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<p>1</p><p>MOBILIDADE URBANA</p><p>1</p><p>NOSSA HISTÓRIA</p><p>A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários,</p><p>em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-</p><p>Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços</p><p>educacionais em nível superior.</p><p>A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de</p><p>conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no</p><p>desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além</p><p>de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que</p><p>constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de</p><p>publicação ou outras normas de comunicação.</p><p>A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma</p><p>confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base</p><p>profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo</p><p>no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no</p><p>atendimento e valor do serviço oferecido.</p><p>2</p><p>Sumário</p><p>NOSSA HISTÓRIA ..................................................................................................... 1</p><p>INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 3</p><p>DESAFIOS IMPORTANTES A SEREM ENFRENTADOS NO SISTEMA .................. 4</p><p>DE MOBILIDADE URBANA DO BRASIL .................................................................. 4</p><p>MOBILIDADE E DESENVOLVIMENTO URBANO .................................................... 5</p><p>INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA ............................................................... 6</p><p>ENVELHECIMENTO DA POPULAÇÃO ..................................................................... 9</p><p>CRESCIMENTO DO TRANSPORTE INDIVIDUAL E QUEDA DO ........................... 10</p><p>TRANSPORTE PÚBLICO ........................................................................................ 10</p><p>PERSPECTIVAS DE POLÍTICAS ............................................................................ 14</p><p>BREVE HISTÓRICO ................................................................................................. 15</p><p>A SOLUÇÃO DO PASSADO, O PROBLEMA DE HOJE ......................................... 16</p><p>VOLTANDO À ESTACA ZERO ................................................................................ 17</p><p>É PRECISO REVERTER A LÓGICA DAS CIDADES .............................................. 22</p><p>UMA CIDADE PARA TODOS .................................................................................. 24</p><p>A CIDADE QUE NÃO PARA – SÃO PAULO ........................................................... 27</p><p>AONDE E COMO VAI SÃO PAULO ........................................................................ 32</p><p>VIDA E QUALIDADE DE VIDA ................................................................................ 34</p><p>PLANOS E PROJETOS ........................................................................................... 36</p><p>ESPERANDO O TREM ............................................................................................ 39</p><p>A BICICLETA COMO TRANSPORTE ...................................................................... 41</p><p>REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 43</p><p>3</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>O padrão de mobilidade da população brasileira vem passando por fortes</p><p>modificações desde meados do século passado, reflexo principalmente do intenso e</p><p>acelerado processo de urbanização e crescimento desordenado das cidades, além do</p><p>uso cada vez mais intenso do transporte motorizado individual pela população (Ipea,</p><p>2010a). O aumento do transporte individual motorizado e consequente redução das</p><p>viagens do transporte público vêm contribuindo para a deterioração das condições de</p><p>mobilidade da população dos grandes centros urbanos, principalmente em função do</p><p>crescimento dos acidentes de trânsito com vítimas, dos congestionamentos urbanos</p><p>e também dos poluentes veiculares (Carvalho e</p><p>Pereira, 2011).</p><p>A percepção geral é que essas condições permanecerão por muito tempo, pois</p><p>as políticas de incentivo à produção, venda e utilização de veículos privados</p><p>4</p><p>prevalecem sobre as medidas de estímulo ao uso do transporte público e do transporte</p><p>não motorizado. Por sua vez, os governantes vêm sendo bastante cobrados pela</p><p>população no sentido de adotar políticas públicas efetivas que promovam a melhoria</p><p>das condições de mobilidade das pessoas e a redução dos custos dos deslocamentos</p><p>urbanos, principalmente os deslocamentos que utilizam transporte público coletivo.</p><p>Este texto buscou discutir uma série de desafios que os gestores públicos e privados</p><p>têm de enfrentar na busca de um sistema de mobilidade urbana mais adequado para</p><p>a população. Dessa forma, alguns dos principais desafios da mobilidade no Brasil que</p><p>foram destacados pelo autor são caracterizados na seção seguinte, assim como a</p><p>discussão acerca das políticas públicas necessárias para a solução dos problemas</p><p>apresentados. O texto apresenta ainda uma seção com as considerações finais, além</p><p>das referências bibliográficas utilizadas. Vale ressaltar que este artigo é um ensaio</p><p>construído a partir da experiência do autor e da sua produção recente. Foi</p><p>desenvolvido com o objetivo de articular trabalhos variados e contribuir com a</p><p>discussão das políticas públicas de mobilidade</p><p>DESAFIOS IMPORTANTES A SEREM ENFRENTADOS NO SISTEMA</p><p>DE MOBILIDADE URBANA DO BRASIL</p><p>É obrigação dos dirigentes públicos buscar um sistema de mobilidade mais</p><p>igualitário do ponto de vista social, com sustentação financeira e ao mesmo tempo</p><p>sem excluir os mais pobres, além de gerar o mínimo de externalidades negativas</p><p>possíveis. Para seguir esse caminho, vários desafios têm de ser superados pelos</p><p>gestores da mobilidade, como: a falta de compatibilização das políticas de</p><p>desenvolvimento urbano e metropolitano com o planejamento dos sistemas de</p><p>mobilidade; a falta de políticas perenes de financiamento e investimento na</p><p>infraestrutura de transporte público urbano; a ausência de medidas de racionalização</p><p>do uso do transporte motorizado individual e compensação pelas suas externalidades</p><p>negativas; o envelhecimento da população e o seu rebatimento sobre as condições</p><p>de mobilidade das pessoas e os custos do transporte público (TP); a alteração do</p><p>modelo de financiamento regressivo da operação TP vigente no Brasil; entre outros.</p><p>5</p><p>Os itens seguintes procuraram colocar alguns desses pontos em debate, com vistas</p><p>ao embasamento mínimo para a formulação de políticas públicas de mobilidade.</p><p>MOBILIDADE E DESENVOLVIMENTO URBANO</p><p>Há pouco mais de quarenta anos, a população brasileira vivia, em sua maior</p><p>parte, nas áreas rurais, sem que houvesse muitas demandas por transporte de massa</p><p>nos poucos aglomerados urbanos existentes.</p><p>Hoje, cerca de 85% da população vive em centros urbanos, sendo que existem</p><p>36 cidades com mais de 500 mil habitantes na rede urbana brasileira, além de</p><p>quarenta regiões metropolitanas estabelecidas, nas quais vivem mais de 80 milhões</p><p>de brasileiros (cerca de 45% da população). Parte dos problemas urbanos vividos pela</p><p>população brasileira hoje em dia é resultado desse forte e rápido crescimento das</p><p>cidades, ocorrido após o início do processo de industrialização brasileira, sem que</p><p>houvesse investimentos correspondentes na rede de infraestrutura urbana, formando</p><p>grandes passivos nessa área. Os sistemas de transporte urbano são um exemplo</p><p>claro desse descompasso entre o crescimento populacional e territorial urbano</p><p>acelerado e a falta de investimento em infraestrutura de transporte de massa e não</p><p>motorizado.</p><p>gama de especialistas em</p><p>transportes, isso demonstra a inviabilidade de soluções que privilegiem o transporte</p><p>individual motorizado.</p><p>AONDE E COMO VAI SÃO PAULO</p><p>Apesar de a cultura do automóvel ainda prevalecer na cidade, há indícios de</p><p>que ela está perdendo força. Atualmente, 60% da população têm automóvel em casa</p><p>– em 2009, o índice era de 50% – segundo a pesquisa Mobilidade Urbana 2015,</p><p>realizada pela Rede Nossa São Paulo e Ibope. Um terço dos paulistanos (32%) utiliza</p><p>o carro todos os dias ou quase todos os dias para se locomover. O número é 10 pontos</p><p>acima do registrado em 2007, mas ainda assim representa uma queda em relação a</p><p>2014, quando chegou a 38%. Isso se dá porque as pessoas estão deixando mais o</p><p>carro em casa: entre quem possui automóvel, o uso todos os dias caiu de 56% em</p><p>2014 para 45% em 2015.</p><p>As principais demandas para trocar o carro pelo transporte público são a</p><p>existência de mais linhas, que cubram percursos que não cobrem atualmente (36%);</p><p>a existência de mais e melhores corredores de ônibus, faixas exclusivas e linhas de</p><p>metr (27 ) a melhoria nas condições físicas do transporte público coletivo/mais</p><p>33</p><p>conforto (22%); e a diminuição do tempo de espera no transporte público coletivo</p><p>(18%). No mesmo sentido, a construção e ampliação de linhas de metrô e trem é a</p><p>medida mais importante para a melhoria da mobilidade, sendo mencionada por</p><p>metade dos entrevistados. Melhorar a qualidade do transporte por metrô (45%) e por</p><p>ônibus (41%) vem a seguir, à frente da melhoria das ruas e avenidas (33%) e outras</p><p>medidas. 83% dos que usam o carro todos os dias ou quase afirmam que com certeza</p><p>ou provavelmente deixariam de usá-lo se houvesse uma boa alternativa de transporte”</p><p>Por outro lado, embora a avaliação do transporte público seja ruim de maneira</p><p>geral, é pior entre os que utilizam o carro diariamente. A nota média, em uma escala</p><p>de 1 a 10, é de 4,1 para os usuários de automóveis contra 5,1 dos que não o utilizam</p><p>– para quem usa transporte público todos os dias ou quase todos os dias, a média fica</p><p>em 4,4. Ou seja, além dos problemas do sistema de transporte coletivo, é preciso</p><p>ações políticas que atuem no sentido de superar o preconceito com esses modos. A</p><p>pesquisa da Rede Nossa São Paulo mostra também que a diferença do tempo gasto</p><p>por quem usa carro e por quem usa transporte coletivo não é tão grande.</p><p>Considerando ida e volta no deslocamento principal do dia, os paulistanos levam em</p><p>média 1h 44 minutos. Essa média se manteve estável nos últimos anos e representa</p><p>uma queda em relação a 2009, quando chegou a 1h 57 minutos. Dentre os usuários</p><p>diários de automóveis, o tempo médio fica em 1h44 minutos. Já para quem usa o</p><p>transporte público, esse tempo é de 1h 58 minutos, uma diferença de 15 minutos.</p><p>Porém, isso reflete mais os longos deslocamentos da população como um todo do que</p><p>uma possível eficiência do transporte público. Outro sinal de mudança no</p><p>comportamento tinha surgido na Pesquisa de Mobilidade do Metrô, de 2012, uma</p><p>atualização da Pesquisa Origem-Destino de 2007. Observou-se que na população de</p><p>renda mais alta, houve um aumento de viagens não motorizadas (a pé ou de bicicleta)</p><p>e em transporte coletivo. Na faixa com renda familiar acima de R$ 9.330, o transporte</p><p>individual ainda é predominante, mas sua participação caiu de 82% para 76% entre</p><p>2007 e 2012, enquanto o coletivo cresceu de 18% para 24%. O número de viagens</p><p>realizadas por Metrô subiu 31% e, por trem, 53%.</p><p>A implementação da Linha 4-Amarela do Metrô, em integração com a Linha</p><p>9Esmeralda da CPTM, ajuda a explicar a mudança, já que foi mais sentida nas regiões</p><p>atendidas por essas linhas. Além da integração entre as linhas, a pesquisa também</p><p>indica um aumento de viagens integradas entre automóvel e transporte sobre trilhos.</p><p>34</p><p>Já nas faixas de menor renda, ocorreu aumento nas viagens motorizadas e por</p><p>transporte individual.</p><p>Além da maior presença do automóvel, isso reflete duas tendências: uma menor</p><p>participação do modo a pé como modo principal da viagem (ou seja, quando o trajeto</p><p>é feito totalmente a pé da origem ao destino quando o motivo é trabalho ou escola ou</p><p>quando a distância é superior a 500 metros para os demais motivos); e o aumento das</p><p>viagens feitas em motocicletas. Os dois fenômenos – assim como o aumento total do</p><p>número de viagens – se relacionam com a melhora econômica, tanto na compra dos</p><p>veículos como na possibilidade de usar modos alternativos à caminhada, uma opção</p><p>feita muitas vezes devido aos custos do transporte.</p><p>VIDA E QUALIDADE DE VIDA</p><p>A situação da mobilidade em São Paulo consome tempo livre, que poderia ser</p><p>voltado ao descanso ou lazer de boa parte da população, além disso, possui um índice</p><p>de letalidade ainda muito preocupante e causa impactos negativos à saúde e</p><p>qualidade de vida dos paulistanos. A pesquisa Imagem, da Associação Nacional de</p><p>Transportes Públicos, realizada em 2012 na região metropolitana traz algumas luzes</p><p>para entender como a população vive esse cotidiano. A pesquisa quebrou a viagem</p><p>em três etapas: de casa até o embarque no primeiro meio de transporte; a troca para</p><p>o segundo meio de transporte; e o desembarque do último transporte para o destino</p><p>final. Os principais problemas apontados pelos entrevistados, de modo geral, foram a</p><p>lotação e o tempo de espera, mas com índices superiores no começo do trajeto, ou</p><p>seja, nos bairros de moradia. Essa etapa também tem maiores níveis de problemas</p><p>não relacionados diretamente com o sistema de transporte, mas sim com</p><p>infraestrutura urbana, como insegurança, falta de urbanização e iluminação. Se para</p><p>levar e trazer a população para o trabalho e de volta para casa o transporte público já</p><p>tem limitações, para outras atividades a situação se agrava. Um em cada quatro</p><p>paulistanos diz deixar de fazer alguma atividade aos fins de semana – como</p><p>programas com crianças e entretenimento – em razão do transporte. Outro entrave ao</p><p>exercício do direito de circulação na cidade está na falta de acessibilidade para</p><p>pessoas com deficiência. Nos últimos anos, se intensificou o ritmo de adaptação do</p><p>35</p><p>transporte público. De acordo com dados da Prefeitura, em 2009, apenas 26% da frota</p><p>de ônibus paulistana era adaptada para pessoas com deficiência. Em quatro anos, o</p><p>índice mais que dobrou e atingiu 60%. As maiores dificuldades, mais uma vez, estão</p><p>nas periferias: as linhas locais muitas vezes utilizam veículos menores e de adaptação</p><p>mais difícil. Além disso, falta pensar na integralidade do percurso: não basta ter</p><p>apenas um ônibus acessível, quando não há calçadas ou pontos de parada</p><p>adequados. Embora São Paulo tenha, proporcionalmente, um dos menores índices de</p><p>mortes no trânsito entre as capitais brasileiras, uma olhada nos números absolutos dá</p><p>uma ideia do impacto: foram 1471 mortes em 2011, segundo o Mapa da Violência de</p><p>2013, dedicado a acidentes de trânsito e motocicletas. As principais vítimas são</p><p>jovens. Os dados da CET mostram uma queda nos óbitos no último período: 686 entre</p><p>janeiro e agosto de 2015, ante 861 nos primeiros oito meses de 2014. Os acidentes</p><p>fatais atingem, em primeiro lugar, os pedestres, seguidos dos motociclistas. Na</p><p>ponderação, São Paulo tem nove mortes por 100 mil habitantes ao ano. A meta da</p><p>capital para a Década de Segurança Viária da ONU é reduzir para 6 mortes a 100 mil</p><p>habitantes até 2020.</p><p>Os impactos à saúde vão além dos acidentes. Num congestionamento, existe</p><p>ainda o stress social gerado pela insegurança e agressividade de alguns motoristas.</p><p>Além disso, a temperatura nos corredores de trânsito é mais alta e a umidade relativa</p><p>do ar é mais baixa. O tráfego é, portanto, uma das condições mais predisponentes</p><p>para desenvolvimento de doenças e stress.</p><p>Um estudo do American Heart Association diz que o tráfego é tão causador de</p><p>infarto quanto o cigarro e/ou a má alimentação.</p><p>O problema é que as outras duas</p><p>causas são de foro individual, enquanto o tráfego é uma questão coletiva, fora do</p><p>controle individual”, explica o médico Paulo Saldiva, professor da Universidade de São</p><p>Paulo, em entrevista à Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias. A</p><p>pesquisa Mobilidade Urbana da Rede Nossa São Paulo mostra ainda que 62% da</p><p>população relatam problemas de saúde no domicílio relacionados à poluição do ar da</p><p>cidade. O controle da poluição do ar é um dos aspectos com menor índice de</p><p>satisfação – com nota média de 3,1, numa escala de 1 a 10, à frente apenas da</p><p>situação do trânsito. Segundo a Organização Mundial da Saúde, doenças respiratórias</p><p>ou cardiovasculares relacionadas à poluição mataram 99 mil pessoas no estado de</p><p>São Paulo entre 2006 e 2011.</p><p>36</p><p>Uma análise da Universidade de São Paulo dos poluentes na capital mostrou</p><p>que 63% vêm dos escapamentos de carros, caminhões e ônibus.</p><p>PLANOS E PROJETOS</p><p>O Sistema Interligado de Transporte Público é um marco nas políticas de</p><p>transporte na cidade. Desenvolvido na gestão de Marta Suplicy (2001 a 2004), o</p><p>projeto previa a integração das redes de transporte existente, com o objetivo de</p><p>reformular radicalmente o sistema de ônibus, aproveitando a infraestrutura existente</p><p>e implementando soluções de custo mais baixo. Ou seja, visando à ampliação do</p><p>acesso e à melhoria da qualidade do transporte, mas também à otimização e</p><p>racionalização do sistema. Com o sistema, os corredores de ônibus foram ampliados</p><p>dos 40 quilômetros existentes até 2002 para 110 quilômetros em 2004. A reserva e</p><p>tratamento do espaço para os coletivos, além de aumentar a velocidade de circulação</p><p>e diminuir o tempo de viagem, representava uma identificação dos eixos e vias com</p><p>maior demanda. Ou seja, não podem ser pensados isolados, mas em virtude da 99</p><p>mil PESSOAS MORRERAM DE DOENÇAS RESPIRATÓRIAS OU</p><p>CARDIOVASCULARES RELACIONADAS À POLUIÇÃO NO ESTADO DE SÃO</p><p>PAULO ENTRE 2006 E 2011.</p><p>O Plano Diretor Estratégico de 2002 previa ainda outros 270 quilômetros durante sua</p><p>vigência, até 2012. O aumento no número de terminais de ônibus também</p><p>corresponde a esse olhar de integração entre as linhas e de criação de pontos de</p><p>troca entre elas. Os corredores e terminais foram passos para a troncalização do</p><p>sistema, com a divisão da rede de ônibus entre as linhas estruturais, nas vias de alta</p><p>demanda, e locais. Houve um expressivo investimento na renovação da frota de</p><p>ônibus. Além disso, houve a incorporação – como permissionários – de operadores</p><p>clandestinos de transporte, os perueiros. Com veículos menores, passam a atender</p><p>as linhas locais e têm de se submeter à regulamentação da Prefeitura. Para efetivar</p><p>esse modelo era necessária também a integração tarifária. Trata-se da grande</p><p>inovação da mobilidade urbana em São Paulo, a criação do Bilhete Único. Um</p><p>sistema de bilhetagem eletrônica, que permite ao passageiro pegar mais de um</p><p>ônibus pagando a mesma passagem (atualmente, são até quatro viagens no período</p><p>de até três horas, de acordo com a modalidade de bilhete). Seus impactos são</p><p>diversos. É uma forma de redistribuição tarifária, já que beneficia mais os que fazem</p><p>trajetos mais longos e com mais integrações. Em outras palavras: o passageiro que</p><p>utiliza apenas um ônibus em seu trajeto acaba ajudando a pagar os custos dos</p><p>passageiros que utilizam a integração. Para uma grande parcela da população</p><p>37</p><p>representou o barateamento dos gastos com transporte ou a possibilidade de fazer</p><p>trajetos mais rápidos – principalmente após 2005, quando o bilhete passou a permitir</p><p>a integração com o metrô e os trens da CPTM. Outro aspecto do Bilhete Único é</p><p>permitir o acompanhamento dos dados de forma digitalizada, o que pode ser</p><p>incorporado no planejamento do setor. Se o programa caminhava no sentido de</p><p>priorizar o transporte coletivo, tanto nos investimentos públicos como no uso do solo</p><p>urbano, sua fragilidade ficou demonstrada com o abandono que sofreu nos anos</p><p>seguintes, com sua implementação interrompida pela prefeitura. Um estudo das</p><p>urbanistas Raquel Rolnik e Danielle Klintowitz mostra que, a partir de 2005, “os</p><p>investimentos na construção de novos corredores de ônibus previstos no sistema</p><p>foram interrompidos, assim como um conjunto de medidas que ainda eram</p><p>necessárias para implantar mais plenamente a troncalização”1. A descontinuidade,</p><p>acentuada pelas mudanças de gestão, dá uma mostra dos desafios de se</p><p>implementar, de fato, uma política que priorize o transporte coletivo, especialmente</p><p>quando este disputa recursos financeiros ou espaço urbano com o automóvel</p><p>particular. A questão ainda não se consolidou como política social na agenda do</p><p>Estado, mas a ação dos movimentos sociais vem mudando esse quadro.</p><p>Principalmente após as manifestações de 2013, a cidade intensificou projetos</p><p>voltados à mobilidade. Embora muitas dessas políticas constassem do Plano de</p><p>Metas, sua implementação foi acompanhada de resistências por alguns setores da</p><p>população. A primeira delas foram as faixas exclusivas para ônibus. Somente em</p><p>2013, a operação criou mais de 300 quilômetros de faixas – estruturas mais simples</p><p>que os corredores, com espaço segregado para os ônibus normalmente à direita.</p><p>Até o fim de 2015, somaram-se mais 90 quilômetros.</p><p>A Prefeitura aponta como resultado o aumento na velocidade média dos</p><p>coletivos nessas vias – de 12 km/h antes das faixas para 20 km/h atualmente. As</p><p>críticas se vocalizaram na capa da revista Época São Paulo em dezembro de 2013,</p><p>que afirmava que “a ideia deu errado”, pois o “privilégio” dos nibus saturou ainda mais</p><p>o trânsito da cidade. Porém, a medida conquistou aprovação maciça – 88% da</p><p>população segundo o Datafolha (em setembro de 2013). Com isso, o debate mudou</p><p>de foco e passou para as ciclovias. Até 2012, a cidade de São Paulo tinha apenas 63</p><p>quilômetros de vias voltadas exclusivamente para bicicletas. Desde 2014, a Prefeitura</p><p>concluiu 260 quilômetros de ciclovias, dos 400 quilômetros que constam do Plano de</p><p>Metas. A valorização de um modo de transporte não motorizado, com todos os</p><p>benefícios associados – um meio saudável, não poluente e com menos impacto</p><p>urbano – parece um consenso, mas na implementação surgiram opositores. O</p><p>Ministério Público do Estado de São Paulo abriu um inquérito contra o prefeito</p><p>Fernando Haddad e o secretário dos Transportes, Jilmar Tatto, pedindo</p><p>esclarecimentos acerca da ausência de planejamento físico e financeiro e custo</p><p>elevado na implantação e expansão do sistema cicloviário do município. O MP chegou</p><p>a pedir a interdição da instalação de ciclovias, o que foi negado pela Justiça. Por outro</p><p>38</p><p>lado, movimentos de ciclistas apontam a necessidade de mais faixas na periferia e</p><p>interligação entre estas e o centro da cidade. Mesmo com a polêmica, o número de</p><p>ciclistas vem aumentando na cidade. No primeiro ano, o acréscimo foi de 50%,</p><p>representando 86 mil pessoas que passaram a usar a bicicleta, segundo a pesquisa</p><p>da Rede Nossa São Paulo/Ibope de 2014. Segundo outra pesquisa, da ONG</p><p>Ciclocidade em 201512, 40% dos ciclistas das regiões central e intermediárias</p><p>adotaram esse meio havia menos de um ano.</p><p>A primazia do automóvel também se viu ameaçada com a redução da</p><p>velocidade máxima permitida em diversas vias, incluindo as marginais dos rios</p><p>Pinheiros e Tietê, onde o limite passou a ser 50 km/h nas pistas locais. Em regiões</p><p>onde há maior circulação de pedestres, também começa a ser implementada a Área</p><p>40, com velocidade máxima de 40 km/h. PASSE LIVRE Após as manifestações de</p><p>junho de 2013, a Prefeitura alegou a inviabilidade da tarifa zero nos ônibus. Como</p><p>alternativa, primeiramente anunciou as novas modalidades do Bilhete Único (diário,</p><p>semanal e mensal).</p><p>No fim de 2014, junto com o novo aumento da tarifa, veio o passe livre para</p><p>estudantes da rede pública na educação básica, de programas como ProUni e cotas,</p><p>entre outros critérios. Ainda assim, o custo do transporte para o passageiro continua</p><p>sendo um problema do sistema – o preço da passagem é um dos itens com pior</p><p>avaliação na pesquisa da Rede Nossa São Paulo, com média de 3,3, acima apenas</p><p>da lotação dos ônibus. Movimentos sociais, como o Passe Livre, afirmam que o valor</p><p>é alto devido aos lucros dos operadores do transporte. A auditoria da Ernst & Young,</p><p>contratada pelo município em 2013, encontrou que o lucro médio das empresas foi</p><p>18,6% no período do contrato, feito em 2003. Na época, a licitação estimava esse</p><p>ganho em 18%, dentro da realidade de então, segundo a auditoria. Porém, a Ernst &</p><p>Young recomendou a redução desse retorno para cerca de 7%. Com o lançamento da</p><p>nova licitação, em 2015, a Prefeitura acenou com a possibilidade de aumentar a</p><p>concorrência e quebrar o quase oligopólio no setor – apenas um grupo, o Ruas,</p><p>controla 53% da frota e recebe 56% dos repasses. Uma forma de permitir a entrada</p><p>de outros atores foi a desapropriação das garagens, que passariam a ser cedidas às</p><p>empresas vencedoras. Porém, o edital tem como período de vigência 20 anos,</p><p>prorrogáveis por mais 20. Segundo analistas, como o grupo APÉ, estudos em</p><p>mobilidade, intervalos menores e licitações separadas por conjunto de linhas</p><p>39</p><p>estimulariam uma concorrência maior. Junto com a nova licitação, a Prefeitura</p><p>apresentou um novo modelo para o transporte coletivo, que retoma ideias centrais do</p><p>Sistema Interligado. Com algumas mudanças já em execução e outras anunciadas, o</p><p>Plano de Linhas intensifica o modelo de troncalização. Um dos aspectos é a operação</p><p>controlada, já testada na implementação das linhas noturnas (até 2014, a cidade</p><p>praticamente não tinha transporte durante a madrugada). Isso significa a garantia do</p><p>cumprimento dos horários de saída e rápida reposição de veículos avariados. O papel</p><p>dos corredores e faixas exclusivas é central para garantir a fluidez dos ônibus.</p><p>O sistema se subdivide em linhas estruturais, coletoras e perimetrais. As</p><p>primeiras transitam nas vias principais, em corredores ou faixas, com veículos</p><p>maiores. As coletoras ligam os bairros a terminais ou outros pontos de troca. As linhas</p><p>perimetrais não passam pelo centro da cidade, ligando diferentes vias estruturais.</p><p>Essa visão se coaduna ao Plano Diretor Estratégico, aprovado em 2014. Um dos</p><p>pontos mais importantes do PDE é o adensamento populacional nos eixos de</p><p>transporte: com restrições à verticalização no miolo dos bairros e permitindo prédios</p><p>mais altos nas vias expressas de transporte público. O Plano Diretor também eliminou</p><p>a obrigatoriedade de um mínimo de vagas de estacionamento em prédios novos, como</p><p>forma de desestimular o uso de automóveis. Um dos princípios da reorganização é</p><p>reduzir o número de linhas que transitam nos corredores, para agilizar o embarque.</p><p>Isso implica o seccionamento de linhas que, atualmente ou até recentemente, ligavam</p><p>de forma direta os bairros ao centro. A medida tem causado grande insatisfação entre</p><p>os usuários, principalmente entre os moradores de locais mais periféricos, já que</p><p>precisam fazer baldeação, muitas vezes em terminais superlotados.</p><p>ESPERANDO O TREM</p><p>Normalmente em grandes metrópoles, o sistema de ônibus é complementar ao</p><p>metrô, que cumpre o papel estrutural. Mas as promessas de expansão são</p><p>desacreditadas com os sucessivos atrasos de entrega nas obras e denúncias de</p><p>corrupção na construção e compra de trens. O metrô é, idealmente, a principal opção</p><p>para o transporte de massa em grandes cidades. A insuficiência de seu alcance</p><p>territorial e a superlotação colocam ainda mais pressão sobre o sistema de ônibus.</p><p>40</p><p>Hoje, 6 milhões de pessoas se deslocam diariamente de ônibus, em comparação com</p><p>2 milhões de passageiros diários no metrô. Um dos exemplos dos problemas na</p><p>ampliação do metrô é a Linha 4 – Amarela. Em construção desde 2004, a linha teve</p><p>seu projeto alterado diversas vezes. Atualmente, ela funciona entre a Luz (na região</p><p>central) e o Butantã (na zona oeste), com interligações com outras linhas do Metrô e</p><p>da CPTM. As obras contabilizaram diversos acidentes, sendo o mais grave o</p><p>desabamento na região de Pinheiros em janeiro de 2007. A cratera engoliu casas e</p><p>veículos, matando sete pessoas. Apesar de um laudo do Instituto de Pesquisas</p><p>Tecnológicas indicar falhas nas análises do terreno e falta de medidas de segurança,</p><p>não houve nenhuma punição aos responsáveis. A Linha 4 é a primeira feita em</p><p>parceria público-privada. Em julho de 2015, o governo estadual rompeu o contrato com</p><p>o consórcio responsável pela construção de duas das quatro estações que ainda</p><p>faltam, devido aos atrasos. Inicialmente, a previsão era de entrega de todas as</p><p>estações até 2014; agora, se estima que não ficarão prontas antes de 2018. O valor</p><p>despendido pelo governo também não seguiu o previsto, ultrapassando em R$ 40</p><p>milhões o contrato inicial para a construção do Pátio Vila Sônia e das futuras estações</p><p>Higienópolis-Mackenzie e Oscar Freire. O atraso é ainda maior nas três linhas de</p><p>monotrilho, nas regiões sul e leste da Grande São Paulo. Cerca de 40 quilômetros e</p><p>36 estações deveriam ter sido entregues até 2012, mas, no final de 2015, apenas três</p><p>quilômetros e duas estações estavam em operação. A nova estimativa é também</p><p>2018. Uma das linhas, a Ouro, deve passar pelo aeroporto de Congonhas e pelo</p><p>Morumbi – era uma das obras prometidas para a Copa do Mundo. Os custos também</p><p>superaram as estimativas: no caso da linha Prata, o valor mais que dobrou, passando</p><p>de R$ 3,5 bilhões para R$ 7,2 bilhões. O modelo de monotrilho teria a vantagem de</p><p>ser mais barato e ter implementação mais rápida que o metrô tradicional, porém isso</p><p>não vem se comprovando. Em 2008, investigações iniciadas na Europa trouxeram à</p><p>tona um esquema de corrupção envolvendo o Metrô. Segundo as denúncias,</p><p>empresas como a Alstom e a Siemens participaram, pelo menos desde 1998, de um</p><p>cartel que fraudava as licitações, com pagamento de propina a funcionários do</p><p>governo. As empresas definiam quem apresentaria a proposta vencedora e</p><p>superfaturavam obras e trens em até 30%, de acordo com a Polícia Federal. Em meio</p><p>a tudo isso, o jornal Folha de S. Paulo descobriu que documentos relativos ao Metrô,</p><p>CPTM e EMTU estavam sob sigilo, com a classificação de ultrassecretos. Após as</p><p>críticas, a medida foi revogada. Ainda assim, a dificuldade em obter transparência</p><p>nesse setor é sintomática da forma como são definidas as políticas de mobilidade em</p><p>41</p><p>São Paulo. São diversos modelos e interesses em disputa, em uma cidade que</p><p>começa a perceber a inviabilidade do automóvel. Porém, mesmo quando priorizam o</p><p>transporte coletivo, as decisões são muitas vezes tomadas de cima para baixo, com</p><p>pouca ou nenhuma participação da população. No nível municipal, houve a instalação</p><p>do Conselho de Transporte e Trânsito. Embora seja um avanço, trata-se ainda de um</p><p>espaço consultivo, por onde nem sempre passam debates sobre políticas importantes.</p><p>No nível metropolitano, as dificuldades de incidência da sociedade são ainda maiores.</p><p>Mas as manifestações de 2013 mostraram que as pessoas querem ser ouvidas para</p><p>a construção de uma cidade onde a mobilidade seja direito de todos.</p><p>A BICICLETA COMO TRANSPORTE</p><p>A bicicleta como transporte ainda é para poucos Apesar do Sistema de</p><p>Informações da Mobilidade Urbana (SIMU) em documento3 anual desenvolvido pela</p><p>Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) em parceria com o Banco</p><p>Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) afirmar que, entre 2004</p><p>e 2014, o uso de bicicletas como meio de locomoção duplicou ainda é pouco</p><p>comparado com os outros meios de transporte. A bicicleta ainda é associada</p><p>majoritariamente às atividades de lazer nos fins de semana e o modelo de</p><p>desenvolvimento urbano hegemônico ainda coloca o carro particular como</p><p>protagonista. Outra</p><p>questão é que a grande maioria das políticas cicloviárias nas</p><p>cidades são voltadas para áreas privilegiadas das cidades, negligenciando parte das</p><p>42</p><p>pessoas que já utilizam a bicicleta em sua rotina. Em geral estas regiões são distantes</p><p>dos centros urbanos e deveriam ser prioridade nas políticas que visam integrar</p><p>diferentes modais de transporte4 . Há também quem discorde do investimento em</p><p>políticas para a promoção do uso de bicicleta como o prefeito eleito de São Paulo,</p><p>João Doria (PSDB), que quer desativar algumas ciclovias da cidade e não pretende</p><p>ampliá-las.</p><p>A ideia do futuro prefeito contraria o PlanMob (Plano Municipal de Mobilidade</p><p>Urbana) que prevê fazer 1.300 km de ciclovias em São Paulo até 2030. Aqueles que</p><p>decidem usar a bicicleta para se locomover enfrentam diversos desafios. No Rio de</p><p>Janeiro há 374 km de ciclovias e os trechos das praias encantam turistas e moradores,</p><p>mas algumas partes dos trajetos não são conservadas e há relatos constantes de</p><p>assaltos e furtos. Entre julho e setembro, o estado do Rio registrou 577 furtos e 61</p><p>roubos, uma média de quase sete crimes por dia, de acordo com o Instituto de</p><p>Segurança Pública. A questão resultou em uma CPI das Bikes, que investigou a venda</p><p>de bicicletas e peças do veículo abaixo do preço de mercado em sites na internet.</p><p>Outro problema são os conflitos entre ciclistas e motoristas que muitas vezes</p><p>enxergam o ciclista como um inimigo, o que pode ser conferido no Grupo do Facebook</p><p>chamado Massa Crítica Rio de Janeiro um movimento que reúne pessoas online (mais</p><p>de 5.000) e em bicicletadas frequentes para promover o uso das bicicletas como</p><p>transporte. Grupos como esse estão organizados em diversas partes do Brasil e do</p><p>mundo. Esta falta de educação no transito é apontada no relatório da Pesquisa</p><p>Nacional sobre o Perfil do Ciclista Brasileiro e suas motivações para utilizar a bicicleta8</p><p>produzido pela Parceria Nacional pela Mobilidade por bicicleta como maior problema</p><p>enfrentado pelos ciclistas enquanto rapidez e praticidade é a maior motivação para</p><p>pedalar para se locomover.</p><p>Quando a tomada de decisão é pela mudança A última prefeitura de São</p><p>Paulo reconheceu publicamente que “o maior problema na mobilidade urbana é o</p><p>transporte individual, ” nas palavras do secretário municipal de transportes, Jilmar</p><p>Tatto . Para ele, o transporte ativo é uma questão de lei, pois as ciclovias estão</p><p>previstas no Estatuto Nacional das Cidades. Assim até o final do ano de 2016, há a</p><p>promessa de 400 quilômetros, um terço da necessidade da cidade, número</p><p>estabelecido em debates entre a prefeitura e cicloativistas.</p><p>43</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>ABRAMOVAY, R. Mobilidade versus carrocentrismo. Folha de S. Paulo, São Paulo,</p><p>14 dez. 2011.</p><p>ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE TRANSPORTE PÚBLICO. Sistemas de Informações</p><p>da Mobilidade – Relatório Geral 2011. Brasília: ANTP, 2012.</p><p>DIAMOND, J. M. Colapso: como as cidades escolhem o fracasso ou o sucesso. Rio</p><p>de Janeiro: Record, 2012.</p><p>INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Perfil dos</p><p>Municípios Brasileiros – 2012. Rio de Janeiro: IBGE, 2013.</p><p>INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA (Ipea). Impactos sociais e</p><p>econômicos dos acidentes de trânsito nas aglomerações urbanas brasileiras. Brasília:</p><p>Ipea, 2003.</p><p>_______. Emissões relativas de poluentes do transporte motorizado de passageiros</p><p>nos grandes centros urbanos brasileiros. Brasília: Ipea, 2011.</p><p>_______. Tempo de deslocamento casa-trabalho no Brasil (1992 -2009): diferenças</p><p>entre regiões metropolitanas, níveis de renda e sexo. Brasília: Ipea, 2013.</p><p>MARICATO, E. Brasil tem obra sem plano e plano sem obra. São Paulo, Câmara</p><p>Municipal de São Paulo, 28 mai. 2013. Entrevista a Rodolfo Blancato. Disponível em:</p><p>MINISTÉRIO DO TRANSPORTE. Plano setorial de transporte e de mobilidade urbana</p><p>para mitigação e adaptação à mudança do clima. Brasília: Ministério do Transporte,</p><p>2013.</p><p>MORRIS, E. From Horse Power to Horsepower. Access, v.30, 2007.</p><p>ROWLING, J. K. Harry Potter e a Ordem de Fênix. Rio de Janeiro: Rocco, 2003.</p><p>44</p><p>VASCONCELLOS, E. A. de. Transporte e meio ambiente: conceitos e informações</p><p>para análise de impactos. São Paulo: Annablume, 2008.</p><p>ABRACICLO – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FABRICANTES DE</p><p>MOTOCICLETAS E CICLOMOTORES. Anuário da Associação Brasileira de</p><p>Fabricantes de Motocicletas e Ciclomotores. São Paulo: Abraciclo, 2014.</p><p>ANFAVEA – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS FABRICANTES DE VEÍCULOS</p><p>AUTOMOTORES. Anuário da Indústria Automobilística Brasileira. São Paulo:</p><p>Anfavea, 2014.</p><p>CARVALHO, C. H. R.; PEREIRA, R. H. M. Efeitos da variação da tarifa e da renda da</p><p>população sobre a demanda de transporte público coletivo urbano no Brasil.</p><p>Brasília: Ipea, 2011. (Texto para Discussão, n. 1595).</p><p>______. Gastos das famílias brasileiras com transporte público e privado no Brasil:</p><p>uma análise da POF 2003 e 2009. Brasília: Ipea, 2012. (Texto para Discussão, n.</p><p>1803).</p><p>IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de</p><p>Orçamentos Familiares (POF) 2008-2009. Rio de Janeiro: IBGE, 2010.</p><p>Outro aspecto importante da interação entre crescimento urbano e mobilidade</p><p>é a forma excludente como as cidades crescem, com a ocupação das áreas mais</p><p>periféricas pelos mais pobres. Isto significa que o custo do transporte vai aumentando</p><p>à medida que as fronteiras urbanas se expandem em função das maiores distâncias</p><p>percorridas e também pela característica de cidades dormitórios das novas ocupações</p><p>periféricas, que reduzem a rotatividade de uso do transporte público, aumentando seu</p><p>custo unitário (Ipea, 2011).</p><p>Os passivos acumulados na rede de infraestrutura urbana e as iniquidades</p><p>observadas na ocupação das cidades trazem grandes desafios para os dirigentes</p><p>públicos. Em termos de reordenamento territorial urbano, o desafio é estabelecer</p><p>políticas de aproximação da população mais pobre às áreas de maior dinamismo</p><p>6</p><p>econômico-social, ou no sentido inverso, promover maior desenvolvimento às áreas</p><p>mais carentes dos aglomerados urbanos. Isso permitiria reduzir a necessidade de</p><p>grandes deslocamentos por parte dessa população. Nesse contexto, é importante</p><p>que o poder público programe políticas adequadas de adensamento urbano e maior</p><p>distribuição dos empregos pelo território. Por seu turno, Viagens pendulares que</p><p>lotam os veículos no início do percurso e o esvaziam somente no destino,</p><p>geralmente áreas centrais. Não há renovação de passageiros ao longo do trajeto das</p><p>linhas periféricas. Um exemplo disso é o deslocamento para regiões periféricas das</p><p>capitais das sedes de governo e autarquias que o estado de Minas Gerais e também</p><p>o Distrito Federal promoveram, também se torna uma necessidade a integração da</p><p>camada da população excluída às oportunidades urbanas pela oferta de transporte</p><p>público de qualidade, com a adoção de um programa permanente de investimento</p><p>em infraestrutura de transporte de massa e transporte não motorizado, priorizando</p><p>os corredores de transporte e as áreas periféricas de maior concentração da</p><p>população urbana.</p><p>Vale ressaltar os desafios enfrentados pelos governantes na implantação das</p><p>políticas habitacionais populares. Como o preço da terra é muito mais baixo nas</p><p>regiões distantes dos centros comerciais, as políticas habitacionais, em geral,</p><p>reforçam o imobilismo dos mais pobres e a formação de cidades dormitórios,</p><p>pressionando cada vez mais o custo global do transporte.</p><p>A periferização dos aglomerados urbanos, no qual, no período entre os censos</p><p>de 2000 e 2010, os municípios periféricos das principais regiões metropolitanas</p><p>brasileiras tiveram um crescimento populacional muito maior que os municípios</p><p>centrais (Ipea, 2011).</p><p>INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA</p><p>As periferias dos aglomerados urbanos brasileiros já estão estabelecidas, e</p><p>há a necessidade de atendimento dentro de padrões aceitáveis de qualidade dos</p><p>deslocamentos dessa população, principalmente no caso dos deslocamentos</p><p>casatrabalho. Deslocamentos distantes, com baixo nível de conforto em função da</p><p>7</p><p>acomodação em pé dos passageiros e alto nível de fragmentação dos destinos,</p><p>requerem que as viagens ocorram no menor tempo possível e haja a oferta de</p><p>múltiplos destinos pelo sistema público. Tudo a um preço compatível com o nível baixo</p><p>de renda da população. Para isso, os corredores de transporte rodoviários têm que</p><p>apresentar pistas exclusivas para o transporte coletivo, reduzindo o seu tempo de</p><p>viagem, com áreas de transbordo adequadas e que permitam ultrapassagem entre os</p><p>veículos nestes pontos. Além disso, o sistema tem de operar dentro do conceito de</p><p>uma rede integrada para que todos possam ter condições de acesso a qualquer ponto</p><p>da cidade.</p><p>No caso de aglomerados urbanos que apresentam extensas regiões com alta</p><p>densidade populacional, como ocorre principalmente nas duas metrópoles nacionais</p><p>brasileiras (Rio de Janeiro e São Paulo), a tecnologia metroferroviária passa a ter</p><p>melhores condições de viabilidade.</p><p>Atualmente, essas duas metrópoles e outras metrópoles nacionais com</p><p>sistemas sobre trilhos apresentam malhas bastante reduzidas em relação às</p><p>observadas nas metrópoles asiáticas, europeias e até mesmo em cidades da América</p><p>Latina. A cidade do México, por exemplo, apresenta uma razão de 10 km de linha de</p><p>metrô para cada 1 milhão de habitantes, enquanto no Rio de Janeiro e em São Paulo</p><p>essa relação é superior a 2 milhões de habitantes para cada 10 km. O grande</p><p>problema dos investimentos em sistemas metroferroviários são os altos custos</p><p>envolvidos nos projetos. Uma linha de metrô pode custar a partir de R$ 200 milhões o</p><p>quilômetro e chegar, em alguns casos, a um custo próximo de R$ 500 milhões/km</p><p>(linha 4 do metrô de São Paulo). No caso dos BRTs, a experiência recente brasileira</p><p>mostrou valores que variaram entre 10 milhões e 30 milhões o quilômetro. Por isso, a</p><p>maioria das grandes cidades está optando por essa tecnologia.</p><p>Sistemas de ônibus operando com características de metrôs – via exclusiva,</p><p>embarque em nível, cobrança de passagem fora do veículo etc. Independentemente</p><p>da tecnologia, o país precisa programar políticas de investimento perenes em</p><p>8</p><p>sistemas de transporte de massa. Com a Copa do Mundo e as Olimpíadas, houve uma</p><p>retomada forte dos investimentos na área de mobilidade urbana com foco no</p><p>transporte público de massa, mas questiona-se se essas iniciativas irão se perpetuar</p><p>com o fim desses grandes eventos no país (Ipea, 2010b).</p><p>A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) dos combustíveis,</p><p>uma das principais fontes para investimento na infraestrutura de transporte no país,</p><p>praticamente deixou de arrecadar recursos com a política de redução e supressão das</p><p>alíquotas incidentes sobre os combustíveis impetradas pelo governo federal nos</p><p>últimos anos. Os usuários de automóveis, por exemplo, já chegaram a pagar R$ 0,50</p><p>por litro de gasolina de Cide e, até o início de 2015, não pagam nada. Com isso, a</p><p>arrecadação com combustíveis automotivos, que já foi superior a R$ 10,00 bilhões por</p><p>ano, desde 2012 está zerada. Pela legislação vigente, 29% da arrecadação é</p><p>destinada aos estados e, desta parte, 25% aos municípios. O governo federal, no início</p><p>de 2015, anunciou a volta da cobrança da Cide, mas ficou claro nos anúncios da</p><p>medida que o objetivo final é a formação de superavit primário e não a formação de</p><p>fundos para investimentos em transporte. Outro desafio em termos de viabilização dos</p><p>investimentos são as barreiras que estados e municípios enfrentam para acessar</p><p>linhas de investimentos mais atrativas dos principais agentes de fomento (Banco</p><p>Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, Banco Interamericano</p><p>de Desenvolvimento – BID, Banco Internacional para Reconstrução e</p><p>Desenvolvimento – BIRD etc.). Primeiro, o problema de capacidade e estrutura para</p><p>desenvolvimento de projetos que atendam aos requisitos solicitados, seguido das</p><p>barreiras informacionais. Além disso, há ainda os desafios financeiros enfrentados</p><p>pelos municípios e estados mais pobres, caracterizados pela falta de capacidade de</p><p>investimento e de endividamento. Nesse ponto, reside um grande desafio para a</p><p>União, pois até hoje a grande parte dos recursos aportados são de empréstimos</p><p>concedidos via BNDES ou outros programas específicos.</p><p>Os investimentos realizados via Orçamento Geral da União (OGU), que são</p><p>recursos a fundo perdido, em sua maioria estão concentrados nos sistemas</p><p>ferroviários da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), que respondem por</p><p>menos de 3% da demanda global de viagens por transporte público. Isso ocorre em</p><p>função de esses sistemas serem de propriedade da União, o que lhe dá essa</p><p>obrigatoriedade de investir. Os sistemas rodoviários, principalmente os de alta</p><p>9</p><p>capacidade, em geral não recebem recursos a fundo perdido. Há quem defenda uma</p><p>maior participação da União nos investimentos de mobilidade com recursos via OGU</p><p>ou outro fundo</p><p>específico, justamente para viabilizar projetos importantes que, sem</p><p>esse apoio, não sairiam do papel, principalmente em cidades mais pobres, que são as</p><p>que apresentam as maiores taxas de crescimento do transporte individual atualmente</p><p>no Brasil (Ipea, 2011).</p><p>ENVELHECIMENTO DA POPULAÇÃO</p><p>A população brasileira está envelhecendo em função de fatores como a queda</p><p>da fecundidade e o aumento da expectativa de vida geral. Se em 1991 apenas 2,9%</p><p>da população urbana tinha mais de 65 anos, hoje quase 8% da população está nesta</p><p>faixa, com forte tendência de crescimento (Pereira et al., 2013). O primeiro impacto</p><p>disso na mobilidade urbana é econômico. Por lei constitucional, as pessoas com mais</p><p>de 65 anos não pagam passagem de transporte público coletivo. Isso significa que,</p><p>com o envelhecimento, aumenta-se ano a ano o contingente de passageiros gratuitos</p><p>e diminui o número de passageiros pagantes. Como no Brasil o transporte público é</p><p>custeado basicamente pelo passageiro pagante, esse movimento demográfico</p><p>impacta a tarifa para cima, que simula o impacto tarifário na situação hipotética de</p><p>volume de demanda de passageiro proporcional ao perfil demográfico.</p><p>O impacto atual das gratuidades dos idosos chega a quase 10% do custo da</p><p>tarifa, com forte tendência de crescimento. Como não há custeio extratarifário dessa</p><p>gratuidade, os usuários de transporte estão pagando por ele, o que torna-se uma</p><p>grande injustiça social, já que esses usuários, em sua maioria, são de baixa renda.</p><p>O desafio aqui colocado é a constituição de fundos públicos para o custeio</p><p>dessa e de outras gratuidades existentes, de forma que o ônus do benefício não recaia</p><p>nas costas dos usuários de baixa renda (Ipea, 2013a). O ideal é que esses fundos</p><p>sejam compostos de recursos oriundos do transporte individual ou outras fontes</p><p>ligadas ao padrão de consumo dos mais ricos, já que eles pouco contribuem para o</p><p>financiamento do transporte público.</p><p>10</p><p>Outro desafio com o envelhecimento é dotar os sistemas de transporte em geral</p><p>com características específicas para atender pessoas com dificuldade de locomoção.</p><p>Com o envelhecimento da população, a quantidade de pessoas com dificuldades de</p><p>locomoção circulando pela cidade aumentará bastante. Veículos sem degraus,</p><p>calçadas e equipamentos mais acessíveis, pontos de paradas e terminais bem</p><p>dimensionados e projetados no conceito de acessibilidade universal, entre outras</p><p>medidas, são cada vez mais necessários, mas pouco representados nos orçamentos</p><p>públicos dos três níveis. De acordo com o Decreto Presidencial no 5.296/2004, o prazo</p><p>de dez anos para todos os elementos de transporte ficarem acessíveis terminou em</p><p>2014, e pouco se fez neste sentido (Ipea, 2010b).</p><p>CRESCIMENTO DO TRANSPORTE INDIVIDUAL E QUEDA DO</p><p>TRANSPORTE PÚBLICO</p><p>Com uma nova política de atração dos investimentos da indústria</p><p>automobilística iniciada em meados da década de 1990, o Brasil vem passando por</p><p>outra fase de aumento do transporte individual motorizado. A capacidade de produção</p><p>de automóveis e motocicletas mais que triplicou no período. Com o aumento da</p><p>produção, houve a necessidade de políticas que estimulassem a venda e o uso de</p><p>automóveis e motocicletas. Isso ocorreu pela redução da carga tributária sobre os</p><p>veículos até 1.000 cilindradas, que representam atualmente mais de 50% das vendas,</p><p>além de medidas de expansão do crédito (Carvalho e PAo mesmo tempo em que o</p><p>transporte individual foi crescendo – desde meados dos anos 1990 – a demanda por</p><p>transporte público sofreu quedas frequentes (Carvalho e Pereira, 2011). Os sistemas</p><p>de ônibus urbanos que atendem 90% da demanda de transporte público tiveram sua</p><p>demanda encolhida em cerca de 25% desde essa época, apesar da tendência de</p><p>estabilização do volume de passageiros observada recentemente, em função do</p><p>aumento de renda dos mais pobres (NTU, 2013). Apenas os sistemas de transporte</p><p>público sobre trilhos tiveram aumento de demanda no período, em função dos</p><p>investimentos na malha e as vantagens competitivas desses sistemas em ambiente</p><p>de intenso congestionamento de tráfego rodoviário. O problema é que esses sistemas</p><p>possuem baixa abrangência nas redes de transporte, conforme descrito</p><p>11</p><p>anteriormente. Pelos dados da última Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), pode-</p><p>se verificar que as famílias brasileiras apresentam uma característica de gastar mais</p><p>em transporte privado que no público em praticamente todas as faixas de renda</p><p>(Carvalho e Pereira, 2012). Além disso, esses gastos com transporte privado sobem</p><p>exponencialmente à medida que a renda aumenta (elasticidaderenda maior que 1).</p><p>Os gastos com transporte público são crescentes apenas para famílias mais</p><p>pobres, em função do aumento da mobilidade das pessoas quando há aumento de</p><p>renda, mas, mesmo nessa faixa, os gastos com transporte privado são maiores. Para</p><p>as classes de renda mais elevadas, valores superiores à mediana, os gastos per capita</p><p>com transporte público decrescem à medida que se sobe de classe (elasticidade-</p><p>renda negativa). Isso mostra a falta de atratividade do transporte público para as</p><p>famílias mais ricas, inclusive as famílias da classe média, e ao mesmo tempo a</p><p>intensidade de uso do transporte privado em ambiente de crescimento da renda.</p><p>Os problemas de um modelo de mobilidade estruturado no transporte individual</p><p>são as externalidades negativas geradas. Talvez a mais impactante dessas</p><p>externalidades seja as mortes no trânsito. No Brasil, são cerca de 50 mil mortes no</p><p>trânsito por ano. Segundo dados do seguro Danos Pessoais Causados por Veículos</p><p>Automotores de Via Terreste (DPVAT) (Seguradora Líder, 2015), em 2013, foram</p><p>54.767 indenizações por mortes e 444.206 por invalidez, com um desembolso total de</p><p>R$ 2,5 bilhões. O Ipea estimou em cerca de R$ 40 bilhões os custos com acidentes</p><p>nas rodovias brasileiras e cerca de R$ 10 bilhões nos aglomerados urbanos (Ipea,</p><p>2015), sendo que a perda de produção e os gastos hospitalares são os itens de maior</p><p>custo. Outras externalidades são os congestionamentos e a poluição veicular. Várias</p><p>foram as políticas que reforçaram o estímulo ao transporte individual. As tarifas de</p><p>transporte público por ônibus, por exemplo, tiveram um crescimento acima da inflação</p><p>nos últimos quinze anos, ao mesmo tempo em que os principais itens associados ao</p><p>transporte privado tiveram crescimento real negativo, o que significa, um processo de</p><p>barateamento do uso e aquisição do transporte privado e encarecimento do transporte</p><p>público (Ipea, 2013a).</p><p>Somente a partir de meados de 2013, com a intensificação das manifestações</p><p>populares contra os aumentos de tarifas, houve redução real dos preços das</p><p>passagens, com impacto sobre o orçamento dos municípios.</p><p>12</p><p>No caso do transporte público, as políticas estabelecidas foram pelo caminho</p><p>contrário ao princípio da modicidade tarifária, e observa-se que os principais fatores</p><p>de oneração das tarifas continuam atuantes (NTU, 2009) – aumentos das gratuidades</p><p>financiadas pelo mecanismo do subsídio cruzado, perda de produtividade e</p><p>competividade em relação ao transporte individual, elevação dos custos de operação</p><p>em função do aumento dos congestionamentos e da falta de vias exclusivas, elevação</p><p>do preço dos principais insumos do transporte público (TP) (veículos, pneus, diesel</p><p>etc.). Para inverter essa lógica individualista, as políticas públicas devem seguir o</p><p>princípio de privilegiar o transporte público e o não motorizado em detrimento do</p><p>transporte motorizado individual. Para isso, são necessárias medidas de</p><p>compensação pelas externalidades produzidas pelos usuários de motos e automóveis,</p><p>onerando principalmente o uso e a propriedade desse tipo de transporte (taxação da</p><p>gasolina, propriedade e seguro dos veículos, assim como o uso do espaço urbano).</p><p>Na outra linha, devem ser adotadas medidas de barateamento</p><p>e estímulo ao uso do</p><p>transporte público como a implantação de faixas e corredores exclusivos para ônibus</p><p>e medidas de redução do seu custo via diminuição de tributos e financiamento</p><p>extratarifário da operação dos serviços. Aumento geral dos preços das passagens</p><p>para cobertura dos custos com as gratuidades, já que não há recursos externos para</p><p>financiá-las.</p><p>Financiamento progressivo da operação de transporte público e dos benefícios</p><p>tarifários concedidos No Brasil, como o custeio da operação de transporte público</p><p>ocorre quase que exclusivamente da arrecadação de tarifas e a maior parte dos</p><p>usuários são pessoas de baixa renda, pode-se deduzir que quem financia a operação</p><p>de transporte são as famílias de menor renda. Além disso, como também não há</p><p>financiamento externo das gratuidades e dos benefícios concedidos, o ônus dessas</p><p>medidas recai da mesma forma aos usuários pagantes de baixa renda, que têm sua</p><p>tarifa onerada para cobrir esses custos. Perfil bastante regressivo no financiamento</p><p>do TP, pois quanto mais ricas as famílias menos elas gastam com o transporte público.</p><p>Mas qual o problema desse modelo de financiamento em que apenas quem usa</p><p>diretamente paga pelos seus custos? O problema é justamente a regressividade no</p><p>custeio do sistema e benefícios sociais do transporte público urbano: os pobres pagam</p><p>muito enquanto os ricos pagam muito pouco. Essa iniquidade se acentua mais ainda</p><p>porque toda a sociedade se beneficia da existência do transporte público, seja usuário</p><p>ou não, principalmente os mais ricos. Como todos se beneficiam, todos deveriam</p><p>13</p><p>pagar, e como qualquer política pública de caráter social os mais ricos deveriam</p><p>contribuir com uma carga maior, ao contrário do que ocorre hoje em dia. Uma amostra</p><p>da universalização dos benefícios do TP ocorre quando há paralisação ou deficiência</p><p>na oferta de TP por motivo de greve ou outro qualquer. Todas as atividades</p><p>econômicas sofrem fortes impactos. Além disso, os usuários de automóveis não</p><p>conseguem trafegar pelas vias, o setor produtivo fica prejudicado pela falta de mão de</p><p>obra e o comércio padece com a falta de transporte para trabalhadores e</p><p>consumidores, até mesmo o comércio voltado para as classes mais altas, já que a</p><p>circulação de veículos privados fica prejudicada. Se o TP beneficia a todos,</p><p>principalmente os mais ricos, todos deveriam pagar, com destaque para esse grupo</p><p>social.</p><p>Outro grupo bastante beneficiado com os investimentos em sistemas de</p><p>transporte de qualidade são os proprietários de imóveis, já que esses ativos costumam</p><p>se valorizar bastante devido a existência de bons sistemas de transporte nas suas</p><p>imediações. Isso ocorre principalmente no Brasil, onde não há políticas de</p><p>transferência desses ganhos para a coletividade após valorizações provocadas por</p><p>investimentos públicos na melhoria do sistema de mobilidade.</p><p>A Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU) estima</p><p>em cerca de 18% o ônus adicional médio no valor das tarifas de ônibus para cobrir o</p><p>custo das gratuidades.</p><p>Seguindo a linha de se criar um modelo de financiamento da operação mais</p><p>progressivo, seria necessário criar mecanismos de cobranças cujas bases de</p><p>arrecadação estariam associadas aos serviços ou produtos consumidos pelos mais</p><p>ricos e que tivessem algum relacionamento com o sistema de mobilidade. Desses</p><p>gastos, o mais progressivo é a aquisição de veículos, seguido pelo gasto com</p><p>combustível, o que daria uma boa sinalização para taxação do transporte individual.</p><p>Outras fontes também poderiam ser adotadas, como o IPVA, IPTU, cobrança pelo uso</p><p>do espaço público urbano (estacionamentos e pedágio).</p><p>14</p><p>PERSPECTIVAS DE POLÍTICAS</p><p>As tendências de aumento do transporte individual no país são muito fortes e</p><p>isso traz grandes desafios para os dirigentes e gestores públicos do transporte no</p><p>sentido de planejar políticas mitigadoras das externalidades negativas produzidas e</p><p>planejar sistemas dentro dos conceitos do desenvolvimento sustentável. No âmbito</p><p>federal, destaca-se a necessidade de se programar políticas perenes de</p><p>financiamento e investimento direto com recursos do OGU de grandes obras de</p><p>mobilidade urbana com foco na priorização do transporte coletivo e do transporte não</p><p>motorizado. Para isso, seria importante a volta da cobrança da Contribuição de</p><p>Intervenção no Domínio Econômico sobre os combustíveis veiculares. Outras ações</p><p>também são importantes na área de capacitação e informação. No âmbito local e</p><p>regional, há também uma série de ações que podem ser adotadas, com destaque para</p><p>as medidas de regulação de trânsito, com a destinação de mais espaço no sistema</p><p>viário para o transporte público coletivo e o não motorizado, aliadas com outras</p><p>medidas compensatórias (restritivas) focadas no transporte individual.</p><p>Outro desafio colocado se referiu à alteração do modelo atual de financiamento</p><p>da operação do TP e benefícios concedidos com o aumento da participação de fontes</p><p>extratarifárias na receita. Essas novas fontes devem focar as famílias mais ricas, que,</p><p>hoje em dia, pouco contribuem no financiamento do TP. Com isso, pode-se alcançar</p><p>um objetivo importante colocado pela população durante as manifestações de 2013:</p><p>o barateamento das tarifas de transporte público. Muitas outras medidas seriam</p><p>importantes para aumentar a participação do transporte público na matriz modal dos</p><p>deslocamentos urbanos.</p><p>As manifestações da população em 2013 colocaram em cheque as políticas</p><p>de mobilidade até então adotadas que sempre privilegiaram o transporte individual.</p><p>Cabem aos governantes entenderem o recado dado pela população e começarem a</p><p>mudar essa realidade.</p><p>15</p><p>BREVE HISTÓRICO</p><p>Por volta dos anos 1800, a população de equinos crescia vertiginosamente nas</p><p>grandes cidades e, com ela, os problemas sociais e sanitários trazidos pela grande</p><p>quantidade de animais. Para que se tenha uma ideia, por volta de 1890, cada um dos</p><p>cavalos que compunha a já mencionada frota de Nova York produzia, em média, dez</p><p>quilos de fezes por dia, totalizando duas mil toneladas de dejetos espalhados pela</p><p>cidade a cada 24 horas. Essa situação desesperadora não era exclusiva da cidade</p><p>norte-americana. O jornal Times de Londres estimou, em 1894, que se não houvesse</p><p>nenhuma mudança, em meados de 1950 todas as ruas da cidade estariam soterradas</p><p>sob 2,5 metros de dejetos de cavalo. Somando-se ao mau cheiro, os excrementos</p><p>atraíam um enxame enorme de moscas – grandes vetores de doenças – e ratos.</p><p>Estima-se que, comparativamente, o número de acidentes fatais per capita causados</p><p>por veículos puxados por cavalos em Nova York em 1900 era 75% maior que o de</p><p>acidentes de trânsito atuais (Morris, 2007). Paralelo a isso, o congestionamento</p><p>provocado pelo uso do cavalo como meio de transporte mais que dobrou entre 1885</p><p>e 1905. Numa das várias tentativas de se minimizar essas questões, Nova York sediou</p><p>a 1ª Conferência Internacional de Planejamento Urbano, em 1898. Na pauta principal</p><p>do evento estava a busca de uma solução para os problemas causados nas grandes</p><p>cidades do mundo pelo uso exacerbado do cavalo como meio de transporte. A</p><p>Conferência, que tinha duração prevista de sete dias, terminou antes do esperado,</p><p>sem, no entanto, trazer ao problema qualquer solução definitiva.</p><p>A situação só viria a ser contornada no começo do século XX, com a</p><p>disseminação do uso do carro.</p><p>A expansão do carro trouxe inúmeros benefícios ao desenvolvimento tecnológico e</p><p>econômico das cidades, introduzindo mudanças significativas na linha de produção e</p><p>no mercado de trabalho (fordismo), cujas consequências – positivas e negativas –</p><p>são sentidas até hoje. Esses fatores fizeram que os investimentos no setor se</p><p>tornassem constantes, como forma de garantir sua crescente expansão.</p><p>No Brasil, em especial, a preferência ao transporte rodoviário começou a ser</p><p>dada</p><p>a partir da Constituição de 1934, com o direcionamento dos esforços para</p><p>construção de rodovias no país. Em 1956, passamos pela introdução da indústria</p><p>automobilística, acompanhada, desde então, por políticas públicas de apoio aos</p><p>veículos automotores, em especial ao carro e à motocicleta. Essas políticas de</p><p>16</p><p>incentivo, que persistem até hoje, no entanto, fizeram que, cem anos após a crise</p><p>vivida pelo uso de cavalos no transporte, o uso do automóvel (outrora uma solução)</p><p>se tornasse um problema sério nos grandes centros urbanos. Voltamos a enfrentar e</p><p>discutir os impactos sociais, ambientais e de saúde gerados pelo uso exagerado de</p><p>um modal no transporte de pessoas: hoje, o carro se tornou o cavalo do século XXI.</p><p>A SOLUÇÃO DO PASSADO, O PROBLEMA DE HOJE</p><p>Atualmente, mais de 50% dos domicílios do Brasil já têm um automóvel ou uma</p><p>moto em suas garagens. De fato, a frota brasileira de veículos está em franco</p><p>crescimento, graças à política de incentivos adotada pelo governo desde a década de</p><p>1930. Nos últimos dez anos, o número de automóveis no país cresceu 138,6%,</p><p>enquanto a população brasileira teve expansão de apenas 12,2% no mesmo período.</p><p>Possuir um carro, no entanto, é apenas a ponta do problema da mobilidade nas</p><p>grandes cidades, agravado pela utilização cotidiana e excessiva do veículo. Prova</p><p>disso é que, apesar de Nova York ter uma das maiores taxas de motorização do</p><p>mundo, é em São Paulo que as pessoas gastam mais tempo no deslocamento casa-</p><p>trabalho. Em um rol de 31 cidades, a capital paulista perde apenas para Xangai, maior</p><p>cidade da China. No ranking das dez cidades com maior tempo de deslocamento,</p><p>cinco são brasileiras e todas aparecem em situação mais crítica que a de Nova York</p><p>(Ipea, 2013).</p><p>O tempo não é a única coisa que as pessoas, e notadamente os brasileiros,</p><p>perdem nos congestionamentos. Perde-se também saúde, dinheiro e, em alguns</p><p>casos, até a vida. O Brasil possui taxas altíssimas de acidentes de trânsito, chegando</p><p>a ter 22,5 mortes a cada 100 mil pessoas, mais do que a Índia (18,9), a China (20,5)</p><p>e o dobro dos Estados Unidos (11,4). Estima-se que o sistema de saúde brasileiro</p><p>gaste em média R$ 50 bilhões ao ano com tratamentos e outros custos decorrentes</p><p>de acidentes de trânsito. De acordo com estudo feito a cada dois anos pela Fundação</p><p>Getulio Vargas (FGV), o trânsito de São Paulo acarretou à cidade perdas da ordem de</p><p>R$ 40 bilhões em 2012. Isso representa 1% do PIB do país, com cada cidadão</p><p>17</p><p>deixando de ganhar ou de gastar cerca de R$ 3,6 mil enquanto estava preso, de forma</p><p>totalmente improdutiva, nos congestionamentos.</p><p>Quando se analisa a saúde, os números não são menos preocupantes.</p><p>Em 2011, quase 27 mil internações realizadas na Região Metropolitana de São</p><p>Paulo estudos avançados 27 (79), 2013 57 (RMSP) foram decorrentes da poluição do</p><p>ar. Na cidade de São Paulo, os gastos com essas internações chegaram a R$ 31</p><p>milhões (Vormitag, 2013). Há, ainda, a questão do aquecimento global. Se no século</p><p>XIX o assunto não era presente no cotidiano das pessoas, hoje com certeza cresce</p><p>em importância ante os efeitos desse fenômeno e a expansão constante das emissões</p><p>de gases de efeito estufa no país.</p><p>Nesse contexto, o setor de transporte é um dos atores principais e ocupa o</p><p>posto de segundo maior emissor de gases de efeito estufa no país (7% a 9% das</p><p>emissões, ficando atrás somente das queimadas e mudanças no uso do solo – cerca</p><p>de 70%). Quando se trata das emissões do setor de energia, no qual o transporte está</p><p>inserido, ele ainda responde pela maior parte das emissões do setor (48,23%). No</p><p>tocante às emissões oriundas do transporte de passageiros, 68% delas são</p><p>provenientes do transporte individual e 32%, do transporte coletivo (Ministério do</p><p>Transporte, 2013).</p><p>VOLTANDO À ESTACA ZERO</p><p>Os números apresentados deixam claro que a solução para o transporte com</p><p>carros envelheceu e que suas externalidades negativas já são tantas que chegam a</p><p>superar seus benefícios. Do ponto de vista de políticas públicas, talvez uma das mais</p><p>graves consequências trazidas pelo carro tenha sido a apontada por Jared Diamond</p><p>em seu livro Colapso, no qual sinaliza que o uso do automóvel inviabilizou a projeção</p><p>de sistemas de transportes públicos que satisfizessem as necessidades da maioria</p><p>dos moradores das cidades. Citando o caso de Los Angeles, Diamond (2012, p.599)</p><p>explica que nossa antiga rede de bondes faliu nos anos de 1920 e 1930, e seus direitos</p><p>de exploração foram comprados por fabricantes de automóveis e subdivididos de</p><p>modo que fosse impossível reconstruir a rede (que competia com os automóveis). A</p><p>18</p><p>preferência dos habitantes de Los Angeles por viver em casas ao invés de prédios e</p><p>apartamentos, e as longas distâncias e diversas rotas cruzadas pelos trabalhadores</p><p>tornou impossível projetar sistemas de transporte público que satisfizessem as</p><p>necessidades da maioria dos residentes. Isso ocorreu em razão da priorização</p><p>histórica dada por diversos governos, inclusive o brasileiro, à indústria automobilística,</p><p>o que levou à marginalização e ao sucateamento de outros modais que não o</p><p>individual motorizado. Essa priorização cria um ciclo interminável de deterioração das</p><p>cidades e utilização injusta e antidemocrática do espaço urbano – que precisa ser</p><p>corrigida com urgência.</p><p>Um século após a crise vivida pelas grandes cidades com seu sistema de</p><p>transporte, voltamos a sonhar e a discutir uma solução de mobilidade que nos redima,</p><p>desejando que desta vez o remédio de hoje não represente a doença do futuro.</p><p>Um passo rumo à mudança Em janeiro de 2012, e após quase 17 anos de</p><p>tramitação no Congresso Nacional, o Brasil passou a ter uma Política Nacional de</p><p>Mobilidade Urbana (PNMU). Instituída pela Lei n.12.587/2012, a Política define as</p><p>diretrizes que devem orientar a regulamentação e o planejamento da mobilidade</p><p>urbana nas cidades brasileiras.</p><p>As diretrizes são claras e podem ser bem resumidas em uma frase: é preciso</p><p>incentivar os deslocamentos por meios de transporte não motorizados e os coletivos</p><p>e desestimular os individuais motorizados – responsáveis por 27,4% dos</p><p>deslocamentos realizados nas cidades brasileiras com mais de 60 mil habitantes</p><p>(Associação..., 2012). Nisso reside o maior mérito da Política: ao obrigar que os</p><p>gestores das cidades priorizem e incentivem outros modais, ela claramente tenta</p><p>corrigir a distorção na cultura do planejamento dos deslocamentos que ocorrem no</p><p>país. Além de estabelecer diretrizes, a Política traz, ainda, uma determinação clara</p><p>para os municípios com mais de 20 mil habitantes (30% das cidades brasileiras): de</p><p>que elaborem, até abril de 2015, um Plano de Mobilidade Urbana (PMU), capaz de</p><p>abarcar não só as diretrizes da Lei, mas também de traçar, juntamente à sociedade</p><p>civil, um planejamento de curto, médio e longo prazos para a forma como se darão os</p><p>deslocamentos de bens e pessoas na cidade. Apesar de as determinações da PNMU</p><p>serem importantes, a ideia de fazer que os municípios brasileiros realizem um</p><p>planejamento ordenado do setor não é nova.</p><p>19</p><p>Em 2001, o Estatuto das Cidades (Lei n.10.257/01) – que instituiu a</p><p>obrigatoriedade do Plano Diretor – determinou que todas as cidades com mais de 500</p><p>mil habitantes elaborassem seu Plano de Transportes. Mudanças no termo (de</p><p>transporte para mobilidade) à parte, o cerne das duas determinações é o mesmo: o</p><p>vislumbre, pelo legislador, da necessidade de se regular o setor de transporte de</p><p>pessoas e cargas. Não obstante isso, doze anos após o advento do Estatuto das</p><p>Cidades, a determinação feita por ele ainda continua obscura para boa parte dos</p><p>gestores.</p><p>De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente</p><p>55,3% dos municípios com mais de 500 mil habitantes possuem o Plano de</p><p>Transporte. Dentre os 44,7% restantes que também</p><p>deveriam ter um Plano há mais</p><p>de uma década, somente 28,9% o estão elaborando. Se o recorte for ampliado para</p><p>todos os 5.564 municípios do país, o percentual cai consideravelmente: somente 3,8%</p><p>possuem o mencionado instrumento de planejamento (IBGE, 2013). Esse</p><p>preocupante cenário demonstra que o retorno da determinação, de forma mais</p><p>detalhada e aprimorada, veio em boa época, devido a dois fatores principais – um</p><p>relativo à norma em si e outro externo a ela. O primeiro é o fato de que além da</p><p>diferença de denominação já apontada acima, à obrigatoriedade de elaboração do</p><p>PMU seu universo de abrangência, a determinação de claras diretrizes que deverão</p><p>orientar sua elaboração e conteúdo e o estabelecimento de que aqueles que</p><p>descumprirem a norma federal ficarão privados de receber recursos orçamentários</p><p>federais destinados à mobilidade até que cumpram o disposto na PNMU.</p><p>Apesar de a efetividade dessa sanção ser questionável, ela já demonstra um</p><p>avanço em relação à disposição anterior, cuja ineficácia parcial pode ser atribuída à</p><p>inexistência, à época, de qualquer sanção para aqueles que a descumprissem. O</p><p>segundo fator que faz que a existência de diretrizes federais para a mobilidade seja</p><p>importante diz respeito ao ciclo de investimentos em mobilidade urbana vivido no país.</p><p>Historicamente, a alocação de recursos federais em mobilidade não é</p><p>constante, grandiosa ou mesmo bem distribuída – entre 2006 e 2010, somente 4%</p><p>dos municípios brasileiros receberam verbas federais para o setor, de acordo com</p><p>levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e divulgado</p><p>em janeiro/2012. Dentre os recursos distribuídos, grande parte foi repassada, em</p><p>20</p><p>geral, para as cidades com mais de um milhão de habitantes (no período citado acima,</p><p>esse valor correspondeu a 94% do total), com o repasse de quantias quase sempre</p><p>irrisórias às cidades que possuem menos de 500 mil habitantes. Essa realidade, no</p><p>entanto, tem se alterado pouco a pouco nos últimos anos.</p><p>Desde meados de 2009, o volume de recursos – sejam do orçamento federal,</p><p>estadual/ municipal ou via financiamento – que têm sido disponibilizados para a</p><p>mobilidade cresceu consideravelmente, chegando a mais de R$ 90 bilhões. Mais da</p><p>metade desses recursos é proveniente do Programa de Aceleração do Crescimento</p><p>(PAC) da Copa (R$ 12 bilhões), do PAC Mobilidade Grandes Cidades (R$ 32,6</p><p>bilhões) e do PAC Mobilidade Médias Cidades (R$ 8 bilhões). Aos R$ 90 bilhões</p><p>somam-se, ainda, os R$ 50 bilhões anunciados recentemente pela presidenta da</p><p>República, em junho de 2013.</p><p>O Brasil passa, assim, por um dos maiores ciclos de investimento de mobilidade</p><p>da história, sendo essencial que a alocação desses recursos seja orientada por</p><p>diretrizes rígidas que priorizem outras formas de deslocamento que não o carro,</p><p>refletidas, localmente, em um planejamento que trace um inovador perfil de mobilidade</p><p>para a cidade. Caso contrário, veremos os recursos serem investidos na manutenção</p><p>de um status quo que privilegia o carro e acaba por sujeitar mais de 60% da população</p><p>dos centros urbanos a um sistema de transporte coletivo colapsado. Superadas essas</p><p>questões, não se pode negar, no entanto, que a PNMU tem fragilidades estruturais</p><p>capazes de comprometer a sua efetividade e que merecem atenção. Uma delas é a</p><p>falta de previsão sobre qual a forma jurídica que o Plano de Mobilidade Urbana deve</p><p>ter uma vez elaborado. Na prática, ele pode adotar desde a forma de lei ordinária (na</p><p>melhor das hipóteses), até mesmo uma simples apresentação de slides ou de rápida</p><p>visualização, que não guarda nenhuma força vinculante capaz de garantir aos</p><p>cidadãos que o plano será observado pelo poder público. Essa situação é</p><p>especialmente preocupante se considerarmos o hábito dos governantes brasileiros de</p><p>abandonar os planos feitos ou iniciados na gestão anterior.</p><p>Outra fragilidade é a ausência de explicitação sobre como se dará o processo</p><p>de avaliação dos Planos que serão apresentados em 2015, processo sobre o qual,</p><p>inclusive, muito pouco tem se falado até o momento. Essa avaliação é imprescindível</p><p>para garantir que as disposições da PNMU resultem em um instrumento de</p><p>21</p><p>planejamento com metas de curto, médio e longo prazos para a mobilidade. Essas</p><p>metas devem atendar às especificidades de cada cidade, apontadas não só pelos</p><p>estudos que deverão embasá-lo, mas também pela ampla participação e consulta</p><p>popular. Ou seja, sem um rigoroso processo de avaliação, veremos a história se repetir</p><p>e, tal qual ocorreu com os Planos Diretores, teremos documentos pré-formatados, que</p><p>podem até ser implantados, mas que não necessariamente trazem em si</p><p>determinações capazes de transformar a mobilidade e a qualidade de vida dos</p><p>cidadãos.</p><p>Por fim, faltou à Lei em análise uma maior rigidez no momento de estabelecer</p><p>o papel do governo federal em todo esse processo. Apesar de ser inegável que o</p><p>regulamento da mobilidade é de competência de cada município, a ausência de uma</p><p>cultura de planejamento no país levou à crítica situação de escassez de mão de obra.</p><p>Cabe ao governo federal, nesse ponto, promover essa capacitação e destinar uma</p><p>fatia do enorme bolo de recursos que hoje estão disponibilizados à mobilidade para a</p><p>elaboração e capacitação dos profissionais que realizarão a complexa tarefa de reunir,</p><p>em um documento, os anseios da população para a mobilidade da cidade. Sem essa</p><p>capacitação, corremos o risco de não conseguirmos entregar nem o PMU, nem os</p><p>projetos das obras a serem realizadas, essenciais para que o montante hoje</p><p>disponibilizado para a mobilidade não seja alocado em outro setor pela simples falta</p><p>de propostas para sua destinação.</p><p>Percebe-se, assim, que, apesar de importante, o sucesso da Política Nacional</p><p>dependerá de outras iniciativas do governo federal e do próprio Ministério das</p><p>Cidades, que perpassam a necessária regulamentação da Lei n.12.587/12. Num país</p><p>em que se tem, nas palavras de Ermínia Maricato, “obra sem plano e plano sem obra”,</p><p>seria ingenuidade acreditar que a elaboração de um plano per se seja capaz de mudar</p><p>a realidade catastrófica da mobilidade brasileira. De fato, não o é. Mas o cenário</p><p>composto pela disponibilização de recursos e a existência de diretrizes rígidas</p><p>voltadas à melhoria da mobilidade gera uma perspectiva promissora que não pode ser</p><p>desperdiçada: a de que, pela primeira vez, os municípios e gestores têm a obrigação</p><p>de discutir com a população qual cidade querem ter no futuro.</p><p>22</p><p>É PRECISO REVERTER A LÓGICA DAS CIDADES</p><p>A construção de uma cidade diferente da que temos hoje, mais inclusiva e</p><p>socialmente justa, perpassa necessariamente a adoção de duas medidas</p><p>complementares: a melhoria do transporte público coletivo e a revisão dos benefícios</p><p>concedidos, de forma direta e indireta, ao usuário do transporte individual motorizado,</p><p>seja durante a produção, comercialização ou uso do carro. A relação entre os</p><p>subsídios e incentivos dados ao transporte individual e ao coletivo é da ordem de oito</p><p>para um, ou seja, para cada R$ 8,00 concedidos ao transporte individual, R$ 1,00 é</p><p>direcionado ao transporte coletivo (Vasconcellos, 2012b). Essa tendência do governo</p><p>parece ignorar que, nos grandes centros urbanos, somente 35% das viagens urbanas</p><p>motorizadas são realizadas por esse meio, contra 64% realizadas por ônibus e metrô</p><p>(Ipea, 2011, p.17). Apesar disso, estima-se que 80% do leito carroçável seja ocupado</p><p>pelos carros. Não é difícil concluir, assim, que os congestionamentos existem porque</p><p>nossas ruas têm uma capacidade limitada de acomodar veículos e, infelizmente, o</p><p>sistema atual permite que uma menor parte da população ocupe a maior parte da</p><p>estrutura viária existente.</p><p>No tocante aos subsídios provenientes de incentivos tributários, eles somam,</p><p>anualmente, montante que varia entre R$ 8,5 e R$ 14 bilhões. Esse valor corresponde</p><p>à renúncia fiscal operada pelo governo federal quando decidiu reduzir o Imposto sobre</p><p>Produtos Industrializados (IPI) para aquisição de veículos de baixa cilindrada e a</p><p>Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CideCombustíveis) – reduzida a</p><p>partir de 2008 até ter sua alíquota zerada em junho de 2012. No caso da Cide, tributo</p><p>que incide sobre álcool, petróleo, gás natural e seus derivados e que tinha parte de</p><p>sua verba destinada a investimentos em infraestrutura de transporte, a renúncia é</p><p>ainda mais grave. Isso porque representa não só um incentivo ao uso do carro – vez</p><p>que a redução da alíquota foi usada como manobra para evitar a alta do preço da</p><p>gasolina, o que oneraria mais os usuários frequentes do transporte individual –, mas</p><p>também o fim de uma fonte constante de recursos ao setor de transportes. Além dos</p><p>incentivos fiscais, os usuários do transporte individual recebem um benefício ainda</p><p>mais importante ao lhes ser disponibilizado, a um custo extremamente baixo (o do</p><p>Imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA)), o uso de um dos bens</p><p>mais essenciais da cidade: as ruas. Se considerarmos que o valor médio do IPVA no</p><p>Brasil é de R$ 850,00 (ou R$ 2,3 por dia), cada motorista paga somente R$ 1,15 para</p><p>circular e utilizar livremente as ruas da cidade, pois apenas metade da arrecadação é</p><p>23</p><p>destinada ao município. Percebe-se, facilmente, que esse valor é muito inferior ao</p><p>gasto por aqueles que dependem do transporte coletivo para realizar seus</p><p>deslocamentos (Vasconcellos, 2012b). As vias possuem a função essencial de abrigar</p><p>grande parte dos deslocamentos, permitindo às pessoas o acesso aos serviços</p><p>indispensáveis que a cidade guarda. O espaço que hoje se destina ao</p><p>estacionamento, gratuito ou não (zona azul), de carros em áreas públicas poderia ser</p><p>mais bem utilizado se convertido para a instalação de espaços de convivência (mais</p><p>conhecidos como parklets), ciclovias, ciclofaixas ou mesmo para o alargamento das</p><p>insuficientes calçadas brasileiras.</p><p>Mesmo que pudéssemos imaginar que a cobrança feita para estacionamento</p><p>em via pública fosse majorada (no caso da zona azul) ou instituída (nas regiões em</p><p>que nem cobrança há), ainda assim ela não compensaria os prejuízos que a ocupação</p><p>do espaço público pelo carro gera para a sociedade em geral. Se, por exemplo, a</p><p>cidade de São Paulo instituísse cobrança de R$ 8,00/ dia nas vias onde atualmente</p><p>não existe cobrança alguma – menos de um quarto dos R$ 35,00 que, em média, são</p><p>cobrados pelas redes privadas de estacionamento na capital –, teríamos uma verba</p><p>anual de mais de R$ 2 bilhões, apenas 5% do valor perdido, em produção e consumo,</p><p>pela cidade nos congestionamentos (R$ 40 bilhões), sem se considerar, ainda, todos</p><p>os outros custos já elencados acima. Sob esse viés, não faz sentido permitir que os</p><p>usuários do carro estacionem livremente nas vias da cidade, tornando estático um</p><p>espaço que poderia ser usado para a melhoria da qualidade de vida da população. E,</p><p>caso se pergunte para onde iriam os carros, devemos nos valer do que disse o ex-</p><p>prefeito de Bogotá, Enrique Peñalosa, quando colocado diante da mesma questão: “o</p><p>primeiro artigo de todas as constituições democráticas, inclusive a brasileira, diz que</p><p>todos são iguais perante a lei. Se isso é verdade, um ônibus com 100 passageiros tem</p><p>direito a 100 vezes mais espaço nas ruas que um carro com uma pessoa”.</p><p>A eliminação dos estacionamentos, sobretudo na área central, é só uma das</p><p>possíveis mudanças que podem ser realizadas pelos gestores. Outras perpassam a</p><p>retomada da cobrança da Cide, a instituição da taxa de congestionamento e o</p><p>estabelecimento de áreas livres da circulação de carros. Essas medidas, em conjunto</p><p>ou separadamente, são essenciais para se internalizar os custos e as externalidades</p><p>negativas (abordadas no início deste artigo) geradas pelo uso excessivo do automóvel</p><p>e retardar sua expansão ilimitada sobre o tecido urbano. Assim, está claro que é</p><p>24</p><p>preciso coragem para alterar o atual estado das coisas nas grandes e médias cidades</p><p>do mundo. Como foi dito no livro infantojuvenil Harry</p><p>Potter, “chegou a hora de escolhermos entre o que é certo e o que é fácil” (Rowling,</p><p>2003). Só isso dará conta da dimensão de ruptura que precisa ser feita com a</p><p>sociedade industrial e o mundo do automóvel que nos governa desde o começo do</p><p>século XX.</p><p>UMA CIDADE PARA TODOS</p><p>Como em toda mudança profunda de paradigma, a implantação de medidas</p><p>que restrinjam ou desestimulem, direta ou indiretamente, o uso do carro terá que</p><p>vencer certa resistência por parte de alguns cidadãos. Sobretudo porque a melhoria</p><p>geral do transporte coletivo – que facilitará a restrição ao carro – não virá por completo</p><p>no curto prazo. Essas medidas, no entanto, são tão necessárias quanto a realização</p><p>de uma verdadeira revolução no modo como as políticas públicas são pensadas e</p><p>implementadas no Brasil.</p><p>Não faz sentido que a elaboração de políticas para melhorar a mobilidades nas</p><p>cidades seja pensada apenas no âmbito do Ministério das Cidades, enquanto os</p><p>Ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Transportes e Minas e Energia</p><p>desenvolvem linhas de ação que, na maioria das vezes, contribuem para agravar o</p><p>problema. Isso vale para as mencionadas políticas de desoneração tributária que, ao</p><p>reduzirem o preço do carro, como afirma Ricardo Abramovay (2011), esvaziam o pátio</p><p>das montadoras, mas contribuem para aumentar os índices dos congestionamentos.</p><p>Sem que se mude a forma como se dão os planejamentos e planos, feitos de portas</p><p>fechadas e de forma isolada, sem considerar as outras áreas que influenciam a</p><p>questão (como é o caso do uso do solo para a mobilidade), continuaremos a gastar</p><p>tempo e dinheiro com iniciativas que já nascem fadadas ao fracasso ou à irrelevância.</p><p>Não existem soluções mágicas para problemas complexos. Mas hoje, diferente do</p><p>vivido há cem anos com o problema decorrente do uso do cavalo como meio de</p><p>transporte, não dependemos mais de uma invenção tecnológica para sair dos</p><p>congestionamentos.</p><p>25</p><p>As soluções são conhecidas e variadas, algumas mais simples que outras, e</p><p>envolvem a realização de um planejamento que englobe e considere todos os atores</p><p>da mobilidade e priorize os transportes não motorizados e coletivos, feito de forma</p><p>participativa e capaz de transformar efetivamente a forma como as pessoas se</p><p>deslocam pela cidade. Se não nos falta tecnologia, certo é que falta aos gestores</p><p>brasileiros força política para entender que, de fato, devolver à cidade o seu direito de</p><p>circulação e aos cidadãos o seu direito à cidade, sequestrado que foi pelo uso do</p><p>automóvel, pode sim trazer conflitos e desgastes políticos.</p><p>No entanto, o impacto da construção de uma cidade mais justa será,</p><p>inegavelmente, positivo para todos. É essa percepção que precisa ser construída e</p><p>trabalhada por todos nós.</p><p>As emissões dos gases de efeito estufa aumentaram 21,5% entre 2005 e 2010 no</p><p>setor de energia no Brasil: a fatia passou de 16% das emissões totais do país para</p><p>32%. Foi o setor que mais cresceu no período e o que tende a continuar</p><p>aumentando, dados os imensos aportes do governo federal direcionados para</p><p>viabilizar a exploração de petróleo, em especial do pré-sal, que totalizarão</p><p>aproximadamente R$ 740 bilhões até 2020. O crescimento das emissões é</p><p>agravado, ainda, pelo aumento do consumo da em detrimento ao consumo do</p><p>álcool. Apenas para que se tenha uma ideia, nos anos 2010 e 2011 houve uma</p><p>queda de 35%, ou quase seis bilhões de litros, nas vendas de etanol. De acordo</p><p>com O Estado de S. Paulo, “a expansão dos biocombustíveis seria responsável por</p><p>uma redução de 79 a 89 milhões de toneladas de gás carbônico lançadas na</p><p>atmosfera até 2020, numa contribuição de 9 a 8% da meta total de corte das</p><p>emissões a que o Governo se comprometeu em 2009. [...] Além disso, documento</p><p>publicado pelo Ministério do Meio Ambiente, no ano passado, estima que a emissão</p><p>de gás carbônico por veículos cresceria, até 2020, a uma média de 4,7% ao ano, por</p><p>conta do aumento da frota de veículos no País” (O Estado de S. Paulo, p.A12,</p><p>5.3.2012, Marta Salomon e Iuri Dantas).</p><p>Existe alguma controvérsia entre os especialistas com relação a esse ponto. Há</p><p>quem diga que, não entregue o plano em abril/2015, não há possibilidade de o</p><p>município vir a elaborá-lo, voltando a se tornar elegível para recebimento das verbas</p><p>federais. Com respeito, discordamos dessa interpretação, uma vez que o §4º do artigo</p><p>24 da Lei n.12.587/12 expressamente diz que: “Os Municípios que não tenham</p><p>elaborado o Plano de Mobilidade Urbana na data de promulgação desta Lei terão o</p><p>prazo máximo de 3 (três) anos de sua vigência para elaborá-lo. Findo o prazo, ficam</p><p>impedidos de receber recursos orçamentários federais destinados à mobilidade</p><p>urbana até que atendam à exigência desta Lei”.</p><p>26</p><p>Aqui se destaca o caso da cidade de Belo Horizonte, cujo Plano de Mobilidade</p><p>(PlanMob BH) somente em setembro/2013 ganhou força de lei (Decreto n.15.317/13),</p><p>não obstante existir desde 2010. A promulgação do Decreto é positiva, mas inegável</p><p>que, por ser um ato do Executivo e que não perpassa a Câmara dos Vereadores, não</p><p>há de ser a melhor forma jurídica a ser adotada para um instrumento que tem como</p><p>seu pilar a participação popular e o controle social. Nesse sentido, de toda a verba</p><p>que se pretende investir em mobilidade (R$ 140 bilhões, conforme mostrado</p><p>anteriormente), somente 10% dos recursos já foram alocados em empreendimentos.</p><p>O percentual significativamente baixo se dá exatamente pela falta de projetos</p><p>apresentados, conforme ressalta matéria do jornal Valor</p><p>Econômico, publicada no dia 18.10.2013, caderno A6, de autoria de Daniel Rittner e</p><p>Lucas Marchesini.</p><p>Essa questão fica ainda mais clara quando se tem em mente que,</p><p>considerando-se as médias de ocupação diária, o espaço ocupado pelo passageiro</p><p>do carro (40 m²) é 11 vezes superior ao ocupado pelo passageiro do ônibus (3,6 m²).</p><p>Se for considerada a lotação máxima do ônibus (75 passageiros), a relação vai de 11</p><p>para 40 vezes maior. Esse cálculo é feito tendo-se por base que um carro médio possui</p><p>cinco metros de comprimento e, se trafegar a 40 km/h, terá uma sombra de 15 metros.</p><p>Considerando-se que a largura da faixa é de 3 m, o carro ocupa cerca de 60 m² da</p><p>via.</p><p>Sobre esse ponto, a edição de 2012 da pesquisa “DNA Paulistano”, realizada</p><p>pelo Datafolha, surpreendeu ao trazer como resultado que a menção a passeios e</p><p>asfalto esburacados superou tópicos tradicionais, como segurança, saúde e trânsito.</p><p>Mais especificamente, a má conservação de ruas e calçadas, que vem ganhando cada</p><p>vez mais atenção na cena da mobilidade, foi o problema mais citado pelos paulistanos</p><p>(Editorial Prioridade Pedestre – Folha de S.Paulo, 2.12.2012, p.A2). Cálculo feito tendo</p><p>por base estimativa de que na Região Metropolitana de São Paulo, 40% dos</p><p>motoristas precisam estacionar o carro fora de casa, dos quais 15% (1,2 milhão de</p><p>veículos) conseguem fazê-lo em via pública, sem pagar.</p><p>27</p><p>A CIDADE QUE NÃO PARA – SÃO PAULO</p><p>A expansão periférica em São Paulo ganha impulso nos anos 1940, motivada</p><p>por dois fatores principais: o aumento do valor dos aluguéis na região mais central e</p><p>a facilitação para a aquisição de lotes em zonas até então desocupadas. O intenso</p><p>fluxo migratório que a cidade recebeu nesse período, acompanhado do</p><p>remodelamento das áreas atingidas pelo Plano de Avenidas, produziram uma grande</p><p>valorização da região central. Mesmo com o congelamento dos aluguéis, a Lei do</p><p>Inquilinato, de 1942, não foi capaz de conter a pressão, além de ter desestimulado a</p><p>construção privada de habitações. A manutenção dos valores tirou a rentabilidade dos</p><p>proprietários, que passaram a buscar alternativas, como a venda dos imóveis. Embora</p><p>a lei permitisse poucas exceções, os proprietários conseguiam na Justiça muitas</p><p>vezes a retirada dos moradores. Estima-se que 10% da população paulistana foi</p><p>despejada entre 1945 e 1948. Para os empresários, a opção mais atraente era a venda</p><p>de loteamentos distantes do centro e, na mesma época, o Estado regulou a compra</p><p>parcelada de terrenos. A construção ficava a cargo dos trabalhadores. A criação do</p><p>28</p><p>Sistema Financeiro de Habitação, em 1964, é um marco da entrada mais ativa do</p><p>Estado na produção de moradias. Porém, atendeu principalmente – e mesmo nesses</p><p>casos, insuficientemente – às classes média e alta.</p><p>A Lei de Zoneamento de 1972 é outro fator de estímulo ao crescimento</p><p>horizontal de São Paulo, com a restrição à verticalização na região central2 . Nos anos</p><p>1970 e 80, além da autoconstrução, ganha grandes dimensões o fenômeno das</p><p>favelas, devido aos sobressaltos da economia, com aumento do desemprego e</p><p>arrocho salarial.</p><p>Em São Paulo, as favelas cresceram de forma mais intensa nas periferias do</p><p>que no centro. Isso pode ser explicado por remoções mais concentradas em áreas de</p><p>maior visibilidade, mas também pela ocupação de áreas de preservação ambiental.</p><p>Isso significa que hoje um enorme contingente de pessoas precisa encarar longos</p><p>deslocamentos diariamente. O resultado é um efeito dominó, em que a superlotação</p><p>dos ônibus, trens e metrô torna mais lento o embarque e desembarque, atrasando</p><p>ainda mais a viagem; e quem pode, foge para o conforto do automóvel individual,</p><p>congestionando ainda mais as principais vias de acesso à região central. Porém, o</p><p>sistema de transportes não é apenas produto dessa lógica urbanística: é também</p><p>promotor desse modelo de espraiamento e periferização da cidade. Há relatos da</p><p>existência de propagandas de lotes à venda fazendo referência às linhas de ônibus</p><p>que passariam no local como indicação da associação entre esses dois atores”, afirma</p><p>Campos. Ao criar loteamentos em regiões mais distantes, o setor privado também</p><p>criava a necessidade de transporte para essas regiões, valorizando os terrenos vazios</p><p>ao longo do caminho. “Como resultado, o serviço de ônibus acompanhou e, de certo</p><p>modo, produziu o crescimento periférico da cidade. Esse tipo de urbanização só foi</p><p>possível pela existência de ônibus que levariam os habitantes ao centro da cidade</p><p>cotidianamente para seus trabalhos. Vantagem esta que os ônibus tinham sobre os</p><p>bondes elétricos ainda presentes na época [anos 1950] operados pela CMTC</p><p>[Companhia Metropolitana de Transporte</p><p>Coletivo]”, continua o artigo do autor. Os interesses imobiliários também são</p><p>responsabilizados pela demora na criação de linhas de metrô.</p><p>A Light, empresa proprietária das redes de bonde no início do século XX,</p><p>apresentou nos anos 1920 um plano de transportes com uma rede de metrô articulada</p><p>29</p><p>a outros meios. A proposta foi recusada pela prefeitura. Ao invés disso, nos anos 1930,</p><p>o engenheiro Prestes Maia, que mais tarde seria prefeito, deu início ao seu Plano de</p><p>Avenidas, que propunha vias com largas calçadas ao lado do espaço para veículos.</p><p>Os ônibus, com mais flexibilidade que o transporte sobre trilhos, permitiam a ocupação</p><p>de diferentes regiões da cidade. Juntamente à expansão do uso do automóvel como</p><p>símbolo de modernidade, o projeto ajudou a configurar a cidade no modelo</p><p>radiocêntrico: um centro mais adensado e caminhos radiais em direção à periferia.</p><p>Nos anos 1950, a prioridade ao automóvel se intensifica, com a abertura de vias</p><p>expressas, praticamente rodovias urbanas – caso das marginais e da Avenida 23 de</p><p>Maio. Se o ápice desse modelo é o Minhocão, inaugurado em 1970, a Ponte Estaiada,</p><p>de 2008 – na nova fronteira econômica da cidade, a região da Avenida Berrini – mostra</p><p>que a tendência seguiu até pelo menos muito recentemente. A obra é voltada</p><p>exclusivamente para carros, não prevendo a presença de ônibus, bicicletas ou</p><p>pedestres. O Metrô</p><p>só começou a ser implementado em São Paulo no fim dos anos</p><p>1960, com o início da operação, em 1974, da linha Norte-Sul. O projeto inicial previa</p><p>a entrega de 70 quilômetros de linhas até 1978. Porém, os planos seriam radicalmente</p><p>alterados nos anos seguintes. Ao invés da ideia de uma rede, investiu-se na extensão</p><p>da linha LesteOeste para a zona leste, então atendida precariamente pelos trens de</p><p>subúrbio. A decisão segue a política de habitação, com a criação de conjuntos</p><p>habitacionais no bairro de Itaquera nos anos 1980. Atualmente, São Paulo conta com</p><p>apenas 78,4 quilômetros de linhas.</p><p>Enquanto a cidade se espalhava horizontalmente, com a criação de novas</p><p>periferias, a região central passou por um processo de esvaziamento. O fenômeno</p><p>tem diversas explicações, várias das quais passam pela degradação da região –</p><p>devido a obras viárias, como o Minhocão –, à falta de incentivo para a preservação de</p><p>edifícios tombados e à maior presença da população em situação de rua no centro.</p><p>Pesa também a consolidação de bairros de classe média em outras regiões e a maior</p><p>proporção de moradia de aluguel na região central, dando maior rotatividade à</p><p>moradia. Entre os censos de 1980 e de 2000, se percebe uma queda de 30% no</p><p>número de habitantes da área da Subprefeitura da Sé, que engloba os distritos Sé,</p><p>República, Bela Vista, Bom Retiro, Consolação, Cambuci, Santa Cecília e Liberdade.</p><p>Em termos absolutos, são 179 mil moradores a menos na região. A pesquisa Origem-</p><p>Destino (OD) de 2007 indicava que a queda continuava, com dados da Fundação</p><p>Seade mostrando uma mudança nessa tendência somente a partir de 2009 – período</p><p>30</p><p>que corresponde à maior expansão do setor imobiliário e de novos lançamentos</p><p>residenciais. Embora, na soma de seus distritos, o centro ainda seja a área da cidade</p><p>com maior concentração de empregos, também nesse aspecto houve queda, em parte</p><p>pela abertura de novos centros empresariais. A pesquisa OD de 1997 apresentava</p><p>três distritos do centro entre os quatro que mais ofertavam vagas de trabalho:</p><p>República, Sé, Itaim Bibi e Bela Vista. Em 2007, o Itaim assumiu a dianteira, e o Jardim</p><p>Paulista e a Vila Mariana passaram a figurar entre os quatro distritos com mais</p><p>empregos. Os números apontam a constante migração do “centro”: do chamado</p><p>Centro Velho, mais próximo à Sé, para o Centro Novo, área da Praça da República;</p><p>para a região da Avenida Paulista nos anos 1990 e para a Nova Faria Lima e as</p><p>proximidades da Marginal Pinheiros e Berrini nos anos 2000. Esses ciclos de</p><p>construção e abandono são uma das marcas da lógica urbana de São Paulo e ajudam</p><p>a entender a segregação socioespacial da cidade. “Como lembra Flavio Villaça, o</p><p>deslocamento dos centros urbanos tradicionais, nas cidades brasileiras tem a ver com</p><p>a popularização desses mesmos centros (…). Capitais, empresas e até mesmo órgãos</p><p>públicos participam da busca (leia- -se produção) de um espaço que confira distinção,</p><p>isto é, que não seja tão acessível por meio do transporte público”.</p><p>O quadro se torna mais complexo quando se toma em consideração que cerca</p><p>de 45% da população da Grande São Paulo está fora da capital, em outros municípios</p><p>da região metropolitana (RMSP) – mas também se deslocando para acessar oferta de</p><p>trabalho, estudos e outros serviços. Dentro de cada município, cabe à prefeitura operar</p><p>o sistema de ônibus. A RMSP conta ainda com ônibus intermunicipais, operados pela</p><p>Empresa Metropolitana de Transporte Urbano (EMTU), com os trens da Companhia</p><p>Paulista de Trens Metropolitanos (CPMT) e com o Metrô – todos de responsabilidade</p><p>do governo estadual. Essa multiplicidade de agentes, com pouca articulação entre</p><p>eles, tumultua a governança do sistema. Deslocamentos e impactos DEVAGAR,</p><p>QUASE PARANDO Os congestionamentos poderiam ser indicados como patrimônio</p><p>imaterial de São Paulo. De tão presentes no cotidiano, são também um aspecto</p><p>cultural definidor da cidade, das conversas informais a uma estação de rádio dedicada</p><p>exclusivamente ao tema. As sucessivas quebras dos recordes de congestionamentos</p><p>e a queda na velocidade média mostram uma tendência constante, que talvez comece</p><p>a ser revertida, de maior estrangulamento no trânsito da cidade. Segundo a pesquisa</p><p>Mobilidade Urbana, da Rede Nossa São Paulo, o trânsito está entre as áreas que o</p><p>paulistano aponta como mais problemáticas. Em 2015, ficou em quinto lugar, tendo</p><p>31</p><p>sido mencionado por 29% dos entrevistados. Em anos anteriores, estava à frente,</p><p>ocupando o quarto lugar em 2013 e 2014 e o terceiro lugar em 2008. Os pesquisadores</p><p>afirmam que essa variação pode se dever mais à entrada de outras preocupações,</p><p>como o desemprego (em relação a 2013 e 2014), que a uma melhora na percepção</p><p>do trânsito. A última Pesquisa de Monitoração da Fluidez disponível, elaborada em</p><p>2013 pela CET, mostra que no pico da manhã (das 7h às 10h) a velocidade média em</p><p>percursos no sentido bairro-centro era de 18,4 km/h, uma queda de 10,7% em relação</p><p>a 2008, quando era de 20,6 km/h. A volta para casa é ainda mais lenta: 14,1 km/h,</p><p>sendo que em 2008 era 18,6 km/h. Os dados mais recentes da Prefeitura sugerem</p><p>uma redução de 6% nos congestionamentos entre 2014 e 2015, passando de 124,4</p><p>quilômetros para 104,8 quilômetros no pico da tarde. A melhora está ligada, segundo</p><p>a administração, à redução de acidentes ocasionada pela redução da velocidade</p><p>máxima em diversas vias de São Paulo, enquanto críticos atribuem à crise econômica.</p><p>Porém, apenas cinco dias antes do anúncio de redução dos congestionamentos, outro</p><p>recorde havia sido quebrado. Segundo a Rádio SulAmérica Trânsito/Maplink, em 11</p><p>de setembro de 2015 São Paulo ultrapassou a marca de mil quilômetros de vias</p><p>congestionadas. Nas medições da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), o</p><p>maior índice era de 344 quilômetros de lentidão, atingidos na noite de 23 maio de</p><p>2014. 14,1km/h É A VELOCIDADE MÉDIA DESENVOLVIDA NA VOLTA PARA CASA</p><p>PELO PAULISTANO</p><p>A diferença se deve à abrangência e método de coleta das informações. A CET</p><p>monitora 175 vias, somando 868 quilômetros, com observações feitas por funcionários</p><p>em prédios e em veículos e por câmeras em vias. O Maplink, por sua vez, utiliza</p><p>informações enviadas por GPS de veículos, cobrindo toda a cidade. O impacto do</p><p>trânsito na economia paulistana foi calculado em R$ 40 bilhões em 2012, por um</p><p>estudo da Fundação Getúlio Vargas.</p><p>O valor compreende os custos de oportunidade – o tempo perdido pela</p><p>população em congestionamentos – e os gastos extras com combustíveis, com</p><p>problemas de saúde gerados pela emissão de poluentes e com o transporte de cargas.</p><p>Outra pesquisa, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da</p><p>Universidade de São Paulo (FEA-USP), estima que os ganhos de produtividade</p><p>trazidos por uma redução de meia hora no tempo de deslocamento em São Paulo</p><p>teriam um impacto de R$ 156 bilhões no Produto Interno Bruto (PIB) do país.</p><p>32</p><p>Em 2015, a capital paulista bateu a marca de oito milhões de veículos, entre</p><p>carros, motos, caminhões e ônibus, segundo estimativa do portal G17 com base em</p><p>dados do Departamento Estadual de Trânsito (Detran). Apertados nos 17 mil</p><p>quilômetros de vias da cidade, os carros que se multiplicaram com os incentivos à</p><p>indústria automobilística podem ter sido um tiro na culatra da cultura do automóvel:</p><p>espalhou-se a ideia de que obras de expansão do viário não seriam capazes de</p><p>acompanhar a demanda. “Tentar curar o congestionamento adicionando mais</p><p>capacidade de tráfego é como tentar curar a obesidade afrouxando o cinto” é uma</p><p>frase que ganha cada vez mais popularidade.</p><p>Um dos exemplos é o alargamento da Marginal Tietê, realizado pelo governo</p><p>estadual em 2010, ao custo de R$ 1,75 bilhão. Nos primeiros momentos após a</p><p>inauguração, houve alívio no trânsito da via. Porém, em apenas três anos, a lentidão</p><p>média voltou aos patamares anteriores. Para uma ampla</p>

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