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DELIRIUM Definição: → É um transtorno agudo da atenção e da função cognitiva que pode surgir em qualquer momento durante a evolução de uma doença. → Muitas vezes, o delirium é o único sinal de uma condição médica grave subjacente, sobretudo em pessoas mais velhas e frágeis ou que têm uma demência subjacente. → O delirium, como uma síndrome geriátrica, é inerentemente multifatorial e se desenvolve como resultado de interações entre fatores de risco predisponentes e danos nocivos ou precipitantes. - Fatores de risco: → O principal fator de risco predisponente para o delirium é o comprometimento cognitivo preexistente, especificamente a demência, que aumenta o risco de delirium em 2 a 5 vezes. → Praticamente todas as doenças médicas crônicas podem predispor pessoas mais velhas ao delirium, assim como distúrbios neurológicos e metabólicos específicos. - Achados clínicos: A- Sinais e sintomas: → As principais características temporais do delirium são seu início agudo e a evolução flutuante, durante a qual os sintomas aparecem e desaparecem, ou aumentam e diminuem em gravidade durante um período de 24 horas. Está é a principal característica que distingue o delirium da demência, que se desenvolve gradual e progressivamente durante meses a anos. 1. Alterações cognitivas: Em geral são determinadas por testes cognitivos e, mais importante, por meio da observação clínica rigorosa da qualidade da resposta do paciente. Por exemplo, uma pessoa pode obter uma pontuação correta em uma determinada tarefa cognitiva, mas durante a tarefa pode apresentar flutuações da atenção, distração fácil, discurso incoerente ou letargia. 2. Desatenção: Diminuição da capacidade de se concentrar, manter e desviar a atenção. Por exemplo, os pacientes podem apresentar dificuldade para manter ou seguir uma conversação, perseveram em uma resposta anterior, necessitam de repetição de instruções ou têm dificuldades para seguir instruções em tarefas cognitivas (repetição simples, digit span ou sequência de números, recitação de trás para diante de meses/dias). 3. Pensamento desorganizado: Manifesta-se como pensamentos desordenados e, em caso extremo, discurso incoerente. Problemas de memória, desorientação ou linguagem são frequentes. 4. Alteração do nível de consciência: Variam de estados agitados, vigilantes, a estados letárgicos ou estupor. 5. Outras características: Não são essenciais para o diagnóstico, mas podem ser comumente observadas: agitação ou retardo psicomotor, distúrbios da percepção (p. ex., alucinações, delírios), delírios paranoides, labilidade emocional e distúrbios do ciclo sono-vigília. B- Achados laboratoriais e de imagem: → Não existem exames laboratoriais específicos para a identificação do delirium. → Os exames laboratoriais para avaliação de pacientes delirantes devem incluir hemograma completo, eletrólitos (incluindo cálcio), função renal e hepática, glicose e saturação de oxigênio. Além disso, na pesquisa de uma infecção oculta, devem ser consideradas hemoculturas, culturas de urina, exame de urina e radiografia de tórax. → Quando não se identificam fatores contribuintes específicos em um determinado paciente, podem ser solicitados outros exames ● testes da função da tireoide ● gasometria arterial ● níveis de vitamina B12 ● níveis de doses de medicamentos ● exames toxicológicos ● níveis de cortisol ● uma avaliação do líquido cefalorraquidiano. → Imagens cerebrais com tomografia computadorizada ou ressonância magnética são indicadas quando: ● há história ou sinais de queda recente ● traumatismo craniano ● febre de origem desconhecida ● sintomas neurológicos focais recentes ● ou quando nenhuma causa óbvia foi identificada. → Um eletroencefalograma pode ser indicado para avaliar a presença de atividade convulsiva oculta. Também pode ser usado na diferenciação de delirium de distúrbios psiquiátricos não orgânicos. Geriatria Tainara Withoft Tabela 21.2 - Tratamento farmacológico e não farmacológico do delirium NÃO FARMACOLÓGICO (por fator de risco/fator precipitante) INTERVENÇÃO DIRECIONADA FARMACOLÓGICO - INTERVENÇÃO DIRECIONADA: Privação de sono - Protocolo do sono (massagem das costas, técnicas de relaxamento, música calmante, redução da luz e ruídos, leite morno ou chá de ervas sem cafeína, quarto privativo, redução dos controles de sinais vitais (procedimentos/administração de medicamentos durante a noite) - Evitar o uso de sedativos, especialmente a difenidramina - Manter o ciclo de sono-vigília NEUROLÉPTICOS: Típicos: - Haloperidol (Haldol): → Prós: Aprovados/testados, apresentações IV/intramuscular, orais, teoricamente menos efeitos sobre o intervalo QT, ideais do ponto de vista farmacocinético → Contras: Sedação, hipotensão, distonia aguda, sintomas extrapiramidais, efeitos colaterais anticolinérgicos (boca seca, constipação, retenção urinária, confusão), piora da rigidez parkinsoniana → Dose de ataque: 0,25-1 mg a cada 20-30 minutos até o paciente se tornar manejável. Dose diária máxima de 3-5 mg. Pico de efeito em 4-6 horas (oral), 20 minutos após administração intramuscular/intravenosa → Dose de manutenção: Dose de ataque dividida em 2, administrada a cada 12 horas: reduzir durante 2-3 dias → Cuidados: Receptores dopaminérgicos D2 ficam saturados com doses baixas. Assim, > 5 mg/24 horas não têm benefício clínico, somente aumentam o dano Desidratação - Reconhecimento da depleção de volume e reposição de líquidos Perda auditiva - Próteses auditivas apropriadas ou amplificadores disponíveis e em uso Perda visual - Fornecimento de recursos visuais adequados (óculos do próprio paciente, lentes de aumento ou equipamento adaptado) Imobilidade - Deambulação o mais cedo possível (assistência ou supervisão quando necessário) - Sair da cama e sentar na cadeira durante as refeições - Exercícios ativos para a amplitude dos movimentos se estiver restrito ao leito - Envolver o paciente em seus cuidados (ida ao banheiro, escovar o cabelo, vestir-se) - Minimizar as linhas de acesso e drenos (telemetria, acesso intravenoso, cateteres vesicais) Comprometimento Cognitivo - Orientação frequente quanto a pessoa, espaço e tempo - Cartaz grande para orientação, calendários, relógios - Presença da família, quarto individual, próximo ao posto de enfermagem - Envolver os pacientes nas decisões e higiene diária - Contato visual durante as interações Atípicos: - Olanzapina (Zyprexa, Zydis): → Prós: Menos sintomas extrapiramidais, apresentação como comprimidos dissolúveis → Contras: O aumento dos efeitos colaterais anticolinérgicos pode piorar a confusão, prolongamento potencial do intervalo QT → Dose inicial: 2,5-5 mg. Repetir em 20 minutos, se necessário Medicamentos (sedativos ou psicoativos) - Usar medicamentos alternativos e menos prejudiciais - Evitar medicamentos com meias-vidas longas - Levar em consideração funções hepática e renal deficientes - Reduzir e suspender medicamentos - Quetiapina (Seroquel): → Prós: O efeito sedativo ajuda a manter o ciclo sono-vigília → Contras: Apresentação oral somente, prolongamento do intervalo QT → Dose inicial: 6,25-12,5 mg Geriatria Tainara Withoft desnecessários - Critérios de Beers da American Geriatrics Society 2012: ● Todos os antidepressivos tricíclicos ● Anticolinérgicos ● Benzodiazepínicos ● Corticosteróides ● Antagonistas do receptor H2 ● Sedativos hipnóticos ● Meperidina/clorpromazina/tioridazina - Risperidona (Risperdal)/Ziprasidona (Geodon) → Prós: O efeito sedativo ajuda a manter o ciclo sono-vigília, apresentações oral e intramuscular → Contras: Pode ser excessivamente sedativo, prolongamento do intervalo QT, discinesia tardia - Benzodiazepínicos: → Prós: Usadas para abstinência alcoólica e de sedativos: lorazepam (Ativan) é o benzodiazepínico de escolha em decorrência da meia-vida reduzida, sem metabólito ativo, apresentado na versão intravenosa → Contras: Geralmente não são recomendadas em decorrência de excesso de sedação, pioram a confusão → Dose inicial: 0,25-0,5 mg C. Exame físico: → Muitas vezes, o delirium pode ser a manifestaçãoinicial de uma doença grave subjacente em uma pessoa idosa; assim, a observação atenta buscando por sinais no exame físico pode permitir um diagnóstico precoce de uma patologia precipitante. → Uma pesquisa cuidadosa por evidências de infecções ocultas deve ser realizada, incluindo os sintomas de pneumonia, infecção do trato urinário, processos abdominais agudos, infecções articulares ou sopro cardíaco de instalação recente. → Um exame neurológico detalhado, com atenção a sinais focais ou lateralizados, também é fundamental. D. Exames especiais: 1. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais IV-Texto Revisado (DSM-5): As diretrizes DSM-5 foram desenvolvidas com base na opinião de especialistas, e continuam sendo o padrão para a definição e critérios diagnósticos do delirium. 2. Método de avaliação da confusão (Confusion Assessment Method [CAM]): É uma ferramenta simples, validada atualmente e bastante usada. Essa ferramenta tem sensibilidade de 94 a 100%, especificidade de 90 a 100%, e valor preditivo negativo de 90 a 100% para o delirium. Tabela 21-3 Critérios diagnósticos CAM para delirium (a) 1. Início agudo e evolução flutuante. Essa característica baseia-se em respostas positivas de um membro da família ou enfermeiro às seguintes perguntas: Existe evidência de uma mudança aguda no estado mental basal do paciente? O comportamento (anormal) flutua durante o dia; isto é, tende a aparecer e desaparecer ou sua gravidade aumenta e diminui? 2. Desatenção. Essa característica baseia-se na observação de uma dificuldade de focalizar a atenção (p. ex., pode ser facilmente distraído ou tem dificuldade em seguir o que estava sendo dito). 3. Pensamento desorganizado. Essa característica baseia-se na observação de pensamento desorganizado ou discurso incoerente, como pensamento errático ou irrelevante, fluxo de ideias pouco claro ou ilógico, mudança imprevisível de assunto. 4. Nível de consciência alterado. Essa característica baseia-se na presença de um nível de consciência outro que não o “alerta”. Tal alteração do nível de consciência pode ser vigilante (hiperalerta) ou vários níveis de estados hipoalertas, como letargia (sonolento, facilmente despertável), estupor (dificuldade de despertar) ou coma (não despertável). (a) o diagnóstico de delirium requer a presença das características 1 e 2, ou 3 e 4. As classificações de CAM devem ser concluídas após a revisão do prontuário médico, discussão com um membro da família ou enfermeiro, e uma breve avaliação cognitiva do paciente (p. ex., usando um exame cognitivo breve, como orientação, lembrar de palavras e o teste Digit Span). - Diagnóstico diferencial: → O principal dilema diagnóstico para o clínico é a diferenciação entre delirium e demência. Isso é especialmente difícil quando a função cognitiva basal é desconhecida ou quando existem déficits cognitivos conhecidos, e quando é necessário determinar se a condição atual é causada por um comprometimento cognitivo crônico subjacente ou pelo delirium. ● Distúrbios de atenção e alteração do nível de consciência em geral não são características de demência leve a moderada, e sua presença apoia o diagnóstico de delirium. ● Em pacientes com demência conhecida, uma história que inclui piora da confusão acima e abaixo do comprometimento cognitivo basal também sugere delirium. →Outros diagnósticos importantes que devem ser diferenciados de delirium são: ● depressão, mania e outros transtornos psicóticos não orgânicos, como a esquizofrenia. - Prognóstico → Tradicionalmente, o delirium tem sido descrito como uma síndrome reversível, o que implica que os pacientes invariavelmente retornam ao seu estado cognitivo e funcional basal. → Clinicamente, no entanto, o delirium nem sempre é transitório, e pode resultar em déficits cognitivos e funcionais a longo prazo. → Depois do delirium, alguns pacientes desenvolvem queixas subjetivas de memória e apresentam uma redução no desempenho em testes cognitivos. Esses achados de pesquisa sugerem que os processos patológicos associados com o delirium podem estar associados com danos neurológicos diretos e persistentes. → Além disso, os pacientes que desenvolvem delirium parecem ter uma probabilidade maior de receberem um diagnóstico de demência depois de algum tempo. Parece que o delirium aumenta o risco de desenvolver demência e pode acelerar a taxa de progressão para uma demência. Assim, o delirium pode, de fato, alterar a trajetória do declínio cognitivo em indivíduos idosos Geriatria Tainara Withoft DEMÊNCIA - Definição: → Demência refere-se a um processo de doença marcado pelo declínio cognitivo, mas com clareza de consciência. → A demência não se refere a um baixo funcionamento intelectual, nem retardo mental, porque estas são condições de desenvolvimento e estáticas, e os déficits cognitivos na demência representam um declínio de níveis anteriores de funcionamento. → A demência envolve múltiplos domínios cognitivos, e déficits cognitivos causam prejuízo significativo no funcionamento social e profissional. → O transtorno pode ser progressivo ou estático; permanente ou reversível. Presume-se sempre uma causa subjacente, embora, em casos raros, seja impossível determinar uma causa específica. - Epidemiologia: → A prevalência da demência dobra aproximadamente a cada 5 anos após os 60 anos de idade. → Entre idosos com mais de 85 anos de idade e residentes na comunidade, a prevalência é estimada em 25 a 45%. A prevalência é ainda maior em clínicas geriátricas (> 50%). → Cerca de 60 a 70% dos casos de demência podem ser atribuídos à doença de Alzheimer (DA); demência com corpos de Lewy (DCL) e demência vascular (DV) são as outras formas mais comuns de demência. → Além disso, uma porcentagem significativa de pacientes apresenta doença mista (DA e DV ou DV e DCL). A demência frontotemporal (DFT) é uma forma mais recentemente reconhecida, cuja prevalência ainda é incerta. - Achados clínicos: A. História do paciente: → A história é a parte mais importante da avaliação de um paciente com possível comprometimento cognitivo ou demência. → Quando se permite que o paciente forneça a sua versão da história, também é possível avaliar sua memória recente e remota. Perguntas sobre sua história médica e cirúrgica, bem como sobre os medicamentos tomados atualmente, podem ajudar a avaliar sua memória recente e remota. → Como a história obtida a partir de um paciente com déficit cognitivo pode ser incompleta e incorreta, é fundamental obter também a história por meio de um membro da família, cuidador ou outra fonte. ● A história deve se concentrar no tempo decorrido desde o início dos sintomas, se o início foi gradual ou abrupto e a taxa e natureza de sua progressão (passo a passo ou declínio contínuo). ● As áreas específicas nas quais é preciso se concentrar incluem a capacidade do paciente para aprender coisas novas (o uso de um micro-ondas ou um controle remoto), problemas de linguagem (encontrar palavras ou falta de conteúdo), problemas com tarefas complexas (o controle de seu talão de cheques, o preparo de uma refeição), habilidade espacial (perder-se em lugares familiares) e alterações da personalidade, problemas comportamentais ou sintomas psiquiátricos (delírios, alucinações, paranoia). → Isso deve incluir uma avaliação das atividades da vida diária (AVDs) e das atividades instrumentais da vida diária (AIVDs), por exemplo, cozinhar, fazer limpeza, fazer compras, cuidar das finanças, usar o telefone, controlar os medicamentos e dirigir ou conseguir transporte). Além disso, o médico deve avaliar a situação familiar e social do paciente, porque a informação obtida pode ser decisiva para a elaboração de um plano de tratamento. → É importante obter uma história medicamentosa detalhada, bem como uma história das condições comórbidas, incluindo sintomas de depressão, uso de álcool e outras substâncias. Embora causas potencialmente reversíveis de demência sejam responsáveis por < 1% dos casos, uma grande parte do trabalho diagnóstico é dirigida para a identificaçãoe o tratamento delas. Tabela 22-1 Elementos-chave da história e do exame físico - História - Duração dos sintomas e natureza da progressão dos sintomas - Presença de sintomas específicos relacionados a ● Memória (recente e remota) e aprendizado ● Linguagem (problemas para encontrar palavras, dificuldades de auto-expressão) ● Habilidades visuoespaciais (perdendo-se) ● Funcionamento executivo (cálculos, planejamento, execução de tarefas de múltiplos passos) ● Apraxia (não é capaz de realizar tarefas previamente aprendidas, p. ex., cortar uma fatia de pão) ● Alterações comportamentais e da personalidade ● Sintomas psiquiátricos (apatia, alucinações, delírios, paranóia) - Avaliação funcional (AVDs e AIVDs) - AVDs, atividades da vida diária; AIVDs, atividades instrumentais da vida diária. - Avaliação do suporte social - História médica, comorbidades - Revisão abrangente da medicação, incluindo medicamentos vendidos sem receita médica e fitoterápicos - História familiar - Revisão de sistemas, incluindo rastreamento para depressão e abuso de álcool/drogas - Exame físico - Exame cognitivo - Exame físico geral, com atenção especial para ● Exame neurológico procurando por achados focais, sinais extrapiramidais, avaliação da marcha e do equilíbrio ● Exame cardiovascular ● Sinais de abuso ou negligência - Triagem para comprometimentos da audição e visão Geriatria Tainara Withoft B. Sinais e sintomas: 1. DOENÇA DE ALZHEIMER: → A tríade clássica dos achados na DA: ● comprometimento da memória, manifestado pela dificuldade de aprendizagem e recordação da informação (principalmente de novas informações) ● problemas visuoespaciais ● comprometimento da linguagem que, em combinação, são graves o suficiente para interferir com o funcionamento social ou ocupacional. → Classicamente, pacientes com DA têm pouca ou nenhuma noção de seus déficits, o que pode ser o resultado do comprometimento de sua função executiva (planejamento, noção e julgamento). → No início da evolução da doença, os pacientes com DA mantêm seu funcionamento social e a capacidade de realizar tarefas familiares aprendidas, mas muitas vezes têm dificuldades com tarefas mais complexas, como administrar um talão de cheques ou tomar decisões complexas. → A desorientação é comum em pacientes com DA e costuma começar com desorientação em relação ao tempo, espaço e, por fim, em relação à pessoa. → Os pacientes desenvolvem um distúrbio de linguagem progressivo, que começa sutilmente como uma afasia anômica e, finalmente, progride para afasia fluente e, então, para o mutismo nos estágios finais da doença. → Os pacientes têm dificuldade com tarefas visuoespaciais e podem ter propensão a se perder, mesmo em ambientes familiares. → A doença é lentamente progressiva e os pacientes apresentam um declínio contínuo na sua capacidade de permanecer independentes. → Alterações comportamentais são comuns na DA, bem como em todos os subtipos de demência, e nenhum sintoma neuropsiquiátrico ou perturbação comportamental é patognomônico → Alterações iniciais podem se manifestar por meio de apatia e irritabilidade (≤ 70% dos pacientes) e depressão (30 a 50% dos pacientes) → A agitação se torna mais comum à medida que a doença progride e pode ser notada principalmente em relação a questões de higiene e vestuário. → Os sintomas psicóticos, como delírios, alucinações e paranoia, também são comuns, afetando até 50% dos pacientes com estágios moderados a avançados da doença. 2. DEMÊNCIA COM CORPOS DE LEWY: → A DCL é a 2º forma mais comum de demência depois da DA, afetando 20 a 30% dos pacientes com demência. → As principais características da DCL são: ● parkinsonismo ● flutuação do déficit cognitivo ● alucinações visuais. → A presença de 1 dessas características sugere possível DCL, e a presença de 2 a 3 características sugere provável DCL. → Distúrbio do sono REM (movimentos oculares rápidos) e grave sensibilidade a antipsicóticos são sugestivos de DCL, enquanto insuficiência autonômica, síncope e depressão são características adicionais. Esses sintomas devem ocorrer na ausência de outros fatores que possam explicá-los. → Em pacientes com DCL, o parkinsonismo costuma se apresentar mais tarde ou simultaneamente com o início da demência. Isso difere da demência relacionada com a doença de Parkinson (DP), que em geral ocorre mais tarde na doença. ● Na DCL, o parkinsonismo se manifesta primariamente com rigidez e bradicinesia; o tremor é menos comum (< 10 a 25% dos pacientes em grandes séries). ● O desenvolvimento do parkinsonismo em estágios finais de uma demência não é específico para DCL, porque muitos pacientes com DA avançada também desenvolvem aumento do tônus, bradicinesia e tremor. → Início insidioso e é progressiva, embora classicamente tenha uma qualidade flutuante diuturna. ● A flutuação pode ser observada no nível de alerta, funcionamento cognitivo e estado funcional. → Na fase inicial, os déficits de memória e linguagem são menos proeminentes do que na DA. → As habilidades visuoespaciais, a velocidade de resolução de problemas e a velocidade de processamento, por sua vez, estão significativamente mais comprometidas do que na DA no mesmo estágio. → Alucinações visuais ocorrem em 60 a 85% dos pacientes com DCL confirmada em necropsia, em comparação com 11 a 28% dos pacientes com DA confirmada por necropsia. ● As alucinações são classicamente muito vívidas e com frequência envolvem animais, pessoas ou objetos místicos. ● Ao contrário da psicose verdadeira, muitos dos pacientes com DCL são capazes de distinguir as alucinações da realidade e, inicialmente, não chegam a ser perturbados por elas. → Aconselha-se prudência no uso de medicamentos antipsicóticos, pois os pacientes com DCL são especialmente sensíveis a neurolépticos, podendo ocorrer uma piora dramática dos sintomas extrapiramidais. Os neurolépticos não devem ser administrados como um teste diagnóstico, pois foram relatados óbitos em pacientes com DCL. 3. DEMÊNCIA VASCULAR: → Em geral, o diagnóstico baseia-se na presença de evidências clínicas ou radiográficas de doença cerebrovascular em um paciente com demência. → Uma demência com início súbito após um acidente vascular encefálico (AVE), ou um início gradual, mais do que contínuo, apoia o diagnóstico no contexto de AVEs e achados neurológicos focais ao exame. No entanto, como uma porcentagem considerável de pacientes apresenta doença vascular subcortical, a evolução pode parecer ser mais gradual. → Além disso, muitos pacientes apresentam demência mista, DA e DV, e subitamente uma doença não vascular, leve e progressiva, pode ser desmascarada em decorrência de um AVE. → Os distúrbios de memória na DV costumam ser menos graves do que na DA. → Os pacientes com DV têm memória prejudicada, mas tendem a ter um melhor reconhecimento e se beneficiam de sinalização, diferente dos pacientes com DA. → No exame neuropsiquiátrico formal podem ser encontrados déficits “desiguais”, muitas vezes com dificuldades em tarefas aceleradas e em testes da função executiva. Assim como na DA, sintomas psicológicos e comportamentais são comuns. A depressão pode ser mais grave em pacientes com DV. 4. DEMÊNCIA FRONTOTEMPORAL (DFT): → A DFT se desenvolve em uma idade relativamente nova (a média de idade de início é 50 anos). → Estima-se que a DFT seja responsável por cerca de 25% das demências pré-senis. Geriatria Tainara Withoft → Existe uma variante comportamental (antes conhecida como doença de Pick), e uma variante da linguagem, que inclui afasia primária progressiva e demência semântica. → A variante comportamental da DFT (vcDFT) é caracterizada por alterações precoces na personalidade e no comportamento, com preservação relativa da memória, sendo com frequência diagnosticada erroneamente como transtorno psiquiátrico. No entanto, alguns sintomas são altamente específicos para vcDFT (p. ex., 97 a 100% apresentam hiperoralidade, alterações precoces na personalidade e no comportamento, perda precoce da consciência social [desinibição], comportamentos compulsivosou repetitivos, redução progressiva na fala [precocemente], enquanto as habilidades visuoespaciais são poupadas), podendo ser confiavelmente distinguida da DA. → A hiperoralidade pode ser manifestada por alterações acentuadas na preferência alimentar (alimentos tipo fast food e carboidratos) ou, simplesmente, excessos alimentares. → Outro aspecto interessante é que alguns pacientes com DFT desenvolvem talentos artísticos, sem ter tido qualquer interesse prévio. → Testes cognitivos em pacientes com DFT podem revelar pontuações normais no Mini-Exame do Estado Mental (MEEM) no início da doença. → Testes neuropsiquiátricos mais formais revelam déficits em tarefas do sistema frontal, como fluência verbal, abstração e funcionamento executivo, e esses déficits são observados mais cedo do que em um paciente típico com DA. → Em contraste com os pacientes com DA, os pacientes com DFT tendem a apresentar habilidades visuoespaciais preservadas e memória relativamente conservada, sobretudo a memória de reconhecimento. Nota: Exame de imagem: atrofia assimétrica do lobo frontal ou temporal ATENÇÃO: DFT: 1- Variante comportamental (+ comum) ● variante de linguagem 2- A- Variante de linguagem - semântica: paciente fala, mas não entende o que digo pra ele >> atrofia da região frontal superior à esquerda 2- B- Variante de linguagem - agramática/não fluente: paciente não fala, mas entende o que falo >> apraxia de fala >> atrofia fronto insular posterior a esquerda 5- OUTRAS DEMÊNCIAS: → Muitas outras doenças estão associadas com comprometimento cognitivo e demência, como Doença de Parkinson (DP) e seus distúrbios relacionados, doença de Huntington (DH), infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) e alcoolismo. → Cerca de 30% dos pacientes com DP desenvolvem demência. Isso costuma ocorrer tardiamente na evolução da DP, e se caracteriza pela lentidão do processamento mental, distúrbios da recordação (com memória de reconhecimento em geral preservada), disfunção executiva e problemas visuoespaciais. → A DH é uma doença autossômica dominante rara, caracterizada por comprometimento motor (coreia, distonia) e deficiências comportamentais e cognitivas. Com os avanços no tratamento do HIV e o aumento do número de sobreviventes a longo prazo, o comprometimento neurocognitivo associado com o HIV (HAND, ou HIV-associated neurocognitive disorder) deve ser considerado no diagnóstico diferencial de comprometimento cognitivo. → Embora o abuso crônico de álcool prejudique o funcionamento cognitivo, há controvérsias quanto à existência de uma síndrome demencial verdadeira relacionada ao álcool (não associada com deficiência de tiamina e traumatismo craniano), em parte porque não existem estudos em grande escala. 6. DOENÇA AVANÇADA E DOENÇA EM ESTÁGIO TERMINAL: → Os sintomas avançados da maioria das demências parecem ser semelhantes e, em estágios finais, é quase impossível distinguir entre os diferentes tipos de demência. → Na demência avançada (em geral com uma pontuação < 10 no MEEM), as competências linguísticas estão significativamente prejudicadas. Pode haver um discurso pouco significativo, e a compreensão está gravemente comprometida. Alguns pacientes podem progredir até o mutismo. Pacientes com demência avançada apresentam dificuldade progressiva, mesmo com as AVDs mais básicas, como a alimentação, e podem progredir a ponto de apresentarem incontinência vesical e intestinal, tornando-se completamente dependentes em todas as AVDs. Os sintomas de parkinsonismo, como a rigidez, são comuns. A marcha está prejudicada e, por fim, os pacientes deixam de andar, permanecendo presos ao leito. Ocasionalmente, podem ser observadas crises convulsivas em pacientes com demência em estágio final. Os pacientes que não morrem em decorrência de outras comorbidades tendem a desenvolver complicações concomitantes (p. ex., desnutrição, úlceras de decúbito, infecções recorrentes). A causa mais comum de óbito na demência avançada é a pneumonia. C. Exame do estado físico e mental: → O exame neurológico deve ser dirigido para a identificação de evidências de AVEs anteriores, como sinais focais, e de parkinsonismo, como rigidez, bradicinesia ou tremor, tendo em mente que na demência avançada um tônus aumentado e reflexos vivos não são específicos. → A marcha e o equilíbrio são uma parte importante do exame e devem ser avaliados rotineiramente. → Uma avaliação cardiovascular cuidadosa, incluindo a determinação da pressão arterial e pesquisa de doença carotídea e vascular periférica, pode ajudar a apoiar o diagnóstico de DV. → Alguns pacientes sem demência e com deficiências auditivas ou visuais significativas podem apresentar um comportamento que sugere demência, com uma pontuação baixa no teste de estado mental. Portanto, é importante identificar e, se possível, corrigir as possíveis deficiências sensoriais antes de diagnosticar uma demência. D. Testes de triagem: 1. Mini-Exame do Estado Mental: → O MEEM, uma ferramenta de 30 pontos que testa orientação, memória imediata, atraso da memória, concentração/cálculo, linguagem e áreas visuoespaciais, foi o teste de triagem mais amplamente usado para a cognição. → O MEEM, como muitos testes de triagem, é um teste cultural e de linguagem tendencioso, devendo ser feitos ajustes por idade e nível de escolaridade. Quando as pontuações são ajustadas para idade e nível educacional, o MEEM tem alta sensibilidade e especificidade para a detecção da demência (82 e 99%), respectivamente. → Como o teste é aplicado verbalmente e os pacientes são convidados a escrever e desenhar, deficiências visuais e auditivas ou outras deficiências físicas podem invalidar em parte a pontuação. → Um paciente com comprometimento cognitivo precoce pode pontuar dentro dos limites da normalidade para a idade e escolaridade; no entanto, se o teste for repetido a cada 6 a 12 meses, Geriatria Tainara Withoft o MEEM é capaz de detectar um declínio cognitivo e sugerir um diagnóstico de CCL ou demência. → Entre os pacientes com DA, as pontuações do MEEM caem em média 3 pontos por ano, enquanto para as pessoas com CCL, 1 ponto por ano é mais comum. → Em pacientes que estão envelhecendo normalmente, as pontuações do MEEM não devem diminuir muito de ano para ano. → Como diretriz geral: ● pontuação acima de 26 é normal ● pontuações de 24 a 26 podem indicar CCL ● pontuação < 24 é consistente com demência. Contudo, é melhor comparar a pontuação de cada paciente com as pontuações medianas ajustadas para a idade e escolaridade, para monitorar se houve uma alteração, além de avaliar o declínio funcional. 2. Montreal Cognitive Assessment: → O Montreal Cognitive Assessment (MOCA) está sendo preferido como teste de triagem para comprometimento cognitivo. → Semelhante ao MEEM, o MOCA também é um teste de triagem de 30 pontos que avalia diversas áreas cognitivas incluindo a memória (com uma tarefa de evocação de cinco palavras), orientação, função visuoespacial, concentração, cálculo, atenção, abstração, linguagem e função executiva (que não é levada em consideração no MEEM). → Esse teste é mais sensível do que o MEEM, sobretudo para a detecção de CCL. → O formulário mostra uma nota de corte de 26 (25 ou menos indicam comprometimento), mas esse valor provavelmente é muito alto para a maioria das populações dos Estados Unidos, por exemplo. → Os resultados do teste são altamente influenciados pelo nível educacional. 3. Mini-cog: → Foram feitas várias tentativas de se criar ferramentas de rastreamento simples, direcionadas e mais rápidas do que o MEEM. → 2 testes bastante usados são o Clock Draw Test (CDT) e o 3-Item Recall: quando usados em conjunto, recebem o nome de “Mini-cog”. ● No Mini-cog, pede-se que o paciente desenhe um relógio com os ponteiros definidos para um determinado horário. ● Existem vários CDTs, cada um com um sistema de pontuação diferente. No entanto, há evidências que sugerem que uma dicotomia simples entre relógios normais e anormais tem uma boa sensibilidade (cerca de 80%) para a detecção de demência, mesmo paraavaliadores inexperientes. ● Relógios normais têm todos os números na posição correta e os ponteiros estão posicionados corretamente para exibir o horário solicitado. → A utilização do Mini-cog é rápida e fácil e, se ambos são normais, ele exclui a demência. → O Mini-cog pode ser particularmente útil em pacientes com baixa escolaridade e em pacientes que não falam inglês, para os quais o MEEM não é tão útil. E. Avaliação cognitiva: → A avaliação cognitiva de um paciente com comprometimento cognitivo ou demência deve ser feita juntamente com o exame físico. → Além da utilização de uma ferramenta de avaliação padronizada como o MEEM ou MOCA, os prestadores de serviço também devem avaliar áreas de funcionamento cognitivo que não são bem avaliadas pelo MEEM ou MOCA, como julgamento e discernimento. → O diagnóstico de demência requer a existência de comprometimento em 2 ou mais funções cognitivas como memória, linguagem, função visuoespacial e funcionamento executivo. ● A linguagem pode ser avaliada simplesmente ouvindo, procurando por uma falta de conteúdo no diálogo do paciente ou o uso de termos vagos para substituir substantivos, como “coisa” ou “isso”. ● Pedir que o paciente nomeie objetos comuns na sala pode ser útil caso a linguagem pareça ser normal. ● Evidências de comprometimento do funcionamento executivo muitas vezes são descobertas pela história e também podem ser avaliadas durante o exame. Por exemplo, se o paciente não é capaz de descrever de forma detalhada uma função complexa, que o paciente normalmente faz (ou fazia), é possível que exista um problema com o funcionamento executivo. F. Achados laboratoriais: → Na avaliação de um paciente com comprometimento cognitivo ou demência recentemente diagnosticada, os exames laboratoriais em geral são usados para excluir causas potencialmente tratáveis de demência. → A deficiência de vitamina B12 e o hipotireoidismo são comuns em adultos mais velhos e podem afetar o funcionamento cognitivo. O tratamento dessas condições é justificado, embora poucos casos de demência sejam realmente causados por (ou melhorados com o tratamento de) deficiência de vitamina B12 ou hipotireoidismo. → A maioria dos médicos também irá solicitar um hemograma completo, eletrólitos, creatinina, glicose, cálcio e testes de função hepática. → Deve-se pesquisar sífilis latente e HIV caso exista um alto índice de suspeita dessas condições G. Imagem: → A tomografia computadorizada (TC) e a ressonância magnética (RM) de rotina na avaliação de pacientes com demência permanecem controversas, mas em geral recomenda-se que seja feita uma TC sem contraste ou uma RM não contrastada na avaliação de comprometimento cognitivo para excluir causas tratáveis de demência, como hematoma subdural, hidrocefalia de pressão normal e tumor. Além de procurar por lesões estruturais, a imagem pode ser útil no diagnóstico da demência não DA. → A RM é mais sensível para alterações vasculares e determinações do volume do hipocampo. → Os exames de neuroimagem provavelmente apresentam um baixo rendimento em pacientes com um quadro clínico típico de DA e sintomas que estão presentes por mais de 1 a 2 anos. As vantagens e desvantagens dos exames de neuroimagem podem ser discutidas com os pacientes e seus familiares. → Os exames de imagem para DV também são inespecíficos, pois muitos pacientes idosos apresentarão algum grau de doença vascular isquêmica na TC ou RM. Na verdade, aos 85 anos de idade, cerca de 100% dos pacientes apresentarão sinais hiperintensos em exames de imagem. Portanto, a simples evidência de doença vascular não justifica o diagnóstico de DV. No entanto, se houver doença extensa, infartos múltiplos ou infartos em localizações anatômicas importantes (p. ex., no tálamo) em um paciente com história ou achados neuropsicológicos consistentes com DV, é provável que os achados de imagem sejam clinicamente relevantes. Na DFT existe classicamente uma perda de volume assimétrica dos lobos frontal e temporal anterior, em comparação com a atrofia global observada na DA. Geriatria Tainara Withoft → A tomografia por emissão de pósitrons com fluorodeoxiglicose (FDG-PET) avalia o metabolismo da glicose em áreas cerebrais específicas e pode ser útil na distinção da DA precoce da DFT ou DCL. ● Embora a FDG-PET tenha demonstrado melhorar a precisão diagnóstica da DA confirmada pela patologia, ela não é considerada padrão para o diagnóstico da DA e, em geral, não é necessária para fechar o diagnóstico. ● O exame não é recomendado como teste de triagem para indivíduos assintomáticos, em parte porque até 30% dos idosos “normais” do ponto de vista cognitivo têm exame positivo para amiloide cerebral, e porque no momento não há nenhum tratamento capaz de retardar ou prevenir o aparecimento de sintomas. H. Testes e exames especiais 1. Testes neuropsicológicos: O teste neuropsicológico costuma ser realizado por neuropsicólogos e consiste em uma bateria de exames abrangentes e padronizados, que testam diversas áreas cognitivas, incluindo inteligência, memória, linguagem, habilidades visuoespaciais, atenção, raciocínio e resolução de problemas, bem como outras medidas da função executiva. O diagnóstico de demência geralmente pode ser feito pela obtenção de uma história detalhada e pelo exame físico (incluindo uma breve avaliação cognitiva) e não exige testes neuropsicológicos. No entanto, existem casos nos quais um encaminhamento para testes neuropsicológicos formais pode ser de particular importância (p. ex., quando os pacientes têm sintomas precoces ou leves, sobretudo quando têm uma grande inteligência pré-mórbida e estão desempenhando “normalmente” ferramentas como o MEEM). Os testes neuropsicológicos também podem ser úteis em pacientes menos inteligentes e com baixa escolaridade, bem como em pacientes com depressão, esquizofrenia ou outra doença psiquiátrica na qual pode ser difícil determinar a condição que está contribuindo para os déficits cognitivos aparentes. Da mesma forma, em pacientes com características atípicas, como comprometimento precoce da linguagem, os testes neuropsicológicos podem ser úteis no diagnóstico diferencial de um tipo incomum de demência. Além disso, uma bateria mais abrangente de testes cognitivos é capaz de identificar questões relativas que podem ser importantes para os pacientes e seus cuidadores, podendo ser útil para o estabelecimento de uma linha de base, a partir da qual podem ser feitas reavaliações. 2. Kohlman Evaluation of Living Skills: A Kohlman Evaluation of Living Skills (KELS), geralmente aplicada por terapeutas ocupacionais, avalia a capacidade do paciente para realizar tarefas necessárias para uma vida independente e segura. Por exemplo, pede-se que o paciente preencha um cheque para pagamento de uma fatura falsa, use o telefone ou identifique situações perigosas em fotos e diga o que ele faria naquele caso. Essa avaliação pode ser útil quando um paciente com demência conhecida ou suspeita de demência vive sozinho e quando é preciso decidir sobre a necessidade de transferir o paciente para um ambiente mais supervisionado, como moradia assistida. 3. Exame genético: Houve avanços importantes na elucidação da genética da DA. Foram definidas duas categorias de defeitos genéticos: aqueles que causam DA de início precoce e aqueles envolvidos na DA de início tardio. A DA familiar de início precoce é rara e representa cerca de 5% de todos os casos de DA. Pacientes com DA de início precoce em geral desenvolvem demência na faixa dos 40 a 50 anos de idade e quase sempre antes dos 65 anos de idade. Como a DA de início precoce muitas vezes é familiar, é importante obter uma história familiar detalhada sobre a demência. Essa variante é herdada de forma autossômica dominante. As mutações que causam a DA de início precoce foram identificadas em três genes, até o momento: presenilina 1 (PSEN1), presenilina 2 (PSEN2) e proteína precursora de amiloides (APP) nos cromossomos 14, 1 e 21, respectivamente. A mutação em PSEN1 é a mais comum. O teste para mutação genéticaem um paciente com DA de início precoce não é clinicamente útil para um paciente, pois não irá alterar o manejo da doença. No entanto, se o paciente tem filhos que desejam saber se herdaram o gene, a família deve ser encaminhada para aconselhamento genético. Além disso, o teste genético de pacientes com DA de início precoce pode ser valioso para pesquisa. Em contraste com a DA de início precoce, a DA de início tardio (idade superior a 60 a 65 anos) está associada a genes que aumentam o risco de DA, mas não de uma forma autossômica dominante. Os pacientes e membros da família podem perguntar aos médicos sobre o “teste sanguíneo de Alzheimer”, quando querem se referir à genotipagem da apolipoproteína E (APOE). A associação entre APOE e o risco de DA está bem estabelecida. A presença de um alelo ε4 aumenta o risco de DA em cerca de duas a três vezes, enquanto o alelo ε2 pode ser protetor. É importante ter em mente que APOE-ε4 é apenas um fator de risco genético para DA; portanto, a ausência de um alelo ε4 não exclui o diagnóstico, assim como a presença de homozigoto ε4 não determina o diagnóstico. Na verdade, a maioria dos pacientes com DA não são portadores do alelo ε4. Existe um amplo consenso de que o teste APOE deve ser reservado apenas para fins de pesquisa. - Diagnóstico diferencial: → Deficiência de B12; doença da tireoide; hipercalcemia, depressão, alcoolismo, hematoma subdural, hidrocefalia de pressão normal, neoplasias do SNC, efeitos de medicamentos, metais pesados → O diagnóstico diferencial também inclui delirium, déficits sensoriais não corrigidos, distúrbios amnésicos e outras condições psiquiátricas. - Complicações: → Delirium → Distúrbios comportamentais e psicológicos: ● Agitação e agressão ● Vocalizações disruptivas ● Características psicóticas (delírios, alucinações, paranoia ● Sintomas depressivo ● Apatia ● Distúrbios do sono ● Perambulação ou vagância ● Resistência à higiene pessoal (banho e asseio geral) → Complicações relacionadas ao estresse do cuidador Cuidadores informais proporcionam a maior parte dos cuidados aos pacientes com demência, a custos financeiros e pessoais consideráveis. O risco do estresse do cuidador aumenta com o avanço da gravidade da demência, com o aumento da dependência nas AVDs e com a presença de problemas comportamentais. Os médicos devem avaliar os cuidadores para estresse, pois o estresse está associado a desfechos ruins para os pacientes e cuidadores, incluindo aumento do risco de institucionalização do paciente, aumento do risco de negligência ou abuso do paciente e aumento do risco de depressão entre os cuidadores (com relatos de afetar 30 a 50% dos cuidadores). O estresse pode ser reduzido com intervenções terapêuticas como repouso e apoio do cuidador. - Tratamento: A. Comprometimento cognitivo 1. Inibidores da colinesterase — Hoje, os inibidores da colinesterase (IChEs) são a base do tratamento da DA de qualquer gravidade (leve Geriatria Tainara Withoft a grave): donepezil, rivastigmina e galantamina. Todos demonstraram melhorar modestamente a função cognitiva e retardam o declínio funcional na DA leve a moderada, podendo ser benéficos até mesmo na demência grave. O uso de IChEs no CCL é comum, especialmente para o tipo amnésico, mas não está aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA). Ensaios clínicos indicam que pode haver alguns benefícios sintomáticos no CCL, embora não impeçam a progressão para DA. Além disso, embora os IChEs estejam aprovados pelo FDA apenas para DA e demência da DP, também foram demonstrados benefícios em pacientes com DCL e DA mista com DV. Todos os IChEs têm a mesma eficácia relativa em DA e costumam diferir apenas em suas meias-vidas (e, portanto, nos regimes de dosagem) e especificidade para os receptores (a rivastigmina também inibe a butirilcolinesterase, mas o significado clínico ainda é desconhecido). Os efeitos colaterais, incluindo náusea, vômito e diarreia, são um efeito da classe e o motivo mais comum para a interrupção do tratamento. Esses efeitos secundários geralmente podem ser aliviados pela titulação lenta do fármaco durante 8 a 12 semanas. Também são relatados distúrbios do sono e pesadelos. Além disso, os IChEs parecem aumentar o risco de síncope. É preciso cuidado ao receitá-los a pacientes com bradicardia. A Tabela 22-4 apresenta as doses iniciais recomendadas e as doses-alvo para cada um dos IChEs. O uso de mais de 10 mg por dose de donepezil 23 mg não é recomendado em decorrência do aumento de efeitos colaterais e ausência de benefício clínico. Tabela 22.4 - Inibidores da colinesterase: MEDICAMENTO DOSE INICIAL DOSE-ALVO Donepezil (a) 2,5-5,0 mg ao dia 10 mg ao dia (aumentar após 4 semanas) (b) Rivastigmina (c) 1,5 mg duas vezes ao dia 6 mg duas vezes ao dia (aumentar em 1,5 mg duas vezes ao dia a cada 2 semanas) (d) Galantamina (e) 4 mg duas vezes ao dia 8-12 g duas vezes ao dia (aumentar a cada 4 semanas) aTambém disponível em comprimidos dissolvíveis por via oral. bO donepezil 23 mg não demonstrou ser mais eficaz do que o donepezil 10 mg, e o risco de efeitos colaterais é maior. cTambém disponível como adesivo. A dose inicial é de 4,6 mg/24 horas. Aumentar para 9,5 mg após 4 semanas. dTitular novamente de 1,5 mg duas vezes ao dia (oral) ou 4,6 mg (adesivo) caso o tratamento tenha sido interrompido por mais do que alguns dias. eTambém disponível em apresentação de liberação prolongada para administração uma vez ao dia. Iniciar com 8 mg ao dia, aumentar para 8 mg a cada 4 semanas, até um máximo de 16-24 mg ao dia. A avaliação da eficácia do tratamento com IChEs em pacientes individuais não foi formalmente padronizada para a prática médica diária. Em ensaios clínicos os efeitos colaterais são modestos, nos quais apenas 40 a 50% dos pacientes apresentam evidências de melhoria nas determinações do funcionamento cognitivo, nos escores de AVDs ou nas pontuações clínicas subjetivas. Os escores de MEEM ou MOCA que permanecem estáveis durante 6 a 12 meses sugerem que o medicamento pode ser eficaz. Embora a troca de IChEs decorrente de falta de eficácia ou presença de efeitos colaterais intoleráveis possa ser benéfica para alguns pacientes, existem poucas evidências que apoiem isso. O tempo de tratamento adequado com IChEs ainda não é conhecido, mas muitos especialistas recomendam que ele seja mantido indefinidamente (ou até que já não haja mais função a perder) quando se nota alguma melhora ou estabilização. Os médicos e cuidadores podem notar uma diminuição da função quando os IChEs são suspensos. 2. Memantina: A memantina, um antagonista do N-metil-D-aspartato (NMDA), é aprovada pelo FDA para o tratamento da DA moderada a grave. Muitas vezes, a memantina é adicionada ao tratamento com IChE quando a demência atinge um grau moderado. A memantina geralmente é bem tolerada. Em ensaios clínicos controlados, a cefaleia é o único efeito colateral relatado, ocorrendo em pelo menos 5% dos pacientes e o dobro da taxa com placebo (6% com memantina, comparada com 3% no grupo placebo). Tonturas, confusão e constipação podem ser relatadas com menor frequência. 3. Outros tratamentos: Houve certo interesse em antioxidantes, como gingko biloba e vitamina E (α-tocoferol), para o tratamento da demência, uma vez que eles têm um efeito de ação plausível. Estudos usando gingko biloba sugerem que ele possa ser discretamente benéfico na demência, mas as evidências são inconsistentes. Ensaios clínicos randomizados, em grande escala e de alta qualidade, verificaram que o gingko biloba e a vitamina E não são eficazes na prevenção da demência em idosos com cognição normal ou CCL. Embora os AINEs, as estatinas e o estrogênio pareçam promissores para o tratamento da DA em estudos observacionais, os ensaios clínicos randomizados não conseguiram demonstrar qualquer benefício para esses agentes no tratamento da DA. B. Demência vascular: Não há medicamentos especificamente aprovados para o tratamento da DV. Os princípios do tratamento da DV baseiam-se no tratamento dos fatores de risco de AVE como tabagismo,diabetes e hiperlipidemia. O tratamento da hipertensão arterial sistêmica (HAS) é controverso. Embora o controle da HAS possa ajudar a reduzir a incidência de demência, alguns dados observacionais sugerem que, em um quadro de demência já instalada, uma hipertensão leve (uma pressão arterial sistólica de até 150) pode ser melhor para a função cognitiva do que uma pressão arterial baixa. Os IChEs e a memantina podem ser benéficos na DV. C. Problemas comportamentais 1. Abordagens farmacológicas: Se as abordagens não farmacológicas falharem, pode ser necessário adicionar um tratamento medicamentoso. No entanto, não existem tratamentos farmacológicos aprovados para SCPD, e seus benefícios modestos devem ser avaliados em relação aos danos potenciais. Várias classes de medicamentos são usadas para o tratamento de SCPD, incluindo antipsicóticos, antidepressivos, estabilizadores do humor e IChEs. Tabela 22-6 Farmacoterapia para sintomas comportamentais e psicológicos da demência Fármaco Dose inicial Dose máxima recomendada Haloperidol 0,25-0,5 mg ao dia 2-3 mg/dia Risperidona 0,25 mg duas vezes ao dia 1,5 mg/dia Olanzapina 2,5 mg ao dia 5-10 mg/dia Trazodona 25 mg quatro vezes ao deitar 50-100 mg ao deitar ISRSs (p. ex., citalopram) 10 mg ao dia 20-40 mg ao dia Carbamazepina 100 mg ao dia 300-400 mg/dia Geriatria Tainara Withoft Divalproato de sódio 125 mg duas vezes ao dia ~1.000 mg/dia ISRS, inibidor seletivo da recaptação da serotonina. aUse a menor dose benéfica. bTambém disponível em apresentações IV. cTambém disponível na forma líquida (não misturar com refrigerante à base de cola ou chá) e em comprimidos de dissolução oral. dTambém disponível por via intramuscular e em comprimidos de dissolução oral. eTambém disponível na apresentação sprinkle. Antipsicóticos: Os antipsicóticos atípicos olanzapina e risperidona têm a melhor evidência de eficácia (que é modesta), mas seus efeitos colaterais devem ser considerados e avaliados em relação aos benefícios potenciais. Todos os medicamentos antipsicóticos atípicos têm uma advertência na tarja preta sobre o risco aumentado de mortalidade e eventos cerebrovasculares quando usados em pacientes com demência. Uma discussão sobre os riscos e benefícios do uso de antipsicóticos com o tomador de decisão do paciente deve ser documentada. Além do AVE e da mortalidade, os efeitos colaterais a serem considerados são os sintomas extrapiramidais e a discinesia tardia (em altas doses), sedação, ganho de peso, diabetes melito e hiperprolactinemia. Os antipsicóticos típicos em baixa dose (como haloperidol) podem ser usados no tratamento da fase aguda, mas devem ser evitados como medicação crônica em decorrência do risco de discinesia tardia irreversível. Em um estudo, mesmo um tratamento com haloperidol em dose baixa por via oral (1,5 mg/dia) resultou em discinesia tardia em 30% dos pacientes após um ano e > 60% dos pacientes em três anos. Estabilizadores do humor: Em um pequeno ensaio, os estabilizadores do humor, como a carbamazepina e o ácido valproico, demonstraram benefícios para alguns desfechos secundários. No entanto, em decorrência dos efeitos colaterais, das interações medicamentosas e da necessidade de monitoração com exames de sangue, esses agentes não são recomendados como tratamentos de primeira linha. Quando as tentativas de abordagem não farmacológicas e o uso de medicamentos mais comuns falharem, deve-se considerar o encaminhamento a um geriatra ou um gerontopsiquiatra. Os benzodiazepínicos não são recomendados para o tratamento crônico de SCPD. Os benzodiazepínicos não parecem ser mais eficazes do que outras classes de medicamentos. Além disso, os efeitos adversos associados com os benzodiazepínicos, como risco maior de quedas, sedação, abstinência e às vezes excitação paradoxal, as tornam uma escolha particularmente difícil. - Prognóstico: → O prognóstico da demência é variável, dependendo da causa e presença de condições comórbidas. As estimativas de sobrevida desde o início ou desde o diagnóstico da DA são amplas. A expectativa média de vida é de 3 a 15 anos. Os pacientes com início do quadro em idades mais jovens tendem a ter maior sobrevida, e os pacientes com DV podem ter uma sobrevida um pouco mais curta. A morte muitas vezes resulta de pneumonia terminal nas demências degenerativas e em eventos cardiovasculares na DV. Para ajudar as famílias a entenderem a progressão da doença, pode ser útil usar uma escala como a Funcional Assessment Staging (FAST staging) para DA. Na FAST staging existem sete estágios, sendo o estágio 7 de demência o estágio terminal. Essa escala está amplamente disponível on-line, e o site da Associação de Alzheimer a disponibiliza para pacientes e seus familiares. Quando os pacientes atingem o estágio 7, o encaminhamento para internação pode ser indicado. → 90 % dos pacientes com demência acabam sendo institucionalizados. O tempo médio para sua transferência a uma clínica geriátrica é de 3 a 6 anos após o diagnóstico. A gravidade da demência, a dependência nas AVDs, dificuldades comportamentais e a idade e carga do cuidador são fatores de risco significativos para a institucionalização. Intervenções que incluem o apoio do cuidador e a educação na gestão de comportamentos difíceis podem retardar a colocação do paciente em uma clínica de idosos. Geriatria Tainara Withoft