabalho de pessoas negras escravizadas no país ocorreu desde o início do cultivo de cana-de-açúcar no nordeste brasileiro. Com as descobertas de ouro em Minas Gerais, diversas pessoas negras foram para essa região. Posteriormente, o declínio desse ciclo fez diversos negros escravizados irem para estados como São Paulo e Rio de Janeiro. As pessoas negras eram trazidas de alguns países do Continente Africano para o Brasil nos navios negreiros ou tumbeiros, embarcações que atravessam o mar Atlântico, em viagens que podiam durar dois meses ou mais, em condições sub-humanas, sem garantias mínimas de higiene e alimentação. As pessoas escravizadas eram colocadas nos porões dos navios, amontoadas e acorrentadas, eram violentadas de diversas formas e muitas morriam no decorrer da viagem. A Figura 2.2 é um quadro de Johann Moritz Rugendas, que retrata o porão de um navio tumbeiro. Figura 2.2 - Negros no fundo do porão, Johann Moritz Rugendas (1802-1858) Fonte: Wilfredor / Wikimedia Commons. A seguir, discutiremos a cultura negra da sociedade brasileira e suas especificidades. Vamos lá? A cultura negra na formação da sociedade brasileira Os negros tiveram papéis fundamentais na economia brasileira. Desse modo, para compreender as desigualdades raciais existentes no país, caro(a) estudante, também é necessário entender aspectos da história do Brasil. Conforme expõe Nascimento (1978), o africano escravizado construiu as fundações da nova sociedade com a flexão e a quebra da sua espinha dorsal, quando ao mesmo tempo seu trabalho significava a própria espinha dorsal daquela colônia. Ele plantou, alimentou e colheu a riqueza material do país para o desfrute exclusivo da aristocracia branca. Tanto nas plantações de cana-de-açúcar e café e na mineração quanto nas cidades, o africano incorporava as mãos e os pés das classes dirigentes que não se autodegradavam em ocupações vis como aquelas do trabalho braçal. A nobilitante ocupação das classes dirigentes – os latifundiários, os comerciantes, os sacerdotes católicos – consistia no exercício da indolência, no cultivo da ignorância, do preconceito e na prática da mais licenciosa luxúria (NASCIMENTO, 1978, p. 49-50). Outro ponto abordado por Nascimento (1978) é a exploração sexual da mulher africana no período escravocrata. Na visão do autor, as relações entre homens brancos e mulheres negras eram bastante violentas, argumento que derruba a ideia de que o Brasil formou-se a partir da integração entre povos negros e portugueses brancos, sem preconceitos raciais. Portanto, essa realidade social é oposta à prevalecente ideia de que a formação do Brasil se verificou obedecendo um processo integrativo imune de qualquer preconceito; tira a máscara do português e do brasileiro “branco” isentos de procedimentos racistas. Liquida certos argumentos considerando que aquela ausência de preconceito teria permitido ao colonizador engajar-se numa saudável interação sexual com a mulher negra: não só brasileiros, como latino-americanos (NASCIMENTO, 1978, p. 62). As mulheres negras no Brasil ainda vivenciam diversas violências. De acordo com Carneiro (2003), a problemática das violências doméstica e sexual atinge todas as mulheres, mas as negras vivenciam violências específicas, como as limitações enfrentadas no campo afetivo, o que compromete, muitas vezes, o pleno exercício de suas sexualidades. Ademais, Nascimento (1978) destaca as perseguições às culturas afro-brasileiras. Naquele contexto, as agressões à cultura de origem africana dos povos escravizados ocorriam de diferentes formas. Segundo o autor, muitas vezes, essas violências eram consideradas sutis, como o ato de batizar os africanos em alguns portos brasileiros. A Igreja Católica foi utilizada pelos colonizadores como uma ferramenta de controle e dominação, perseguindo e atacando crenças religiosas durante séculos. Conforme expõe Nascimento (1978), diversos terreiros (templos) ficavam em locais escondidos nas matas ou disfarçados em encostas de morros e, quando encontrados, podiam ser invadidos e ter diversos objetos confiscados. A intolerância às religiões afro- brasileiras, como o Candomblé e a Umbanda, ainda existe no Brasil, visto que terreiros ainda são atacados e destruídos. Assim, caro(a) aluno(a), a história do Brasil é marcada pela escravização da população negra de origem africana, que teve um papel importante nos diferentes ciclos econômicos brasileiros, trabalhando, por exemplo, nos engenhos de cana-de-açúcar, entre os séculos XVI e XVIII, e na exploração do ouro em Minas Gerais, no século XVIII. Nesse contexto, a cultura dos negros de origem africana também colaborou para a construção da sociedade brasileira, no que se refere às religiões, músicas, danças e à culinária, mas as consequências da escravização e do preconceito vivenciado por essas pessoas permanecem até hoje. Os movimentos negros, existentes no Brasil desde o período escravocrata, realizam enfrentamentos às desigualdades raciais. De acordo com Carneiro (2003), esses movimentos são responsáveis, por exemplo, pela exigência de maior representatividade das pessoas negras em livros didáticos e pelas reivindicações de políticas públicas de enfrentamento ao racismo. Um exemplo é a Lei nº 10.639, de 2003, que inclui, no currículooficial da rede de ensino, a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”. ATIVIDADE 1) Leia um trecho da música “A carne”, composta por Seu Jorge, Marcelo Fontes do Nascimento e Ulisses Cappelletti (SEU JORGE, on-line). A carne mais barata do mercado É a carne negra A carne mais barata do mercado É a carne negra Que vai de graça pro presídio E para debaixo do plástico E vai de graça pro subemprego E pros hospitais psiquiátricos A carne mais barata do mercado É a carne negra Que fez e faz história, Segurando esse país no braço, meu irmão O cabra aqui não se sente revoltado Porque o revólver já está engatilhado E o vingador é lento [...]. De acordo com essa música e a história dos povos negros de origem africana no Brasil, assinale a alternativa correta. a) A música faz uma crítica ao alto preço da carne de boi na década de 1990 no país, o que impossibilitava o acesso a esse produto por grande parte da população negra. b) No trecho “Que fez e faz história, segurando esse país no braço”, os autores da música fazem referência ao período escravocrata brasileiro. c) A música aborda a miscigenação brasileira que inclui povos indígenas, negros e portugueses. d) No trecho “E vai de graça pro subemprego e pros hospitais psiquiátricos”, há uma crítica aos hospitais psiquiátricos brasileiros que, na década de 1980, cobravam altas taxas para internação de pessoas negras. e) A música faz uma crítica à sociedade patriarcal brasileira, que não valoriza o trabalho doméstico realizado pelas mulheres. RELAÇÕES RACIAIS E DESIGUALDADE SOCIAL: GILBERTO FREYRE No século XX, dois nomes marcaram os estudos sobre relações raciais no Brasil: Gilberto Freyre (1900-1987) e Florestan Fernandes (1920-1995). Inicialmente, apresentaremos como Freyre compreende a relações raciais no país e, depois, discutiremos o pensamento de Florestan Fernandes e as divergências entre ambos. As relações raciais no Brasil, segundo Gilberto Freyre Gilberto Freyre foi um historiador e sociólogo que estudou a formação da sociedade brasileira durante o período colonial, a partir da perspectiva da miscigenação, abordando como funcionavam os engenhos e a estrutura física existente neles, como a senzala, a casa-grande, a capela e a casa de moer. A obra desse autor destaca-se devido aos estudos da sociedade brasileira não apenas a partir de perspectivas econômicas e políticas, visto que Freyre também analisou vieses sociais, abordando o cotidiano e as relações existentes no período colonial. REFLITA A miscigenação é a mescla entre diferentes etnias. As populações formadas por meio das relações entre diferentes etnias são consideradas miscigenadas ou mestiças. Freyre escreveu o livro Casa-grande e senzala durante o Estado Novo, período em que o Brasil buscava construir uma identidade nacional, compartilhada por diferentes pessoas que viviam no território nacional. Nesse momento, questionava-se o que era ser brasileiro e o que as pessoas tinham em comum, e sua obra buscou responder a esses questionamentos. Na época do lançamento, o livro não foi bem recebido por diversos setores conservadores e elitistas, que defendiam a supremacia das pessoas brancas. Outras críticas também foram construídas em relação a essa obra, principalmente quanto à forma como o autor aborda as relações entre brancos e negros escravizados. Aqui, não faremos análises densas a respeito do pensamento de Gilberto Freyre, pois nosso objetivo é conhecer as principais ideias defendidas pelo autor e como seu pensamento influenciou a forma como outros pensadores compreendem a sociedade brasileira. Assim, salientamos que o pensamento de Freyre (2003) sustenta a formação do Brasil por meio do encontro de três raças: o branco, o indígena e o negro, dando origem, segundo o autor, a uma quarta “raça”: o povo brasileiro. A obra de Freyre apresentou algumas respostas à pergunta “o que é o brasileiro?”, que ecoava nos projetos de construção de uma identidade nacional. Desse modo, os estudos desse autor foram considerados um “divisor de águas” na historiografia brasileira. Para Freyre (2003, p. 62), formou-se na América tropical uma sociedade agrária na estrutura, escravocrata na técnica de exploração econômica, híbrida de índio – e mais tarde de negro – na composição. Sociedade que se desenvolveria defendida menos pela consciência de raça, quase nenhuma no português cosmopolita e plástico, do que pelo exclusivismo religioso desdobrado em sistema de profilaxia social e política. Menos pela ação oficial do que pelo braço e pela espada do particular. Ademais, Freyre (2003) salienta que os portugueses preferiam mulatas4, caboclas e morenas do que mulheres brancas e loiras. Nas palavras do próprio autor: [...] a mulher morena tem sido a preferida dos portugueses para o amor, pelo menos para o amor físico. A moda de mulher loura, limitada aliás às classes altas, terá sido antes a repercussão de 4 Em sua obra, o autor utiliza a palavra “mulata” e, por isso, ela foi reproduzida neste texto. É importante pontuar, no entanto, que existem diversas problemáticas racistas em relação ao termo, que tem como origem a palavra “mula”, a qual nomeia o animal resultante do cruzamento de um cavalo com uma jumenta ou de uma égua com um jumento. influências exteriores do que a expressão de genuíno gosto nacional. Com relação ao Brasil, que o diga o ditado: “Branca para casar, mulata para f..., negra para trabalhar”; ditado em que se sente, ao lado do convencionalismo social da superioridade da mulher branca e da inferioridade da preta, a preferência sexual pela mulata. Aliás o nosso lirismo amoroso não revela outra tendência senão a glorificação da mulata, da cabocla, da morena celebrada pela beleza dos seus olhos, pela alvura dos seus dentes, pelos seus dengues, quindins e embelegos muito mais do que as “virgens pálidas” e as “louras donzelas”. Estas surgem em um ou em outro soneto, em uma ou em outra modinha do século XVI ou XIX. Mas sem o relevo das outras (FREYRE, 2003, p. 71-72). Ainda na obra Casa-grande e senzala, Freyre (2003) abordar os papéis de povos indígenas na formação da sociedade brasileira, contudo essas análises assumem papel secundário, quando o autor aborda os engenhos de cana-de-açúcar que se situavam em Pernambuco. Nesses locais, a mão de obra indígena teve papel secundário, se comparada à da população negra escravizada. A mulher indígena teve destaque em algumas análises de Freyre (2003), pois seus estudos mostraram que, nos engenhos, muitas vezes, ela era considerada responsável por receitas culinárias, pela agricultura e pelos remédios naturais. De acordo com Santos (2012), Freyre parece considerar a cultura indígena complementar em relação às culturas europeias e africanas, por isso, não enfatiza essa influência no processo de construção da sociedade brasileira. Ainda segundo Santos (2012), para Freyre, as pessoas negras de origem africana tiveram maior facilidade para se inserir na formação econômica e social brasileira do que os povos indígenas. Nas palavras do próprio estudioso: a enxada é que não se firmou nunca na mão do índio nem na do mameluco; nem o seu pé de nômade se fixou nunca em pé-de-boi paciente e sólido. Do indígena quase que só aproveitou a colonização agrária no Brasil o processo da coivara, que infelizmente viria a empolgar por completo a agricultura colonial. O conhecimento de sementes e raízes, outras rudimentares experiências agrícolas, transmitiu-as ao português menos o homem guerreiro que a mulher trabalhadora do campo ao mesmo tempo que doméstica. Se formos apurar a colaboração do índio no trabalho propriamente agrário, temos que concluir, contra Manuel Bonfim – indianófilo até a raizdos cabelos –, pela quase insignificância desse esforço (FREYRE, 2003, p. 162). Figura 2.3 - Primeira Missa (1860); quadro pintado por Victor Meirelles Fonte: Tetraktys / Wikimedia Commons. A obra pintada por Victor Meirelles (1832-1903) retrata a primeira missa católica realizada no Brasil. Como exposto anteriormente, a Igreja exerceu papel fundamental na dominação de povos indígenas, mediante a imposição religiosa, por exemplo, por meio do batismo. Assim, Freyre (2003) destaca o papel dos jesuítas na formação do Brasil Colônia, por meio da educação e da moral. Os portugueses, de acordo com o autor, não trouxeram para o território brasileiro divergências religiosas, como os franceses e ingleses fizeram em suas colônias. Para o “unionismo” prepara-nos aliás a singular e especialíssima situação do povo colonizador; o qual chega às praias americanas unido política e juridicamente; e por maior que fosse a sua variedade íntima ou aparente de etnias e de crenças, todas elas acomodadas à organização política e jurídica do Estado unido à Igreja Católica (FREYRE, 2003, p. 90). A contribuição dos negros na formação do Brasil, de acordo com Freyre (2003), além de estar relacionada ao esforço físico do trabalho escravizado, é cultural e pode ser vista, por exemplo, na alimentação e nas vestimentas. No que se refere à vida sexual das pessoas do período escravocrata, Freyre (2003) expõe que os homens brancos sentiam-se atraídos pelas mulheres negras por diferentes motivos, como o clima tropical brasileiro e as questões sociais e culturais. No caso do brasileiro, desde menino tão guloso de mulher, atuaram, ainda com mais força, influências de caráter social contrárias à continência, ao ascetismo, à monogamia. Entre nós o clima tropical terá indiretamente contribuído para a superexcitação sexual de meninos e adolescentes; para a sua antecipação, tantas vezes mórbida, no exercício de funções sexuais e conjugais. Menos, porém, que as influências puramente sociais (FREYRE, 2003, p. 350). A tese de que as mulheres negras eram responsáveis por corromper a vida sexual da sociedade brasileira é questionada por Freyre (2003), porque, para ele, essa corrupção não ocorreu a partir da mulher negra, mas de pessoas escravizadas, negras ou indígenas, tendo como responsável os sistemas social e econômico em que elas estavam inseridas. Portanto, segundo o autor, é absurdo responsabilizar-se o negro pelo que não foi obra sua nem do índio, mas do sistema social e econômico em que funcionaram passiva e mecanicamente. Não há escravidão sem depravação sexual. É da essência mesma do regime. Em primeiro lugar, o próprio interesse econômico favorece a depravação criando nos proprietários de homens imoderado desejo de possuir o maior número possível de crias (FREYRE, 2003, p. 414). A forma como Gilberto Freyre compreende as relações entre negros escravizados, indígenas e colonizadores brancos, por um lado, questionou diversas teorias que apontavam a inferioridade dos povos negros e indígenas por meio de justificativas biológicas, físicas ou sociais. Por outro lado, o pensamento desse autor foi bastante criticado por romantizar as relações, deixando de considerar diversas violências vivenciadas pelos povos escravizados. A seguir, abordaremos as contribuições de Florestan Fernandes, outro importante pensador brasileiro. Apresentaremos os principais pontos de seus estudos e como ele compreende as relações raciais no Brasil. Depois, realizaremos uma breve discussão sobre as proximidades e diferenças entre os pensamentos de Gilberto Freyre e Florestan Fernandes. ATIVIDADE 2) Leia o texto a seguir. Os primeiros escravos africanos começaram a ser importados em meados do século XVI; seu emprego nos engenhos brasileiros, contudo, ocorria basicamente nas atividades especializadas. Por esse motivo, eram bem mais caros que os indígenas: um escravo africano custava, na segunda metade do século XVI, cerca de três vezes mais que um escravo índio (MARQUESE, 2006, p. 111). Gilberto Freyre, importante estudioso brasileiro, dedicou-se a escrever sobre a formação do Brasil e as relações entre diferentes povos. Em sua obra Casa-grande e senzala, ele faz algumas diferenciações quanto ao emprego da mão de obra escrava negra e indígena no período colonial. Com base nesse contexto, assinale a alternativa correta. a) Os povos de origem africana eram bondosos e inocentes, por isso, não se rebelavam contra os colonizadores portugueses e, desse modo, contribuíram para a economia do Brasil no período colonial. b) Os povos indígenas tiveram papel secundário na formação cultural da sociedade brasileira. c) Apenas os povos indígenas foram utilizados como mão de obra no período de produção da cana-de-açúcar. d) Os povos indígenas recusaram interações com os portugueses, por isso, o Brasil necessitou da mão de obra africana. e) As mulheres indígenas, devido ao pouco conhecimento sobre agricultura, em nada contribuíram para a colonização agrária brasileira. RELAÇÕES RACIAIS E DESIGUALDADE SOCIAL: FLORESTAN FERNANDES Florestan Fernandes foi um importante sociólogo brasileiro, que se dedicou a escrever a respeito de temas como as relações raciais e as desigualdades sociais no Brasil. Esse autor escreveu diversos livros e artigos que ficaram conhecidos no Brasil e em outros países, contudo apresentaremos apenas as principais ideias defendidas por ele no livro O negro no mundo dos brancos, de 1972, pois, nesse livro, Florestan Fernandes faz diversas considerações sobre as relações étnico-raciais brasileiras. As relações raciais no Brasil, segundo Florestan Fernandes Em pesquisas realizadas na cidade de São Paulo, com pessoas negras, Florestan Fernandes percebeu que, mesmo após a abolição da escravatura em 1888, ainda existiam diversas desigualdades entre pessoas brancas e negras na sociedade brasileira, que se tornava cada vez mais industrializada. O pensamento de Fernandes sustenta, principalmente, a defesa de que a democracia racial, proposta por autores como Gilberto Freyre, na verdade, é um mito, pois, segundo Fernandes, negros e brancos tinham condições de vida diferentes. Figura 2.4 - Família de brasileiros brancos e mulheres negras escravizadas por ela (1860) Fonte: Kingpin13 / Wikimedia Commons. A democracia racial é utilizada por alguns autores para a compreensão das relações raciais brasileiras. Para esses estudiosos, no Brasil, diferente de em outros países, os indivíduos não veem uns aos outros a partir do conceito de raça e, desse modo, não têm preconceitos raciais. Salientamos, porém, que, apesar de Freyre nunca ter utilizado a tese da democracia racial em suas obras, as interpretações de seu pensamento fazem ele ser considerado um defensor dessa tese. Nesse contexto, conforme expõe Fernandes (1972), sob a égide da ideia de democracia racial justificou-se, pois, a mais extrema indiferença e falta de solidariedade para com um setor da coletividade que não possuía condições próprias para enfrentar as mudanças acarretadas pela universalização do trabalho livre e da competição [...]. Esse quadro mostra que a chamada “democracia racial” não tem nenhuma consistência e, vista do ângulo do comportamento coletivo das “populações de cor”, constitui um mito cruel (FERNANDES, 1972, p. 29). O mito da democracia racial foi criado visando ao interesse e aos valores sociais e não contribui para que as pessoas negras se conscientizem quanto à realidade vivenciada e lutem para modificá-la. Isso porque se argumenta que, no Brasil, não existe racismo. Ademais, segundo Fernandes (1972), as transformações econômicas que ocorreram no Brasil, no início do século XX, beneficiaram a “raça dominante”, que ocupava posições importantes na estrutura de poder político e econômicoe, em extensão menor, os imigrantes europeus. Nessa época, o governo preocupava-se muito mais com a falta de integração política e econômica nacional do que com a falta de integração da sociedade brasileira no nível das relações sociais e do desequilíbrio que existia. FIQUE POR DENTRO Conceição Evaristo é uma escritora mineira, nascida em 1946. Ela é formada em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestra em Literatura pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e doutora em Literatura Comparada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Evaristo é a autora de diversos livros e poemas, como “Vozes-Mulheres”, do livro Poemas de recordações e outros movimentos, exposto a seguir. Vozes-Mulheres A voz de minha bisavó ecoou criança nos porões do navio. Ecoou lamentos de uma infância perdida. A voz de minha avó ecoou obediência aos brancos-donos de tudo. A voz de minha mãe ecoou baixinho, revolta no fundo das cozinhas alheias, debaixo das trouxas roupagens sujas dos brancos, pelo caminho empoeirado rumo à favela. A minha voz ainda ecoa versos perplexos com rimas de sangue e fome. A voz de minha filha recolhe todas as nossas vozes, recolhe em si as vozes mudas, caladas, engasgadas nas gargantas. A voz de minha filha recolhe em si a fala e o ato. O ontem – o hoje – o agora. Na voz de minha filha se fará ouvir a ressonância O eco da vida-liberdade. Para conhecer outros poemas de Conceição Evaristo, acesse o link: <https://www.revistaprosaversoearte.com/conceicao-evaristo-poemas/>. Acesso em: 6 jun. 2019. O padrão das relações raciais no Brasil, de acordo com Freyre (1972), foi construído para uma sociedade escravista, ou seja, para manter as pessoas negras sob a sujeição das pessoas brancas. Para o autor, enquanto essa forma de relação não for abolida, as distâncias social, política e econômica entre brancos e negros continuarão imensas, mesmo que essa diferença não seja reconhecida de modo explícito. Figura 2.5 - Mulher negra escravizada como babá e ama de leite de Eugen Keller, na província de Pernambuco. Obra de Alberto Henschel, 1874 Fonte: Spoladore / Wikimedia Commons. Para Fernandes (1972), existem diferenças entre o racismo brasileiro e de outros países que tiveram populações negras escravizadas, como nos Estados Unidos. Para o autor, no entanto, mesmo existindo dissimilitudes, os dois países são racistas. O racismo existente nos EUA pode ser caracterizado como sistemático e, no Brasil, como assistemático, pois, aqui, não se reconhece a existência do preconceito racial. Tomaram-se estas noções para dar fundamento à escravidão e para alimentar outra racionalização corrente, segundo a qual o próprio negro seria beneficiado pela escravidão, mas sem aceitar- se a moral da relação que se estabelecia entre o senhor e o escravo. Por isso, surgia no Brasil uma espécie de preconceito reativo: o preconceito contra o preconceito ou o preconceito de ter preconceito (FERNANDES, 1972, p. 42). Segundo Fernandes (1972), a discriminação racial existente no Brasil é uma herança do período escravista. A abolição da escravatura não fez as pessoas negras terem as mesmas condições sociais, econômicas e políticas das pessoas brancas brasileiras. Diferenças entre o pensamento de Gilberto Freyre e de Florestan Fernandes A primeira diferença entre o pensamento de Gilberto Freyre, na obra Casa-grande e senzala, e de Florestan Fernandes, em “O negro no mundo dos brancos”, é o período em que as obras foram escritas. A primeira foi publicada em 1933, período em que o Brasil ainda enfrentava dificuldades para se consolidar como uma nação única; desse modo, buscava-se construir uma identidade comum para todos os brasileiros, em um território de pessoas diversas. Por sua vez, a obra de Fernandes foi publicada em 1972, período em que o Brasil possuía uma industrialização mais consolidada, mesmo que tardia. Anos após o processo que colocou fim na escravatura, as desigualdades entre pessoas negras e brancas ainda se mostravam presentes no país. REFLITA A ideia de que as mulheres são frágeis e delicadas não se estende a todas. Angela Davis, importante filósofa estadunidense, em seu livro “Mulheres, raça e classe”, publicado em 1981 e, em 2016, no Brasil, destaca a fala de Sojourner Truth, considerada pioneira na luta por direitos de mulheres e homens negros nos Estados Unidos. Segundo Angela Davis, na primeira National Convention on Women’s Rights (Convenção Nacional de Direitos das Mulheres), que ocorreu em 1850, um dos homens presentes na reunião afirmou que as mulheres não eram capazes de votar, porque, até para atravessarem uma poça de água ou entrarem em uma carruagem, precisavam da ajuda dos homens. Nesse contexto, Sojourner Truth [...] apontou para fora desse argumento com a simplicidade de que ela nunca foi ajudada a atravessar poças de água nem a entrar em carruagens “e não sou eu uma mulher?”. Com uma voz como um trovão, ela disse “olhem para mim! Olhem para os meus braços” e enrolou as suas mangas para revelar os tremendos músculos dos seus braços. “Eu lavrei, plantei, e ceifei para celeiros e nenhum homem podia ajudar-me! E não sou eu mulher? Podia trabalhar tanto e comer tanto como um homem – quando podia fazê-lo – e suportar o chicote também! E não sou eu mulher? Dei à luz treze crianças e vi a maior parte delas serem vendidas para a escravatura, e quando chorei a minha dor de mãe, ninguém senão Jesus me ouviu! E não sou eu mulher?” (DAVIS, 2016, p. 49). O olhar de Freyre (2003) para o Brasil é construído a partir da perspectiva da miscigenação, ou seja, a mistura entre as diferentes raças era justamente o que dava unidade ao povo brasileiro. Para o estudioso, o Brasil era um país mestiço desde o início do processo de colonização. Assim, a miscigenação brasileira, vista por muitos estudiosos da época como um atraso para a construção do Brasil, é, para Freyre (2003), na verdade, o que possibilitou a colonização do país pelos portugueses. As relações raciais e “misturas” entre povos é vista por Freyre (2003) como algo que aconteceu sem grandes conflitos, pois, para ele, o português (por diversos motivos elencados no livro Casa-grande e senzala) teve facilidade para se relacionar com as pessoas negras de origem africana. Diversos pesquisadores, porém, contestam essa visão, visto que, para eles, a miscigenação brasileira também mostra o estupro sofrido por mulheres e homens negros escravizados. Por ver essas relações entre diferentes raças sem grandes conflitos, Freyre (2003) defende que a sociedade brasileira não é racista como em outros países. Assim, a forma como esse autor compreendeu as relações raciais no Brasil fez seu pensamento ser atrelado ao conceito de democracia racial. Em contrapartida, Fernandes (1972) questiona essa democracia, considerando-a um grande mito. Para o autor, as relações raciais brasileiras têm algumas diferenças, se comparadas com outros países, contudo a sociedade brasileira também é racista. Enquanto Freyre (2003) considera que a convivência entre pessoas brancas e negras foi pacífica, Fernandes (1972) afirma que essa convivência é conflituosa e desigual até hoje. Devido à influência marxista, isto é, por embasar seu pensamento na perspectiva materialista de Karl Marx (1818-1883), Fernandes (1972) compreende a situação das pessoas negras no país também a partir da perspectiva de classe social. O autor expõe, por exemplo, que o negro teve dificuldades para se integrar à sociedade industrial brasileira, porque estava acostumado com serviços do campo e domésticos. Por outro lado, Freyre (2003) afirma que as pessoas negras de origem africana tiveram facilidade para se adaptarem à sociedade brasileira no períodocolonial. Para Fernandes (1972), no Brasil, o debate sobre raça precisa ser acompanhado das discussões sobre classe social, visto que, para ele, a desigualdade social entre pessoas brancas e negras só deixará de existir por meio da integração dos negros à sociedade. Portanto, caro(a) estudante, a história do Brasil é marcada pela escravização da população negra. Ainda existem diversas desigualdades raciais no país e, com o intuito de propor enfrentamentos para elas, há propostas de políticas afirmativas, como as cotas raciais para pessoas negras em vestibulares e em outros concursos públicos. No próximo tópico, apresentaremos as principais justificativas que fundamentam esse tipo de ação afirmativa. ATIVIDADE 3) Leia o trecho a seguir. “Democracia racial, a rigor, significa um sistema racial desprovido de qualquer barreira legal ou institucional para a igualdade racial, e, em certa medida, um sistema racial desprovido de qualquer manifestação de preconceito ou discriminação” (DOMINGUES, 2005, p. 116). Com base nesse contexto, segundo o entendimento de Fernandes, importante sociólogo brasileiro, a democracia racial é: a) uma interpretação correta acerca da sociedade brasileira, pois o racismo no Brasil é diferente de outros locais do mundo. b) um mito, pois, no Brasil, as relações entre pessoas brancas e negras são marcadas pelo preconceito e pela violência. c) uma interpretação problemática da sociedade brasileira, pois várias pessoas deixam de comparecer em votações eleitorais. d) um mito, pois a sociedade brasileira tornou-se democrática apenas no fim do Regime Militar, na década de 1980. e) uma interpretação correta acerca da sociedade brasileira, pois não é possível identificar uma única raça no Brasil. O DEBATE SOBRE AS POLÍTICAS AFIRMATIVAS NO BRASIL: COTAS RACIAIS OU COTAS SOCIAIS? Caro(a) aluno(a), você sabe o que são políticas afirmativas? São medidas políticas realizadas com o intuito de colocar fim a exclusões sociais, econômicas e culturais que alguns grupos vivenciam em uma sociedade. Essas políticas podem ocorrer por meio da oferta de recursos ou de outros benefícios a grupos com históricos de discriminações raciais, religiosas, de gênero, etc. Uma dessas medidas corresponde às cotas, que podem ocorrer em processos seletivos de órgãos públicos, como concursos e vestibulares. Esse é um tema que costuma levantar diversos debates, por isso, nosso objetivo, inicialmente, é explicar o que são as políticas afirmativas e, posteriormente, dois tipos de cotas, as sociais e as raciais, e os principais argumentos que fundamentam suas existências, de acordo com alguns estudiosos. O que são políticas afirmativas? Provavelmente, caro(a) estudante, você já ouviu a expressão “todos são iguais perante a Lei”. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, afirma que todos têm os mesmos direitos à moradia, educação, saúde, liberdade e ao lazer, mas, na prática, isso acontece? Todos nós, de fato, temos os mesmos direitos? De acordo com Piovesan (2008a), a ideia de que todos têm os mesmos direitos é denominada igualdade formal, genérica e abstrata, contudo considerar os sujeitos apenas sob esse viés é insuficiente, pois também é preciso pensar em suas particularidades, visto que diversos grupos tiveram direitos violados por muitos anos. A diferença, utilizada, muitas vezes, como justificativa para a subversão de direitos, deve ser, segundo Piovesan (2008a), promotora de direitos. Nessa ótica, determinados sujeitos de direitos, ou determinadas violações de direitos, exigem uma resposta específica e diferenciada. Isto é, na esfera internacional, se uma primeira vertente de instrumentos internacionais nasce com a vocação de proporcionar uma proteção geral, genérica e abstrata, refletindo o próprio temor da diferença (que na era Hitler foi justificativa para o extermínio e a destruição), percebe-se, posteriormente, a necessidade de conferir a determinados grupos uma proteção especial e particularizada, em face de sua própria vulnerabilidade. Isso significa que a diferença não mais seria utilizada para a aniquilação de direitos, mas, ao revés, para a promoção de direitos (PIOVESAN, 2008a, p. 888). Nesse contexto, alguns grupos, como os de mulheres, afrodescendentes, pessoas com algum tipo de deficiência, devem ser compreendidos a partir de suas condições sociais específicas. Em outras palavras, deve-se buscar o direito à igualdade, mas também é preciso considerar as diferenças (PIOVESAN, 2008a). Corroborando, Santos (2003) afirma que deve haver uma igualdade que reconheça as diferenças, em vez de produzi-las e de colaborar com as desigualdades. Desse modo, há diferentes medidas que podem proporcionar o enfrentamento das desigualdades existentes entre diferentes grupos. Uma dessas medidas, de acordo com Piovesan (2008a), é a estratégia de promoção de direitos. Para a autora, proibir discriminações de modo repressivo não é o suficiente para garantir a igualdade; são necessárias ações que aceleram esse processo, por meio de estratégias que estimulem a inserção de grupos social e historicamente discriminados nos espaços coletivos e democráticos, como as ações afirmativas. Portanto, as ações afirmativas não devem ser compreendidas apenas pelo viés da reparação histórica, ou seja, de recompensar um passado discriminatório, mas de proporcionar a transformação social (PIOVESAN, 2008a). A seguir, observe uma foto da equipe ministerial, indicada em 2019. Figura 2.6 - Equipe ministerial indicada pelo governo federal (2019) Fonte: Senado Federal / Wikimedia Commons. Mesmo o Brasil tendo 55% de sua população negra, de acordo com o IBGE (2016), e 51,6% de mulheres, segundo dados do IBGE (2017), as pessoas que ocupam os cargos políticos do país são, em sua maioria, homens e brancos. Isso significa que a equipe ministerial não representa, de fato, os diferentes grupos sociais que compõem a sociedade brasileira. Como consequência, as demandas desses diferentes grupos podem não ser consideradas pautas necessárias. Algumas ações afirmativas já foram realizadas no Brasil, a fim de diminuir as desigualdades de gênero no campo político. Uma delas é a Lei nº 9.100, de 1995, conhecida como “Lei das cotas”, que definiu uma cota mínima de 20% das vagas de cada partido ou coligação para mulheres. Posteriormente, conforme expõe Piovesan (2008a), essa lei foi alterada pela Lei nº 9.504, de 1997, a qual define que todos os partidos ou coligações devem reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de homens e mulheres, respectivamente. A Constituição Federal Brasileira (1988) também inclui a possibilidade de ações afirmativas, como no artigo 7º, inciso XX, que aborda a proteção do mercado de trabalho das mulheres, considerando necessários incentivos específicos. Além disso, o artigo 37, VII, define a reserva percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas com algum tipo de deficiência (PIOVESAN, 2008). A seguir, apresentaremos dois tipos de ações afirmativas: as cotas sociais e as cotas raciais. O que são as cotas sociais? Como o nome sugere, as cotas sociais visam propor enfrentamentos às desigualdades sociais existentes no Brasil. Essas cotas podem atender às demandas como vagas em concursos e vestibulares, reservadas para grupos sociais específicos. As regras podem variar de acordo com a instituição. Por exemplo, podem haver vagas destinadas a pessoas com renda per capita até determinado valor, oriundas de escolas públicas ou que preencham esses dois requisitos. Na Universidade Estadual de Maringá (UEM), por exemplo, as cotas sociais são reservadas para candidatos que tenham cursado os Ensinos Fundamental e Médio em escolas da rede pública, não tenham diploma de curso superior e tenham renda bruta mensal per capitade até 1,5 salários mínimos. Por sua vez, a Fuvest, responsável por realizar o vestibular da Universidade de São Paulo (USP), define que 40% das vagas devem ser destinadas aos alunos de escola pública e aos alunos de escola pública que são pretos, pardos e indígenas. A defesa da necessidade de cotas sociais sustenta-se no argumento de que o Brasil é um país bastante desigual, logo, as pessoas não têm o mesmo acesso à educação e ao mercado de trabalho, o que impossibilita a transformação social e a diminuição das desigualdades. Figura 2.7 - Contraste social entre a Rocinha, maior favela do Brasil, e os edifícios de São Conrado, Rio de Janeiro Fonte: Alicia Nijdam / Wikimedia Commons. Considere a seguinte situação fictícia: Flávia e Manuela são adolescentes de 17 anos, estudantes do terceiro ano do Ensino Médio, residentes na cidade do Rio de Janeiro. Ambas sonham com o ingresso em um curso de medicina. Flávia mora com sua mãe, que é empregada doméstica, no Complexo da Maré, bairro pobre da cidade, e precisa pegar diversos ônibus para chegar até a escola. Desde criança, quando não está na escola, Flávia ajuda sua mãe com as diárias, sobrando pouco tempo para estudar. Em contrapartida, Manuela vive com seus pais no Leblon, bairro nobre da cidade. No Ensino Fundamental, ela estudou em uma escola particular próxima a sua casa e, no Ensino Médio, estudou em uma escola bilíngue. No último ano, durante as tardes, ela começou um cursinho específico para estudantes que querem prestar o vestibular de medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Caro(a) aluno(a), você considera que Flávia e Manuela têm as mesmas condições de passar no vestibular de medicina no fim do terceiro ano do Ensino Médio? O argumento utilizado pelas cotas sociais é que as pessoas pobres não têm o mesmo acesso às universidades brasileiras e, mesmo quando formadas, não têm possibilidades iguais no mercado de trabalho, por isso, também existem cotas sociais em concursos públicos. Sem acesso à educação e, posteriormente, ao mercado de trabalho na área de formação, Flávia dificilmente conseguirá mudar sua atual situação financeira. O que são cotas raciais? Quantos(as) professores(as) negros(as), caro(a) aluno(a), você já teve durante os Ensinos Fundamental ou Médio? Quantos(as) médicos(as) negros(as) você conhece? Provavelmente, a quantidade de pessoas negras que você já conheceu em cargos de prestígio social e financeiro é bem menor se comparada ao número de pessoas brancas. As cotas raciais pretendem garantir que pessoas negras ingressem nas universidades públicas e passem em outros concursos públicos. Assim, são consideradas um caminho para a mudança social. Além disso, o conhecimento produzido pelas pessoas negras tem sido deslegitimado ao longo da história, logo, a entrada de pessoas negras nos espaços universitários possibilita a produção de conhecimentos diversos e plurais. Historicamente, a prática acadêmica evidencia o apagamento de biografias de intelectuais negras/os, o esvaziamento de singularidades por narrativas descontextualizadas distanciadas da história, e isto é uma estratégia discursiva poderosa que resulta em danos irreparáveis na vida de pessoas negras (MARTINS et al., 2018, p. 124-125). Portanto, as relações de poder entre pessoas brancas e negras não são iguais. A população negra teve seus direitos negados ao longo da história do Brasil, desse modo, as cotas raciais visam propor enfrentamentos a essas desigualdades. REFLITA A língua de um país também pode expressar preconceitos de uma sociedade. Você já pensou que diversas expressões que ainda são utilizadas nos dias atuais são racistas? Quando dizemos que um lápis tem “cor de pele”, geralmente, estamos falando de um lápis rosado/bege, mas essa cor não representa a pele de todos os brasileiros. Outro exemplo é a expressão “não sou tuas negas”, indicando que uma negra é propriedade de alguém e que se pode fazer tudo com ela. No período escravocrata, as mulheres negras eram consideradas propriedade dos homens brancos e violentadas sexualmente por eles. Ademais, as palavras “negro” e “preto” são utilizadas em diversas expressões como algo negativo. Em “a coisa está preta”, o termo indica uma situação ruim ou desconfortável. Na expressão “serviço de preto”, essa palavra é utilizada para fazer referência a um serviço malfeito. De acordo com Segato (2006), ainda existe bastante desinformação quanto à proposta de cotas raciais, por isso, diversas pessoas emitem suas opiniões sem conhecer as justificativas que sustentam a existência dessas cotas. Segundo a autora, atualmente, no Brasil, a exclusão social de pessoas negras é vista como algo natural. Assim, é necessário um resgate histórico do período da escravatura no país, para que se compreenda como as pessoas negras vivenciaram diversas violências e exclusões sociais. A exclusão, entre nós, é uma estrutura profunda de ordem psíquica, cognitiva, ontológica, e não meramente socioeconômica. Originária do sistema de exploração escravocrata, logo permaneceu enquistada na ideologia e reproduzida pela cultura do povo brasileiro. As relações sociais próprias da escravidão constituíram-se em matriz de convivência no Brasil, transformaram-se em “costume”, numa forma de normalidade. Na sociedade brasileira pós-escravocrata, a suspensão da ordem jurídica que garantia a exclusão na lei foi substituída por uma caução ideológica, o racismo, que passou a ser a norma não-jurídica a garantir a permanência da exclusão das pessoas negras (SEGATO, 2006, p. 81). Para Segato (2006, p. 83), as cotas raciais não devem ser entendidas apenas como algo que altera “o perfil da injustiça social que prejudica os índices brasileiros ou como um mecanismo de desenvolvimento socioeconômico, através de educação ampliada de setores menos favorecidos da população”. Para a autora, essa é uma visão reducionista do fenômeno e que pode provocar diversos outros impactos na vida social dos sujeitos. Com base nos estudos de Segato (2006), há dez impactos particulares da eficácia da política de cotas nas universidades, dentre eles, destacamos a eficácia reparadora, capaz de instituir nos espaços acadêmicos mecanismos para ressarcir, pelo menos em parte, a população negra brasileira que foi marginalizada e violentada durante a história do país. Ademais, há a eficácia política, pois a sociedade aceita, publicamente, sua responsabilidade por práticas racistas ao longo da história, e a eficácia propriamente transformadora, capaz de desestabilizar estruturas racistas. Cotas raciais ou cotas sociais? Muitas pessoas posicionam-se contra as cotas sociais e raciais e outras ficam em dúvida sobre a necessidade dessas duas políticas. É realmente necessária a existência dessas políticas? As cotas raciais substituem as cotas sociais? É preciso optar por uma delas? As pessoas que defendem apenas a existência das cotas sociais argumentam que, uma vez colocado o critério social, as pessoas pobres, tanto brancas como negras, terão acesso à universidade e ocorrerão transformações sociais. Segundo o professor Paulo Inácio Prado, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, em entrevista ao Jornal da USP (2016), a correlação entre renda e raça pode fazer as pessoas pensarem que as cotas sociais, ao promoverem a entrada dos mais pobres na universidade, são também uma ação afirmativa racial. Dados da USP, porém, sinalizam que apenas 5% dos alunos que entraram na universidade pelo programa de inclusão de alunos da escola pública se autodeclararam negros e/ou indígenas. Portanto, caro(a) estudante, as cotas são um dos tipos de ações afirmativas que visam propor enfrentamentos às desigualdades existentes no Brasil. Há diferenças entre as cotas raciais e as cotas sociais, por isso, alguns pesquisadorese movimentos sociais defendem a necessidade de ambas. Por fim, salientamos que a intenção dos estudos propostos nesta unidade não foi a de construir visões definitivas, mas apresentar algumas discussões e alguns argumentos que sustentam a defesa das cotas sociais e raciais, para que você, caro(a) aluno(a), possa refletir acerca desse assunto. FIQUE POR DENTRO O debate sobre cotas raciais e sociais, geralmente, gera diversas polêmicas. Várias universidades já adotaram a política de cotas, como a Universidade de Brasília (UnB) e a Universidade de São Paulo (USP), mas ainda existem alguns mitos acerca da implantação e da eficácia das cotas. A Universidade Federal de Minas Gerais divulgou um texto com os 10 principais mitos sobre as cotas, que inclui discussões relacionadas ao fato de as cotas serem ou não inconstitucionais, se subvertem o princípio do mérito acadêmico ou se podem diminuir o nível do processo de ensino-aprendizagem. Você pode ler o texto, na íntegra, no link: <https://www.ufmg.br/inclusaosocial/?p=53>. A defesa das cotas, tanto raciais como sociais, para a grande maioria dos estudiosos, não deve ser separada da ideia de que se trata de uma política imediata, capaz de diminuir desigualdades e promover a transformação social, contudo outras medidas devem ser tomadas, por exemplo, na educação básica. ATIVIDADE 4) Leia a notícia a seguir, veiculada pela CBN. O Coletivo negro Yalodê-Badá realizou um ato pedindo cotas raciais na UEM. Além do grupo, pessoas ligadas a movimentos sociais, estudantes e professores que apoiam a causa se reuniram em frente à Biblioteca Central da Universidade Estadual de Maringá. Foi na noite desta quinta-feira (16). Havia cartazes e faixas pedindo o maior acesso de alunos negros na instituição. Houve falas e manifestações artísticas. O fato de o dia 13 de maio ser marcado como a data da abolição também foi lembrado no ato – mas como dia de luta. E também as cotas raciais, uma demanda de muito tempo, disse Amanda Lima, membro do coletivo (SIMÃO, 2019, on-line). Em relação às cotas raciais nas universidades públicas e aos argumentos utilizados por quem defende essas cotas, assinale a alternativa correta. a) As cotas raciais têm o principal objetivo de aumentar a quantidade de vagas nas universidades distantes de grandes centros urbanos. b) As cotas raciais são um dos tipos de políticas afirmativas e têm o objetivo de propor enfrentamentos às desigualdades sociais, culturais e econômicas existentes entre pessoas brancas e negras no Brasil. c) Defende-se que as cotas raciais devem ser implementadas apenas em alguns cursos superiores, pois não existe demanda, por exemplo, na área de licenciatura. d) As faixas e os cartazes construídos por movimentos negros em manifestações a favor das cotas raciais em universidades públicas são inconstitucionais. e) As cotas raciais são destinadas a pessoas com renda per capita de até 1,5 salários mínimos, oriundas de escolas públicas. INDICAÇÕES DE LEITURA Nome do livro: Quem tem medo do feminismo negro? Editora: Companhia das Letras. Autor: Djamila Ribeiro. ISBN: 8535931139. Comentário: Nesse livro, Djamila Ribeiro reúne diversos artigos publicados no blog da revista Carta Capital, entre 2014 e 2017. O texto que abre o livro aborda a própria história de vida da autora, que expõe ter passado por um processo de “silenciamento” durante a infância e a adolescência. Ao trabalhar na Casa de Cultura da Mulher Negra, Djamila Ribeiro relata que teve contato com autoras negras que a fizeram mudar a forma como ela via o mundo e a si própria. INDICAÇÕES DE FILME Nome do filme: Moonlight: sob a luz do luar Gênero: Drama. Ano: 2017. Elenco principal: Alex R. Hibbert, Ashton Sanders e Trevante Rhodes. Comentário: O filme mostra três momentos da vida de Chiron, um jovem negro que vivencia diversos conflitos no reconhecimento de sua identidade e sexualidade. Durante a infância, Chiron cresceu no subúrbio de Miami, nos EUA, vivenciando dificuldades com sua mãe, viciada em drogas. Quando se tornou adolescente, sofria bullying de diversos colegas na escola, em um momento em que também passa a se entender como homossexual. Quando adulto, Chiron tentou adaptar-se ao contexto em que estava inserido, enfrentando novas problemáticas. O filme recebeu oito indicações ao Oscar, ganhando os prêmios de melhor filme, melhor roteiro adaptado e melhor ator coadjuvante. UNIDADE III Gênero, diversidade sexual e promoção de direitos Karen Eduarda Alves Venâncio Patrick Aparecido Trento Introdução Nesta unidade, primeiramente, apresentaremos o conceito de gênero e as diferenças entre ele e o conceito de sexo, além das principais ideias de algumas autoras, como Simone de Beauvoir e Judith Butler. Em um segundo momento, abordaremos as identidades e as sexualidades. Assim, discutiremos o que é identidade de gênero e orientação sexual, bem como os preconceitos relacionados às diferentes identidades e sexualidades, como a homofobia e a transfobia. Posteriormente, apresentaremos algumas discussões acerca das relações de gênero, abordando o que é machismo e que é feminismo e esclarecendo algumas dúvidas em relação a esses conceitos. Nesse contexto, apresentaremos os movimentos feministas e a importância deles na luta pelos direitos das mulheres. Por fim, discutiremos as violências contra as mulheres, evidenciando que existem diversas formas de violências, por exemplo, físicas, psicológicas, patrimoniais, sexuais e morais. Nesse sentido, apresentaremos alguns marcos legais no enfrentamento das violências contra as mulheres no Brasil, como a criação das Delegacias da Mulher, a Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, e a Lei nº 13.104/2015, chamada de Lei do Feminicídio. Fonte: Varvara Gorbash / 123RF. GÊNERO EM DEBATE No Brasil e em outros lugares do mundo, a palavra “gênero” tem ganhado destaque nos últimos anos, mas você, caro(a) estudante, sabe o que significa o conceito de gênero? Nesta unidade, você aprenderá o que significa gênero e sexo, assim como as principais diferenças entre os dois conceitos. Além disso, apresentaremos algumas discussões sobre os motivos que fazem esse tema ser considerado polêmico, atualmente, no Brasil, por muitas pessoas. Figura 3.1 - Existem diversas dúvidas em relação aos conceitos de gênero e sexo Fonte: rawpixel / 123RF. Antes de compreender o que é o conceito de gênero, é necessário entender o que é sexo, pois, no campo teórico-acadêmico, esses dois conceitos são frequentemente diferenciados. O que é sexo? Sexo é considerado uma categoria biológica de diferenciação de seres vivos. As justificativas de diferenciação são de ordem anatômica, por exemplo, as pessoas que nascem com pênis e os cromossomos XY são homens, e as que nascem com vagina e os cromossomos XX são mulheres. Esse conceito é utilizado, muitas vezes, como argumento para proposições de características inatas aos seres humanos, como “toda mulher gosta de cozinhar”. Inicialmente, parte-se da ideia binária de que existem apenas homens (com pênis) e mulheres (com vaginas), e que, por terem estruturas anatômica e fisiológica diferentes, cada um tem características inatas de comportamento. Ademais, conforme expõem Wolff e Saldanha (2015), a subordinação das mulheres era atribuída a seu sexo, que, por sua vez, era uma diferença considerada natural. Pesquisas científicas e especialmente o conhecimento médico indicavam diferenças nos corpos, entre homens e mulheres, que explicariam, de alguma maneira, porque as mulheres estavam em uma condição de subordinação aos homens. Os argumentos mais usados eram, e até hoje são (!!!), que as mulheres, por terem menor força física, dependeriam do trabalho dos homens para sobreviver,e, além disso, como elas teriam seu destino marcado pela maternidade, isso também as tornaria dependentes dos homens (WOLFF; SALDANHA, 2015, p. 33). Muitas autoras denominam “binária” a diferenciação dos seres humanos a partir da categoria sexo, pois, nesse caso, considera-se a existência de apenas dois sexos: homem e mulher. As pessoas consideradas intersexo, como as que nascem com uma genitália que não é considerada somente um pênis e/ou uma vagina, ou as que nascem com um mosaico genético, em que parte das células é cromossomo XX e outra XY, com frequência, vivenciam violências. Essas violências referem-se ao fato de que, muitas vezes, ainda crianças, essas pessoas são submetidas a cirurgias ou a tratamentos médicos que têm o intuito de enquadrá-las como homens ou mulheres. As consequências desses procedimentos podem ser irreversíveis, como a falta de sensibilidade em órgãos genitais, cicatrizes e traumas emocionais. Figura 3.2 - Conceito de sexo tradicionalmente utilizado Fonte: Lukáš Kolesár / 123RF. Portanto, como exposto anteriormente, o conceito de sexo diferencia os seres humanos em duas categorias: homens (cromossomos XY) e mulheres (cromossomos XX). Essa divisão não contempla todas as pessoas, por exemplo, as consideradas intersexo. FIQUE POR DENTRO Antigamente, era comum o uso do termo “hermafrodita” para fazer referência a pessoas com variações de caracteres sexuais, como cromossomos, gônadas e/ou órgãos genitais. Com o passar do tempo, no campo da Biologia e da Medicina, esse termo foi substituído por “intersexo”. A intersexualidade ainda é um tabu na sociedade, vista a partir de diversos preconceitos, logo, uma pessoa intersexo pode vivenciar diversas violências e apagamentos durante sua vida. Quando nasce, a criança é enquadrada na compreensão binária de sexo: um menino ou uma menina. Quando uma criança não se enquadra nessa divisão tradicional, geralmente, é submetida a cirurgias e a outros tratamentos médicos, que podem trazer consequências físicas e psicológicas para o resto de sua vida. Para saber mais a respeito desse assunto, leia o texto “Sou intersexual, não hermafrodita”, de Barbara Ayuso. Esse texto pode ser lido, integralmente, no link: https://br.123rf.com/stock-photo/xx_e_xy.html?&sti=n295olitdge4rgh5m3%7C&mediapopup=22229699 https://br.123rf.com/stock-photo/xx_e_xy.html?&sti=n295olitdge4rgh5m3%7C&mediapopup=22229699 <https://brasil.elpais.com/brasil/2016/09/17/estilo/1474075855_705641.html>. Acesso em: 17 jun. 2019. Diversos estudos questionam essas justificativas que atribuem características consideradas “naturais” de homens e mulheres a partir do conceito de sexo. Desse modo, o conceito de gênero passou a ser utilizado também no campo das ciências humanas. O que é gênero? Se você procurar a palavra “gênero” no dicionário, caro(a) estudante, encontrará diversos significados, porque essa palavra é utilizada por diferentes campos do conhecimento, como a literatura (gêneros literários), a Biologia (para se referir a um grupo morfológico ou uma categoria taxonômica que reúne espécies com relações filogenéticas e que se diferenciam de outras por traços específicos), a música (para se referir a diferentes gêneros musicais), etc. (MICHAELIS, 2019). Nesta unidade, apresenta-se como esse conceito tem sido compreendido em seu sentido social. Esse não é um trabalho simples, pois diversos autores compreendem o conceito de gênero de diferentes formas. Desse modo, utilizaremos algumas referências principais acerca desse tema, mas é preciso salientar que existem diversos debates e visões distintas em relação a ele. Uma definição simplista do conceito de gênero, mas que pode ajudar a entendê- lo, corresponde ao fato de que ele visa compreender questões sociais atribuídas, geralmente, ao que a sociedade entende como homem ou mulher, ou seja, é um conceito utilizado para fazer referência ao que é construído socialmente e historicamente acerca do conceito de sexo. Nesse contexto, Olinto (1998) expõe que gênero é um conceito das Ciências Sociais surgido nos anos 70, relativo à construção social do sexo. Significa a “distinção entre atributos culturais alocados a cada um dos sexos e à dimensão biológica dos seres”. O uso do termo gênero expressa todo um sistema de relações que inclui sexo, mas que transcende a diferença biológica. O termo sexo designa somente a caracterização genética e anátomo-fisiológica dos seres humanos (OLINTO, 1998, p. 162). A palavra “gênero” tem sido utilizada nas últimas décadas dentro dos debates acadêmicos. Joan Scott, por exemplo, é uma importante historiadora estadunidense que se dedicou a compreender esse conceito. O artigo “Gênero: uma categoria útil para análise histórica”, escrito por ela, tornou-se uma referência importante sobre o tema em diversos países. De acordo com Scott (1995), as palavras têm uma história, portanto, para compreender os significados atuais da palavra “gênero” no campo social, é importante entender como a categoria “gênero” se inseriu nos discursos e nas pesquisas acadêmicas. Segundo a autora, essa categoria foi utilizada para defender o caráter fundamentalmente social das distinções que são baseadas no sexo, rejeitando o determinismo biológico do termo “sexo” e da expressão “diferença sexual”. Diversas autoras feministas passaram a utilizar a categoria gênero como uma alternativa para sexo, considerado por muitas um conceito determinista. Outro uso do conceito de gênero teve o intuito de introduzir uma noção relacional nos estudos feministas, defendendo que não é possível compreender homens e mulheres de forma isolada (SCOTT, 1995). O conceito de gênero, de acordo com Wolff e Saldanha (2015), tem relação com a cultura, a história e a formação social. Isso significa que características consideradas femininas, masculinas ou neutras dependem da cultura e do período histórico em que estão inseridas. Como exemplo, podemos mencionar o uso do kilt pelos escoceses, traje que muitos consideram semelhante a uma saia. Na Escócia, essa peça de roupa é utilizada por homens em algumas situações formais, como casamentos, formaturas e outras comemorações. No Brasil, as roupas semelhantes a uma saia são consideradas femininas. Figura 3.3 - Escoceses vestindo o kilt Fonte: James F. Perry / Wikimedia Commons. O conceito de gênero também deve ser compreendido como poder, pois a sociedade estabelece algumas hierarquias em relação a gênero e a outras categorias, como raça e classe. Conforme expõem Wolff e Saldanha (2015, p. 36), gênero é poder, é hierarquia. As sociedades estabelecem lugares sociais que são demarcados em termos de gênero, classe, raça, geração, religião, entre outros. Mas o gênero tem sido, nas sociedades que conhecemos, o primeiro desses critérios, aquele que estabelece, desde que a pessoa nasce e é identificada a partir de características sexuais com papéis esperados de gênero, que atividades ela poderá exercer em sua vida, e quanto poder terá em suas relações. Nas sociedades que conhecemos, esta hierarquia é do tipo “patriarcal”, ou seja, são as pessoas identificadas com o gênero masculino que detêm a maior parte do poder. Isso não quer dizer, como ensina Michele Perrot (1988, p. 168), que as mulheres não tenham “poderes”. E como nos aponta Michel Foucault (1988, p. 91), não há poder sem resistência. Nesse sentido, gênero é também uma construção social, isto é, algo que não é natural e predeterminado antes do nascimento de um indivíduo. Simone de Beauvoir (1908-1986) foi uma importante filósofa, que apresentou debates sobre as relações entre homens e mulheres, sendo considerada, atualmente, um dos maiores nomes no campo acadêmico dos estudos de gênero e de movimentos feministas. Para Beauvoir (1970), não se nasce mulher, torna-se mulher. Essa famosafrase da filósofa refere-se à ideia de que não existem características inatas em relação ao comportamento e aos gostos das mulheres, por exemplo, mas que eles são construídos socialmente. Essa compreensão da autora se relaciona à corrente filosófica da qual ela fazia parte, o existencialismo, o qual considera que a existência tem prioridade sobre a essência humana. Em outras palavras, as mulheres não têm uma essência inata, que faz delas mulheres, mas, ao longo de suas vidas, elas constroem essa identidade. Nas palavras da própria autora: ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino. Somente a mediação de outrem pode constituir um indivíduo como um Outro (BEAUVOIR, 1970, p. 9). Nos dois livros que compõem a obra “O segundo sexo”, Beauvoir (1970) defende a tese de que as mulheres ocupam o não lugar na sociedade, isto é, a mulher é sempre pensada em relação ao homem. Segundo a autora, o homem é considerado essencial e universal, enquanto a mulher é entendida como aquilo que o homem não é, ou seja, a mulher é considerada o “outro”, o segundo sexo. Como exemplos, podemos citar a utilização do termo “homem” como sinônimo de humanidade ou quando, em uma sala de aula com mais mulheres do que homens, os(as) professores(as) dizem “bom dia a todos”. Figura 3.4 - Simone de Beauvoir, importante filósofa dos estudos de gênero Fonte: Moshe Milner / Wikimedia Commons. As contribuições de Simone de Beauvoir foram bastante significativas para os estudos de gênero e questionaram os lugares ocupados e não ocupados pelas mulheres na sociedade. Outra filósofa bastante conhecida nesse campo de estudos é a estadunidense Judith Butler. A autora difere do pensamento de Simone de Beauvoir em alguns aspectos, por exemplo, ao considerar que, de certo modo, as mulheres não nascem com essa classificação por terem características inatas do que é considerado ser mulher, mas, porque, antes mesmo de nascer, no período da gestação, já existe o questionamento: trata- se de uma menina ou de um menino? Nesse contexto, são criadas diversas expectativas, as quais são lançadas sobre o feto que ainda não nasceu. Em outras palavras, antes mesmo de nascer, já somos socializados como homens ou mulheres. Por exemplo, no caso de uma mulher grávida, que descobre que o neném gestado tem vagina, diversas expectativas de comportamento são lançadas sobre esse feto, como as roupas que o bebê deverá vestir, as cores que deverá gostar, como deverá se comportar, quais brinquedos poderá ter, etc. De acordo com Butler (2003), a diferenciação entre o conceito de sexo e de gênero foi realizada, inicialmente, para questionar a afirmação de que biologia era um destino incontornável. Hoje, segundo a autora, é importante romper perspectivas binárias, ao se pensar na categoria de gênero, pois o entendimento de feminino e masculino como definições únicas e opostas não é suficiente para compreender e enquadrar todas as pessoas, além de apresentar diversas problemáticas. Discussões sobre gênero Nos últimos anos, houve diversos debates em relação ao conceito de gênero. Um exemplo corresponde ao Plano Nacional de Educação (PNE), de 2014, que orienta o planejamento educacional dos municípios por dez anos. Esse plano gerou diversas polêmicas acerca da necessidade ou não de discussões sobre gênero nas escolas. Outra situação bastante polêmica refere-se às manifestações a favor e contra a visita da filósofa Judith Butler ao Brasil, em 2017. Nos últimos anos, a ideia de ideologia de gênero ganhou destaque no Brasil. Você já ouviu essa expressão? Ela ganhou força quando alguns pesquisadores e/ou militantes foram acusados de promovê-la ao realizarem discussões sobre gênero e sexualidade. De um lado, existem pesquisadores e educadores que defendem a necessidade das discussões de gênero e sexualidade para a construção de uma sociedade menos desigual e preconceituosa; do outro, muitas vezes, há representantes de instituições religiosas e conservadoras, que acusam esses pesquisadores de promover a ideologia de gênero, incentivar crianças a práticas sexuais e colaborar com a homossexualidade. Grande parte das pessoas que defendem a existência da ideologia de gênero tem pouco ou nenhum conhecimento acerca dos conceitos abordados nesta unidade e faz críticas e acusações errôneas e sem fundamentos teóricos e científicos. Desse modo, antes de defender ou não uma posição, é fundamental ter conhecimento sobre o tema. Os pesquisadores que defendem a necessidade de discussões de gênero e sexualidade afirmam que as escolas, por exemplo, podem ser locais de construção de preconceitos e discriminações, mas também de promoção de emancipações e mudanças (AUAD, 2006). Para Louro (1998 apud VINHOLES, 2012), por meio das simbolizações das relações pedagógicas construídas na escola, a criança aprende normas, valores e sentidos que vão lhe conduzir em relação à diversidade de gênero. Dessa forma, além de refletir as concepções de gênero que circulam na sociedade, a escola também as produz, logo, as discussões relacionadas a gênero e sexualidade são necessárias no espaço escolar. Os pesquisadores que consideram necessárias as discussões acerca de gênero e sexualidade afirmam que orientações sexuais são diferentes de aulas sobre sexo. Ao propor orientações sexuais nas escolas, os educadores têm o objetivo de contribuir para que o(a) aluno(a) tenha, futuramente, uma vida sexual saudável, sem riscos de contrair doenças sexualmente transmissíveis ou de ter uma gravidez indesejada, por exemplo. Ademais, as discussões sobre sexualidade permitem a promoção da igualdade e o enfrentamento a preconceitos, como homofobia, lesbofobia e transfobia, além de promover a igualdade entre gêneros, como no caso de enfrentamentos às violências contra as mulheres. ATIVIDADE 1) Simone de Beauvoir, proeminente filósofa francesa do século XX, dedicou-se a refletir sobre os lugares das mulheres na sociedade, questionando e dialogando com áreas do conhecimento como a Psicanálise e a Biologia. Dentre suas proposições mais conhecidas, está contida a frase “não se nasce mulher, torna-se mulher”, presente em sua obra “O segundo sexo”. Em relação esse contexto, assinale a alternativa correta. a) Simone de Beauvoir propõe que as questões constitutivas de gênero se reduzem à esfera biológica. b) Para Beauvoir, não existem aspectos inatos na constituição dos gêneros, mas construídos por meio de elementos histórico-sociais. c) A frase faz uma apologia à supremacia das mulheres em relação aos homens. d) Tornar-se mulher refere-se ao processo de transição de gênero, denominado segundo sexo. e) Beauvoir enfatiza a importância da conexão entre mãe e filha durante o parto, para que a criança se torne mulher. SEXUALIDADES E IDENTIDADES Nesta parte da unidade, apresentaremos mais alguns aspectos relacionados às sexualidades e identidades. Assim, discutiremos dois conceitos importantes para esse tema: orientação sexual e identidade de gênero. Neste momento, caro(a) aluno(a), o objetivo é possibilitar que você entenda quais são as diferenças entre identidades e sexualidades e compreenda que nós, seres humanos, somos diversos. Orientação sexual Caro(a) estudante, você sabe o que é orientação sexual? Esse conceito pode ser definido como o desejo afetivo e/ou sexual que cada pessoa tem em relação a outras pessoas. Assim, uma pessoa pode se sentir atraída por alguém do mesmo gênero (homossexual), do gênero oposto (heterossexual), pelos dois gêneros (bissexual), bem como pode sentir atração independente do sexo ou gênero (pansexualidade), etc. É denominadaheteronormatividade a compreensão de que o desejo afetivo pelo sexo oposto “é tomado como parâmetro de normalidade em relação à sexualidade, para designar como norma e como normal a atração e/ou o comportamento sexual entre indivíduos de sexos diferentes” (PETRY; MEYER, 2011, p. 196). Em outras palavras, na sociedade em que vivemos, a heterossexualidade é tratada como norma, ou seja, como aquilo que é comum ou “normal”. Assim, salientamos que a heterossexualidade é um tipo de orientação sexual, mas não é a única. Apesar disso, como vivemos em uma sociedade heteronormativa, as pessoas que não se enquadram nessa orientação sexual vivenciam diversos preconceitos, com frequência. Figura 3.5 - Existem diferentes orientações sexuais Fonte: rootstocks / 123RF. Quando o assunto é orientação sexual, devemos considerar que a sexualidade faz parte da vida humana e tem grande importância na vida psíquica dos sujeitos. Também é preciso considerar as singularidades existentes entre diferentes pessoas em relação à sexualidade, visto que há orientações sexuais e formas de se relacionar distintas. Portanto, não existe apenas um modo de ser (heterossexual, homossexual ou bissexual, por exemplo). A palavra “orientação” é utilizada no lugar de “opção” (opção sexual), pois se entende que a sexualidade não é uma escolha realizada em algum momento da vida. Se fosse uma escolha, os heterossexuais também teriam feito essa escolha em algum momento e poderiam, inclusive, escolher novamente, ao se relacionarem com pessoas do mesmo sexo, por exemplo. FIQUE POR DENTRO Você já ouviu a expressão “cura gay”? Popularmente, é um nome para as terapias que propõem a “reorientação” ou a “reversão” sexual. As consequências psicológicas desses “tratamentos” são bastante expressivas, além dos relatos de violências físicas, como choques e torturas. O Conselho Federal de Psicologia do Brasil, na Resolução n° 001/99, de 22 de março de 1999, estabelece que a homossexualidade não é uma doença e, desse modo, os(as) psicólogos(as) não podem exercer atividades que colaborem com a patologização de práticas homoafetivas nem com serviços e eventos que visem aos tratamentos e às “curas” para a homossexualidade. Para saber mais sobre o tema e ter acesso a relatos de pessoas que vivenciaram violências nesse tipo de “tratamento”, leia o texto “O inferno da ‘cura’ gay”, de Marcos Sergio Silva. O texto pode ser lido, integralmente, no link: <https://www.uol/noticias/especiais/o-inferno-da-cura-gay.htm#se-nao-ha-mal-nao-ha- cura>. Acesso em: 17 jun. 2019. Identidade de gênero Agora, apresentaremos o conceito de identidade de gênero, que costuma ser confundido com a orientação sexual, a qual corresponde à sexualidade dos sujeitos. Por sua vez, a identidade de gênero se relaciona à forma como as pessoas se identificam. Para compreender o que é identidade de gênero, são fundamentais as discussões sobre sexo e gênero (e suas diferenças) realizadas anteriormente. Pode parecer um pouco confuso, inicialmente, quando abordamos o conceito de identidade de gênero, pois vivemos em uma sociedade que considera natural a existência de pessoas cisgêneras, contudo as identidades são diversas. As pessoas enquadradas em determinado sexo biológico e que se identificam com o gênero atribuído a elas são denominadas cisgêneros. Por exemplo, uma pessoa que nasce com uma vagina é classificada como mulher e se identifica como mulher, ou seja, identifica-se com o gênero atribuído a ela. As pessoas que se identificam com um gênero diferente do que foram classificadas no nascimento são denominadas transgêneros. Um exemplo é uma pessoa que nasce com uma vagina, é classificada em seu nascimento como mulher, mas que não se identifica como mulher. Se transgênero remete às pessoas que assumiram na vida adulta uma expressão de gênero (binário ou não) diferente ou complementar daquela atribuída ao nascer, cisgênero designa pessoas que se mantiveram no sexo designado (BONASSI, 2017, p. 23). A expressão não binário é utilizada para se referir às pessoas que não compreendem sua identidade limitada às categorias “feminino” ou “masculino”. Algumas pessoas podem compreender suas identidades como “entre” o masculino e o feminino e outras como totalmente distante das duas categorias. Conforme expõem Reis e Pinho (2016), os gêneros não binários, [...] além de transgredirem à imposição social dada no nascimento, ultrapassam os limites dos polos e se fixam ou fluem em diversos pontos da linha que os liga, ou mesmo se distanciam da mesma. Ou seja, indivíduos que não serão exclusiva e totalmente mulher ou exclusiva e totalmente homem, mas que irão permear em diferentes formas de neutralidade, ambiguidade, multiplicidade, parcialidade, ageneridade, outrogeneridade, fluidez em suas identificações (REIS; PINHO, 2016, p. 14). A expressão gênero fluido é utilizada para fazer referência às pessoas que podem se identificar, em alguns períodos, com diferentes identidades de gênero, masculino, feminino ou neutro. Segundo Reis e Pinho (2016), essa definição faz referência à identidade de pessoas que têm o espectro de gêneros em constante mudança. Por fim, o termo agênero é utilizado como classificação para pessoas que não se consideram pertencentes a qualquer gênero. De acordo com Reis e Pinho (2016), agênero refere-se aos casos em que os indivíduos vivenciam a ausência de gênero. Trans, travestis e drag queens Quando o assunto é identidades de gênero, surgem diversas dúvidas; uma delas corresponde às diferenças entre as pessoas que se consideram transexuais, travestis e drag queens. Como exposto anteriormente, uma pessoa que se considera transexual não se identifica com o gênero atribuído ao seu sexo biológico. No Brasil, o termo “travesti” é bastante utilizado e carrega uma visão, muitas vezes, preconceituosa e negativa, pois diversas pessoas trans são chamadas de travestis como forma de ofensa. Esse termo, no entanto, também assume um viés político de ressignificação e algumas pessoas preferem ser chamadas de travestis. Como a identidade de gênero diz respeito a como a pessoa se identifica, antes de considerarmos alguém trans ou travesti, é importante perguntarmos como ela se reconhece. Figura 3.6 - Bandeira Transgênero Fonte: SVG file Dlloyd based on Monica Helms design / Wikimedia Commons. Uma confusão bastante frequente é achar que as pessoas transexuais são as que querem mudar aspectos físicos do corpo ou fizeram cirurgias de redesignação sexual. Ademais, o mais adequado, ao se referir a mulheres travestis, é utilizar o pronome feminino, e não masculino, ou seja, a travesti, e não o travesti. Para alguns, pode parecer apenas um detalhe, mas se trata de respeito à identidade da outra pessoa e à diversidade. O conceito de drag queen, por sua vez, corresponde a uma expressão artística e não tem relação, necessariamente, com a identidade de gênero dessa pessoa. Isso porque um homem cisgênero pode ser drag queen sem se identificar como mulher. Em resumo, segundo Jesus (2012), a denominação “travesti”, mais frequente no Brasil do que em outros país, é historicamente estigmatizada. Tem-se discutido a sua utilidade hoje, quando se entende que: (1) Elas não se “travestem” no sentido original da terminologia; (2) Muitas pessoas tidas como travestis têm identidade transexual; e (3) Há os termos crossdresser e transformista (drag queen ou drag king) para se referir a dimensões específicas da vivência transgênero que não decorrem de aspectos identitários (como a travestilidade ou a transexualidade) (JESUS, 2012, p. 18). As questões de identidade de gênero não impactam apenas elementos da aparência ou da sexualidade. Algumas pessoas que se identificam como transgêneras optam por não mais adotar o nome contido em seu registrode nascimento, pois entendem que tal nome não representa sua identidade de gênero, assim, preferem utilizar um nome social. O nome social é o nome pelo qual pessoas travestis e transexuais preferem ser chamadas, no lugar do nome registrado em cartório. A utilização do Nome Social para se referenciar às pessoas travestis e transexuais, respeitando suas autodeterminações sobre o modo de tratamento em torno de sua identidade de gênero, se refere à garantia de um direito para pessoas que historicamente vivem violações, o que pode atuar como um importante elemento para o desenvolvimento do acompanhamento socioassistencial (BRASIL, 2007, p. 7). Nem todas as pessoas trans querem ser chamadas por um nome social, mas as que desejam devem ser respeitadas, pois se trata de um direito que diversas instituições já reconhecem, como algumas universidades e concursos públicos, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Identidade X sexualidade Como exposto anteriormente, a identidade de gênero é diferente da orientação sexual. Isso significa que a forma como a pessoa se compreende no mundo não tem, necessariamente, relação com as pessoas com as quais ela deseja se relacionar. Gênero se refere a formas de se identificar e ser identificada como homem ou como mulher. Orientação sexual se refere à atração afetivossexual por alguém de algum/ns gênero/s. Uma dimensão não depende da outra, não há uma norma de orientação sexual em função do gênero das pessoas, assim, nem todo homem e mulher é “naturalmente” heterossexual. (BRASIL, 2007, p. 41). Assim, uma pessoa trans, necessariamente, não é heterossexual, homossexual ou bissexual. Para entender melhor esse assunto, considere o seguinte exemplo: quando nasceu, Paula foi identificada como homem, por ter nascido com um pênis, logo, seu sexo biológico foi classificado como homem. Paula, porém, não se identifica como um homem, mas como uma mulher, então, é considerada uma pessoa trans, por não se identificar com o gênero atribuído ao seu sexo biológico. Ademais, Paula sente atração por mulheres, e não por homens, assim, é considerada uma mulher trans lésbica, pois é uma mulher que sente atração por outras mulheres. Caso Paula sentisse atração por homens, seria uma mulher trans heterossexual. Sexualidade e gênero são, portanto, componentes distintos da formação identitária, que podem assumir formas múltiplas, como as evidenciadas nesse exemplo. Enquanto gênero se relaciona ao modo como pessoas são socialmente diferenciadas por aspectos histórico-culturais, tradicionalmente, em homens e mulheres, a orientação sexual está relacionada a questões afetivas, do desejo e da excitação sexual (CARDOSO, 2008, p. 73). Preconceitos e violências Existem diversos preconceitos relacionados às diferentes identidades e sexualidades. Homofobia e lesbofobia são preconceitos contra as pessoas que sentem atração e se relacionam com pessoas do mesmo gênero. De acordo com Borillo (2001), no cerne desse tratamento discriminatório, a homofobia tem um papel importante, dado que é uma forma de inferiorização, consequência direta da hierarquização das sexualidades, que confere à heterossexualidade um status superior e natural (BORILLO, 2001, p. 17). Existem também preconceitos relacionados às pessoas bissexuais, inclusive, dentro de movimentos denominados LGBTQI+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexo e outras variações de gênero). Muitas vezes, essas pessoas são consideradas temporariamente confusas ou pervertidas sexualmente. REFLITA A criminalização da homofobia tem sido discutida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no que se refere à criminalização ou não de condutas discriminatórias contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais, etc. O STF poderá exigir que o Congresso Nacional avalie a criação de uma lei que torne crime atos de homofobia. Não existe ainda uma definição sobre quais ações serão consideradas crimes e as penas aplicadas, pois, caso seja aprovado, o texto será discutido por deputados e senadores. Existem diversos debates e diversas opiniões divergentes de pessoas que apoiam ou não a criminalização da homofobia, tanto por setores conservadores como pela própria comunidade LGBTQI+. Para alguns representantes dos movimentos LGBTQI+, a criminalização seria um passo importante no reconhecimento de práticas discriminatórias como descumprimento dos direitos humanos e, desse modo, seria uma medida contra a impunidade relacionada a essas violências. Outros representantes afirmam que a criminalização não é a solução, pois práticas punitivas somente não são eficientes para o fim da homofobia, além de o sistema penal ser seletivo e injusto. Estima-se que cerca de 420 pessoas foram mortas no Brasil em 2018, devido à discriminação LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais), de acordo com o levantamento realizado pelo Grupo Gay da Bahia (GGB, 2018). Esse cenário evidencia a violação dos direitos humanos, que garante que as pessoas têm o direito de expressar suas identidades e sexualidades. A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) também divulga dados acerca das violências contra pessoas trans. Para essa associação, no Brasil, a expectativa de vida de transexuais e travestis é de 35 anos, bem inferior se comparada à expectativa nacional. Historicamente, a população transgênero ou trans é estigmatizada, marginalizada e perseguida, devido à crença na sua anormalidade, decorrente da crença de que o “natural” é que o gênero atribuído ao nascimento seja aquele com o qual as pessoas se identificam e, portanto, espera-se que elas se comportem de acordo com o que se julga ser o “adequado” para esse ou aquele gênero [...]. Em nosso país, o espaço reservado a homens e mulheres transexuais e a travestis é o da exclusão extrema, sem acesso a direitos civis básicos, sequer ao reconhecimento de sua identidade. São cidadãs e cidadãos que ainda têm de lutar muito para terem garantidos os seus direitos fundamentais, tais como o direito à vida, ameaçado cotidianamente. Violências físicas, psicológicas e simbólicas são constantes (BRASIL, 2007, p. 11). O canal de denúncias “Disque 100” do Governo Federal é um importante mecanismo para denúncias de casos que ferem direitos humanos, como situações que envolvem homofobia, lesbofobia, bifobia e transfobia. O canal funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana, inclusive em feriados. ATIVIDADE 2) A diversidade humana se observa também em suas feições identitárias e sexuais. Como exemplo, o termo “transgênero” emergiu como categoria para definir pessoas que não se identificam com o gênero que lhes é atribuído socialmente ao nascer. Assim, aquele que se reconhece com o gênero que lhe foi designado no nascimento é: a) homossexual. b) cisgênero. c) heterossexual. d) drag queen. e) pansexual. RELAÇÕES DE GÊNERO Até agora, apresentamos algumas discussões sobre o conceito de gênero. Neste momento, abordaremos alguns apontamentos sobre as relações existentes entre esses conceitos. O que é machismo? O machismo refere-se aos comportamentos, às ações e atitudes que visam a não igualdade de direitos entre diferentes gêneros, contribuindo para a diminuição das mulheres. Há situações machistas cotidianas, por exemplo, quando se considera que os serviços domésticos são tarefas apenas das mulheres, quando há julgamentos de personalidade feitos com base na roupa que uma mulher está usando, quando alguém diz que as mulheres são motoristas ruins, etc. Figura 3.7 - O machismo está presente nas relações cotidianas Fonte: nlshop1 / 123RF. Portanto, podemos ver exemplos de machismos em diversos âmbitos, como nos relacionamentos, em filmes, músicas, documentários, livros, etc. Para Drumont (1980), determinados comportamentosmachistas podem ser percebidos ainda na infância, pois, desde criança, o menino e a menina entram em determinadas relações, que independem de suas vontades, e que formam suas consciências: por exemplo, o sentimento de superioridade do garoto pelo simples fato de ser um macho e em contraposição ao de inferioridade da menina. Um outro exemplo nos é oferecido pela própria destinação em termos de trabalho: a menina é geralmente conduzida para atividades que não produzem dinheiro, enquanto que o garoto é necessariamente orientado para uma profissionalização (DRUMONT, 1980, p. 81-82). Algumas autoras consideram o machismo algo estrutural, ou seja, algo que é produzido e reproduzido pelos sujeitos, mas que também estrutura toda a sociedade. Desse modo, entende-se que as instituições que compõem a sociedade, como o Estado, a família e a religião cristã, por exemplo, estruturam-se a partir de perspectivas machistas. REFLITA Existem limites para o humor? Você, provavelmente, já escutou alguma “piada” que aborda como as mulheres dirigem mal ou que mulheres loiras são burras. Nesse contexto, existem diversos debates acerca dos limites existentes no humor. Algumas pessoas defendem que, por se tratar de uma brincadeira, a piada pode abordar situações como as pontuadas anteriormente. Ademais, alguns consideram que, hoje, vivemos um período politicamente correto, no qual os comediantes não podem mais fazer algumas piadas. Outras pessoas defendem que uma piada é engraçada apenas quando todas as pessoas envolvidas se divertem e, portanto, quando alguém é ofendido(a), não é uma brincadeira. Argumenta-se também que “piadas” machistas e homofóbicas, por exemplo, fortalecem estereótipos e preconceitos. O que você pensa a respeito desse tema, caro(a) estudante? Você acredita que existem limites para o humor? Se sim, quais? O que é feminismo? O feminismo é um movimento social e político e, de certo modo, uma forma de compreender o mundo e as relações, que reivindica a igualdade de direitos entre homens e mulheres. FIQUE POR DENTRO Algumas pessoas acreditam que o feminismo é o oposto do machismo, mas essa interpretação está incorreta. Na verdade, um termo que poderia ser considerado oposto ao machismo é “femismo”, e não feminismo. O “femismo” defende a superioridade do gênero feminino em relação ao masculino. O feminismo, por sua vez, defende a igualdade entre os diferentes gêneros, por meio de diversas pautas, como a igualdade de salário entre homens e mulheres, o fim de casos de feminicídio e violências contra as mulheres, os direitos políticos das mulheres iguais aos dos homens e a não discriminação das mulheres em espaços públicos e privados. Nesse contexto, para saber mais sobre as diferenças entre femismo e feminismo, leia o texto de Maria Eduarda, denominado “Feminismo x femismo: Qual a diferença?”. O texto pode ser lido, integralmente, no link: <https://super.abril.com.br/blog/turma-do- fundao/feminismo-x-femismo-qual-a-diferenca/>. Acesso em: 17 jun. 2019. De acordo com Alves e Pitanguy (2017), o feminismo propiciou discussões sobre desigualdades de poder entre homens e mulheres, tanto no espaço público como no privado. Segundo as autoras, o feminismo não defende uma disciplina única, imposta a todas as mulheres, ou seja, o movimento feminista não se organiza de uma forma centralizada [...]. Caracteriza-se pela auto-organização das mulheres em suas múltiplas frentes, assim como em grupos pequenos, onde se expressam as vivências próprias de cada mulher (ALVES; PITANGUY, 2017, p. 8-9). Os feminismos contemplam diferentes pautas, as quais, muitas vezes, têm relação com as especificidades da vida das mulheres que os organizam. Desse modo, podemos pensar na existência de diversos movimentos feministas, e não apenas de um, considerado universal, pois, como exposto anteriormente, as mulheres são sujeitas diversas. Alguns movimentos feministas, quando pressupõem a ideia de mulheres como sujeitas universais, deixam de considerar pautas específicas. Um exemplo é que muitos movimentos feministas deixam de considerar pautas relacionadas às mulheres negras e trans, ou seja, mesmo buscando a igualdade entre homens e mulheres, produzem e reproduzem outras opressões, como o racismo e a transfobia. A história do movimento feminista, geralmente, é dividida em gerações ou ondas, que ocorreram em épocas historicamente distintas e, desse modo, têm demandas políticas e sociais diferentes. A primeira onda feminista refere-se ao movimento sufragista, que lutou pela garantia de direitos como o voto (NEGRÃO, 2002 apud NARVAZ; KOLLER, 2006). De acordo com Alves e Pitanguy (1985), a primeira onda tinha duas principais frentes: a luta por melhores condições de trabalho e a luta pelos direitos de cidadania. As mulheres reivindicaram o direito a melhores salários, à redução das jornadas de trabalho e ao voto. Para as autoras, essa luta abrangeu mulheres de diferentes classes e, apesar de ter acontecido de diferentes formas, em diversos países, foi um dos movimentos políticos de massa mais significativos do século XX, mas que, dificilmente, aparece nos livros de História. Figura 3.8 - Annie Kenney e Christabel Pankhurst: ativistas que defendiam o direito ao voto para as mulheres Fonte: Kaldari / Wikimedia Commons. A segunda onda ocorreu entre as décadas de 1950 e 1990, principalmente nos Estados Unidos e na França, com denúncias de opressões masculinas, a luta relacionada aos direitos reprodutivos e os debates sobre a sexualidade. Conforme expõem Alves e Pitanguy (1985), a segunda onda feminista reivindicou a igualdade em todos os níveis, tanto externo como doméstico, tendo como temas centrais a saúde, a sexualidade, as ideologias, o mercado de trabalho e as violências. Enfim, a terceira onda, com início na década de 1990, deu visibilidade para as singularidades e subjetividades das mulheres. Segundo Narvaz e Koller (2006), essa onda contesta as definições essencialistas de feminilidade e defende que as mulheres são plurais e têm diferentes vivências. A terceira onda também é estruturada como uma crítica a movimentos anteriores que excluíam algumas mulheres dos discursos e das reivindicações. O pós-estruturalismo é característico da terceira onda, enfatizado também pelo olhar para as micropolíticas. Figura 3.9 - A terceira onda feminista discute as singularidades e subjetividades de diferentes mulheres Fonte: venimo / 123RF. É significativo, caro(a) estudante, que você entenda as diferentes gerações dos movimentos feministas, mas, para algumas pesquisadoras, a divisão e a linearidade precisam ser vistas com cautela e criticidade. Isso porque diversos movimentos de mulheres, em diferentes países do mundo, realizaram resistências e enfrentamentos que, muitas vezes, são apagados quando se conta uma única história. Para Hemmings (2009), as histórias dominantes podem dividir o passado, visando à construção de uma narrativa de progresso, à perda e à homogeneização. Assim, a divisão tradicional das ondas feministas, segundo a autora, pode ocasionar generalizações e estereótipos para as diferentes décadas de reivindicações e lutas. ATIVIDADE 3) Os movimentos feministas, assim como outros movimentos sociais, são considerados diversos, pois podem defender pautas distintas. Ao longo da história, as mulheres lutaram por diferentes reivindicações. Esses movimentos, para algumas autoras, são divididos em três principais ondas ou gerações. Nesse contexto, assinale a alternativa correta em relação à primeira onda feminista. a) A primeira onda feminista é marcada pelo pensamento de Simone de Beauvoir de que não existem concepções inatas para o que é ser mulher. b) Uma das principais demandas da primeira onda feminista estava relacionadaao direito das mulheres ao voto. c) A primeira onda feminista aconteceu em países asiáticos, pois as mulheres ocidentais, na época, já haviam consolidado diversos direitos. d) O rompimento entre concepções binárias dos conceitos de sexo e gênero foi amplamente debatido durante a primeira onda feminista. e) Os homens foram os principais responsáveis por defender os direitos das mulheres durante a primeira onda feminista. VIOLÊNCIAS CONTRA AS MULHERES Hoje, a violência contra as mulheres está presente em muitos contextos sociais, nos âmbitos privado, residencial ou público, atingindo, de forma geral, todos os grupos de mulheres, contudo, com maior força, segmentos mais empobrecidos e negros. Assim, a seguir, discutiremos diferentes tipos de violências que atingem as mulheres. O que são violências contra as mulheres? A violência doméstica e familiar contra as mulheres, segundo a ONU Mulheres (2015), é uma forma de violação aos direitos humanos. Para Gomes et al. (2007), diversos estudos feministas contribuíram para dar visibilidade à violência doméstica e, como consequência, ocorreram mais exigências de respostas políticas. De acordo com Araújo (2008), a violência de gênero é produzida e reproduzida nas relações de poder em que se entrelaçam diferentes categorias, como gênero, classe e raça/etnia. Quando são estudadas as violências contra as mulheres, é preciso considerar a compreensão plural dos conceitos de violência e de mulher. Não existe apenas uma forma de violência contra as mulheres, as quais, por sua vez, não formam uma categoria universal. Assim, as diferenças entre as mulheres precisam ser consideradas. As violências contra as mulheres podem acontecer em diferentes campos, como no trabalho, em situações domésticas ou públicas. As violências domésticas e familiares vivenciadas por mulheres no Brasil são alarmantes. De acordo com a pesquisa denominada “Violência doméstica e familiar contra a mulher”, 49% das mulheres em situação de violência tiveram como agressor o próprio marido ou companheiro e 21% disseram que foram agredidas pelo ex-namorado, ex-marido ou ex-companheiro (BRASIL, 2015). Uma em cada cinco mulheres, segundo a pesquisa, contou que não procurou uma forma de auxílio. Os motivos que impediram as mulheres de realizarem denúncias são: preocupação com a criação dos filhos (24%); medo de vingança do agressor (21%); crença de que seria a última vez (16%); crença na impunidade do agressor (10%); vergonha da agressão (7%) (BRASIL, 2015). A Lei nº 11.340/2006, que abordaremos mais especificamente ainda nesta unidade, define cinco tipos de violências contra as mulheres: patrimonial, sexual, psicológica, moral e física. O Quadro 3.1 apresenta alguns exemplos de violências contra as mulheres. Tipo de violência Exemplos Patrimonial Destruição total ou parcial de bens e objetos, documentos pessoais e instrumentos de trabalho. Sexual Relações sexuais sem consentimento, mesmo com uma companheira, ou o ato de impedir que a mulher use métodos contraceptivos. Psicológica Comportamentos e falas que afetem a autoestima ou causem outros danos emocionais, como chamar a mulher de “feia” ou dizer que ela não conseguirá se relacionar com outras pessoas. Moral Condutas relacionadas à calúnia, injúria ou difamação, como fazer comentários acerca da mulher para vizinhos e conhecidos ou afirmar que uma mulher praticou um crime que não cometeu. Física Ações que afetem a saúde e a integridade corporal, como tapas, socos, chutes e empurrões. Quadro 3.1 - Exemplos de violências contra mulheres Fonte: Elaborado pelos autores. Outro ponto importante que deve ser considerado em relação às violências contra as mulheres é a compreensão de que elas têm diversas identidades, por exemplo, diferenças étnicas, sexuais e de classes sociais. Todas as mulheres estão sujeitas a vivenciar violências, contudo outros marcadores sociais referentes a suas identidades precisam ser observados, ou seja, se as mulheres são negras, brancas, indígenas, ricas, pobres, lésbicas, heterossexuais, etc. Figura 3.10 - As mulheres são sujeitas diversas Fonte: rawpixel / 123RF. De acordo com o Atlas da Violência, em 2016, 4.645 mulheres foram assassinadas no Brasil (IPEA, 2018). A mortalidade de mulheres brancas diminuiu 7,4% entre 2005 e 2015, contudo a de mulheres negras aumentou em 22% nesse mesmo período. Esses dados mostram a importância de considerar questões raciais no que se refere às violências contra as mulheres. De acordo com Cerqueira et al. (2018), no estado de São Paulo, houve uma diminuição de 35,4% dos casos de violências contra mulheres entre 2004 e 2015, mas, no estado do Maranhão, houve um aumento de 130,0%. Esses dados mostram que a posição geográfica também é um marcador importante, quando se discutem as violências contra mulheres. FIQUE POR DENTRO O conceito de interseccionalidade é utilizado por Kimberlé Crenshaw (2002) para falar sobre opressões vivenciadas por mulheres negras. De acordo com a autora, as mulheres negras não têm suas pautas contempladas com frequência nos movimentos feministas, muitas vezes, racistas, e no próprio movimento negro, que se mostra, muitas vezes, machista. Segundo Crenshaw (2002), não devemos compreender as opressões de forma isolada ou como somas, ou seja, não podemos visualizar os eixos de opressão de modo separado. Nesse contexto, a autora utiliza a metáfora da intersecção de linhas de trânsito, para expor que as pessoas podem ser consideradas pontos em que diversas opressões se cruzam, desse modo, as posições são estabelecidas nesse cruzamento. Diferentes opressões, como racismo, sexismo e classe, atuam juntas e ao mesmo tempo. Para saber mais sobre esse conceito, leia o texto “A intersecionalidade na discriminação de raça e gênero” de Kimberlé Crenshaw. Você pode ler o texto, na íntegra, no link: <http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-content/uploads/2012/09/Kimberle- Crenshaw.pdf>. Acesso em: 17 jun. 2019. Portanto, diferentes tipos de violências contra as mulheres acontecem com frequência, de forma simultânea (violências físicas são acompanhadas de violências psicológicas, por exemplo) e são diversas. Enfrentamentos às violências contra as mulheres no Brasil Você, provavelmente, já ouviu a frase “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”, que expressa a ideia de que a violência contra as mulheres é um assunto apenas do âmbito privado. Na verdade, essa violência também é uma responsabilidade do Estado e de todos(as). A partir da década de 1980, principalmente, no Brasil, foram criadas diversas políticas que visavam ao enfrentamento das violências contra as mulheres. A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, denominada “Convenção de Belém do Pará”, que ocorreu em 1994, foi um marco importante. Ela promoveu o reconhecimento das violências contra as mulheres como violações aos direitos humanos, além de estabelecer deveres aos estados signatários no enfrentamento às violências contra as mulheres. Conforme expõe Santos (2008), há três principais momentos de mudanças institucionais que demonstram as políticas públicas relacionadas ao enfrentamento às violências contra as mulheres no Brasil: a criação da primeira Delegacia da Mulher, em 1985, os Juizados Especiais Criminais, de 1995, e a Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha. A primeira Delegacia da Mulher, chamada na época de Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), foi criada na década de 1980. De acordo com Santos (2005 apud SANTOS, 2008, p. 157), em agosto de 1985, o governador Montoro criou a “Primeira Delegacia de Polícia de Defesa da Mulher” do Brasil e da América Latina (Decreto 23.769/1985). O processo de criação desta delegacia, conhecida em São Paulo pelo acrônimoDDM, recebeu intensa cobertura dos meios de comunicação social e trouxe grande visibilidade ao problema da violência e ao trabalho desenvolvido pelas organizações não-governamentais feministas. Em 1986, foi criada a primeira casa-abrigo, também na cidade de São Paulo. Essas casas são instituições que acolhem mulheres em situações de violências e sob risco de morte. Atualmente, existem diversas casas-abrigos no território nacional, contudo há a necessidade de outras políticas de abrigamento, uma vez que o Relatório nº 1, de 2013, da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), demonstrou que essas instituições, mesmo importantes, são pouco procuradas. Essa baixa procura se deve, provavelmente, ao caráter sigiloso da instituição, que impossibilita saídas e contatos com pessoas próximas sem autorização prévia. Assim, muitas mulheres decidem não ir para as essas casas, o que sinaliza a necessidade de implementação de outras políticas de abrigamento para mulheres, como as casas de passagem, que acolhem mulheres que não estão sob risco de morte, e o aluguel social. Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha): enfrentamento legal às violências domésticas e familiares A Lei nº 11.340, sancionada em 2006, é um dos marcos mais importantes acerca do enfrentamento às violências contra as mulheres no Brasil. Essa lei é referência para outros países do mundo, por considerar, além de aspectos punitivos e criminais, os de promoção e de igualdade de gêneros. Ademais, essa lei é uma homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, mulher que sofreu duas tentativas de assassinato pelo seu ex-companheiro e ficou paraplégica. Seu agressor continuou em liberdade durante 19 anos. Figura 3.11 - Maria da Penha Maia Fernandes, símbolo de luta pelos direitos das mulheres no Brasil Fonte: Cesar Itiberê / Wikimedia Commons. A Lei Maria da Penha ampara mulheres que vivenciaram violências no âmbito familiar e doméstico. A pessoa que sofreu a violência deve ser uma mulher, mas o agressor pode ser qualquer pessoa, não necessariamente homens. Nesse sentido, são consideradas violências familiares e domésticas as que ocorrem entre mulheres e seus(suas) parceiros(as) amorosos(as) e entre mulheres e demais pessoas com algum parentesco ou familiaridade. Por exemplo, violências entre nora e sogra podem ser enquadradas nessa lei. O reconhecimento de diferentes tipos de violências pela Lei Maria da Penha merece destaque, pois, de acordo com Machado (2013), antes, não existia, em nenhum nível legal brasileiro, o conceito de violência psicológica com a mesma complexidade. Além disso, com a Lei Maria da Penha, ocorreram algumas modificações no campo criminal, como o agravante para os crimes que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher, como consta no artigo 43 dessa lei. Assim, há a possibilidade de decretação de prisão preventiva em caso de descumprimento das medidas protetivas de urgência. Desse modo, essa lei é um marco no enfrentamento às violências contra as mulheres brasileiras, mas ainda existem diversas questões que precisam ser debatidas, como a dificuldade dos operadores do Direito de compreender as violências além do campo jurídico. Outro ponto é a falta de integração entre as instituições que compõem a rede de enfrentamento, como os Centros de Referência de Atendimento à Mulher, as Casas-abrigos, as Casas de Acolhimento Provisório, os Juizados Especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e a Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180). Lei nº 13.104/2015 (Lei do Feminicídio) O feminicídio é a morte de mulheres em decorrência do fato de a pessoa ser uma mulher, ou seja, há relação com misoginia e discriminação de gênero. Em 2015, foi sancionada a Lei nº 13.104, com o intuito de alterar o Código Penal (artigo 121 do Decreto-lei nº 2.848/40) e incluir, desse modo, o feminicídio como uma modalidade de homicídio qualificado. Dessa forma, os projetos de lei (da CPMI e seus dois substitutivos) e a lei aprovada objetivaram dar um nome jurídico – feminicídio – a uma conduta que expressa a morte violenta com características ou contextos especiais, que, em geral, não são observadas em mortes masculinas. Assim sendo, nominar juridicamente o feminicídio como a morte por razões de gênero foi uma demanda feminista de reconhecimento da especificidade dessas mortes. Portanto, o nomen juris através da tipificação penal reflete o reconhecimento político-jurídico de uma violência específica que é também uma violação dos direitos humanos das mulheres (CAMPOS, 2015, p. 110). De acordo com o Mapa da Violência de 2015, entre os anos de 1980 e 2013, 106.093 pessoas morreram pela condição de serem mulheres no Brasil. Sendo assim, a caracterização dos homicídios contra as mulheres como feminicídio foi também um passo importante no reconhecimento e no enfrentamento às violências e mortes de mulheres no país. ATIVIDADE 4) A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, é um marco de enfrentamento às violências domésticas e familiares contra as mulheres no Brasil. Nesse contexto, considere as assertivas expostas a seguir. I. A violência patrimonial diz respeito a qualquer tipo de calúnia ou difamação contra as mulheres. II. Por ser uma Lei que considera as desigualdades de gênero entre homens e mulheres, a violência doméstica e familiar, segundo essa lei, ocorre apenas quando os agressores são homens. III. Impedir que a mulher utilize métodos contraceptivos é um tipo de violência sexual. De acordo com a Lei nº 11.340/2006, está correto o que se afirma em: a) I e III, apenas. b) III, apenas. c) I e II, apenas. d) I, apenas. e) I, II e III. INDICAÇÕES DE LEITURA Nome do livro: Feminismo e política: uma introdução Editora: Boitempo. Autor: Flávia Biroli e Luis Felipe Miguel. ISBN: 9788575593967. Comentário: Nesse livro, Flávia Biroli e Luis Felipe Miguel apresentam sínteses e reflexões sobre a teoria política feminista, produzida desde a década de 1980 até os dias atuais. Diversos temas presentes hoje nas discussões feministas são abordados pelos autores, por meio de diferentes correntes teóricas. Utilizando uma escrita simples, os autores permitem que o leitor que não tem muita proximidade com os temas consiga compreender as discussões apresentadas. INDICAÇÕES DE FILME Nome do filme: Frida Gênero: Biografia, Drama. Ano: 2002. Elenco principal: Salma Hayek, Alfred Molina, Geoffrey Rush. Comentário: O filme retrata a vida de Frida Kahlo, importante artística mexicana do século XX. Sua trajetória foi marcada por diversos acontecimentos, como um acidente, quando ela era adolescente, que a fez ter problemas de saúde durante toda sua vida. O filme também aborda o relacionamento de Kahlo com um importante artista mexicano, Diego Rivera; uma relação intensa e marcada por conflitos. Além disso, o filme retrata como Frida Kahlo questionou diversos aspectos de uma sociedade machista e misógina, com suas obras e sua forma de ser no mundo. UNIDADE IV Cultura e Cidadania Karen Eduarda Alves Venâncio Patrick Aparecido Trento Introdução Nesta unidade, abordaremos aspectos que se relacionam com a cultura e a cidadania. Vivemos em uma sociedade plural e o respeito à diversidade é um aspecto importante para a vida coletiva. Inicialmente, conheceremos o papel do Estado na formulação e na implementação de políticas públicas e na garantia de direitos. Veremos, também, que essa não é uma tarefa que cabe apenas ao Estado mas também a toda sociedade e aos indivíduos que dela fazem parte. Posteriormente, estudaremos o que são políticas universais. Conheceremos dois principais marcos no campo dos direitos humanos. O primeiro marco é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, elaborada em 1948, que contou com a contribuiçãode diversos países e foi divulgada pela ONU. O segundo é a Constituição Federal Brasileira de 1988. Veremos, também, o que são as chamadas políticas públicas específicas e inclusivas, que visam propor ações para grupos da sociedade que foram historicamente excluídos de setores políticos, sociais e econômicos. Por fim, estudaremos o conceito de acessibilidade. Conheceremos a definição de deficiência, segundo a legislação brasileira, e os diferentes tipos de deficiências. Veremos que existem leis no Brasil que visam garantir a inclusão e o acesso das pessoas com algum tipo de deficiência, contudo essa população ainda vivencia diversos preconceitos. Estudaremos, ainda, a acessibilidade de pessoas consideradas idosas, visto que, nas últimas décadas, a expectativa de vida dos brasileiros aumentou significativamente. Fonte: rawpixel / 123RF. O PAPEL DO ESTADO, DA SOCIEDADE E DOS INDIVÍDUOS NA PROMOÇÃO DE DIREITOS E DE CIDADANIA Nesse primeiro momento da unidade, estudaremos os papéis do Estado, da sociedade e dos indivíduos na promoção de direitos e de cidadania. O papel do Estado na promoção e na garantia de direitos Quando pensamos no termo política, por vezes, tendemos a associá-la somente a uma ideia eleitoral ou partidária, mas ela está presente nas relações humanas cotidianas, ou seja, é o exercício da vida em coletividade. A origem da construção do Estado está na necessidade que algumas sociedades tiveram de organizar as demandas de diferentes pessoas que dela fazem parte, isto é, organizar o mundo da política. O Estado Moderno é construído pelo contrato firmado de uma sociedade, ou seja, o conjunto dos indivíduos de um determinado grupo se relacionando em seu interior, que pertence a um território e investe poder a determinadas pessoas para serem seus representantes, ou seja, para exercerem o poder. Assim, podemos entender o conceito de Estado como um poder com legitimidade e soberania para governar uma sociedade em um determinado território. Thomas Hobbes (1588-1679) foi um importante pensador sobre a organização das sociedades. Uma de suas obras mais conhecidas é o livro Leviatã, cujo título faz referência ao monstro bíblico, citado no livro de Jó, que governava o caos primitivo. O estado de natureza, de acordo com Hobbes, correspondia às situações de vida humana sem política. Nele, segundo o pensador, não existiriam limites e os sujeitos poderiam fazer o que quisessem, acontecendo guerras e conflitos. Figura 4.1 - Thomas Hobbes Fonte: Dcoetzee / Wikimedia Commons. Com o intuito de se afastarem do estado de natureza, as sociedades concordam em realizar o que Hobbes chama de contrato social, isto é, investir de poder um soberano, que deveria ser o mediador das relações. A concepção atual de Estado moderno baseou-se no pensamento de Hobbes, como também de Maquiavel (1469-1527), filósofo italiano que escreveu o livro O Príncipe, e de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), que acreditava, diferente de Hobbes, que os sujeitos eram naturalmente bons, contudo a vida em sociedade poderia conduzi-los à depravação. Entende-se que, para que exista um Estado, é necessária uma unidade de comando, em que ele é o soberano, um território (local onde ele exercerá o poder) e um conjunto de pessoas comprometidas e que respeita as legislações impostas, por exemplo, as constituições. Muitas vezes, confundimos Estado com governo, contudo, são conceitos divergentes. O governo é constituído por pessoas que ocupam, por um determinado período, algumas posições dentro do Estado, como presidentes, governadores e reis. No Brasil, vivemos, atualmente, um período de democracia, em que os governantes são substituídos, contudo o Estado permanece. De acordo com Mattos (2001, apud ALVES, 2010) o Estado abrange um conjunto de instituições permanentes, por exemplo, os tribunais, o exército e a casa legislativa. Já governo diz respeito a um conjunto de programas que um grupo propõe para uma sociedade, ou seja, é o exercício das funções do Estado por parte de alguns sujeitos. Visto que o Estado deve representar todos de uma sociedade, é dever dele garantir direitos essenciais e garantir a cidadania. O conceito de cidadania possui relação com a formação do Estado Moderno, que ocorreu após a dissolução do sistema feudal, por volta do século XVI. Com a construção do Estado Moderno, os direitos dos sujeitos pertencentes a uma sociedade passaram a ter maior destaque. Posteriormente, foram formuladas as primeiras cartas e normativas que visavam discutir direitos e cidadania universais, como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, no ano de 1789, considerada um marco da Revolução Francesa, processo social e político que trouxe diversas mudanças na Europa e colaborou com a conquista de poder da burguesia. Vale lembrar que, nessa época, os direitos abrangiam somente os homens, pois as mulheres não eram consideradas cidadãs. Após a Revolução Francesa, diferentes sociedades também realizaram discussões e formularam documentos com o intuito de definir e de garantir direitos. Um dos marcos mundiais com relação aos direitos humanos, foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que estudaremos mais detalhadamente ainda nesta unidade. Papel da sociedade civil e dos indivíduos na promoção e na garantia de direitos Vimos, anteriormente, que na sociedade em que vivemos temos governantes, que fazem parte do Estado, e são responsáveis por nos representar, garantir direitos e promover a cidadania. E nós, tanto como sociedade quanto como indivíduos, qual é o nosso papel na promoção e na garantia de direitos e cidadania? Muitas pessoas entendem que cabe ao Estado a promoção e a garantia de direitos, mas deixam de considerar que fazem parte de uma sociedade e, desse modo, também são responsáveis por mudanças ou pela manutenção de garantias ou não de direitos. Entende-se, em nossa sociedade, que todos os cidadãos possuem direitos e deveres. São direitos de todo cidadão, por exemplo, direitos civis, como o direito à vida e à liberdade de expressão, direitos sociais, como educação, saúde, alimentação, trabalho e moradia, direitos políticos, com a garantia de voto direito e secreto e a ser candidato em eleições. Contudo, nós, enquanto cidadãos, também possuímos deveres, como cumprir as leis do nosso país, proteger o patrimônio público, proteger o meio ambiente, participar da formulação de políticas públicas e respeitar os direitos de outros cidadãos. Algumas legislações brasileiras enfatizam e reafirmam os deveres da sociedade e dos indivíduos que a compõem com relação à garantia de direitos humanos. Um exemplo é a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), que define, em seu Art. 4°, que é dever de todos a garantia de diversos direitos: É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990, on-line). Isso significa que, ao vermos crianças vivenciando situações de violências e/ou negligências, temos a obrigação de realizar denúncias aos órgãos competentes, uma vez que também somos responsáveis pela garantia de seus direitos. Figura 4.2 - A sociedade e os indivíduos que dela fazem parte têm o dever de garantir, de acordo com a Lei 8.096/90, os direitos de crianças e de adolescentes Fonte: rawpixel / 123RF. Outra Lei brasileira que reafirma o compromisso da sociedade civil é a 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha, a qual define que é dever de todos garantir a segurança das mulheres e não permitir que elas vivenciem situações de violênciasdomésticas e familiares (BRASIL, 2006). ATIVIDADE 1) O Estado tem o papel de garantir direitos, através de políticas públicas e legislações específicas. A concepção de Estado Moderno foi construída a partir da visão de diversos autores, sendo um deles Thomas Hobbes. De acordo com o filósofo, é possível afirmar que: a) as pessoas são naturalmente boas, contudo o Estado as corrompe. b) Alternativa correta: o estado de natureza simbolizava a vida humana repleta de conflitos e caos, sem a existência do Estado. c) o Estado é soberano e, por isso, não representa a sociedade em que governa. d) o contrato social realizado entre pessoas pertencentes a uma sociedade é, de acordo com Hobbes, o principal motivo dos conflitos entre os sujeitos. e) os fins justificam os meios, ou seja, um governante deve fazer o necessário para manter-se no poder. POLÍTICAS PÚBLICAS UNIVERSAIS Antes de iniciarmos nossos estudos sobre políticas públicas universais, aprenderemos o que são políticas públicas. Podemos entender políticas públicas como um conjunto de ações tomadas pelo governo, seja em nível federal, estadual ou municipal, que visam assegurar direitos relacionados à cidadania para um conjunto de pessoas. Elas podem ser universais, isto é, garantir o direito a todos, ou específicas, por buscarem atingir uma categoria: Políticas públicas são conjuntos de programas, ações e atividades desenvolvidas pelo Estado diretamente ou indiretamente, com a participação de entes públicos ou privados, que visam assegurar determinado direito de cidadania, de forma difusa ou para determinado seguimento social, cultural, étnico ou econômico. As políticas públicas correspondem a direitos assegurados constitucionalmente ou que se afirmam graças ao reconhecimento por parte da sociedade e/ou pelos poderes públicos enquanto novos direitos das pessoas, comunidades, coisas ou outros bens materiais ou imateriais (SANTOS, 2015, p. 55). O processo de construção de políticas públicas é extenso e contínuo, pois para elas serem construídas é necessário que existam justificativas e, com o passar do tempo, precisam ser avaliadas e, se necessário, reformuladas. Veremos, agora, algumas políticas públicas que visam garantir direitos universais, utilizando como base a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e a Constituição Federal Brasileira de 1988. Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi elaborada em conjunto com representantes de diversos países do mundo. Sua data de proclamação foi 10 de dezembro de 1948, dia em que ocorreu a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris. Trata-se de um conjunto de normas e de direitos que devem ser comuns em diferentes nações. Foi considerada um marco dessa área, pois foi a primeira vez que o mundo elaborou, em conjunto, um documento que visava a proteção universal dos direitos humanos. Já foi traduzida em mais de 500 idiomas e utilizada como base para a formulação de constituições de diversos países. Figura 4.3: Eleanor Roosevelt mostrando cartaz com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1949 Fonte: Civvi~commonswiki / Wikimedia Commons. De acordo com Hogemann (on-line), os direitos humanos possuem relação com os conceitos de justiça, de igualdade e de democracia. A autora destaca que esses direitos deveriam ser obrigação de todas as nações que fizeram parte de sua construção, independente dos sistemas políticos e econômicos, mas destaca que, na prática, diversos direitos ainda são desrespeitados. Ao longo da história da humanidade, foram lançados alguns documentos que buscaram discutir direitos humanos, mas nunca antes contemplando diversos países. São exemplos de outros documentos que preanunciam os direitos humanos, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada em 1789, e a Declaração de direitos do homem, de Virgínia, em 1776. O processo de construção da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) tem relação com acontecimentos vivenciados pelo mundo, na época, como a Segunda Guerra Mundial, que durou entre 1939 e 1945. Durante esse momento, o mundo viu acontecer diversos conflitos e violências. Os ataques às cidades Hiroshima e Nagazaki, no Japão, mataram diversas pessoas e deixaram muitas outras com consequências físicas e psicológicas. Figura 4.4: Prisioneiros do campo de concentração de Mauthausen, libertos em 5 de maio de 1945 Fonte: Arnold E. Samuelson / Wikimedia Commons. Outro exemplo de violências e mortes, foram os campos de concentração nazistas, que aprisionaram e mataram diversas pessoas, principalmente judeus. FIQUE POR DENTRO A pesquisadora Daniela Arbex utiliza da expressão “holocausto brasileiro” para fazer referência à morte de pessoas, que ocorreu no maior hospício brasileiro, localizado na cidade de Barbacena, no Estado de Minas Gerais. De acordo com a autora, as pessoas que ficavam na instituição eram torturadas, violentadas e mortas. Muitas pessoas eram colocadas dentro de hospícios sem qualquer diagnóstico psicológico e psiquiátrico, por exemplo, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, mulheres que engravidam de patrões ou de homens casados e moças que haviam perdido a virgindade e, conforme a família, causavam vergonha. Mais de 50 mil pessoas morreram no Hospício de Barbacena, o que, para Danela Arbex, é classificado como holocausto. Para saber mais sobre as violências que aconteciam no Hospício de Barbacena, acesse o link, disponível em: <https://www.huffpostbrasil.com/2016/11/09/o-holocausto-brasileiro-e-os-estragos- irreparaveis-do-silencio_a_21700120/>, acesso em: 17 jun. 2019. Após os eventos ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial, como a revelação dos campos de concentração nazistas e as bombas atômicas lançadas sobre o Japão, o mundo encontrava-se, de certo modo, assustado. Diante das catástrofes trazidas pela guerra, a urgência por discussões com relação aos direitos humanos tornava-se cada vez maior. Nesse contexto que a Declaração Universal dos Direitos Humanos foi elaborada. A Declaração de 1948 defende que todas as pessoas, independente de raça, cor, religião, sexo, opinião política, origem nacional ou social, ou qualquer outra condição, possuem os direitos estabelecidos nela. São estabelecidos diversos direitos, como a defesa de que todos os seres humanos, ao nascerem, são livres, possuem direitos iguais e, por serem dotados de razão e consciência, têm o dever de agir uns com os outros através do espírito da fraternidade (ONU, 1948). Define-se, na Declaração dos Direitos Humanos de 1948, de modo geral, que todos os seres humanos possuem direito à vida, à liberdade e à segurança. Desse modo, resguardado os princípios fundamentais, ninguém poderá ser mantido em regime de escravidão ou pode ser submetido à tortura (ONU, 1948). No texto ainda se afirma que todos são iguais perante à lei e devem ser protegidos de qualquer discriminação, que deve ser garantido o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião, definindo, também, que todos têm direito a condições dignas de trabalho e direito à lazer, à liberdade de locomoção e à residência, podendo deixar seu país e, também, regressar, dentre outros direitos (ONU, 1948). REFLITA Um dos direitos estabelecidos pela Declaração dos Direitos Universais (ONU, 1948) é de que todos seres humanos possuem direito à liberdade de locomoção e à residência dentro das fronteiras de cada Estado, mas que, também, tem direito de deixar seu país e de regressar. Nos últimos anos, países da Europa receberam diversos imigrantes, o que foi considerado por muitos pesquisadores como “crise dos refugiados”. Entende-se como refugiado um imigrante que saiu deseu país de origem, devido a temores ou a perseguições, relacionados à raça, à religião, à nacionalidade, ao grupo social ou à visão política. Grande parte dos refugiados que entrou no continente europeu é da Síria, pois o país tem vivenciado uma guerra civil bastante violenta nos últimos anos. A Organização das Nações Unidas pontua que atualmente estamos vivenciando uma grande crise humanitária, pois trata-se do maior fluxo de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial. Parte da população e dos governantes de países da Europa é contra a entrada dos imigrantes sírios no país, pois teme que o mercado de trabalho seja abalado e ocorra aumento, também, dos gastos públicos para abranger essa população. Como você compreende a entrada de refugiados no continente europeu? Constituição Federal de 1988 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é considerada a Lei suprema do país, ou seja, a normativa legal que deve reger todas as demais leis. É chamada, também, de Constituição Cidadã, por ter sido construída durante o processo de redemocratização do Brasil, após o período do Governo Militar, que durou entre 1964 e 1985. Vale lembrar que durante esse período, ocorreram diversas ações autoritárias, portanto uma redemocratização do Brasil necessitava, também, de discussões com relação à liberdade de expressão: O marco inicial do processo de incorporação de tratados internacionais de direitos humanos pelo Direito Brasileiro foi a ratificação, em 1989, da Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes. A partir desta ratificação, inúmeros outros importantes instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos foram também incorporados pelo Direito Brasileiro, sob a égide da Constituição Federal de 1988 (PIOVESAN, 2008b, p. 95). O principal objetivo da Constituição de 1988 foi de trazer garantias constitucionais no campo dos direitos fundamentais (BRASIL, 1988). Alguns direitos garantidos assemelham-se aos elencados pela Declaração dos Direitos Humanos de 1948, por exemplo, todos serem iguais perante à lei, direito à liberdade de pensamento e crença e que ninguém pode ser submetido à tortura ou a tratamentos desumanos e degradantes (ONU, 1948; BRASIL, 1988). Piovesan (2008b, p. 95) complementa que a partir da Carta de 1988 foram ratificados pelo Brasil: a) a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989; b) a Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990; c) o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992; d) o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992; e) a Convenção Americana de Direitos Humanos, em 25 de setembro de 1992; f) a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995. Outros aspectos que podem ser observados como garantias previstas na Constituição Federal são, por exemplo, o direito à saúde, à educação, à alimentação, ao trabalho, ao transporte, ao lazer, à previdência social, à proteção à maternidade e à moradia, que vêm, ao longo da existência da Carta de 1988, sendo complementados de acordo com as necessidades sociais que o contexto social brasileiro demanda (BRASIL, 1988). ATIVIDADE 2) A Declaração dos Direitos Humanos foi promulgada pela Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 1948 e, atualmente, já foi traduzida para mais de 500 línguas. A esse respeito, observe as afirmativas a seguir. I- A Declaração dos Direitos Humanos foi elaborada no período da Revolução Francesa, desse modo, tem como princípios a igualdade, a fraternidade e a liberdade. II- Todo ser humano, segundo a declaração, tem direito ao trabalho e ao salário. III- De acordo com o documento, todas as pessoas pertencentes a uma sociedade têm direito à política, mas não podem fazer parte no governo de seu país, diretamente. Estão corretas as afirmativas: a) I e II, apenas. b) II, apenas. c) II e III, apenas. d) I, apenas. e) I, II e III POLÍTICAS PÚBLICAS ESPECÍFICAS E INCLUSIVAS Estudamos, anteriormente, a respeito das políticas universais, que visam garantir direitos a todos. Veremos, a partir de agora, acerca das chamadas políticas públicas inclusivas. Os direitos universais, como os propostos pela Declaração dos Direitos Humanos de 1948 e, no Brasil, pela Constituição Federal de 1988, buscam garantir diversas prerrogativas a toda população, como aqueles relacionados à vida, à saúde, à educação, à liberdade de expressão, ao trabalho, à moradia etc. Se já existem essas garantias para todos, porque há necessidade de criar políticas públicas específicas para alguns grupos sociais? Os argumentos que sustentam as políticas públicas específicas e inclusivas são de que a garantia de direitos universais é importante, contudo não é suficiente para fazer com que grupos historicamente excluídos de setores políticos, sociais e econômicos da sociedade, consigam realmente ter acesso a direitos. As diferenças entre grupos sociais, no Brasil, sinalizam a necessidade de políticas públicas específicas. Geralmente, as justificativas para a criação de políticas públicas específicas são construídas por meio de dados estatísticos e de pesquisas acadêmicas de diversas áreas. Em nosso país ainda existem, por exemplo, diversas desigualdades entre diferentes grupos sociais. No território nacional, em 2017, os dados divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (IBGE, 2017), apontaram que a minoria da população (cerca de 10%) tinha 43,3% dos rendimentos do país. O chamado índice Gini é responsável por medir a desigualdade de renda em uma escala de 0 a 1, sendo que, quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade. O Brasil, no ano de 2019, ficou com 0,6257, sendo considerado um país com acentuada desigualdade social. Figura 4.5 - A desigualdade social, no Brasil, é bastante acentuada: a menor parte da população concentra a maior parte da renda Fonte: Sira Anamwong / 123RF. Visando garantir que pessoas em situação de pobreza e de pobreza extrema consigam recursos para sua subsistência mínima, foram criados, pelo Governo Federal, alguns programas sociais, como o Programa Bolsa Família, instituído no ano de 2004, que visa a transferência de renda do Governo Federal, com o intuito de garantir direitos básicos, como alimentação. As famílias que recebem o benefício devem manter crianças e adolescentes, entre seis e 17 anos, frequentando a escola. Outro exemplo de políticas públicas específicas são as cotas para pessoas indígenas em concursos e vestibulares. A Lei 12.711/12, chamada de Lei de Cotas (BRASIL, 2012), foi criada com o intuito de estabelecer normativas com relação à reserva de vagas para alguns grupos sociais. Conforme já estudamos, há políticas públicas que visam a integração de pessoas negras na educação e no mercado de trabalho, como as cotas reservadas para essas populações. Contudo, outros grupos marginalizados, como os indígenas, ainda carecem de maior proteção legal. Desse modo, defende-se a necessidade de garantia de vagas específicas para as populações indígenas. De acordo com o Art. 3°, da Lei 12.711/12, Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art. 1º desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (BRASIL, 2012, on-line). REFLITA Qual é o termocorreto para se referir às populações que já ocupavam o continente americano antes da chegada dos europeus: índios ou indígenas? O termo índio advém de um equívoco histórico, pois, ao aportarem inicialmente na América em seus primeiros contatos, os europeus não se deram conta de que haviam chegado a um continente até então desconhecido para eles e pensaram ter alcançado alguma região do Extremo Oriente, chamada pelos europeus, genericamente, de Índias Orientais. Por conta desse erro, os povos que, em um primeiro momento, estabeleceram contato com as expedições europeias foram batizadas por eles de índios, já que perante a percepção errônea europeia, seriam eles habitantes das Índias. O conceito de indígenas seria um termo mais adequado para se referir às populações americanas pré-colombianas, pois carrega um sentido semelhante à ideia de nativo. No entanto, tal terminologia não é isenta de problemas, porque generaliza em uma mesma categoria uma diversidade enorme de culturas e de populações distintas, tendo por referência a chegada do europeu na América. O elemento identitário que une essas populações é o fato de serem anteriores ao homem europeu no continente americano, apagando as particularidades de uma riqueza cultural extremamente diversa, em uma categoria genérica. As políticas públicas para populações específicas visam a inclusão desse grupo nas sociedades. Entende-se que todos deveriam ter as mesmas garantias, contudo, isso ainda não acontece nos dias atuais porque, historicamente, alguns grupos, por exemplo, pessoas com algum tipo de deficiência, negros e indígenas, tiveram, durante muito tempo, diversos direitos – que hoje são considerados fundamentais –, negados. Não há consenso sobre a melhor definição a respeito de políticas públicas, portanto, não há uma definição única sobre esse conceito. As explicações vão desde um campo de reflexão para a análise de grandes questões públicas, até a soma das atividades de um governo. Conforme Souza (2006, p. 24), “a definição mais conhecida continua sendo a de Laswell, ou seja, decisões e análises sobre política pública implicam responder às seguintes questões: quem ganha o quê, por quê e que diferença faz”. De modo geral, podemos entender políticas públicas, também, como ações governamentais que causam efeitos específicos no cotidiano da população, em áreas de interesse, como a saúde, a segurança ou a educação. Essas políticas públicas específicas visam, portanto, propor enfrentamentos dessas desigualdades e fundamentam-se no princípio da equidade. Enquanto a igualdade entende que todos possuem os mesmos direitos, a equidade propõe que é preciso considerar, ainda, as especificidades na busca pela igualdade. A equidade é um dos princípios básicos do Sistema Único de Saúde (SUS), no qual se entende, por exemplo, que os atendimentos em um hospital devem seguir uma classificação de risco, isto é, o atendimento é definido considerando ordem de chegada, mas, também, urgência e gravidade dos casos. REFLITA Medidas de adoção de políticas públicas, no Brasil, não são necessariamente novidade, e algumas dessas políticas puderam ser observadas ainda na década de 1930, com a instauração do Estado Novo, de Getúlio Vargas, e sua perspectiva nacional desenvolvimentista (FARAH, 2016). É notável, já nesse período, um esforço de construção institucional, a universalização e a profissionalização de serviços públicos (FARAH, 2016). São desse período, por exemplo, a criação de institutos de aposentadorias e pensões, precursores do atual INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e a adoção da obrigatoriedade do ensino primário em todo o território nacional. O vínculo dos direitos civis e sociais se firmava, diretamente, no lugar ocupado no mundo do trabalho. A categoria dos “Trabalhadores do Brasil”, termo usado por Getúlio Vargas para se referir às classes urbanas de carteira assinada, adquiriu garantias reservadas por políticas públicas de assistência social e de valorização do salário no mesmo ritmo em que a complexidade e a modernização da economia e da administração nacional se intensificavam com a CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) de 1943. ATIVIDADE 3) As políticas públicas específicas para determinadas parcelas da população visam promover a inclusão e a igualdade de grupos que historicamente foram excluídos dos setores políticos, sociais e econômicos da sociedade. O Programa Bolsa Família é um exemplo de benefício específico para uma parcela da população brasileira. A esse respeito, assinale a alternativa correta. a) O benefício foi criado na década de 1980, período em que o Brasil vivenciava um processo de redemocratização após o governo militar. b) Um dos principais objetivos do programa é combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional. c) Considerando as especificidades das diferentes regiões brasileiras, o benefício é exclusivo para pessoas que moram nas regiões nordeste e norte. d) Somente possui direito ao benefício pessoas que possuem filhos(as) de até 10 anos de idade e que estejam regularmente matriculadas em escolas. e) O Programa contempla pessoas que tenham renda per capita de até 2 salários mínimos por pessoa. ACESSIBILIDADE, DIFERENÇAS E DEFICIÊNCIAS O termo acessibilidade significa possibilitar o alcance e o uso de espaços, de equipamentos urbanos, de informação e de comunicação a pessoas que possuem mobilidade reduzida ou algum tipo de deficiência. Diferenças e deficiências O processo de luta pelos direitos das pessoas com deficiência e a substituição da representação do deficiente como uma pessoa anormal, considerando as maneiras como a estrutura social segrega corpos que têm outras formas de estar no mundo, intensificou- se durante a década de 1970, com a criação da UPIAS (Union of the Physically Impaired Against Segregation), no Reino Unido, sendo a primeira instituição gestada e comandada por deficientes físicos (DINIZ, 2007). No Brasil, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência ocorreu somente no ano de 2009, após importantes lutas e mobilizações nacionais e internacionais com relação aos direitos das pessoas com deficiências. O tratado construído com a convenção foi incorporado à legislação com marco constitucional (Decreto 6.949/09) (BRASIL, 2009) e trouxe modificações com relação à compreensão da deficiência, superando a compreensão de impedimento com sinônimo de deficiência. Entende-se que o conceito de deficiência é uma construção social e, desse modo, também está em constante modificação. A deficiência é compreendida, conforme consta no Decreto 3.298/99, a partir de cinco principais tipos: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, ostomia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, nanismo [...]; II - deficiência auditiva - perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500HZ, 1.000HZ, 2.000Hz e 3.000Hz; [...] III - deficiência visual - cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60o; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores; [...] IV - deficiência mental - funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidadesadaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização da comunidade; d) utilização dos recursos da comunidade; [...] e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho; V - deficiência múltipla - associação de duas ou mais deficiências (BRASIL, 1999, on-line). Quando dizemos que uma pessoa possui algum tipo de deficiência, é importante nos atentarmos ao fato de que existem diferentes classificações que comprometem diferentes regiões corporais e psíquicas. Além disso, é importante nos atentarmos ao conceito de normalidade, pois as pessoas são enquadradas como deficientes a partir de um “modelo” de ser humano considerado normal. Para Maior (on-line), desde a origem da raça humana, as pessoas se diferem entre si, contudo, com a supervalorização das capacidades físicas, sensoriais e cognitivas, pessoas que possuem algum tipo de limitação com relação a essas capacidades vivenciam diversos preconceitos e exclusões. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5296.htm#art70 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5296.htm#art70 Existem várias medidas a serem adotadas para o combate ao preconceito e à exclusão, como algumas ações pontuais que, ainda que partam da boa vontade de quem as propõe, não integram a totalidade dos direitos das pessoas com deficiência. Pensar sobre a convivência entre pessoas enquadradas com algum tipo de deficiência, por não corresponder a uma “norma” social, física e cognitiva, apesar de atitude louvável, se posta sob caráter imediatista e assistencialista, não possibilitam, de fato, a acessibilidade, e continuam mantendo pessoas com deficiências à margem da sociedade. Pensemos em uma escola na qual as salas de aula ocupam um prédio de três andares. As turmas de ensino médio estudam, geralmente, no andar mais alto, porém, com a matrícula de um aluno cadeirante, a sua turma teve de ser deslocada para o térreo. Ainda que o problema tenha sido amenizado, pontualmente, a estrutura predial da escola continua não contemplando o direito à acessibilidade. Figura 4.6 - As calçadas e as ruas, caso não sigam normas de acessibilidade, podem ser limitações de locomoção para pessoas que utilizam cadeiras de rodas Fonte: Dmitriy Shironosov / 123RF. No início do século XX, conforme Maior (on-line), a deficiência era encarada como uma dificuldade a ser superada, compreendida através do olhar biomédico: No modelo biomédico, considera-se a deficiência como consequência de uma doença ou acidente, que deve ser objeto de tratamento para a habilitação ou a reabilitação do máximo de capacidades, aproximando-se da cura. Este paradigma tem como foco as limitações funcionais que se encontram na pessoa, desconsiderando as condições do contexto social. O modelo biomédico corresponde à integração da pessoa com deficiência à sociedade, situação na qual os esforços de participação são desenvolvidos pela pessoa e sua família, sem que haja mudanças da sociedade (MAIOR, on-line, p. 1). Posteriormente, a deficiência passou a ser vista sob o viés social, sendo relacionada ao conceito de inclusão. Principalmente a partir da década de 1970, o conceito de deficiência passou a ser entendido como um conceito político, em especial, na Europa e nos Estados Unidos, como a marca social da desvantagem que acomete pessoas com diferentes tipos de lesões e não mais enquanto pessoas com problemas e anormalidades (DINIZ, 2007). A partir desse conceito, busca-se propiciar condições de interação entre os indivíduos com algum tipo de limitação e toda a sociedade. Entende-se que as pessoas com deficiência são sujeitos de direito, autônomos e independentes, já que O modelo social visa à transformação das condições sociais, mediante políticas públicas inclusivas. Segundo Sassaki, no modelo social da deficiência cabe à sociedade eliminar todas as barreiras físicas, programáticas e atitudinais para que as pessoas possam ter acesso aos serviços, lugares, informações e bens necessários ao seu desenvolvimento pessoal, social, educacional e profissional (SASSAKI, 2003, apud MAIOR, on-line, p. 2). Atualmente, sob o modelo social aplicam-se, também, as concepções sobre direitos humanos para garantir os direitos das pessoas com algum tipo de deficiência, com relação a diversos campos, por exemplo, transporte, lazer, alimentação, liberdade e autonomia. FIQUE POR DENTRO As mulheres surdas enfrentam dificuldades para denunciar situações de violências, pois, muitas vezes, as instituições que compõem a rede de enfrentamento às violências contra as mulheres, como Centros de Referência e Delegacias da Mulher, não possuem intérpretes de Libras (Linguagem Brasileira de Sinais). A Libras, no ano de 2002, foi considerada língua oficial no Brasil. Além do reconhecimento, a garantia de acessibilidade a pessoas surdas deve vir acompanhada da necessidade de existência de intérpretes ou de profissionais que compreendam a Libras em diferentes instituições de atendimento ao público. Para saber mais sobre dificuldades enfrentadas por mulheres surdas ao buscarem relatar violências, leia a reportagem, disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem- denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes- 23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar &fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2- Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fw>. Acesso em: 18 jun. 2019. Educação inclusiva x educação especial Como vimos com a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Constituição de 1988, a educação é um direito de todos. A partir de agora, estudaremos, brevemente, as principais diferenças entre a proposta da educação inclusiva e da educação especial. A educação inclusiva defende que todos os alunos devem fazer parte da escola comum e pauta-se nos princípios da cidadania e da valorização das diferenças. O ensino- aprendizagem é entendido como um processo social, em que todos fazem parte, ou seja, em que os alunos identificados com algum tipo de deficiência devem, também, estar presentes. A educação é vista como um campo capaz de promover a autonomia e a independência na escola e fora dela. A educação especial é uma modalidade de ensino que busca a promoção do desenvolvimento das potencialidades de pessoas portadoras de necessidades especiais, considerando diferentes níveis e graus do sistema de ensino. Busca possibilitar modalidades de ensino específicas para pessoas com deficiência ou com altas habilidades. https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem-denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes-23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar&fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2-Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fw https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem-denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes-23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar&fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2-Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fw https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem-denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes-23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar&fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2-Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fw https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem-denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes-23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar&fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2-Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fw https://oglobo.globo.com/sociedade/celina/mulheres-surdas-nao-conseguem-denunciar-violencia-domestica-por-falta-de-interpretes-23597017?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar&fbclid=IwAR0iv50Zw9dEF95CUw431U2-Dl7SRGyYFTPjjD7uBn3wuTGf2WhrgXvu1fwA capacitação de profissionais para a atuação na educação especial tem sido tema constante na formação pedagógica em cursos de licenciatura. O desenvolvimento de competências para a adaptação de práticas de ensino e de conteúdos programáticos às demandas de cada aluno, de forma continuada, abre um horizonte de possibilidades maiores de inserção social para estudantes com necessidades especiais. As legislações que embasam a acessibilidade Outro ponto relevante na garantia de direitos básicos para populações com necessidades especiais é a possibilidade de acesso nos mais diversos lugares da sociedade. No Brasil, a acessibilidade é um direito que deve ser garantido por meio de legislações e de políticas públicas. A Constituição Federal Brasileira de 1988, já aborda que todos possuem diversos direitos, contudo não trata somente de assuntos relacionados à inclusão de pessoas com algum tipo de deficiência. No ano 2000, foi promulgada a Lei 10.098/00 (BRASIL, 2000), a primeira a trazer especificamente o tema da acessibilidade. Ela estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. O Decreto 5.296/04 (BRASIL, 2004) reforçou o que estava exposto na Lei 10.098/00 (BRASIL, 2000), abordando o atendimento prioritário a pessoas com algum tipo de deficiência e a necessidade de projetos arquitetônicos e urbanísticos acessíveis. Existe, também, no Brasil, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, chamado, ainda, de Lei Brasileira de Inclusão, que entrou em vigor no ano de 2016. A Lei utilizou como embasamento a Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos das Pessoas com deficiência, que ocorreu nos Estados Unidos, em 2006. A acessibilidade é necessária em diferentes campos, por exemplo, com relação à educação. O Ministério da Educação, com a Portaria nº 20 (BRASIL, 2017), exige a existência de ambientes físicos e digitais acessíveis nas universidades. Adaptando os espaços e os acessos nos ambientes físicos de escolas e de universidades, por exemplo, o exercício da cidadania, por meio da educação de grupos socialmente excluídos, torna-se efetivo, como no caso de pessoas com limitações advindas de lesões. População Idosa Anteriormente, abordamos a acessibilidade em relação a pessoas com algum tipo de deficiência. Discutiremos, agora, algumas questões sobre o tema que envolve as pessoas idosas. O Brasil tem vivenciado aumentos significativos na expectativa de vida nas últimas décadas. Atualmente, a expectativa de vida, no Brasil, é de 72 anos e cinco meses para os homens, e de 79 anos e quatro meses para as mulheres, conforme o Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018). Os dados sinalizam que, entre 1940 e 2016, houve um aumento de 30,3 anos na expectativa de vida dos brasileiros. Com a população mais velha, os debates sobre acessibilidade com relação a pessoas idosas têm aumentado, mas ainda diversos direitos não são garantidos. Figura 4.7 - População idosa Fonte: Mark Bowden / 123RF. O Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741/03, define que as pessoas consideradas idosas devem ter, no mínimo, 60 anos, e estabelece diversos direitos que devem ser garantidos a elas. Ainda, segundo a legislação, é dever da família, da comunidade, da sociedade e do poder público assegurar diversos direitos às pessoas idosas, como à alimentação, à vida, https://br.123rf.com/stock-photo/idoso_negro.html?oriSearch=idoso&sti=nqlx2pe8ujb9fbjzzu%7C&mediapopup=31054808 https://br.123rf.com/stock-photo/idoso_negro.html?oriSearch=idoso&sti=nqlx2pe8ujb9fbjzzu%7C&mediapopup=31054808 à saúde, à moradia, ao lazer, à liberdade, ao trabalho e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 2003). Assim como pessoas com algum tipo de necessidade especial, os idosos possuem prioridade de atendimento, por exemplo, em bancos ou em filas de supermercado, de acordo com a Lei 10.048/00 (BRASIL, 2000). No Art. 38, do Estatuto do Idoso, Lei nº 10.741/03 (BRASIL, 2003), garante-se que, em programas habitacionais, públicos ou subsidiados com recursos públicos, o idoso goza de prioridade na aquisição de imóvel para moradia própria e devem ser eliminadas barreiras arquitetônicas e urbanísticas, para garantia de acessibilidade. ATIVIDADE 4- A Lei Brasileira, promulgada no ano 2000, é um marco na promoção da acessibilidade, pois estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida. A Lei que o texto anterior faz referência é: a) Lei 8.069, também conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente. b) Lei 10.098, conhecida como Lei da Acessibilidade. c) Lei 11.340, chamada, popularmente, de Lei Maria da Penha. d) Lei 10.741, conhecida como Estatuto do Idoso. e) Lei 13.146, chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência. INDICAÇÕES DE LEITURA Nome do livro: Introdução ao Estudo das Políticas Públicas: uma visão interdisciplinar e contextualizada Editora: FGV Editora Autor: Alvaro Chrispino ISBN: 8522517800 Comentário: O livro de Alvaro Chrispino busca trazer considerações sobre o que são políticas públicas, a partir de perspectivas de acontecimentos recentes. A sociedade contemporânea, muitas vezes, não participa do processo de construção de políticas públicas, desse modo, o livro busca demonstrar como diferentes aspectos se articulam no processo de formulação, de execução e de avaliação de políticas públicas. Por abordar olhares interdisciplinares, o livro mostra-se significativo para profissionais de diferentes áreas que, de forma direta ou indireta, lidam com aspectos relacionados às políticas públicos nos seus campos de trabalho. INDICAÇÕES DE FILME Nome do filme: Hoje eu quero voltar sozinho Gênero: Drama e Romance Ano: 2014 Elenco principal: Ghilherme Lobo, Fabio Audi e Tess Amorim Comentário: A história gira em torno de Leo, um adolescente cego, interpretado por Guilherme Lobo, e Gabriel, pelo ator Fabio Audi. Após a entrada de Gabriel no colégio, a vida de Leo passa por diversas mudanças e, assim, o longa mostra as relações de Leo a respeito da sua sexualidade e da identidade. Diversos sentimentos são abordados no filme, como as relações amorosas entre dois meninos, na adolescência, os ciúmes de amigos e alguns dilemas enfrentados no cotidiano escolar. CONCLUSÃO DO LIVRO Em nossa primeira unidade, estudamos a formação da identidade nacional brasileira, e vimos que o que entendemos hoje como ser brasileiro é, também, uma construção que envolve projetos de diferentes épocas da história do Brasil. Além disso, conhecemos o conceito de multiculturalismo, importante para compreendermos e refletirmos as relações entre diferentes culturas em um mundo cada vez mais globalizado. Na segunda unidade, discutimos acerca de aspectos da formação da sociedade brasileira, a partir da perspectiva das relações raciais entre diferentes povos, tendo como embasamento teórico dois importantes pensadores brasileiros, Gilberto Freyre e Florestan Fernandes. Vimos que as relações raciais no Brasil são desiguais e que, com o intuito de diminuí-las, são propostas políticas afirmativas, como as cotas raciais. Na terceira unidade, estudamos identidades, sexualidades e desigualdades de gênero. Vimos que a homofobia, a transfobia e o machismo estão presentes na sociedade brasileira, e diversas pessoas vivenciam violências em decorrência de preconceitos. Conhecemos diferentes tipos de violências contra as mulheres e verificamos políticas públicas que buscam enfrentá-las. Em nossa última unidade, vimos que o Estado tem papel essencial na promoção e na garantia de direitos, mas nós, como sociedade eindivíduos, também somos responsáveis. Conhecemos o que são políticas universais, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e, também, as políticas públicas para grupos sociais específicos, como a Lei 8.096/90, que corresponde ao Estatuto da Criança e do adolescente. Além do mais, estudamos o que é acessibilidade e a importância de sua promoção para a garantia de igualdade de direitos. Como vimos, o livro que estudamos trouxe diversas discussões sobre diversidade, cultura e cidadania. Tratam-se de temas pertinentes para suas formações profissionais, pois toda atuação, independente da área do conhecimento, envolve, de forma direta ou indireta, aspectos éticos. Esperamos que os conteúdos abordados tenham proporcionado novos conhecimentos e reflexões que contribuam para sua formação profissional e pessoal. REFERÊNCIAS ALVES, B. M.; PITANGUY, J. O que é feminismo. São Paulo: Brasiliense, 1985. ALVES, F. O papel do Estado na garantia do direito à educação de qualidade: organização e regulação da educação nacional. Japaratuba: Conferência CONAE, 2010. ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transexuais. Mapa dos assassinatos de travestis e transexuais no Brasil em 2017. Disponível em: <https://antrabrasil.files.wordpress.com/2018/02/relatc3b3rio-mapa-dos-assassinatos- 2017-antra.pdf>. Acesso em: 16 jun. 2019. ARAÚJO, M. de F. Gênero e violência contra a mulher: o perigoso jogo de poder e dominação. Psicologia para América Latina, nº 14, México, 2008. 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