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Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 1 Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores Professor: Alex Sandra Soares e Renato Soares Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 2 Introdução 3 Análise do movimento humano 3 Complexo articular do ombro 5 Articulação esternoclavicular 5 Articulação acromioclavicular 6 Articulação escapulotorácica 7 Articulação subacromial 11 Complexo articular do cotovelo 18 Articulação umerorradial 20 Articulação radioulnar proximal 20 Suporte ligamentar 21 Os movimentos do complexo do cotovelo 21 Complexo do punho e da mão 24 Os movimentos do complexo do punho e mão 29 Referências 37 Sumário Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 3 Introdução Esta aula tem como objetivo principal apre- sentar noções de anatomia e conceitos teóricos relacionados à movimentação dos membros superiores. Ao longo do texto, notas clínicas serão apresentadas para reforçar característi- cas relacionadas a anatomia e a biomecânica local. Além disso, em alguns momentos, elas vêm acompanhadas de questões relacionadas à aula, que têm como função levar o aluno a reflexão acerca dos conteúdos apresentados. Inicialmente, serão abordados conceitos relacionados à análise do movimento huma- no, os quais serão utilizados na abordagem de cada complexo do membro superior: om- bro, cotovelo, punho e mão. A descrição ana- tômica se focará nos aspectos relacionados à movimentação articular. Assim, as superfícies articulares, os estabilizadores estáticos e di- nâmicos e os músculos atuantes serão en- fatizados ao longo da aula. Depois, os movi- mentos fisiológicos e artrocinemáticos serão apresentados e discutidos do ponto de vista teórico e prático. Análise do movimento humano A associação da cinesiologia e da biomecâ- nica é fundamental na análise do movimento humano, uma vez que a primeira descreve qualitativamente o movimento e a segunda o quantifica. A cinesiologia é a ciência que tem como objetivo descrever o movimento humano. Nesse caso, durante a realização de um mo- vimento como a abdução do complexo do ombro, por meio das análises cinesiológicas, pode ser realizada a descrição da trajetória do braço e do antebraço, identificadas as fa- ses do movimento e definidos os músculos atuantes (ENOKA, 2000) Para mensurar parâmetros como a veloci- dade de execução, devem-se utilizar concei- tos da biomecânica. Esta baseia-se na mecâ- nica clássica para a descrição do movimento humano. A cinemática e a cinética são duas grandes áreas de estudo dela que utilizare- mos ao longo da aula. Ao se estudar carac- terísticas como posição, velocidade e acele- ração sem considerar as forças que geram o Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 4 movimento, estamos estudando os conceitos da cinemática. Já ao estudarmos as forças, estudamos os conceitos da cinética (HALL, 1993; AMADIO, DUARTE, 1996). A cinemática articular é dividida em dois tipos de movimento: o osteocinemático e o artrocinemático. O movimento osteocinemá- tico ocorre quando a diáfise óssea forma o raio de um círculo imaginário em um ponto fixo. Ou seja, corresponde ao movimento fi- siológico realizado voluntariamente pelo ser humano de acordo com os planos cardeais do corpo. A flexão e a extensão, a abdução e a adução e a rotação interna e externa são exemplos de movimentos osteocinemáticos. Ele é comumente chamado de movimento fisiológico, termo que será utilizado na pre- sente aula. Já os movimentos que ocorrem nas su- perfícies articulares durante a realização dos movimentos fisiológicos são denominados movimentos artrocinemáticos. Caso um mo- vimento artrocinemático esteja alterado ou bloqueado, não é possível realizar o movi- mento fisiológico em toda a sua amplitude. Tais movimentos garantem que as superfí- cies articulares mantenham o contato em todo o arco de movimento e dessa forma contribuem diretamente para a estabilidade local. Nas articulações sinoviais, as superfí- cies articulares determinam os movimentos artrocinemáticos locais: o deslizamento, o rolamento ou o movimento giratório. No deslizamento, um ponto de uma das superfícies articulares entra em contato com diferentes pontos da superfície articular oposta. Ou seja, nesse caso, temos a translação. A direção do deslizamento é determinada pelo formato da superfície articular, fato que determina a regra do côncavo-convexo, que se relaciona diretamente à forma das superfícies articulares que se encontram em movimento. Ou seja, se a superfície articular móvel for côncava, desliza na mesma direção da diáfise óssea ou do movimento angular. Já se for convexa, desliza na direção oposta à diáfise óssea. No exemplo da figura 1, extensão do joelho em cadeia cinética aberta, a tíbia (superfície articular côncava) desliza na mesma direção da diáfise óssea ou do movimento angular. Figura 1 – Ilustração da regra do côncavo-convexo. No movimento de extensão do joelho, a tíbia, que apresenta superfície articular côncava, desliza ou escorrega na mesma direção do movimento. No rolamento, os pontos de contato das superfícies articulares mudam constante- mente, ou seja, novos pontos de uma super- Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 5 fície entram em contato com novos pontos da superfície oposta. No movimento giratório, uma extremidade óssea gira sobre a outra ao redor de um eixo longitudinal. Nesse caso, o osso roda man- tendo seu eixo mecânico estacionário. No corpo humano, a maior parte das arti- culações realiza movimentos compostos, nos quais os três movimentos artrocinemáticos ocorrem simultaneamente. Diversas lesões articulares são causadas por alteração ou falta desses componentes, uma vez que os movimentos osteocinemáti- cos e atrocinemáticos são interdependentes e ocorrem em conjunto. Assim, compreen- der a artrocinemática é fundamental para o profissional que trabalha com o movimento humano. Vídeo 1: definição dos seguintes conceitos: biomecânica, cinesiologia, osteocinemática, artrocinemática, regra do côncavo-convexo Complexo articular do ombro O complexo do ombro ou cintura escapu- lar é o primeiro elo do tronco com o esque- leto apendicular e tem como função prin- cipal o posicionamento da mão no espaço. Tal função depende diretamente da grande mobilidade local, principal característica des- se complexo. Contudo, a grande mobilidade pode levar a instabilidade articular. No treina- mento físico, nos programas de reabilitação e prevenção de lesão do complexo do ombro, é fundamental que mobilidade e estabilidade sejam norteadores do trabalho a ser realiza- do. O complexo do ombro é formado por três ossos, o úmero, a clavícula e a escápula, e cinco articulações: três verdadeiras, esterno- clavicular, acromioclavicular e glenoumeral (figura 2, números 5, 4 e 1, respectivamen- te) e duas falsas, escápulo-torácica e suba- cromial (figura 2, números 3 e 2, respectiva- mente). Figura 2 – Ilustração das articulações que formam o complexo do ombro. 1 - articulação glenoumeral, 2 - articulação subacromial, 3 – articulação escápulo- torácica, 4 - articulação acromioclavicular e 5 - articulação esternoclavicular. Fonte: Kapandji, 1990. Articulação esternoclavicular A articulação esternoclavicular é do tipo selar, na qual ocorrem predominantemente os movimentos de deslizamento. Ela é for- mada pela extremidade da clavícula (verti- calmente orientada de forma convexa e ho- rizontalmente, de forma côncava), a incisura Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 6 clavicular do manúbrio do esterno e a car- tilagem da primeira costela. As superfícies articulares são extremamente irregulares, contudo, um menisco muito grosso minimi- za tal característica e aumenta a congruência local. Os ligamentos costoclavicular, esterno- claviculares (anterior e posterior) e intercla- vicular, em conjunto com o menisco local e o músculo subclávio, são responsáveis pela grande estabilidade da articulação. O subclá-vio tem função motora muitas vezes ques- tionável, mas funciona como um ligamento dinâmico para a articulação. Ele contrai-se e puxa a clavícula em direção ao manúbrio es- ternal. A articulação esternoclavicular é a única li- gação entre o membro superior e o esquele- to axial. Ainda que se caracterize como uma articulação selar extremamente estável, fun- cional como uma junta esferoide. Entre as superfícies articulares locais, ocorrem os mo- vimentos de deslizamento anteroposterior e superoinferior. Além disso, a clavícula roda ao redor do seu eixo longitudinal. Os movimen- tos locais incluem a protração e a retração (15° a 20°) no plano horizontal, a elevação e a depressão (30° a 40°) no plano frontal e a rotação (40° a 50°). Na protração, a clavícula desliza e rola anteriormente na junta ester- noclavicular; já na retração, ocorre o oposto. Na elevação, o movimento da clavícula ocor- re sobre o manúbrio esternal, fato que leva ao deslizamento para baixo desse osso; já na depressão, ela desliza para cima. Esses mo- vimentos artrocinemáticos são fundamentais para completa amplitude de movimento local e de todo o complexo do ombro. Nota clínica A articulação esternoclavicular é extre- mamente forte. Dessa forma, as luxações locais são raras, mas as fraturas da clavícu- la ocorrem frequentemente. Articulação acromioclavicular A extremidade acromial da clavícula arti- cula-se com o acrômio da escápula e forma a articulação acromioclavicular, classificada como plana. Semelhantemente à esterno- clavicular, é recoberta por fibrocartilagem e possui um disco articular. Superiormente, o ligamento acromioclavicular reforça a articu- lação, com a função de impedir a subida da clavícula nos traumas diretos. Já os ligamen- tos coracoclaviculares, conoide e trapezoide mantêm a integridade local e impedem que o acrômio deslize inferiormente em relação à clavícula. Tais ligamentos suspendem o membro superior livremente em relação ao tronco. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 7 A partir da articulação acromioclavicular, a escápula move-se amplamente. Por se tra- tar de uma superfície de deslizamento fun- damental para o movimento do complexo do ombro, a junção entre a escápula e o tórax é definida como uma articulação fisiológica. A articulação acromioclavicular não possui nenhum músculo que se conecte às suas su- perfícies ósseas e produza movimento. As- sim, os músculos que se fixam à escápula funcionam como motores para ela. A articulação acromioclavicular possui mo- vimentos triplanares: rotação em direção an- teroposterior, rotação supero-inferior e pro- tração e retração. A rotação anteroposterior da clavícula na escápula (5° a 8°) ocorre no eixo longitudinal, contudo, essa articulação contribui pouco para esse movimento, o qual ocorre principalmente na articulação ester- noclavicular (40° a 50º). A rotação superior e inferior é essencial para a elevação do com- plexo do ombro. Nesse caso, nota-se a aber- tura ou o fechamento do ângulo escapulo- clavicular. Na protração, ocorre o movimento anterior da extremidade acromial, e o inver- so ocorre na protração. Articulação escapulotorácica A escápula, com seu formato curvilíneo, contorna a parede torácica dorsal e desliza facilmente pelas oito costelas superiores, for- mando dessa forma uma junta fisiológica, a articulação escapulotorácica. O formato triangular e chato da escápula forma uma grande área para inserção de músculos, que a ligam à articulação glenoumeral (músculos intrínsecos da articulação glenoumeral - del- toide e redondo maior - e músculos do man- guito rotador - supraespinal, infraespinal, redondo menor e subescapular) e conectam o membro superior ao tronco (anteriormen- te: músculos peitoral maior, peitoral menor, subclávio e serrátil anterior; posteriormente: músculos trapézio, latíssimo do dorso, levan- tador da escápula, romboide maior e romboi- de menor). Os ligamentos coracoclaviculares e os músculos ao seu redor sustentam e estabili- zam a escápula nos movimentos do comple- xo do ombro. A escápula forma um ângulo de 30° com o gradil costal, está rodada discre- tamente no sentido da linha média a partir da sua extremidade superior e inclina-se an- teriormente em relação ao plano sagital. Tal posicionamento orienta um plano fisiológico para o movimento do complexo do ombro, o plano da escápula. Os movimentos de elevação que ocorrem no plano frontal (abdução) e sagital (flexão) não estão de acordo com o plano escapular. O plano da escápula está posicionado 30° a 45° à frente do plano frontal (figura 3). Quando o membro superior se movimenta obedecendo Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 8 a esse plano, a escápula desliza livremente em relação ao gradil costal, otimizando assim o movimento de todo o complexo do ombro. Dois músculos são fundamentais no deslizamento escapular, o serrátil anterior, fixado entre o gradil costal e a escápula, e o subescapular, fixado entre o úmero e a borda medial da escápula. Esses músculos, os quais formam uma superfície de deslizamento e ancoragem da escápula, oferecem a mobilidade necessária para que a cavidade glenoide posicione-se adequadamente e a cabeça umeral alcance a amplitude extrema de elevação do membro superior, cerca de 200°. A sincronização entre os movimentos da escápula e do úmero determinam o ritmo escápulo- umeral. A alteração do posicionamento da escápula, a falta de mobilidade local, a alteração da sinergia dos músculos que controlam os movimentos da escápula e o encurtamento muscular podem alterar o ritmo e culminar na diminuição da amplitude dos movimentos fisiológicos ou em patologias, como a síndrome do impacto. Figura 3 – Ilustração dos planos sagital, frontal e da escápula. A escápula possui funções que se relacionam ao movimento de todo o complexo do om- bro. Entre elas, podemos destacar: a manutenção do posicionamento adequado da cavidade glenoide em relação ao úmero, a realização da protrusão e da retrusão do ombro, facilitando a realização de movimentos como o do arremesso, a elevação do acrômio durante os mo- vimentos de abdução e flexão, evitando assim o pinçamento subacromial, e a transferência de velocidade, energia e força provenientes dos membros inferiores e do tronco para os membros superiores. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 9 A escápula realiza movimentos de rotação, deslizamento lateral e vertical em relação ao gradil costal, conforme ilustrado na figura 4. Figura 4 – Ilustração dos movimentos elementares da escápula: a) rotação, b) deslizamento lateral e c) deslizamento vertical. A rotação escapular ocorre em torno do eixo perpendicular ao plano da escápula. Na rotação para cima (figura 4a, lado esquerdo), a escápula roda para cima de tal forma que o ângulo inferior orienta-se para fora do gradil costal e a cavidade glenoide dirige-se para o alto. A rotação escapular pode alcançar a amplitude de 60°, como ocorre na abdução da articulação glenoumeral. Na rotação para baixo, ocorre o movimento oposto. No deslizamento lateral, ela dirige-se laterolateralmente, ou seja, para dentro, ou aduz (figura 4b, lado direito), e para fora, ou abduz (amplitude total de 10 mm a 12 mm) (figura 4b, lado esquerdo). No deslocamento vertical, desliza superiormente ou para o alto (figura 4c, lado esquerdo) e inferiormente ou para baixo (15 mm) (figura 4c, lado direito). Esses movimentos são considerados elementares da articulação. Durante a elevação da articulação glenoumeral, há a combinação deles em amplitude variáveis. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 10 O quadro 1 apresenta os movimentos elementares da escápula e os músculos responsá- veis por eles. Quadro 1 – Movimentos elementares da escápula e respectivas ações musculares Elevação Trapézio fibras descendentes, levantador da escápula, romboide maior e menor. Depressão Trapézio fibras ascendentes, subclávio, peitoral menor, serrátil anterior. Rotaçãopara cima Trapézio fibras descendentes, trapézio fibras ascendentes e serrátil anterior. Rotação para baixo Levantador da escápula, subclávio, peitoral menor, romboide maior e menor. Protração Serrátil anterior e peitoral menor. Retração Trapézio fibras transversas, romboide maior e menor. Nota clínica A função do serrátil anterior é fundamental para o posicionamento e a movimentação da escápula. Nos casos de paralisia do músculo devido a lesão do nervo torácico longo, a margem medial da escápula move-se lateral e posteriormente e, consequentemente, ela afasta- se do gradil costal. Essa condição é visível nas avaliações posturais ao se analisar o ritmo escapuloumeral durante a abdução do complexo do ombro e nos exercícios de flexão de braços em cadeia cinética fechada. A escápula alada é um achado comum nas avaliações posturais. Qual a repercussão disso sobre o complexo do ombro? Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 11 Articulação subacromial O espaço delimitado entre o tubérculo maior da cabeça umeral (inferiormente), o proces- so coracoide (anteromedialmente) e o arco coracoacromial (superiormente) forma os limites da articulação subacromial. Do ponto de vista anatômico, não se pode fazer tal denominação, mas o deslizamento presente nessa região durante os movimentos do complexo do ombro levam à classificação dela como articulação do ponto de vista fisiológico. Nesse espaço, passam importantes es- truturas do complexo do ombro: a cabeça do úmero, o tendão da cabeça longa do músculo bíceps braquial, a porção superior da cápsula articular, o músculo supraespinal e as margens superiores dos músculos subescapular e infraespinal, a bursa subdeltoidea e a superfície inferior do arco coracoacromial. O espaço anatômico presente é diminuído durante os movimentos de elevação do com- plexo do ombro, especialmente entre 60° e 120°, uma vez que, nesse arco de movimento, as estruturas locais podem ser comprimidas pela cabeça do úmero. Os movimentos artroci- Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 12 nemáticos garantem a integridade articular durante os osteocinemáticos, contudo, qualquer desarranjo pode levar a síndrome do impacto. Nota clínica biomecânica_complexo_ombro_parteII A síndrome do impacto caracteriza-se como o pinçamento das estruturas contidas no espaço subacromial durante a elevação do ombro. Esse pinçamento ocorre em um determinado momento durante a elevação da articulação glenoumeral, especialmente entre 60° e 120°. Assim, determina um arco doloroso ou uma limitação dolorosa do movimento. O pinçamento é mais comum entre indivíduos de meia idade ou mais velhos. Acome- te preferencialmente profissionais que utilizam o movimento repetitivo de abdução do ombro ou atletas de esporte de arremesso. O pinçamento subacromial está relacionado ao arco doloroso, ou seja, à medida que o indivíduo realiza a elevação do ombro, a compressão das estruturas subacromiais de- flagra a dor. O arco doloroso pode ocorrer por comprometimento da porção subacromial da bursa subacromial ou sudeltoidea, tendinite do supraespinal, infraespinal, redondo menor ou subescapular, tendinite na cabeça longa do bíceps braquial e estiramento da articulação acromioclavicular inferior. Várias podem ser as causas do desenvolvimento dos sintomas. Algumas podem re- lacionar-se à biomecânica da articulação glenoumeral. Detectar a origem do problema pode levar ao seu tratamento efetivo. Quando a causa não é tratada, o fator irritante crônico se manterá, e os sintomas serão aliviados, contudo retornarão, e então o processo se tornará crônico. Entre as causas da patologia, podemos destacar: hipermobilidade da cápsula e dos ligamentos glenoumerais, diminuição da mobilidade escápulo-torácica durante a elevação do com- plexo do ombro e perda da sinergia muscular durante a elevação. Como estes fatores apontados anteriormente podem levar ao surgimento da patologia? Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 13 Articulação glenoumeral A articulação glenoumeral é do tipo esferoide multiaxial, formada pela cabeça umeral, orientada medialmente, para o alto e para trás, e pela cavidade glenoide da es- cápula, disposta lateralmente, para o alto e para frente. A cavidade glenoide é plana, o que con- tribui para a grande mobilidade articular, po- rém pouco estável. O lábio glenoidal, estru- tura fibrocartilaginosa inserida na margem da cavidade e na cápsula articular, aumenta em 50% a profundidade local, propiciando aumento da congruência articular. O encaixe do tipo bola e soquete dessa articulação garante ao complexo do ombro movimentos tridimensionais amplos com di- versas variantes. O lábio glenoidal, a cápsula articular e o suporte ligamentar formam o grupo dos es- tabilizadores estáticos locais, que se somam aos estabilizadores dinâmicos com intuito de garantir estabilidade em toda a amplitude de movimento. A cápsula articular, fixada infe- riormente ao colo do úmero e superiormente à margem óssea da cavidade glenoide, é re- forçada pelos ligamentos glenoumerais supe- rior, médio e inferior. Os três feixes reforçam anteriormente a cápsula, pois se fixam entre a cavidade glenoide, o tubérculo menor e o colo anatômico do úmero. Superiormente, o ligamento coracoumeral e o arco coracoacro- mial oferecem proteção à articulação glenou- meral. Entre os estabilizadores dinâmicos locais, destaca-se o manguito rotador. Esse mangui- to musculocutâneo que envolve a articulação glenoumeral é formado por quatro músculos: o supraespinal, o infraespinal, o redondo me- nor e o subescapular. Durante os movimentos que incluem a elevação do ombro, o manguito rotador re- gula a posição da cabeça do úmero dentro da cavidade glenoide. Durante a abdução, produz a coaptação transversal e a transla- ção inferior da cabeça umeral, permitindo que o movimento ocorra sem compressão das estruturas que se encontram no arco co- racoacromial (figura 5). Em conjunto, a ca- beça longa do bíceps auxilia na coaptação transversal da cabeça umeral. Esses múscu- los ainda funcionam como reforço anterior e Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 14 posterior da cápsula, controlando os movimentos artrocinemáticos locais. O deslizamento anterior da cabeça umeral, presente, por exemplo, nos movimentos que associam abdução e rotação externa, é controlado pelos músculos subescapular e pela cabeça longa do bíceps. Já o supraespinal, o infraespinal e o redondo menor estabilizam a cabeça umeral no desli- zamento posterior. Figura 5 – Ilustração das linhas de força desenvolvida pelos músculos do manguito rotador. A estabilidade longitudinal também é assistida pelos músculos locais. Anteriormente, os músculos peitoral maior (porção clavicular), coracobraquial e cabeça curta do bíceps e, posteriormente, os músculos deltoide e tríceps braquial estabilizam a articulação glenoumeral dos esforços longitudinais. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 15 Nota clínica A grande mobilidade da articulação glenoumeral facilita a ocorrência de episódios de luxação local em esportes de alta velocidade, nos quais a articulação é exigida nos extremos da amplitude de movimento. Desequilíbrio muscular com predomínio dos rotadores internos sobre os externos e episódios de luxação recorrente ao alcançar objetos acima da cabeça são alguns dos sinais apresentados por aqueles que sofreram uma luxação do ombro. Os movimentos que levam a um novo episódio de lesão frequentemente são simples e pouco estressantes, como se espreguiçar ao acordar. Após o tratamento, conservador ou cirúrgico, para total retorno às atividades laborais e esportivas, o portador da luxação do ombro deve passar por uma série de orientações e exercícios específicos para restauração do controle neuromuscular local. Quais são os pontos fundamentais a ser recuperados do ponto de vista biomecânico após a luxação anterior da articulação glenoumeral? A articulação glenoumeral possuitrês graus de liberdade: abdução e adução (plano fron- tal, eixo anteroposterior), flexão e extensão (plano sagital, eixo látero-lateral) e rotação interna e externa (plano transverso, eixo longitudinal). No plano horizontal (eixo vertical), têm-se ainda os movimentos de adução (45°) e abdu- ção (135°) horizontais. Durante os movimentos da articulação glenoumeral, os movimentos de rolamento e des- lizamento estão de acordo com a regra do côncavo-convexo. O movimento dela depende diretamente da integridade e da mobilidade das demais arti- culações do complexo do ombro. Todas as articulações locais trabalham conjuntamente em todos os movimentos fisiológicos locais. A abdução glenoumeral é dividida em três fases: de 0° a 90°, de 90° a 150° e de 150° a 180°. Em cada fase, os músculos atuantes, as articulações do complexo do ombro e os movimentos artrocinemáticos obedecem a um padrão. A seguir, descreveremos cada fase. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 16 • Abdução de 0° a 90° Atualmente, há um consenso em que os músculos deltoide e supraespinal trabalham em conjunto toda a amplitude de movimento da articulação. Porém, nos instantes iniciais, de 0° a 30°, há um predomínio do supraespi- nal sobre o deltoide. Nesse momento, os demais músculos do manguito rotador e o bíceps braquial tra- cionam a cabeça do úmero para dentro da cavidade glenoide, desempenhando o papel de coaptadores articulares. Em média a 20° de abdução, a escápula começa a rodar para cima, e a clavícula eleva-se e roda ao redor do seu eixo longitudinal. A 90°, a elevação cessa em função da tensão do ligamento costo-clavicular. Além disso, nesse ponto, o movimento na articulação glenoumeral é in- terrompido pelo contato do tubérculo maior do úmero com o arco coracoacromial. • Abdução de 90° a 150° A rotação da escápula para cima ou no sentido anti-horário alcança o seu limite nes- se instante. Seu objetivo é posicionar a cavidade gle- noide para cima e para o lado enquanto o úmero roda lateralmente e desliza inferior- mente, tirando o tubérculo maior da área de impactação do arco coracoacromial. A rota- ção para cima do ângulo inferior da escápu- la e o posicionamento da cavidade glenoide lateralmente e para o alto ocorrem graças à ação conjunta das fibras ascendentes e des- centes do trapézio e do serrátil anterior. O músculo trapézio posiciona a cavidade glenoide, e o serrátil anterior realiza a co- aptação da escápula contra o gradil costal. Nesse momento, é possível verificar a rota- ção para cima da escápula, a aproximação do ângulo inferior em direção ao gradil costal e a queda da porção superior (espinha da es- cápula). A rotação escapular ocorre concomi- tantemente à rotação posterior (30° a 40°) e à elevação (30°) da clavícula, movimentação que envolve as articulações esternoclavicular e acromioclavicular. À medida que a amplitu- de de movimento aumenta, há o tensiona- mento da porção anteroinferior da cápsula. • Abdução de 150° a 180° Nessa fase, as articulações vertebrais par- ticipam ativamente do movimento de abdu- Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 17 ção. Há uma inclinação lateral do tronco realizada pelos músculos paravertebrais do lado oposto do ombro abduzido. Se os dois membros superiores são abduzidos, é necessário que ocorra o aumento da hiperlordose lombar. Em relação ao úmero, nesses instantes finais, ele roda medialmente para prover liberdade à porção anteroinferior da cápsula articular. Durante a abdução, a uma elevação de 10° da porção medial da clavícula, o ângulo esca- puloclavicular abre-se 70° e, como dito anteriormente, a clavícula roda no sentido posterior cerca de 45°. Ao se considerar o movimento da escápula, os movimentos elementares somam-se, as- semelhando-se a um movimento de sino. Até 120° de abdução, a cada dois graus de mo- vimento na articulação glenoumeral, há um grau na escapulotorácica; depois, a relação é de um para um. Um movimento de báscula ocorre de tal forma que, na escápula, o ângulo inferior se dirige para a frente e para cima, enquanto a parte superior, correspondente à espinha da escápula, se desloca para baixo e para trás. Isso foi descrito na fase correspon- dente a 90° a 150° como a aproximação do ângulo inferior em direção ao gradil costal e a queda da espinha da escápula. Durante a flexão, os movimentos artrocinemáticos são semelhantes aos descritos para a abdução. As principais diferenças relacionam-se às amplitudes. A adução a partir da posição anatômica não ocorre, mas necessita ser associada à flexão para alcançar a amplitude de movimento de 45°. O deslizamento da cabeça umeral é fundamental em todos os movimentos fisiológicos da articulação. Durante a rotação interna, o úmero desliza posteriormente, e, na externa, anteriormente. Na adução, desliza posteriormente, e, na abdução horizontal, anteriormente. O quadro 2 apresenta os movimentos fisiológicos da articulação glenoumeral e os múscu- los responsáveis por eles. Quadro 2 – Movimentos fisiológicos da articulação glenoumeral e respectivos músculos responsáveis Flexão Peitoral maior, deltoide fibras anteriores, coracobraquial. Extensão Grande dorsal, redondo maior, redondo menor, deltoide fibras posteriores. Abdução Deltoide, supraespinal. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 18 Adução Latíssimo do dorso, redondo maior e menor. Rotação interna Subescapular, redondo maior, grande dorsal, peitoral maior (secundário fibras anteriores do deltoide). Rotação externa Infraespinhoso e redondo menor (secundário, deltoide fibras posteriores). Adução horizontal Deltoide fibras anteriores, subescapular, peitoral maior e menor e serrátil anterior. Abdução horizontal Supraespinal, infraespinal, redondo maior, redondo menor, trapézio fibras transversa e latíssimo do dorso. Nota clínica A abdução associada à rotação externa compõe o mecanismo de lesão mais frequente do complexo do ombro, a luxação anterior. Quais músculos devem ser trabalhados após sua ocorrência? Por quê? Complexo articular do cotovelo O complexo do cotovelo é composto por três articulações envolvidas por uma única cáp- sula articular que têm como função realizar a junção mecânica entre o braço e o antebraço. Dessa forma, trabalha em conjunto com o complexo do ombro com a finalidade de aproxi- mar e afastar os objetos apanhados pela mão. O complexo do cotovelo é formado por três ossos - o úmero, o rádio e a ulna - e três ar- ticulações - a umeroulnar, a umerorradial e a radiulnar proximal. Articulação umeroulnar A articulação umeroulnar, do tipo gínglimo (ou em dobradiça) uniaxial, é a principal do complexo do cotovelo. Na extremidade inferior do úmero, a superfície articular da tróclea umeral possui a estrutura de um carretel, que se estende anteriormente até a fossa supratro- Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 19 clear e posteriormente até a fossa olecraniana. Essas duas fossas têm a função de aumentar a amplitude da flexo-extensão, uma vez que retardam o contato do processo coronoide da ulna com a fossa supratroclear durante a flexão e do olécrano com a fossa olecraniana durante a extensão (figura 6). Dessa forma, a incisura troclear da ulna, com seu formato de 180° de arco, pode deslizar e alcançar os níveis extremos de amplitude articular. Figura 6 – Ilustração das fossas supratroclear (anteriormente) e olecraniana (posteriomente). Note que, durante a flexo-extensão, as fossas retardam o contato do úmero com a ulna e aumentam a amplitude de movimento do complexo do cotovelo. Fonte: Kapandji, 1990. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 20 O ângulo de carregamento é uma carac- terística da articulação umeroulnar. Anterior- mente, o sulco troclear umeral é verticalizado e paralelo ao sulco longitudinal do úmero. Já pos- teriormente, o sulco tem direção oblíqua para baixo e para fora, o que determina um ângulo agudo de 15° com o eixo longitudinal poste- rior do úmero. Taiscaracterísticas determinam a angulação valga característica do complexo do cotovelo, maior nas mulheres (13° a 16°, vista anterior em posição anatômica) do que nos homens (11° a 14°) (figura 7). Figura 7 – Ilustração do ângulo de carregamento. Ainda que a articulação umeroulnar fun- cione como uma dobradiça, apresenta 5° de rotação interna e externa no final dos movi- mentos de flexo-extensão (VIEIRA; CAETA- NO, 1999). Essa rotação é fundamental para que a articulação alcance os extremos da amplitude articular. Articulação umerorradial A articulação umerorradial é uma junta si- novial em gínglimo que atua em conjunto com a ulna nos movimentos de flexo-extensão do complexo do cotovelo. Durante a flexo-exten- são, a face superior côncava da cabeça do rá- dio desliza sobre o capítulo do úmero, e, na pronação e na supinação, gira como um pivô. Articulação radioulnar proximal A prono-supinação é definida como o mo- vimento de rotação do antebraço em torno de seu eixo longitudinal. Tal movimento ofe- rece ao punho um terceiro grau de liberdade caracterizado como fundamental para diver- sas atividades funcionais da mão, por exem- plo, abrir uma maçaneta. A prono-supinação dá-se na articulação radioulnar proximal, pertencente ao comple- xo do cotovelo, e na radioulnar distal, per- tencente ao punho. Na articulação radiulnar proximal, o rádio e a ulna estão lado a lado, formando uma articulação uniaxial em pivô do tipo trocoi- de. Esta é formada entre a cabeça do rádio convexa e o anel ósseo fibroso pertencente à incisura radial da ulna côncava. Estabilizando a cabeça do rádio à ulna nessa região, está o ligamento anular, o qual compõe 80% da superfície articular. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 21 Suporte ligamentar Os ossos do complexo do cotovelo são fi- xados pela cápsula articular, reforçada late- ralmente pelos ligamentos colateral lateral e anular, os quais formam o complexo do liga- mento colateral lateral ou radial, e medial- mente pelo ligamento colateral medial. O ligamento colateral lateral estende-se desde a margem proximal da cabeça radial até a porção proximal da ulna. O ligamen- to anular envolve a cabeça do rádio a partir das margens anterior e posterior da incisura radial. O ligamento colateral medial origina-se dos dois terços centrais da superfície ante- roinferior do epicôndilo medial do úmero e parte para a porção proximal da ulna. Gra- ças ao formato das superfícies articulares, aos ligamentos locais, à cápsula articular e às unidades musculotendíneas, o complexo do cotovelo é considerado estável, fato que caracteriza tal articulação como propensa às lesões por esforços repetitivos. Os ligamentos locais têm como função a manutenção da coaptação articular, a res- trição dos movimentos laterais (estresse em valgo e varo) e a fixação da cabeça radial durante os movimentos de prono-supinação. Nota clínica A cabeça do rádio não possui caracte- rísticas anatômicas para suportar os es- forços de tração. O único elemento que impede a descida desse osso em relação à ulna é a membrana interóssea. A luxação da articulação radioulnar proximal ocor- re principalmente em crianças em idade pré-escolar. A história do episódio inclui o levantamento abrupto da criança pelo antebraço. Nesse caso, o complexo do co- tovelo encontra-se em extensão, e o an- tebraço, pronado. A tração pode romper o ligamento anular, e a cabeça do rádio então é exposta. Os movimentos do complexo do coto- velo Os movimentos do complexo do cotovelo envolvem importantes forças de tração nas unidades musculotendíneas e ligamentares e grande força de cisalhamento e compressão nas extremidades ósseas. O movimento de flexo-extensão do coto- velo (plano sagital, eixo laterolateral) ocorre nas articulações umeroulnar e umerorradial. Já a prono-supinação ocorre na radioulnar proximal e distal. Ao se partir da extensão total, é possível alcançar ativamente 145° de flexão. Já passivamente, pode-se chegar a Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 22 160° de flexão e 10° de hiperextensão. Ro- tações automáticas, adução e abdução ocor- rem simultaneamente aos movimentos de flexo-extensão. Além disso, a prono-supina- ção compõe o movimento nos extremos da amplitude de movimento. Durante a flexão, tem-se o deslizamento anterior da incisura troclear na tróclea ume- ral até o momento em que o processo co- ronoide alcança a fossa coronoide; o rádio aproxima-se do capítulo, aumentando as forças de compressão local, e a ulna supina e aduz em relação ao úmero. Na extensão, ocorre o oposto: a incisura troclear desliza posteriomente na tróclea umeral, e o bico do olécrano alcança a fossa olecraniana; o rádio afasta-se do capítulo, e a ulna prona e abduz em relação ao úmero. A capacidade de adução e abdução da ulna fica mais evidente durante a prono- -supinação. Na posição totalmente supinada, ela aproxima-se da linha média do corpo, ou seja, aduz. Já na pronação, afasta-se, ou seja, abduz. Os principais flexores do cotovelo são os músculos braquial, bíceps braquial e bra- quiorradial. Os músculos pronador redondo, flexor radial do carpo, flexor ulnar do carpo e extensor radial longo do carpo atuam no movimento de forma secundária. A ação dos flexores do cotovelo é máxima próximo a 90°; nessa posição, a força muscular torna- -se perpendicular à direção do braço de ala- vanca, fato que favorece a ação dos motores primários da articulação. O principal extensor do cotovelo é o músculo tríceps braquial; o ancôneo atua no início do movimento e para manutenção dele. O ato de alimentar-se depende diretamen- te do complexo do cotovelo. Quando pega- mos o alimento, realizamos a extensão com- binada com a pronação, e, ao levá-lo à boca, a flexão com a supinação. O músculo bíceps braquial, responsável pelas duas ações, é chamado de músculo da alimentação. No complexo do cotovelo, as restrições im- postas pelas estruturas locais são bastante evidentes. A extensão do cotovelo é limitada pelo apoio do bico do olécrano na fossa ole- craniana, pela tensão da parte anterior da cápsula articular e pela resistência da mus- Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 23 culatura flexora. Caso os limites articulares sejam ultrapassados, podem ocorrer fratura do olécrano e ruptura da cápsula. A luxa- ção posterior do cotovelo está entre as mais comuns do corpo humano. Caso o olécrano resista ao estresse de uma hiperextensão, a articulação pode então se luxar. A flexão da articulação realizada ativa- mente é limitada pelo contato das massas musculares da loja anterior do braço e do antebraço, especialmente pelo músculo bí- ceps braquial. Já na flexão passiva, as mas- sas musculares acomodam-se, e, então, o movimento alcança até 160°. Nos extremos da amplitude de flexão, o apoio da cabeça radial na fossa supracondiliana, a tensão da parte posterior da cápsula e a tensão passi- va do músculo tríceps braquial restringem o movimento. A prono-supinação corresponde à rotação do antebraço em torno do seu eixo longitu- dinal. Partindo da posição intermediária as- sociada à flexão do cotovelo, a supinação alcança 90°, e a pronação, 85°, ou seja, a rotação axial do antebraço alcança aproxi- madamente 180°. Graças a esse movimento, o punho ganha um terceiro grau de liberdade para a mão. O eixo do movimento corresponde exatamente ao do manuseio de ferramentas. A prono-supinação interfere diretamente na articulação radiocarpiana, por exemplo, os movimentos de desvio ulnar e radial de- pendem diretamente da prono-supinação. A pronação do antebraço produz o desvio ulnar do punho, o qual, consequentemente, posiciona a pinça para movimentos finos rea- lizada entre o polegar, o indicador e o médio. Esse movimento é necessário para tarefas que requeiram alta habilidade, como pegar um grão de arroz sobre uma mesa. Já a supi- nação associa-se ao desvio radial e favorece a preensão de força. Durante a pronação,o rádio gira em torno da ulna. Ele dirige-se para baixo e para fora; consequentemente, afasta-se da ulna e per- mite a passagem da tuberosidade bicipital. Na supinação, ocorre o movimento oposto. Os músculos que efetuam a supinação são bíceps braquial, supinador, abdutor longo do polegar, extensor curto do polegar e exten- sor próprio do indicador. Os dois primeiros são os principais; já os demais possuem uma pequena vantagem mecânica para supinação. Os músculos pro- nadores são pronador redondo, pronador quadrado, flexor radial do carpo, palmar lon- go e extensor radial do carpo, sendo que os principais são os dois pronadores. Os três úl- timos músculos são secundários. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 24 Nota clínica A epicondilite lateral, ou cotovelo de tenista, é uma das principais lesões do complexo do cotovelo. O processo inflamatório atinge particularmente o tendão do extensor radial curto do carpo. A dor aparece gradualmente sobre a face externa do cotovelo e intensifica-se nos movimentos de flexão do punho associados a pronação. A flexão resistida do punho é dolorosa. A etiologia é desconhecida, contudo, algumas teorias são levantadas para procurar elucidar as causas do problema: 1) fadiga por overuse; 2) quando o punho está fletido e então é realizado o desvio ulnar associado a pronação, o extensor radial curto do carpo é forçado sobre a cabeça do rádio; e 3) trauma direto ou contração violenta. Qual a melhor forma de trabalhar os extensores do cotovelo com a finalidade de prevenir lesões e ou recidivas? Complexo do punho e da mão A mão, órgão efetor do membro superior, agrega estruturas anatômicas e características mecânicas capazes de desempenhar com grande destreza tarefas motoras finas, como tocar piano, e grossas, como as executadas por um carateca para partir fibras de madeira e tijolos. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 25 O complexo do punho e da mão é formado por 27 ossos: no punho, oito ossos do carpo, e, na mão, cinco metacarpos e 14 falanges. O complexo do punho e da mão relaciona-se ainda diretamente à articulação radiulnar distal. Graças às articulações radiulnar proximal e distal, o punho tem à sua disposição o movi- mento rotacional. A prono-supinação depende diretamente da integridade das articulações radiulnar proxi- mal e distal, pois ambas movimentam-se conjuntamente a partir de um mesmo eixo articular que as atravessa. A radiulnar distal é uma articulação sinovial do tipo trocoide, formada pela cabeça da ulna e pela incisura ulnar do rádio, unidas por um disco articular fibrocartilaginoso. Esse disco fixa-se medialmente à margem da incisura ulnar e lateralmente ao processo estiloide do rádio e forma a superfície proximal da articulação radiocarpiana. O complexo do punho é formado pelas articulações radiocarpiana e mediocarpiana. A articulação radiocarpiana é formada proximalmente pela extremidade distal do rádio e pelo complexo da fibrocartilagem triangular e distalmente pelos ossos escafoide, semilunar e pi- ramidal, pertencentes à primeira fileira dos ossos do carpo. Como descrito anteriormente, o complexo da fibrocartilagem é formado por um disco ar- ticular localizado entre a fileira proximal do carpo e a ulna. Essa articulação é do tipo elipsoide, sendo que a superfície proximal (rádio e complexo da fibrocartilagem) é côncava e se articula na sua correspondente convexa formada pela porção distal da articulação. Na fileira proximal do carpo, tem-se ainda o pisiforme, o qual não se articula com o rádio e está à frente do piramidal, inserido no músculo flexor ulnar do Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 26 carpo. A principal função desse osso sesamoide é aumentar o torque produzido pelo mús- culo flexor ulnar do carpo. Figura 8 - Ilustração das superfícies proximal e distal da articulação radiocarpiana. Fonte: Adaptado de Kapandgi, 1990. A articulação mediocarpiana tem como limite proximal a primeira fileira dos ossos do car- po e distal a segunda fileira, composta pelos ossos hamato, capitato, trapézio e trapezoide. O escafoide é o maior dos ossos do carpo e é considerado ponto-chave para o complexo do punho, pois liga as duas fileiras e garante estabilidade local. Figura 9 - Ilustração das fileiras proximal e distal dos ossos do carpo e articulação mediocarpiana. Fonte: Adaptado de Kapandgi, 1991. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 27 A estabilidade da articulação radiocarpia- na é garantida pela extensa cápsula articu- lar e pelos ligamentos radiocárpico palmar, radiocárpico dorsal, colateral ulnar do carpo e colateral radial do carpo. A fileira proximal dos ossos não possui inserções musculares. A estabilidade local depende diretamente da cápsula e do ligamento interósseo entre o escafoide, o semilunar e o piramidal. As ar- ticulações intercárpicas são estabilizadas por uma série de ligamentos intrínsecos. Diversos tendões flexores e extensores divididos em compartimentos cruzam o pu- nho. Esses compartimentos são delimitados por uma estrutura ligamentar que cruza os tendões e previne que eles sejam estrangu- lados quando o punho se movimenta. Essa estrutura é chamada de retináculo. Na região dorsal do punho, tem-se o retináculo exten- sor, e, na porção palmar, o flexor. O retináculo extensor tem origem na bor- da lateral distal do rádio e migra para a su- perfície posterior distal da ulna e para seu processo estiloide. Os compartimentos deli- mitados pelos retináculos e pelos ossos são fibrósseos e revestidos por bainhas sinoviais. Os seguintes tendões formam o retináculo extensor: túnel 1 - músculo abdutor longo do polegar e extensor curto do polegar; túnel 2 - músculo extensor radial longo e curto do carpo; túnel 3 - músculo extensor curto do polegar; túnel 4 - os quatro tendões do mús- culo extensor dos dedos e o músculo exten- sor do indicador; túnel 5 - músculo extensor do dedo mínimo; e túnel 6 - músculo exten- sor ulnar do carpo. Os retináculos aumentam a efetividade e a eficiência dos extensores do punho e dos dedos. Na região anterior do punho, tem-se o retináculo flexor. O ligamento transverso do carpo recobre os ossos escafoide e trape- zoide lateralmente e o pisiforme e o hámulo do hamato medialmente, formando o túnel. O assoalho deste é formado pelo ligamento radiocarpal palmar e pelo complexo do liga- mento palmar. Doze tendões flexores do pu- nho, os quais se originam na parte medial do antebraço e inserem-se no aspecto palmar da mão, e o nervo mediano atravessam o tú- nel do carpo. Os tendões que passam por ele são: os quatro tendões dos músculos flexo- res superficiais dos dedos, os quatro tendões dos músculos flexores profundos dos dedos, o músculo flexor longo do polegar, o músculo flexor radial do carpo e o nervo mediano. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 28 Nota clínica Os sintomas relacionados à síndrome do túnel do carpo referem-se à compressão do nervo mediano, a qual pode gerar desde formigamento dos dedos polegar, indicador e médio até atrofia dos músculos tenares. O canal do carpo é uma área relativamente estreita, e qualquer alteração das estruturas locais diminui a passagem dos tendões e do nervo. Essa compressão pode ser iniciada por uma tenossinovite (inflamação de uma bainha tendínea) dos tendões flexores em função de microtraumas, por fratura ou por luxação de qualquer um dos carpais. Cada um dos dedos possui uma articulação carpometacarpal correspondente, a qual aumenta de mobilidade do segundo para o quinto dedo. O primeiro metacarpo e o trapézio formam a articulação carpometacarpiana do polegar. Essa articulação selar é a mais importante do polegar, pois permite que ele realize a flexo- extensão, a adução e a abdução e a oponência. As demais articulações carpometacarpais são planas, e a mobilidade em cada uma delas difere. Durante a flexo-extensão e a abdução e adução, o movimento na segunda e na terceira articulação metacarpalé mínimo, a quarta é ligeiramente móvel, e a quinta, muito móvel. Nelas, os ossos estão unidos pelos ligamentos carpometacárpicos dorsais, carpometacárpicos palmares e carpometacárpicos interósseos. A articulação metacarpofalangiana do polegar é uma articulação do tipo gínglimo. Nesse caso, a superfície convexa da cabeça metacarpal articula-se com a superfície côncava da base da falange. No polegar, a articulação metacarpofalangiana realiza somente os movimentos de flexo-extensão. As articulações metacarpofalangianas do segundo ao quinto dedos são bicondilares, formadas pelas cabeças dos metacarpos que se articulam com as bases das falanges proximais de cada dedo. Os metacarpos têm uma base proximal, um corpo e uma cabeça distal. Do segundo ao quinto dedo, eles articulam-se com as falanges e formam as articulações metacarpofalangianas do tipo plana, biaxiais, com cabeças convexas em ambas as extremidades, ou seja, nas falanges e nos metacarpos. Nessas articulações, ocorrem os movimentos de flexo-extensão e a abdução e adução. Nos dedos, as falanges formam três fileiras, a proximal, a média e a distal, exceto o polegar, que não possui a falange média. A articulação interfalangeana do polegar e as interfalangianas proximal e distal do segundo ao quinto dedos são do tipo gínglimo. Elas possuem somente o Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 29 movimento de flexo-extensão e são bastante estáveis. Os movimentos do complexo do punho e mão Os movimentos do complexo do punho se- rão descritos a partir da posição anatômica. Assim, considera-se que o antebraço se en- contra supinado. No movimento de prono-supinação, a ex- tremidade distal do rádio movimenta-se a partir da ulna fixada. Durante a pronação, a incisura ulnar do rádio, côncava, desliza em torno da cabeça ulnar, convexa, limitada ao final do arco pelo impacto entre os dois os- sos. Já na supinação, movimento oposto, a membrana interóssea e a impactação entre a incisura ulnar do rádio e o processo esti- loide ulnar freiam o movimento. As articu- lações radiulnar proximal e distal estão inti- mamente interligadas durante o movimento de prono-supinação; qualquer alteração de posicionamento ou distância entre o rádio e a ulna interfere na função e na estabilidade local. Uma fratura da cabeça do rádio, por exemplo, altera essa disposição e prejudica a função local. Os movimentos do punho ocorrem em tor- no de dois eixos. A flexão (85°) e a exten- são (90°), no eixo látero-lateral e no plano sagital; a adução (45°) ou desvio ulnar e a abdução (15°) ou desvio radial, no eixo an- teroposterior e no plano frontal. A extensão do punho ocorre preferen- cialmente na articulação mediocarpal, cerca de 60%, acompanhada dos movimentos de desvio radial e de pronação, que apresentam pequena amplitude. Já na flexão, 60% do movimento ocorre na articulação radiocarpal e 40% na mediocarpal, nesse caso, acompa- nhada do desvio ulnar e da supinação. No plano sagital, durante a extensão, a fileira proximal convexa desliza para cima e anteriormente (ou na direção palmar). O deslizamento anterior segue a regra do côn- cavo-convexo, ou seja, a superfície convexa Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 30 formada pelos ossos escafoide, semilunar e piramidal dirige-se no sentido oposto ao do movimento fisiológico. Na articulação mediocarpiana, o trapézio e o trapezoide côncavos deslizam posterior ou dorsalmente em relação ao escafoide, que é convexo. Já o hamato e o capitato, convexos, deslizam anteriormente. O oposto ocorre na flexão: a fileira proximal dos ossos do carpo desliza para baixo e pos- teriormente, o trapézio e o trapezoide deslizam anteriormente, e o hamato e o piramidal, posteriormente. A figura 10 ilustra o movimento artrocinemático da fileira proximal dos os- sos do carpo durante a flexo-extensão. Figura 10 - Ilustração do deslizamento anterior da fileira proximal dos ossos do carpo durante a extensão e posterior durante a flexão. Fonte: Adaptado de Kapangi, 1991. Durante o desvio radial, a fileira proximal desliza para cima e para dentro, e a distal vai para baixo e para fora. Esse deslizamento inverte-se no desvio ulnar. Neste, a 30°, a força de compressão é aplicada perpendicularmente ao plano de desliza- mento, gerando a posição de maior estabilidade do punho, a qual corresponde à posição de função da mão. Os motores principais para a flexão do punho são os músculos flexor radial do carpo, flexor ulnar do carpo e flexor superficial dos dedos. Os músculos flexor profundo dos de- dos, palmar longo e flexor longo do polegar atuam de forma secundária. Em relação aos extensores, existem três músculos principais: extensor radial longo do carpo, extensor radial curto do carpo e extensor ulnar do carpo. A disposição dos músculos extensores dos dedos, extensor do dedo mínimo, extensor longo do polegar e extensor do indicador fazem com que eles sejam considerados extensores auxiliares do punho. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 31 Os desvios radial e ulnar resultam da con- tração sinérgica de músculos que são res- ponsáveis pela flexão e pela extensão do pu- nho. O desvio radial resulta da contração dos músculos flexor radial do carpo e extensor radial longo e curto do carpo. Em função da linha de tração dos músculos extensores pro- fundos do punho (abdutor longo do polegar, extensor curto do polegar, extensor longo do polegar, extensor do indicador e supinador), estes podem auxiliar no desvio radial. Já o desvio ulnar é realizado pelo flexor ulnar do carpo e pelo extensor ulnar. A mão possui músculos denominados in- trínsecos e extrínsecos. Os intrínsecos têm origem nos segmentos carpianos e na mão; já os extrínsecos, no antebraço e no úme- ro. Os músculos intrínsecos dividem-se em três grupos: relacionados ao polegar, que se encontram no lado radial e são responsáveis pela eminência tenar; relacionados ao dedo mínimo, que são encontrados no lado ulnar e responsáveis pela eminência hipotenar; e intrínsecos, dispostos no meio da mão, entre os metacarpais. Oito músculos atuam sobre o polegar, qua- tro intrínsecos e quatro extrínsecos. Os mús- culos intrínsecos da eminência tenar são: fle- xor curto do polegar, oponente do polegar, abdutor curto do polegar e adutor do pole- gar. Os extrínsecos são: extensor longo do polegar, extensor curto do polegar, abdutor longo do polegar e flexor longo do polegar. A flexão do polegar ocorre quando a pri- meira articulação metacarpofalangiana é movida transversalmente à palma, e a ex- tensão corresponde ao retomo. A abdução do polegar ocorre no plano perpendicular à mão a partir da posição anatômica. Nela, o primeiro metacarpal afasta-se do segundo, e a adução é o retorno. A oposição envolve a combinação de abdução, circundução e rota- ção. Nesse caso, a ponta do polegar vai de encontro à ponta dos demais dedos, ou em oposição a eles. Os movimentos do polegar ocorrem gra- ças a complexas interações neuromusculares e mecânicas entre os músculos intrínsecos e extrínsecos. Os principais extensores são os músculos extensor radial longo e curto do carpo e os secundários, o oponente do pole- gar e o abdutor curto do polegar. Os múscu- los flexores longo e curto são responsáveis pela flexão. Na adução, além do adutor do polegar, participam extensor longo do po- legar, flexor longo do polegar, flexor curto do polegar e adutor do polegar. A abdução ocorre pela ação dos músculos abdutor cur- to e longo do polegar. Na oposição, quando o polegar é suavemente colocado nessa po- sição, os músculos tenares são mais ativos que os hipotenares. O principal músculo do Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 32 movimento é o oponente do polegar, e o fle- xor curto do polegar tem ação secundária. O principal músculo hipotenar é o oponente do dedo mínimo. Os músculos intrínsecos da região hipote- nar são: o abdutor do dedo mínimo, o flexor curto do dedo mínimo e o oponente dodedo mínimo. A função de cada um está direta- mente relacionada à sua denominação. Os músculos extrínsecos hipotenares são pal- mar curto, abdutor do dedo mínimo, flexor curto do dedo mínimo e oponente do dedo mínimo. Os músculos intrínsecos da mão dividem- -se em três grupos: quatro lumbricais, quatro interósseos dorsais e três interósseos palma- res. Os lumbricais localizam-se na palma da mão, e os interósseos, entre os metacarpais. Em conjunto, eles fletem as articulações me- tacarpofalangianas e estendem as interfalan- gianas médias e distais. Nas metacarpofalan- gianas, os lumbricais e os interósseos formam o sistema principal de movimento. Quando a mão segura um objeto, ela desen- volve o movimento de preensão, dividido em preensão de força ou preensão de precisão. Na primeira, todos os músculos extrínsecos e intrínsecos participam, exceto os lumbricais (excluindo o quarto). Já segunda, os músculos intrínsecos fornecem as características neces- sárias para o controle dos movimentos finos. Os músculos interósseos palmares e dorsais, por exemplo, controlam de forma delicada as forças de compressão. Os fatores determinantes para a realiza- ção da preensão palmar incluem: mobilidade normal da primeira articulação carpometa- carpiana e, em menor extensão, da quarta e da quinta; rigidez relativa da segunda e da terceira articulações carpometacarpianas; es- tabilidade normal dos arcos longitudinais dos dedos e do polegar; sinergismo e antagonis- mo balanceados entre musculatura intrínseca e extrínseca da mão; porção sensorial, com- primento, mobilidade e posição normais de cada raio. Pode-se dividir a preensão nas seguintes fases: 1) abertura da mão, realizada pela ação simultânea dos músculos intrínsecos da mão e dos músculos extensores longos; 2) fecha- mento dos dedos e do polegar para agarrar o objeto, sob a responsabilidade dos músculos flexores e de oposição extrínsecos e intrínse- cos; 3) modulação da força de acordo com as características e o peso do objeto, sob ação Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 33 dos músculos flexores e de oposição extrínsecos e intrínsecos; e, finalmente, 4) abertura da mão, semelhante ao início do movimento. A preensão de força, aquela utilizada para segurar um objeto firmemente pela mão, e a de precisão, que envolve movimentos de pinça, realizadas pela mão sofrem repercussão direta da posição do punho. A força e a potência durante a preensão são maiores quando o punho se encontra em extensão e desvio ulnar. Utiliza-se a flexão isométrica, há a aproximação das eminências tenar e hipotenar e a função intacta das estruturas da extremidade ulnar da mão. Essa preensão associa preferencialmente os músculos extrínsecos e o adutor do polegar. Já na preensão de precisão, o polegar deve se posicionar perpendicular à mão, e os músculos intrínsecos são os motores principais. Nesse caso, eles funcionam predominante- mente contraídos de forma isotônica, e, uma vez que tais posições requerem um alto nível de informação sensorial, são usadas áreas com maior quantidade de receptores sensoriais. As articulações metacarpofalangianas e a porção radial da mão são preferencialmente utili- zadas. A tabela a seguir descreve a origem e a inserção de cada músculo do membro superior, de acordo com Kendall e McCreary (1987). Músculo Origem Inserção Ação Deltoide Terço lateral da clavícula, acrômio e espinha da escápula. Tuberosidade deltoidea do úmero. Abduz o ombro; as fibras anteriores flexionam e rodam medialmente; as fibras posteriores estendem e rodam lateralmente. Supraespinal Fossa supraespinhal da escápula. Tubérculo maior do úmero. Abduz o ombro; discreta rotação lateral. Infraespinal Fossa infraespinhal da escápula. Tubérculo maior do úmero (posteriormente ao supraespinal). Roda lateralmente o ombro; discreta adução. Subescapular Fossa subescapular da escápula. Tubérculo menor do úmero. Roda medialmente o ombro. Redondo maior Face dorsal do ângulo inferior da escápula. Tubérculo menor do úmero. Aduz, estende e roda medialmente o ombro. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 34 Redondo menor Margem lateral da escápula. Tubérculo maior do úmero (posteriormente ao infraespinhal). Roda lateralmente o ombro, aduz e estende. Coracobraquial Processo coracoide da escápula. Porção média do úmero, face medial. Flexiona e aduz o ombro. Bíceps braquial Cabeça longa: tubérculo supraglenoidal da escápula. Cabeça curta: processo coracoide da escápula. Tuberosidade do rádio. Flexiona o cotovelo e o ombro; supina o antebraço. Braquial Face anterior da metade distal do úmero. Processo coronoide da ulna. Flexiona o cotovelo. Tríceps braquial Cabeça longa: tubérculo infraglenoidal da escápula. Cabeça lateral: face posterior do úmero acima do sulco do nervo radial. Cabeça medial: face posterior do úmero abaixo do sulco do nervo radial. Olécrano da ulna. Estende o cotovelo; a cabeça longa também estende o ombro. Ancôneo Epicôndilo lateral do úmero. Face lateral do olecrano. Estende o cotovelo. Pronador redondo Epicôndilo medial do úmero e processo coronoide da ulna. Parte média da face lateral da diáfise do rádio. Pronação e flexão discreta do cotovelo. Flexor radial do carpo Epicôndilo medial do úmero. Face ventral de segundo e terceiro metacarpais. Flexiona e abduz o punho; auxilia na flexão do cotovelo; realiza a pronação do antebraço. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 35 Palmar longo Epicôndilo medial do úmero. Aponeurose palmar. Tensiona a fáscia palmar, realizando uma concavidade com a palma da mão, e flexiona o punho. Flexor ulnar do carpo Epicôndilo medial do úmero, olécrano e dois terços proximais da face posterior da ulna. Pisiforme, hamato e quinto metacarpal. Flexiona e aduz o punho e pode auxiliar na flexão do cotovelo. Flexor superficial dos dedos Epicôndilo medial do úmero, processo coronoide da ulna e face anterior do rádio. Face ventral das falanges médias do segundo ao quinto dedos. Flexiona as articulações interfalangianas proximais do segundo ao quinto dedos, auxilia na flexão das articulações metacarpofalangianas. Flexor profundo dos dedos Epicôndilo medial e processo coronoide, membrana interóssea e face ventral da ulna. Face ventral da base das falanges distais do segundo ao quinto dedos. Flexiona as articulações interfalangianas distais do segundo ao quinto dedos, auxilia na flexão das articulações interfalangianas proximais. Flexor longo do polegar Face ventral do rádio e membrana interóssea. Face ventral da base da falange distal do polegar. Flexiona a articulação interfalangiana do polegar; auxilia na flexão das articulações metacarpofalangianas e carpometacarpiana; pode auxiliar na flexão do punho. Pronador quadrado Face ventral distal da ulna. Face ventral distal do rádio. Pronação do antebraço. Braquiorradial Crista supracondilar lateral do úmero. Processo estiloide do rádio. Flexiona o cotovelo. Extensor radial longo do carpo Crista supracondilar lateral do úmero. Face dorsal da base do segundo metacarpal. Estende e abduz o punho e auxilia na flexão do cotovelo. Extensor radial curto do carpo Epicôndilo lateral do úmero. Face dorsal da base do terceiro metacarpal. Estende e auxilia na abdução do punho. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 36 Extensor dos dedos Epicôndilo lateral do úmero. Face dorsal das falanges do segundo ao quinto dedos. Estende as articulações metacarpofalangianas e, em conjunto com os lumbricais e interósseos, as articulações interfalangianas do segundo até o quinto dedos. Auxilia na abdução do segundo, terceiro e quarto dedos e auxilia na extensão e abdução do punho. Extensor do dedo mínimoTendão do extensor dos dedos. Tendão do extensor dos dedos no dorso do dedo mínimo. Estende as articulações metacarpofalangianas e interfalangianas do dedo mínimo. Extensor ulnar do carpo Epicôndilo lateral do úmero. Base do quinto metacarpal. Estende e aduz o punho. Supinador Epicôndilo lateral do úmero Extremidade proximal da face lateral da diáfise do rádio Supina o antebraço Abdutor longo do polegar Face posterior do meio do rádio e ulna e membrana interóssea. Base do primeiro metacarpal. Abduz e estende a articulação carpometacarpiana do polegar, abduz e auxilia na flexão do punho. Abdutor curto do polegar Face posterior do meio do rádio e membrana interóssea. Base da primeira falange do polegar. Abduz as articulações carpometacarpiana e metacarpofalangiana do polegar. Estende a articulação interfalangiana do polegar. Extensor longo do polegar Face posterior do meio da ulna e membrana interóssea. Base da última falange do polegar. Estende a articulação interfalangiana do polegar e auxilia na extensão das carpometacarpiana e metacarpofalangiana do polegar. Auxilia na abdução e na extensão do punho. Oponente do polegar Retináculo dos flexores e trapézio. Borda lateral do metacarpal do polegar. Opõe (flexão, abdução e leve rotação medial) a articulação carpometacarpiana do polegar. Anatomia e Cinesiologia de Membros Superiores 37 Flexor curto do polegar Retináculo dos flexores, trapézio e primeiro metacarpal. Base da falange proximal do polegar Flexiona as articulações carpometacarpiana e metacarpofalangiana do polegar; auxilia na oposição. Extensor do indicador Face posterior da extremidade distal da ulna e membrana interóssea. Tensão do extensor dos dedos para o dedo indicador. Estende o dedo indicador. Abdutor do dedo mínimo Pisiforme e tendão do flexor ulnar do carpo. Base da falange proximal do dedo mínimo. Abduz, auxilia na oposição e pode auxiliar na flexão da articulação metacarpofalangiana do dedo mínimo. Flexor curto do dedo mínimo Retináculo dos flexores e uncinado. Base da falange proximal do dedo mínimo. Flexiona as articulações carpometacarpiana e metacarpofalangiana do dedo mínimo. Oponente do dedo mínimo Flexor dos retináculos e uncinado. Metacarpal do dedo mínimo. Opõe (flexão com leve rotação) a articulação carpometacarpiana do dedo mínimo. Referências AMADIO, A. C.; DUARTE, M. Fundamentos biomecânicos para análise do movi- mento humano. 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