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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE MATEMÁTICA E ESTATÍSTICA LICENCIATURA EM MATEMÁTICA WELBER GONÇALVES PROPHETA INFLUÊNCIA DE DIOFANTO DE ALEXANDRIA NA MATEMÁTICA DO PERÍODO DA GRÉCIA ANTIGA E DA ATUALIDADE Goiânia 2023 WELBER GONÇALVES PROPHETA INFLUÊNCIA DE DIOFANTO DE ALEXANDRIA NA MATEMÁTICA DO PERÍODO DA GRÉCIA ANTIGA E DA ATUALIDADE Trabalho acadêmico entregue digitalmente ao professor da disciplina IME0381 – História da Matemática I – como parte dos pré-requisitos para aprovação na disciplina supracitada. Professor: Prof. Dr. Humberto Clímaco Goiânia 2023 1 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................... ......................... 2 2 VIDA E OBRA DE DIOFANTO ......................................................... 3 2.1 BREVE BIOGRAFIA DE DIOFANTO................................................. 3 2.2 OBRA DE DIOFANTO....................................................................... 3 2.3 IMPACTOS DA OBRA DE DIOFANTO NA GRÉCIA ANTIGA.......... 5 2.4 IMPACTOS DA OBRA DE DIOFANTO PÓS GRÉCIA ANTIGA....... 7 2.5 RELAÇÃO ENTRE A OBRA DE DIOFANTO E O DESENVOLVIMENTO DA ÁLGEBRA ............................................. 8 3 CONCLUSÕES ................................................................................ 9 4 REFERÊNCIAS ................................................................................ 10 2 1 INTRODUÇÃO A matemática grega difere daquelas desenvolvidas na Babilônia e no Egito Antigo. Nessas duas civilizações, a matemática era vista como mera ferramenta de resolução de problemas cotidianos relacionados à agricultura, administração, agrimensura, arquitetura, astronomia etc. A inovação trazida pelos gregos foi o uso da retórica, uma sequência lógica composta por proposições encadeadas. Além da retórica havia uma preocupação quanto ao entendimento do método empregado para resolver determinado problema, ou seja, para os gregos não bastava a solução de um determinado problema “funcionar”. O entendimento das etapas da resolução de um problema bem como o porquê de cada passo tomado na resolução era relevante para os pensadores matemáticos gregos. (STRUIK, 1992 p. 72 e 73) Além do emprego da retórica, outra característica marcante da matemática grega era o uso sistemático de geometria como ferramenta principal da resolução de diversos problemas matemáticos. Atualmente sabe-se que há uma grande variedade de problemas matemáticos cujo escopo de resolução foge da área da geometria. Diofanto de Alexandria deixou seu legado na história da matemática. Sua contribuição mais relevante foi a obra Aritmética, que serviu como base para o desenvolvimento da álgebra moderna, pois trazia uma proposta inovadora para a matemática grega: o uso de abreviaturas para representar grandezas desconhecidas – a álgebra sincopada. O desenvolvimento matemático de Diofanto foi um divisor de águas para a matemática grega, bem como para a matemática da atualidade. (STRUIK, 1992 p. 106; EVES, p. 208 e 209; SILVA et. al.,2020) Embora haja divergências na literatura quanto ao seu ano de nascimento e morte, sua obra contribuiu significativamente para o desenvolvimento da matemática que se tem atualmente. 3 2 VIDA E OBRA DE DIOFANTO 2.1 Breve biografia de Diofanto Há poucos – e divergentes – registros históricos sobre o ano do seu nascimento e morte. O único dado concreto sobre ele é sua idade ao falecer: 84 anos. Essa informação é extraída de um poema da obra Antologia Grega, que se apresenta na forma de adivinha matemática. (GAMAS, 2013; Melo 2015) A adivinha matemática em questão é a seguinte: Este túmulo guarda Diofanto. Ó maravilha imensa! O túmulo com astúcia conta a duração da sua vida. A sexta parte da sua vida, o deus permitiu-lhe ser criança; um doze avos da vida depois, a primeira barba cresceu; uma sétima parte depois, acendeu nele o fogo do himeneu, que ao quinto ano de casado lhe concedeu um filho. Ah, infeliz filho tão amado! Ao atingir metade da idade com que morreria seu pai, queimou-se o seu corpo frio. Ao cabo de quatro anos a enganar a sua dor com o estudo dos números, encontrou enfim o cabo dos seus dias. (JESUS, p. 110 e 111. tradução, sem ano) A adivinha matemática pode ser convertida algebricamente na seguinte equação: 𝑥 = 𝑥 6 + 𝑥 12 + 𝑥 7 + 5 + 𝑥 2 + 4 84𝑥 = 14𝑥 + 7𝑥 + 12𝑥 + 420 + 42𝑥 + 336 9𝑥 = 756 𝑥 = 84 O período no qual Diofanto viveu permanece incerto. Na história da matemática considera-se, por consenso dos estudiosos da área, que o período de atividade mais intensa de Diofanto tenha sido, no contexto alexandrino, por volta do século III d.C. 2.2 Obra de Diofanto Alguns séculos após Euclides escrever Os Elementos, Diofanto escreveu sua obra de maior destaque, Aritmética. Essa obra de Diofanto é composta por 13 4 volumes, dos quais apenas 6 desses são conhecidos, enquanto os demais volumes se perderam. A obra é uma abordagem analítica da teoria algébrica dos números que eleva o autor à condição de gênio em seu campo. A parte remanescente do trabalho é dedicada à resolução de 130 problemas, numa variedade considerável, cujas resoluções conduzem a equações do primeiro e do segundo graus. Apenas uma cúbica muito particular é resolvida. O assunto do primeiro livro é equações determinadas em uma incógnita e dos demais de equações indeterminadas de segundo grau, e às vezes de grau maior, em duas ou três incógnitas. A falta de métodos gerais é nítida, e a aplicação iterada de artifícios engenhosos concebidos especificamente para as necessidades de cada problema. Diofanto admitia somente respostas entre os números racionais positivos e, na maioria dos casos, satisfazia-se com apenas uma resposta do problema, sem se preocupar com a existência de mais soluções ou até mesmo com a existência de infinitas soluções. Há enunciados de teoremas penetrantes na Aritmética; assim é que encontrado, sem prova, mas com uma alusão à Porismas, que a diferença entre dois cubos racionais é também a soma de dois cubos racionais — uma questão que posteriormente mereceria a atenção de Viète, Bachet e Fermat. Há muitas proposições relativas à representação de números como soma de dois, três ou quatro quadrados, um campo de investigações seria posteriormente completado por Fermat, Euler e Lagrange. Deve-se ter em mente que “número” significa “número racional positivo”. Os problemas algébricos indeterminados em que se devem achar apenas as soluções racionais tornaram-se conhecidos como problemas diofantinos. Na verdade, o uso moderno dessa terminologia muitas vezes impõe a restrição de que as soluções sejam inteiras. Porém, essa espécie de problema não se originou com Diofanto, assim como não foi ele o primeiro a trabalhar com equações indeterminadas ou a resolver equações quadráticas de maneira não geométrica, como às vezes se afirma. 5 2.3 Impactos da Obra de Diofanto na Grécia antiga O trabalho de Diofanto trouxe uma nova perspectiva no que diz respeito à representação dos números: o uso de abreviações para representar grandezas desconhecidas no processo de resolução de problemas matemáticos – ou simplesmente álgebra sincopada. O processo de resolução de problemas matemáticos empregava o uso da retórica, que consistia no uso excessivo de palavras durante para descrever a resolução dos problemas, transformando o processo lógico dedutivo em trechos pseudoliterários. A introdução de termos abreviados por Diofanto foi a primeira tentativa de simplificar a escrita matemática empregada na época. Diofantotinha abreviações para a incógnita, potências da incógnita até a de expoente seis, subtração, igualdade e inversos. O símbolo usado por ele para a incógnita é o sigma final grego ς. Na álgebra sincopada de Diofanto, “incógnita ao quadrado” se indica por Δ𝑌, (as duas primeiras letras da palavra grega dunamis (ΔΥΝ𝐴ΜΙΣ) que significa “potência”) e “incógnita ao cubo” denota-se por ΚΥ, (as duas primeiras letras da palavra grega kubos (ΚΥΒ𝑂Σ) que significa “cubo”). (SERRÃO; BRANDEMBERG, 2014) Para quarta potência utilizava se ΔΥΔ (quadrado-quadrado), para quinta potência, ΔΚΥ (quadrado-cubo) e para sexta potência ΚΥΚ (cubo-cubo). O símbolo para operação de subtração é parecido com um V invertido com a bissetriz traçada nele. A explicação mais aceita é que o símbolo utilize a primeira e a última letra da palavra grega leipis (ΛΕΙΨΙΣ) que significa “menos”. (SERRÃO; BRANDEMBERG, 2014) Todos os termos negativos de uma expressão eram reunidos e antes deles se escrevia o sinal de menos. Indicava-se a adição por justaposição; e o coeficiente da incógnita ou de uma potência qualquer da incógnita era representado por um numeral grego alfabético logo em seguida ao símbolo a que se deveria ligar. E quando houvesse um termo constante, então usava-se Μ̇, uma abreviação da palavra grega monades (Μ𝑂ΝΑΔΕΣ), que significa “unidades”, seguido do coeficiente 6 numérico apropriado. As Informações apresentadas podem ser sintetizadas na tabela a seguir: Símbolo Álgebra de Diofanto Simbologia Algébrica Atual Adição Ausente + subtração − igualdade 𝜖𝜎𝜏𝜄 = incógnita ς 𝑥 Termo constante Μ̇ Qualquer elemento em ℝ Incógnita ao quadrado Δ𝑌 𝑥2 Incógnita ao cubo ΚΥ 𝑥3 Incógnita a 4ª potência ΔΥΔ 𝑥4 Incógnita a 5ª potência ΔΚΥ 𝑥5 Incógnita a 6ª potência ΚΥΚ 𝑥6 Tabela 1: Alguns Símbolos da álgebra sincopada de Diofanto. Feita a partir de (SERRÃO; BRANDEMBERG, 2014) O sistema numérico empregado adotado na Grécia encontra-se na figura 1. Figura 1: Sistema de numeração grego 7 Seguindo a tabela construída anteriormente, bem como o sistema de numeração grego, e aplicando a regra da justaposição para a adição, e da reunião de todos os elementos negativos para aplicar o símbolo “menos” antecedendo todos esses termos e aplicando o sistema de numeração da época, é possível construir uma tabela que relacione expressões da álgebra atual com a álgebra sincopada de Diofanto: Álgebra atual: Álgebra Sincopada de Diofanto 𝑥2 − 5𝑥 = 2 Δ𝑌𝛼 ς𝜖 𝜖𝜎𝜏𝜄 Μ̇𝛽 𝑥3 − 8𝑥2 + 2𝑥 = 4 Κ^Υ𝛼ςβ Δ𝑌 η 𝜖𝜎𝜏𝜄 Μ̇δ Tabela 2: Equivalência entre a simbologia proposta por Diofanto e a utilizada atualmente. 2.4 Impactos da Obra de Diofanto pós Grécia Antiga Após Diofanto, o desenvolvimento matemático estagnou durante vários séculos. Sua obra foi “redescoberta” durante o período do Renascimento, fornecendo subsídios, apesar de rudimentares quando comparados com a matemática atual, para o desenvolvimento do que atualmente se conhece como álgebra. Um dos volumes traduzidos de Aritmética inspirou o matemático Fermat a elaborar o que se conhece atualmente como pequeno teorema de Fermat, ou simplesmente, último teorema de Fermat, cuja demonstração foi obtida em meados da década de 90 do século XX, dada sua grande complexidade. (Neto, 2016; Ribeiro, 2014) O trabalho de Diofanto foi um ponto de partida para o desenvolvimento da teoria dos números – campo da matemática que estuda a natureza dos números e diversos critérios de divisibilidade. Além da teoria dos números, o campo da álgebra se beneficiou consideravelmente das obras desse matemático. Em Diofanto, grandezas conhecidas e desconhecidas possuíam mesmo status matemático. Em suas obras, há um rompimento com o pensamento geométrico presente desde os egípcios, babilônicos e seus antecessores gregos pois era presente o uso de 8 potências maiores que três, que na geometria não correspondiam a nenhuma grandeza. (Melo, 2013) 2.5 Relação entre a obra de Diofanto e o desenvolvimento da álgebra O desenvolvimento da linguagem algébrica é uma história que se estende por milhares de anos e que passou por vários estágios, como aponta Boyer (1974). De acordo com o autor, a linguagem algébrica passou por três estágios: o primitivo completamente verbal e escrito com palavras, o intermediário em que são adotadas algumas abreviações, e o final em que o poder de síntese das expressões é transmitido pelos símbolos. Foram necessários cerca de três mil anos para se chegar à representação algébrica atual. (BOYER, 1974) A contribuição de Diofanto ocorreu no estágio intermediário (ou sincopado). Sua obra chegou ate os árabes do oriente através de Hipácia, principal comentadora das obras de Diofanto. A Aritmética chegou até a Europa através de traduções e através do conhecimento árabe que foi desenvolvido baseado nessas obras que ate então estavam "perdidas" para o ocidente. A origem da Álgebra provavelmente teve lugar na Babilônia, por volta de 1.700 a.C, com a utilização de problemas matemáticos para resolução de questões práticas, como comércio e finanças. Procedimentos algébricos surgiram também no Egito, quase na mesma época que na Babilônia, entre 1.850 a.C e 1.650 a.C. Na Grécia, até cerca de 540 a.C, a Álgebra era geométrica, formulada pelos pitagóricos. (KATZ, 1998) O moderno simbolismo da Álgebra só surgiu por volta de 1500, e o francês François Viète foi um divisor de águas no pensamento algébrico ao separar a solução empírica de equações da moderna corrente que teve seu início com as propriedades teóricas das equações. Viète introduziu o uso das letras para indicar números desconhecidos da forma como são utilizadas até hoje. Ele foi o primeiro a utilizar letras como termos genéricos, aproximando a representação simbólica das equações à praticada atualmente. (BOYER, 1974). 9 CONCLUSÕES Diofanto foi um personagem extremamente relevante para o desenvolvimento da álgebra e da teoria dos números. Seus trabalhos forneceram as bases necessárias ao desenvolvimento da álgebra atual. Suas pesquisas e esforços para utilizar uma linguagem abreviada em detrimento da retórica e seu pioneirismo no uso da álgebra em detrimento dos métodos geométricos amplamente difundidos por seus antecessores e contemporâneos gregos inspirou grandes nomes da matemática, como Fermat. Aritmética de Diofanto foi uma das obras que serviram como base para o desenvolvimento da álgebra no período do renascimento. Tal obra, por este motivo, merece seu destaque no que diz respeito a história da matemática 10 REFERÊNCIAS 1. STRUIK, Dirk J.; GUERREIRO, J. Santos; VIEIRA, Manuel Joaquim. História concisa das matemáticas. 1992. Capítulo III. 2. EVES, Howard. Introdução à história da matemática, tradução: Hygino H. Domingues, São Paulo: Editora da Unicamp, 2004. p. 207 a 209 3. MELO, José Ronaldo. Da Aritmética a Gênese do Pensamento Algébrico em Diofanto. Elementos, Rio Branco, Ac, v. 3, n. 2, 2013. 4. RIBEIRO, Rildo. Equações Diofantinas: uma abordagem para o Ensino Médio. 2014. 5. NETO, Huilton José Domingues. Critérios de Divisibilidade. Orientador: Me. Rafael Afonso Barbosa, 2016. 6. MELO, Helena Sousa. Os Pais na Matemática. Correio dos Açores, p. 19-19, 2015. 7. SILVA, Elieudo Nogueira; DE SOUZA LIMA, Ana Cristina; DE OLIVEIRA, Tamara Sued Pinheiro. ESTUDO DA ÁLGEBRA: O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA FORMALIZAÇÃO SIMBÓLICA. Boletim Cearense de Educação e História da Matemática, v. 7, n. 20, p. 347-356, 2020. 8. GAMAS, Carlos. Diofanto de Alexandria e os primórdios da Álgebra. Parte: Colecao: http://hdl. handle. net/10316.2/29938, 2013. 9. Antologia grega. Epigramas Vários (livros IV, XIII, XIV, XV). Imprensa da Universidade de Coimbra, 2018. Livro digital. Disponível em https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/43284/1/Antologia%20Grega.%20Epigramas%20varios. pdf Acesso em 16 de dezembro de 2022. p. 110 e 111. 10. SERRÃO, Marcelo Miranda; BRANDEMBERG, João Cláudio. PROBLEMAS MATEMÁTICOS DA ANTIGUIDADE COMO ESTRATÉGIA PARA O ENSINO DE EQUAÇÕES NO 9º ANO DA EDUCAÇÃO BÁSICA. Rematec, v. 9, n. 16, p. 130- 147, 2014. 11. FERREIRA, Lucimeire de Lourdes Adorno; NOGUEIRA, Clélia Maria Ignatius. O Desenvolvimento Da Linguagem Algébrica E Sua Compreensão Por Meio Da Álgebra Geométrica. Sem ano. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_luci meire_lourdes_adorno.pdf> Acesso em 03 de fevereiro de 2023. 12. KATZ, Victor J. A History of Mathematics. An Introduction. 2. udg. Reading (Mass.) etc.: Addison-Wesley, 1998. https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/43284/1/Antologia%20Grega.%20Epigramas%20varios.pdf https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/43284/1/Antologia%20Grega.%20Epigramas%20varios.pdf https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/43284/1/Antologia%20Grega.%20Epigramas%20varios.pdf