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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2023.0000589571 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320, da Comarca de Limeira, em que é apelante FURLAN PARTICIPAÇÕES LTDA, é apelado MUNICIPIO DE LIMEIRA. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 15ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores EUTÁLIO PORTO (Presidente) E SILVA RUSSO. São Paulo, 17 de julho de 2023. RAUL DE FELICE Relator(a) Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 2 Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 Apelante: Furlan Participações Ltda. Apelada: Prefeitura Municipal de Limeira Comarca: Limeira VOTO Nº 18248 APELAÇÃO CÍVEL Ação de repetição de indébito tributário ITBI Município de Limeira Incorporação de bem imóvel ao patrimônio de pessoa jurídica mediante integralização do capital social no ano de 2016 Pretensão de repetição do ITBI com fundamento na imunidade tributária Autora que possui como objeto social a participação em outras sociedades – Lançamentos contábeis relativos aos exerícios de 2014 a 2018 demonstram que a maior parte das receitas da autora é proveniente de atividades imobiliárias Pretensão de aplicação do Resp nº 796.376 Tema 796 do STF - Não há discussão sobre eventual excesso entre o valor do imóvel e o capital integralizado - Inaplicabilidade, in casu, do paradigma - Presunção de legitimidade dos atos administrativos não ilidida - Sentença mantida Recurso não provido. Vistos. Trata-se de ação de repetição de indébito ajuizada por FURLAN PARTICIPAÇÕES LTDA em face da PREFEITURA MUNICIPAL DE LIMEIRA objetivando a devolução de R$ 12.050,23, relativo ao recolhimento de ITBI incidente sobre a operação de incorporação de imóvel ao patrimônio da empresa, julgada improcedente pela r. sentença de fls.215/220, sob o fundamento de que a transmissão do bem imóvel ocorreu em 2016 e restou comprovado que a atividade preponderante da autora, no período de dois anos anteriores e dois anos subsequentes à aquisição do imóvel, é imobiliária, não se vislumbrando o direito à imunidade pretendida. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 3 Condenou a autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atribuído à causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º do CPC. Apela a autora sustentando, em resumo, que faz jus à imunidade insculpida no artigo 156, §2º, inc. I da Constituição Federal que é incondicionada à atividade exercida pela sociedade adquirente, nos termos da decisão do Supremo Tribunal Federal em repercussão geral nos autos do RE nº 796.376/SC (Tema 796); a apelante atende aos requisitos previstos no CTN e na legislação municipal, pois não possui como atividade preponderante a exploração do ramo imobiliário; a maioria das receitas por ela auferidas nos anos de 2014 a 2018, são provenientes de investimentos que detém no capital social de outras empresas, principalmente da exploração de atividade têxtil (não imobiliária), de modo que não se enquadra como sujeito passivo do ITBI. Requer o provimento do recurso para que seja reconhecida a imunidade tributária, com condenação do município à repetição do indébito a título de ITBI, com inversão dos ônus de sucumbência. Contrarrazões às fls. 241/250. Recurso tempestivo e preparado às fls.234/235. É O RELATÓRIO. A sentença não comporta reforma. Inicialmente, consigna-se que a tese fixada no Recurso Extraordinário 769.376 (Tema 796, do STF), ao contrário do que preconiza a apelante, não diz respeito especificamente ao caso aqui tratado. Preleciona a tese fixada pela Suprema Corte que “A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 4 De sorte que não se pode isolar um dos pontos do v. acórdão, quando examina os casos constitucionais de imunidade, para estender arbitrariamente este fundamento ao caso em foco, cuja discussão refoge aos dizeres da tese então fixada (CPC artigo 504, inciso I). No mais, a Constituição Federal prevê as hipóteses de imunidade do ITBI, dentre elas, quando houver transferência de bens imóveis para a integralização do capital social, o que é excepcionado quando a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda, locação ou arrendamento mercantil. Assim determina o artigo 156, §2º, inciso I, da Constituição Federal: “Art. 156 Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) II transmissão 'inter vivos', a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direito a sua aquisição. ; (...) § 2º - O imposto previsto no inciso II: I não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” . PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 5 Já o Código Tributário Nacional prevê em seu artigo 36: “Art. 36. Ressalvado o disposto no artigo seguinte, o imposto não incide sobre a transmissão dos bens ou direitos referidos no artigo anterior: I quando efetuada para sua incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica II quando decorrente da incorporação ou da fusão de uma pessoa jurídica por outra ou com outra Parágrafo único. O imposto não incide sobre a transmissão aos mesmos alienantes, dos bens e direitos adquiridos na forma do inciso I deste artigo, em decorrência da sua desincorporação do patrimônio da pessoa jurídica a quem foram conferidos”. E, no tocante ao conceito de “atividade preponderante”, assim dispõe o artigo 37 do Código Tributário Nacional: “Art. 37. O disposto no artigo anterior não se aplica quando a pessoa jurídica adquirente tenha como atividade preponderante a venda ou locação de propriedade imobiliária ou a cessão de direitos relativos à sua aquisição. §1º. Considera-se caracterizada a atividade preponderante referida neste artigo quando mais de 50% (cinquenta por cento) da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações mencionadas neste artigo. §2º. Se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de (dois) anos antes dela, apurar- se-á a preponderância referida no parágrafo anterior levando PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 6 em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição. §3º. Verificada a preponderância referida neste artigo, tornar- se-á devido o imposto, nos termos da lei vigente à data da aquisição, sobre o valor do bem ou direito nessa data. §4º. O disposto neste artigo não se aplica à transmissão de bens ou direitos, quando realizada em conjunto com a da totalidade do patrimônio da pessoa jurídica alienante”. A documentação carreada aos autos mostraque a empresa autora foi constituída em agosto de 2005 conforme se colhe do contrato social de fls. 20/37 e da ficha cadastral juntada às fls. 43. Em 27/10/2016 a empresa autora teve seu capital social aumentado mediante a integralizado de bem imóvel de propriedade do sócio Zulmiro José Furlan e sua mulher, conforme certidão de matrícula de fls.47 (R.7 8.028). O objeto social da empresa, por seu turno é a participação no capital social de outras empresas na condição de acionista ou quotista; a concentração de investimentos em negócios empresariais de interesse dos sócios, em nome da sociedade, ou em parceria com outros empreendedores; a administração de bens direitos próprios e a incorporação de empreendimentos imobiliários (Cláusula terceira fls.29). A ficha cadastral de Pessoa Jurídica juntada às fls. 43 identifica como atividade principal e secundária as atividades de “Holdings de instituições não-financeiras” e “Aluguel de imóveis próprios e Incorporação de empreendimentos imobiliários”. Os lançamentos contábeis relativos aos exercícios de 2014 a 2018 (fls.62/79), demonstram que autora exerceu de maneira preponderante, atividades imobiliárias e exploração de imóveis, consistentes, basicamente, na PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 7 locação de imóveis, recebimento de aluguéis e pagamento de despesas incidentes sobre os referidos imóveis. Além disso, apesar da autora alegar que “está juridicamente habilitada a deter participação, na condição de acionista ou quotista, no capital social de sociedades que explorem qualquer tipo de atividade, seja no ramo imobiliário ou não” fls.15 e que “Apenas nos exercícios de 2017 e 2018 há a presença de receitas de receitas auferidas em decorrência de participações em empresas que exploram o ramo imobiliário...” fls.16, em atenção do despacho de fls.208, deixou de produzir outras provas além daquelas existentes por ocasião do pedido administrativo de repetição (fls.53/61) e reiteradas por ocasião da propositura da presente ação, enquanto a ela incumbia o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito, nos termos do artigo 373, I, do Código de Processo Civil. Desta forma, não logrou a apelante a comprovação de que sua receita operacional, nos dois anos anteriores e nos dois anos seguintes à integralização de capital (2014 a 2018) não adveio, em percentual superior a 50%, de atividades imobiliárias. Ao contrário, a autora não atende aos requisitos legais que livram da incidência do ITBI as transações de pagamento de capital com incorporação de imóvel. Como bem salientou o magistrado na r. sentença “ ... ficou comprovado que, no exercício de 2014, a atividade imobiliária da autora (recebíveis de aluguéis) correspondeu, em verificação por amostragem, a 60% de sua receita operacional (fls. 11 e 14), de forma que, conforme acima fundamentado, a preponderância da atividade imobiliária no período de dois anos anteriores e dois anos subsequentes à aquisição do imóvel restou demonstrada”. Portanto, considerando que as receitas da autora provieram PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Apelação Cível nº 1001525-44.2022.8.26.0320 - Voto nº 18248 8 preponderantemente da atividade imobiliária no período discutido, deve a r. sentença de improcedência ser mantida, devendo a verba honorária a que foi condenada a autora ser acrescida de um ponto percentual, por aplicação do §11 do artigo 85 do CPC. Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso, nos termos do voto. Raul De Felice Relator