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Estado e Políticas Públicas
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Apresentação 
 
 As pessoas adoecem e morrem devido não só às suas heranças 
genéticas ou a contatos com parasitas e substâncias tóxicas, mas também em 
decorrência do maior ou menor acesso aos serviços de saúde que possuem, 
da possibilidade que têm de receber e interpretar informações disponíveis 
sobre saúde, do modo de vida a que são submetidas por força de suas 
condições de subsistência e trabalho. 
 Como vimos até aqui, a saúde dos indivíduos e das coletividades traduz o 
modo como a sociedade está organizada e como são distribuídos seus 
recursos. Isto equivale a dizer que a promoção da saúde depende das ações 
do governo e das instituições, emitidas por intermédio das Políticas Públicas. 
 As Políticas desta natureza, ou seja, voltadas para a proteção social, 
expressam a maneira como as sociedades constroem historicamente seus 
mecanismos de solidariedade, sendo a saúde parte importante do conjunto 
destas políticas. 
 Vamos observar agora um pouco do processo de montagem das políticas 
públicas sociais, ou de seguridade social, nos países capitalistas, durante o 
século XX, e como se deu tal processo no Brasil, no qual as primeiras leis de 
proteção social remontam às décadas de 30 e 40, ampliando-se, 
gradativamente, segundo uma orientação universalista. 
 
 
A Formulação das Políticas Sociais 
 
 A economia de mercado, modalidade de organização social difundida pelo 
mundo desde o século XVIII, tem originado um grande número de demandas 
relacionadas com a sobrevivência das pessoas, bem como com a vida cultural 
das sociedades. Esta forma de organização econômica tem crescentemente 
dissociado o mundo do trabalho (e o que se produz a partir da capacidade de 
trabalho de cada homem), das condições materiais objetivas de existência 
(como a propriedade natural da terra ou dos meios de produção), Em outras 
palavras, o homem que produz tem acesso bastante restrito aos benefícios 
oriundos de seu trabalho. 
 Para tornar viável a sobrevivência individual e familiar, parcela expressiva 
da população se vê compelida a barganhar as condições de venda de sua 
capacidade de trabalho. A maior ou menor capacidade de barganha individual 
ou coletiva determina o valor do trabalho e a qualidade do emprego, que 
 
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 Texto extraído de Gestão de saúde: curso de aperfeiçoamento para dirigentes municipais de saúde: 
programa de educação a distância. Rio de Janeiro: FIOCRUZ; Brasília: UnB, 1998. Autoria de Conteúdos 
da Unidade I: Antônio Ivo de Carvalho, Clarice Melamed, José Mendes Ribeiro, Mozart de Oliveira 
Júnior, Nilson do Rosário Costa e Oviromar Flores. Texto para uso exclusivo em sala de aula. A 
paginação não coincide com o original. 
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podem ser medidos, nas economias de mercado, pela proporção que os 
salários ocupam entre os principais itens que compõem a renda nacional. O 
padrão de vida do conjunto da sociedade se tornou, assim, parcialmente 
dependente do valor da renda direta, gerada pelo trabalho assalariado. 
 Contudo, nem todas as necessidades sociais são contempladas de modo 
satisfatório através da renda direta gerada pelo trabalho. Questões 
relacionadas com a educação e com a saúde adquirem contornos públicos, ou 
seja, dependem de ações governamentais para seu equacionamento e não se 
resolvem apenas na esfera do mercado. 
 Ao levantar as questões de educação, saúde, assistência, estamos 
falando da produção de bens e serviços públicos. Denomina-se bem público o 
resultado de uma ação coletiva ou governamental que pode beneficiar a todos, 
não provocando perda para nenhum dos membros da sociedade, nem sendo 
privilégio de indivíduos ou grupos. 
 Este é o caso típico da ação de prevenção e controle das epidemias 
através das melhorias ambientais e da vacinação em massa. O controle da 
ameaça epidêmica, como o caso da cólera em meados do século passado na 
Europa ou da varíola nesse século, beneficiou a todos e criou um bem público 
pela sensação coletiva do fim da ameaça epidêmica. 
 No entanto, nem todos os problemas que afetam as condições de vida no 
modo capitalista podem ser postos em pauta com a urgência e a efetividade 
que podem ser consideradas necessárias pelo bom senso. 
 Há um conjunto de necessidades sociais que exigem políticas 
direcionadas a um beneficiário individual ou grupo, e que demandam ações 
públicas que provocam ganhos para alguns, exigindo concessões da parte de 
outros. É o que se denomina função redistributiva, uma característica bastante 
típicas do Estado, que, assim, se responsabiliza pelas necessidades do 
conjunto da sociedade, que exigem condições de acesso a serviços sociais 
públicos decorrentes de um princípio de justiça e que geram os sistemas de 
proteção social. 
 Os sistemas de proteção social são definidos como o conjunto de políticas 
públicas de natureza social que respondem pelas funções de: 
• prover proteção para todos os membros da comunidade nacional; 
• realizar objetivos não econômicos e diretamente econômicos, como o 
provimento de renda mínima; 
• promover políticas de sentido redistributivo dos ricos para os pobres. 
 Três modelos de política social foram desenhados nos diferentes países 
capitalistas: residual, meritocrático e institucional-redistributivo (Titmus: 1983), 
que serão definidos a seguir. 
 O modelo residual baseia-se na premissa de que existem dois canais para 
a solução de demandas de sobrevivência: a família e o mercado. As 
instituições de proteção social atuariam apenas temporariamente, na 
eventualidade de falha destas instituições. Foi o modelo de proteção social, 
difundido pelo pensamento liberal clássico e contemporâneo, que se tomou 
dominante nos Estados Unidos, por exemplo. 
 O modelo meritocrático subordina o sistema de proteção social a uma 
racionalidade econômica, supondo que os indivíduos devem estar aptos a 
resolver suas próprias necessidades através de sua relação direta com o 
mercado, baseados em seu esforço no trabalho, que pode ser medido por meio 
de sua eficiência e produtividade. Este modelo resulta na participação 
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complementar das políticas governamentais no provimento dos serviços 
sociais, para corrigir as imperfeições do mercado; dirige benefícios, por 
exemplo, a pobres e velhos, grupos que, reconhecidamente, estariam alijados 
da possibilidade de disputarem espaço no mercado de trabalho de forma 
temporária ou permanente. 
 Já o modelo de proteção social institucional-redistributivo é o que mais 
aproxima a idéia de direito social do conceito de cidadania, dando origem ao 
Estado de Bem-Estar Social (ou Welfare State, como ficou conhecido na 
literatura especializada). 
 A proteção social preconizada por este último modelo é concebida como 
uma iniciativa de incorporação de todos os membros da comunidade nacional a 
um padrão de vida considerado adequado para viver em sociedade, provendo 
serviços e benefícios sociais de modo universal e integral, independente da 
situação do indivíduo no mercado de trabalho. Atente para as diferenças 
marcantes em relação aos dois modelos anteriores. 
 Partindo de um princípio de justiça substantiva, este modelo considera que 
todos os homens possuem uma igualdade básica que não permite que sofram 
privações em decorrência do seu desempenho ou fracasso econômico. 
 A implementação da noção de cidadania, implícita no Estado de Bem Estar 
Social, reconhece a existência de uma "igualdade humana básica" associada à 
necessidade de participação integral de todos os indivíduos na comunidade 
nacional. O desenvolvimento pleno desta construção ideal criaria ou 
estabeleceria certos limites à desigualdade criada pelo mercado e inerente a 
este. O conjunto de direitos de cidadania "invadiria" o pressuposto da liberdade 
do mercado (Marshall, 1967).Em resumo, a extensão da cidadania alteraria o 
padrão de desigualdade social gerado pela ordem econômica. 
 Em uma perspectiva histórica, o conceito de cidadania pode ser 
desmembrado em três partes: civil, política e social, segundo Marshall. Estes 
três elementos aparecem numa sucessão lógica e histórica, que guarda 
relação com a evolução dos direitos civis na experiência nacional inglesa. 
 Em primeiro lugar, o elemento civil, referido ao século XVIII, seria 
composto dos direitos individuais - liberdade de ir e vir, de imprensa, 
pensamento e fé, direito à propriedade, de concluir contrato e direito à justiça. 
 O elemento político seria entendido como o direito à ação coletiva e à 
participação no exercício do poder político como um membro ou eleito. As 
instituições correspondentes seriam o parlamento e os conselhos de governo. 
 O elemento social compreende desde o direito de um mínimo de bem-
estar econômico e segurança ao direito de participar por completo "na herança 
social e levar a vida de um ser civilizado de acordo com os padrões que 
prevalecem na sociedade", segundo Marshall. O sistema educacional e os 
serviços sociais são as instituições ligadas aos direitos sociais que tiveram 
pleno desenvolvimento no século XX. 
 A cidadania transformar-se-ia, nos contextos nacionais onde foi 
desenvolvida, em um pacto social traduzido em um código de direitos e 
deveres que devem atingir a todos indistintamente. Diretamente ligada ao 
exercício pleno da cidadania no plano social está a idéia de seguridade social, 
que se antepõe à noção de seguro, como discutiremos adiante. 
 
 
 
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As Políticas Sociais no Brasil 
 
 Até o final da década de 80, as políticas sociais brasileiras foram 
qualificadas como (i) residuais: por não abrangerem toda a comunidade 
nacional como objeto da proteção social; e (ii) meritocrático-corporativas 
(Draibe: 1989), porque a definição dos direitos sociais ficou restrita à 
vinculação ao sistema previdenciário, sendo definidos como cidadãos os 
indivíduos pertencentes às categorias ocupacionais (corporações) 
reconhecidas pelo Estado e que contribuíam para a Previdência Social. 
Para que você possa compreender melhor vamos revisitar a nossa 
história. 
No período populista, iniciado com Vargas nas décadas de 30 e 40, o 
desenvolvimento das políticas sociais, como, por exemplo, na previdência e na 
saúde, fizeram parte de uma estratégia de incorporação de segmentos da 
classe média e trabalhadores urbanos à cidadania. Nesse sentido, as políticas 
sociais tiveram notável visibilidade e impacto na construção do projeto 
nacional, embora não tivessem conseguido, de fato, eliminar a pobreza ou 
implementar uma redistribuição significativa de renda. 
 Durante o primeiro mandato de Getúlio Vargas (a ditadura de 1930-1945), 
os principais sindicatos de trabalhadores não colocaram em questão o regime 
autoritário nem reivindicaram a ampliação do poder de cidadania na gestão ou 
na busca de um modelo redistributivo nas políticas sociais. Ao contrário, 
ocorreu verdadeira aliança entre o movimento sindical e o governo, 
estabelecendo-se, como "prêmio", o acesso direto dos grupos sindicais mais 
organizados ao aparato executivo do Estado. Por meio deste acesso 
privilegiado às decisões públicas foram criadas as principais organizações de 
política social nas décadas de 30 e 40, como foi o caso dos antigos IAP 
(Institutos de Aposentadorias e Pensões das diversas categorias de 
trabalhadores). 
 A caminhada que se fez nesta época, e mesmo daí em diante, não foi, 
portanto, em direção a uma cidadania plena, incorporando os elementos civis, 
políticos e sociais. Houve, de fato, o estabelecimento de uma cidadania 
regulada, de caráter parcial e concedida por meio de uma articulação entre a 
política de governo e o movimento sindical. O conceito de cidadania regulada 
(Santos: 1989) nos permite entender a dinâmica de instalação do sistema de 
proteção social no período pós anos 30, situando a criação das primeiras 
instituições públicas preocupadas com assistência médica, habitação, 
previdência, etc., oferecidas à população (ou parte desta) como concessão do 
Estado, mais do que como direito de cidadania. 
 A cidadania regulada promoveu a subordinação dos direitos sociais dos 
brasileiros ao sistema de previdência social estatal. Isto fez com que no Brasil a 
cidadania social se desenvolvesse subordinada a um sistema de estratificação 
ocupacional definido por normas legais, dispondo sobre categorias de incluídos 
e não-incluídos, e não através de um código de valores políticos. 
 Foram reconhecidos como cidadãos (ou seja, os incluídos) apenas os 
membros da comunidade localizados nas ocupações reconhecidas e definidas 
em lei e que contribuíam para a Previdência. A extensão da cidadania se fez 
mediante direitos associados com as profissões, antes que pelo 
reconhecimento da condição de membro da comunidade nacional. Assim, não 
bastava ser brasileiro para gozar de direitos de cidadania social; antes era 
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necessário "ter carteira assinada" e contribuir financeiramente para a 
Previdência Social, mediante uma modalidade de seguro (recebem benefícios 
somente aqueles que pagam por eles). 
 Desta forma, acabaram excluídos da cidadania todos aqueles cuja 
ocupação a lei desconhecia: os trabalhadores da área rural e os trabalhadores 
urbanos cujas ocupações não tivessem sido reguladas. Mesmo as 
reivindicações relativas a emprego, salários, renda e benefícios sociais ficaram 
na dependência de um reconhecimento prévio da legitimidade da categoria. No 
caso dos trabalhadores rurais, a exclusão foi dramática: durante décadas 
houve forte resistência do Estado brasileiro em reconhecer seus direitos 
trabalhistas. 
 O enquadramento das políticas governamentais de proteção social, 
através desta estruturação da cidadania regulada, de natureza corporativa, isto 
é, voltada para categorias profissionais regulamentadas por lei, produziu fortes 
distorções na política social. Uma delas, caracterizada pelo estabelecimento de 
privilégios corporativos, resultou na confusão da própria noção de "público", 
atribuída às instituições previdenciárias, cujo acesso, entretanto, sempre fora 
exclusivo das categorias profissionais incluídas no pacto populista. A 
Previdência Social, encarnada pelos antigos IAP's, era, com efeito, pública e 
governamental na aparência, porém profundamente marcada pelos interesses 
privados em sua atuação. Um exemplo claro disso foi a permanente opção de 
compra de serviços médicos particulares por parte da maioria dos Institutos. 
 Contudo, a tensão entre a manutenção de uma estrutura de privilégios e a 
necessidade de extensão dos chamados direitos sociais foi permanente no 
Brasil. Esta tensão ocorreu não só entre as categorias profissionais 
privilegiadas bancários, comerciários, industriários, funcionários públicos, que 
mostravam marcantes diferenças de acesso entre si - como entre elas e o 
restante da população. 
 Estes conflitos levaram à promulgação de uma Lei Orgânica da 
Previdência Social (LOPS), em 1960, que uniformizou os serviços e benefícios 
prestados pelo sistema previdenciário brasileiro, sem unificar, entretanto, os 
diversos Institutos. 
 
 
O Regime Autoritário de 1964 e as Políticas Sociais 
 
 O regime autoritário, instaurado pelo golpe militar de 1964, produziu 
alterações importantes no modelo de políticas sociais criado nas décadas 
anteriores, em um ambiente de neutralização das resistências corporativas às 
mudanças, dadas as restrições à ordem democrática no País, afetando as 
atividades sindicais e o funcionamento dos partidos políticos. 
 Estas mudanças foram viabilizadas pela alta concentração de autoridade 
decisória, resultante do fortalecimento de uma tecnocracia estatal sintonizada 
com as diretrizes de centralismo e racionalidade da máquina pública. 
 Já durante o primeiro governo militar (1964-1967),duas metas importantes 
foram atingidas: a reconcentração da iniciativa decisória no interior do aparato 
de Estado, especialmente no Executivo, e a reafirmação da capacidade 
gerencial direcionada para a acumulação de capital, assegurando controle 
sobre a economia. 
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 Este processo, que viabilizou o monopólio real das elites dirigentes 
(militares, tecnoburocracia, grande empresariado) sobre as políticas 
governamentais, permitiu ao regime deslocar o eixo da disputa por privilégios 
entre os representantes do Estado e as elites sindicais, como ocorria desde o 
Estado Novo, para uma esfera bem mais restrita da tecnoburocracia. 
 Este movimento compôs uma ampla estratégia de exclusão de importantes 
lideranças da sociedade civil e do mundo do trabalho de espaços como os 
conselhos administrativos e, especificamente, os fóruns tripartites, nos quais, 
antes do golpe de Estado, representantes dos empregados, empregadores e 
governo influíam sobre os rumos da Previdência. 
 Durante alguns anos foi muito difícil para os que se opunham a este 
Estado autoritário abandonar a tese unilateral de que os governos militares 
haviam se instalado exclusivamente com o objetivo de favorecer o grande 
capital nacional associado com o internacional, sem apresentar um projeto 
próprio para o País, e admitir que a "Revolução de 1964" havia realizado 
reformas econômicas com base nas quais foi possível enfrentar a crise 
econômica, política e social que envolveu todo o País, nos primeiros anos da 
década de 60, e, assim, desencadear um vigoroso processo de acumulação e 
expansão produtiva. 
 O regime autoritário trabalhava com a tese de que decisões de 
investimentos públicos em bens de natureza social deviam ter como prioridade 
o atendimento de viabilidade financeira do empreendimento público. Em outros 
termos, a expansão no fornecimento de serviços sociais teria sido dirigida, 
neste período, especificamente aos consumidores, ou seja, aos indivíduos que 
apresentavam poder de compra desses serviços. O caso da política de 
saneamento básico no País, marcada pela criação das Empresas de 
Saneamento estaduais, é bastante exemplar, neste aspecto. 
 Os efeitos excludentes da nova produção dos serviços sociais eram 
evidentes, e resultavam em uma apropriação desigual das políticas públicas 
por parte da população. Apontava-se, assim, para um novo modelo de ação 
governamental, subordinado à lógica econômica e extremamente atrelado aos 
interesses do setor privado. 
 E foi assim que entre os anos de 1964 e 1973 houve uma acentuada 
mudança, para pior, nos indicadores de cobertura das políticas sociais, 
exemplificados pelo aumento da mortalidade infantil em várias capitais 
importantes, como São Paulo. 
 A mortalidade infantil, um indicador seguro de condições sócio-econômicas 
gerais, havia diminuído acentuadamente entre 1950 e 1960 nas capitais 
brasileiras, porém durante a década seguinte a tendência ao decréscimo foi 
revertida, um pouco mais cedo ou mais tarde em todas elas. Em São Paulo, a 
mortalidade infantil atingiu seu ponto mais baixo em 1962, passando a 
aumentar significativamente a partir daí, até atingir em 1969, nível 40% 
superior. Evolução análoga se verificou em Belo Horizonte, onde a mortalidade 
infantil aumentou quase 45% entre 1960 e 1969 (Singer, 1977). 
 A homogeneidade da tendência ao aumento da mortalidade infantil e o fato 
de ela verificar-se ao longo de um período considerável demonstravam que 
houve realmente queda no padrão de vida, pelo menos da população dos 
centros urbanos maiores. 
 Nesse contexto, a avaliação de indicadores e de condições sociais, 
particularmente o indicador da mortalidade infantil, junto à concentração de 
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renda, configuravam a degradação das condições sociais da população. Era 
evidente o decréscimo dos salários reais no período e outros fatores como 
alimentação e saneamento básico. Os dados indicavam que a deterioração da 
situação econômica dos assalariados acompanhada da concentração de renda 
levou a uma progressiva nos níveis de saúde. 
 Esta situação era especialmente gritante no Município de São Paulo onde 
a evolução se afastava abruptamente das previsões realizadas, com base nas 
tendências verificadas no período anterior. Diferentes indicadores sociais 
refletiam o desenvolvimento da economia que conjugou altas taxas de 
crescimento da economia, em especial entre 1968 e 1974, com expansão do 
emprego e uma política social regressiva associada com a paralisia das 
políticas públicas compensatórias. 
 Os dados epidemiológicos simplesmente reforçavam o debate sobre a 
necessidade de correção dos rumos do modelo de desenvolvimento social 
trazido à tona pela publicação de informações sobre a concentração de renda 
na comparação dos Censos de 1960 e 1970. 
 Finalmente, o consenso sobre a falência do modelo social do regime 
tornou-se ainda maior pela divulgação de dados dramáticos, parcialmente 
censurados pelo regime militar, no Estudo Nacional de Despesa Familiar - 
ENDEF, iniciado em 1974, que revelavam que o problema alimentar do Brasil 
era quantitativo, que importante parcela da população se alimentava pouco e 
que existia uma desnutrição protéica grave. 
 Os indicadores econômicos e sociais nesta primeira fase do regime 
confirmavam as críticas à subordinação das decisões em política social às 
formulações da área econômica. 
 Esses dados desmontavam as teses dominantes, sumarizadas, pelo então 
ministro Delfim Neto, na idéia de "deixar primeiro o bolo crescer, depois 
distribuir". Uma redução economicista, na época em moda, de que primeiro 
viria o crescimento econômico (a produção de riqueza), depois a redistribuição 
da renda (as políticas sociais). 
 As políticas governamentais produziam seus efeitos por uma perversa 
conjugação entre estatismo e privatismo. A centralização decisória reforçava a 
capacidade de planejamento e coordenação da ação governamental. A 
ausência de pressões vindas de baixo da sociedade, fortemente reprimidas 
pelo regime de força, aliada à fragmentação das instituições do Estado, 
fortalecia cada vez mais uma burocracia estatal arrogante e autônoma que 
incentivava visivelmente a privatização. 
 Tal situação terminou por comprometer as bases políticas do regime, 
gerando também grande insatisfação da sociedade. É então que o debate 
sobre a questão social toma força, acarretando importantes mudanças na 
forma das políticas sociais. Com efeito, como foi visto até aqui, os resultados 
obtidos durante os três primeiros governos militares (1964-1973) consolidaram 
e privilegiaram quase que exclusivamente o setor privado e ampliaram de 
forma exagerada a exclusão social. No entanto, as demandas dos movimentos 
sociais e as pressões das agências internacionais induziram o Estado brasileiro 
a refazer sua agenda social. 
 Verifica-se que, já no Governo Geisel (1974-1979), a preocupação com o 
social assumiu explicitamente uma orientação de expansão de cobertura, 
mesmo que mantendo em várias áreas a articulação com o setor privado, como 
é o caso da saúde. Este deslocamento do foco junto às políticas sociais ocorre 
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com a preservação do traço autoritário presente durante todos os governos 
militares e que, em tal período, é explicitado com o lema da "distensão lenta, 
gradual e segura". 
 Uma característica realmente nova dessa conjuntura social é o fato de a 
política buscar o rompimento com a exclusão do modelo anterior, trabalhando 
com uma idéia mais universalista de direitos sociais e não com a subordinação 
do acesso como decorrência do fato de o indivíduo ser contribuinte da 
Previdência Social. 
 A desorganização política e social imposta pelos governos militares criou 
na sociedade brasileira, como resposta, estímulos a outras formas de 
solidariedade social, possibilitando a emergência de um sistema de valores 
centrado na defesa da cidadania universal, direitoao trabalho e à justiça, 
forjadas na crítica ao autoritarismo e nas suas repercussões sociais. Nos anos 
70 foram particularmente visíveis movimentos sociais envolvendo 
trabalhadores, médicos, intelectuais, moradores e minorias, tendo como pauta 
as questões ligadas à saúde e outras relacionadas à vida. 
 Este novo cenário de mudanças de valores e crescimentos de pressão das 
elites e movimentos sociais urbanos para o equacionamento das carências de 
infra-estrutura (principalmente saneamento) e de serviços sociais (educação, 
atenção médica, previdência, etc.) gerou uma situação de pressões para a 
inovação no campo das políticas públicas. 
 A política governamental teve que romper com a lógica da «viabilidade 
econômica» da conjuntura anterior, ampliando de modo significativo a inclusão 
do setor social nos projetos de desenvolvimento econômico e não mais como 
decorrência do mesmo (a «divisão do bolo» somente após seu crescimento). 
 A política pública que mais expressivamente registrou este clima de 
mudança foi o II Plano Nacional de Desenvolvimento/PND (1974), que redefiniu 
o modelo de desenvolvimento social brasileiro. Esta formulação de política 
governamental respondeu não só às pressões econômicas conjunturais, 
decorrentes da «crise do petróleo» de caráter internacional, como refez as 
relações entre economia (produção), desenvolvimento social (consumo) e 
integração social. 
 O II PND assumiu certas críticas de agências internacionais a respeito da 
concentração de renda, embora considerando tal fenômeno decorrente «de 
uma evolução em longo prazo da economia, e não de fatores recentes». Desta 
forma, o II PND se propõe a garantir «o aumento substancial de renda em 
todas as classes, e a redução substancial da pobreza absoluta», mediante uma 
agenda que combinaria iniciativas de (i) política de emprego com política de 
salários, isto é, melhorias nos postos de trabalho e aumentos salariais reais; (ii) 
política de valorização de recursos humanos, onde foi privilegiada a 
organização, pelas políticas governamentais, da ação social. Neste item 
destacou-se o papel da política de saúde que justificou "uma estratégia que 
visa à clara definição institucional do setor, com base em mecanismos de 
coordenação que anulem imprecisões ou superposições de âmbito de 
atuação"; (iii) política de integração social, através de políticas de 
suplementação de renda (PIS-PASEP); (iv) política habitacional; (v) ampliação 
do conceito de previdência social para abranger progressivamente novas 
categorias da população, especialmente as situadas nas faixas de maior 
pobreza. 
 
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Universalização das Políticas Sociais: o Caso da Saúde 
 
 Esta nova formulação da política social voltada para a inclusão, ocorrida 
nos anos 70, não só inverteu a sua localização como subproduto do 
desenvolvimento econômico, como fortaleceu mudanças relevantes nos 
indicadores de infra-estrutura social e de condição de vida, especialmente para 
as populações urbanas. 
Alguns exemplos são marcantes. Vejamos. 
 Exemplo 1: entre 1979-80 a área habitacional mostrou intervenção pública 
(construção direta pelo Estado) equivalente a 20% do volume total de unidades 
de qualquer tipo (inclusive barracos), igualando-se aos indicadores 
encontrados nas social-democracias européias nas décadas anteriores. 
 Exemplo 2: a universalização do sistema previdenciário por força das leis 
que incentivaram a incorporação dos trabalhadores rurais à previdência social 
em 1971 (Funrural); das empregadas domésticas (1972) e autônomos (1973). 
 Exemplo 3: as mudanças na política de saúde, depois de 1974 (Plano de 
Pronta Ação) ampliaram o acesso da população pobre e das áreas rurais ao 
consumo de atenção médico-hospitalar. 
 Exemplo 3: ainda o PPA permitiu a universalização da cobertura para a 
clientela não-segurada, ao desburocratizar o atendimento nos casos de 
emergência e incorporar as Secretarias de Saúde e Hospitais Universitários ao 
sistema previdenciário, através de convênios globais. 
 Aliás, o PPA constituiu um momento expressivo na história das políticas 
de saúde, pois acarretou a perda de controle da assistência à saúde pela 
burocracia previdenciária, como vinha acontecendo havia décadas. A expansão 
da assistência médica teria, assim, transbordado de seu contexto institucional 
de origem e buscado articular todos os serviços de assistência existentes no 
País, procurando, mediante convênios, expandir a cobertura. 
 A universalização da cobertura de atendimento médico que acompanhou 
este processo de retomada das políticas sociais favoreceu a agenda defendida 
pela Reforma Sanitária, na década de 80, permitindo que viesse a se alterar, 
efetivamente, os critérios de elegibilidade de clientela vigentes no sistema 
previdenciário, em troca de uma concepção de inclusão universalista. 
 Nesse quadro de ampliação das políticas sociais, a assistência médica 
teve um incremento muito mais destacado que os demais benefícios, chegando 
mesmo a contemplar os trabalhadores não segurados. 
 Até então restrita como padrão de cidadania regulada, a previdência social 
migrou de um modelo de seguro-saúde (recebe benefícios apenas quem paga) 
para um desenho organizacional típico de seguridade social (direito 
independente de pagamento), sendo esta nova forma amplamente incentivada 
pelas mudanças trazidas pelo II PND. 
 Nas relações entre as áreas de Previdência Social e de saúde no âmbito 
das políticas públicas, o processo de reorganização institucional estabelecido 
com a criação do SINPAS - Sistema Nacional de Previdência e Assistência 
Social (1977) significou uma expressiva ampliação das atividades de proteção 
social. 
 Foram definidos, na ocasião, importantes organismos no seio do aparelho 
estatal nacional, que passam a assimilar a crescente expansão das atividades 
no campo saúde, como é o caso do Instituto Nacional da Assistência Médica da 
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Previdência Social - INAMPS; da assistência social como a LBA e a 
FUNABEM; além de estruturas gerenciais como o DATAPREV e o lAPAS. 
 Apesar dos avanços propiciados por este novo momento da política de 
saúde, algumas das características do modelo gerado no período militar não 
desapareceram de todo e, entre elas, podem ser citadas: 
• centralização das decisões financeiras e operacionais, no Governo 
Federal e dentro dele, no interior do INAMPS. 
• financiamento baseado em contribuições sociais; 
• redes de atendimento não integradas; 
• privatização da execução dos serviços de saúde; 
• pouca efetividade sob o ponto de vista das necessidades da população, 
seja quanto ao acesso ou a qualidade dos serviços. 
 De uma maneira geral, a expansão dos serviços médicos obedece à 
lógica já observada desde o período anterior, caracterizada por crescente 
incorporação de contingentes cada vez mais amplos da população. Esta 
tendência é esboçada na redução de barreiras burocráticas ao acesso e no 
crescimento quantitativo da oferta de serviços e unidades assistenciais. 
 As transformações institucionais do sistema continuam a acontecer na 
década seguinte. Em 1980, na VII Conferência Nacional de Saúde é lançado 
pelo Governo Federal o PREV-SAÚDE - Programa Nacional de Serviços 
Básicos. Em 1982 é criado o CONASP - Conselho Nacional de Administração 
da Saúde Previdenciária, subordinado diretamente ao presidente da República. 
 Tanto o PREV-SAÚDE como o plano elaborado pelo CONASP já 
incorporavam uma análise cuidadosa dos principais problemas apresentados 
pelo sistema na época. Em termos de realizações, apenas o último obteve 
algum êxito, suas propostas foram parcialmente implementadas entre 1982-
1984. É a partir do plano do CONASP que se inicia a implementação de Ações 
Integradas de Saúde (AIS) com o objetivo de tornar mais eficientes e eficazes 
as ações produzidas pelo Sistema. Até o final de 1986, 2.500 municípios 
haviam assinadoos termos de adesão às AIS. 
 Em julho de 1987, por meio do Decreto 94.657, o presidente da República 
cria os Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (SUDS) com o 
objetivo de contribuir para a consolidação e o desenvolvimento qualitativo das 
AIS, antecipando um conjunto de inovações descentralizantes que viriam a ser 
consolidadas na Constituição de 1988. 
 Entre as principais bandeiras da luta pela chamada Reforma Sanitária 
estão a necessidade de ampliação dos recursos públicos postos à disposição 
da saúde da população, a utilização de critérios de eqüidade em sua 
distribuição e a transparência em sua aplicação. 
 Apesar de certo consenso formado pela ação de governo quanto à 
necessidade de ampliação da oferta de serviços em saúde. Os resultados mais 
palpáveis são ainda tímidos durante a primeira metade dos anos 80, pelas 
restrições impostas no quadro de recessão econômica em que se encontrava 
imerso o País. As contribuições para a Previdência Social constituem, é bom 
lembrar, nesta etapa, as principais responsáveis pelo financiamento não só das 
aposentadorias e pensões, como também das ações de saúde efetuadas pelo 
INAMPS em todo o País. 
 Em 1986, já no governo da Nova República, ocorre uma retomada dos 
gastos públicos nas áreas sociais e especialmente em saúde. Em cinco anos, a 
política de descentralização, proposta pelas AIS, associada com uma elevação 
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significativa de investimentos federais faz triplicar o número de unidades de 
saúde construídas e mantidas pelas municipalidades. 
 Estas mudanças organizacionais incrementaram especialmente a 
participação do setor saúde nos gastos da Previdência, que chegaram, em 
média, a 30% das despesas totais nos anos 1975-1978, acarretando redução 
nas despesas com benefícios, assistência social e com a administração e 
gerência do sistema. 
 Esta explicitação de um projeto social universalista retirou da política social 
o estigma de subproduto do desenvolvimento econômico e tomou viáveis 
mudanças importantes nos indicadores de oferta de infra-estrutura social e de 
condição de vida. Os termos do debate, a partir do final da década de 70, 
permanecem os mesmos, porém são «descobertas» as virtudes das políticas 
públicas de natureza social. De uma perspectiva econômica, redistribuir não é 
só possível, como também mais racional e virtuoso. 
 Esta extensão de direitos teve um efeito incrementalista sobre os gastos 
públicos de natureza social, influenciando de modo positivo as discussões em 
fins da década de 80 sobre o modelo social brasileiro. Um dos efeitos mais 
importantes dessas mudanças no setor social brasileiro será a sua total 
confirmação pela Constituição de 1988, considerada a Constituição Cidadã 
pelas suas grandes inovações conceituais e pela ampliação dos programas 
abrangentes de proteção criados nos anos anteriores. 
 Mesmo utilizando um volume significativo de recursos, o sistema de 
proteção social não estaria, entretanto, alcançando níveis razoáveis de 
eficiência dos gastos nem qualidade dos seus resultados. 
 
 
A Constituição de 1988 e a Seguridade Social 
 
 Vamos agora examinar as principais inovações conceituais trazidas pela 
Constituição de 1988. 
 A principal delas foi a adoção do conceito de seguridade social, que 
reconhecia os direitos sociais orientados por uma noção de comunidade 
nacional e definida no artigo 194 da Constituição Federal como um conjunto de 
princípios, normas e instituições, integradas por ações dos poderes públicos e 
da sociedade visando assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à 
assistência social. 
 A seguridade social, assim definida, reforçou a idéia de um sistema de 
cobertura destinado a todos que, contribuintes ou não, encontrem-se em 
estado de necessidade, conforme definido em lei. Mantendo-se o vínculo 
contributivo apenas para a previdência social, estas inovações conceituais 
representaram um grande avanço na linha da universalização do acesso aos 
benefícios e serviços, compondo um sistema de proteção social - o Estado de 
Bem Estar Social - de razoáveis proporções no Brasil. 
 O conceito de seguridade social resultou na definição do OSS - 
Orçamento da Seguridade Social, aspecto inédito na legislação brasileira, por 
intermédio do qual são definidas as fontes de financiamento das políticas e 
programas da previdência, da saúde e da assistência social, no âmbito do 
governo federal. 
 As fontes do OSS são, nos termos da Constituição, formadas por diversas 
contribuições sociais, entre elas a dos empregadores, que pode incidir sobre a 
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folha de salários, o faturamento e o lucro; a dos trabalhadores; a receita de 
concursos de prognósticos (loterias). 
 O aspecto mais relevante nessa idéia de orçamento da seguridade social 
é a concepção de socialização de custos, com todos pagando para todos, o 
que introduziu um componente redistributivo (de quem tem mais para quem 
tem menos) no financiamento das funções de atenção à saúde, previdência e 
assistência social. 
 Os pressupostos básicos do Sistema Único de Saúde são descritos na 
Constituição de 1988 como uma parte do capítulo da seguridade social. A Lei 
8.080, que dispõe sobre a promoção da saúde e organização dos serviços, e a 
Lei 8.142, que define a participação da comunidade e regula as transferências 
intergovernamentais, dão contornos mais nítidos às orientações 
constitucionais. 
 A fórmula Saúde - direito de todos, dever do Estado, consagrada como 
princípio constitucional em 1988, sintetiza admiravelmente a concepção de 
uma política social universalista. Resultante de um desenho da Reforma 
Sanitária rompeu e transformou, para melhor, o padrão de intervenção estatal 
no campo social moldado na década de 30. 
 Associado às premissas da Seguridade Social, o projeto de um Sistema 
Único de Saúde traz para o debate nacional a noção de acesso universal ao 
cuidado à saúde, não como uma concessão, mas como direito, provocando a 
formação de um vasto movimento legal e gerencial, nos vários níveis de 
governo, para tomar possível a oferta dos serviços que lhe são inerentes. 
 A instituição de um sistema de saúde de acesso universal e igualitário 
rompe, assim, com o modelo da cidadania regulada e do beneficio como 
privilégio, e assume a obrigação de quitar parte da nossa imensa dívida social, 
daí sua especial importância. 
 O SUS despertou ainda um conjunto de princípios ordenadores da justiça 
social e de eficiência político-administrativa, o que deverá ser retomado em 
vários momentos do nosso curso. 
 
 
Conclusão 
 
 Como vimos, a tendência para um pacto social orientado para a cidadania 
plena vem desde as proposições do II PND, paradoxalmente sob o regime 
militar, até a Constituição de 1988. 
 Entretanto, mesmo com tal evolução, o desenvolvimento social é ainda 
frontalmente questionado pelos defensores do mercado (a orientação 
neoliberal), que atualizam, com bases inteiramente novas, a velha máxima do 
desenvolvimento social como um subproduto do crescimento econômico. 
 A difusão internacional dessa lógica fortaleceu um diagnóstico sobre a 
incapacidade de o modelo organizacional do Estado brasileiro assegurar a 
eficiência e qualidade em seus programas sociais. 
 Realmente, constata-se que, apesar dos avanços descritos, a expansão 
de cobertura, assegurada pelos grandes investimentos sociais estatais, nem 
sempre se refletiu em uma oferta de benefícios mais plena e justa para a 
clientela do sistema. Omite-se, também, o fato de ter tal expansão ocorrido 
freqüentemente sob a tutela de governos falidos ou corruptos, além de estar 
associada à incompetência administrativa; à indefinição de responsabilidades, 
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bem como à utilização clientelista e corporativa dos recursos, envolvendo o 
sistema político-partidário, prestadores de serviço e produtores de insumos,os 
escalões administrativos e o corpo funcional das organizações públicas. 
 Estes problemas não raro agravam-se pela completa inexistência de 
mecanismo de controle e de avaliação dos serviços prestados aos usuários. 
 Tal diagnóstico coloca em debate público a agenda da reforma do Estado. 
Embora as idéias de ineficiência e incapacidade estatal muitas vezes tenham 
origem no pensamento neoliberal, reformar o Estado para orientá-Io aos ideais 
de justiça social é parte importante do projeto de diversas forças políticas que 
acreditam no Estado e em suas instituições para corrigir os efeitos 
concentradores e excludentes do mercado. 
 
 
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