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INTRODUÇÃO AOS DEBATES DE GÊNERO E SEXUALIDADE SST RASCKE, Karla Leandro Introdução aos debates de gênero e sexualidade / Karla Leandro Rascke Ano: 2020 nº de p. 14 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 INTRODUÇÃO AOS DEBATES DE GÊNERO E SEXUALIDADE Apresentação Neste momento, trataremos de oportunizar conhecimento através da disciplina Introdução aos debates de gênero e sexualidade. Estudaremos conceitos relacionados a gênero e relações de gênero no âmbito da sociedade e as lutas por equidade. Iremos também problematizar a respeito das normas sociais e padrões vigorantes, e, iremos estudar ainda os conceitos de sexualidade e diversidade sexual. Será proporcionado também um debate e conhecimento a respeito do movimento feminista e movimento LGBTQIA+ a importância desses movimentos sociais para a sociedade e suas bandeiras de luta como por modelo as relacionadas a gênero, identidade de gênero, sexualidade, diversidade sexual. E, por fim teremos a oportunidade de conhecer e estudar os conceitos de sexualidade, orientação sexual, homoafetividade, heteronormatividade e homofobia. Bons estudos. GÊNERO NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS E DA SOCIEDADE Numa perspectiva social dentro dos parâmetros da sociologia e da psicologia, a noção de gênero tem sido empregada para diferenciar socialmente as pessoas. Essa categoria não é apenas analítica, mas também histórica, no sentido de um contexto predominantemente masculino, em que a mulher sempre ocupou lugar de retaguarda, sendo visibilizada como um gênero fragilizado, e o homem gênero de força e poder. Como enfatiza Carla Bassanezi Pinsky na apresentação da obra de Peter Stearns (2007, p. 11) “[...] gênero é uma forma de enfatizar o caráter social e, portanto, histórico, das concepções baseadas nas percepções das diferenças sexuais. 4 Compete entender gênero para além do termo feminino e masculino, mas dimensionando a identidade do que é ser masculino ou feminino. Na contemporaneidade, a identificação envolve dificuldades e entraves sociais, políticos e mesmo morais, implicando que pessoas que não se veem no sexo em que nasceram, sofram com os ditames da sociedade em relação à identidade. Atenção Desde antes do nascimento de uma criança, com o resultado do ultrassom em mãos, a família começa a moldar seu lugar no mundo, e a partir de suas genitálias é que tudo se definirá. Se for menina, sua cor será rosa - decoração, roupas e acessórios terão a predominância dessa tonalidade. Caso seja menino, o padrão será a cor azul. Com o crescimento das crianças, essa dicotomia continua a ser sentida no modo de se vestir. No entanto, é por meio dos brinquedos e das brincadeiras adquiridos/permitidos para um e para outro - no caso, para outra – que isso será percebido de maneira mais enfática. Sexo é um dado biológico, isto é, tudo aquilo relacionado ao nosso corpo físico (a genitália, os seios, o formato do corpo); Gênero é um fato, uma construção sociocultural. Atenção Essa dicotomia criada pela sociedade do ser masculino e feminino, determinando objetos, cores, modo de ser de meninos e meninas, comportamentos diferenciados para cada tipo de gênero, são coisas advindas e criadas pelo homem, impostas pela sociedade e todos as seguem como uma regra, reforçada de geração em geração. Beauvoir tem uma celebre frase que “ninguém nasce mulher: torna-se” (1980, p. 9). Isso se estende também para os homens. Nesse sentido, a dicotomia entre o ser feminino e/ou masculino não é definida apenas pelo determinismo biológico. Queremos com isso afirmar que, tanto o homem quanto a mulher são produtos de uma dada realidade sociocultural. Foi tentando problematizar essas relações de poder estabelecidas entre homens e mulheres que nasceu o conceito de gênero. 5 O termo surgiu no mundo acadêmico, aproximadamente em meados da década de 1970, em um diálogo constante entre o movimento feminista e pesquisadoras das mais diversas áreas: história, sociologia, antropologia, ciência política, entre outras. Foi por meio dos estudos sobre mulheres que o processo de desnaturalização do papel de submissão/inferioridade, da qual a mulher estava destinada socialmente, passou a ser desconstruído. Como afirmou Louro (2007, p. 55): Para que se compreenda o lugar e as relações de homens e mulheres numa sociedade importa observar não exatamente seus sexos, mas sim tudo que socialmente se construiu sobre eles. No entanto, cabe ressaltar que os papeis de gênero se estabelece no cotidiano, em um jogo constante de poder e resistência. Essas relações estão em todos os campos: educação, saúde, trabalho, política, religião e nos momentos de lazer. A respeito de abordagens sobre diversidade sexual e de gênero, sugerimos consultar o site “Grupo de Pesquisa Sexualidade e Escola”, em que você irá encontrar teses, dissertações, livros em pdf, indicações diversas de material relacionado ao tema: <http:// sexualidadeescola.furg.br/index.php>. Acesso em: 23 de set. de 2020. Saiba mais IDENTIDADE DE GÊNERO, ORIENTAÇÃO SEXUAL E DIVERSIDADE SEXUAL A identidade de gênero está associada, de maneira direta, à subjetividade, à percepção que determinada pessoa tem sobre si, sobre ser masculino ou feminino, ou ainda sobre ser ora um, ora outro. A maneira como a pessoa se vê, se sente e se apresenta para a sociedade na condição de homem ou mulher (ou de ambos como é o caso de algumas travestis), no entanto, não está vinculada ao sexo biológico nem à orientação sexual. 6 Nesse sentido, a partir do conceito de identidade de gênero é possível percebermos que possuir determinada genitália (pênis ou vagina) não obriga ninguém a se sentir pertencente a este ou aquele grupo (masculino ou feminino). Assim, quando uma pessoa nasce com um pênis, órgão referente ao sexo biológico do homem, mas entende que sua ação e sua visão enquanto sujeito humano é de uma mulher, ela tem a identidade de gênero feminina e, neste caso, seu corpo biológico não condiz com sua identidade de gênero. Sobre identidade de gênero Fonte: Plataforma Deduca (2020) Identidade de gênero é um termo ainda recente e sua origem remete ao campo médico-psiquiátrico, no intuito de diagnosticar os efeitos da divergência entre o sexo biológico e a identificação subjetiva com o sexo oposto ao que a pessoa detém, o chamado “transtorno de identidade de gênero”. Atualmente, além da área médica, outras áreas do conhecimento têm discutido e se apropriado dessa noção para discutir as divisões e os papéis incutidos em homens e mulheres na sociedade a partir de um dado que é o seu sexo biológico. Se gênero é um fenômeno social e não biológico, a identidade de gênero também não se prende a esse determinismo, ou seja, uma pessoa se identifica independente do seu sexo biológico. Assim: Temos os humanos ‘cis’ (do latim, do mesmo lado), as pessoas cuja identidade de gênero está ao lado do que socialmente se estabeleceu como o padrão para o seu sexo biológico; e os humanos ‘trans’ (do latim, 7 para além de), pessoas cuja identidade de gênero é diferente do que foi estabelecido socialmente como padrão para seu sexo biológico (WOLFF; SALDANHA, 2015, p. 32). Aqui entram em cena outros dois personagens: transexuais e travestis. Pessoas transexuais são aquelas que não se identificam com a genitália que possuem, sentem-se o oposto, assumindo uma identidade de gênero diferente da que lhe foi determinada geneticamente. É importante frisar que um grande número delas, não todas, deseja – e algumas efetuam – a mudança de sexo, um jeito de resolver esse conflito de não pertencer ao corpo no qual nasceu. O homem trans é quem nasceu com genitália feminina, mas assumiu uma identidade de gênero masculina. Já a mulher trans é a identidade de gênero feminina em um corpo com genitália masculina. Conheça a “Série Educação e Diversidade Sexual”, vídeo educativo sobre diversidadesexual e educação: <https://www.youtube.com/ watch?v=gB-GMQzo7kg>. Acesso em: 23 de set de 2020. Saiba mais Desse modo, a partir do conceito de gênero podemos compreender que a organização binária da sociedade, dividida entre mulher e homem, gerou – e ainda gera – preconceito, discriminação, opressão e violência, ainda mais quando há um jeito “certo” de ser homem e de ser mulher. Orientação sexual A Orientação sexual se refere à direção e às pessoas para as quais emanamos nossos desejos, nossos afetos. É a maneira que uma pessoa sente atração por outra. Uma pessoa pode se sentir atraída por um homem, por uma mulher ou por ambos. Há também quem não sente atração sexual por nenhuma outra, ou que sente atração por pessoas, independentemente de seu sexo biológico ou sua identidade de gênero. Vamos às especificidades: 8 Esquema sobre orientação Sexual PANSEXUAL ASSEXUAL BISSEXUAL HETEROSSEXUAL HOMOSSEXUAL Pessoa que sente atração por outras pessoas, indiferente de seu sexo biológico e sua identidade de gênero - mulher, pessoa trans, homem. Pessoa que não tem atração sexual por nenhuma outra pessoa, nem homem, nem mulher, nem ninguém. Pessoa que sente atração por pessoas de ambos os sexos. (homem/mulher-homem, mulher/ mulher-homem). Pessoa que sente atração por pessoas do sexo oposto (homem/mulher, mulher/homem). considerado como cis-gênero. Pessoa que sente atração por pessoas do mesmo sexo (homem/homem, mulher/mulher). Fonte: Elaborado pela autora (2020). Mas, e quando se é transgênero? Eles são homossexuais ou heterossexuais? Uma travesti que se relaciona com um homem é hétero, da mesma forma, quando um homem trans (sexo biológico feminino e identidade de gênero masculina) namorar uma mulher, isso também é um relacionamento heterossexual. No entanto, se esse mesmo homem trans namorasse um homem seria um relacionamento homossexual. Nesses casos seria preciso não se atentar para o sexo biológico, mas, para a identidade de gênero. Ainda, como abordagem importante, para finalizar este tópico, duas questões demandam evidência: muitas pessoas utilizam a expressão opção sexual, e isso 9 é um equívoco, pois remete a uma escolha, como se fosse possível escolher mecanicamente, de forma metódica e linear quem seria seu objeto de desejo. Outro aspecto demanda pensar a norma, ou seja, as pessoas indicam o que elas acham certo e errado e, em nossa sociedade, ainda nos dias de hoje, por mais que tenhamos debates em torno de identidade de gênero, orientação e diversidade sexual, muitas pessoas consideram “normal” apenas a heteronormatividade. Heteronormatividade: conjunto de ações e práticas que normatizam a sexualidade, que cria um padrão de orientação sexual como norma, como se fosse algo dado, natural, ignorando as outras formas de desejo, atração e afeto. Como consequência, quem não se encaixa nesse padrão são erradas, divergentes, aberrações. Em suma, heteronormatividade é tudo aquilo que desconsidera, inferioriza e exclui todas as outras orientações sexuais que não a heterossexual. Homofobia: no sentido literal da palavra, significa medo, repulsa da homossexualidade e dos homossexuais, no entanto, há muita discussão em torno desse conceito. Podemos entender a homofobia como ódio às pessoas que não se encaixam no comportamento heteronormativo. Na prática, é o preconceito, a inferiorização e a violência contra os homossexuais. Curiosidade Diversidade sexual Um movimento reacionário tende a conservar uma sociedade embasada no patriarcado, moralista, cuja manifestação mais expressiva e evidente é o machismo. Um machismo que na maioria das vezes é verbal, mas que alimenta diariamente todo tipo de violência contra as mulheres ou contra grupos LGBTQIA+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexuais, Qeens e assexuais e mais outras identidades). O fundamento desses discursos, que acabam propagando o ódio a estes grupos sociais, reduz a questão sexual à moralidade social. 10 Diferença entre sexo, orientação sexual e identidade de gênero. MULHER HÉTERO FÊMEA } IDENTIDADE DE GÊNERO É a maneira como você se enxerga; o gênero que se identifica como fazendo parte. ORIENTAÇÃO SEXUAL Indica pelo que você sente atração. Mostra pra que lado sua sexualidade está orientada. SEXO BIOLÓGICO É sua genitália e cromossomos quando veio ao mundo. HOMEM HOMO MACHO BI INTERSEXUAL Pessoa que se indentificam com mais de um dos gêneros como travestis ou com nenhum deles. } Fonte: Plataforma Deduca (2020) Embora sejamos, por nascimento, homem ou mulher e em casos raros intersexual, não podemos entender a diversidade sexual somente por isso, pelo nosso sexo biológico. Diversidade sexual vai além das nomenclaturas, é um conjunto de vivências, são nossas práticas, nossos desejos, nossos comportamentos, nossas expressões, a forma como agimos, como vemos e como mostramos a nossa sexualidade. TRAJETÓRIAS DE MOVIMENTOS FEMINISTAS E LGBTQIA+ O movimento feminista pode ser definido como um movimento social que defende a equidade entre homens e mulheres, conquistado por meio do empoderamento feminino, ou seja, a libertação da mulher da submissão aos padrões patriarcais. Inicialmente as lutas estavam pautadas em direitos políticos, ou melhor, no direito de votar e ser votada. Menos de 100 anos atrás, as mulheres não tinham o direito de votar e muito menos de serem votadas, não tinham o direito de estudar ou de trabalhar fora do lar. Eram tuteladas por homens, primeiro por seus pais, depois pelos maridos. Nem ao menos eram donas de seus corpos. 11 No Brasil, o movimento feminista da primeira onda buscou inspiração nos Estados Unidos e países europeus. Assim, o direito ao voto foi a principal pauta de reinvindicação nas primeiras décadas do século XX. O sufrágio feminino foi o motivo que fez com que as mulheres brasileiras se reunissem em torno de uma pauta. No entanto, não podemos pensar em um grupo amplo de mulheres. Em sua maioria, eram universitárias que tiveram contato com o movimento sufragista em outros países. Em 1932, por meio de um decreto provisório, as mulheres garantiram o direito de votar, que só aconteceu efetivamente no ano seguinte. E assim, no ano de 1933, as mulheres brasileiras foram até às urnas para concretizarem o direito conquistado. No entanto, somente um ano depois o direito de voto para as mulheres foi garantido pela Carta Magna de 1934. As reivindicações principais da segunda onda feminista (décadas de 1960-1970) foram pautadas em duas frases de ordem: o privado é político e nosso corpo nos pertence. As questões referentes ao espaço privado – como, por exemplo, a violência doméstica, o controle sobre o corpo, o direito ao prazer, os direitos reprodutivos – passaram a ser apontadas como questões sociais, ou seja, como objeto de políticas públicas. Nesse contexto, surge a pílula anticoncepcional, em meados dos anos de 1960 e as mulheres passam a ter um controle maior sobre seu corpo, entram em número significativo no mercado de trabalho, mas continuam na luta pela desconstrução da sociedade sexista pautada no determinismo biológico. Em 1975, foi decretado o Ano Internacional da Mulher, pela Organização das Nações Unidas (ONU), que instituiu a década seguinte como a década da mulher. As feministas da terceira onda focaram no que chamaram de micropolítica. O direito de igualdade na diferença foi a pauta dessa onda. Inicialmente, o próprio movimento passou por indagações que resultaram em novas ideias e estratégias. Movimento LGBTQIA+ No Brasil, a movimentação em torno das questões da comunidade homossexual começou na década de 1980, quando foi realizado o 1º Encontro Brasileiro de Homossexuais, na cidade de São Paulo. Foi também nesse período que surgiram os primeiros grupos organizados. 12 É importante ressaltar que anterior a esse momento, alguns eventos já marcavam as discussões sobre a temática. Um exemplo foi o Jornal Lampião, fundadoem 1978, que tinha por objetivo discutir as temáticas referentes à homossexualidade. Com forte influência desse periódico, surgiu o primeiro grupo homossexual do Brasil, o Somos de São Paulo. No final da década de 1980, muitos desses grupos sofreram desarticulações em virtude do advento da AIDS e da associação dessa como uma “epidemia gay”. Isso implicou que muitas pessoas ficaram receosas de assumir sua orientação sexual e serem associadas ao HIV. Nesse período começaram a surgir grupos de apoio à AIDS, articulando uma discussão mais ampla sobre a doença e a homossexualidade, no intuito de informar, proteger e romper preconceitos existentes sobre esses grupos. Bandeiras em apoio às causas LGBTQIA+ Fonte: Plataforma Deduca (2020). Nesse período, os grupos ativistas começaram a agir de maneira mais pragmática. Em 1994, articularam uma organização nacional, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). A organização, que iniciou com pouco mais de 10 grupos, atualmente é uma rede nacional com aproximadamente 300 organizações da comunidade LGBTQI+A. Além da organização desses grupos e encontros, não podemos deixar de mencionar um fator que merece destaque sempre que se fala em público homossexual: as paradas da diversidade. A primeira aconteceu no Rio de Janeiro, em 1995, e dois anos depois, aconteceu a segunda edição, em São Paulo. Importante direito alcançado é a legalidade da união estável entre pessoas do mesmo sexo. O reconhecimento aconteceu em maio de 2011, pelo Supremo Tribunal 13 Federal. Esse fator é importante não apenas pelo reconhecimento social da união, mas também porque o casamento civil entre homossexuais garante os mesmos direitos que o casamento entre heterossexuais: inclusão em plano de saúde e seguro de vida, pensão alimentícia, direito sucessório e divisão dos bens adquiridos. Para finalizar, uma das pautas mais recorrentes da luta LGBTQIA+ é a criminalização da homofobia. Em um primeiro momento, a criminalização da homofobia não consiste em criar um estatuto intitulado homofobia, mas o de incluir o crime de homofobia em tipos penais já existentes. Atualmente existem alguns projetos de Lei da Câmara que visam essa iniciativa. Fechamento Estudamos conceitos relacionados a gênero e relações de gênero no âmbito da sociedade e as lutas por equidade, problematizando normas e padrões vigentes, estudamos também os conceitos de sexualidade e diversidade sexual. Foi debatido também informações acerca do movimento feminista e movimento LGBTQIA+ a respeito da relevância desses movimentos sociais para a sociedade e suas bandeiras de luta como por exemplo as relacionadas a gênero, identidade de gênero, sexualidade, diversidade sexual. E, por fim tivemos a oportunidade de descobrir e conhecer os conceitos de sexualidade, orientação sexual, homoafetividade, heteronormatividade e homofobia. Contudo aprendemos também que há muitas questões envolvendo sexualidade, gênero e diversidade geram polêmicas e/ou envolvem tabus da sociedade, necessitando atenção e cuidados no desenvolvimento de abordagens e análises, de modo a compreender a multiplicidade de sujeitos sociais e suas lutas por dignidade e direito à vida. 14 Referências BEAUVOIR, S. de. O Segundo Sexo, Tradução Sérgio Milliet, v. I, II. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. LOURO. G. L. O corpo educado: pedagogia da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. STEARNS, Peter. História das relações de gênero. Tradução de Mirna Pinsky. São Paulo: Contexto, 2007. SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade. Porto Alegre, v. 20, n. 2, p. 71-99. jul./dez. 1995. WOLFF, C.S; SALDANHA, R.A. Gênero, sexo, sexualidades. Categorias do debate contemporâneo. In: Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 9, n. 16, p. 29-46, jan./jun. 2015. ANTROPOLOGIA GÊNERO E SEXUALIDADE SST BONETTI, Luisa; RANGEL, Natalia Antropologia gênero e sexualidade / Luisa Bonetti; Natalia Rangel Ano: 2020 nº de p. 11. Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 ANTROPOLOGIA GÊNERO E SEXUALIDADE Apresentação Neste momento, trataremos de apresentar informações e conhecimento a respeito da Antropologia Gênero e Sexualidade. Estudaremos sobre a vertente na Antropologia na educação e outras formas de estudos em Antropologia como: Antropologia rural, urbana, Antropologia de Gênero e Sexualidade. Também estudaremos a respeito do conceito e concepção sobre a Etnologia. E, por fim, iremos conhecer a importância de estudar sobre a Antropologia da religião e suas religiosidades, ressaltaremos o quanto é fundamental na formação de qualquer profissional estudar e ter conhecimento a respeito desses temas estudados para que possa se auxiliar nos processos de respeito e inclusão social. Fique atento a todas as informações presentes aqui, e vamos juntos ao processo de conhecimento e aprendizagem a respeito da relevância desses assuntos. Bons estudos. ANTROPOLOGIA DA EDUCAÇÃO A discussão sobre educação no campo da Antropologia sociocultural possibilitou o olhar sobre diferentes formas de conceber a formação do ser humano. Além de ativar um olhar mais crítico à percepção dos teóricos e planejadores da Educação sobre a diversidade cultural do país, a disciplina possibilitou contato com metodologias e práticas diferentes em relação à educação. Quando falamos em educação, é normal que pensemos no espaço do ensino regular, ou seja, da escola. No entanto, a educação faz parte da formação do indivíduo desde o momento em que nasce, estando o seu conteúdo constituído de normas e valores culturais. Mãe ensinando filha Fonte: Plataforma Deduca (2020) 4 A Antropologia trouxe para a Educação nas escolas a necessidade de levar em consideração as especificidades de cada grupo identitário brasileiro, seja étnico, religioso, de gênero ou sexualidade. As perspectivas históricas que geralmente vemos nos livros escolares são eurocêntricas, ou seja, têm uma explicação da história do mundo baseada a partir da Europa, deixando uma vastidão cultural de lado. A escola não é, portanto, um espaço isolado da sociedade, devendo tratar dos temas presentes no cotidiano dos indivíduos para que eles possam desenvolver uma visão crítica sobre os problemas sociais e aprenderem a viver com as diferenças socioculturais. É importante, assim, que se faça a aliança entre o estudo da educação e da sociedade, e da cultura e do meio ambiente que está em seu entorno como veremos melhor no ponto a seguir. Antropologia rural e urbana O meio ambiente que nos envolve é parte essencial de nossa cultura, isto é, de como nos comunicamos, como dividimos nosso tempo, da nossa alimentação, da forma como nos vestimos, do que celebramos, da forma como garantimos nossa sobrevivência, de nossas crenças, entre tantos outros fatores. Antropologia rural A Antropologia rural diz respeito ao estudo das formas de viver das pessoas que vivem no meio rural, ou seja, que vivem do campesinato. Com a urbanização das sociedades modernas, muitas vezes a vida no campo é vista como dissociada da vida urbana, mas esses dois meios ambientes são interdependentes, ou seja, necessitam um do outro para que as pessoas garantam sua sobrevivência. O campesinato faz parte de nossa cultura Fonte: Plataforma Deduca (2020) 5 O estudo dos hábitos e dos costumes é um dos pontos centrais dessa área de estudo. Por exemplo: muitos gaúchos tomam chimarrão. No entanto, qual o significado desse costume? Podemos pensar no hábito de tomar chimarrão de diferentes formas. Dependendo do contexto, o ato de tomar chimarrão pode mudar de significado, sendo interpretado como: • um momento de coletividade, uma vez que, muitas vezes, senta-se em roda durante esta prática, tratando-se de um momento de dividir, conversar e compartilhar percepções em grupo; • um momento de afirmação da identidade, visto que há o compartilhamentode códigos próprios daquele grupo.Entre muitas outras possibilidades, criar rituais, hábitos e construções familiares mais estreitas é uma das caracterís- ticas da população rural. Antropologia urbana Com a crescente industrialização, as sociedades foram urbanizando-se cada vez mais. Um dos temas centrais da Antropologia urbana é a segregação espacial nas cidades. O que isso significa? Enquanto pessoas em melhor condição socioeconômica costumam viver em regiões mais centrais das cidades e têm acesso ao abastecimento de energia elétrica, rede de esgoto, além de localização mais próxima ao local de trabalho, as pessoas em piores condições socioeconômicas, com frequência, não possuem acesso ao saneamento básico, além de, em geral, trabalharem em locais distantes de suas moradias. Favela diante de prédios modernos em uma cidade Fonte: Plataforma Deduca (2020) A Antropologia urbana possibilitou um olhar na história da inauguração da Antropologia sociocultural reservado apenas aos povos indígenas: Até o presente, a antropologia, a ciência do homem, tem-se preocupado principalmente com o estudo dos povos primitivos. Mas o homem 6 civilizado é um objeto de investigação igualmente interessante, e ao mesmo tempo sua vida é mais aberta à observação e ao estudo. A vida e a cultura urbanas são mais variadas, sutis e complicadas, mas os motivos fundamentais são os mesmos nos dois casos. Os mesmos pacientes métodos de observação despendidos por antropólogos tais como Boas e Lowie no estudo da vida e maneiras do índio norte-americano deveriam ser empregados ainda com maior sucesso na investigação dos costumes, crenças, práticas sociais e concepções gerais de vida que prevalecem em Little Italy, ou no baixo North Side de Chicago, ou no registro dos folkways mais sofisticados dos habitantes de Greenwich Village e da vizinhança de Washington Square em Nova York. (VELHO, 1987, p. 28, grifo do autor). A urbanização possibilitou a concentração de muitas pessoas em menores espaços e, por isso, o contato entre pessoas muito diferentes entre si. Isso tornou possível, ao mesmo tempo, um maior contato entre grupos diferentes e a divisão desses grupos em tribos como os punks, os hipsters, os hippies, os góticos, os playboys etc. O estudo e o mapeamento dessas tribos também fazem parte do trabalho do antropólogo que estuda urbanidades. A vida nas sociedades urbanas contemporâneas ao mesmo tempo que une muitas pessoas em um pequeno espaço físico traz a sensação de solidão com a crescente individualização típica da organização de trabalho da sociedade neoliberal (BAUMAN, 2007). A Antropologia urbana brasileira possui uma tradição de autores renomados como Gilberto Velho, Arantes, José Guilherme Cantor Magnani e Proença Leite. Saiba mais Etnologia A etnologia é uma das principais áreas de estudo da Antropologia, inaugurando-a na Europa. Essa área de estudos compreende a análise sobre povos e culturas partindo de uma perspectiva comparativa. 7 A etnologia indígena é uma das principais áreas de estudo da Antropologia sociocultural no Brasil. As descrições sobre grupos indígenas no Brasil vêm sendo feitas desde a época da chegada dos portugueses ao país, de forma rica e detalhada. No entanto, essas descrições iniciais do período da colonização eram feitas com forte caráter moralista. Uma das famosas referências a esse período é a carta enviada a Portugal por Pero Vaz de Caminha. Os jesuítas procuraram entender aspectos como as regras matrimoniais e o idioma tupi. O padre Anchieta foi um desses estudiosos da cultura indígena. (MARCONI; PRESOTTO, 2013). O interesse não vinha, todavia, sem intenções por parte dos jesuítas. Estes estavam preocupados em converter os indígenas ao catolicismo como parte do projeto de controle colonizador. Agora, vamos entender o desenvolvimento da pesquisa científica etnológica no Brasil a partir de Marconi e Presotto (2013). A investigação científica começou a partir da metade do século XIX, com a sistematização de estrangeiros sobre os costumes dos indígenas brasileiros. Atenção Na segunda metade do século XIX, ocorreram expedições de pesquisadores estrangeiros, em especial europeus, ao interior do país, com o objetivo de contatar grupos indígenas para compreender melhor a natureza humana e as especificidades dos indígenas em solo brasileiro. No século XX, finalmente ocorrem as contribuições à etnologia brasileira por parte de antropólogos brasileiros, sendo de importância a participação do general Rondon nas expedições que buscavam amenizar os conflitos em áreas de habitação indígena. Rondon é o fundador do Serviço de Proteção aos Índios. A etnologia no Brasil vem se desenvolvendo cada vez mais e tem envolvimento direto com questões políticas. São requeridos laudos antropológicos pelo Governo em questões relacionadas aos direitos humanos indígenas. Algumas das principais áreas de estudo dos etnólogos são: direito de posse de terra indígena, etnia e cidadania, religião, magia, farmacologia, rituais, política e economia. 8 Além dos indígenas brasileiros, a etnologia reserva seus estudos a diferentes etnias pelo mundo, tratando de povos nórdicos, africanos, asiáticos, etc. É importante a análise antropológica das formas de integração ou exclusão desses grupos na sociedade a partir de fronteiras materiais ou simbólicas. ANTROPOLOGIA, GÊNERO E SEXUALIDADE A temática de gênero e sexualidade se ampliou e vem sendo assunto da Antropologia desde os seus primórdios. Uma das célebres obras da Antropologia sobre o assunto é o livro “Sexo e temperamento”, da antropóloga cultural Margaret Mead, publicado em 1935. Nessa obra, a autora analisa os aspectos relacionados à divisão sexual das tarefas em três tribos diferentes: os Arapesh, os Mundugumor e os Tchambuli. Nas referidas tribos, a divisão sexual das tarefas e as características do temperamento dos sexos masculino e feminino diferem completamente entre si e da própria cultura da autora. Sobre isso, a autora afirma: Se aquelas atitudes temperamentais que tradicionalmente reputamos femininas – tais como passividade, suscetibilidade e disposição de acalentar crianças – podem tão facilmente ser erigidas como padrão masculino numa tribo, e na outra ser prescritas para a maioria das mulheres, assim como para a maioria dos homens, não nos resta mais a menor base para considerar tais aspectos de comportamento como ligados ao sexo. E esta conclusão torna-se ainda mais forte quando Fica clara a importância dos aspectos culturais na divisão do papel social nas sociedades, variando por completo de uma para a outra. Mead acabou por questionar o argumento sobre a ideia de que há papéis “naturais” que homens e mulheres devem cumprir de acordo com seus aspectos meramente biológicos. O que é ser mulher? O que é ser homem? A Antropologia é influenciada por diferentes perspectivas sociais, bem como pelos próprios movimentos sociais. A influência do movimento feminista na Antropologia inaugurou uma nova fase nos estudos sobre gênero. Pensadoras feministas como Simone de Beauvoir, Judith Butler, Bell Hooks, Gloria Anzaldúa, Angela Davis, entre outras, foram de suma importância para o desenvolvimento da teoria antropológica sobre gênero e sexualidade. 9 Uma das maiores contribuições do desenvolvimento teórico sobre o tema foi a distinção entre gênero e sexualidade, antes muitas vezes confundidos. A historiadora Joan Scott (1990) foi uma das primeiras a esclarecer a diferenciação entre gênero e o antigo esquema binário e biologicista que se dividia entre sexos feminino e masculino. A autora coloca que a diferenciação mais complexa de gênero existente na sociedade também se relaciona com fatores sociais como classe social, papel na família, poder político, entre outros fatores. Saiba mais A identidade de gênero foi objeto de estudo de muitas pesquisadoras, em especial feministas, e pesquisadores. Uma das autoras que contribuiupara o debate na contemporaneidade foi Judith Butler (2003). A partir de sua teoria queer, a autora foi capaz de desconstruir ainda mais as ideias binárias sobre gênero, entendendo a performance dos seres humanos, ou seja, a forma como se vestem, como se comportam, etc., e, principalmente, se compreende, como fatores determinantes na construção da identidade de gênero que possui grande diversidade. Seguindo o pensamento desenvolvido pela teoria queer, as diferentes classificações de gênero podem ser definidas em: • cisgênero: pessoas que têm o gênero que combina com o gênero designado à pessoa no nascimento. • transgênero: pessoas que têm um gênero diferente ao designado no nasci- mento. • intersexual: pessoas que possuem desde o nascimento genitália feminina e masculina ou ambivalência cromossômica, impossibilitando a definição pré- via por um gênero ou outro; • gender-fluid (gênero fluido): pessoas que não se identificam com apenas um gênero, transitando entre eles. Butler (2003) reforça a importância de diferenciarmos gênero e sexualidade. A identidade de gênero tem a ver com ser homem cisgênero, mulher cisgênero, homem transgênero, mulher transgênero e pessoas com gênero fluido. 10 A orientação sexual é a afinidade afetiva que norteia as relações amorosas e sexuais. Tipos de sexualidade: • homossexual: pessoas que sentem atração por pessoas do mesmo sexo. Co- nhecidos como gays, no caso dos homens, e lésbicas, no caso das mulheres; • bissexual: pessoas que sentem atração por pessoas de ambos os sexos; • heterossexual: pessoas que sentem atração por pessoas do sexo oposto; • pansexual: pessoas que sentem atração por outras pessoas independente- mente do sexo ou gênero delas; • assexual: pessoas que não sentem atração sexual (o que não impede, neces- sariamente, que desenvolvam relações amorosas). A sigla LGBTQIA significa lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queers, intersexuais e assexuais, misturando, portanto, identidades de gênero e sexualidade. Saiba mais Com o crescimento da democratização nas sociedades de Estado, os movimentos sociais que lutam pelos direitos LGBTQIA puderam ocupar um maior espaço na política mundial, consolidando, por exemplo, a homofobia como crime, apesar de ainda ser difícil realizar denúncias e de obter provas de tais crimes. Entretanto, o que isso tem a ver com a Antropologia? Uma vez que uma das bases da Antropologia é compreender o mundo a partir de outro olhar, ela também possibilita o exercício da empatia. Antropologia da religião A religião é um dos temas clássicos da Antropologia, porque todas as sociedades apresentam pessoas com algum tipo de crença ou fé. Para Marconi e Presotto (2013), é importante realizar a distinção entre religião e magia para os estudos antropológicos: “A primeira e mais curta definição de religião foi dada por Edward Tylor: ‘a crença em seres espirituais’” (MAIR, 1972 apud MARCONI; PRESOTTO, 2013, p. 150). Já a magia recorre a um conjunto de técnicas para controlar o sobrenatural. 11 Antropólogos dedicaram seus estudos a entender o porquê da existência das religiões e suas principais características em comum a partir do método comparativo de pesquisa: As sociedades, frequentemente, desenvolvem normas de comportamento com a finalidade de se precaver contra o inesperado, o imprevisível, o desconhecido, e de estabelecer certo controle sobre as relações entre o homem e o mundo que o cerca. [...] Por meio de cultos e rituais, públicos ou privados, os homens tentam conquistar ou dominar, pela oração, oferendas, sacrifícios, cantos, danças etc., a área de seu universo não submetida à tecnologia. (MARCONI; PRESOTTO, 2013, p. 150). As normas religiosas vão estabelecer um elemento de união, controle e identificação entre os membros de uma religião. Elas também auxiliam os indivíduos a se portar e a como encarar crises, problemas e instabilidades. O poder (conhecido como mana em Antropologia) sobrenatural pode habitar pessoas, objetos ou deuses. De acordo com Marconi e Presotto (2013), o tabu é uma proibição ou alerta da religião para que não se cometa determinado ato, sendo considerado pela religião uma infração passível de punição do sobrenatural ao indivíduo que o ultrapassou. Assim, por meio de um conjunto de normas, é possível estabelecer a conduta proferida pela religião, funcionando como forma de controle sobre os fiéis. Um exemplo de tabu para algumas religiões é o aborto. É importante entender como a religião opera em diferentes culturas e sociedades, porque ela influencia muitas vezes no comportamento, na Educação, na política e na economia. Que tipo de influência religiosa você consegue perceber na política brasileira? Que tabus influenciam nas decisões e projetos de lei de nosso Congresso? Curiosidade Destarte, ainda existem muitos preconceitos religiosos que fazem com que criemos estereótipos xenofóbicos de alguns grupos por causa de sua religião. Alguns exemplos da atualidade são os muçulmanos, que vêm sofrendo ataques por causa 12 das ações de grupos extremistas dessa religião (que têm implicações político- econômicas), além da Umbanda e do Candomblé no Brasil, que, frequentemente, são vistas por religiões cristãs como “do mal”, fomentando ações violentas contra terreiros. Por fim, é importante entendermos o que há em comum entre as religiões e o que as diferencia, respeitando as diferentes formas de relacionar-se com o sobrenatural que os seres humanos desenvolveram. Fechamento Aprendemos que a Antropologia trata de diversos temas que perpassam nossa realidade cotidiana. A Antropologia da educação contribuiu para o conhecimento de formas educativas completamente diferentes bem como para a implementação de políticas educacionais voltadas à diversidade cultural e à pluralidade no ambiente escolar. Estudamos também que as Antropologias rural e urbana colocam em pauta a questão territorial na forma de organização da vida, criação de hábitos e formas de manifestação cultural dos seres humanos e estudamos também o conceito de etnologia. Por fim, apreendemos que Antropologia, gênero e sexualidade tendo entendimento de que as diferenças entre homens e mulheres não são inatas, mas uma de suas principais premissas é também sofrer influência cultural e social. 13 Referências BAUMAN, Z. Vida líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2007. BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Tradução de Renato Aguiar. Rio de janeiro: Civilização Brasileira, 2003. MARCONI, M. de A.; PRESOTTO, Z. M. N. Antropologia: uma introdução. São Paulo: Atlas, 2013. MEAD, M. Sexo e temperamento. São Paulo: Perspectiva, 1979. SCOTT, J. Gênero: Uma Categoria Útil de Análise Histórica. Educação & Realidade, Porto Alegre-RS, v. 15, n.2, p. 71-99, Jul/Dez, 1990. VELHO, O. (Org.). O fenômeno urbano. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987. PADRÕES CORPORAIS: DIFERENÇA E PRECONCEITO SST MATOS, Nathalia Cristina Padrões corporais: diferença e preconceito / Nathalia Cristina Matos Ano: 2020 nº de p. 13 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 PADRÕES CORPORAIS: DIFERENÇA E PRECONCEITO Apresentação Neste momento, trataremos de um assunto extremamente importante na área de humanas que é estudar a respeito de conceitos relacionados a diversidade da família, crenças, raça, gênero e o quanto que a educação é considerada um caminho para realizar esse debate na perspectiva de orientar para o respeito e, por conseguinte para o fim de atitudes de preconceitos. Também você estudará sobre o corpo, enquanto uma arena para as múltiplas diversidades, para o respeito a diversas formas, debatendo com base na categoria gênero. E, por fim, terá informações de que a educação é a possível alternativa para desenvolver ações que auxiliam no arrefecimento de práticas de preconceitos. Fique atento a todas as informações presentes aqui, e vamos juntos ao processo de conhecimento e aprendizagema respeito desses importantes assuntos. Bons estudos. Padrões corporais e a ideia de normal, estranho e excêntrico Vivemos em uma sociedade em que padrões sempre foram estabelecidos, e aquilo que fosse diferente, seria marginalizado e discriminado. Segundo Louro (2006), desde o nascimento somos familiarizados com padrões definidos pela cultura na qual estamos inseridos. Hegemonicamente, os referenciais culturais preconizam que o ideal é ser homem, branco, esbelto, bem-sucedido, heterossexual e cristão. De fato, os sujeitos são, ao mesmo tempo, homens ou mulheres, de determinada etnia, classe, sexualidade, nacionalidade; são participantes ou não de uma determinada confissão religiosa ou de um partido político. De acordo com Louro (2006), não se pode entender essa multiplicidade identitária como se elas fossem somadas ao longo da vida, pois elas estão todas presentes simultaneamente e têm, antes disso, uma relação relacional de uma para com a outra. Cada pessoa tem o direito de ir e vir, e, além disso, tem direito de escolha, sendo que cada uma delas deve ser respeitada por todos, mesmo que haja divergência de ideias. Nesse mesmo sentido, todos têm sua história, sua formação, sua cultura e suas opiniões. Portanto, devemos respeitar e temos direito de ser respeitado. 4 Opiniões e questionamentos diversos Fonte: Plataforma Deduca (2020) O ideal de normalidade sempre foi determinado pelos indivíduos ditos hegemônicos, que escreveram a história da sociedade a partir dos seus próprios pontos de vista, normalmente embasados em preceitos religiosos. Dessa forma, os padrões ditos normais passaram a ser considerados como algo natural, e as características que não fossem enquadradas nesses modelos seriam consideradas estranhas, excêntricas, exóticas e até anormais. As diferenças entre gênero, cor, etnia, nacionalidade, regionalidade, condição social, sexualidade e religiosidade são todas utilizadas como pretexto para que se questionem os padrões vigentes. Se o normal é ser branco, se for negro é estranho, se for indígena é exótico, pois foge do “normal”, mas esse é o ponto de vista de quem? Será que só quem é de cor branca pensa assim? A seguir, temos o exemplo de documentário no qual os papéis masculinos e femininos são invertidos em um projeto que se assemelha a um documentário cômico, mas que nos leva a uma reflexão muito interessante. O curta-metragem “Acorda, Raimundo, acorda!” (Brasil, 1990) reflete sobre a tradicional construção de masculinidade. Os papéis de gênero e a validação homossocial do ser homem são invertidos, hipoteticamente, no sonho do personagem. As mulheres eram humilhavam os homens e saíam para trabalhar, enquanto os homens ficavam em casa cuidando dos filhos e das atividades domésticas, comportando-se de forma submissa. O curta aborda questões sociais e de gênero e está disponível no link <https:// www.youtube.com/watch?v=HvQaqcYQyxU&feature=youtu.be>. Acesso em: 14 de set. de 2020. Saiba mais 5 Segundo Louro (2006, p. 43): “Dizer que as mulheres são diferentes dos homens se constitui, a princípio, numa afirmação irrefutável”. A mulher é biologicamente diferente do homem, possuindo características fisionômicas e sistêmicas singulares. Se considerarmos as fisionomias, veremos que os aspectos masculinos e femininos são muito marcantes e destacam essas diferenças. No entanto, não deveríamos ampliar as diferenças para além de questões e aspectos biológicos e físicos, uma vez que, quanto aos direitos e deveres, todos deveríamos ser tratados igualmente. Sabemos que nem sempre é isso o que acontece. Sempre ouvimos dizer que tal tarefa é melhor quando é feita por mulher, pois são mais delicadas e atenciosas, por exemplo. Entretanto, as características pessoais e o estilo de vida são moldados de maneiras diferentes entre os homens e mulheres. É muito comum, por exemplo, encontrar homens que são excelentes cozinheiros, tarefa que tradicionalmente costumava ser atribuída às mulheres. Da mesma forma, homens podem ser atenciosos e delicados, e as mulheres também podem ser fortes. Para alguns, ver um homem atuando como cozinheiro e uma mulher trabalhando, por exemplo, como engenheira, em uma construção pode parecer estranho. Mas o estranhamento é gerado por visões que foram construídas antes da nossa geração e foram reproduzidas. Qualquer situação que aparente a inversão de papéis deve ser respeitada, pois cada um tem direito de livre escolha. O filme “Vista minha pele” (Brasil, 2003) aborda a questão do preconceito de uma maneira muito criativa, invertendo os papéis entre as etnias branca e negra no ambiente escolar. Maria, a personagem principal, branca e pobre, estuda em um colégio particular, onde ganhou uma bolsa de estudos e queria ganhar o concurso de “miss festa junina”. A história se desenrola de forma muito reflexiva, mostrando que somos diferentes, mas não somos melhores ou piores que os outros. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=LWBodKwuHCM>. Acesso em: 14 de set. de 2020. Saiba mais Dessa forma, percebe-se que, para minimizar os efeitos do preconceito em vários campos, deve-se iniciar um trabalho de prevenção ainda no ambiente escolar, com as crianças e com as famílias. Somente reconhecendo e compreendendo os elementos histórico-sociais da diversidade humana é que poderemos possibilitar práticas menos excludentes e favorecer a inclusão. 6 Padrões de normalidade também podem ser observados em relação à formação familiar. Segundo Louro (2006), é comum considerarmos como família estruturada aquela formada por um pai, uma mãe, heterossexuais, casados, e seus filhos. Toda família que foge a esse arranjo é considerada excêntrica, anormal. Contudo, atualmente não se pode considerar mais um padrão familiar único, pois os tipos de formação são cada vez mais diversos. Diversidade racial, etnica, familiar e de gênero Fonte: Plataforma Deduca (2020) As distinções também podem ser observadas em relação à classe social em que cada indivíduo é enquadrado. Nessa classificação, considera-se não só o poder aquisitivo, mas também o tipo de trabalho, as vestimentas e as condições de moradia, de cultura e lazer. Gonçalves (2001) menciona que o homem utiliza seu corpo como ferramenta de trabalho para buscar atingir objetivos materiais que são valorizados pelo modelo de sociedade vigente. Gonçalves (2001, p. 166) ainda ressalta que as formas de lazer estão condicionadas à classe social a qual pertence o indivíduo. Quem possui um grande poder aquisitivo dispõe de oportunidades que lhes são oferecidas por possuir um status social e financeiro. Enquanto isso, o indivíduo de menor poder aquisitivo, além de ter menos oportunidades, geralmente trabalha nas horas vagas para tentar ter as mesmas oportunidades que pessoas da classe alta têm muitas vezes renunciando ao descanso, do lazer e do tempo com a família para ampliar sua renda. Contudo, diante de tantas possibilidades de observar e classificar o indivíduo em um universo tão amplo como a diversidade humana, deparamo-nos com um tema recorrente: o preconceito. Uma distinção precipitada, baseada em conceitos que nos foram impostos pela sociedade que visa ao consumo, e para isso, determina os padrões de como se deve ser, pensar e agir. 7 O corpo enquanto lugar de marcação da diversidade O corpo é o elemento que se destaca quando se pensa em diversidade, pois pelas características corporais, enquanto aspectos biológicos, sociais e psicológicos, observamos as mensagens da comunicação corporal, tanto no que diz respeito às suas particularidades como à sua coletividade. Cada indivíduo se distingue do outro pelo tipo ou cor de cabelo, da pele, dos olhos, maneira de andar, se vestir, se comportar etc., e todas essas informações externalizam as especificidades desse corpo. “Moldado pelo contexto social e cultural em que o ator se insere, o corpo é o vetor semântico pelo qual a evidência da relação com o mundo é construída [...]”(LE BRETON, 2007, p. 7). A cor e a textura da pele nos transmitem informações relacionadas à etnia, nacionalidade e regionalidade, caso seja muito exposta ao sol, mais clara, mais espessa ou mais macia, poderá revelar o tipo de trabalho que o indivíduo realiza. As cicatrizes contam histórias e as tatuagens evidenciam mensagens e valores nos quais a pessoa acredita. A cor do cabelo, os gestos feitos com as mãos e as expressões do rosto podem revelar muitas características da história de vida de cada um. Le Breton (2007) enfatiza que “[...] o rosto é, de todas as partes do corpo humano, aquele onde se condensam os valores mais elevados. Nele cristalizam-se os sentimentos de identidade, estabelece-se o reconhecimento do outro, fixam-se qualidades da sedução, identifica-se o sexo etc.” (LE BRETON, 2007, p. 70-71. Le Breton (2007 menciona também sobre a definição de estereótipos em relação às aparências físicas, a noção de perfeição/imperfeição que são estabelecidas baseadas em padrões corporais, e que discriminam o que é diferente. Essa situação beneficiou uma área do mercado que vem crescendo fortemente, legitimando a valorização da aparência, transformando o corpo em um “cartão de visitas vivo”. Para Louro (2006), o tema da diversidade vem trazendo muitas divergências e polêmicas ao longo dos anos quando se leva em consideração os conceitos de diferença e igualdade. Muitos grupos sociais exaltam-se em suas diferenças, buscando posicionarem-se no mundo e serem reconhecidos, e ao mesmo tempo, outros grupos exigem a igualdade em todos os aspectos da sociedade. Essa ambiguidade pode ser percebida como uma “falsa dicotomia”, já que igualdade 8 e diferença são conceitos indissociáveis. De acordo com Louro (2006, p. 46), “[...] não há sentido em se reivindicar a igualdade para sujeitos que são idênticos, ou que são os mesmos” (LOURO, 2006, p. 46). Acesse o site do G1 disponível em: <https://g1.globo.com/sp/bauru- marilia/noticia/2018/12/12/projetos-investem-em-educacao-para- desviar-jovens-do-caminho-da-criminalidade.ghtml>. Acesso em: 14 de set. de 2020. Lá você encontra uma reportagem muito interessante a respeito de ações desenvolvidas por um projeto social que atendem adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade social e que proporcionam atividades de cultura, arte entre outros, o que possibilita uma alternativa de vida para esses jovens. Saiba mais A disseminação e a popularização do conhecimento em relação à temática da diversidade humana contribuem para a conscientização das pessoas sobre o assunto. Cada vez que uma ideia é colocada a seu respeito, seja um argumento contextualizado ou uma opinião infundada, rapidamente a crença é reproduzida e se propaga, ainda mais com as facilidades da internet e das redes sociais. As desigualdades somente poderão ser percebidas – e desestabilizadas e subvertidas – na medida em que estivermos atentos para suas formas de produção e reprodução. Isso implica operar com base nas próprias experiências pessoais e coletivas, mas também, necessariamente, operar com apoio nas análises e construções teóricas que estão sendo realizadas. (LOURO, 2006). Para saber mais sobre esse tema, leia o artigo “Identidade cultural, diversidade e diferença: um olhar para gênero e sexualidade na educação” de Marcos Felipe Gonçalves Maia et al., que enfatiza a necessidade de debates nas políticas públicas da educação para promover o respeito às diferenças. Disponível em: <http://www. brajets.com/index.php/brajets/article/view/375>. Acesso em: 14 de set. de 2020. Saiba mais 9 Contudo, podemos perceber que esse assunto tão delicado não pode ser colocado à margem das discussões e dos processos de aprendizagem nos ambientes de ensino, sejam intra ou extraescolar. A diversidade, como um dos temas transversais, precisa ser encarada como imprescindível para a compreensão do mundo como mundo. A sociedade é plural e comporta lugares para todas as culturas, em todos os âmbitos. Muito além de ensinar, discutir e refletir sobre etnia, gênero e sexo, a diversidade deve trabalhar o conceito de respeito. EXPRESSÕES CULTURAIS QUE SE MOSTRAM NO CORPO As manifestações e expressões culturais com o corpo humano são percebidas e estabelecidas em uma relação, que é dinâmica, pois é resultado de um processo histórico. em uma menciona em sua obra que o corpo “[...] é objeto de uma construção social e cultural”, e sob essa ótica, podemos observar que não há perenidade, ou seja um período de duração predeterminado. Todas as relações que o indivíduo estabelece com o mundo, independentemente da cultura à qual ele pertença, ocorrem pelo corpo. Cerimônias, ritos religiosos, técnicas de cultivo da terra, utilização de determinados meios de transporte, vestimentas e caracterização do corpo, os tratamentos médicos, as tradições familiares de nascimento, crescimento, casamento ou morte, são momentos que perpassam pelo significado atribuído ao corpo, e acontecem de diferentes formas, pois existem distintos comportamentos para cada concepção de cultura. Para Le Breton (2007, p. 7): [...] o corpo é o vetor semântico pelo qual a evidência da relação com o mundo é construída: atividades perceptivas, mas também expressão dos sentimentos, cerimoniais dos ritos de interação, conjunto de gestos e mímicas, produção da aparência, jogos sutis da sedução, técnicas do corpo, exercícios físicos, relação com a dor, com o sofrimento etc. Antes de qualquer coisa, a existência é corporal. Ao longo dos anos o homem vem sofrendo “um processo de ‘descorporalização’” que, segundo Gonçalves (2001, p. 17), vem sendo mais intensamente percebido ao passo que a civilização e a racionalização das pessoas evoluem e crescem. A esse respeito, essa mesma evolução também contribuiu para que os sujeitos se tornassem mais autônomos, inteligentes e inovadores. O afeto foi perdendo espaço junto com a expressão sensorial e a experiência corporal, que se tornaram mecanizadas e submissas ao trabalho. 10 Evolução do homem Fonte: Plataforma Deduca (2020) Nos primórdios da existência do homem, sua relação com o seu próprio corpo era imprescindível para a sobrevivência, suas atividades estavam ligadas ao uso do corpo, que exigia características de força e habilidades para manter-se vivo e cuidar de sua família. A modernidade, industrial e capitalista não desprezou completamente essa finalidade; porém, cada vez mais negligência a relação do homem com seu corpo, “[...] visualizando-o como objeto que deve ser disciplinado e controlado” (GONÇALVES, 2001, p. 20). Como sugestão indicamos o documentário “Humano – uma viagem pela vida”, produzido em 2015. Esse documentário é composto por entrevistas, com cerca de 2 mil pessoas, das mais diversas culturas, distribuídas em 60 países, cujo objetivo é relatar suas experiências de vida e suas expectativas para o futuro. O filme traz belas imagens e busca resgatar a essência humana, enquanto indivíduo e enquanto sociedade. Saiba mais Nos dias atuais, a sociedade, que continua capitalista, objetivando o consumo e o lucro, continua vendendo cada vez mais a ideia de um padrão que deve ser almejado e alcançado, sem respeitar as individualidades biológicas, históricas e culturais. Percebemos que algumas expressões culturais estão sendo fortemente direcionadas a se enquadrarem em padrões que geram um status, principalmente as que se manifestam por meio do corpo. Nesse contexto, podemos observar uma crescente ação midiática que incentiva o culto à beleza, a busca de uma perfeição que não existe e o aumento expressivo das intervenções corporais para atingir esse fim. 11 Por outro lado, também testemunhamos o quanto as expressões culturais se manifestam no corpo, no sentido de querer afirmar identidades individuais ou de um grupo. Esse tipo de comportamento era mais comumente observado em tribos indígenas e africanas de várias regiões do mundo que se utilizavam desses elementos para demarcar algum feitoimportante, uma conquista, um ato de passagem ou rituais religiosos. Agora que você conhece sobre a temática da diferença e do preconceito, e suas repercussões nas diferentes concepções de expressão cultural, explore esses conceitos e responda com suas palavras qual a importância do respeito a diversidade para o fim do preconceito na sociedade? Curiosidade Dessa forma, não existe um modelo de corpo, certo, padronizado, mas se observa a existência de muitos corpos, e sua pluralidade embasada na infinidade e diversidade de culturais, as que já existiram, as que existem e as que ainda vão ser criadas ou miscigenadas pelas que estão postas. Por fim, enxergamos na educação, um lugar para ultrapassar a dinâmica meramente racionalista e cognitivista, que prioriza padrões, sejam eles de qualquer origem e característica. Por isso, defendemos que a escola busque ampliar o conhecimento dos alunos utilizando-se do saber e da experiência, valorizando as múltiplas linguagens e a interdisciplinaridade. A educação é o caminho para o reconhecimento da diversidade, de pluralidade de ideias, de compartilhamento de experiências, de reflexão sobre o conhecimento, inclusão e respeito. Fechamento Você teve a oportunidade de aprender sobre vários conceitos relacionados aos aspectos das manifestações culturais, da noção de individualidade e de coletividade, bem como a importância de reconhecer a diversidade, o respeito e a inclusão, em qualquer âmbito da sociedade. Estudamos sobre a diversidade em vários campos como: raça, religiosidade, etnia, gênero entre outras e o quanto que 12 independentemente da fé que o outro professa, da orientação sexual, da identidade de genero, da raça entre outros, deve-se ter o respeito, a tolerância e entender que somos diversos e isso não é condicionante para termos atitudes de preconceito. Com isso, conseguimos compreender que a educação é senão um dos caminhos mais apropriados para que se possa disseminar informação, conhecimento e sobretudo orientar sobre respeito a diversidade e compreender que cada pessoa tem sua personalidade, suas identificações, crença, raça e que isso deve ser levado em consideração para que haja respeito e reciprocidade na convivência em sociedade. 13 Referências GONÇALVES, M. A. S. Sentir, pensar, agir: corporeidade e educação. 5. ed. Campinas: Papirus, 2001. LE BRETON, D. A sociologia do corpo. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2007. LOURO, G. L. Gênero, sexualidade e educação: uma perspectiva pósestruturalista. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2006. O ENFRENTAMENTO ÀS DESIGUALDADES SOCIAIS SST FREITAS, Veronica Tavares de O enfrentamento às desigualdades sociais / Veronica Tavares de Freitas Ano: 2020 nº de p. 10 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 O ENFRENTAMENTO ÀS DESIGUALDADES SOCIAIS Apresentação Neste momento, trataremos de um assunto relacionado ao enfrentamento às desigualdades sociais. Estudaremos sobre o breve contexto histórico da desigualdade no Brasil, apresentando alguns destaques para os agravos dessa situação de desigualdade, e conhecendo alguns conceitos fundamentais. Também estudaremos a respeito do breve histórico de ações afirmativas em várias partes do mundo, como uma forma de enfrentar as disparidades sociais e promover a inclusão social. E, por fim, iremos conhecer algumas ações afirmativas que o Estado brasileiro tem promovido para os cidadãos brasileiros que fazem parte dos grupos socialmente discriminados e excluidos. Bons estudos. BREVE CONTEXTO HISTÓRICO DA DESIGUALDADE SOCIAL NO BRASIL Apesar de contarmos com um ordenamento jurídico que prevê a garantia de uma série de direitos para a população, a realidade nacional é ainda de sistemáticas violações de direitos e perpetuação de elevados índices de desigualdade social. A persistência desse quadro advém do fato de que a história nacional foi baseada em relações profundamente desiguais, o que ainda não foi superado pela nossa sociedade. O passado escravocrata, com quatro séculos de dominação dessa forma de exploração, bem como a existência de dois períodos ditatoriais no século XX enraizaram em nossa estrutura social relações baseadas na desigualdade. Ressalta-se que, imediatamente antes do estabelecimento da ditadura civil-militar de 1964, houve uma grande mobilização nacional em torno do programa das “reformas de base”, com adesão da presidência de João Goulart. No entanto, com a ocorrência do golpe cívico-militar, houve uma interrupção desse processo, que nunca foi resgatado. 4 A desigualdade social no Brasil é um problema grave e profundamente enraizado em nossa sociedade. Existem muitas produções a respeito da temática. Como recomendação, aconselhamos o documentário “Brasileiros Guerreiros, a desigualdade social no Brasil”. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=buw69MKzTQc>. Acesso em 23 de set. de 2020. Também deixamos como uma segunda opção a matéria jornalística da TV Cultura que tem por tema: A desigualdade social no Brasil veiculado em 28/11/2018. Disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=Acw66g3bMW0>. Acesso em 23 de set. de 2020. Saiba mais As reformas de base apresentavam como objetivo justamente proporcionar mudanças estruturais na sociedade, buscando a ruptura de estruturas de reprodução de desigualdade. O acesso à terra, por meio da reforma agrária, era uma das agendas presentes nesse processo. Ao contrário do que ocorreu em grande parte dos países desenvolvidos do mundo, a reforma agrária no Brasil nunca ocorreu, perpetuando a grande concentração de terras no país (CARVALHO et al., 2013). Desigualdade social: É a diferença existente na sociedade a partir das distinções que há entre as classes sociais, considera-se como fatores que geram desigualdades, os fatores culturais, educacionais e econômicos; e não há distribuição justa e igualitária do que se arrecada e ganha em termos de lucros. Igualdade social: Princípio fundamental para as sociedades democráticas, pois possibilita a todos a equiparação no que diz respeito ao desfrute e proveito de seus direitos. Com o fim do Regime Militar no ano de 1985 e a consolidação da Constituição Federal de 1988, a promoção da igualdade e garantia de direitos retomou com fôlego o debate público. Tanto que em seu texto constitucional se coloca a questão 5 dos direitos sociais, igualdade entre os seres humanos, entre outros aspectos, prevalecendo a liberdade, igualdade e a democracia. A constituição Federal assegura que deve ser dever do Estado a responsabilidade de ofertar atendimento a individuos e grupos no que tange a proteção social de acordo com os direitos sociais avalizados em seu artigo 6º, sendo todos eles direitos, então deve ser ofertado de maneira igualitária, respeitando a equidade para que todos tenho acesso ao que lhe cabe enquanto direito e de modo universal. Entretanto, precisamos ressaltar que mesmo tendo sido promulgada a Carta Magna que assegura os direitos sociais e se compromete com a integralidade e universalidade do acesso a esses direitos, no Brasil, torna-se um desafio materializar esse direito e viabiliza-lo, tendo em vista esse rastro de desigualdades em que a sociedade brasileira se formou. Contudo, cabe aos trabalhadores e trabalhadoras que atuam na promoção e viabilização desses direitos, que busquem se comprometer ética e politicamente para que as barreiras de acesso que se levantam cotidianamente para a não efetivação dos direitos, possam ser derrubadas e assim, concretizando a viabilidade e garantia desse direito inerente a população do território brasileiro. BREVE CONTEXTO HISTÓRICO DE AÇÕES AFIRMATIVAS Nos últimos anos, a proposição de “ações afirmativas” ganhou bastante ênfase nas políticas nacionais, com objetivo de combater a profunda desigualdade social no país. Ações afirmativas consistem no conjunto de medidas voltadas a grupos atingidos e discriminados pela exclusão social,ocorridos no passado ou contemporaneamente. O objetivo dessas políticas é combater desigualdades e segregações, buscando o fim de grupos elitizados em contraposição aos marginalizados. Todos são iguais perante a lei e diferente em suas subjetividades Fonte: Plataforma Deduca (2020) 6 Ações afirmativas são políticas enfocais que proporciona oportunidades a indivíduos pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão social racial, de gênero e econômica. Refere-se a medidas que têm como desígnio o combate as discriminações sociais, raciais, de gênero étnicas, religiosas, promovendo assim, a inclusão dessas pessoas que historicamente foram excluídas de diversos processos na sociedade, como o acesso à educação, saúde, emprego, bens materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento cultural. As políticas de ação afirmativa afloraram em conjunto com as lutas pela descolonização após a Segunda Guerra Mundial, aplicadas com a denominação de indigenização ou nativização (CARVALHO et al., 2013). Ações afirmativas geram equiparações no acesso a direitos sociais AÇÕES AFIRMATIVAS GERA OPORTUNIDADES DE ACESSO PARA AS PESSOAS SOCIALMENTE DISCRIMINADAS Fonte: Elaborada pela autora (2020) Assim, com a independência da Índia e do Paquistão, em 1947, da Indonésia, em 1949, seguidas pelos processos de emancipação de muitos países africanos e asiáticos, houve uma demanda de substituir os brancos, de origem europeia, que durante os respectivos regimes coloniais se apropriaram dos postos de comando dessas sociedades inclusive as estruturas de ensino. Cotas para ocupação de cargos públicos ou do acesso à educação e diversas outras medidas foram adotadas para que essas populações protagonizassem os governos de suas nações. No caso ocidental, diante da luta dos negros nos Estados Unidos, com a marca da busca dos direitos civis, desencadeada em 1950, o país incorporou, na década seguinte, à sua legislação e costumes mecanismos de busca pela igualdade inspirados nos avanços de descolonização do mundo afro-asiático. Por fim, a partir da tônica inicial mais forte acerca da questão racial, outros avanços foram agregados no sentido da busca da dissolução de estruturas de reprodução da desigualdade social, buscando direitos aos nativos estadunidenses, às mulheres, idosos, deficientes físicos, à comunidade LGBTQIA+, aos imigrantes, entre outros. 7 AÇÕES AFIRMATIVAS COMO POSSIBILIDADE AO ENFRENTAMENTO DAS DESIGUALDADES SOCIAIS NO BRASIL Existe um conjunto de ações afirmativas em âmbito federal voltadas para os grupos socialmente discriminados no Brasil. Iniciamos mencionando sobre a população negra e parda, é o caso da Lei n. 10.639/03, que torna obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas de nível fundamental e médio. A Lei n. 11.645/08, que modificou as diretrizes e bases da educação nacional, incluindo no currículo oficial de ensino a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira e indígena. Os direitos dos indígenas no Brasil Os direitos dos indígenas estão regidos pela Constituição Federal. Além disso, muito se avançou nas últimas décadas a respeito dessa temática. O ordenamento nacional renegou a perspectiva “assimilacionista”, que compreendia os indígenas como categoria transitória, com perspectiva de desaparecimento. Ademais, houve avanços relevantes sobre a perspectiva dos seus direitos, estabelecendo-se que as terras são direitos originários dessas populações, isto é, anterior à própria formação do Estado Nacional. Atenção A Lei de Cotas no Ensino Superior, que vem sendo adotada por universidades públicas de todo o país. A Portaria Normativa n. 18, de 11 de outubro de 2012, que dispõe sobre a reserva de vagas em instituições federais de ensino; o Decreto n. 7.824, de 11 de outubro de 2012, que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio e o Estatuto da Igualdade Racial. 8 Para enfrentar a desigualdade no topo da formação educacional, o MEC publicou a Portaria n. 13, em 2016, com adoção de ações afirmativas na pós-graduação. A lei prevê que as instituições federais de ensino superior adotem medidas para inclusão de negros (pretos e pardos), indígenas e pessoas com deficiência em seus programas de pós-graduação. Atenção A adoção de medidas nesse sentido na esfera dos concursos públicos igualmente apresenta como objetivo a desconstrução de estruturais de reprodução de desigualdade no país. Dessa forma, as cotas nos concursos para negros e deficientes físicos se apresenta como um avanço relevante nessa seara. A desigualdade de gênero igualmente vem sendo combatida a partir da adoção de ações afirmativas. Um caso relevante nacional é a baixa ocupação de mulheres nos cargos de poder político. Essa situação diz respeito a uma cultura patriarcal na qual foi reservado historicamente o espaço doméstico como o mais adequado para as mulheres, sendo o próprio direito ao voto uma conquista das últimas décadas no país. Destarte, há um baixo investimento das lideranças partidárias em mulheres como figuras públicas, bem como negros e indígenas, sendo esse papel ocupado geralmente por homens brancos, condizentes com a lógica do patriarca sobre a qual se fundou o Brasil. A baixa ocorrência de mulheres nos espaços de poder público ajuda a perpetuar desiguais no sentido cultural, de negar às mulheres espaço e acesso ao poder, bem como nas medidas aprovadas. Afinal, é fato que as prioridades políticas dos sujeitos passam pela própria formação pessoal deles, havendo uma nítida diferença na ênfase para a igualdade de gênero dada por mulheres nos espaços de poder, em contraposição aos homens. Para enfrentar esse problema social, a Lei n. 9.504, de 1997, determinou que as mulheres deveriam ocupar o percentual mínimo de 30% da lista de candidaturas. Apesar dessa conquista, persistem muitos problemas na representação política das mulheres. Para tentar burlar essa lei, muitos partidos colocam mulheres na chapa que não buscam votos efetivamente, constando apenas para o enquadramento legal, sendo conhecidas como “candidaturas laranjas”. 9 Fechamento Estudamos sobre o enfrentamento às desigualdades sociais. E aprendemos que os desafios para relações sociais mais justas são enormes, sendo abordado aqui apenas os principais tópicos da problemática nacional. A questão da violência, o déficit habitacional, o acesso à informação, a inclusão digital são temas bastante relevantes e que necessitam do engajamento da sociedade e, principalmente, dos gestores públicos para o seu devido enfrentamento. Estudamos sobre a importância de o Estado investir em desenvolvimento dos direitos sociais mais básicos da população, como acesso à saúde, educação e saneamento, existindo uma complexidade social que precisa ser encarada para o desenvolvimento das relações sociais. Ademais, trabalhamos a temática da desigualdade a partir das estruturas racistas e patriarcais de nossa sociedade. Esse problema não é apenas brasileiro, sendo um desafio global do século XXI. Porém, o nosso passado escravocrata e autoritário consolidou no cotidiano nacional relações muito profundas de desigualdade e reprodução de privilégios. A percepção dessa dimensão dos problemas sociais é fundamental para a compreensão da sua complexidade. 10 Referências BRASIL. Agência IBGE. Mulher estuda mais, trabalha mais e ganha menos do que o homem. 28 mar. 2019. Disponível em: <https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/ agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/20234-mulher-estuda-mais- trabalha-mais-e-ganha-menos-do-que-o-homem>. Acesso em: 23 set. 2020. BRASIL. Agência IBGE. Munic: mais da metade dos municípios brasileiros não tinha plano de saneamento básico em 2017. 20 set. 2018. Disponível em: <https:// agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de- noticias/releases/22611-munic-mais-da-metade-dos-municipios-brasileiros-nao-tinha-plano-de-saneamento-basico-em-2017>. Acesso em: 23 set. 2020. BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2016]. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 23 set. 2020. BRASIL. IBGE Educa. Conheça o Brasil. Disponível em: <https://educa.ibge.gov.br/ jovens/conheca-o-brasil/populacao/18317-educacao.html>. Acesso em: 23 set. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Sistema Único de Saúde (SUS): estrutura, princípios e como funciona. Disponível em: <http://www.saude. gov.br/sistema-unico-de-saude#:~:text=Princ%C3%ADpios%20 Organizativos&text=Descentraliza%C3%A7%C3%A3o%20e%20Comando%20 %C3%9Anico%3A%20descentralizar,fiscaliza%C3%A7%C3%A3o%20por%20parte%20 dos%20cidad%C3%A3os>. Acesso em: 23 set. 2020. CARVALHO, A. P. C. de et al. Desigualdades de gênero, raça e etnia. Curitiba: InterSaberes, 2013. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Imprensa destaca pesquisa encomendada pelo CFM ao Datafolha sobre a percepção do brasileiro sobre a saúde. 2018. Disponível em: <https://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article& id=27701:2018-06-28-15-18-26&catid=3>. Acesso em: 23 set. 2020. HISTORICIDADE DOS MOVIMENTOS FEMINISTAS E LGBTIS SST RASCKE, Karla Leandro Historicidade dos movimentos feministas e LGBTIS / Karla Leandro Rascke Ano: 2020 nº de p. 12 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 HISTORICIDADE DOS MOVIMENTOS FEMINISTAS E LGBTIS Apresentação Neste momento, trataremos de um assunto relacionado a Historicidade dos Movimentos Feministas e LGBTIs. Estudaremos brevemente e conceitualmente a respeito da história dos movimentos sociais e, por conseguinte dos movimentos feministas, como ele se organizou no mundo, e como e quando ele se organizou no Brasil quais foram suas principais conquistas e suas principais bandeiras de resistência. Também estudaremos a respeito do movimento LGBTQI+A e sua trajetória política e histórica de resistência e luta pelos direitos da população que tem orientação sexual que não condiz com o determinismo heteronormativo. Fique atento a todas as informações presentes aqui, e vamos juntos ao processo de conhecimento e aprendizagem a respeito da relevância desses assuntos. Bons estudos. CONCEITO DE MOVIMENTOS SOCIAIS A gênese do conceito relacionada a movimento social segundo Craveiro &Handam (2015) tem a sua fundamentação na contraditória analogia que existe entre os sistema capitalista e as condições de trabalho. As abordagens preponderantes a respeito dos movimentos sociais empregadas no século XIX até aproximadamente a primeira metade do século XX, faziam-se uma correlação direta do conceito de movimentos sociais com a luta de classes, que havia surgido com os movimentos de trabalhadores operários das fabricas. Sendo assim, o conceito de movimento social pode ser pensado, em linhas gerais, como um conjunto de ações, que tem como base valores comuns que compõem e identificam determinado grupo, visando alcançar mudanças sociais. Nesse sentido, movimento social é um agrupamento de pessoas e/ou instituições com interesses comum, pautados em bandeiras de luta, que podem ter mais de uma frente, ou seja, mais de um interesse. O Brasil tem sua história marcada por diferentes movimentos sociais, dentre eles, movimento negro, movimento de mulheres, movimento dos atingidos por barragens, movimento de mulheres camponesas, movimento operário, movimento sindical, movimento estudantil, etc. Inúmeros foram os grupos que surgiram e se reuniram, 4 em diferentes contextos históricos e por diferentes bandeiras, para lutar por mudanças, seja no campo econômico ou social. Principais movimentos sociais a partir do século XX na realidade brasileira e que possuem atuação até os dias atuais MOVIMENTO FEMINISTA MOVIMENTO LGBTQI+A MOVIMENTO NEGRO MOVIMENTO ESTUDANTIL MOVIMENTO AMBIENTALISTA MOVIMENTO SEM TERRA - MST Fonte: Elaborado pela autora, (2020) Scherer Warnner, (2008) avulta alguns movimentos sociais que foram indispensáveis e assinalaram a história do país quando o Brasil em 1964 teve a democracia substituída por um regime militar ditatorial. A autora destaca que os movimentos que foram surgindo nesse período da história brasileira foram de suma relevância para a luta pelo fim da ditadura e o retorno da democracia e do livres-arbítrios; entre os movimentos sociais ela destaca dois que tiveram expressiva participação nessa conjuntura são eles: o movimento estudantil e os movimentos de base política da igreja católica, ligados a teologia da libertação. Como sugestão de leitura complementar deixamos aqui duas ofertas: Uma delas se refere a um artigo acadêmico escrito por maria da Gloria Gohn, segue a descrição dele bem como o link de acesso: Desafios dos movimentos sociais hoje no Brasil. Disponível em: <http://cressrn.org.br/files/arquivos/eILxHih2XPlto00h4990.pdf>. Acesso em: 17/09/2020. O segundo artigo se refere a explicar o conceito de movimentos sociais a partir da década de 1960 até a contemporaneidade. Segue o link de acesso: <http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0873-65292014000200006>. Acesso em: 17/09/2020. Boa leitura!!! Saiba mais 5 Esses movimentos apresentaram participação categórica na luta em prol de seus ideais pronunciados com a precisão do povo, que era o retorno das disposições em torno da sociedade serem de forma extensa, plural e democrática. Faziam manifestações nas ruas, mesmo ainda sob forte repressão pelo braço armado do Estado, reuniam-se clandestinamente para deliberarem suas formas de tentar sobrepor a ordem ditatorial vigente. MOVIMENTO FEMINISTA Menos de 100 anos atrás, as mulheres não tinham o direito de votar e muito menos de serem votadas, não tinham o direito de estudar ou de trabalhar fora do lar. Eram tuteladas por homens, primeiro por seus pais, depois pelos maridos. Nem ao menos eram donas de seus corpos. Você acha essa afirmação exagerada? Pois bem, elas não escolhiam com que iriam casar, já que os casamentos eram arranjados. Tinham a obrigação de servir seus maridos de todas as maneiras, inclusive sexualmente. Vestiam somente o que era considerado apropriado pela sociedade. Como você pode perceber, muita coisa mudou nesses quase 100 anos, e essas conquistas devem-se ao feminismo. O movimento feminista pode ser definido como um movimento social que defende a equidade entre homens e mulheres, conquistado por meio do empoderamento feminino, ou seja, a libertação da mulher da submissão aos padrões patriarcais. Inicialmente as lutas estavam pautadas em direitos políticos, ou melhor, no direito de votar e ser votada. Depois dessa conquista, a luta mudou um pouco o foco. Continuava a ser por direitos, mas, outros, como pelo próprio corpo, por autonomia, pelos direitos reprodutivos, por igualdade no mercado de trabalho, no campo científico, na organização da vida política. O movimento feminista se reuniu em prol dos direitos das mulheres, tais como o direito de estudar, trabalhar, ser dona do próprio corpo e, principalmente, ter acesso aos mesmos direitos que os homens tinham, ou seja, buscavam a equidade de gênero. Reflita 6 No Brasil, o movimento feminista da primeira onda buscou inspiração nos Estados Unidos e países europeus. Assim, o direito ao voto foi a principal pauta de reinvindicação nas primeiras décadas do século XX. O sufrágio feminino foi o motivo que fez com que as mulheres brasileiras se reunissem em torno de uma pauta. No entanto, não podemos pensar em um grupo amplo de mulheres. Em sua maioria, eram universitárias que tiveram contato com o movimento sufragista em outros países. Em 1932, por meio de um decreto provisório, as mulheres garantiram o direito de votar, que só aconteceu efetivamente no ano seguinte. E assim, no ano de 1933, as mulheres brasileirasforam até às urnas para concretizarem o direito conquistado. No entanto, somente um ano depois o direito de voto para as mulheres foi garantido pela Carta Magna de 1934. As reinvindicações principais da segunda onda feminista (décadas de 1960-1970) foram pautadas em duas frases de ordem: o privado é político e nosso corpo nos pertence. As questões referentes ao espaço privado – como, por exemplo, a violência doméstica, o controle sobre o corpo, o direito ao prazer, os direitos reprodutivos – passaram a ser apontadas como questões sociais, ou seja, como objeto de políticas públicas. Nesse contexto, surge a pílula anticoncepcional, e as mulheres passam a ter um controle maior sobre seu corpo, entram em número significativo no mercado de trabalho, mas continuam na luta pela desconstrução da sociedade sexista pautada no determinismo biológico. Em 1975, foi decretado o Ano Internacional da Mulher, pela Organização das Nações Unidas (ONU), que instituiu a década seguinte como a década da mulher. Atenção As feministas da terceira onda focaram no que chamaram de micropolítica. O direito de igualdade na diferença foi a pauta dessa onda. Inicialmente, o próprio movimento passou por indagações que resultaram em novas ideias e estratégias. A condição de ser mulher deveria levar em conta a intersecção com outros fatores como classe, raça/etnia, geração e orientação sexual. 7 MOVIMENTO LGBTQI+A Os objetivos do Movimento LGBTI no Brasil podem ser articulados em torno de três pautas principais: 1. criminalizar a homofobia e enquanto isso não acontece lutar contra qualquer forma de preconceito em relação à homossexualidade; 2. divulgar informações corretas e positivas em relação à homossexualidade, desmistificando tabus; 3. conscientizar a comunidade homossexual da importância de organização em grupos em prol da defesa e luta pelos direitos. Bandeiras em apoio às causas LGBTIs Fonte: Plataforma Deduca (2020) No Brasil, a movimentação em torno das questões da comunidade homossexual começou na década de 1980, quando foi realizado o 1º Encontro Brasileiro de Homossexuais, na cidade de São Paulo. Foi também nesse período que surgiram os primeiros grupos organizados. No entanto, foi na década de 1990 que o movimento teve maior visibilidade. Isso está associado a vários fatores, mas um que merece destaque foi o fato do mercado de bens e serviços atentar-se ao público homossexual, identificando-os como Gays, Lésbicas e Simpatizantes (GLS). Porém, em meio ao movimento, o grupo identificava-se como Movimento Homossexual Brasileiro (MHB). Somente em meados da década de 1990 é que passou a identificar-se como LGBT, isto é, Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Travestis. E foi em 2008 que a sigla ganhou o formato atual, LGBTI, que foi aprovado em um congresso nacional da categoria, dando maior visibilidade às lésbicas, que são oprimidas duplamente, por ser mulher e pela orientação sexual. 8 É importante ressaltar que anterior a esse momento, alguns eventos já marcavam as discussões sobre a temática. Um exemplo foi o Jornal Lampião, fundado em 1978, que tinha por objetivo discutir as temáticas referentes à homossexualidade. Atenção Com forte influência desse periódico, surgiu o primeiro grupo homossexual do Brasil, o Somos de São Paulo. Na sequência, muitos outros grupos surgiram com a finalidade de fortalecer a identidade e lutar por direitos, inclusive o Grupo Gay da Bahia (GGB), o mais antigo grupo homossexual atuante da América Latina. No final da década de 1980, muitos desses grupos sofreram desarticulações em virtude do advento da AIDS e da associação dessa como uma “epidemia gay”. Isso implicou que muitas pessoas ficaram receosas de assumir sua orientação sexual e serem associadas ao HIV. Nesse período começaram a surgir grupos de apoio à AIDS, articulando uma discussão mais ampla sobre a doença e a homossexualidade, no intuito de informar, proteger e romper preconceitos existentes sobre esses grupos. Nesse período, os grupos ativistas começaram a agir de maneira mais pragmática. Em 1994, articularam uma organização nacional, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). A organização, que iniciou com pouco mais de 10 grupos, atualmente é uma rede nacional com aproximadamente 300 organizações da comunidade LGBTI. Apesar de ter aumentado consideravelmente a rede, a ABGLT continua com a mesma responsabilidade de atuação de outrora, que visa à garantia e à promoção dos direitos da comunidade homossexual, além de ser um espaço para intercâmbio entre os grupos e um meio para a construção de uma agenda comum. Atenção Além da organização desses grupos e encontros, não podemos deixar de mencionar um fator que merece destaque sempre que se fala em público homossexual: as paradas da diversidade. A primeira aconteceu no Rio de Janeiro, em 1995, e dois anos depois, aconteceu a segunda edição, em São Paulo. 9 Parada LGBT ou Parada do Orgulho Gay: é uma manifestação em prol da luta pelos direitos civis da comunidade homossexual e transgênero, acontece em forma de desfile, com muita música, dança e performances. Embora seu caráter seja festivo, é importante ressaltar o cunho social do evento e sua luta pelos direitos humanos. Curiosidade Nesse percurso de 20 anos, a Parada da Diversidade tomou proporções gigantescas em diversas cidades do nosso país. A Parada de São Paulo chegou a atingir quatro milhões de pessoas e é considerada uma das maiores do mundo. Mas não foi somente a parada da diversidade que teve importantes mudanças. O cenário cotidiano da comunidade homossexual também mudou. Eles deixaram de viver em “guetos” e conquistaram alguns dos direitos que almejavam. No entanto, cabe ressaltar que ainda continuam a caminhada pela conquista plena de seus direitos civis. Sugerimos a animação “Medo de quê?”, que faz parte do Kit Escola sem Homofobia. O desenho animado aborda diversas temáticas das questões de gênero: heteronormatividade, homoafetividade, orientação sexual, homofobia. Disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=cIoeUqBxhi0>. Saiba mais Importante direito alcançado é a legalidade da união estável entre pessoas do mesmo sexo. O reconhecimento aconteceu em maio de 2011, pelo Supremo Tribunal Federal. Pouco depois do reconhecimento da união estável para pessoas do mesmo sexo, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) emitiu uma resolução que obrigava todos os cartórios a realizarem casamento civil homoafetivo. Em dois anos após a resolução do CNJ, foram realizados 8.500 casamentos homoafetivos, segundo o IBGE, 2015. Esse fator é importante não apenas pelo reconhecimento social da união, mas também porque o casamento civil entre homossexuais garante os mesmos direitos que o casamento entre heterossexuais: inclusão em plano de saúde e seguro de vida, pensão alimentícia, direito sucessório e divisão dos bens adquiridos. 10 Como sugestão de leitura complementar, deixamos aqui dois textos: O primeiro deles é uma matéria da revista Galileu publicada em março de 2020 a respeito da sigla do movimento LGBTQI+A e de forma conceitual explica o que significa cada uma das letras e quais são os grupos representados por elas. Disponível em: <https:// revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2020/03/o-que- significam-letras-da-sigla-lgbtqi.html>. Acesso em: 17 set. 2020. O segundo material se refere a uma outra matéria publicada no Blog social 1 do site UOL em junho de 2020, que atualiza um pouco mais o debate a respeito das concepções de cada grupo que compõe a sigla do movimento. Disponível em: <https://blogs.ne10.uol.com.br/social1/2020/06/30/o-que- significa-cada-letra-da-sigla-lgbtqia/#:~:text=Como%20 se%20sabe%2C%20o%20L,sexual%20por%20homens%20e%20 mulheres>. Acesso em: 17 set. 2020. Saiba mais Por fim, importa destacar que cada vez mais na contemporaneidade a sigla do movimento tem ganhado mais letra como forma de expandire dar mais visibilidade as diferentes formas de identificação de gênero e orientação sexual atualmente a sigla tem sido: LGBTQI+A – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transsexuais, travestis e transgêneros; Queer, os mais recentes incluídos na sigla são: o Intersexo e o Assexual e o sinal de + abarca outras diversidades de orientação sexual e de identidade gênero para além dessas citadas. Temos os Pansexual que se atraem por pessoas, isto é, independente da orientação sexual e/ou identificação de genero. Em algumas reportagens e manuscritos acadêmicos pode-se encontrar a com o P de Pansexual. Para finalizar, uma das pautas mais recorrentes da luta LGBTI é a criminalização da homofobia. Em um primeiro momento, a criminalização da homofobia não consiste em criar um estatuto intitulado homofobia, mas o de incluir o crime de homofobia em tipos penais já existentes. Atualmente existem alguns projetos de Lei da Câmara que visam essa iniciativa. O mais conhecido dele é o PLC nº 122/06 que altera a Lei do Racismo e o Código Penal. No primeiro caso, amplia a abrangência para punir crimes resultantes de 11 discriminação, incluindo gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Se aprovada a alteração da lei, a homofobia será considerada crime, assim como o racismo. O PLC também visa a alteração do Código Penal, incluindo elementos de gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero como injúria qualificada. Fechamento Estudamos sobre a historicidade dos movimentos feministas e LGBTQI+A. Nesse contexto, é indispensável que se considere a importância dos movimentos sociais sobretudo os movimentos que lutam para dar visibilidade as suas causas e que lutam pelo fim da diferença, do preconceito e das desigualdades existentes. Estudamos também sobre a formação do movimento feminista, como ele surgiu, quais foram suas principais reivindicações e suas conquistas e o quanto que ele é necessário para que se possa com equidade equiparar os direitos entre as pessoas do gênero feminino e do gênero masculino. Por fim, também estudamos a respeito da formação do movimento LGBTQI+A, como ele surgiu, suas principais reivindicações, o que foi possível alcançar em termos de justiça e direitos sociais e civis e o que ainda permanece enquanto luta. Assim, afirmamos que, por meio do conhecimento disponibilizado na educação escolar, é possível ter conhecimento e sobretudo romper com padrões que originam a exclusão, violência e preconceitos contra a diversidade. 12 Referências CRAVEIRO, A.V. HAMDAN, K.O. Os novos movimentos sociais: uma análise crítica em torno desta temática. In: I congresso internacional de política social e serviço social: desafios contemporâneos. Londrina – PR. 2015. SCERER-WARREN, I. Movimentos sociais no Brasil contemporâneo: In: Revista História: debate e tendências V.7 nº 1, Passo Fundo – RS. 2008. DEBATENDO GÊNERO E SEXUALIDADE NA SOCIEDADE SST RASCKE, Karla Leandro Debatendo gênero e sexualidade na sociedade / Karla Leandro Rascke Ano: 2020 nº de p. 11 Copyright © 2020. Delinea Tecnologia Educacional. Todos os direitos reservados. 3 DEBATENDO GÊNERO E SEXUALIDADE NA SOCIEDADE Apresentação Neste momento, trataremos de apresentar o estudo: Debatendo Gênero e Sexualidade na Sociedade. Estudaremos sobre o conceito de gênero enquanto uma importante categoria da área de humanidades que possibilita compreender as pessoas, suas identidades, orientações e papeis de modo amplo e plural. Também estudaremos a respeito das relações de gênero, dialogando com a diversidade sexual. E, por fim, iremos conhecer a importância de estudar sobre os conceitos de sexo e sexualidade, com suas diferenças conceituais e sua relação com o debate de gênero. Fique atento a todas as informações presentes aqui, e vamos juntos ao processo de conhecimento e aprendizagem a respeito da relevância desses assuntos. Bons estudos. GÊNERO NA CONSTRUÇÃO DOS SUJEITOS E DA SOCIEDADE Gênero, como definição gramatical, é utilizado para definir homem e mulher - isto é, gênero masculino e feminino. Conforme Ferreira (1986, p. 844), gênero é uma “categoria que indica, por meio de desinências, uma divisão dos nomes baseada em critérios tais como sexo e associações psicológicas”. Porém, numa perspectiva social dentro dos parâmetros da sociologia e da psicologia, a noção de gênero tem sido empregada para diferenciar socialmente as pessoas. Essa categoria não é apenas analítica, mas também histórica, no sentido de um contexto predominantemente masculino, em que a mulher sempre ocupou lugar de retaguarda, sendo visibilizada como um gênero fragilizado, e o homem gênero de força e poder. Atenção 4 Se gênero pode ser utilizado para analisar as relações sociais estabelecidas entre homens e mulheres, devemos compreender que as relações de gênero perpassam por várias facetas, desde as construções de papéis masculinos e femininos, a constituição de identidades, da sexualidade, da pluralidade de masculinidades e feminilidades, da hierarquia de gênero e, consequentemente, da violência de gênero. Para corrobora com esse debate Mello, nos informa que: As diferenças entre homens e mulheres fecundam-se na sociedade a partir de concepções sobre o que é feminilidade e masculinidade. São disputas simbólicas, que dizem respeito ao processo de reprodução social, seja na família, nas organizações religiosas, escolares, nos ambientes de trabalho e na vida política. (2020, p. 11) Compete entender gênero para além do termo feminino e masculino, mas dimensionando a identidade do que é ser masculino ou feminino. Na contemporaneidade, a identificação envolve dificuldades e entraves sociais, políticos e mesmo morais, implicando que pessoas que não se veem no sexo em que nasceram, sofram com os ditames da sociedade em relação à identidade. Desde antes do nascimento de uma criança, com o resultado do ultrassom em mãos, a família começa a moldar seu lugar no mundo, e a partir de suas genitálias é que tudo se definirá. Se for menina, sua cor será rosa - decoração, roupas e acessórios terão a predominância dessa tonalidade. Caso seja menino, o padrão será a cor azul. Com o crescimento das crianças, essa dicotomia continua a ser sentida no modo de se vestir. No entanto, é por meio dos brinquedos e das brincadeiras adquiridos/permitidos para um e para outro - no caso, para outra – que isso será percebido de maneira mais enfática. Cores como uma das formas de imposições de gênero Fonte: Plataforma Deduca (2020) 5 Essa dicotomia criada pela sociedade do ser masculino e feminino, determinando objetos, cores, modo de ser de meninos e meninas, comportamentos diferenciados para cada tipo de gênero, são coisas advindas e criadas pelo homem, impostas pela sociedade e todos as seguem como uma regra, reforçada de geração em geração. É a naturalização do gênero, como se para ser homem ou mulher bastasse nascer com uma ou outra genitália. Mas, será que é assim tão simples? Na década de 1950, Simone de Beauvoir já dizia que “ninguém nasce mulher: torna-se” (BEAUVOIR, 1980, p. 9). Isso se estende também para os homens. Nesse sentido, a dicotomia entre o ser feminino e/ou masculino não é definida apenas pelo determinismo biológico. Queremos com isso afirmar que, tanto o homem quanto a mulher são produtos de uma dada realidade sociocultural. Foi tentando problematizar essas relações de poder estabelecidas entre homens e mulheres que nasceu o conceito de gênero. O termo surgiu no mundo acadêmico, na década de 1980, em um diálogo constante entre o movimento feminista e pesquisadoras das mais diversas áreas: história, sociologia, antropologia, ciência política, entre outras. Foi por meio dos estudos sobre mulheres que o processo de desnaturalização do papel de submissão/ inferioridade, da qual a mulher estava destinada socialmente, passou a ser desconstruído. Foi com esse intuito que o conceito de gênero surgiu: refletir e desconstruir aideia de que as desigualdades e as convenções sociais estivessem associadas apenas ao determinismo biológico. Afinal, é a sociedade que, pautada na genitália, estabelece padrões e papéis distintos para homens e mulheres. Como afirmou Louro (2007, p. 55): Para que se compreenda o lugar e as relações de homens e mulheres numa sociedade importa observar não exatamente seus sexos, mas sim tudo que socialmente se construiu sobre eles. Percebemos, desse modo, que os diferentes povos, ao longo dos períodos históricos de suas formações sociais, estabeleceram, e ainda estabelecem, comportamentos, papéis e atribuições para mulheres e homens. É importante perceber que, se todas as sociedades definissem comportamentos e parâmetros sociais apenas a partir do sexo biológico de cada pessoa, não teríamos as múltiplas formas de vivenciar a identidade de gênero, tal qual é possível atualmente, apesar dos muitos preconceitos e homofobias existentes. 6 O sexo é um dado biológico, relacionado ao nosso corpo físico – nosso órgão genital, seios, sistema reprodutor etc. –, o gênero é uma construção sociocultural. Atenção No entanto, cabe ressaltar que categoria gênero não é uma norma mecanicamente imposta, tampouco a encontraremos escrita em um código de leis. Ela se estabelece no cotidiano, em um jogo constante de poder e resistência. Essas relações estão em todos os campos: educação, saúde, trabalho, política, religião e nos momentos de lazer. É importante frisar que o próprio conceito de gênero está inserido em um contexto sociocultural, ou seja, ele também é uma construção e é sujeito a transformações. Existe, por exemplo, uma grande diferença entre ser uma mulher em nosso país ou no Oriente. Essa diferença também pode ser articulada em relação ao tempo, ou seja, há diferença entre ser mulher atualmente e ter sido mulher no começo do século XX. Inicialmente, gênero estava associado às discussões de/e para mulheres, focando na condição feminina e na percepção de como a categoria mulher era construída. O resultado disso foi uma homogeneização das mulheres, como sendo uma categoria única, sem atentar-se para outras diferenças como classe, etnia/raça, geração e orientação sexual. CONCEITOS DE SEXUALIDADE E SUA DIFERENÇA COM O CONCEITO DE SEXO Em nossa sociedade contemporânea, ocidental, educamos meninas e meninos de formas distintas, atribuindo a cada um/a comportamentos que consideramos adequados a partir da genitália “descoberta” antes mesmo do nascimento. Assim, diferenças biológicas são utilizadas para construir diferenças sociais, muitas vezes, tidas como naturais, “normais”. 7 Mas por que existem padrões comportamentais considerados corretos para meninas e meninos? Podemos perceber que esses padrões foram atribuídos a partir do sexo biológico, trazendo comportamentos, profissões, cores de roupas, brincadeiras, tudo atribuído a partir do sexo biológico. Sexo é um dado biológico, isto é, tudo aquilo relacionado ao nosso corpo físico (a genitália, os seios, o formato do corpo). Atenção E, na verdade, ao pensarmos a esse respeito, verificamos o quanto esse tipo de educação tolheu homens e mulheres de brincar com que se sentiam atraídos para brincar em sua infância e não podiam pois era considerado brincadeira de menino ou menina. Tantas pessoas se frustraram em não poder escolher a profissão que se sentia mais contemplado/a porque talvez seja considerada profissão de homem ou profissão de mulher. Sendo assim, é importante salientarmos que essa construção cultural e educacional de atribuir papeis a serem exercidos através do sexo biológico, não tem relação alguma com o que pode ou não ser feito por homens e mulheres, podemos perceber que existem excelentes homens que são cozinheiros, e excelentes mulheres que exercem trabalhos na construção civil. Além disso, temos homens bailarinos que são condecorados no mundo com um dos melhores bailarinos do mundo. Outra questão importante é considerar que quando se fala em sexo, não estamos querendo incitar e ensinar as crianças a fazerem sexo, mas explicá-las biologicamente como são seus corpos e suas diferenças. Da mesma forma quando se fala em sexualidade precisamos ter o conhecimento de que a sexualidade não é sinônimo do ato sexual entre pessoas, mas para além disso; sexualidade é toda sensação de prazer que as pessoas sentem quando fazem alguma atividade que lhes proporcionam, boas sensações, leveza e prazer em estar fazendo. Como por exemplo: uma pessoa que ama ler livros, e sentem bem em fazer leituras, está nesse ato desenvolvendo sua sexualidade. 8 E, por fim, quando aludimos sobre gênero, é reconhecer que foram papeis estabelecidos socialmente e culturalmente através dos sexos, mas, podemos romper com essa forma rígida e entender que homens e mulheres podem desde de sua infância brincar com qualquer brincadeira saudável, podem escolher a profissão que se sentem mais contemplados, e ainda escolherem usar a cor de roupa que quiserem, pois nada disso irá interferir em sua sexualidade e tampouco no seu órgão biológico. Conceitos Sexo: Orgão reprodutor feminino e masculino Gênero: São papéis atribuídos aos sexos masculino e feminino, determinados por um processo de educação e cultura moralista Sexualidade: faz parte da personalidade de cada um, é uma necessidade básica e um aspecto do ser humano que não pode ser separado de outros aspectos da vida. Sexualidade não é sinônimo de relação sexual e não se limita à ocorrência ou não de orgasmo. Fonte: Elaborada pela autora (2020) Portanto, consideramos que existem ainda muitas questões envolvendo sexualidade, gênero e diversidade geram polêmicas e/ou envolvem tabus da sociedade, necessitando atenção e cuidados no desenvolvimento de abordagens e análises, de modo a compreender a multiplicidade de sujeitos sociais e suas lutas por dignidade e direito à vida. RELAÇÕES DE GÊNERO Se pensarmos em gênero como uma categoria relacional, ao utilizarmos o termo relações de gênero estamos tornando explícito o que se mantinha nas entrelinhas. Nesse sentido, toda a ação humana, seja em qual for o espaço, é permeada por 9 relações de gênero. É aí que se constroem as identidades de gênero, é no contraste com o outro que acontece a (re)significação, é nesse momento que a pessoa se identifica como isso ou aquilo. Desse modo, como afirmou Scott (1995), percebe-se que gênero é o primeiro modo de dar significados às diferenças. E essas diferenças, como já afirmado, são construídas socialmente. Nesse sentido, o gênero feminino e o gênero masculino estão em um processo social contínuo. Essa categoria relacional é o que define ser homem e ser mulher e o que se espera socialmente de um é diferente do que se espera do outro. Relações de gênero e desigualdade de oportunidades Fonte: Plataforma Deduca (2020) Essa divisão binária entre o masculino e o feminino foram as primeiras concepções das relações de gênero, ainda com o enfoque pautado na relação do sexo feminino e masculino, não conseguindo se desvincular das características biológicas. Uma estrutura essencialista e fixa, esquema que começou a apresentar-se limitado para explicar a complexidade social a que as pessoas e suas relações estavam imersas. O que podemos entender é que as transformações cotidianas, como a globalização, os multiculturalismos e a socialização dos conhecimentos advindos da internet proporcionam mudanças na sociedade e isso faz com que as relações de gênero mudem também. Porém a pergunta é: estariam a sociedade pronta para tantas mudanças e informações? Na atualidade, por exemplo, é impossível afirmar que exista uma divisão estática entre o que é masculino e o que é feminino. Inclusive existem identidades de gênero que não se encaixam totalmente nessa divisão binária. 10 A respeito de abordagens sobre diversidade sexual e de gênero, sugerimos consultar o site “Grupo de Pesquisa Sexualidade e Escola”, em que vocêirá encontrar teses, dissertações, livros em pdf, indicações diversas de material relacionado ao tema: <http:// sexualidadeescola.furg.br/index.php>. Acesso em: 16 set. 2020. Saiba mais Fechamento Os estudos em questão nos possibilitaram aprendermos sobre o que é genero, sua construção na sociedade. Também aprendemos sobre o que é sexo, e sua diferença entre sexualidade e genero e estudamos sobre as relações de gênero. Estudamos também que sexualidade não é sinônimo de relação sexual e orgasmo ou a ausencia dele. Entendemos que que homens e mulheres podem brincar em sua infância, escolher o esporte, profissão cor de roupa independente do que foi atribuido a ele/a usar e/ou ser, pois isso não interferirá em sua sexualidade tampouco em seu sexo biológico. Por fim, apreendemos que gênero e sexualidade estão em diálogo e que devemos estar em constante estudo e aprendizagem para que possamos romper com as barreiras do achismo e do preconceito que ainda persistem e ao invés de informar e orientar corretamente, criam estigmas, tabus e reforçam os processos de exclusão social e preconceitos. 11 Referências BEAUVOIR, S. de. O Segundo Sexo, Tradução Sérgio Milliet, v. I, II. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 2ª ed. 18. Impressão. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. LOURO. G. L. O corpo educado: pedagogia da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. MELLO, F.A. de. A violência doméstica contra mulheres no Programa Casa Abrigo Regional ABC: questões para o serviço social. Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de estudos pós graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – SP – para a obtenção do grau de Mestra em Serviço Social. – São Paulo – SP. 2020. Disponível em: <https://tede2. pucsp.br/bitstream/handle/23163/2/Flaviana%20Aparecida%20de%20Mello.pdf>. Acesso em 16 de set. de 2020. SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação & Realidade. Porto Alegre, v. 20, n. 2, p. 71-99. jul./dez. 1995.