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Índice
INTRODUÇÃO AO TEMA..............................................................................................2
MBEMBE, FOUCAULT E A BIOPOLÍTICA.................................................................3
MBEMBE, ARENDT E A DESUMANIZAÇÃO DAS MINORIAS...............................5
MBEMBE É IMPRESCINDÍVEL..................................................................................11
Licensed to Jose Adriano Leite mergulhao - Adrianomergulhao@hotmail.com.br
TEMA COMENTADO - NECROPOLÍTICA
Tema comentado pelo Prof. Ari – O Brabo Da Reda çã o! 
INTRODUÇÃO AO TEMA
Hoje eu trouxe um dos conceitos mais incríveis presentes na leitura
mundial no século XXI, presente no livro “Necropolítica”, de Achille
Mbembe. 
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A influência que Mbembe exerce, tanto no universo intelectual europeu
quanto no universo intelectual estadunidense, é extraordinária. Não é à toa
que seu nome também chegou ao Brasil. O que ele descreve sobre a necro-
política é assustador: a forma como nós inventamos a sociedade atual e
essa lógica de poder do século XXI.
Conhecer sobre Achille Mbembe é o que você, aluno, precisará para
sustentar um repertório rico na sua redação. Esse autor é uma excelente
citação.
Na verdade, Mbembe baseia seus estudos em outras matrizes fun-
damentais, como Foucault, Hannah Arendt e Georgio Agamben, todos
teóricos que também trazem uma leitura sobre o fenômeno dessa sociedade
bizarra em que nós estamos inseridos e de uma forma extraordinária.
MBEMBE, FOUCAULT E A BIOPOLÍTICA
A essência do conceito de necropolítica, para você entender bem,
quando for fazer a sua redação, é a estruturação da sociedade em uma lógi-
ca de política e de poder que decide quando as pessoas devem viver ou
morrer, assim como decide sobre o corpo das pessoas e sobre a existência
delas. Com base nas ideias de Michel Foucault, Mbembe recupera a ideia
de que estamos imersos em uma lógica vinculada ao biopoder ou à
biopolítica.
Foucault discute bastante o conceito de uma sociedade que, dentro de
um mecanismo microcapilar, insere a percepção do que pode ou não ser fei-
to com a nossa existência e do que pode ou não ser vivido por cada ser hu-
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mano. A decisão sobre o nosso corpo, sobre a nossa aparência e sobre
o nosso destino, nada disso cabe a nós. 
Estamos imersos em uma lógica de sociedade que nos controla em
relação ao que nós podemos sonhar, querer, desejar e até mesmo ao que
nós podemos experimentar. O universo dos prazeres e da felicidade está
determinado por um conjunto de valores, pressupostos, normas e imposi-
ções morais infinitas. Um exemplo disso são os debates sobre a comunida-
de LGBTQIA+, que está presa a estigmas e a valores culturais que não per-
mitem que ela se manifeste tal como ela é, mas que ela se manifeste como
o corpo social deseja. Assim como as teses a respeito do aborto, que tam-
bém querem decidir o que uma mulher pode ou não fazer com seu próprio
corpo.
Nas palavras de Michel Foucault, esse é o sistema de biopoder ou
de biopolítica. Esse sistema vai se entrelaçando à nossa vida cotidiana, vai
se entrelaçando àquilo que nós regulamos como o comportamento ideal ou
inaceitável a tal ponto de nem percebermos que isso está acontecendo.
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Assim, Mbembe dá um passo à frente nessa análise. Ele não foca
apenas na questão de sermos controlados e de não pensarmos por nós
mesmos: ele lança luz ao fato de pensarmos pelo sistema, pela lógica
do poder. Ele começa a perceber que os modelos políticos que sustentam a
sociedade contemporânea (essa estrutura de sociedade provinciana, ainda
herdeira da colonização europeia) decidem quais pessoas podem estar vi-
vas, quais pessoas não merecem viver e quais pessoas não merecem ter o
direito à vida protegido.
Ele consegue ter essa percepção, porque ele vem de um estudo profun-
do sobre a lógica da escravidão, da descolonização e da negritude, con-
siderando, ainda, a própria história do Mbembe como cidadão camaronês e
toda a luta por visibilidade e reconhecimento.
Então, Mbembe menciona que nós estruturamos a sociedade no século
XXI a partir desse valor e começamos a estabelecer os grupos que mere-
cem ser respeitados ou não. Esse é o ponto de encontro entre a teoria de
Mbembe com as teorias de Hannah Arendt.
MBEMBE, ARENDT E A DESUMANIZAÇÃO DAS MINORIAS
Hannah Arendt discute muito sobre a desumanização das minorias
e a forma como nós consideramos respeitáveis, dignas de sobrevivência,
dignas de respeito e de cidadania aquelas pessoas que espelham a nossa
própria cultura, aquelas pessoas com as quais nos identificamos. E, muitas
vezes, os grupos minoritários, invisíveis, empobrecidos e distantes do
nosso núcleo de vivência, são excluídos. A vida dessas pessoas importa
menos. Perceba que alguns grupos têm o seu direito à vida questionado, re-
lativizado. 
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Em consonância com esse conceito, populações favelizadas, popula-
ções negras, grupos raciais minoritários, comunidades indígenas, comunida-
des quilombolas, a comunidade LGBTQIA+, mulheres, ex-detentos, pessoas
com HIV, todos são grupos menorizados ou são grupos cujo direito à
vida é questionado.
Dessa forma, o Estado decide quem pode viver e quem pode morrer,
quais grupos têm o seu direito à vida preservado, protegido e garantido
pelas estruturas do Estado e quais grupos sofrerão pesadamente a mão,
quase sempre irrevogável, de um Estado que não perdoa, ou de um Estado
que atribui a condição de criminoso e de ilegal àquele grupo não desejado.
É o que muitas vezes percebemos em temas como colonização do conceito
de ordem. Aqui, nós entramos com a colonização do conceito de digni-
dade, no qual o conceito de vida é o Estado que decide quem pode vi-
ver ou morrer.
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Em paralelo a isso, em bairros mais abastados, a polícia chega res-
peitosamente, porque o seu papel ali é fazer com que aquele grupo social
sobreviva com qualidade de vida e bem-estar, enquanto, na favela, a polí-
cia chega atirando. Ela deve atirar sob qualquer suspeita de ameaça, e,
muitas vezes, essa mesma polícia confunde, oportunamente, comportamen-
tos indesejados com ameaça, atirando em meninos que, muitas vezes, não
têm nada a ver com a situação criminosa, mas que são compreendidos
como criminosos em potencial, já que são pobres, negros e marginalizados.
Então, essa é a essência da estrutura da necropolítica.
Você deve estar se perguntando como essa lógica de poder consegue
se sustentar, e, de fato, essa é uma questão difícil. Como é que se justifica o
fato de que nós podemos permitir que esse grupo sobreviva e aquele outro
grupo não? Por que nós vamos atacar aquele outro grupo? Por que cria-se
uma lógica de exceção, um Estado de exceção.
É perceptível que, em boa parte das democracias contemporâneas, em
boa parte do mundo ocidental, incluindo o Brasil, o governo vive na fron-
teira, no limite da legalidade, já com o pé do lado de fora da Constitui-
ção. Assim, o Estado sempre afronta a norma, sempre está disposto a
transformar em regra o uso dessa exceção da estrutura democrática ci-
dadã e da gestão do bem-estar social. Essa pequena exceção torna-se re-
gra e, assim, ele justifica os seus atos como “eu não estou ilegal, porque
eu estou na fronteira”. Nessa fronteira, ele faz o que bem entende, ele ata-
ca muitas vezes se justificando a partir de um nível de emergência, nem
sempre real, ou por uma noção ficcional de inimigo.
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Além disso, existe um processo chamado de alucinação negativa. A
psicanálise explica que a pessoa inventa um inimigo.Nós sofremos de
cristofobia, de invasão comunista, de invasão alienígena ou de outra razão
qualquer. A partir daí, ocorre o ataque e a decisão de qual grupo ameaça a
norma, a demanda básica do poder, e esse poder, quase com uma inspira-
ção maquiavélica, precisa ser sustentado e apregoado custe o que custar,
custe a vida de quem custar.
Dessa forma, populações inteiras são dizimadas em nome da vida.
Grupos minoritários inteiros são considerados culpados, tais como os indí-
genas, os quilombolas e a população que vive em regiões florestais, para
que outros sobrevivam. Como Darcy Ribeiro fala, é como se estivésse-
mos construindo uma estrutura de democracia em que não cabem to-
das as pessoas e as que não cabem devem ser mortas.
Essa noção se conecta perceptivelmente com Hitler, isto é, isso se co-
necta com o nazifascismo de uma forma assustadoramente intensa. A
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visão sobre a população ariana em confronto com outras populações selva-
gens, marginais e impuras é a mesma. Considera-se um determinado grupo
como superior, que deve ter a sua vida protegida e privilegiada, e outros
grupos que não merecem viver. Assim, justifica-se a visão de separar nos
campos de concentração, ou matar em câmaras de gás. 
Como nós, no Brasil, ainda não temos as câmaras de gás, matamos
com a fumaça das florestas, com tropas de choque na favela; matamos de
fome, de vírus, de crise sanitária, de desemprego, de violência nas ruas, de
transfobia, de homofobia, de misoginia, enfim, matamos.
É nessa estrutura de um Estado de exceção ou de um Estado de Sítio
(Giorgio Agamben também discute esse conceito) que essa lógica de poder
começa a se estruturar. Então, ela não é necessariamente ilegal. Novamen-
te, ela vive na fronteira e, por isso, ela se justifica.
No entanto, como esses fatores já estão no nosso meio há muito
tempo, já estão incorporados à vida cotidiana, nós não estranhamos que
isso ocorra e entramos naquilo que o Munanga diz: “O carrasco mata sem-
pre duas vezes. A segunda, pelo silêncio.”.
Inicialmente, essas pessoas são mortas por esse modelo de poder, que
se estrutura com base nessas ameaças invisíveis, que confunde comporta-
mento indesejado com comportamento criminoso. Essas pessoas morrem
uma segunda vez, quando são esquecidas, ou quando, simplesmente,
são negligenciadas, ou, ainda, quando nós, que não somos mortos por
isso, não nos importamos com o que está acontecendo, porque não é cono-
sco. Enfim, essa estrutura rouba dessas pessoas a possibilidade de um lar,
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a própria liberdade do corpo, assim como rouba o estatuto político. É uma
morte em vida.
Em linhas gerais, é a mesma coisa que nós fizemos com o sistema
de escravagismo, sustentado por esse país por tantos anos, isto é, é a
mesma coisa que se fez com a escravização, roubando o lar, o corpo e o
estatuto político das pessoas mantidas na escravidão. Estamos ainda nesse
modelo.
MBEMBE É IMPRESCINDÍVEL
Dessa forma, a tese de Mbembe é imprescindível, porque deixa mui-
to claro que nós não saímos do velho sistema colonial, que nós ainda
somos uma espécie de província da Europa, que nós ainda reproduzimos
os mesmos modelos daquela época, que nós reproduzimos o que houve de
mais nefasto na estruturação do poder, e que, infelizmente, como esses me-
canismos são microcapilares, como eles fazem parte do sistema, nós não
conseguimos quebrá-los, ou nós mal percebemos que eles existem, só os
lamentando, quando ocorrem.
Ainda assim, lamentamos das formas mais pífias e patéticas, como colo-
car uma foto preta no Instagram. Realmente, você fez muita coisa. Oh, para-
béns! Você mudou o mundo, menos pessoas morreram, porque você pôs
uma foto preta no seu Instagram. Olha, você é um ativista político. Que re-
volução você provocou!
Sabe quantas outras pessoas negras morreram dentro dessa lógica ne-
cropolítica? Não cabe nos dedos das mãos. Então, nós estamos ainda à
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mercê de um sistema que decide quem vai morrer, que determina quem
vai morrer.
Talvez hoje você não esteja na mira. Talvez. Mas deixe a sua existência
ameaçar o status quo, deixe a sua existência ameaçar os valores firma-
dos por essa lógica de poder, deixe esses valores reconhecerem que, tal-
vez, você não seja interessante para a proliferação da sociedade perfeita.
Você vai estar na mira, e a sua vida vai ser igualmente leiloada.
Esse conceito de necropolítica é intenso, e Achille Mbembe merece
que sua obra seja lida. Talvez ele seja um dos maiores nomes do pensa-
mento mundial para o século XXI.
Fica essa reflexão: Quais conceitos têm revolucionado sua percep-
ção de sociedade? Quais conceitos têm revolucionado seus textos?
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