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DO REGIME DE BENS (ARTS. 1.639 a 1.688) 1. Conceitos introdutórios e princípios • Regime de bens é o conjunto de regras de ordem privada relacionadas com interesses econômicos e patrimoniais decorrentes da entidade familiar (casamento ou união estável). o Podem ser de dois gêneros: ▪ Legal; ou ▪ Convencional. • São previstos, na legislação pátria, os seguintes regimes de bens: a) Regime de Comunhão parcial de bens; b) Regime de Comunhão Universal de Bens; c) Regime de Separação Legal ou Obrigatória; d) Regime de Participação Final nos Aquestos. • O regime de bens passa a vigorar desde a data do casamento (art. 1.639,§1º, CC). 1.1. Princípios aplicáveis aos regimes de bens 1.1.1. Princípio da Autonomia Privada; 1.1.2. Princípio da indivisibilidade do regime de bens; 1.1.3. Princípio da variedade de regimes de bens; 1.1.4. Princípio da mutabilidade justificada. 2. Das regras gerais dos regimes de bens 2.2.1. Da responsabilidade 3. Do Pacto antenupcial 4. Regime de Comunhão Parcial de Bens 5. Regime de Comunhão Universal de Bens (arts. 1.667/1671, CC) • Regime Convencional em que se comunicam tanto os bens anteriores, como os presentes e posteriores à celebração do casamento. o Instaura-se a nominada Mancomunhão (Maria Berenice Dias), ou seja: propriedade em mão comum. o Há, portanto, uma comunicação total ou plena nos aquestos, inclusive das dívidas passivas de ambos, bens recebidos por herança ou doação. 5.1. Bens que se excluem da comunhão universal (art. 1.668, CC) 5.2. Administração dos bens comuns 6. Regime da Separação Legal (também chamado de regime de bens compulsório, separação obrigatória ou separação compulsória) ou Convencional de Bens 6.1 Regime da Separação Legal ou Separação Obrigatória Previsto no art. 1.641, CC, e estabelece ser obrigatório o regime da separação de bens no casamento: Obs. É norma de ordem pública e objetiva a proteção de determinadas pessoas. Obs.2. Não exige pacto antenupcial, bem como não é autorizado aos nubentes sua realização visando evitar a separação obrigatória (cf. art. 1.655, CC – “É nula a convenção ou cláusula dela que contravenha disposição absoluta de lei”). • I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; o Caso incorram no art. 1.523, CC será imposta a sanção consistente no regime da separação de bens. o Não lhes serão aplicados o regime da separação obrigatória, caso demonstrem: ▪ Inexistência de prejuízo aos herdeiros (art. 1.523, inc. I, CC); ▪ O nascimento do filho ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo de 10 meses após o começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal (art. 1.523, inc. II, CC); ▪ A inexistência de prejuízo para o ex-cônjuge (art. 1.523, inc. III, CC); ▪ A inexistência de prejuízo ao pupilo ou curatelado (art. 1.523, inc. IV, CC). ** Apesar da imposição do regime de separação obrigatória, nada impede que, posteriormente, cessada a causa que impôs o regime de separação obrigatória, possa ser pleiteada a alteração do regime de bens (art. 1.639, §2, CC). • II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos; (Redação dada pela Lei nº 12.344, de 2010) https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12344.htm#art1 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12344.htm#art1 O único critério utilizado aqui é a idade. Não há a utilização de qualquer análise das faculdades mentais ou de estado de senilidade. Obs. Objetiva proteger a pessoa idosa e, de acordo com o Senador Josaphat Marino, trata-se de prudência legislativa em favor da pessoa e de suas famílias, considerando a idade dos nubentes. “É de lembrar que, conforme os anos passam, a idade avançada acarreta maiores carências afetivas e, portanto, maiores riscos corre aquele que tem mais de setenta anos de sujeitar-se a um casamento em que o outro nubente tenha em vista somente vantagens financeiras, ou seja, que os atrativos matrimoniais sejam pautados em fortuna e não no afeto”. o Em que pese o dispositivo, na essência, objetivar a proteção de determinadas pessoas, neste caso termina por proteger os herdeiros do idoso com mais de 70 anos, possuindo feição estritamente patrimonialista e seguindo na contramão da proteção da pessoa humana (personalização do Direito Civil). Obs. Enunciado 125, da I Jornada de Direito Civil, compreendendo pela inconstitucionalidade do dispositivo, propõe sua revogação. Como Justificativa, apresenta que: “A norma que torna obrigatório o regime da separação absoluta de bens em razão da idade dos nubentes não leva em consideração a alteração da expectativa de vida com qualidade, que se tem alterado drasticamente nos últimos anos. Também mantém um preconceito quanto às pessoas idosas que, somente pelo fato de ultrapassarem determinado patamar etário, passam a gozar da presunção absoluta de incapacidade para alguns atos, como contrair matrimônio pelo regime de bens que melhor consultar seus interesses” Obs.2. Em outubro/2022 o Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral a respeito da afirmação de inconstitucionalidade do art. 1.641, inc. II, do CC – Agravo no RE, nº 1.309.642/SP (Tema 1.236). ***O dispositivo viola patentemente a dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade, o princípio da liberdade, sem prejuízo de criar uma presunção de incapacidade em decorrência da idade. Entretanto, o dispositivo permanece vigente. o Súmula 377 STF: No regime da separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. Se durante o casamento o casal adquire determinado patrimônio, ainda que em nome de um deles, razoável que o outro cônjuge também tenha direito sobre esse patrimônio. ▪ Mas e a prova do esforço comum, é necessária? Divergência. ➢ Flávio Tartuce: Há a exigência de prova do esforço comum, inclusive objetivando evitar o enriquecimento sem causa. ➢ Paulo Lobo, Maria Berenice Dias, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona: Não há necessidade de esforço comum. Afinal, a súmula transformou o regime da separação obrigatória em regime de comunhão parcial, e parece que foi mesmo essa a intenção da súmula, obtendo-se, assim, o que se pretende com a inconstitucionalidade do dispositivo. ▪ E no caso de união estável? ➢ Apesar de vozes dissonantes na doutrina, o STJ tem entendimento tranquilo a respeito da incidência da separação obrigatória àqueles que, no momento da constituição de união estável, contarem com mais de 70 anos (REsp 1.383.624/MG; REsp 154.896/RJ). o Art. 496, CC – Venda de bens do Ascendente para o Descendente: “É anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido” ▪ Dispensa-se a anuência do cônjuge, tendo em vista que este não concorre com os descendentes na sucessão (art. 1.829, inc. I, CC). ▪ Parágrafo único do art. 496: “Em ambos os casos, dispensa-se o consentimento do cônjuge se o regime de bens for o da separação obrigatória”: ➢ Solução: Súmula 177 do CJF “Art. 496: Por erro de tramitação, que retirou a segunda hipótese de anulação de venda entre parentes (venda de descendente para ascendente), deve ser desconsiderada a expressão “em ambos os casos”, no parágrafo único do art. 496” • III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. o Refere-se ao caso de suprimento de consentimento. ▪ Art. 1.519, CC: “A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz”. ➢ É o caso daquele que já possui idade núbil e não recebe, de maneira injusta, o consentimento. o Completada a maioridade, podem os nubentes pleitear a modificação do regime de bens, nos termos do art. 1.639, §2 , CC. 6.2. Regime da Separação Convencional (Absoluta, Pura ou Completa) de bens art. 1.687 e 1.688. Regime convencional(demandando a existência de Pacto Antenupcial), que estabelece que o casamento não repercute na esfera patrimonial dos cônjuges porque não haverá comunicação dos bens que cada um possuía antes ou depois do casamento. Obs. Não há a aplicação da súmula 377 do STF, uma vez que é exclusiva à separação obrigatória. 6.2.1. Administração dos bens – art. 1.687, CC; • A administração dos bens particulares compete a cada um dos cônjuges de maneira exclusiva, podendo livremente alienar e gravar de ônus real (sejam móveis ou imóveis); o Não necessita, portanto, de outorga conjugal (art. 1.647, CC) o Dívidas não se comunicam, salvo as voltadas à economia doméstica (art. 1.643 e 1.644, CC). 6.2.2. Dos deveres do Casamento • Plena subordinação a todos os deveres do casamento: o Despesas da família; o Solidariedade; o Mútua assistência; e o Sustento, guarda e educação dos filhos. • Ambos são obrigados a contribuir para as despesas na proporção dos rendimentos de seu trabalho e bens, salvo estipulação em contrário no pacto. • Autoriza-se, entretanto, a realização de doações um para o outro, sejam antes ou depois das núpcias. o O ponto de atenção aqui é que estas importam em adiantamento ao que lhes caberá em futura herança, nos termos do art. 544, CC. 6.2.3. Da comunicação dos bens • Comunicação dos bens adquiridos por esforço comum ou em condomínio o Em condomínio: Bem adquirido e em nome de ambos os cônjuges, aplicando-se a regra dos arts. 1.314 a 1.326, CC o Por esforço comum: Apesar de estar em nome de apenas um dos cônjuges, foi adquirido por esforço comum, ou seja, que concorreu para aquele acréscimo com seus recursos ou seu trabalho. ▪ Uma vez feita a prova, não há como negar a comunhão do bem acrescido, sob pena de enriquecimento ilícito. 6.3. Diferenças entre o regime da separação convencional e obrigatória Regime da Separação Convencional Regime da Separação Obrigatória Necessário Pacto Antenupcial Regime decorrente de norma legal Bens adquiridos na constância do casamento não se comunicam Bens adquiridos na constância do casamento se comunicam, independente da prova de esforço comum (súmula 377, STF) 7. Regime da Participação Final nos Aquestos (art. 1.672 a 1.686, CC) Trata-se de regime convencional híbrido, em que o patrimônio se reparte em particular e comum. Inspirado no Direito Germânico, Argentino, Gaulês, Espanhol e Lusitano. Art. 1.363, CC Alemão: “O patrimônio do marido e o patrimônio da mulher não se tornam patrimônio comum dos cônjuges. Isso se aplica também ao patrimônio que um cônjuge adquire após o casamento. Os bens adquiridos durante o casamento são, entretanto, compensados quando termina a comunhão de adquiridos”. A tônica desse regime é simples: durante o casamento, cada cônjuge mantém um patrimônio próprio, individual e livremente administrado e, quando da dissolução do matrimônio, cada um deles terá direito à meação sobre os bens que o outro adquiriu, à título oneroso, na constância da convivência. Por isso é chamado de híbrido. Na fase de nascimento e desenvolvimento, funciona como de separação de bens. No fim do regime, cada cônjuge participa dos ganhos (participação por metade) do outro. Representa, aqui, o regime da comunhão parcial. Ocorre a nominada comunhão de destinos, centrando as forças da comunhão patrimonial na ajuda recíproca para que , ambos, ao final, tenham superavit econômico. Obs. Esse direito à meação não admite renúncia ou cessão, além de se apresentar impenhorável na constância do casamento (art. 1.682, CC). Art. 1672 do CC: “No regime de participação final nos aquestos cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento”. Obs2. Bens de participação não se confundem com meação. Esta última independe de esforço comum para comunicação. Já a participação demanda esforço comum/empenho econômico. Obs. 3. 7.1. Do Patrimônio Próprio de cada cônjuge Nos termos do art. 1.673, CC integram o patrimônio próprio os bens: • Que cada cônjuge possuía ao casar; o São os bens particulares antes do casamento. • Os bens adquiridos, a qualquer título, na constância do casamento o Englobam-se os bens adquiridos de forma gratuita ou onerosa. Obs. A administração de tais bens é exclusiva de cada cônjuge, que livremente poderá alienar, desde que sejam móveis. Obs.2. A ratio essendi do regime é conferir aos cônjues 7.2. Da dissolução do casamento Caso ocorra a dissolução do casamento, os bens a serem partilhados serão apurados e calculados, havendo uma reconstituição dos aquestos. ***No caso de dissolução por divórcio, verificar-se-á o montante dos aquestos à data em que cessou a convivência ***No caso de dissolução por morte, verificar-se-á a meação do cônjuge sobrevivente de conformidade com os artigos antecedentes, deferindo-se a herança na forma estabelecida no art. 1.829 e ss. Levanta-se, aqui, o acréscimo patrimonial de cada um dos cônjuges no período de vigência do casamento. Efetua-se uma espécie de balanço. Obs. Aquestos são os bens adquiridos na constância do casamento. São aquestos: os bens próprios adquiridos na constância do casamento; e os bens comuns adquiridos na constância do casamento. • Nos termos do art. 1.674, ficam excluídos da soma dos patrimônios: o I - os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram; o II - os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade; o III - as dívidas relativas a esses bens. Obs. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos durante o casamento (presunção iuris tantum) os bens móveis Obs.2. Na definição do montante dos aquestos, serão computados: • As doações feitas por um dos cônjuges sem a autorização do outro (outorga conjugal). O bem poderá ser reivindicado ou declarado no monte partilhável por valor equivalente ao da época da dissolução. o Neste caso, apesar de a lei falar de “reivindicação”, o caso é de sujeição à ação anulatória, com prazo decadencial de 02 anos. • O valor dos bens alienados em detrimento da meação, deve ser incorporado ao monte partível. o Exceção à preferência de o cônjuge lesado, ou de seus herdeiros, de o reivindicar. • Dívidas posteriores ao casamento, contraídas por um dos cônjuges, somente este responderá, salvo prova de terem sido revertido, parcial ou totalmente em benefício do outro ou do casal. • Se um dos cônjuges solveu dívida do outro com bens do seu patrimônio; o Neste caso, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação. • Bens adquiridos pelo trabalho conjunto o Neste caso, cada um dos cônjuges terá quota igual no condomínio ou no crédito por aquele modo estabelecido. ▪ Aplica-se aqui a divisão igualitária, comportando prova em contrário caso tenha havido colaboração superior à metade do valor do bem. Obs. Não sendo possível ou conveniente a divisão de todos os bens em natureza, calcular-se-á o valor de alguns ou de todos para a reposição em dinheiro ao cônjuge não proprietário. Obs.2. Não sendo possível, porém, realizar a reposição em dinheiro, serão avaliados os bens e, mediante autorização judicial, alienados tantos quantos bastem. Obs.3. As dívidas de um dos cônjuges, quando superiores à sua meação, não obrigam ao outro, ou aos seus herdeiros. 7.3. Outras disposições • Os bens móveis, em face de terceiros, presumem-se do domínio do cônjuge devedor, salvo se o bem for de uso pessoal do outro. o Exemplo: um dos cônjuges realiza um contrato de financiamento para aquisição de um veículo. Perante o credor, o bem é do cônjuge que constar do contrato. • Os bens imóveis são de propriedade do cônjuge cujo nome constar no registro. o Impugnadaa titularidade, caberá ao cônjuge proprietário provar a aquisição regular dos bens. ▪ Há aqui, portanto, uma inversão do ônus da prova. 7.4. Exemplo e síntese 7.4.1. Exemplo Se o marido tem um patrimônio originário de R$1.000.000,00 e um patrimônio final de R$1.700.000,00; Se a esposa tem um patrimônio originário de R$500.000,00 e um patrimônio final de R$800.000,00. Considerando que todos os bens foram adquiridos onerosamente (desviando da regra do art. 1.674) durante a convivência do casal. Ela terá direito a R$350.000,00 em relação ao patrimônio dele (já que ele adquiriu R$700.000,00 durante a união) Ele terá direito a R$150.000,00 em relação ao patrimônio dela (já que ela adquiriu R$300.000,00 durante a união). Compensando-se os aquestos (um valor com o outro), obtém-se o resultado de R$200.000,00 em favor da esposa. Aqui, exigiria reposição em dinheiro ao cônjuge não-proprietário ou, não sendo possível, serão avaliados e vendidos (com autorização judicial) tantos bens quantos bastarem. 7.4.2. Em síntese Cálculo dos aquestos compreende três etapas: • Apuração dos bens do patrimônio particular (art. 1.674, CC) • Verificação dos valores dos demais bens adquiridos durante o casamento separando-se os que foram adquiridos pelo esforço comum o Deverá ser observado que: ▪ Os bens móveis presumem-se adquiridos na constância do casamento (artigo1.674, parágrafo único, CC); ▪ Nos bens adquiridos com o trabalho conjunto terá cada cônjuge quota igual (art. 1.679, CC); ▪ Os bens imóveis são de propriedade do cônjuge cujo nome constar no registro (art. 1.681, CC). ➢ Havendo impugnação pelo outro o ônus da prova é deste último (art. 1.681, parágrafo único, CC). • fazer os ajustes finais necessários, a saber: o Se ocorreram doações sem autorização do outro valor deve ser declarado no monte a ser partilhado (art. 1.675, CC); o Os bens alienados em detrimento da meação incorporam-se ao monte (art. 1676, CC); o O pagamento de dívida do outro com bens do próprio patrimônio será compensado na meação do outro cônjuge. Valor será atualizado (art. 1678 CC); o A dívida de um dos cônjuges quando superior à sua meação não compromete a do outro ou seus herdeiros (art. 1.686, CC) o Apurada a meação os bens serão divididos preferencialmente em espécie e não sendo possível em dinheiro.