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<p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA</p><p>Cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>Neide Araújo Castilho Teno</p><p>Ivo Di Camargo Junior</p><p>(Organizadores)</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA</p><p>Cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>Copyright © dos autores</p><p>Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida</p><p>ou transmitida ou arquivada, desde que levados em conta os direitos dos</p><p>autores.</p><p>Ivo Di Camargo Junior; Neide Araújo Castilho Teno [organizadores].</p><p>Ensino, discurso e teoria: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>São Paulo, Mentes Abertas, 2024, 165 p.</p><p>ISBN: 978-65-982457-7-1</p><p>1. Estudos Linguísticos. 2. Contemporaneidade. 3. Estudos. 4. Ensino. 5.</p><p>Teoria. I. Título.</p><p>CDD 410</p><p>Capa feita a partir do cartaz de Alexander Rodchenko (1925).</p><p>Diagramação: Maristela Zeviani.</p><p>A Editora Mentes Abertas divulga os trabalhos acadêmicos presentes nessa obra</p><p>e não se responsabiliza de maneira alguma por qualquer tipo de plágio, cópia</p><p>ou citação indevida por parte de qualquer integrante deste livro e condena</p><p>veementemente esta prática. Confiamos na idoneidade moral e intelectual de</p><p>nossos autores. Portanto, qualquer responsabilidade legal neste quesito é de</p><p>única e integral responsabilidade do autor.</p><p>Conselho editorial</p><p>Profa. Dra. Cristiane Navarrete Tolomei (UFMA, Brasil)</p><p>Prof. Dr. Fábio Marques de Souza (UEPB, Brasil)</p><p>Profa. Dra. María Isabel Pozzo (IRICE-Conicet-UNR, Argentina)</p><p>Comitê científico</p><p>Profa. Dra. Eva Paulino Bueno (St. Mary´s University, Estados Unidos)</p><p>Prof. Dr. Helder Neves de Albuquerque (PPGRN - UFCG, Brasil)</p><p>Prof. Dr. José Alberto Miranda Poza (UFPE, Brasil)</p><p>Prof. Dr. José Veranildo Lopes da Costa Junior (UFPB, Brasil)</p><p>Prof. Dr. Maged Talaat Mohamed Ahmed Elgebaly (Aswan University, Egito)</p><p>Profa. Dra. Mona Mohamad Hawi (USP, Brasil)</p><p>www.mentesabertas.com.br</p><p>https://mentesabertas.minhalojanouol.com.br/ A Mentes Abertas é filiada à ABEC</p><p>SUMÁRIO</p><p>PREFÁCIO ............................................................................... 7</p><p>Dr. Ronny Diogenes</p><p>VARIANTES LINGUÍSTICAS UTILIZADAS NO</p><p>PORTUGUÊS FALADO EM DOURADOS/MS</p><p>Um estudo sociolinguístico ................................................ 11</p><p>Elza Sabino da Silva Bueno</p><p>Neide Araújo Castilho Teno</p><p>Sandra Espíndola</p><p>GÊNEROS ACADÊMICOS</p><p>Recorrência da modalidade oral nos cursos de graduação</p><p>.......................................................................................................... 37</p><p>Ana Paula Faustino de Oliveira</p><p>Edineia Leite dos Santos Oliveira</p><p>SENTIDOS EM OPOSIÇÃO</p><p>Limiares dos significados à luz da teoria semiótica ....... 51</p><p>Elaine Cristina dos Reis Rosenacker</p><p>Rita de Cássia A Pacheco Limberti</p><p>O MEDO EM TEMPOS DA COVID-19</p><p>Uma retrospectiva à luz da psicanálise e de alinhavos</p><p>poéticos ........................................................................................... 63</p><p>Adriana Lúcia de Escobar Chaves de Barros</p><p>Ednéia Albino Nunes Cerchiari</p><p>TEXTOS MULTIMODAIS PARA ALÉM DA</p><p>LINGUAGEM VERBAL</p><p>Uma perspectiva de leitura ................................................. 79</p><p>Léia Bernal Sanches Correia</p><p>Sones Lei Domingues Cintra</p><p>A DIGLOSSIA E O BILINGUISMO E O PROCESSO DE</p><p>EDUCAÇÃO SUPERIOR DE ALUNOS ÍNDIOS .................. 91</p><p>Uilian Mendes da Costa</p><p>Neide Araújo Castilho Teno</p><p>TEORIAS LINGUÍSTICAS E AS CONCEPÇÕES QUE A</p><p>ELAS SE RELACIONAM</p><p>Uma apreciação dos métodos ........................................... 107</p><p>Ivo Di Camargo Junior</p><p>Neide Araújo Castilho Teno</p><p>ESTUDO DO LÉXICO AFRICANO EM</p><p>COMUNIDADES AFRO-BRASILEIRAS DE MATO</p><p>GROSSO ...................................................................................... 129</p><p>Antônio Carlos Santana de Souza</p><p>Cristiane Schmidt</p><p>Maria Elaine Vila de Pinho</p><p>POSFÁCIO</p><p>Inovações destacam desafios e oportunidades na</p><p>integração de novas tecnologias digitais na aliança com o</p><p>ensino formal ............................................................................... 155</p><p>Juliana Tófani de Sousa</p><p>SOBRE OS ORGANIZADORES ................................... 1645</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>7</p><p>PREFÁCIO</p><p>O Ubuntu nos ensina a não nos sentir ameaçados pelo bem que há</p><p>nos outros. Devemos buscá-lo e incentivar as pessoas a brilhar.</p><p>Dessa forma, estimularemos o que há de melhor nos outros e em</p><p>nós mesmos.</p><p>Mungi Ngomane (2022)</p><p>Na trama intricada da existência humana, emerge a</p><p>filosofia ubuntu, um chamado ancestral que ecoa das</p><p>profundezas das culturas africanas para nos recordar da</p><p>essência da nossa humanidade. "Eu sou porque nós somos", essa</p><p>frase sublinha a interconexão vital entre os indivíduos. Ou seja,</p><p>não há o eu sem o outro (Volóchinov, 2019). Neste princípio,</p><p>vislumbramos uma harmonia entre as ideias ubuntu e as</p><p>concepções marxistas de Bakhtin e seu círculo, que afirmam que</p><p>somos incompletos sem o outro. Engels (1880), trouxe uma</p><p>reflexão que estrutura o pensamento de Bakhtin, ele afirmou</p><p>que sem senhor não há escravo e sem escravo não há senhor</p><p>(Engels, 1880).</p><p>É nessa teia de conexões e interdependências que as línguas</p><p>surgem, se desenvolvem e desempenham um papel central na</p><p>interação humana. Elas não são apenas veículos de</p><p>comunicação, mas portais para compreendermos e nos</p><p>conectarmos uns com os outros. A partir dessa visão, no</p><p>contexto educacional, do ensino e aprendizagem de línguas,</p><p>emergem implicações profundas. Como Bakhtin (2010)</p><p>argumenta, o ato responsável exige uma conexão intrínseca</p><p>entre eu e o outro, uma jornada que engloba alma, mente e corpo.</p><p>Nesse caminho, a educação se ergue como um farol, guiando-</p><p>nos na reflexão sobre nossas ações e seu impacto na sociedade.</p><p>Este movimento é essencial para a realização do ato</p><p>responsável, pois no momento que as práticas educativas nos</p><p>levam a olhar para o próximo de forma empática, podemos</p><p>assumir a responsabilidade perante ele (Volóchinov, 2018).</p><p>Bakhtin (2010) defendia que o ato responsável não é apenas uma</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>8</p><p>resposta ética, mas uma postura crítica diante da vida, uma</p><p>relação dialógica que busca ativamente a transformação da</p><p>realidade.</p><p>O diálogo, como destaca Bakhtin (2011), é a essência da</p><p>vida humana. Na escola, ele se manifesta, em todas as etapas,</p><p>mas sobretudo na interação entre professores e alunos ele</p><p>encontra um espaço fértil para a construção de identidades e</p><p>convicções. Segundo Bakhtin (2011) esse diálogo envolve</p><p>“interrogar, ouvir, responder, concordar, etc. Nesse diálogo</p><p>o homem participa inteiro e com toda a vida: com os olhos,</p><p>os lábios, as mãos, a alma, o espírito, todo o corpo, os atos.</p><p>Aplica-se totalmente na palavra, e essa palavra entra no</p><p>tecido dialógico da vida humana, no simpósio universal” (p.</p><p>348).</p><p>Nesse contexto, a diversidade linguística e cultural emerge</p><p>como uma força vital, enriquecendo o tecido da sociedade.</p><p>Línguas originárias, imigração e de fronteiras constituem</p><p>marcas da diversidade humana, que devem ser valorizadas e</p><p>celebradas. Sendo assim, essas línguas dos outros devem ocupar</p><p>um espaço privilegiado na educação. Isso se dá, pois no diálogo</p><p>com o outro, confrontamo-nos com preconceitos e estereótipos</p><p>que precisam ser desafiados e superados.</p><p>Há algum tempo, houve a tentativa de extinguir o espanhol</p><p>do currículo do ensino médio. Isso nos faz refletir sobre a razão</p><p>de ocultar das escolas brasileiras a segunda língua mais falada</p><p>na América Latina. Qual o medo que as classes dominantes têm</p><p>dessa língua? Por que nos apartar do outro latino-americano que</p><p>é hispanófono? Ao nos aproximarmos dessas pessoas, que estão</p><p>bem próximas, conhecendo suas línguas, poderemos perceber</p><p>tudo o que</p><p>Nesse contexto podemos encontrar alunos oriundos das</p><p>diferentes localidades do centro-oeste que apresentam uma</p><p>formação acadêmica abrangente, passando por diferentes</p><p>disciplinas e práticas pedagógicas.</p><p>Desse contexto selecionamos os sujeitos do estudo,</p><p>acadêmicos dos cursos de graduação da UEMS/MS, para</p><p>identificar quais gêneros textuais orais são mais utilizados na</p><p>academia pelos graduandos. Como instrumento utilizamos um</p><p>questionário online utilizando o no Google Forms, contendo três</p><p>perguntas abertas e uma de múltipla escolha para seleção do</p><p>corpus de análise.</p><p>Para organização dos dados recorremos a análise de</p><p>conteúdo de Bardin ( 2016 ) uma técnica que permite</p><p>sistemátizar e descrever os dados , a partir do conteúdo das</p><p>mensagens incluindo ‘’inferência de conhecimentos relativos às</p><p>condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas</p><p>mensagens’’ (Bardin, 2016, p. 47).</p><p>Essa tecnica possibilida organizar os dados e agrupa-los em</p><p>categorias definidas por meio dos pressupostos utilizados por</p><p>Bardin (2016). Assim , apos a pré analise, exploracão do material</p><p>e tratamento dos dados elegemos quatro categorias :</p><p>compreensão acerca dos gêneros orais, gêneros mais</p><p>recorrentes, dificuldade acerca dos gêneros acadêmicos,</p><p>dominio e apropriacão do gênero academico oral. O recorte que</p><p>realizamos para esta escrita restringiu aos generos mais</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>43</p><p>recorrentes para evidenciar as nomeações atribuídas aos</p><p>gêneros orais.</p><p>Para análise dos dados perpassamos por dois momentos:</p><p>utilizamos as categorias oriundas do método de Bardin (2016) e</p><p>para descrever os achados utilizamos a análise interpretativa</p><p>das mensagens frequentes considerado modelo didático. Para</p><p>fundamentar a pesquisa vinculamos aos Pressupostos teóricos</p><p>estudiosos na perspectiva da Linguística Aplicada, pois</p><p>realizam reflexões pertinentes aos Gêneros textuais orais e</p><p>escritos como: Bezerra (2012), Marcuschi (2001), e pesquisadores</p><p>que contribuem com discussões no ensino-aprendizagem de</p><p>gêneros acadêmicos e formação docente para a produção de</p><p>textos orais ou escritos de interacionismo social: Schneuwly;</p><p>Dolz (2006), Lousada (2014), , entre outros que apresentam</p><p>trabalhos com os gêneros orais em diferentes contextos.</p><p>Coleta de Dados /Análises dos dados</p><p>Esta etapa consistiu em coletar os dados e identificar quais</p><p>gêneros textuais orais são mais recorrentes na academia pelos</p><p>graduandos, primeiro para responder a essa inquietação</p><p>elaboramos quatro perguntas disponibilizadas no Google Forms</p><p>para os graduandos que elencamos nesta seção:</p><p>1) Como acadêmico você sabe diferenciar os gêneros</p><p>acadêmicos orais dos escritos?</p><p>Justifique a sua resposta.</p><p>2) No cotidiano oralizamos ou escrevemos por meio dos</p><p>gêneros. Na Universidade não é diferente, em seu curso</p><p>de Gradação qual é o gênero acadêmico mais</p><p>recorrente?</p><p>(A) Seminário (B) Arguição (C) Conferência (D) Debate</p><p>Regrado (E) Ensaios</p><p>3) Ao ingressar na Universidade você apresentou</p><p>dificuldade em conhecer os gêneros acadêmicos?</p><p>Justifique a sua resposta</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>44</p><p>4) Para o seu curso de graduação você apresenta domínio</p><p>e apropriação de algum gênero acadêmico oral? Cite</p><p>qual.</p><p>A Análise de Dados para o estudo recorreu à análise do</p><p>conteúdo de Bardin4 (2016) que oportuniza a descrição dos</p><p>dados a partir da recepção de produção e recepção. A estudiosa</p><p>indica três fases essenciais para que análise de dados aconteça</p><p>que são:</p><p>• Pré-Análise</p><p>• Exploração do Material</p><p>• Tratamento para os resultados: inferência e</p><p>interpretação</p><p>Para Bardin (2011) a Análise do Conteúdo busca</p><p>compreender ambos os contextos, ou seja, do emissor, receptor</p><p>e o ambiente inserido no ato do enunciado. Com isso, ocorre</p><p>uma aproximação do interacionismo sociodiscursivo com a</p><p>análise do conteúdo, pois não trabalham de forma isolada, mas</p><p>estuda os instrumentos de intercorrências das relações</p><p>‘’linguageiras, dos grupos sociais’’ (Bardin, 2011, p.26) e suas</p><p>interações comunicativas, cabíveis de interpretação.</p><p>No ponto de vista de Bronckart (2008), as competências que</p><p>adquirimos com a linguagem autorizam realizarmos atividades</p><p>coletivas, nesse sentido que conferimos importância aos</p><p>aspectos ligados a linguagem como organizadora no papel dos</p><p>sujeitos sociais. Este estudioso busca nos processos psicológicos</p><p>explicações para compreender a problemática, que envolve o</p><p>Interacionismo Sociodiscursivo (ISD). As teorias filosóficas</p><p>advogam que “a linguagem só existe em práticas, ou jogo de</p><p>linguagem, são heterogêneas, diversas e estão em permanente</p><p>transformação” (Bronckart ,2008, p. 16).</p><p>O ISD com bases nos estudos Bronckart ( 2008)</p><p>fundamenta-se em atividades de capacidade humanas de modo</p><p>4 [...] a análise do conteúdo trabalha a fala quer dizer, a prática da língua realizada por</p><p>emissores identificáveis.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>45</p><p>coletivo em especial a linguagem verbal. Sendo assim, tanto</p><p>para Análise do Conteúdo como para o ISD o ser humano tem a</p><p>capacidade de pensar por meio da linguagem, e ao verbalizar</p><p>consegue acesso ao pensamento, sendo capaz de ampliar a sua</p><p>tomada de consciência para resolver determinadas situações. A</p><p>linguagem, de acordo com Bronckart, envolve a dimensão</p><p>comunicativa, e essencial para dimencionar outras dimensoes</p><p>significativas.</p><p>O quadro a seguir apresenta algumas tomadas de</p><p>consciência dos graduandos da UEMS quando responderam o</p><p>questionário on-line:</p><p>Quadro 1 - As respostas dos graduandos no Google Forms.</p><p>Fonte : Elaborado pela estudiosa 2022.</p><p>Por meio desse dados, contendo algmas respostas dos</p><p>graduando na cor azul, a próxima etapa é Análise dos dados a</p><p>partir das categorias do Interacionismo Sociodiscursivo.</p><p>Graduando (A): Resposta com relação à pergunta 1</p><p>Sim, os gêneros orais como próprio nome diz é necessário apresentar para</p><p>outras pessoas através da fala, já a escrita seria a documentação escrita</p><p>como, por exemplo, artigo científico, resumos ou a documentação de</p><p>requisitos de software.</p><p>Graduando (B): Resposta com relação à pergunta 3</p><p>Sim, pelo fato de que no meu ensino médio não tive o contato com a</p><p>criação de artigos científicos e debates dentro da sala de aula. Em resumo,</p><p>os alunos na minha época eram poucos incentivados a sair da sua zona de</p><p>conforto e buscar as informações.</p><p>Graduando (C):</p><p>Não, pois tive uma base de ensino forte no cursinho.</p><p>Graduando (A): Resposta à pergunta 4</p><p>Sim, Seria o gênero de apresentação de seminários com uso de vídeos</p><p>criados e editados pelos membros do grupo.</p><p>Graduando (C):</p><p>Não, pois no meu curso é mais utilizada a escrita boa documentação.</p><p>Graduando (A):</p><p>Sim seminários</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>46</p><p>Análises dos dados</p><p>Nesta seção, apresentamos os resultados utilizando os</p><p>dados coletados e os procedimentos de análise detectados por</p><p>meio das respostas relacionadas dos graduandos dos cursos de</p><p>graduação da UEMS/MS. Assim, referenciamos algumas</p><p>respostas pertinentes ao objetivo deste estudo conforme as</p><p>recorrências de aparecimento e formação das categorias.</p><p>O Quadro 2 - apresenta as categorias e a codificação do material.</p><p>Categorias Codificação do material –Unidade de Contexto</p><p>Compreensão acerca</p><p>dos gêneros orais</p><p>(GA)-graduando A</p><p>Gênero oral é o que apresenta para outras pessoas, e</p><p>o escrito é uma documentação escrita. Exemplificou</p><p>com artigo científico, resumos ou a documentação de</p><p>requisitos de software</p><p>Gêneros academicos</p><p>mais recorrentes</p><p>(A) Seminário (B) Arguição (C) Conferência</p><p>(D) Debate Regrado (E) Ensaios</p><p>Dificuldade de</p><p>conhecimento</p><p>acerca dos gêneros</p><p>acadêmicos</p><p>Muita dificuldade porque não contato com a criação</p><p>de artigos científicos e debates dentro da sala de</p><p>aula. (A) Não, pois tive uma base de ensino forte no</p><p>cursinho. Graduando (C):</p><p>Dominio e</p><p>apropriacão do</p><p>gênero academico</p><p>oral</p><p>Graduando (A): Resposta à pergunta 4</p><p>Sim, Seria o gênero de apresentação de seminários</p><p>com uso de vídeos criados e editados pelos membros</p><p>do grupo.</p><p>Graduando (C): Não, pois no meu curso é mais</p><p>utilizada a escrita boa documentação.</p><p>Graduando (A): Sim seminários</p><p>Fonte : Elaborado pelas pesquisadoras 2023.</p><p>A partir do Interacionismo Sociodiscursivo (Bronckart,</p><p>2016), que organiza a compreensão por meio da linguagem foi</p><p>possivel entender o balanço das aprendizagens. Das quatro</p><p>fases apontadas (Dolz, 2016, p. 243), para este estudo foi possivel</p><p>discorrer a quarta fase que ‘’prevê uma análise posterior dos</p><p>resultados observados, de forma a confrontar o que tinha sido</p><p>previsto e o que de fato ocorreu. Nesse momento, é feito um</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>47</p><p>balanço das vantagens e limites do dispositivo didático’’, nesse</p><p>ponto averigua-se a falta de conhecimento dos graduandos</p><p>perante os gêneros acadêmicos.</p><p>A primeira categoria compreensão sobre oralidade as</p><p>narrativas dos alunos depoem para um conhecimento razoavel</p><p>acerca dos generos academicos, e num balanco geral no</p><p>cotidiano o ensino com generos academicos nao sao</p><p>mobilizados de forma a considerar como o desenvolvimento</p><p>das capacidades de linguagem dos alunos, pois « nao ter base »</p><p>faz parte de um quadro de desconhecimento, embora o</p><p>recorrentes foram indicados como generos academicos</p><p>‘’(A)Seminário (B) Arguição (C) Conferência (D) Debate</p><p>Regrado (E) Ensaios’’. Entre os mecanimos enunciativos</p><p>podemos inferir que são vozes que assumem o não conhecer</p><p>em diferentes instâncias.</p><p>Nas categorias compreensão e dificuldades observam-se</p><p>pontos de vista ora antagônicos ora pertinente o que caracteriza</p><p>ausência de envolvimento com o gênero acadêmico. Torna</p><p>necessário nesta categoria, tanto o conhecimento acerca dos</p><p>conteúdos trabalhados anteriormente, como conhecer as</p><p>práticas de ensino para pensar em uma maneira de propor</p><p>inovações com gêneros orais. Esse contrapondo foi observado</p><p>nos depoimentos dos alunos quando apontam o ensaio como</p><p>um gênero acadêmico ao lado da arguição e do debate regrado.</p><p>Isto ocorre porque explica a literatura que os estudos sobre</p><p>gêneros orais não se encontram bem definidos, o que tem</p><p>ocasionado dificuldade na compreensao dos generos. Marcuschi</p><p>(2005, p. 25 ), por exemplo, considera a “oralidade seria uma</p><p>prática social interativa para fins comunicativos que se</p><p>apresenta sob variadas formas ou gêneros textuais fundados na</p><p>realidade sonora; ela vai desde uma realização simples a mais</p><p>formal nos mais variados contextos de uso”. As ideias de</p><p>Schneuwly (apud Rojo e Schneuwly, 2006, p. (467), estão</p><p>vinculados na afinidade de junção entre os gêneros orais e</p><p>escritos, pois [...] A relação entre gêneros orais e gêneros escritos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>48</p><p>não é uma relação de dicotomia. É antes uma relação de</p><p>continuidade e de efeito mútuo’’ até porque encontram em</p><p>interdependencia um do outro , o genero oral pressupoe o</p><p>escrito.</p><p>A categoria domínio e apropriação observaram aspectos</p><p>ligados ao envolvimento participativo e adaptamos uma</p><p>compreensão de alunos que demonstram domínio a partir da</p><p>sua fala com apresentação de seminários, com uso de vídeos,</p><p>com criação de vídeos, evidenciando apropriação pelo oral e</p><p>apostando em exposições orais.</p><p>Estendemos as análises com exemplos empíricos de</p><p>gêneros apontados pelos alunos “requisitos de software,</p><p>seminários com uso de vídeos criados e editados”. Embora não</p><p>realizem descrições de vídeos e buscas na plataforma Youtube,</p><p>inferimos numa descricao prescritivo da possibilidade de se</p><p>prepararem para exposicoes orais. A mencão do ensaio tanto</p><p>pode ser para uma exposicão oral como pode ser para um texto</p><p>escrito.</p><p>Considerações finais</p><p>A carência e ou ausência de práticas educativas nos gêneros</p><p>orais foi ponto de reflexão de Ferrarezi Jr; Caralho (2018),</p><p>quando apontam que ainda existe a desconsideração e a falta de</p><p>orientação coerente para as atividades, à ausência dos trabalhos</p><p>com os textos produzidos na modalidade escrita e/ou oral, e</p><p>mais uma série de consequências oriundas dessas práticas</p><p>pautaram-se ao longo do tempo.</p><p>Mesmo assim, reiteramos que a necessidade de propostas</p><p>para sala de aula que sejam voltadas para informações que</p><p>possam ser um apoio firme no momento da produção, tendo em</p><p>vista que o propósito se que os (as) discentes tenham acesso a</p><p>informações sobre o gênero e esteja apto a produzi-lo.</p><p>Aprendizagem desse novo saber na graduação proporciona</p><p>articulações com a sua vida profissional, pois o ISD tem por base</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>49</p><p>"a capacidades de pensamentos inicialmente marcados pelo</p><p>sociocultural e pelo lingageiro’’. Pressupõe que se o aluno</p><p>tecnicamente não comprende os disposivos dos gêneros</p><p>acadêmicos pode ser falta de conhecer quais são eles.</p><p>Para tanto, evidenciamos a importância reflexões que</p><p>apontam o ensino-aprendiagem dos gêneros orais em sala de</p><p>aula, assim quando o estudante ingressar na graduação tem o</p><p>conhecimento e apropriação das suas principais caracterisitcas,</p><p>e aos poucos ter o dominio desse novo saber.</p><p>Referências</p><p>BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70,2016.</p><p>BEZERRA Benedito Gomes. Letramentos Acadêmicos na Perspectiva dos</p><p>Gêneros Textuais. Fórum Linguístico, Florianópolis, v. 9, n. 4, p. 247-258,</p><p>out./dez. 2012. Disponível em http://dx.doi.org/10.5007/1984-</p><p>8412.2012v9n4p247.</p><p>BRONCKART, Jean Paul. Atividades de linguagem, discurso e</p><p>desenvolvimento humano. Tradução Machado A. R.; Matencio, M. L. M.</p><p>Campinas: Mercado de Letras, 2006. 259 p.</p><p>BRONCKART, Jean-Paul. O agir nos discursos: das concepções teóricas às</p><p>concepções dos trabalhadores. Tradução de Anna Rachel Machado, Maria</p><p>de Lourdes Meirelles Matencio. Série II. Campinas: Mercado de Letras,</p><p>2008, 208 p. (Coleção Ideias sobre Linguagem).</p><p>BRONCKART, Jean Paul. Teorias da Linguagem. .Campinas, Mercado de</p><p>Letras,2022 (prelo).</p><p>CARVALHO, Robson Santos de; FERRAREZI JR, Celso. Oralidade na educação</p><p>básica: o que saber, como ensinar. São Paulo: Parábola, 2018.</p><p>DOLZ, Jean Paul ; SCHNEUWLY, Bernard. As Relações Oral/Escrita Nos</p><p>Gêneros Orais Formais E Públicos: O Caso Da Conferência Acadêmica.</p><p>Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, v. 6, n. 3, p. 463-493, set./dez.</p><p>2006. Disp</p><p>em:<http://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/0603/8%20art</p><p>%206%20(rojo).pdf</p><p>SCHNEUWLY, Bernard.; DOLZ, Jean Paul. Gêneros Orais E Escritos Na Escola.</p><p>Trad. e org.: R Rojo e G. S. Cordeiro. Campinas: Mercado das Letras, 2004.</p><p>LOUSADA, Eliane Gouvea. (2017) Intervenção, pesquisa e formação:</p><p>aprendizagem do trabalho educacional e desenvolvimento de</p><p>professores https://revistahorizontes.usf.edu.br/horizontes/article/view/55</p><p>9/246</p><p>MACHADO, Ana Raquel. A perspectiva interacionista sociodiscursiva de</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>50</p><p>Bronckart. In: MEURER, Jose Luiz.; BONINI, Adair; MOTTA-ROTH,</p><p>Désirée. Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial,</p><p>2005. [capítulo 11 do livro]</p><p>MARCUSCHI, Luiz Antônio. DA FALA PARA A ESCRITA: Atividades de</p><p>Retextualização. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 2005.</p><p>MARCUSCHI, Luis Antônio L. A.; DIONÍSIO, A. P. Fala e escrita. Belo</p><p>Horizonte: Autêntica, 2007.</p><p>ROJO, Roxane.; SCHNEUWLY, Bernard. AS RELAÇÕES ORAL/ESCRITA NOS</p><p>GÊNEROS ORAIS FORMAIS E PÚBLICOS: O CASO DA CONFERÊNCIA</p><p>ACADÊMICA. Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, v. 6, n. 3, p.</p><p>463-493, set./dez. 2006. Disp em: em:<http://www3.unisul.br/paginas/</p><p>ensino/pos/linguagem/0603/8%20art%206%20(rojo).pdf</p><p>Acesso em 2022.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>51</p><p>SENTIDOS EM OPOSIÇÃO</p><p>Limiares dos significados à luz da teoria semiótica</p><p>Elaine Cristina dos Reis Rosenacker1</p><p>Rita de Cássia A Pacheco Limberti²</p><p>A Semiótica, a ciência dos signos, abrange a leitura do</p><p>verbal, do não verbal e do verbal e não verbal. Ela perscruta a</p><p>significação de sujeitos e de objetos, atribuindo sentidos às</p><p>narrativas que simulam o fazer do homem no mundo. A análise</p><p>semiótica possibilita a geração de indagações e de estratégias</p><p>capazes de identificar os muitos e diversos significados</p><p>presentes na linguagem, investigando como o texto faz para</p><p>dizer aquilo que diz e como ele opera, suas configurações e sua</p><p>relação com o seu contexto de produção (Barros, 2005).</p><p>Nesta perspectiva, destacamos a corrente semiótica de</p><p>Algirdas Julien Greimas (1917-1992), linguista lituano, de forte</p><p>influência no Brasil. Esta vertente teórica, chamada semiótica</p><p>greimasiana (estudo dos signos, que representam algum</p><p>significado e sentido para o indivíduo), é fruto da linguística</p><p>estrutural e da semiótica discursiva de Ferdinand de Saussure,</p><p>que trabalhou com as dicotomias: língua e fala, sintagma e</p><p>paradigma, sincronia e diacronia, significante e significado,</p><p>associando a produção de sentidos à existência das diferenças.</p><p>Greimas propôs o trabalho com a semântica,</p><p>desenvolvendo a teoria da narratividade, que define qualquer</p><p>texto como narrativo, visto constituir-se um cenário de</p><p>transformações, onde sujeito e objeto são colocados em relação,</p><p>com estabelecimentos e rupturas de contratos múltiplos e</p><p>sucessivos (Barros, 2019).</p><p>1 Graduada em Pedagogia, mestranda do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Letras</p><p>UEMS Campo Grande. E-mail: elaine.cristina3410@gmail.com</p><p>² Docente do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Letras UEMS Campo Grande. E-</p><p>mail: rita.limberti@uems.br</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>52</p><p>Dedicado aos estudos do texto e do discurso, Greimas</p><p>formulou a teoria de oposições (quadrado semiótico),</p><p>ratificando os pressupostos empregados na linguística de</p><p>Saussure, aos quais ainda acrescenta: “Não há, na língua, nem</p><p>signos, nem significações, mas DIFERENÇAS de signos e</p><p>DIFERENÇAS de significações” (Flores, 2023, p. 133), e é este o</p><p>princípio fundamental da semiologia.</p><p>Semiótica Greimasiana</p><p>A semiótica greimasiana tem como unidade de sentido o</p><p>texto, contrastando com a linguística lexical, cuja unidade de</p><p>sentido é a frase. Sua teoria compreende que todo texto é</p><p>narrativo e que toda narratividade (princípio organizador de</p><p>qualquer discurso) é constituída de oposições. Os signos se</p><p>relacionam uns com os outros, o que faz surgir a significação.</p><p>A narratividade, na concepção greimasiana, é definida</p><p>como a passagem de um estado a outro (junção (conjunção ou</p><p>disjunção) e transformação (de um estado inicial a outro), as</p><p>quais (junção e transformação) constituem dois enunciados, que</p><p>se constroem por meio de manipulações. As manipulações</p><p>podem ocorrer: por tentação (o sujeito destinador propõe ao</p><p>sujeito destinatário a conjunção com um objeto de valor positivo</p><p>caso ele aceite o contrato proposto (realizar uma ação</p><p>(performance); por intimidação (o sujeito destinador propõe ao</p><p>sujeito destinatário a conjunção com um objeto de valor</p><p>negativo caso ele não aceite o contrato proposto (realizar uma</p><p>ação (performance); por provocação (o sujeito destinador</p><p>investe no sujeito destinatário valores negativos caso ele não</p><p>aceite o contrato proposto (realizar uma ação (performance); e</p><p>por sedução (o sujeito destinador investe no sujeito destinatário</p><p>valores positivos caso ele aceite o contrato proposto (realizar</p><p>uma ação (performance). Para realizar a performance, o sujeito</p><p>utiliza-se dos meios disponíveis e das condições necessárias, ou</p><p>seja, estabelece relações com os objetos modais por meio de</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>53</p><p>modalizações: querer, fazer, poder, saber. Essa relação que</p><p>acontece entre sujeito e objeto (ambos actantes) se dá através de</p><p>um acordo e é o que lhes confere existência (Barros, 2019).</p><p>Há dois tipos de objetos: os de valor e os modais. Os</p><p>primeiros são valores descritivos (objetos consumíveis e</p><p>tesaurizáveis, como a riqueza, ou prazeres e “estados de</p><p>alma”, como o amor); os segundos constituem-se das</p><p>modalidades do querer, dever, saber e poder fazer. Os</p><p>prazeres e “estados de alma” são englobados na classe</p><p>lexical das paixões, que são efeitos de sentido das</p><p>qualificações modais que modificam o sujeito de estado, isto</p><p>é, que explicam as relações que o sujeito mantém com o</p><p>objeto. Assim, um objeto modalizado pelo querer é desejável</p><p>para o sujeito de estado e essa relação manifesta-se pelo</p><p>efeito de sentido desejo. (Fiorin, 1989, p. 95).</p><p>Na manipulação, o destinador (enunciador) manipula o</p><p>destinatário (enunciatário) a querer ou a dever fazer, conferindo</p><p>a este a competência para tal, que, ao agir, realiza a performance</p><p>(ação). O destinador exerce também o papel de avaliador,</p><p>aplicando a sanção positiva ou negativa (Barros, 2005).</p><p>“Os enunciados de fazer operam a passagem de um estado</p><p>a outro, de um estado conjuntivo a um estado disjuntivo e vice-</p><p>versa”. (Barros, 2005, p. 23). O sujeito de estado e do fazer</p><p>podem ser o mesmo (programas “reflexivos”) ou diferentes.</p><p>No percurso da manipulação, há o estabelecimento de um</p><p>acordo entre destinador e destinatário, em geral após a</p><p>ruptura da ordem estabelecida, ou seja, depois da</p><p>transgressão de contratos sociais implícitos ou explícitos; no</p><p>percurso da sanção, o destinador executa sua parte no</p><p>contrato pela atribuição de recompensa ou pela punição do</p><p>sujeito fiel ou não a suas obrigações. (Barros, apud Pereira et</p><p>al , [201-?]).</p><p>Os programas narrativos (PN’s) integram estados e</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>54</p><p>transformações, numa relação entre sujeito e objeto, e quando</p><p>compostos por vários programas relacionados e hierarquizados</p><p>em que o posterior pressupõe o(s) anterior(es), traduz-se em</p><p>percursos narrativos. Quando a função transformação resulta na</p><p>conjunção entre os actantes, tem-se um programa de aquisição;</p><p>se resulta na disjunção, o programa é de privação (Barros, 2005,</p><p>p. 25). Um programa narrativo (PN) pode ser representado pelos</p><p>seguintes símbolos:</p><p>Quadro 1- quadro representativo dos símbolos de um programa</p><p>narrativo</p><p>F = função</p><p>→ = transformação</p><p>S1 = sujeito do fazer</p><p>S2 = sujeito do estado</p><p>ດ = conjunção Ex: PN =F[S1 → (S2 ດ OV)]</p><p>U = disjunção</p><p>Ov = objeto-valor</p><p>Fonte: Barros, 2005, p. 24</p><p>Sintetizando, os percursos narrativos podem assim ser</p><p>definidos:</p><p>• Percurso do sujeito- caracterizado pela sequência lógica de</p><p>programas de competência e de performance, em que o</p><p>sujeito é o actante funcional, ou seja, assume vários papéis</p><p>actanciais (Barros, 2005, p. 30).</p><p>• Percurso do destinador- manipulador- O sujeito</p><p>destinador- manipulador propõe valores almejados pelo</p><p>sujeito destinatário e lhe confere os valores modais (querer</p><p>fazer, saber fazer, poder fazer e dever fazer) necessários</p><p>para a ação. O destinatário-sujeito, através de um fazer</p><p>interpretativo, aceita o contrato proposto pelo destinador-</p><p>manipulador ou não. (Barros, 2005, p. 30-31).</p><p>• Percurso do destinador- julgador- responde pela sanção do</p><p>sujeito através dos programas narrativos, interpretação</p><p>veridictória dos estados procedentes do fazer do sujeito,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>55</p><p>definidos como verdadeiros (parecem e são); falsos (não</p><p>parecem e não são), mentirosos (parecem, mas não são) ou</p><p>secretos (não parecem, mas são) e retribuição (o sujeito</p><p>cumpridor recebe recompensa e o não cumpridor sofre</p><p>punição) (Barros, 2005, p. 35).</p><p>Para Greimas, os três percursos estruturam-se num</p><p>esquema narrativo marcado por relações, acontecimentos,</p><p>projeções, destinos, retratando o “sentido da vida” (BARROS,</p><p>2005, p. 38).</p><p>Estrutura discursiva</p><p>A mudança da estrutura narrativa para a discursiva ocorre</p><p>quando é assumida pelo sujeito da enunciação, o enunciador</p><p>(destinador), que reflete suas escolhas em seu discurso, com</p><p>base nos efeitos de sentido que deseja produzir, a fim de</p><p>persuadir o enunciatário (destinatário) por meio do efeito de</p><p>proximidade ou de distanciamento da enunciação ou da</p><p>realidade ou referente. Para o primeiro, utiliza-se a terceira</p><p>pessoa, criando-se a ilusão de objetividade, neutralizando a</p><p>enunciação, que só faz comunicar os “fatos” e o modo de ver dos</p><p>outros, procedimento este denominado desembreagem</p><p>enunciva, contrário à desembreagem enunciativa, em primeira</p><p>pessoa (Barros, 2005, p. 53-55). Nesta última, de base de efeitos</p><p>de realidade ou de referente, os discursos são atrelados a</p><p>pessoas, espaços e tempo (ancoragem actancial, espacial e</p><p>temporal, respectivamente), o que corrobora a ilusão de</p><p>veracidade dos fatos, mas é entendido também como efeito</p><p>contrário, ou seja, de que não existe o real, a não ser como criação</p><p>do discurso (Barros, 2005, p. 59). Quando o discurso é mal</p><p>elaborado ou inserido no contexto de outros textos, havendo</p><p>confrontos de ideias, controvérsias, ele pode ser negado como</p><p>“verdadeiro” (Barros, 2005, p. 62).</p><p>Quando se lê um texto, busca-se o tema abordado, a</p><p>isotopia temática. A tematização, reflexo de valores investidos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>56</p><p>no texto, aparece nos discursos por meio de figuras de conteúdo</p><p>(figurativização), para levar o enunciatário a reconhecer</p><p>“imagens do mundo”, crer e, por conseguinte, cumprir o</p><p>contrato estabelecido entre enunciador e enunciatário, onde o</p><p>primeiro dita as regras e ao final aplica sanção ou dá a</p><p>recompensa, a depender da resposta do enunciatário. “Os</p><p>percursos figurativos recobrem (...) percursos temáticos e</p><p>percursos narrativos” (Barros, 2005, p. 71).</p><p>Os papéis assumidos nos discursos e narrativas contribuem</p><p>para o estabelecimento de expectativas.</p><p>Recortes do filme</p><p>• O personagem protagonista, Tashi, desde os 5 anos</p><p>residente de um mosteiro, busca pelo nirvana (realização,</p><p>felicidade, mesmo em meio aos contratempos da vida), a</p><p>fim de tornar-se um ser espiritualmente iluminado, mas</p><p>apaixona-se por Pema, já noiva, que se casa com ele.</p><p>• Na vila, as colheitas eram vendidas para o senhor Dawa,</p><p>que trapaceava na balança e no valor. Tashi pôs em dúvida</p><p>as suas boas intenções de comprar e começou a levar a</p><p>colheita para o comércio na cidade. Sugeriu que o ex- noivo</p><p>de Pema também o fizesse, porém, ele, contrário à venda</p><p>dos produtos na cidade, não seguiu a sugestão de Tashi e</p><p>continuou a comercializar com quem já vinha negociando.</p><p>• À noite, quando sua esposa e filho estavam dormindo,</p><p>Tashi preparou sua malinha e partiu. No trajeto de volta,</p><p>fora abordado por sua esposa. Ela tentou sensibilizá-lo</p><p>fazendo hipóteses sobre as condições da esposa de Buda</p><p>após ele tê-la deixado vítima da solidão, da amargura, da</p><p>raiva. O que ela teria dito quando seu filho perguntou por</p><p>seu pai? Acrescentou ainda que o abandono de um filho, só</p><p>seria possível para um homem, jamais para uma mulher.</p><p>Disse também que, se os pensamentos dele por Dharma</p><p>tivessem a mesma intensidade que o amor e a paixão que</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>57</p><p>demonstrou por ela, ele se tornaria um Buda naquela vida</p><p>e naquele corpo. Ainda assim, ele decidiu retornar de onde</p><p>veio.</p><p>Análises</p><p>Deixado pelos pais aos 5 anos no monastério, Tashi vivia</p><p>em conjunção com sua tradição e permaneceu isolado em</p><p>meditação para atingir o seu objeto de valor, que era ser um ser</p><p>espiritualmente iluminado. Assim, num primeiro momento,</p><p>aceitou o “contrato” da tradição budista, acreditando que, após</p><p>a rígida disciplina monástica, seria recompensado com a</p><p>liberdade prometida (manipulação por tentação), porém Tashi</p><p>rompeu o contrato pelo fato de não ter a recompensa (sanção</p><p>positiva) pelo seu fazer (meditação, isolamento, renúncia aos</p><p>prazeres mundanos) e passou a almejar outro objeto de valor.</p><p>Ao conhecer Pema (noiva de Jamayang), Tashi por ela se</p><p>apaixonou; ela o manipulou por meio da tentação e passou a ser,</p><p>além de destinadora-manipuladora, seu objeto de valor</p><p>almejado. Ele acreditou no contrato, amaram-se, casaram-se e o</p><p>noivo Jamayang, que até então estava em conjunção com Pema,</p><p>passou para o estado de disjunção com seu objeto de valor</p><p>(Pema). Enquanto Tashi teve uma aquisição, o seu noivo</p><p>Jamayang passou por uma privação. Tashi, que vivia em</p><p>disjunção com a satisfação dos desejos da carne, passou para o</p><p>estado de conjunção com este objeto de valor.</p><p>O povo da vila, trabalhadores do campo, tinha um</p><p>“contrato” com o comprador (destinador-manipulador) de sua</p><p>produção por acreditar na recompensa justa - pagamento (objeto</p><p>de valor) feito por ele. Tashi colocou em dúvida a sua</p><p>honestidade e sugeriu aos produtores da vila a comercialização</p><p>direta da colheita, por eles próprios, na cidade. Os produtores</p><p>romperam o “contrato” com o comprador, suposto trapaceiro</p><p>(destinador-manipulador), e aceitaram o novo “contrato”</p><p>proposto por Tashi (destinador-manipulador), acreditando que</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>58</p><p>a aquisição do objeto de valor parecia e seria real. Somente</p><p>Jamayang, ex- noivo de Pema, não o aceitou.</p><p>Tashi os manipulou pela tentação, os fez acreditar e usar da</p><p>própria competência para lucrarem mais vendendo seus</p><p>produtos na cidade e, de fato, tiveram resultados positivos,</p><p>confirmando que o contrato parecia e era verdadeiro.</p><p>Dawa ainda havia dito que, se não vendessem para ele,</p><p>teriam que comer toda a sua produção, insinuando que ele seria</p><p>a única opção para negociação, tentando manipular por</p><p>intimidação, porém os camponeses não aceitaram esse</p><p>“contrato”, interpretando-o como falso.</p><p>Tashi estava em conjunção com sua esposa e filho, porém</p><p>numa noite decidiu romper o “contrato” com eles e partiu para</p><p>a transformação, para o estado de disjunção com os dois e foi</p><p>embora (agiu, realizou a performance); inclusive, banhou-se no</p><p>rio como quando decidiu abrir mão do seu objeto de valor inicial</p><p>(o nirvana). Sob a perspectiva da análise da relação entre Tashi</p><p>e a esposa e filho, houve um estágio inicial do programa, o de</p><p>aquisição, no qual a esposa e o filho tinham Tashi (ambos os</p><p>sujeitos em conjunção com o objeto de valor deles) para um</p><p>programa de privação, os dois sujeitos se viram privados de seu</p><p>objeto valor, o esposo e pai, respectivamente.</p><p>O objeto de valor de Tashi passou a ser novamente o</p><p>alcance do nirvana. Sua esposa, agora na posição de</p><p>destinadora-manipuladora, tentou sensibilizá-lo e persuadi-lo,</p><p>ao comparar o que estavam passando com o que Buda e sua</p><p>família já haviam passado, e tentou fazê-lo através da</p><p>intimidação velada, como quando fala: O que ela (esposa de</p><p>Buda) teria dito quando seu filho perguntou pelo pai? Ela ainda</p><p>acrescentou que, o abandono de um filho, só seria possível para</p><p>um homem, jamais para uma mulher. Assim, procurou</p><p>manipulá-lo pela provocação, pois se ele quisesse mostrar o</p><p>contrário, ou seja, que apesar de ser homem não abandonaria</p><p>um filho, teria voltado para a seu lar.</p><p>Pema ainda tentou manipulá-lo por provocação</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>59</p><p>(investindo valores negativos no sujeito destinatário Tashi, de</p><p>não amá-la o suficiente), ao dizer que se os seus pensamentos</p><p>por Dharma tivessem a mesma intensidade que o amor e a</p><p>paixão demonstrados por ela, ele se tornaria um Buda naquela</p><p>vida e naquele corpo. Ainda assim, ele não se</p><p>deixou manipular</p><p>(não acreditou no valor negativo atribuído a si por Pema) e</p><p>manteve-se firme em seu propósito de agir para atingir o</p><p>nirvana. Ela, diante da decisão de Tashi, ofereceu-lhe a sua</p><p>ausência (sanção), partindo.</p><p>Conclusão</p><p>A semiótica notabiliza-se por alguns pontos específicos de</p><p>sua abordagem dos objetos significantes: permite a leitura de</p><p>objetos verbais, não verbais ou mistos (verbais e não verbais);</p><p>oportuniza a investigação do caminho percorrido na elaboração</p><p>da produção dos sentidos, estejam eles contidos em um</p><p>discurso, uma pintura, uma foto, quadrinhos, dentre outros. O</p><p>aparato teórico-metodológico da semiótica perscruta porque</p><p>algo é o que é, diferenciando-o daquilo que não o é. Nesta</p><p>medida, este aparato apresenta tal regularidade no conjunto de</p><p>procedimentos de abordagem dos objetos que chegou a receber</p><p>críticas no sentido de ser uma “camisa de força” da produção de</p><p>sentido. A teoria semiótica, contudo, notabiliza-se por</p><p>constituir-se um aparato estruturado e estruturante do percurso</p><p>do sentido. Ressalte-se, ainda, que a teoria semiótica engendrou-</p><p>se no interior do estruturalismo linguístico, originando seu</p><p>conceito de estrutura narrativa das famosas “funções de Propp”,</p><p>formalista russo do Círculo de Praga que as elaborou a partir da</p><p>observação de recorrências nas narrativas dos contos de fada.</p><p>A análise semiótica propicia o levantamento de possíveis</p><p>interpretações, a identificação dos recursos utilizados para a</p><p>sustentação daquilo que é dito e/ou produzido, a verificação dos</p><p>valores que veicula e dos temas abordados, o reconhecimento</p><p>dos implícitos e dos subentendidos. Qualquer dado detectado</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>60</p><p>que possa contribuir para a atribuição de sentido ao objeto</p><p>examinado é considerado pela análise semiótica, pois esta teoria</p><p>opera com toda a gama de signos, sejam eles verbais ou não</p><p>verbais, sejam símbolos ou índices, sejam sinais não sígnicos ou</p><p>signos culturais. Tudo pode parecer significante ao olhar</p><p>semiótico.</p><p>Visto sob este ângulo, as leituras de recortes do filme</p><p>Samsara não tiveram como objetivo demonstrar verdades, até</p><p>porque nem sujeitos, nem sentidos, nem discursos estão prontos</p><p>e acabados. Os papéis nos discursos e narrativas diversificam-</p><p>se, sendo que até um mesmo sujeito pode assumir diferentes</p><p>papéis dentro de uma mesma narrativa, pode passar de sujeito</p><p>a objeto, de destinador-manipulador a destinatário-</p><p>manipulado, passível de sanções positivas e de sanções</p><p>negativas, num jogo de simulacros onde valores voláteis e</p><p>inconstantes se alternam.</p><p>Cabe destacar ainda que o ponto de vista é o que cria o</p><p>objeto; na medida em que este passa a significar, passa a ter</p><p>valor (Silveira, 2022). Tal excerto reforça o fato de que os sujeitos</p><p>e os objetos (como aqueles mobilizados no filme, em decorrência</p><p>da análise), adquiram múltiplos valores, antes inexistentes, mas</p><p>vivos e pulsantes em virtualidade, a partir da qual eles se</p><p>tornam reais e passam a significar no mundo.</p><p>Na relação entre sujeito e objeto, no decorrer das</p><p>transformações resultantes da aceitação ou não do contrato</p><p>estabelecido pelo destinador ao destinatário, o sujeito é movido</p><p>por paixões, que nada mais são do que “estados da alma”</p><p>suscitados pelos efeitos de sentido, os quais, por sua vez, se</p><p>produzem por arranjos de modalidades engendradas nas</p><p>narrativas.</p><p>As narrativas, por sua vez, constituem-se no interior de</p><p>uma macronarrativa estruturante, única, que comporta todos os</p><p>programas, contratos, sujeitos e objetos, a qual, pela vastidão</p><p>constitutiva, assume uma dimensão abstrata e inapreensível.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>61</p><p>Esta grande narrativa extrapola a esfera da teoria narrativa,</p><p>alguns a chamam destino outros a chamam “vida”.</p><p>Referências</p><p>BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 2005.</p><p>BARROS, Diana Luz Pessoa de. Teoria e prática semióticas: quatro rumos.</p><p>YouTube.23 de set. de 2019. Disponível em: <http://semioticafflch.usp.br/</p><p>node/887>. Acesso em:12 de julho de 2023.</p><p>FIORIN, José Luiz. Elementos de Análise do Discurso. São Paulo: Contexto,1989.</p><p>FLORES, Valdir do Nascimento. A linguística geral de Ferdinand de Saussure. 1. Ed.</p><p>São Paulo: Contexto, 2023.</p><p>PEREIRA, J.; VARGAS, V. S. Percurso gerativo de sentido no filme curta-metragem</p><p>“Débora”: da teoria à prática. Pelotas: EdUFPEL, 2021.</p><p>NALIN, Pan; BAKER, Tim. Samsara. Ladakh: Pandora Film Production, 2001.</p><p>SILVEIRA, Eliane. A Aventura de Saussure. Campinas: Abralin, 2022.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>62</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>63</p><p>O MEDO EM TEMPOS DA COVID-19</p><p>Uma retrospectiva à luz da psicanálise e de alinhavos</p><p>poéticos</p><p>Adriana Lúcia de Escobar Chaves de Barros 1</p><p>Ednéia Albino Nunes Cerchiari 2</p><p>Diante do sombrio cenário pandêmico que teve início no</p><p>Brasil em março de 2020, quando fomos arrancados do nosso</p><p>cotidiano e obrigados a viver o distanciamento social por causa</p><p>da COVID-19, fomos acometidos pelo medo. Tínhamos medo</p><p>do contágio do coronavírus, medo de sermos contagiados e</p><p>contagiarmos o outro, medo de sair de casa, de abrir a porta, de</p><p>adoecer, medo da hospitalização, medo da morte, medo do</p><p>depois da morte, enfim, medo de tudo. O pânico passou a ser</p><p>assunto recorrente nos consultórios, nas conversas cotidianas,</p><p>nos meios de comunicação e, praticamente, em todo lugar.</p><p>Muitas pessoas adoeceram, física e emocionalmente naquela</p><p>época.</p><p>Mesmo com o fim oficial da pandemia, até hoje, estamos</p><p>sentindo os efeitos negativos desse período de perdas, mortes,</p><p>doenças e sofrimentos. Sendo assim, procuramos tecer algumas</p><p>considerações, em retrospectiva, sobre o medo em tempos da</p><p>1 Professora Dr. Titular da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul - UEMS,</p><p>ministrando aulas nos cursos de graduação e de pós-graduação stricto sensu do Mestrado</p><p>Acadêmico e Profissional em Letras. Licenciatura e Bacharelado em Psicologia pela</p><p>Anhanguera-UNIDERP (2023) CRP 14/10019. Pós-Doutorado em Letras Modernas pela USP</p><p>(2016-2017). Doutorado em Estudos da Linguagem pela PUC-Rio (2010). Mestrado em</p><p>Administração de Empresas com especialização em Marketing pelo IAG Escola de Negócios</p><p>da PUC-Rio (2006). Pós-graduação em Management (MBA) pelo IAG Escola de Negócios</p><p>da PUC-Rio (2003). Pós-graduação em Metodologia do Ensino da Língua Inglesa.</p><p>Licenciatura Plena em Letras Português-Inglês pela PUC-Rio (1984). E-mail:</p><p>chaves.adri@hotmail.com https://orcid.org/0009-0004-3511-6828.</p><p>2 Psicanalista, Membro Efetivo da Sociedade Psicanalítica de Mato Grosso do Sul - SPMS,</p><p>FEBRAPSI, FEPAL e IPA. Professora Titular Aposentada da UEMS (1994 a 2017); Doutora</p><p>em Ciências Médicas (FCM/UNICAMP); Pós-Doutora em Psicologia (UCDB); Pesquisadora</p><p>Sênior da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) e do Programa de Pós-</p><p>graduação Stricto Sensu em Ensino em Saúde (PPGES/UEMS); e-mail: edcer@terra.com.br</p><p>http://orcid.org/0000-0002-4716-6855.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>64</p><p>pandemia da COVID-19 à luz da Psicanálise, alinhavando-as</p><p>com poemas e escritos de Carlos Drummond de Andrade,</p><p>Clarice Lispector e Cecília Meireles, neste ensaio que propõe</p><p>uma abordagem interdisciplinar.</p><p>O medo é essencial para a preservação das espécies,</p><p>sobretudo quando o compreendemos como um instinto animal</p><p>e/ou um elemento ativador da produção de adrenalina no</p><p>sistema simpático para a garantia de sobrevivência perante uma</p><p>ameaça. Sob esse prisma, o medo é primordial na preparação do</p><p>organismo diante das situações perigosas, seja para que lute,</p><p>seja para que fuja.</p><p>No entanto, mesmo sendo um mecanismo de defesa, o</p><p>medo nem sempre nos protege do perigo, principalmente</p><p>quando exerce sobre nós, efeitos paralisantes, desencorajadores</p><p>e desestimulantes, ou provoca sentimento de impotência,</p><p>desesperança e aflição. O que chamamos genericamente de</p><p>medo pode tratar-se de um quadro de ansiedade proveniente de</p><p>um medo difuso, que tenha desencadeado uma angústia</p><p>permanente. E é sobre esse viés que discorreremos sobre o medo</p><p>e suas vicissitudes desse sentimento na época da COVID-19,</p><p>cujas implicações vêm sendo percebidas até os dias de hoje.</p><p>Considerações sobre o medo da COVID-19, psicanálise e</p><p>alinhavos literários</p><p>A intensificação das notícias sobre a COVID-19 no Brasil e</p><p>no mundo e a confirmação sobre sua letalidade diante da morte</p><p>de um ente querido ou de um conhecido disseminou o medo na</p><p>população em geral. O perigo iminente causado pelo</p><p>coronavírus suscitou sentimentos e atitudes diversas em relação</p><p>a forma de se lidar com os próprios medos.</p><p>Analisando as atitudes das pessoas naquele período de</p><p>pandemia, Kupermann (2020, citado por Vieira, 2020) dividiu as</p><p>pessoas em quatro grupos. O primeiro, formado por aqueles que</p><p>negavam a existência dos perigos em relação ao contágio do</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>65</p><p>vírus e, consequentemente, colocaram a sua vida e a dos outros</p><p>em risco. O segundo, pelos que não ignoravam a existência do</p><p>perigo, mas também não se sentiam tão ameaçados. Esses, em</p><p>geral, trabalhavam em casa, em sistema de home office e já</p><p>haviam criado meios de proteger a si e a sua família. Havia</p><p>ainda um terceiro grupo de pessoas que precisava sair para</p><p>trabalhar e acabava sublimando o medo do contágio para</p><p>sobreviver e preservar a sua saúde física e mental. Por fim, o</p><p>quarto grupo, formado por pessoas que, por razões internas e</p><p>de estrutura de personalidade, haviam sido tomados pelo medo.</p><p>Independente do grupo ao qual pertencíamos na época, o</p><p>medo da COVID-19 era fruto de um perigo real (França, 2003).</p><p>Ainda que o enfrentássemos, sublimássemos,</p><p>desconvidássemos, sucumbíssemos ou negássemos, o medo</p><p>estava presente nas nossas vidas, causando profundos impactos</p><p>biopsicossociais.</p><p>Segundo França (2003, p. 60), “no medo, destaca-se o</p><p>sentimento de grande inquietação ante a noção de um perigo</p><p>real ou imaginário”, que podem ser: i) inatos, como certos</p><p>medos atávicos ou ii) adquiridos, “tanto a partir de experiências</p><p>com perigos reais (medos realísticos)” ou daqueles “que</p><p>parecem irracionais, oriundos do nosso mundo interno (medos</p><p>imaginários) e que de alguma forma se inscrevem em nossa</p><p>memória” (França, 2003, p. 60).</p><p>Complementando, no estudo “O medo da perda do amor”,</p><p>Gerber (2013) fala do medo defendendo que o amor é um afeto</p><p>básico e que, portanto, o bebê, que já nasce com um potencial de</p><p>amor e uma expectativa de ser amado, sente medo diante do</p><p>risco de perdê-lo. Segundo o autor, essa expectativa de amor</p><p>está presente nas duas gestações pelas quais o ser humano</p><p>passa: i) gestação intrauterina e ii) gestação simbólica de</p><p>inserção na humanidade, (fora do útero). Assim, nesses dois</p><p>processos de gestações, o bebê capta, além dos traços maternos,</p><p>“o acolhimento da mãe, representante contingente do</p><p>acolhimento da humanidade” (p. 34). Quando tal acolhimento é</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>66</p><p>frustrado por alguma razão e a necessidade de amor não é</p><p>correspondida, o primeiro afeto que surge é o medo. Nessa</p><p>perspectiva, o medo da perda do amor e do acolhimento</p><p>consiste no “medo básico que vai criar todos os outros medos</p><p>aos quais nós estamos submetidos” (p. 34).</p><p>Gerber (2013) considera que “a virulência do superego seria</p><p>um produto do medo da perda do amor” (p. 35), portanto “o</p><p>medo da perda de acolhimento e reconhecimento pelo outro</p><p>(inicialmente, pelas figuras parentais) seria, no decorrer do</p><p>desenvolvimento psíquico, depositado nessa agência moral”</p><p>(Gerber, 2013, p. 35). O termo superego foi introduzido por</p><p>Freud, em 1923, em seu estudo O Ego e o Id “o último dos</p><p>grandes trabalhos teóricos de Freud. Ele oferece uma descrição</p><p>da mente e de seu funcionamento” (Freud, 1923/1980, p. 14). A</p><p>partir da teoria do superego “Freud formulou o chamado ideal</p><p>de ego, ou seja, paralelamente a uma instância que diria o que</p><p>‘não devemos fazer’, haveria também uma instância que diria ‘o</p><p>que devemos fazer para sermos amados, acolhidos e</p><p>reconhecidos’” (Gerber, 2013, p. 35) e evitarmos o desamparo.</p><p>Sendo o medo e o desamparo inerentes ao ser humano, eles</p><p>servem de tema recorrente em canções, versos e prosas, desde</p><p>há muito tempo. Assim, de acordo com a proposta alinhavarmos</p><p>este ensaio de forma interdisciplinar, destacamos,</p><p>primeiramente, a obra de Clarice Lispector (1998, p. 11)</p><p>intitulada “A Paixão Segundo G.H.” e publicada em 1964, em</p><p>que a autora nos fala sobre os seus próprios medos.</p><p>Clarice Lispector parte da experiência da protagonista de</p><p>esmagar uma barata ao fechar a porta do guarda-roupa, no</p><p>momento em que o inseto tenta sair. Conforme Cook (1999, p.</p><p>169), esse incidente, aparentemente banal, é a oportunidade</p><p>para “a narradora-personagem [...] se lançar em uma</p><p>experiência ontológica que a levará para além das coordenadas</p><p>temporais e espaciais da sua existência quotidiana”. E são o</p><p>“além das coordenadas temporais e espaciais”, a</p><p>atemporalidade e a universalidade do espaço no romance de</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>67</p><p>Clarice Lispector, que nos permitem estender os afetos de G.H.,</p><p>aos nossos próprios (Gerber, 2013).</p><p>Fazendo referência aos conceitos psicanalíticos e</p><p>corroborando com Cook (1999), surgem os seguintes</p><p>questionamentos quanto à noção de banalidade/trivialidade</p><p>daquele ato de esmagar a barata: i) teria sido esse, um incidente</p><p>traumático para G.H.? ii) Sendo isso verdade, teria sido intenso</p><p>o suficiente para provocar uma desorganização psíquica na</p><p>protagonista, incapacitando-a de dominar e elaborar</p><p>psiquicamente as suas excitações, para poder reagir</p><p>adequadamente à visão daquele inseto, meio morto e meio vivo?</p><p>iii) Teria o trauma de esmagar aquele inseto remetido G.H. ao</p><p>trauma cabal do ser humano que são o estado de desamparo e a</p><p>sua condição de vulnerabilidade (Laplanche & Pontalis, 1992)?</p><p>iv) Se tudo isso é fato, então aquele acontecimento é mesmo</p><p>apenas “aparentemente trivial” (Cook, 1999, p. 169).</p><p>A “mundividência lispectoriana” mencionada por Cook</p><p>(1999, p. 169), a universalidade e a atemporalidade das</p><p>personagens de Clarice Lispector nos possibilitam tecer</p><p>considerações sobre o medo daquele período da COVID-19,</p><p>traçando paralelos com os sentimentos de angústia expressos</p><p>pela escritora.</p><p>O medo de Clarice e o medo que sentimos na época da</p><p>desconhecida pandemia dialogam, na medida em que o novo</p><p>nos assombra e nos desorienta. Conforme Lispector (1998, p. 11):</p><p>[...] tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o que</p><p>não entendo quero sempre ter a garantia de pelo menos estar</p><p>pensando que entendo; não sei me entregar à desorientação.</p><p>Conforme Santos e Fortes (2011), a ausência de garantias</p><p>definitivas leva o sujeito ao estado de desamparo. G.H. “quer ter</p><p>sempre [...] garantia”, porque a falta dela causa medo e</p><p>desorientação. Traçando mais um paralelo do romance de</p><p>Clarice Lispector com os impactos da COVID-19 em nossas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>68</p><p>vidas, podemos dizer que, naquele período, sem certezas ou</p><p>garantias quanto aos efeitos da doença e à descoberta de uma</p><p>vacina eficaz, assim como G.H., encontrávamo-nos em estado de</p><p>desamparo.</p><p>O medo do novo coronavírus estava causando sérios danos</p><p>aos indivíduos e à sociedade em geral. Diante do desconhecido,</p><p>as pessoas se sentiam perdidas e, quanto a isso, Clarice, na voz</p><p>de G.H., reflete sobre a dificuldade de sentir-se perdida e</p><p>perder-se.</p><p>[...] É difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente</p><p>arrumarei depressa um modo de me achar, mesmo que</p><p>achar-me seja de novo a mentira de que vivo. Até agora</p><p>achar-me era já ter uma ideia de pessoa e nela me engastar:</p><p>nessa pessoa organizada eu me encarnava, e nem mesmo</p><p>sentia o grande esforço de construção que era viver</p><p>(Lispector, 1998, p. 10).</p><p>De novo aos tempos da pandemia, o que era antes dela</p><p>havia se tornado para nós, passado cada vez mais remoto. O</p><p>cotidiano que nos oprimia ia ganhando um ar nostálgico de</p><p>lembranças do que não havíamos vivido e tornando-se clichês</p><p>como o conhecido “éramos felizes e não sabíamos”. Na época,</p><p>parecia mais fácil acharmo-nos e mantermo-nos organizados na</p><p>mentira de antes, do que nos perder no que ainda estava por vir.</p><p>O futuro que se apresentava como desconhecido, desorganizado</p><p>e incerto nos causava muito medo. Sobre o medo, Lispector</p><p>(1998, p.10) destaca:</p><p>[...] O medo agora é que meu novo modo não faça sentido?</p><p>Mas por que não me deixo guiar pelo que for acontecendo?</p><p>Terei que correr o sagrado risco do acaso. E substituirei o</p><p>destino pela probabilidade (Lispector, 1998, p. 10).</p><p>G. H. inquieta-se diante dos riscos do acaso e da</p><p>probabilidade. Conforme França (2013), no medo, o sentimento</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>69</p><p>de grande inquietação ganha realce e, nessa perspectiva, G.H.</p><p>sente medo, inspirando-nos a mais questionamentos: i) será que</p><p>os medos da protagonista partiram de experiências com perigos</p><p>reais? ii) Será que foram procedentes do mundo interno da</p><p>protagonista, que de alguma forma se inscreveu em sua</p><p>memória? iii) E quantos aos nossos medos em relação à sombria</p><p>COVID-19 de poucos anos atrás?</p><p>Encontrávamo-nos em estado de inquietação. Tínhamos</p><p>medo. A pandemia havia nos tornado conscientes do inevitável</p><p>descontrole sobre o nosso destino. Substituir a ilusão da certeza</p><p>sobre o amanhã pelo risco do acaso nos parecia assustador. O</p><p>medo nos desamparava e naquela hora, precisávamos de</p><p>alguém que nos estendesse a mão, como no caso de G.H., que</p><p>no momento de medo e desamparo disse:</p><p>[...] Estou tão assustada que só poderei aceitar que me perdi</p><p>se imaginar que alguém me está dando a mão. [...] muitas</p><p>vezes, antes de ter a coragem de ir para a grandeza do sono,</p><p>finjo que alguém está me dando a mão e então vou, vou para</p><p>a enorme ausência de forma que é o sono (Lispector, 1998, p.</p><p>16).</p><p>Em o “Vocabulário de Psicanálise”, Laplanche e Pontalis</p><p>(1992) definem o desamparo como um “estado do lactente que,</p><p>dependendo inteiramente de outrem para a satisfação das suas</p><p>necessidades (sede, fome), se revela impotente para realizar a</p><p>acção específica adequada para pôr fim à tensão interna”</p><p>(p.156). Para Freud (1895/1980) em o “Projeto para uma</p><p>Psicologia Científica”, o desamparo original do ser humano está</p><p>diretamente relacionado à sua inaptidão motora, uma vez que</p><p>as principais necessidades do recém-nascido, que são a fome, a</p><p>respiração e a sexualidade, dão lugar a estímulos endógenos que</p><p>exigem descarga e esse, em razão de sua prematuridade</p><p>biológica, é incapaz de suprir suas necessidades vitais,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>70</p><p>necessitando de assistência alheia e, assim, dependendo</p><p>completamente do outro.</p><p>Considerando a definição de desamparo em Laplanche e</p><p>Pontalis (1988), inferirmos que G.H. além de assustada, também</p><p>se sente desamparada, dependendo inteiramente da mão de</p><p>alguém para satisfazer a sua necessidade básica de dormir. Na</p><p>ausência de alguém para lhe dar acolhimento e lhe estender a</p><p>mão, a protagonista finge a presença desse alguém. G.H. está</p><p>desamparada e completamente dependente de um outro, que</p><p>não corresponde às suas necessidades (Laplanche & Pontalis,</p><p>1992).</p><p>E quanto a nós? Quem nos daria a mão naquele momento</p><p>de pandemia da COVID-19? Também estávamos</p><p>desamparados. Precisávamos de acolhimento. Muitos de nós</p><p>encontravam-se incapazes de suprir as suas próprias</p><p>necessidades vitais. Precisávamos de assistência alheia</p><p>(Laplanche & Pontalis, 1992). Onde estavam as pessoas que não</p><p>apareciam quando mais precisávamos delas?</p><p>Em tempos de isolamento social, as pessoas estavam</p><p>confinadas nas casas ao lado, encontravam-se escondidas atrás</p><p>de máscaras e mantinham-se afastadas e desinfetadas pelo</p><p>álcool em gel 70%. Não nos eram permitidos toques, abraços ou</p><p>beijos. Não nos eram consentidas visitas aos moribundos, que</p><p>morriam sozinhos nas UTIs, sem direito à despedida dos</p><p>familiares, dos amigos e estavam sendo enterrados “sem choro</p><p>nem vela”. Restava-nos, portanto, seguir a sugestão de G.H. de</p><p>imaginar alguém nos dando a mão.</p><p>Nós pensávamos: e agora? O que será de nós? O que será</p><p>do mundo? Como indaga o poeta Carlos Drummond de</p><p>Andrade (Drummond, 2002, p. 23) em seu conhecido poema,</p><p>também nos indagávamos, “E agora, José?”</p><p>A festa acabou,</p><p>a luz apagou,</p><p>o povo sumiu,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>71</p><p>a noite esfriou, [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>A COVID-19 nos havia sentenciado ao isolamento social.</p><p>Não íamos mais a festas e a sensação que tínhamos era que o</p><p>povo havia sumido literalmente, tornando os dias e as noites</p><p>mais frias, sem o calor da presença do outro.</p><p>Estávamos carentes de amor, de afeto básico, sentíamos</p><p>medo. Precisávamos de amor, porque, como afirma Gerber</p><p>(2013), já nascemos com o potencial de amor e com uma</p><p>expectativa de sermos amados. Estávamos sofrendo o medo da</p><p>perda do amor. Precisávamos do outro para nos acolher (Gerber,</p><p>2013). Esse medo básico desencadeava todos os outros medos</p><p>aos quais estávamos submetidos naqueles tempos da COVID-19</p><p>e em qualquer tempo de desiquilíbrio social, como a época em</p><p>que esse poema foi escrito.</p><p>O poema “José” foi publicado pela primeira vez em 1942,</p><p>período em que o mundo enfrentava a Segunda Grande Guerra.</p><p>Drummond retrata a desilusão, a angústia e o desamparo do</p><p>homem diante da desintegração daquilo que conhecia por</p><p>mundo.</p><p>O desamparo é uma reação frente às situações perigosas e</p><p>traumáticas. O homem de Drummond, encarnado na figura de</p><p>José, está desamparado em meio àquela guerra de âmbito</p><p>mundial (Freud 1926).</p><p>No estudo “Inibições, Sintomas e Ansiedade”, Freud</p><p>(1926/1980) propõe o desamparo, como reação frente às</p><p>situações de perigo que geram ansiedade.</p><p>Segundo ele,</p><p>[O] o determinante fundamental da ansiedade automática é</p><p>a ocorrência de uma situação traumática; e a essência disto é</p><p>uma experiência de desamparo por parte do ego, face de um</p><p>acúmulo de excitação, quer de origem externa, quer interna,</p><p>com o que não se pode lidar (Freud 1926/1980, p. 99).</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>72</p><p>Mais adiante, Freud (1926/1980) diz que “o perigo de</p><p>desamparo psíquico é apropriado ao perigo de vida quando o</p><p>ego do indivíduo é imaturo; o perigo da perda de objeto, até a</p><p>primeira infância, quando ele ainda se acha na dependência de</p><p>outros” (p 166). Assim, ao longo desse estudo de Freud,</p><p>depreendemos o quanto a questão do desamparo é de</p><p>importância capital para a elaboração da sua segunda teoria da</p><p>angústia.</p><p>No estudo intitulado “Desamparo e alteridade: o sujeito e</p><p>a dupla face do outro”, Santos e Fortes (2011) concluem que “a</p><p>partir dos artigos [de Freud] ‘Futuro de uma ilusão’ de 1927 e</p><p>‘Mal-estar na Civilização’ de 1930, a noção [do desamparo] é</p><p>então formulada como condição fundamental da existência</p><p>humana, como ausência de garantias definitivas para o sujeito”</p><p>(p. 749).</p><p>Laplanche e Pontalis (1992, p. 112) afirmam que “Freud liga</p><p>explicitamente o estado de desamparo à prematuração do ser</p><p>humano” (p.112) e, quando “adulto, o estado de desamparo é o</p><p>protótipo da situação traumática geradora de angústia” (p.112),</p><p>confrontando-o no presente com a impotência de seu estado de</p><p>desamparo infantil originário. Consequentemente, o trauma</p><p>cabal do ser humano é o estado de desamparo e a sua condição</p><p>de vulnerabilidade.</p><p>Em relação à definição de trauma, Laplanche e Pontalis</p><p>(1992) o conceituam como um “acontecimento da vida do sujeito</p><p>que se define pela sua intensidade, pela incapacidade em que se</p><p>encontra o sujeito de reagir a ele de forma adequada, pelo</p><p>transtorno e pelos efeitos patogênicos duradouros que provoca</p><p>na organização psíquica” (p. 522). Mais adiante afirmam que</p><p>“em termos econômicos, o traumatismo caracteriza-se por um</p><p>afluxo de excitações que é excessivo, relativamente à tolerância</p><p>do indivíduo e à sua capacidade de dominar e de elaborar</p><p>psiquicamente estas excitações” (p. 522).</p><p>De volta a Drummond, sabemos que “José” é um nome</p><p>brasileiro comum. No poema, esse “José”, que poderia ser o</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>73</p><p>“João da Silva”, é a representação de impessoalidade da</p><p>desilusão, do pessimismo e do desamparo humanos.</p><p>[...] e agora, José?</p><p>e agora, você? [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>José sou eu, é você, é o mundo inteiro. José é um homem</p><p>descaracterizado e atemporal que não sabe o que dizer perante</p><p>uma nova e desconhecida ordem, como nós no findado período</p><p>de pandemia.</p><p>[...] e tudo acabou</p><p>e tudo fugiu</p><p>e tudo mofou,</p><p>e agora, José? [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>As incertezas causadas pela COVID-19 nos causaram</p><p>medo, restando-nos repetir a pergunta sem respostas de</p><p>Drummond: “E agora, José?”</p><p>O mundo que conhecíamos havia acabado, fugido, mofado.</p><p>O “normal” havia sido substituído pelo “novo normal”. Mas,</p><p>como seria o “novo normal”?, nos perguntávamos. Como</p><p>seriam as nossas vidas, então? Nessa hora, o medo daquilo que</p><p>desconhecíamos voltava a nos assombrar e a nos desorientar.</p><p>Estávamos em meio a uma guerra mundial. Sentíamo-nos</p><p>desamparados como José que</p><p>[...] está sem mulher,</p><p>está sem discurso,</p><p>está sem carinho [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>Sem mulher, sem discurso e sem carinho, o José do poema</p><p>está vivendo a terrível experiência de se sentir-se absolutamente</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>74</p><p>sozinho, desconectado, sem o acolhimento e a compreensão do</p><p>Grande Outro (Gerber, 2013).</p><p>Quanto às nossas próprias mazelas, o isolamento social</p><p>ganhou eco, a solidão, nos envolveu e estávamos com a sensação</p><p>de que não havia o que ser feito. Sem saída, sem escape e sem</p><p>proteção, tínhamos sido dominados pelo sentimento de</p><p>impotência.</p><p>O mundo estava se desintegrando diante dos nossos olhos.</p><p>Nossos rostos, derretendo na frente do espelho. Estávamos nos</p><p>liquefazendo e as nossas antigas formas, que nos pareciam tão</p><p>bem delineadas, davam lugar a uma massa difusa, indefinida e</p><p>indeterminada. Não reconhecíamos mais em nós, tudo aquilo</p><p>que nos soava tão familiar. Não reconhecíamos nada do que</p><p>vinham se apresentando à nossa frente.</p><p>[...] Com a chave na mão</p><p>quer abrir a porta,</p><p>não existe porta;</p><p>quer morrer no mar,</p><p>mas o mar secou;</p><p>quer ir para Minas,</p><p>Minas não há mais.</p><p>José, e agora? [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>A chave que temos não servia porque aquela porta não</p><p>existia mais. A pandemia da COVID-19 havia nos colocado</p><p>diante de novas portas. As velhas práticas cotidianas não eram</p><p>mais adequadas às novas demandas e precisávamos nos adaptar</p><p>a esse “novo normal”, que por princípio semântico significava</p><p>“anormal”, até que nos acostumássemos com ele.</p><p>“Minas” não havia “mais”, não tínhamos lar seguro,</p><p>conhecido e acolhedor para viver. O mar havia secado, então</p><p>também não tínhamos onde morrer. “E agora, José?”</p><p>[...] Mas você não morre,</p><p>você é duro, José! [...]</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>75</p><p>[...] sem cavalo preto</p><p>que fuja a galope,</p><p>você marcha, José!</p><p>José, para onde? [...]</p><p>(Drummond, 2002, p. 23)</p><p>Fomos expulsos e excluídos do mundo que conhecíamos e,</p><p>como afirma Gerber (2013, p.35-36), o sentimento de exclusão é</p><p>o mais “terrorífico” de todos os afetos, mais até do que o medo</p><p>da morte. A exclusão remete ao desamparo, então, estávamos</p><p>desamparados.</p><p>Contudo, a humanidade é dura como José. A humanidade</p><p>não sucumbe. Sem cavalos pretos para uma fuga a galope, o</p><p>homem segue marchando. Mas para onde, José? Para onde,</p><p>você? Naquela época, restava-nos marchar rumo ao</p><p>desconhecido e na direção de um mistério Sem-Fim.</p><p>Assim, vislumbrando o final deste ensaio e a fim de trazer</p><p>a esse triste cenário daqueles tempos da COVID-19, uma ponta</p><p>de esperança, selecionamos um poema de Cecília Meireles,</p><p>intitulado “Canção Mínima”, que retrata com cores e flores, esse</p><p>mistério do Sem-Fim.</p><p>No mistério do Sem-Fim,</p><p>equilibra-se um planeta.</p><p>E, no planeta, um jardim,</p><p>e, no jardim, um canteiro;</p><p>no canteiro, uma violeta,</p><p>e, sobre ela, o dia inteiro,</p><p>entre o planeta e o Sem-Fim,</p><p>a asa, de uma, borboleta.</p><p>(Meireles, 1983)</p><p>Nesse poema, Cecília Meireles (Meireles, 1983) indica o</p><p>norte da nossa marcha de então. Se antes, ir na direção do</p><p>mistério do Sem-Fim era rumar ao desconhecido, agora já</p><p>conhecemos partes desse lugar. Como um zoom, a poetiza parte</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>76</p><p>de fora para dentro, aproximando-nos de um lugar que vai se</p><p>revelando aos poucos. Sob a ótica de mundo exterior, podemos</p><p>dizer que o planeta de Meireles é a Terra, sob o prisma de</p><p>mundo interior, esse planeta está dentro de nós.</p><p>Independentemente de a que mundo Meireles esteja nos</p><p>remetendo, a poetiza nos convoca à responsabilidade de</p><p>cuidarmos dele.</p><p>Segundo Meireles (1983), sobre o mistério do Sem-Fim,</p><p>equilibra-se um planeta que tem um jardim, um canteiro e uma</p><p>violeta, portanto precisamos cuidar desse jardim, desse canteiro</p><p>e dessa violeta. Eles são únicos, eles são nossos, e como diz</p><p>Meireles, para isso, temos o dia inteiro.</p><p>Aproximando-nos do centro do planeta, Meireles nos leva</p><p>ao cerne da questão: há uma asa de borboleta entre o planeta e</p><p>o Sem-Fim. À primeira vista, a asa de uma borboleta</p><p>representaria a alegria das cores, porém, prezando por coerência</p><p>a tudo o que foi abordado no nosso ensaio, a remetemos à ideia</p><p>de metamorfose, de mudança.</p><p>O mundo está em constante transformação. Nos</p><p>modificamos a cada milésimo de segundo. Vivemos o “novo”</p><p>todos os dias. Não deveríamos ter temido o “novo normal”,</p><p>porque ele era inevitável. A pandemia da COVID-19 passaria,</p><p>como na verdade, passou, porque tudo nessa vida passa.</p><p>Não há como exigir garantias de um planeta que se</p><p>equilibra sobre um mistério que nem fim tem. Somos</p><p>responsáveis por cuidar de nós e acolher o outro. Se assim</p><p>fizermos, contribuiremos para diminuir a quantidade de</p><p>pessoas desamparadas, angustiadas, traumatizadas e temerosas</p><p>quanto às incertezas do que está por vir.</p><p>Considerações Finais</p><p>Chegando ao término dessa curta jornada, retomamos</p><p>alguns aspectos centrais, abordados neste artigo. Em</p><p>decorrência da falta de garantias de sobrevivência frente às</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>77</p><p>situações traumáticas de perigo as quais a pandemia da COVID-</p><p>19 vinha nos submetendo, sentimo-nos vulneráveis,</p><p>angustiados e desamparos. Estávamos morrendo de medo.</p><p>Vimos que o medo é um mecanismo de defesa necessário</p><p>ao ser humano e primordial para a sua sobrevivência frente às</p><p>situações potencialmente ameaçadoras. Porém, o medo crônico</p><p>e desproporcional que vivenciamos naquele período acabou</p><p>sendo comprovado danoso e fator determinante para o</p><p>surgimento de transtornos psiquiátricos.</p><p>Diante de um futuro que se apresenta como desconhecido,</p><p>desorganizado e incerto não acreditamos que seja mais fácil nos</p><p>achar e nos manter organizados na mentira de antes, como</p><p>defende G.H., por mais heroica que tal atitude pareça, quando</p><p>estamos sofrendo. O preço a pagar por essa mentira é alto</p><p>demais. Não devíamos</p><p>nos perder no que ainda está por vir. A</p><p>chave para a “nova porta” é cuidarmos de nós e acolhermos o</p><p>outro.</p><p>Por fim, enfatizamos que o presente estudo não esgota a</p><p>temática aqui apresentada e tão pouco era esse nosso objetivo.</p><p>Contudo, esperamos que ele tenha inspirado a elaboração de</p><p>novos estudos interdisciplinares e levado às impensadas</p><p>reflexões.</p><p>Referências</p><p>ANDRADE, C. D. de. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002.</p><p>BRASIL. Ministério da Saúde. Sobre a doença. 2020 Disponível em:</p><p><https://coronavirus.saude.gov.br/sobre-a-doenca>. Acesso em julho de</p><p>2023.</p><p>COOK, M. Deus, vida e morte In: A paixão segundo G.H. de Clarice Lispector.</p><p>Boletim Centro de Estudos Portugueses - CESP, Belo Horizonte, v.19, n.24,</p><p>jan./jun, 1999.</p><p>DIATKINE, R. Tão negra quanto a madeira desta moldura.... Revista Brasileira</p><p>de Psicanálise, v.47, n.1, p.67-82, 2013. Disponível em: <http://rbp.org.br/?</p><p>magazine=124>. Acesso em julho de 2023.</p><p>FRANÇA, M. T. de B. Do terror primário ao medo protetor: considerações</p><p>sobre terror, pânico, fobia e medo em crianças. Revista Brasileira de</p><p>Psicanálise, v.47, n.1, p.52-66, 2013. Disponível em:</p><p><http://rbp.org.br/?magazine=124>. Acesso em julho de 2023.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>78</p><p>FREUD, S. Projeto para uma Psicologia Científica. In: S. Freud. Edição standard</p><p>brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Tradução</p><p>de J. Salomão. Vol.1. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1980. (Trabalho original</p><p>publicado em 1895).</p><p>FREUD, S. O ego e o id. In: S. Freud. Edição standard brasileira das obras</p><p>psicológicas completas de Sigmund Freud. Tradução de J. Salomão. Vol.</p><p>XIX. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1980. (Trabalho original publicado em 1923).</p><p>FREUD, S. Inibições, Sintomas e Ansiedade. In: S. Freud. Edição standard</p><p>brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Tradução</p><p>de J. Salomão. Vol.XX. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1980. (Trabalho original</p><p>publicado em 1926).</p><p>FREUD, S. Esboço de psicanálise. São Paulo: Cinebook, 2019. (Trabalho original</p><p>publicado em 1938).</p><p>GERBER, I. O medo da perda do amor. Revista Brasileira de Psicanálise, v.47,</p><p>n.1, p.32-40, 2013. Disponível em: <http://rbp.org.br/?magazine=124>.</p><p>Acesso em julho de 2013.</p><p>GONÇALVES, C. S. Medo, estranheza e desmedida na transferência. Revista</p><p>Brasileira de Psicanálise, v.47, n.1, p.41-51, 2013. Disponível em:</p><p><http://rbp.org.br/?magazine=124>. Acesso em agosto de 2023.</p><p>LAPLANCHE, J.; PONTALIS, J. B. Vocabulário da Psicanálise. São Paulo:</p><p>Livraria Martins Fontes Editora Ltda, 1992.</p><p>LISPECTOR, C. A paixão segundo G.H. Rio de Janeiro: Rocco, 2009. Disponível</p><p>em:<https://kbook.com.br/wp-content/files_mf/paix%C3%A3osegundogh.</p><p>pdf>. Acesso em agosto de 2023. (Trabalho original publicado em 1964).</p><p>MEIRELES, C. Obra poética. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1983.</p><p>NETO, D. A. C. Medo, o representante da morte. Revista Brasileira de</p><p>Psicanálise, v.52, n.1, p.45-56, 2018. Disponível em: <http://rbp.org.br/?</p><p>magazine=124>. Acesso em julho de 2023.</p><p>SANTOS, N. de T. G. dos; FORTES, I. Desamparo e alteridade: o sujeito e a</p><p>dupla face do outro. Psicologia USP, São Paulo, v.22, n.4, p.747-769, 2011.</p><p>VIEIRA, W. Medo de tudo, 2020. Disponível em: <https://gamarevista.</p><p>com.br/semana/ta-com-medo/medo-do-coronavirus-medo-de-tudo/>.</p><p>Acesso em junho de 2023.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>79</p><p>TEXTOS MULTIMODAIS PARA ALÉM DA LINGUAGEM</p><p>VERBAL</p><p>Uma perspectiva de leitura</p><p>Léia Bernal Sanches Correia1</p><p>Sones Lei Domingues Cintra 2</p><p>Viver numa sociedade globalizada é o mesmo que dialogar</p><p>com inúmeras vozes constantemente, pois desde os primeiros</p><p>dias de vida somos submetidos ao pluralismo cultural, a qual é</p><p>representada pelas imagens, estilos, línguas, sons e gestos que</p><p>circulam na sociedade por meio de recursos digitais e materiais.</p><p>Assim percebemos que a manifestação cultural é multimodal,</p><p>ou seja, ela pode ser exposta de diferentes modos e formas</p><p>dentro do contexto social.</p><p>Na maioria das práticas sociais nos conduz para novos</p><p>hábitos, que envolve ferramentas digitais, como o uso dos chats,</p><p>e-mails, lives entre outros. Essas linguagens digitais e os</p><p>aparelhos tecnológicos, como o celular incorporaram a nossa</p><p>rotina de vida com tanta rapidez e nos vemos reféns da</p><p>tecnologia, pois tudo gira em torno dela e a cada geração</p><p>ficamos cada vez mais alienados aos benefícios que ela nos</p><p>proporciona.</p><p>1 Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS – Campo</p><p>Grande); Professora do quadro permanente da rede pública municipal de ensino.</p><p>Colaboradora no Projeto de Pesquisa “Narrativas de Saberes Profissionais: diálogos sobre o</p><p>agente de letramento e o ensino de línguas”. Orcid https://orcid.org/0000-0002-9397-3404</p><p>Lattes http://lattes.cnpq.br/4216347771976002 E-mail:leiabernal@gmail.com</p><p>2 Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS – Campo</p><p>Grande); Profª. de Língua Inglesa do quadro permanente na Secretaria de Estado de</p><p>Educação do Estado de Mato Grosso do Sul (SED/MS). Lotada no Conselho Estadual de</p><p>Educação - Núcleo Pedagógico de Educação Profissional e Superior (CEE/NUPEPS).</p><p>Coordenadora Adjunta do GT de Ensino Superior do Fórum Estadual de Educação</p><p>(FEE/MS). Colaboradora no Projeto de Pesquisa “Narrativas de Saberes Profissionais:</p><p>diálogos sobre o agente de letramento e o ensino de línguas”. Lattes:</p><p>http://lattes.cnpq.br/0132614563780651 Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8436-2022. E-</p><p>mail: sonesley.sedms@gmail.com</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>80</p><p>Nesse contexto comunicacional, as novas formas de ler e</p><p>comunicar, trouxeram mudanças para o ensino, principalmente</p><p>com o advento da tecnologia digital e os recursos visuais, onde</p><p>as imagens tornam-se mais frequentes nos meios sociais, nas</p><p>propagandas, nas mídias, em materiais didáticos, direcionando</p><p>o professor para uma prática pedagógica mais multimodal para</p><p>produção de significados aos alunos.</p><p>As ferramentas digitais aprimoraram a forma de</p><p>comunicação enriquecendo o texto que outrora se limitava a</p><p>linguagem escrita e possibilitando a completude do valor que se</p><p>deseja transmitir em cada mensagem. Assim a compreensão</p><p>leitora resulta da junção entre o verbal e não-verbal, do visual e</p><p>audiovisual, cada técnica utilizada na expressão tem seu</p><p>objetivo de transmitir algo ao leitor.</p><p>Partindo do pressuposto que o aluno é letrado antes mesmo</p><p>de frequentar a instituição de ensino, a escola tem o papel</p><p>fundamental de conduzir os estudantes a leitura e compreensão</p><p>do todo numa visão crítica, analisando cada traço presente no</p><p>texto, pois cada experiência vivenciada acrescenta valores ao</p><p>saber do aluno, para tanto, ele precisa de estímulos que o</p><p>conduza a criticidade, que o leve a assimilar o que lê com o</p><p>contexto social e cultural em que vive.</p><p>Conforme Barros (2009, p. 1) “as atuais demandas de leitura</p><p>e escrita têm exigido dos leitores capacidades cada vez mais</p><p>avançadas de letramento, por exemplo, atribuir sentidos a textos</p><p>multimodais, quer sejam impressos ou digitais”, ou seja, é</p><p>necessário que a leitura seja para além do texto, compreendendo</p><p>o propósito do escritor.</p><p>Considerando que os textos multimodais fazem parte do</p><p>cotidiano dos alunos, pois em todo lugar se deparam com</p><p>anúncios publicitários, banners, outdoors entre tantos outros</p><p>modos de comunicação, trazer um texto que é familiar ao aluno</p><p>e propor a análise em sala de aula promove o envolvimento e</p><p>interesse que resultem significativamente na aprendizagem do</p><p>aluno.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>81</p><p>Desse modo, este artigo tem como objetivo destacar como</p><p>a multimodalidade contribui para a construção de sentido no</p><p>processo de formação leitora considerando os aspectos verbais</p><p>e não-verbais presentes na superfície textual, para tanto</p><p>analisaremos um texto multimodal destacando a possibilidade</p><p>de abordagem interdisciplinar e as vozes que ecoam por meio</p><p>dela num constante dialogismo intertextual.</p><p>O multiletramento e as práticas multimodais</p><p>A sociedade contemporânea está recheada de novas</p><p>tecnologias que favorecem os meios de comunicação, se em</p><p>décadas passadas havia limitação de recursos comunicativos,</p><p>atualmente as variedades eclodem de modo incontrolável que o</p><p>uso da forma escrita no papel está cada vez mais no segundo</p><p>plano.</p><p>A cultura híbrida onde a mesclagem da forma verbal e não</p><p>verbal, possibilita o contato do homem com diferentes recursos</p><p>multimidiáticos em qualquer ambiente que estiver. Assim desde</p><p>os primeiros anos de vida o ser humano já está envolvido com a</p><p>multimodalidade, ou seja, variadas formas de comunicação a</p><p>forma escrita, oral e audiovisual.</p><p>As inovações midiáticas permeiam os saberes favorecendo</p><p>as novas formas de ensinar nas escolas. Os alunos já chegam na</p><p>escola com saberes sociais e tecnológicos, e por estar</p><p>familiarizado com os recursos digitais, ao usar ferramentas</p><p>digitais como meio de ensino, o professor instiga o estudante a</p><p>ser mais ativo, participativo nas práticas educacionais.</p><p>Nesse contexto de multiplicidade cultural tecnológica, Rojo</p><p>e Moura (2012) apontam para o multiletramento, onde já não há</p><p>uma única forma e ensinar, mas trilhar pelo caminho da</p><p>semiótica, se apropriando dos meios audiovisuais, das imagens,</p><p>das imagens mesclado com a escrita e também o texto escrito.</p><p>Rojo (2012, p.13) afirma que:</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>82</p><p>Diferentemente do conceito de letramentos (múltiplos), que</p><p>não faz senão apontar para a multiplicidade e variedade das</p><p>práticas letradas, valorizadas ou não nas sociedades em</p><p>geral, o conceito de multiletramentos – é bom enfatizar –</p><p>aponta para dois tipos específicos e importantes de</p><p>multiplicidade presentes em nossas sociedades,</p><p>principalmente urbanas, na contemporaneidade: a</p><p>multiplicidade cultural das populações e a multiplicidade</p><p>semiótica de constituição dos textos por meio dos quais ela</p><p>se informa e se comunica.</p><p>A autora enfatiza a diferença existente entre o letramento e</p><p>o multiletramento destacando que o multiletramento envolve as</p><p>novas tecnologias nas práticas educativas, e o uso de textos</p><p>multimodais, conforme Hammes e Weiss (2011, p.01) “a</p><p>linguagem multimodal, aquela que integra som, imagem, texto</p><p>e animação, apresenta muitas vantagens ao contexto educativo,</p><p>colabora com o processo de ensino aprendizagem desde que</p><p>utilizada adequadamente”.</p><p>Considerando a presença dos recursos visuais no cotidiano</p><p>da sociedade, ao trazer recursos multimodais para sala de aula</p><p>o professor permite que seus alunos construam sentidos no que</p><p>lê, possibilitando que realize novas leituras com olhar crítico</p><p>para cada traço apresentado. Kress e Van Leeuwen (2001) ensina</p><p>que a multimodalidade está presente em toda forma de</p><p>expressão comunicativa, seja oral, escrita, com ou sem imagens,</p><p>pois mesmo que não haja imagens, a estrutura textual, os realces</p><p>no texto dialogam com o leitor na construção de sentidos.</p><p>Coscareli e Novais (2010) destaca que ao ler um texto</p><p>multimodal, o leitor deve acionar seus saberes e ler nas</p><p>entrelinhas analisando cada característica presente no texto, seja</p><p>na cor utilizada nas imagens, o layout da palavra, o design dos</p><p>parágrafos entre outros aspectos relacionados, todos devem ser</p><p>considerados e ler de forma dinâmica e integrada para melhor</p><p>compreensão do texto lido.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>83</p><p>A multiplicidade de linguagens leva os alunos a ter acesso</p><p>a grande quantidade textos, seja impresso, digitais ou não eles</p><p>estão presente nas práticas diárias nas escolas e uma delas é o</p><p>gênero das histórias em quadrinhos (HQ’s), que por possuir</p><p>utilizar imagens e texto escrito desperta a atenção dos alunos.</p><p>Partindo do pressuposto que toda expressão comunicativa</p><p>é multimodal, seja verbal ou não verbal ela apresenta suas</p><p>características próprias “que usa mecanismos próprios para</p><p>representar os elementos narrativos” (Ramos, 2016, p. 13) e de</p><p>acordo com os estilos, o veículo de circulação, as funções que</p><p>exercem, elas se enquadram dentro de uma tipologia textual e</p><p>consequentemente em um gênero textual.</p><p>Usamos a expressão gênero textual como uma noção</p><p>propositalmente vaga para referir os textos materializados</p><p>que encontramos em nossa vida diária e que apresentam</p><p>características sociocomunicativas definidas por conteúdos,</p><p>propriedades funcionais, estilo e composição característica.</p><p>Se os tipos textuais são apenas meia dúzia, os gêneros são</p><p>inúmeros. Alguns exemplos de gêneros textuais seriam:</p><p>telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance,</p><p>bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, reunião de</p><p>condomínio, notícia jornalística, horóscopo, receita</p><p>culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de</p><p>restaurante, instruções de uso, outdoor, inquérito policial,</p><p>resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea,</p><p>conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador,</p><p>aulas virtuais e assim por diante (Marcuschi, 2003, p. 22,23).</p><p>O gênero do texto que selecionamos para análise é a charge,</p><p>que faz parte do hipergênero história em quadrinhos. A charge</p><p>geralmente tem a função humorística, onde utiliza o humor para</p><p>criticar algo, aborda assuntos de cunho social, político, religioso,</p><p>artístico, ou temas da atualidade. O conteúdo representa o</p><p>personagem em forma de caricatura destacando um traço para</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>84</p><p>chamar atenção do leitor e pode utilizar a linguagem verbal ou</p><p>somente a linguagem visual.</p><p>A charge é um gênero jornalístico, pode ser veiculado por</p><p>revistas, jornais e outdoors, instigando no leitor um apelo</p><p>crítico acompanhado de ironia. As charges estão associadas</p><p>as circunstâncias ocorridas em determinados momentos da</p><p>atualidade e, também pode ser percebida enquanto texto</p><p>ilustrativo, acarretando assim o uso do humor, da imagem e</p><p>de elementos linguísticos (Trigueiro, 2019, p. 26).</p><p>Trata-se de um gênero textual de humor que aborda fatos</p><p>do cotidiano fazendo uma relação intertextual dentro de um</p><p>processo cognitivo e de interação, conforme depõe Romualdo</p><p>(2000), a charge além de transmitir informações compactadas,</p><p>ela é predominantemente visual e humorística, o que lhe dá o</p><p>caráter de intertextualidade. Nesse sentido, a charge escolhida</p><p>para análise retrata uma realidade social, é composta de</p><p>imagens e palavras com características contemporâneas.</p><p>Esse gênero carrega informações de um gênero híbrido,</p><p>pois faz uma reflexão da sociedade e para isso recorre ao modo</p><p>estrutural da charge (caricatura, linguagem visual, linguagem</p><p>escrita, cores, etc). Esse arquétipo textual se mistura com o</p><p>humor pelo seu caráter de texto curto e pelo jogo das palavras</p><p>como Possenti (1998) em seu livro “Os humores da língua:</p><p>análise linguística de piadas” apontando que o humor pode</p><p>estar presente no modo de utilizar as palavras, assim os</p><p>idiomatismos podem constituir um pretexto para os textos de</p><p>humor. Os efeitos de sentido de uma charge podem estar ligados</p><p>ao modo como as palavras estão organizadas no texto, podendo</p><p>recorrer ao duplo sentido da palavra, na ambiguidade, na</p><p>polifonia, entre outros elementos.</p><p>Nesse viés, para que o aluno compreenda e construa</p><p>sentidos sobre um texto multimodal ele precisa ter</p><p>conhecimento primeiramente sobre o gênero textual que a</p><p>informação está veiculando, assim como ter conhecimento de</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>85</p><p>mundo sobre o que está sendo retratado, no caso sobre o gênero</p><p>charge e sobre o assunto que a</p><p>temos em comum e assim, através de um apoio</p><p>mútuo, lutar de forma responsável pelo mesmo ideal. Esse tipo</p><p>de união faz tremer aqueles que nos querem ver separados.</p><p>Assim, é preciso, cada vez mais, trazer essas línguas para</p><p>as discussões acadêmicas e para a escola. Este é o objetivo deste</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>9</p><p>livro, reunir estudos que abordam práticas de ensino e</p><p>aprendizagem de línguas em contextos diversos e com isso</p><p>possibilitar que o outro se interconecte cada vez mais com o eu.</p><p>Pois somente com essa aproximação poderemos conhecer o</p><p>outro, respeitá-lo e agir responsavelmente perante ele. É por isso</p><p>que as línguas como o espanhol, segunda língua mais falada na</p><p>América Latina, não devem ser ocultadas, mas sim integradas</p><p>ao currículo escolar.</p><p>Os professores e pesquisadores da área do ensino de língua</p><p>têm um papel central nesse diálogo entre o eu e o outro que fala</p><p>uma língua diferente da nossa. Assim, este livro, reúne estudos</p><p>que exploram práticas de ensino e aprendizagem de línguas,</p><p>destacando a importância da diversidade e do diálogo na</p><p>construção de uma sociedade que consiga olhar mais para</p><p>aquele outro que fala uma língua diferente da nossa.</p><p>Que estas páginas sejam mais do que um mero registro</p><p>acadêmico, mas sim um convite à reflexão e à ação. Que</p><p>possamos, através do diálogo e da compreensão do outro, trilhar</p><p>o caminho do ato responsável.</p><p>Dr. Ronny Diogenes1</p><p>Referências</p><p>BAKHTIN, M. Para uma filosofia do ato responsável. São Carlos: Pedro e João</p><p>Editores, 2010.</p><p>BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.</p><p>ENGELS, F. Do Socialismo Utópico ao Socialismo Científico. 1880. Disponível</p><p>em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1880/socialismo/index.htm</p><p>Acesso em 15 fev. 2024.</p><p>NGOMANE, M. Ubuntu todos os dias. Trad. Dolinsky, S. M. Rio de Janeiro:</p><p>Editora BestSeller, 2022</p><p>VOLÓCHINOV, V. Marxismo e filosofia da linguagem. 1. ed. Trad. Grillo, S;</p><p>Américo, E. V. São Paulo: Editora 34, 2018.</p><p>VOLÓCHINOV, V. A palavra na vida e a palavra na poesia. 1. ed. Trad. Grillo,</p><p>S; Américo, E. V. São Paulo: Editora 34, 2019.</p><p>1 Professor do Departamento de Educação do Ceres-UFRN. Doutor em Linguagem e Ensino</p><p>(UFCG), Mestre em Formação de Professores (UEPB), Especialista em Libras (EFICAZ),</p><p>Licenciado em Letras (UFPE). E-mail: ronny.menezes@ufrn.br</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>10</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>11</p><p>VARIANTES LINGUÍSTICAS UTILIZADAS NO</p><p>PORTUGUÊS FALADO EM DOURADOS/MS</p><p>Um estudo sociolinguístico</p><p>Elza Sabino da Silva Bueno1</p><p>Neide Araújo Castilho Teno2</p><p>Sandra Espíndola3</p><p>O estudo que ora realizamos considerou o uso cotidiano da</p><p>língua portuguesa falada por informantes da região de</p><p>Dourados, Mato Grosso do Sul, com a finalidade de analisar</p><p>como o fenômeno linguístico eu e mim é utilizado por falantes</p><p>em atos espontâneos. Os sujeitos foram falantes ingressantes</p><p>e/ou concluintes de cursos superiores da UEMS, pois há uma</p><p>exigência desses sujeitos, uma forma de falar o mais próximo</p><p>possível da modalidade padrão da língua, uma vez que ao</p><p>concluírem sua formação disputarão vagas no mercado de</p><p>trabalho bastante exigente com relação aos padrões linguísticos,</p><p>tanto de oralidade como de escrita.</p><p>Para a materialização do objetivo foram realizadas</p><p>entrevistas in loco com sujeitos que já concluíram o ensino</p><p>superior e ou estavam concluindo e ou disputavam uma vaga</p><p>no mercado de trabalho. De um corpus maior realizamos um</p><p>recorte de doze informantes, sendo seis homens e seis mulheres,</p><p>1 Doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista – UNESP. Docente da</p><p>Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS, onde ministra aula na Graduação e</p><p>na Pós-Graduação. Vice Coordenadora do Programa de Mestrado Profissional em Letras -</p><p>PROFLETRAS da UEMS/Dourados e Pesquisadora da FUNDECT. E-mail: elza@uems.br</p><p>2 Doutora em Educação /Mestre em Letras. Pesquisadora Sênior do Programa de Mestrado</p><p>Profissional em Letras–PROFLETRAS, e do Programa de Mestrado Acadêmico em Letras</p><p>da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS/Dourados /Campo Grande.</p><p>Coordenadora do projeto de Pesquisa: (Multi) Letramentos e Os Gêneros Textuais e/Ou</p><p>Discursivos: Contribuições para o Ensino e Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais</p><p>( Propp/UEMS).Orcid. https://orcid.org/0000-0001-5062-9155 E-mail: cteno@uol.com.br</p><p>3 Doutora em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS/Porto Alegre.</p><p>Docente da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul – UEMS, onde ministra aula na</p><p>Graduação e na Pós-Graduação e Pesquisadora da FUNDECT. E-mail: sandraesp@uems.br</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>12</p><p>com nível superior de escolaridade e faixas etárias distintas,</p><p>contemplando faixas etárias entre 18 a 23, 24 a 30 e pessoas com</p><p>idade acima de 31 anos, com vistas a traçar o perfil e o falar</p><p>espontâneo desses sujeitos.</p><p>O aporte teórico-metodológico, seguiu os ensinamentos</p><p>Labov (2008/1983), Marcuschi (2008/2006), Mollica e Braga</p><p>(2015), Bueno (2003), além dos estudos da linguagem e da</p><p>gramática como Cegalla (2005) Bechara (2007), entre outros que,</p><p>de modo mais enfático, desenvolvem estudos acerca ao uso das</p><p>formas pronominais.</p><p>A sequência para o desenvolvimento do estudo se pautou</p><p>em leituras e fichamentos de obras de estudiosos que se dedicam</p><p>à temática estudada, entrevistas com os informantes</p><p>selecionados, em que se coletou os dados indispensáveis à</p><p>realização do estudo, preenchimento e triagem de fichas sociais</p><p>dos informantes e encaminhamento para as análises. A partir</p><p>das análises dos dados geraram-se percentuais de uso de “para</p><p>eu” e “para mim” no português falado pelos falantes da região de</p><p>Dourados-MS, resultados esses que são apresentados em forma</p><p>de gráficos, quadros e tabelas para uma melhor visualização dos</p><p>referidos percentuais.</p><p>O estudo dividiu-se em três partes distintas conforme</p><p>apresenta: a primeira descreve a fundamentação teórica e a</p><p>posição de gramáticos e estudiosos da linguagem sobre as</p><p>variáveis em questão. A segunda apresenta a metodologia</p><p>utilizada no desenvolvimento da pesquisa, passando pelo perfil</p><p>linguístico e social dos informantes. A terceira parte consiste na</p><p>análise dos dados e discussão dos resultados com relação às</p><p>variáveis linguísticas e sociais estudadas.</p><p>Por fim, as considerações finais descrevem as conclusões</p><p>e a relação com o referencial bibliográfico que serviu de suporte</p><p>para o estudo.</p><p>Fundamentos teóricos utilizados no estudo</p><p>Ao iniciar nossa discussão acerca dos estudos da</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>13</p><p>Sociolinguística faz-se relevante citar os pressupostos de</p><p>Saussure (2006, [1916]) que asseverava que a língua só poderia</p><p>ser estudada dentro do próprio sistema linguístico, pois sendo</p><p>ela estável, sincrônica, homogênea somente a partir de suas</p><p>relações internas, se conhece seus falantes. O estudioso Labov</p><p>(2008, [1972]), por sua vez, acrescenta que na sociedade a</p><p>comunidade de fala nunca se apresenta homogênea e por isso</p><p>não existe um falante-ouvinte ideal, o que temos são variações</p><p>heterogêneas nas comunidades de fala real.</p><p>Diante do exposto, é importante lembrar que, mesmo</p><p>estudando toda uma vida, ainda não é possível saber tudo</p><p>acerca do sistema linguístico de uma determinada língua, pois</p><p>sempre há algo a aprender, uma vez que a língua é viva, passou</p><p>e continua passando por um contínuo processo de evolução e</p><p>mudança linguística para atender as necessidades reais dos</p><p>falantes. Ela muda de uma região para outra, para atender às</p><p>necessidades do homem, muda inclusive com o próprio falante,</p><p>para auxiliá-lo no processo da interação verbal, Bueno (2003).</p><p>Neste</p><p>charge retrata.</p><p>De acordo com Kress, Leite-García e Van Leeuwen (2001,</p><p>apud Mazdzenski, 2008, p. 82):</p><p>A língua escrita está cada vez menos no centro e é menos</p><p>importante como meio de comunicação [...], produtores de</p><p>textos fazem uso cada vez mais de uma gama de modos de</p><p>representação e comunicação que coexistem dentro de um</p><p>dado texto. [...] É impossível interpretar textos prestando</p><p>atenção somente na língua escrita, pois um texto multimodal</p><p>deve ser lido em conjunção com todos os outros modos</p><p>semióticos desse texto.</p><p>Ao apresentar um texto multimodal em sala de aula para</p><p>conduzir a leitura crítica cabe utilizar as estratégias apontadas</p><p>por Solé (1998), o antes o durante e o depois, pois ao utilizar</p><p>essas estratégias o professor fará o levantamento de</p><p>conhecimento prévio, estimulará a criticidade e levará a</p><p>construção de sentidos. Se o texto for exposto ao aluno sem</p><p>nenhum preparo, o objetivo não será alcançado.</p><p>Com base nas estratégias de leitura, para que haja</p><p>compreensão do que é proposto é necessário analisar todo</p><p>contexto da charge, o espaço físico, as vestimentas, que</p><p>representa a função superior entre os personagens, a placa</p><p>apontando a função atribuída ao delegado, a posição que estão</p><p>sentados, a posição das mãos, o olhar e as falas nos balões. Todos</p><p>os elementos são categorias necessárias para que haja uma boa</p><p>interpretação.</p><p>A charge selecionada para análise, foi produzida pelo</p><p>chargista Amarildo e foi publicado originalmente em A Gazeta</p><p>em dezembro de 2011, já foi assunto de questão no ENEM e de</p><p>outras análises. A charge em questão faz uma crítica ao uso</p><p>excessivo de agrotóxicos na produção de alimentos naturais.</p><p>Trata da questão alimentar, onde o estímulo ao consumo das</p><p>frutas, verduras e legumes já não pode gerar bons resultados</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>86</p><p>devido a forma que é tratada pelos agricultores, assim para que</p><p>haja entendimento do aluno sobre a crítica retratada no texto,</p><p>ele precisa ter uma base do tema que está sendo apresentado.</p><p>Analisamos o corpus selecionado numa abordagem</p><p>qualitativa, considerando a temática voltada ao uso de</p><p>agrotóxicos nos hortifrutis e a crítica feita pelos consumidores,</p><p>observando a presença de elementos verbais e não verbais.</p><p>Tomamos como referência as propostas realizadas por Kress,</p><p>Leite-García e Van Leeuwen (2001) dando importância para o</p><p>aspecto multimodal como: a cor, a saliência, o olhar, o</p><p>enquadramento das imagens presentes na charge.</p><p>IMAGEM 1</p><p>.</p><p>Fonte:</p><p>https://www.gazetaonline.com.br/noticias/cidades/2015/10/charge-de-</p><p>amarildo-entra-em-questao-do-enem-sobre-agrotoxicos-</p><p>1013912688.html</p><p>Antes da análise pontuamos algumas indagações a respeito</p><p>da charge que podem ser levantadas para que o aluno pense e</p><p>pontue seu olhar sobre o texto, como por exemplo: onde os</p><p>personagens estão? Por que o homem está preocupado? Comer</p><p>frutas e legumes podem matar? Por que os agricultores usam</p><p>agrotóxicos, ela pode ou não ser usada? São questões que podem</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>87</p><p>conduzir a discussão e reflexão sobre o que está sendo</p><p>apresentado.</p><p>A partir das respostas dos alunos outras questões podem</p><p>ser levantadas, como o consumo de alimentos naturais, tipos de</p><p>alimentos que consomem diariamente, a forma correta do</p><p>cultivo e tratamento dos alimentos, a função do agrotóxico e a</p><p>importância de saber a dosagem correta para não prejudicar a</p><p>saúde dos consumidores entre outros.</p><p>Considerando a estrutura da charge observamos a presença</p><p>da ironia na queixa realizada ao delegado, dizendo que a mulher</p><p>queria matá-lo servindo os hortifrutis no jantar, com isso</p><p>registra-se a crítica da sociedade em relação ao excesso do dos</p><p>agrotóxicos que prejudicam a saúde.</p><p>As cores utilizadas tanto na parede, quanto nas roupas dos</p><p>personagens são cores opacas, cores que indicam a falta de</p><p>perspectiva em relação a vida, que o consumo de agrotóxico por</p><p>meio da alimentação afeta a motivação física dos consumidores</p><p>a qual se encontram reféns dos grandes produtores.</p><p>Outro fator que podemos notar é a posição das mãos dos</p><p>homens presentes na charge, de um lado o delegado anotando</p><p>com as mãos sobre a mesa e do outro o consumidor pedindo</p><p>socorro, porém ambas as expressões faciais indicam desespero,</p><p>pois estão na mesma situação.</p><p>A crítica apresentada vai além da sala de aula, pois envolve</p><p>toda sociedade e levanta questões problematizadoras que levam</p><p>a reflexão devido o desconhecimento por parte de muitos alunos</p><p>o quanto de agrotóxicos ingerimos diariamente sem perceber e</p><p>que estamos consumindo alimentos altamente contaminados</p><p>por agrotóxicos que deveriam ser saudáveis.</p><p>Percebemos então que assim como a charge, outros textos</p><p>multimodais apresentam a linguagem verbal e não-verbal para</p><p>enfatizar e transmitir uma mensagem e que cada elemento</p><p>constitui gerador de sentidos, basta que o leitor tenha</p><p>conhecimento prévio sobre o assunto para que a mensagem</p><p>tenha maior abrangência na vida do leitor.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>88</p><p>Considerações finais</p><p>O processo de letramento inicia-se antes mesmo da criança</p><p>ingressar em uma instituição de ensino, pois convive com</p><p>diferentes textos seja verbal ou não verbal na sociedade em que</p><p>vive. Diante disso a criança é capaz de realizar leituras de</p><p>imagens e palavras como “Coca Cola” são ações que antecipa a</p><p>alfabetização.</p><p>Nesse contexto de letramento onde a criança vive</p><p>bombardeada de informações, as novas tecnologias favorecem</p><p>as práticas educativas. Ao utilizar textos que circulam no</p><p>convívio social do aluno na sala de aula possibilita que um texto</p><p>ganhe nova visão leitora a partir das indagações levantadas em</p><p>sala de aula e levar o aluno a habituar numa nova perspectiva</p><p>de leitura para além das palavras.</p><p>Assim, repensar as formas de ensinar adotando práticas</p><p>com recursos multimidiáticos reflete em resultados</p><p>significativos na aprendizagem do aluno e consequentemente</p><p>na formação crítica do cidadão leitor, desencadeia em ações</p><p>ativas, pois leva o aluno a analisar propostas sociais, tomar</p><p>decisões próprias e propor novas ideias a partir do seu</p><p>conhecimento intelectual construído no ambiente educacional</p><p>por meio da leitura.</p><p>Referências</p><p>BARROS, Cláudia Graziano P. Capacidade de leitura de textos multimodais.</p><p>POLOFONIA, Cuiabá, EDUFMT, p.161-186, 2009. ISSN 0104-687X.</p><p>COSCARELLI, Carla Viana. CANI, Josiane Brunetti (Orgs.). Multiletramentos e</p><p>multimodalidade: ações pedagógicas aplicadas à linguagem. Campinas,</p><p>SP: Pontes Editores, 2016, p. 15-48.</p><p>KRESS, G. VAN LEEUWEN, T. Multimodal Discourse: The modes and media</p><p>of contemporary communication. London: Arnold, 2001.</p><p>MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In:</p><p>Gêneros textuais e ensino. 2. ed. Ângela Paiva Dionísio, Ana Rachel</p><p>Machado, Maria Auxiliadora</p><p>Bezerra (Orgs). São Paulo: Parábola Editorial, 2003.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>89</p><p>MAZDZENSKI, Leonardo. Multimodalidade e Gênero Textual: analisando</p><p>criticamente as cartilhas jurídicas. Editora Universitária, Recife, 2008.</p><p>POSSENTI, S. Os humores da língua: análise linguística de piadas. São Paulo:</p><p>Mercado de Letras, 1998.</p><p>RAMOS, Paulo. A leitura dos quadrinhos. São Paulo: Contexto, 2016.</p><p>ROMUALDO, E. C. Charge jornalística: intertextualidade e polifonia. Maringá:</p><p>Ed. da UEM, 2000.</p><p>ROJO, Roxane; ALMEIDA, Eduardo de Moura (Orgs.). Multiletramentos na</p><p>escola. São Paulo: Parábola Editorial, 2012.</p><p>SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 1998.</p><p>TRIGUEIRO, Hyoucoama Rodrigues. O gênero textual Charge no processo de</p><p>formação do leitor crítico. Manuscrito, 2019.</p><p>WEISS, Jaqueline Raquel; HAMMES, Marli Hatje. A importância da linguagem</p><p>multimodal ao contexto da</p><p>educação. Disponível em:</p><p>http://www.efdeportes.com/efd160/linguagem-multimodal-ao-contexto-</p><p>da -educação.htm Acesso em 16/09/2023.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>90</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>91</p><p>A DIGLOSSIA E O BILINGUISMO E O PROCESSO DE</p><p>EDUCAÇÃO SUPERIOR DE ALUNOS ÍNDIOS</p><p>Uilian Mendes da Costa1</p><p>Neide Araújo Castilho Teno2</p><p>O estudo que ora desenvolvemos propõe discutir os</p><p>conceitos de bilinguismo e de diglossia, bem como a realidade</p><p>plurilíngue e multicultural de modo a delinear situações em que</p><p>o aluno indígena, no mesmo contexto social, necessite usar a</p><p>língua materna, a segunda língua ou as duas línguas ao mesmo</p><p>tempo para se comunicar.</p><p>O objetivo principal foi o de estudar as relações de diglossia</p><p>e de bilinguismo das comunidades em situação bilíngue, a fim</p><p>de entender como esses sujeitos lidam com o domínio de duas</p><p>ou mais línguas nas suas relações acadêmicas. A reflexão parte</p><p>de experiência de ensino com alunos índios matriculados nas</p><p>escolas de Educação Superior, no Município de Cacoal-</p><p>Rondônia-MT.</p><p>O falante bilíngue produz enunciado ao escrever, ao falar,</p><p>ao ouvir e ao ler em mais de uma língua dentro do contexto</p><p>social em que vive e atua, e, por sua vez, consegue desenvolver</p><p>suas competências e habilidades na condição de bilíngue,</p><p>mesmo que uma das línguas tenha menor prestígio social que a</p><p>outra.</p><p>Partimos do pressuposto de o aluno bilingue utiliza a</p><p>1 Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS – Campo</p><p>Grande –MS. Graduado em Letras pela Unesc – Faculdades integradas de Cacoal – RO.</p><p>Especialista em Didática do Ensino Superior pela Facimed – Faculdade de Ciências</p><p>Biomédicas de Cacoal -RO. Especialista em Ensino da Língua Inglesa pela Famart – Itaúna-</p><p>MG. Orcid. https://orcid.org/0000-0003- 4313-3252. E-mail: willian.m.wmc@gmail.com</p><p>2 Doutora em Educação/Mestre em Letras. Pesquisadora Sênior do Programa de Mestrado</p><p>Profissional em Letras–PROFLETRAS, e do Programa de Mestrado Acadêmico em Letras</p><p>da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul–UEMS/Dourados/Campo Grande, Brasil.</p><p>Coordenadora do projeto de Pesquisa. “(Multi) Letramentos e os Gêneros Textuais e ou</p><p>Discursivos: contribuições para o ensino e aprendizagem de línguas em Tempos Digitais.</p><p>Orcid. https://orcid.org/0000-0001-5062-9155. E-mail: cteno@uol.com.br</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>92</p><p>segunda língua em algumas situações e a língua materna ou as</p><p>duas dentro e fora da escola. Não é possível inferir que o aluno</p><p>índio use a segunda língua como o principal meio de interação</p><p>comunicacional para administrar sua vida sócio-acadêmica,</p><p>visto que é possível que ele utilize a sua língua materna para se</p><p>socializar com outros alunos índios e na busca de elementos</p><p>socioculturais que auxiliam na compreensão do novo.</p><p>Diante de tal paradigma, como o aluno índio utiliza sua</p><p>língua materna e a segunda língua no processo de interação</p><p>sócio-acadêmica e na aquisição do conhecimento, problema que</p><p>norteia este estudo.</p><p>No encontro de duas línguas, pode originar outras</p><p>variantes, até mesmo uma complexidade do estudante em</p><p>entender um dos dois idiomas completamente, o que pode</p><p>dificultar o ensino aprendizagem a educação. Nessa simbiose de</p><p>duas línguas, enquanto arsenal linguístico adquirido pelo aluno</p><p>indígena adquire, causa conflitos internos na comunidade</p><p>indígena, além do conflito externo com o branco em seu</p><p>contexto escolar, levando modificações na sua língua nativa,</p><p>oriundo dos conhecimentos adquiridos na academia</p><p>(faculdade).</p><p>Neste cenário, destacamos a importância de investigar e</p><p>repensar, se for o caso, na reorganização dos currículos das</p><p>Universidades para receber alunos indígenas, ou seja, não só</p><p>para receber mas para fazer um acompanhamento a fim de que</p><p>o acadêmico indígena não só entre no ensino superior mas que</p><p>permaneça nele e que possa dar continuidade em sua formação</p><p>continuada em outros níveis mais profundos, a exemplo de pós-</p><p>graduação lato e stricto sensu.</p><p>Importante considerar que a educação superior deve</p><p>desenvolver experiências de aprendizagem pelas quais o</p><p>estudante desenvolva competências coerentes com aquelas</p><p>exigidas pelo mercado de trabalho e que cultive o pensamento</p><p>crítico e reflexivo. Por este viés, salientamos a importância de as</p><p>instituições de ensino superior prepararem-se para atuarem e</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>93</p><p>intervirem na formação dos alunos, procurando indicar</p><p>melhores caminhos para sanar as dificuldades do acadêmico</p><p>índio com a segunda língua e, sobremaneira, com a aquisição de</p><p>novos conhecimentos utilizando essa mesma língua.</p><p>No que concerne à metodologia deste estudo, partimos de</p><p>um estudo bibliográfico, a qual foi sistematizada,</p><p>preliminarmente, em leituras, análises e comparações entre as</p><p>teorias sustentadas pelos autores a respeito do assunto.</p><p>Bilinguismo e a diglossia na formação do aluno índio</p><p>Bilinguismo</p><p>O Brasil, desde a chegada dos europeus, é um país</p><p>multilíngue com uma diversidade de grupos indígenas</p><p>espalhados por todo seu território, na sequência uma</p><p>diversidade de estrangeiros chegara em solo brasileiro, visto</p><p>que já não era um país monolíngue com as chegadas de</p><p>imigrantes europeus, asiáticos e africanos ocorre uma</p><p>efervescência linguística, surge a necessidade de denomina a</p><p>língua geral como língua oficial para melhorar a comunicação</p><p>no Brasil e fortalecer a língua brasileira, posteriormente</p><p>Marquês de Pombal impõe a língua europeia, o português.</p><p>Nos dias atuais, vivencia-se a efervescência linguística</p><p>impulsionada pela tecnologia, a globalização, a evolução do</p><p>comércio e da indústria, a revolução nas comunicações</p><p>eletrônicas fomentada pelo crescimento e expansão da internet,</p><p>que proporciona a comunicação rápida, fácil e acessível com</p><p>qualquer indivíduo em qualquer parte do mundo.</p><p>Bem como as imigrações continuam aquecidas, nos dias</p><p>atuais, em solo brasileiro, por haitianos, venezuelanos e</p><p>refugiados de guerras ou que sofreram crimes contra os direitos</p><p>humanos, fatores preponderantes que intensificam o</p><p>multilinguismo no Brasil.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>94</p><p>Neste contexto sociocultural coexistem várias línguas bem</p><p>como as línguas indígenas, as quais são, hoje, a minoria cultural,</p><p>étnica que tem a necessidade de interagir entre si e em grupos</p><p>majoritários decorrentes de situações sociais imprescindíveis</p><p>para sua sobrevivência e crescimento pessoal e profissional</p><p>como interações em mercados, lojas, bancos e universidades.</p><p>Nesse viés, é natural que grupos indígenas utilizem a</p><p>língua materna em sua comunidade, interação com amigos e</p><p>pais, e externo a comunidade linguística a que pertence utilizem</p><p>a segunda língua para comprar mantimentos, roupas, calçados,</p><p>para utilizar redes bancarias, para sua educação em escolas e</p><p>universidades.</p><p>Evidencia-se a pluralidade linguística, situações que</p><p>conduzem ao bilinguismo, uma vez que, entende-se,</p><p>empiricamente, que o bilinguismo é caracterizado pela</p><p>utilização de duas línguas por um mesmo sujeito, dentro ou fora</p><p>de sua comunidade linguística.</p><p>Por conseguinte, Mackey (2000. p. 29) esclarece que</p><p>“bilinguismo é considerado o domínio igual de duas línguas”,</p><p>sendo assim, uma não interfere na outra, nessa perspectiva o</p><p>falante domina a gramática – a leitura e a escrita –, as condições</p><p>semânticas que as gírias impõem no meio social que ambas as</p><p>línguas vinculam dentro de grupos sociolinguísticos ou não,</p><p>como boleiros, skatistas e pagodeiros.</p><p>Ampliando a discussão Myers-Scotton (2006, n. p) revela</p><p>que “bilingue é um sujeito falante de no mínimo duas línguas,</p><p>as quais não necessita o domínio completo dessas línguas”, veja</p><p>que à primeira</p><p>vista a definição de bilinguismo parece simples,</p><p>mas existem posições teóricas distintas e muitas vezes extremas.</p><p>Assim, há falantes bilingues que têm níveis linguísticos</p><p>variáveis, os quais um domina mais a língua oral e menos a</p><p>escrita, outro exerce o domínio na escrita e na fala existe uma</p><p>dificuldade de pronúncia como aqueles que tem dificuldade de</p><p>audição, de compreensão daquilo que foi dito, Wei (2000, p. 17)</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>95</p><p>“bilingue é quem utiliza dois idiomas independente do seu nível</p><p>de proficiência”.</p><p>Quanto as habilidades do sujeito bilingue vária de um</p><p>indivíduo a outro, da forma que usa as línguas no cotidiano,</p><p>Garcia (2009, p. 61) cristaliza que o bilingue apresenta</p><p>habilidades orais em uma ou outra língua, “as habilidades de</p><p>ouvir e falar, e não ser alfabetizado, de ler e escrever em ambas</p><p>as línguas ou somente em uma, cada habilidade pode ser</p><p>manifestada em combinação diferente”, situações linguísticas</p><p>que são naturais dos falantes de duas ou mais línguas.</p><p>Visto que, a construção linguística, oralidade e escrita, é um</p><p>processo de aprendizagem constante, não há falante</p><p>perfeitamente idealizado, mas a construção de falantes se dá</p><p>com o contato linguístico, dia após dia, e a experiência</p><p>sociocultural a partir da língua nativa, a qual conduz ao</p><p>crescimento linguístico do falante e sequencialmente ao</p><p>domínio da segunda língua por intermédio das experiências</p><p>linguísticas e o contato com a segunda língua.</p><p>Desse modo, Maher (2007, p. 73) expõe, “o bilíngue, não o</p><p>idealizado, mas o de verdade, não exibe pensamentos idênticos</p><p>na língua X e na língua Y, a depender de suas necessidades</p><p>impostas por história pessoal ou pela exigências de sua</p><p>comunidade de fala”, as quais impõem intrinsecamente o sujeito</p><p>bilíngue executar melhor uma língua do que a outra em suas</p><p>interações. Defende a estudiosa do caráter de transitoriedade</p><p>pois a todo momento encontramos situações do sujeito transitar</p><p>entre duas ou a possibilidade de acontecer o contrário. Nessa</p><p>ótica, a estudiosa reforça a ideia e uma concepção de</p><p>bilinguismo como sistemas separados, confiando que o</p><p>bilinguismo pode ser a adição de dois monolíngues.</p><p>Situações linguísticas que o acadêmico indígena se</p><p>encontra, a qual necessita da sua segunda língua para interação</p><p>na educação superior, exigência não só de sua comunidade</p><p>sociolinguística mas para a sobrevivência, para interagir com</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>96</p><p>professores, alunos, coordenação pedagógica, entender a ciência</p><p>e aplicar o conhecimento no mercado de trabalho.</p><p>Dubois (2006) norteia o bilinguismo, o qual entendemos o</p><p>mais adequado no aporte da educação:</p><p>[...] bilinguismo é a situação em que as línguas em tela São</p><p>do mesmo status [...]. Como a situação dos indígenas que</p><p>utiliza sua língua materna em seu convívio social na sua</p><p>tribo e utiliza a segunda língua para ir ao mercado, a escola,</p><p>usa para o seu convívio social fora das tribos (Dubois 2006,</p><p>p. 88)</p><p>No caso em questão, entende-se que a tese acima</p><p>defendida por Dubois (2006), aplica-se aos índios da região de</p><p>Cacoal, visto que usam duas línguas, a materna para a interação</p><p>social na comunidade de origem e a língua portuguesa para os</p><p>negócios e interação com o “homem branco”.</p><p>Diglossia</p><p>A diglossia é outro conceito muito importante na ceara</p><p>dessas discussões linguísticas, visto que procura explicar as</p><p>relações bilíngues de indivíduos que vivem em constante</p><p>interação com sua própria comunidade e com outras</p><p>comunidades das quais dependem sócio e economicamente</p><p>como é o caso dos povos indígenas de Cacoal e região.</p><p>Hamel e Sierra (1983 p. 90) considera que “o bilinguismo</p><p>é visto em uma perspectiva individual e a diglossia social”,</p><p>características que camuflam, por vezes, o conflito sociocultural</p><p>subjacente, a funcionalidade, a interação de duas línguas que</p><p>são usadas em contextos diferentes, as quais põe em dúvida a</p><p>suposta relação estável dentro e fora da comunidade.</p><p>Conflitos sociais, econômicos e de línguas distintas são</p><p>aspectos inerentes entres o contato linguístico. Hamel (1988)</p><p>considera os conflitos como uma maneira de poder sobre as</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>97</p><p>sociedades, e nesta perspectiva, subjaz aos conflitos linguísticos</p><p>as relações de poder entre grupos dominantes e grupos</p><p>dominados, para alcançar uma transformação social.</p><p>Nesse viés, quando duas ou mais línguas se encontram,</p><p>ocorre uma hierarquia e uma minorização dos status de uma das</p><p>línguas, diante disso, Dubois (2006, p. 179) esclarece, “dá-se de</p><p>maneira geral o nome de diglossia à situação de bilinguismo, dá-</p><p>se a diglossia o sentido bilíngue, a qual uma das duas línguas é</p><p>de status sociopolítico inferior”, isso em virtude do caráter sócio-</p><p>histórico, sociocultural, sociolinguístico e ideológico que é</p><p>intrínseco a língua.</p><p>Portanto, duas línguas faladas em uma mesma</p><p>comunidade gera uma disputa de poder que propiciará maior</p><p>status de uma língua em relação a outra, mesmo que as duas</p><p>línguas tenham papeis definidos dentro e fora da comunidade</p><p>haverá um confronto, uma interferência, uma instabilidade</p><p>linguística, pois o grupo social utiliza-se da língua, da cultura</p><p>para afirmar a identidade e o seu papel na sociedade, ainda que</p><p>fora da comunidade utilize a segunda língua para sobreviver.</p><p>A definição do conceito diglossia perpassa por uma</p><p>situação de conflito entre língua dominante e dominada,</p><p>variedade de prestigio e variedade necessária para</p><p>sobrevivência cultural, estigmatizada, tensão linguística que</p><p>tem ampliado e polarizado o conceito, Assevera Hamel e Sierra</p><p>(1989, p.19) que “ defende uma concepção de diglossia mais</p><p>amplificada, como parte integrante de conflitos interculturais de</p><p>relações sociolinguísticas assimétrica”.</p><p>Maher (1997, p. 21) explica a diglossia como “uma relação</p><p>de conflito não estável e assimétrica entre a língua dominante e</p><p>a dominada”. Essa noção proporciona compreender o</p><p>fenômeno da diglossia por meio das relações sociais de</p><p>desigualdade, o que vai exigir do estudioso conhecer a história</p><p>social das comunidades de falantes de línguas minoritárias.</p><p>Diante desse contexto, há uma hierarquização linguística</p><p>em relação as línguas em contato e uma crença de uniformidade,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>98</p><p>visto que cada uma tem sua importância, conjuntura de valores,</p><p>sujeitos diglóssico e bilingue, diglóssico ou apenas bilingue</p><p>naturalmente tem conflitos linguísticos em algum momento da</p><p>comunicação (no ouvir ou no falar) externo ao seu grupo</p><p>linguístico, situações as quais rementem as variações</p><p>linguísticas, influências sociolinguísticas e socioculturais.</p><p>Língua/linguagem</p><p>A língua reflete a forma de pensar de uma determinada</p><p>sociedade, em cada grupo social que inserimos como elemento</p><p>comunicativo ativo.</p><p>A primeira língua aprendida na infância corresponde à</p><p>língua materna e não necessariamente à língua oficial do país</p><p>onde se vive. Gallison e Coste (1983, online3) afirmam: “a língua</p><p>materna é assim chamada porque é o primeiro instrumento de</p><p>comunicação”.</p><p>As pessoas têm a necessidade de aprender a língua materna</p><p>para se comunicar, em seu grupo familiar, seu grupo cultural ou</p><p>étnico. Mackey (1972) apud Ança (1999; online4) propôs três</p><p>critérios para a lexia língua materna: a primazia, a primeira</p><p>língua aprendida, domínio, a língua que se domina melhor e a</p><p>associações pertença a um determinado grupo cultural ou étnico.</p><p>É da língua materna que a criança vai estabelecendo sua</p><p>gramática, e desenvolvendo em direção da gramática dos</p><p>adultos da comunidade onde vive.</p><p>Denominada língua não materna, e segunda língua termo</p><p>aplicado para referir-se ao código aprendido depois da língua</p><p>materna, que</p><p>pode ser língua não materna dentro de fronteiras</p><p>territoriais que tem função reconhecida como língua oficial,</p><p>3Disponível em http://www.portaldoconhecimento.gov.cv/handle/10961/1642?mode=</p><p>simple&submit_simple=Mostrar+registo+em+formato+simples. Acesso em: 18 de</p><p>novembro de 2014.</p><p>4Disponível em: http://www.portaldoconhecimento.gov.cv/handle/10961/1642?mode=</p><p>simple&submit_simple=Mostrar+registo+em+formato+simples. Acesso em: 18 de</p><p>novembro de 2014.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>99</p><p>sendo denominada língua não materna de língua usada na</p><p>escola, situação em que algumas tribos indígenas convivem.</p><p>Segundo Richards (1987) apud Leiria (1999 online5) o termo</p><p>segunda língua tem sido usada com frequência em Linguística</p><p>Aplicada, “para referir à aprendizagem de qualquer língua</p><p>depois da primeira independentemente do estatuto dessa língua</p><p>em relação a quem a aprende ou ao país em que essa língua está</p><p>a ser aprendida”(Richards ,1987, p. 7)</p><p>No contexto linguístico, a segunda língua de um povo é a</p><p>língua tida como não oficial e, quase sempre, usada como língua</p><p>coadjuvante nas relações sociais, trata-se da língua que é objeto</p><p>e veículo de ensino, é definida de natureza língua não materna.</p><p>Nesses casos, as tribos, os grupos culturais ou étnicos que</p><p>utilizam as duas línguas são reconhecidos como bilíngues, as</p><p>duas línguas têm o mesmo valor cultural. Afirmam Mateus e</p><p>Xavier (1992, online6) “que o bilinguismo é a situação em que</p><p>duas línguas coexistem na mesma comunidade e apresenta</p><p>competência gramatical e comunicativa”, visto que quando o</p><p>sujeito bilíngue tem uma das línguas desprestigiada, ou seja,</p><p>sem prestigio social com status inferior, é um sujeito bilíngue</p><p>diglossico, uma vez que, a diglossia é um bilinguismo.</p><p>Manutenção da língua</p><p>O cenário social, cultural e linguístico dos indígenas com</p><p>povos não indígenas produz efeito na formação educativa em</p><p>jovens e adultos indígena.</p><p>No processo de aquisição de uma língua não materna, o</p><p>sujeito falante em uma fase não estabilizada de conhecimento da</p><p>língua, recorrerá às estrutura da língua materna ocorrendo uma</p><p>5Disponível em: http://www.portaldoconhecimento.gov.cv/handle/10961/1642?mode=sim</p><p>ple&submit_simple=Mostrar+registo+em+formato+simples. Acesso em: 18 de junho de</p><p>2014.</p><p>6Disponível em: http://www.portaldoconhecimento.gov.cv/handle/10961/1642?mode=sim</p><p>ple&submit_simple=Mostrar+registo+em+formato+simples. Acesso em: 18 de junho de</p><p>2014.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>100</p><p>influência da língua não materna na língua materna. Ramos</p><p>(2004 online7) explica que: “um dos aspectos mais importantes a</p><p>considerar-se no processo de aquisição de segunda língua é a</p><p>qualidade das interações feitas para tal processo”.</p><p>Assim percebemos a importância da manutenção da língua</p><p>desde o processo de aquisição, um sujeito bilíngue tende a ser</p><p>mais expressivo mais comunicativo do que, os que têm uma</p><p>única língua, desta maneira ninguém negaria que existe</p><p>diferenças no comportamento e no uso da língua entre grupos</p><p>étnicos e culturais, a língua é um importante meio de</p><p>manutenção da identidade do grupo. Segundo Le Page (1980,</p><p>online8), “todo ato de fala é um ato de identidade. Sem</p><p>manutenção da língua as diferenças causam problemas</p><p>educacionais”. E expõe Antunes (2003, online9) que: “a atividade</p><p>pedagógica do vernáculo deve tomar como eixos fundamentais</p><p>quatro campos: oralidade, escrita, leitura e gramática”.</p><p>Moura (online10) afirma com base em (Antunes, 2003, p. 89)</p><p>que, desta maneira, a oralidade deverá ser voltada a variedades</p><p>de tipos de gênero de discurso oral, oralidade orientada para</p><p>facilitar o convívio social, proporcionando competência</p><p>comunicativa, a escrita aponta atividades que fortalecer a</p><p>integração do vernáculo na composição de textos, no que se</p><p>refere na prática de leitura, deve-se colocar atividades</p><p>diversificadas que devem garantir leituras motivadas, tendo</p><p>como meta uma atividade crítica que chega a interpretação de</p><p>aspectos ideológicos dos textos, e do cenário cultural, a</p><p>gramática não terá função de si mesma, mas em função do que</p><p>7Disponível em:http://www.uniesp.edu.br/revista/revista11/pdf/artigos/08.pdf. Acesso em:</p><p>18 de junho de 2014.</p><p>8 Disponível em: http://cetrans.com.br/artigos/Tercia_Ataide_Franca_Teles.pdf. Acesso em:</p><p>18 de junho de 2014.</p><p>9 Disponível em: http://www.inventario.ufba.br/09/9/ENSINO-APRENDIZAGEM%</p><p>20DE%20L%C3%8DNGUA%20PORTUGUESA%20DIVERSIDADE%20LINGU%C3%8DS</p><p>TICA.pdf. Acesso em: 18 de junho de 2014.</p><p>10http://www.inventario.ufba.br/09/9/ENSINO-APRENDIZAGEM%20DE%20L%C3%8DN</p><p>GUA%20PORTUGUESA%20DIVERSIDADE%20LINGU%C3%8DSTICA.pdf. Acesso em:</p><p>18 de junho de 2014.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>101</p><p>as pessoas falam, ouvem, leem e escrevem nas práticas sociais</p><p>linguísticas de uso da língua.</p><p>Nos grupos de classes mais desfavorecidas, como alguns</p><p>grupos indígenas, dominar a língua falada pelas classes</p><p>favorecidas, ou seja, dominar a segunda língua pode favorecer</p><p>a níveis superiores de ensino e a melhores condições de vida,</p><p>além de poder conhecer e exercer com plenitude os seus direitos</p><p>de cidadão, ter acesso à internet, a jornais, livros, revistas</p><p>científicas e periódicos, ter acesso a faculdade de forma plena</p><p>podendo não somente inserir mas concluir o nível superior, ter</p><p>acesso a lojas, mercados, farmácia, por este viés é importante a</p><p>manutenção da língua, e língua por si mesma é um importante</p><p>meio de manutenção da identidade do grupo. Antunes (2003,</p><p>online11): menciona que compreender a língua pode favorecer a</p><p>formação do sujeito para a cidadania.</p><p>O próprio referencial sugere que na formação do sujeito em</p><p>contexto bilíngue torna necessário considerar as atividades a</p><p>partir da primeira língua, ou seja, numa comunidade indígena,</p><p>inicia pela língua indígena. E gradativamente o ensino avance,</p><p>na mesma proporção, seja introduzido a segunda língua. O</p><p>RCNEI (referencial curricular nacional para as escolas</p><p>indígenas) indica a linguagem oral nas escolas indígenas para</p><p>estimular os alunos à competência comunicativa, e para isso</p><p>sugere temas descritivos como: brincadeiras infantis,</p><p>dramatizações, jogos, fatos do cotidiano (construção de casas,</p><p>pescarias, ornamentações, caçadas, festas tradicionais)</p><p>(Brasil/Mec,1998, p. 132)</p><p>O acesso à segunda língua não deve ser um processo de</p><p>transição de uma cultura para outra e sim uma ampliação do</p><p>universo cultural do grupo social do indivíduo. Moura (online12)</p><p>11http://www.inventario.ufba.br/09/9/ENSINO-APRENDIZAGEM%20DE%20L%C3%8DN</p><p>GUA%20PORTUGUESA%20DIVERSIDADE%20LINGU%C3%8DSTICA.pdf Acesso em:</p><p>18 de novembro de 2023.</p><p>12http://www.inventario.ufba.br/09/9/ENSINO-APRENDIZAGEM%20DE%20L%C3%8DN</p><p>GUA%20 PORTUGUESA%20DIVERSIDADE%20LINGU%C3%8DSTICA.pdf Acesso em:</p><p>18 de novembro de 2023.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>102</p><p>afirma, amparado por Mendes (2004), que “um cidadão</p><p>linguisticamente crítico e competente, é a partir da ampliação de</p><p>suas competências comunicativo-interacionais”.</p><p>Um indivíduo e/ou um grupo social sem acesso à leitura e</p><p>a escrita ficam excluídos de práticas sociais de letramento que</p><p>lhes proporciona melhor integração e condição de exercício de</p><p>sua cidadania.</p><p>Nesse cenário, multicultural com a evolução da tecnologia</p><p>cada vez maior, a língua não pode ser mais uma barreira e sim</p><p>uma ponte para novos horizontes, o bilinguismo envolve</p><p>dimensões que vão além dos signos cria-se contato com diversas</p><p>etnias determina adaptações dos falantes à sociedade e ao</p><p>mercado atual de trabalho, no centro dessa pluralidade</p><p>linguística dessas transformações sociais, culturais a educação</p><p>superior estará com o desafio de redesenhar um currículo, pois</p><p>as mudanças ali configuradas indicam a medida efetiva que</p><p>podem influenciar o desenvolvimento</p><p>dos estudantes bilíngues.</p><p>Evidenciam Brown; Bull; Pendlebury, (1997, online13) que:</p><p>“tais práticas podem influenciar, por exemplo, a natureza das</p><p>experiências de aprendizagem experimentada pelos alunos,</p><p>como eles se envolvem com os estudos, que conhecimentos são</p><p>importantes e como se veem no ensino universitário”.</p><p>Evidenciamos que o bilinguismo é uma capacidade</p><p>humana de fazer uso de mais de uma língua, trata-se de um</p><p>fenômeno multilinguisticocultural que deve ser analisado em</p><p>espaço social, por isto devemos pensar na educação sempre em</p><p>termos interculturais, transculturais e transdisciplinar, levando</p><p>em consideração todas as dimensões sociais culturais do ser</p><p>humano.</p><p>Deste modo, não há o que se falar em educação de</p><p>indivíduo bilíngue sem considerar todos os aspectos que foram</p><p>apresentados neste estudo devidamente fundamentados com as</p><p>13Disponível em: http://www.difdo.diren.prograd.ufu.br/Documentos/Avaliacao_e_Apren</p><p>dizagem_Ensino_Superior.pdf . Acesso em: 18 de novembro de 2023.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>103</p><p>renomadas autoridades no assunto. A instituição de ensino</p><p>superior, ou outra, que tem alunos bilíngues corre o risco de não</p><p>estarem promovendo a educação formadora.</p><p>Knapp (2016) em sua tese de doutorado “O Ensino Bilíngue</p><p>e Educação Escolar Indígena para os Guarani e Kaiowá de MS”</p><p>apresenta a questão do bilinguismo nessa comunidade. Os</p><p>povos Guarani e Kaiowá deixam evidências na importância de</p><p>aprender português por conta do contato, todavia “classificar</p><p>essas comunidades essencialmente como comunidades</p><p>bilíngues é generalizar e apagar outras realidades linguísticas</p><p>dentro dessas comunidades” (Knapp,2016, p. 180). Ao lado</p><p>dessa realidade de acordo com o estudioso Knapp a</p><p>aprendizagem do português trata de uma necessidade de</p><p>sobrevivência, cidadania e deve ser ensinada a partir da escola</p><p>nas áreas indígenas.</p><p>Considerações finais</p><p>O estudo apresentado partiu de uma pesquisa de cunho</p><p>teórico, material que versa sobre o estudo da educação e da</p><p>linguagem e sua influência na sociedade e a importância desses</p><p>eventos para a formação do indígena.</p><p>Ressaltamos o que determina a escolha de uma língua de</p><p>um sujeito bilíngue ou diglossico (bilíngue/diglossico) é a</p><p>situação de comunicação, a escolha é um processo associado a</p><p>múltiplos papéis sociais que o falante assume, processo</p><p>inconsciente constitutivo da identidade social.</p><p>Salientamos a importância das instituições de ensino</p><p>superior de se preparar para receber este aluno indígena</p><p>(bilíngue), que por vezes se constitui de duas identidades</p><p>sociais, uma identidade aplicada na aldeia e outra na cidade.</p><p>A revisão literária traz uma reflexão importante e a</p><p>necessidade de redesenhar um currículo escolar nas faculdades</p><p>e universidades que seja capaz de delinear experiências de</p><p>aprendizagem, cultivar a língua vernácula e não deixar de dar o</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>104</p><p>devido valor que tem a segunda língua. Os alunos bilíngues são</p><p>diferentes dos demais e certamente aprender de forma diferente.</p><p>Para que possam cultivar o pensamento crítico e reflexivo</p><p>acadêmico integralmente de forma a contextualizar o</p><p>conhecimento é necessário que seja levado a usar as suas</p><p>potencialidades linguísticas, quer seja por meio de uma das</p><p>línguas, quer seja por meio de todas elas.</p><p>Admitimos que o pressuposto inicial traçado de o aluno</p><p>bilingue utiliza a segunda língua em algumas situações e a</p><p>língua materna ou as duas dentro e fora da escola, trata de uma</p><p>premissa confirmada. Defendemos a presença do bilinguismo,</p><p>em diferentes níveis, pois ora a comunidade prefere manter a</p><p>língua materna, ora recorre a segunda língua para se comunicar.</p><p>Com base nas experiências e estudos realizados podemos</p><p>afirmar que as faculdades na região de Cacoal estão longe de</p><p>desenvolverem currículos que atendam e que sejam capazes de</p><p>desenvolver uma educação de qualidade para os alunos índios</p><p>originários das duas etnias: Cinta Larga e Suruí.</p><p>Referências</p><p>ANTUNES, Irandé. Aula de português – encontro e interação. São Paulo:</p><p>Parábola Editorial, 2003.</p><p>BRASIL. Ministério da Educação. Referencial Curricular Nacional para as</p><p>Escolas Indígenas Brasília: MEC, 1998.</p><p>BROWN, G., Bull, J. and Pendlebury, M. Assessing Student Learning in Higher</p><p>Education. Routledge, London, 1997.</p><p>DUBOIS, Jean et al. Dicionário de linguística. São Paulo: Cultrix, 2006.</p><p>GALLISSON, R. e D. Coste . Dicionário de didáctica das Línguas. Coimbra:</p><p>Livraria Almedina, 1983.</p><p>GARCIA, O. Bilingual education in the 21st century: A global perspective.</p><p>Oxford: Wiley-Blackwell, 2009.</p><p>HAMEL, Rainer Henrique; SIERRA, Maria Teresa. Diglosia y Conflicto</p><p>intercultural: La lucha por um concepto o la danza de los significantes.</p><p>Boletín de Antropologia Americana. n. 8, diciembre de 1983, p.89-110.</p><p>HAMEL, Rainer Henrique; SIERRA, Maria Teresa. Determinantes</p><p>sociolingüísticas de la education indígena bilingue. In: Trabalhos de</p><p>Lingüística Aplicada. Campinas, n.14, jul./dez. 1989, p. 15-66.</p><p>KNAPP, Cássio. O Ensino Bilíngue e Educação Escolar Indígena para ss</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>105</p><p>Guarani e Kaiowá de Ms. Dourados Ufgd 2016.Tese Doutorado em</p><p>História Na Faculdade De Ciências Humanas,Ufgd.</p><p>LEIRIA, Isabel. Português língua segunda e língua estrangeira: investigação e</p><p>ensino. Isabel Leiria 1999. Disponível em: cvc.instituto-</p><p>camoes.pt/idiomático/03/portuguesLSeLE.pdf. Acesso em: 20 de novembro</p><p>2023.</p><p>LE PAGE, R. B. Projection, Focursing and Diffusio. York Papers in Linguistics,</p><p>1980.</p><p>MACKEY, F. W. The description of bilingualism. In: WEI, L. (editor) The</p><p>bilingualism reader. London: Routledge, 2000. p.27-56.</p><p>MACKEY, W. The description of bilingualism. In: FISHMAN, J. A. (Ed.).</p><p>Readings in the sociology of language. The Netherlands: Mouton &amp;</p><p>Co. N. V. Publishers, 1972. P. 555-584.</p><p>Maher, T. M. O dizer do sujeito bilíngue: Aportes da sociolingüística. Anais do</p><p>Seminário - desafios e possibilidades na educação bilíngüe para surdos. Rio</p><p>de Janeiro: INES, 1997.</p><p>MAHER. T. Do casulo ao movimento: a suspensão das certezas na educação</p><p>bilíngüe e intercultural. In: CAVALCANTI, M. C.; BORTONI-RICARDO, S.</p><p>M. (Orgs.). Transculturalidade, linguagem e educação. Campinas, SP:</p><p>Mercado de Letras, 2007, p.67-94.</p><p>MENDES, Edleise. Abordagem Comunicativa Intercultural: uma proposta para</p><p>ensinar e aprender língua no diálogo de culturas. Tese de Doutorado em</p><p>Linguística Aplicada da Universidade Estadual de Campinas —</p><p>UNICAMP/SP. São Paulo, 2004.</p><p>MOURA, Oliveira Waleska. Ensino/aprendizagem de língua portuguesa:</p><p>Diversidade linguística e formação docente. Disponível em:</p><p>http://www.inventario.ufba.br/09/9/ENSINOAPRENDIZAGEM%20DE%2</p><p>0L%C3%8DNGUA%20PORTUGUESA%20DIVERSIDADE%20LINGU%C</p><p>3%8DSTICA.pdf . Acesso em: 18 de novembro de 2023.</p><p>MYERS-SCOTTON, C. Multiple voices: an introduction to bilingualism.</p><p>Malden, EUA: Blackwell Publishing, 2006.</p><p>RAMOS, Ana Paula Fadanelli. O bilinguismo na escola favorece ou prejudica</p><p>a aprendizagem? In: Revista Pedagógica. Pátio ano VIII, n. 31, Porto Alegre:</p><p>Artmed, ago./out. 2004.</p><p>WEI, L. Dimensions of Bilingualism. In: WEI, L. The Bilingualism Reader.</p><p>London; New York: Routledge, 2000.</p><p>XAVIER, Mª Francisca e Mª Helena M. Mateus. “Dicionário de termos</p><p>linguístico” - vol. II. Lisboa: Edições Cosmos, 1992.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>106</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>107</p><p>TEORIAS LINGUÍSTICAS E AS CONCEPÇÕES QUE A</p><p>ELAS SE RELACIONAM</p><p>Uma apreciação dos métodos</p><p>Ivo Di Camargo Junior1</p><p>Neide Araújo Castilho Teno2</p><p>Duas áreas de concentração propõe o Projeto Pedagógico</p><p>do PPGLETRAS/UEMS Unidade de Campo Grande:</p><p>diacronia e sincronia os estruturalistas se voltam para a</p><p>sincronia, oposição marcante nos estudos de Saussure conforme</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>111</p><p>ele mesmo explica “e esse cruzamento das duas ordens de</p><p>fenômenos relativos ao mesmo objeto, preferimos falar de</p><p>Linguística sincrônica e de Linguística diacrônica” (Saussure,</p><p>1995, p. 96).</p><p>Ao lado dessas oposições Saussure assinalou ainda o</p><p>conceito de langue /parole e emprega como uma maneira de</p><p>“demonstrar que os elementos de uma língua não estão</p><p>isolados, mas formam um conjunto solidário” Martelotta, 2013,</p><p>p.54). Diante dessa afirmativa, podemos inferir que é quase</p><p>neutra a possibilidade de realizar pesquisas e análises dos</p><p>elementos linguísticos separando o sistema da língua, sem olhar</p><p>para a estrutura que delineia o modo como esse sistema se</p><p>organiza. A partir dessa premissa que surge Gramática</p><p>Estrutural regularizando a compreensão de sistema da língua.</p><p>O destaque atribuído a Saussure está no fato da definição</p><p>do objeto de estudos da Linguística e suas ideias provocarem</p><p>mudanças o que foi denominado de linguística sincrônica visto</p><p>como um sistema de relações, sem preocupação com mudanças</p><p>históricas. Ganha força os estudos acerca do signo linguístico no</p><p>nível da palavra e posteriormente na área da fonologia, da</p><p>morfologia, da estrutura da sentença, ou seja, a sintaxe.</p><p>E possível compreender a realidade social pelo viés</p><p>estruturalista? A resposta para indagação é positiva pois tanto</p><p>os aspectos físicos como humanos não podem ser vistos</p><p>desvinculados de um contexto social. A partir dessa</p><p>premissa pode constituir tema de estudos estruturalistas: a</p><p>realidade de um determinado espaço regional, a dinâmica</p><p>socioespacial de uso e ocupação de um determinado espaço,</p><p>estudar estruturas sociais hábitos, costumes.</p><p>Podemos pensar em estudos estruturalistas na filosofia, na</p><p>psicologia, na sociologia entre outras áreas. A área da psicologia</p><p>ganhou destaque com os estudos do médico, filósofo e psicólogo</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>112</p><p>alemão Wilhelm Wundt3 considerado o percursor do método</p><p>estruturalista na psicologia. Por meio de trabalhos laboratoriais</p><p>Wundt4 tenta apresentar modelos de interpretação psicológica.</p><p>É no método estruturalista que a psicologia tenta</p><p>compreender o indivíduo olhando a estrutura comum cognitiva</p><p>e psicológica. Sinais de TDAH , agressividade, afetividade,</p><p>amigo imaginário, autoestima, tristeza, inteligência emocional,</p><p>são temas da tarefa do psicólogo e pode ser pesquisado pelo</p><p>método estruturalista para compreender o indivíduo como</p><p>parte de um todo e tentar descobrir qual era a estrutura que</p><p>compunha esse todo.</p><p>O estruturalismo linguístico recebeu adeptos e adesão na</p><p>Educação ligado ao pensamento relacional, e o conceito</p><p>“ensino” e nessa ótica o estruturalismo designa limites para o</p><p>que seja ensino e o que são outras formas de ensino.</p><p>Motta (2022) adapta as ideias propostas por Saviani (2000)</p><p>para ilustrar a influência do estruturalismo na educação, nas</p><p>práticas educativas, e traz o termo atitudes didáticas para</p><p>analisar os problemas implícitos presentes nas relações</p><p>filosóficas e sociais. A ideia de Saviani (2000, p.124) de que o “</p><p>homem sofre as ações das estruturas, mas, na medida em que</p><p>tomam consciência dessa ação, ela é capaz de manipular a sua</p><p>força, agindo sobre a estrutura de modo a lhe atribuir um</p><p>sentido” foi o fio condutor para Motta ( 2022) enxergar para</p><p>além da estrutura e instigar estudos que refletissem o</p><p>planejamento escolar, entre outras temas como:</p><p>[...] como o currículo foi elaborado? Como ocorre a formação</p><p>dos docentes? Como os gestores planejam a educação?</p><p>3 Outras informações consultar Wundt, W. System der Philosophie. Leipzig:</p><p>Engelmann.(1889). Wundt, W. Das Institut für experimentelle Psychologie. In Festschrift</p><p>zur Feier des 500 jährigen Bestehens der Universität Leipzig (p. 118-133). Leipzig:</p><p>Hirzel.(1909) e Wundt, W.. Erlebtes und Erkanntes. Stuttgart: Alfred Kröner.(1920).</p><p>4 Cf ARAUJO, Saulo de Freitas. Wilhelm Wundt e a fundação do primeiro centro</p><p>internacional de formação de psicólogos publicado em Temas em Psicologia versão</p><p>impressa ISSN 1413-389X vol.17 no.1 Ribeirão Preto 2009</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>113</p><p>Como a educação está se estruturando? Portanto, seria</p><p>provável que essas perguntas aprofundariam as reflexões</p><p>sobre a educação e por consequência poderia ter uma</p><p>estrutura com fundamentos mais sólidos (Motta, 2022, p.</p><p>116).</p><p>Desta maneira, afasta a individualidade do sujeito e ganha</p><p>força o objeto e suas relações interpessoais enquanto processo</p><p>educativo assentado nas relações edificadas pelo homem junto</p><p>ao estruturalismo. Em analogia a prática educativa e ao</p><p>estruturalismo as relações são assentadas refletindo a partir do</p><p>processo humano e sua natureza humana conforme ensina Silva</p><p>(1993 ,p.189), todavia “deve deixar transparecer, ao mesmo</p><p>tempo, uma natureza e um mundo humanos, prenhes de vida e</p><p>de uma subjetividade, diante dos quais não posso colocar-me</p><p>como observador exterior e estranho”</p><p>Na verdade, tanto na Educação como em outras áreas, para</p><p>inserção do estruturalismo houve contribuições e enfoques de</p><p>estudiosos que lidavam com categorias como: ensino, cognição;</p><p>avalição, porém ao pensar no caráter individual a educação</p><p>aparece na frente pelo seu papel nas relações interpessoais. De</p><p>acordo com Silva (1993) o estruturalismo transformou os</p><p>aspectos vinculados ao processo da educação, nas atitudes</p><p>didáticas e nas relações com a antropologia. Todavia, no sentido</p><p>restrito da palavra, o estruturalismo não influenciou de modo</p><p>muito significativo a educação brasileira, tendo em vista o</p><p>“vazio teórico” e ao “senso comum” (Saviani, 2000) marcas</p><p>apontadas na relação do estruturalismo e com a educação.</p><p>Gatti (2012) quando aborda a construção metodológica da</p><p>pesquisa em educação, aponta os desafios da área e a</p><p>necessidade dos grupos de pesquisas repensarem “o papel da</p><p>educação e os modos de formação humana”(Gatti, 2012, p. 20)</p><p>para rever os processos e situações dos modelos até então</p><p>apresentados, pois diante da diversidade de enfoques nas</p><p>pesquisas em educação torna imperativo a “intensificação do</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>114</p><p>diálogo entre grupos de pesquisadores, para o clareamento das</p><p>interfaces/contradições entre as diferentes perspectivas” (Gatti,</p><p>2012, p. 20).</p><p>Ademais, não podemos esquecer do movimento intitulado</p><p>estruturalismo no pós-modernismo e os destaques apontados</p><p>pela estudiosa Louro (2008) quando metaforicamente usa a</p><p>expressão de Viajantes pós-modernos para explicitar acerca dos</p><p>estudos na pós-modernidade, pois “parece necessário pensar</p><p>não só em processos mais confusos, difusos e plurais, mas,</p><p>especialmente, supor que o sujeito que viaja é, ele próprio,</p><p>dividido, fragmentado e cambiante” (Louro, 2008, p. 13).Isso</p><p>posto, podemos pensar que nesse movimento de pós</p><p>modernidade “o que interessa é o movimento e as mudanças</p><p>que se dão ao longo do trajeto”( p.13).</p><p>Outro estudioso que problematiza acerca dos estudos no</p><p>cenário pós-moderno é Veiga-Neto (2007) que defende a ideia</p><p>de uma humildade epistemológica e apresenta a seguinte</p><p>sugestão: “o invés de se partir das determinações econômicas</p><p>para explicar o mundo social, outras variáveis são trazidas para</p><p>o tabuleiro do jogo: etnia, religião, gênero, idade, cultura,</p><p>características corporais, desejos, fantasias, etc” (Veiga-Neto,</p><p>2007, p. 36).</p><p>Nessa linha de raciocínio dos estudos estruturalistas</p><p>educacional pós-modernos em educação mencionamos os</p><p>seguintes teóricos pós-críticos relacionadas a educação: Louro</p><p>(1997,1998 ), Fischer (1994, 2001) e Veiga-Neto (2000, 2007, ),</p><p>entre outros. Entre</p><p>o estruturalismo que foca as (relações</p><p>essenciais da estrutura), e a Teoria do discurso destacamos</p><p>Foucault5 um dos teóricos mais citados em diferentes pesquisas.</p><p>Os estudos Pós-estruturalismo que se ocupa da crítica à essência</p><p>da estrutura foi o que deu destaque para a presença dos estudos</p><p>5 Cf FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 2013, além de VEIGA-</p><p>NETO, A. Coisas de governo. In: RAGO, M.; ORLANDI L. B. L.; VEIGA-NETO, A. (Orgs.).</p><p>Imagens de Foucault e Deleuze: ressonâncias nietzschianas. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. p.</p><p>13 -34.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>115</p><p>em Teoria do Discurso (TD).</p><p>Para os estudos da linguagem no pós-estruturalista na</p><p>Ferraz (2015), tem se dedicado a reflexões que conecta a</p><p>perspectiva da filosofia da linguagem pós-estruturalista, a (pós)</p><p>modernidade, discutindo a relação entre linguagem, língua e</p><p>construção de sentidos.</p><p>O artigo “(Pós) Modernidade, (Pós) Estruturalismo e</p><p>Educação Linguística: Construindo Sentidos, Ensejando</p><p>Transformações” de Ferraz (2015) apresenta contribuições</p><p>teóricas necessárias para repensar questões ligadas ao</p><p>estruturalismo e o pós-estruturalismo sob a ótica da</p><p>modernidade e pós-modernidade e um breve glossário com</p><p>explicações de expressões como: transformação social,</p><p>modernidade, pós-modernidade, filosofia da linguagem pós-</p><p>estruturalista e educação linguística. Práticas pedagógicas,</p><p>letramento visual, construção de sentidos são temáticas que</p><p>abrange perspectiva linguística/educacional para o ensino de</p><p>Língua Inglesa.</p><p>Os Estudos da Concepção Funcionalista</p><p>O momento das ideias funcionalistas data do surgimento</p><p>do Círculo Linguístico de Praga, e nasceu para se opor às</p><p>concepções de língua advindas das concepções do</p><p>estruturalismo e do gerativismo. Nessa teoria o nível e suas</p><p>estruturas não constituem mais o centro das atenções pois a</p><p>preocupação está na “relação entre as estruturas gramaticais das</p><p>línguas e os diferentes contextos comunicativos em que elas são</p><p>usadas” (Cunha, 2010, p. 157).</p><p>A forma como o sujeito usa a língua para se comunicar e</p><p>vista “como um diferente modo de significação na oração”</p><p>(Neves, 1997). Para a teoria funcionalistas, a função</p><p>comunicativa está acima de qualquer uso de fala, a sentença, as</p><p>frases e o texto são produzidos com o fim interacionais. Nessa</p><p>ótica, entendemos que o Funcionalismo vem fortalecer as áreas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>116</p><p>mais sociais uma vez que a proposta da gramática funcional é</p><p>ligar a uma teoria da “organização gramatical das línguas</p><p>naturais que procura se integrar em uma teoria global da</p><p>interação social” (Neves, 1999, p.15).</p><p>Kenedy e Martelotta ( 2003 ) ao discorrer sobre a visão</p><p>funcionalista da linguagem no século XX, conceitua</p><p>funcionalismo como compreensão da língua como um</p><p>instrumento de comunicação, e “como tal, não pode ser</p><p>analisada como um objeto autônomo, mas como uma estrutura</p><p>maleável, sujeita a pressões oriundas das diferentes situações</p><p>comunicativas, que ajudam a determinar sua estrutura</p><p>gramatical”(Kenedy e Martelotta, 2003, p. 20 ). Assim estudos</p><p>da sociolinguística, da linguística textual que refere se aos</p><p>desvios da gramática normativa, pode constituir tendências</p><p>consequentes da necessidade de comunicação em determinados</p><p>contextos sociais e tornar fonte de estudos linguísticos.</p><p>As contribuições da concepção funcionalismo linguístico</p><p>está no fato de considerar a linguagem como um instrumento de</p><p>interação social e o interesse de investigação centrar na estrutura</p><p>gramatical considerando o contexto discursivo e a motivação</p><p>para os aspectos da língua. Nessa teoria questões decursivas</p><p>geraram “uma reação generalizada” Pezzatti (2004, p. 166), entre</p><p>os estudiosos da linguagem e entre as diferentes escolas</p><p>representativas trazendo destaques para Givón (1995). Com este</p><p>estudioso o funcionalismo e a gramática propõe estudos em</p><p>temas como o sociocultural envolvendo a estrutura e as funções</p><p>cognitivas e comunicativas; o significado tem estreita relação</p><p>com o contexto.</p><p>As ideias das escolas linguísticas funcionalistas receberam</p><p>várias influências principalmente as denominadas pós</p><p>Saussurianas (século XX) e tiveram importantes representantes.</p><p>Quando pensamos na Europa , as ideias emanadas a partir da</p><p>Escola de Genebra, contribuiu para os estudos dos desvios da</p><p>gramática normativa, uma tendência para atender as</p><p>necessidades da comunicação e tornou fonte para estudos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>117</p><p>linguísticos. Enquanto representantes desse período destacam</p><p>se os nomes de Martinet, e Trubetzkoy, como herdeiros dos</p><p>estudos linguísticos entre outros.</p><p>O legado saussuriano deixa suas marcas em outras Escolas</p><p>ainda, como as de Londres, por meio de Halliday (2004), que</p><p>trouxe uma tendência de estudar as línguas de um ponto de</p><p>vista funcional. Assim, imperioso compreender que a linguística</p><p>norte-americana trouxe importantes pilares para a tendência</p><p>formalista e o aparecimento dos estudos gerativistas e a adesão</p><p>a gramática cognitiva.</p><p>Ademais, é evidente que os estudos funcionalistas</p><p>surgiram em confronto com o enfoque estruturalismo, todavia</p><p>tem muito mais a ver com as ideias de Labov e seus estudos</p><p>com a interação verbal e o surgimento de diferentes gramáticas.</p><p>A saber, gramática funcional foi a responsável para os avanços</p><p>da teoria pragmática de linguagem e a aproximação da interação</p><p>verbal como objeto de estudo.</p><p>Foi com a gramática funcionalista a visão de três princípios</p><p>básicos para os estudos linguísticos de natureza descritiva:</p><p>adequação pragmática, adequação psicológica e adequação</p><p>tipológica. Assim, as pesquisas permeadas pelos estudos</p><p>funcionalistas se preocupam com níveis funcionais e nessa</p><p>perspectiva que encontra se as pesquisas com foco no português</p><p>falado, e publicações como o Projeto da Norma Urbana Culta de</p><p>São Paulo (Projeto NURC/SP), presentes em obras de Castilho e</p><p>Preti (1986,1987) e Preti e Urbano ( 1988).</p><p>Diante do quadro que a literatura apresenta acerca dos</p><p>estudos funcionalistas recorro as palavras de Maria Helena de</p><p>Moura Neves (2004, p 1), que muito bem expressa acerca dos</p><p>estudos funcionalistas enquanto corrente teórica e as versões</p><p>apresentadas pelos diferentes linguísticas pois a “verdade é que,</p><p>dentro do que vem sendo denominado ou autodenominado -</p><p>funcionalismo, existem modelos muito diferentes”.</p><p>A estudiosa cita os funcionalistas, Givón (1995) e Nichols</p><p>(1984) para justificar essa diversidade de conceitos, pois Nichols</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>118</p><p>(1984, p 97 ) considera que toda explicação vai depender da</p><p>fatores como “cognição”, “comunicação”, “processamento</p><p>mental”, “interação social”, “cultura”, “mudança” e “variação”,</p><p>“aquisição e “evolução”. Por isso, o objeto principal da análise</p><p>funcionalista são as situações de uso da língua reveladas como</p><p>propriedade imperativa para a teoria de pesquisas ocupadas do</p><p>uso, da mudança e da variação. Assim, os estudos trazem para</p><p>o bojo das pesquisas os conceitos propostos pela Linguística</p><p>Sistêmico-Funcional (LSF), postulada por Michael Alexander</p><p>Kirkwood Halliday e da Gramática do Funcionalismo</p><p>linguístico6 Design Visual (Kress; Van Leeuwen, 1996).</p><p>Com a teoria funcionalista que avançou as questões da</p><p>linguagem relacionadas a sócio semiótica, como uma maneira</p><p>de se reportar a experiência humana e sua relação com a</p><p>comunidade. No funcionalismo que surgiu a ideia das metas</p><p>funções da linguagem: ideacional, interpessoal e textual</p><p>(Halliday,2004), propondo que a língua sempre está sujeita a</p><p>processos comunicativos, por isso enfatiza que:</p><p>[...] os três componentes funcionais do significado</p><p>ideacional, interpessoal e textual são realizados em toda a</p><p>gramática</p><p>de uma língua. Assim, na gramática, cada</p><p>componente contribui com uma estrutura mais ou menos</p><p>completa (Halliday, 2004, p. 309, tradução nossa)7</p><p>A Linguística Funcional ( LF) na contemporaneidade</p><p>enquanto teoria metodológica apresenta três modelos a saber: a</p><p>Gramática Sistêmico-Funcional (Halliday; Matthiessen, 2004), A</p><p>Gramática Discursivo-Funcional (Hengeveld; Mackenzie, 2008)</p><p>6 Para maiores conhecimentos sugere se a leitura do livro “Introdução à gramática sistêmico-</p><p>funcional em língua portuguesa “de Cristiane Fuzer, Sara Regina Scotta Cabral-1. ed. –</p><p>Campinas, SP : Mercado de Letras, 2014. -- (Coleção as Faces da Línguística Aplicada) .</p><p>7 No original: “the three functional components of meaning, ideational, interpersonal and</p><p>textual, are realized throughout the gramar of a language. But whereas in the gramar of the</p><p>clause each component contributes a more or less complete structure” (HALLIDAY, 2004,</p><p>p. 309).</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>119</p><p>e a Gramática de Papel e Referência (Van Valin; La Polla, 1997).</p><p>Esse modelo apresentado está em consonância com os estudos</p><p>de Mackenzie (2016), que considera a Gramática Discursivo-</p><p>Funcional – como fruto da atual da Gramática Funcional de</p><p>Simon Dik.</p><p>No conjunto da linguística funcionalista o foco de estudo</p><p>está na situação extralinguística e no contexto da comunicação e</p><p>diante disso algumas correntes se destacam para estudos: a</p><p>Pragmática, a Linguística Textual, a Sociolinguística, a Análise</p><p>do Discurso, a Semiótica francesa e da Semiótica greimasiana,</p><p>incluindo a teoria da enunciação. De forma distinta, cada uma</p><p>delas, dento de metodologias especificas recorre a exterioridade</p><p>intrínseca à linguagem para responder questões da linguagem</p><p>que não foram respondidas nas pesquisas de Saussure.</p><p>Barbara e Macedo ( 2009 ) em seu texto “Linguística</p><p>Sistêmico-Funcional para a Análise de discurso: um Panorama</p><p>Introdutório” recorre aos princípios norteadores da</p><p>Linguística Sistêmico Funcional (LSF)para descrever a</p><p>importância da gramática funcional para as investigações</p><p>linguísticas no campo social. Entra em cena nesse texto</p><p>situações de como, onde e porque o sujeito usa a língua e como</p><p>a sociedade se utiliza dessa circunstâncias. De acordo com as</p><p>estudiosas trata-se de uma abordagem teórica “ que parte do</p><p>significado e não da forma[...] a unidade semântica é o texto, seu</p><p>ponto de partida (e não a oração), apresenta-se, portanto, como</p><p>uma teoria da comunicação humana” (Barbara e Macedo, 2009,</p><p>p. 90 )</p><p>Temos um destaque para pontos importantes no debate</p><p>das estudiosas: o texto e a unidade semântica. E quando</p><p>estendemos a unidade semântica estamos considerando a</p><p>“interação entre os indivíduos, ou mesmo de um indivíduo</p><p>consigo mesmo, em sociedade, em um dado contexto, tem</p><p>significado”(p.90) e essa interação apontada entre língua,</p><p>linguagem e sociedade é o que traz para LSF a tarefa de ir além</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>120</p><p>da análise da estrutura , pois com essa teoria, o que determina</p><p>a forma é o significado.</p><p>Nessa perspectiva funcionalista o estudioso da linguagem</p><p>recorre as meta funções (ideacional, interpessoal e textual) para</p><p>compreender as situações de fala, que por sua vez está ligada ao</p><p>contexto de cultura e a seleção e escolhas dos elementos textuais.</p><p>Nessa linha de raciocínio podemos desenvolver estudos e</p><p>pesquisa sistêmica que se atentam com a linguagem em</p><p>sociedade, perpassando pelas mais diferentes situações</p><p>específicas como : literatura, ensino, ação social, mídias,</p><p>multimodalidade. Pesquisar produções de alunos de</p><p>determinado contexto , de series diferentes podem dar</p><p>explicações para diferenças e semelhanças de grupos textuais.</p><p>Analisar entrevistas de empregos, trocas de e-mails de</p><p>cooperativas, vídeos são amostras que apresentam variáveis de</p><p>registro , situações semânticas e podem ser estudadas por meio</p><p>da Gramática Sistêmico Funcional. Essa teoria, por meio da</p><p>linguagem utiliza um método detalhado de análise de texto em</p><p>contexto, para dar explicações acerca do usos e dos significados</p><p>da estrutura da linguagem.</p><p>Por meio da metafunção ideacional é possível compreender</p><p>como o sujeito organiza suas ideias , assim estamos olhando</p><p>para o léxico e a gramática, e para exemplificar indicamos a</p><p>leitura da dissertação de mestrado de Assunção ( 2008) que faz</p><p>um estudo da representação da mulher no contexto social por</p><p>meio de jornais na mídia. A metafunção interpessoal está</p><p>centrada nas análises das interações entres os participantes, o</p><p>grau de distância e proximidade, de função assumida diante da</p><p>sociedade. E para tematizar estudos indicamos por exemplo</p><p>pesquisas sobre imagem de produtos hortaliças , de artistas , de</p><p>propagandas em geral. E para metafunção textual que trata da</p><p>organização do texto e seu constructo observamos as escolhas</p><p>das mensagens e a forma que o sujeito se expressa, definidas</p><p>como tema/rema e dado/novo de acordo com a LSF</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>121</p><p>Os Estudos do Gerativismo</p><p>Sua origem data de 1950, nos Estados Unidos com o livro</p><p>“Estruturas sintáticas” d Noam Chomsky, professor do</p><p>Massachussets Institut of Tecnology – MIT. Com Chomsky</p><p>acarreta uma mudanças nas pesquisas ao surgir a preocupação</p><p>da sintaxe das línguas naturais e com foco na língua como</p><p>objeto mental. Nesse ponto já anuncia mudanças radicais entre</p><p>as ideia de Saussure que vê a língua como objeto social, e</p><p>Chomsky focado nos princípios enraizados na mente humana.</p><p>O estudo de Chomsky considera a estrutura profunda</p><p>como uma realidade mental subjacente do falante-ouvinte.</p><p>Acrescenta essa linguística, que no celebro de cada indivíduo há</p><p>uma estrutura gramatical que pode produzir inúmeras</p><p>sentenças em nível de desempenho. Trata do conhecimento que</p><p>a pessoa tem ao domínio da língua “competência”, ficando para</p><p>o desempenho do sujeito a “performance” como o uso eficaz da</p><p>língua em circunstâncias concretas.</p><p>A Linguística Cognitiva surge, segundo Pinheiro e Ferrari</p><p>(2020) num contexto acadêmico, tendo em vista um impasse</p><p>criado entre os estudiosos da linguagem e a descontentamento</p><p>de pesquisadores ligados à Teoria Gerativa ( John Ross, Paul</p><p>Postal e George Lakoff) que defendiam a inclusão da semântica</p><p>para a explicação de fenômenos sintáticos, o que promovia uma</p><p>quebra do modelo vigente ( Pinheiro e Ferrari ,2020).</p><p>Ao fazer uma retrospectiva dos estudos da Gramática</p><p>Gerativa no Brasil pode se mencionar os estudos de Miriam</p><p>Lemle, Margarida Basílio que após seus estudos de</p><p>doutoramento na década de 1970, promoveram os primeiros</p><p>centros de pesquisa em Gramática Gerativa no Brasil,</p><p>destacando a PUC-SP, UFMG, UFRJ e UNICAMP.</p><p>Carvalho e Sousa (2018) na ANPOLL apresentou um</p><p>trabalho dos 30 anos dos estudos do Grupo de Teoria da</p><p>Gramática com subsídios históricos importantes para o</p><p>conhecimento dos estudos gerativistas. Outras pesquisas foram</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>122</p><p>compiladas no IV Encontro de Gramática Gerativa em 2023 pela</p><p>Universidade Federal da Bahia como uma maneira de manter a</p><p>tradição em ensino e pesquisa na área de Gramática Gerativa.</p><p>A gramática gerativa oferece uma possibilidade teórica</p><p>para o usuário da língua descrever e explicar a natureza da</p><p>Linguagem, ou seja, entender como a mente humana se processa</p><p>ao construir uma informação, independentemente do nível de</p><p>escolarização, “uma possibilidade de descobrir, através do</p><p>estudo da linguagem, princípios abstratos que governam sua</p><p>estrutura e uso [...] e que decorrem de características</p><p>mentais da espécie humana” (Chomsky, 1980, p.09).</p><p>A partir desse princípio os estudiosos da linguagem</p><p>gerativista considera a gramática o oposto dos preceitos</p><p>da</p><p>gramática normativa, por isso as ponderações devem ser</p><p>realizadas com apoio nos conceitos de gramaticalidade e</p><p>agramaticalidade, ou seja, sentenças que pertencem ou não a</p><p>uma dada língua (Mioto, 2005).</p><p>Sob o viés dos estudos linguísticos ainda encontra se o</p><p>modelo /teorias que se preocupam com a linguagem em uso e</p><p>recebem a denominação de pragmáticos, com foco na demanda</p><p>do uso, dos fatores sociais, históricos e culturais. Assim , a</p><p>literatura considera pragmáticos as pesquisas derivadas de</p><p>correntes da Semântica Argumentativa, a Análise da</p><p>Conversação, a Linguística Textual, a Semântica Cognitiva, a</p><p>Análise de Discurso francesa, a Sociolinguística, dentre outras.</p><p>A estudiosa Bernardino (2009) em seu texto “Estruturalismo,</p><p>Gerativismo e Teorias Pragmáticas: pensando a relação entre</p><p>linguagem, cognição e exterioridade” considera que são esses</p><p>estudos :</p><p>[...] que concretizam a virada pragmática no campo da</p><p>Lingüística na segunda metade do século XX. Sejam</p><p>trazendo a fala, ou texto, ou discurso, ou sentido, ou os</p><p>sujeitos para o centro de suas abordagens, todas elas têm em</p><p>comum o fato de considerarem os fatores externos à língua</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>123</p><p>e, principalmente, levarem em conta os contextos de uso</p><p>como a maneira efetiva de se estudar os fenômenos</p><p>linguísticos (Bernardino, 2009, p 2514).</p><p>Essas teorias pragmáticas, diversamente das abordagens</p><p>estruturalista e gerativista, conceber a linguagem considerando</p><p>os contextos efetivos de uso. Aliás, focar os contextos de uso da</p><p>linguagem, estamos nos referindo aos estudos da Linguística</p><p>Textual, da linguística Cognitiva, da Semântica Cognitiva, entre</p><p>outras) justamente por fazer relação entre a cognição e</p><p>exterioridade.</p><p>Considerações finais</p><p>O texto buscou apresentar um esboço teórico acerca das</p><p>teorias linguísticas e as concepções que a elas se relacionam.</p><p>Dentre os estudos já apresentados buscou se focar nos princípios</p><p>gerais da Linguística Estruturalista, Gerativista e Funcionalista</p><p>para compreensão dos métodos de ensino.</p><p>O estudo ora realizado trouxe fundamentos importantes</p><p>acerca das teorias da linguagem e constituíram subsídios</p><p>necessários para o conhecimento dos diferentes métodos de</p><p>ensino de línguas, e a conscientização de que o estudo estrutural</p><p>da língua não garante compreender as questões sociais,</p><p>históricas, discursivas e ideológicas, pelas quais emana o ensino</p><p>e pesquisa da linguagem.</p><p>As teorias linguísticas no Brasil tiveram forte influência nos</p><p>Estudos dos Estados Unidos da América a partir dos anos 30 do</p><p>século XX, e Ferdinand de Saussure foi considerado o fundador</p><p>do estruturalismo com sua obra Curso de Linguística Geral. Essa</p><p>obra tem sido reeditada pois fornece as bases teóricas para</p><p>ciências do século 20: a Linguística Estrutural e a Semiologia, ou</p><p>ciência dos signos.</p><p>Ao lado do estruturalismo o texto aborda as questões</p><p>relacionadas ao Gerativismo e a função de uma gramática que</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>124</p><p>ensina não ditar regras, mas submergir no sentido das frases</p><p>gramaticais, o que vai chamar de Gramática Gerativa de Noam</p><p>Chomsky. O papel do pesquisador nesse modelo é descrever a</p><p>competência do falante de acordo com contexto do falante. As</p><p>argumentações do texto vinculam se ainda a vertente</p><p>funcionalista enquanto método de mais uma teoria linguística.</p><p>O paradigma funcionalista tem suas raízes com aquelas trazidas</p><p>por Saussure e tem a intenção de trazer a ideia de um “novo”</p><p>paradigma, temas já advindos na Escola de Praga, ampliando</p><p>conceitos como a função da linguagem incluindo os</p><p>participantes.</p><p>Os princípios teóricos ficam centrados na concepção de</p><p>Halliday (1994), como linguagem a ser interpretada dentro de</p><p>um contexto sociocultural em que tal metodologia se concretiza.</p><p>A linguagem funcionalista pode ser manifestada pela semiótica,</p><p>derivando a noção das metafunções da linguagem: ideacional,</p><p>interpessoal e textual.</p><p>Nesse sentido, o artigo cumpre com sua finalidade e</p><p>contribui para o aprimoramento dos conceitos das teorias</p><p>linguísticas e provoque acerca dos estudos da linguagem e as</p><p>suas abordagens.</p><p>Referências</p><p>ASSUMPÇÃO, M. As representações da mulher profissional brasileira e norte-</p><p>americana construídas pela mídia impressa. Dissertação de Mestrado.</p><p>PUC-SP.2008.</p><p>BARBARA, Leila e MACEDO, Célia Maria Macêdo de. Linguística Sistêmico-</p><p>Funcional para a Análise de discurso: um Panorama Introdutório.</p><p>Cadernos de Linguagem e Sociedade, 10 (1), 2009</p><p>BARTHES, R. Aula. São Paulo: Cultrix. 1977/2013.</p><p>CARVALHO, D.; SOUSA, L. Gramática Gerativa em Perspectiva: Escopo,</p><p>Objetivos e Estrutura. In: CARVALHO, D.; SOUSA, L. (Orgs.). Gramática</p><p>Gerativa em Perspectiva. São Paulo: Editora Blucher, 2018, p. 7-24</p><p>CARVALHO, C. I. C., and BARBOSA, J. R. A., ed. In: Teorias linguísticas:</p><p>orientações para a pesquisa [online]. Mossoró: EdUFERSA, 2021, 159 p.</p><p>ISBN: 978-65-87108-25-4. https://doi.org/10.7476/9786587108629.</p><p>CARVALHO, C. I. C., and BARBOSA, J. R. A., ed. In: Teorias linguísticas:</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>125</p><p>orientações para a pesquisa [online]. Mossoró: EdUFERSA, 2021, 159 p.</p><p>ISBN: 978-65-87108-25-4</p><p>CASTILHO, A. T., PRETI, D. (Org.). A linguagem falada culta na cidade de São</p><p>Paulo: materiais para seu estudo. (Projeto NURC). São Paulo: T. A.</p><p>Queiroz, 1986, 1987</p><p>BERNARDINO, Rosângela Alves dos Santos. Estruturalismo, gerativismo e</p><p>teorias pragmáticas: pensando a relação entre linguagem, cognição e</p><p>exterioridade. Disp. em: <http://www.leffa.pro.br/tela4/Textos/Textos</p><p>/Anais/ABRALIN_2009/PDF/Ros%C3%A2ngela%20Alves%20dos%20Sant</p><p>os%20BERNARDINO.pdf>. Acesso out. 2023.</p><p>CERQUEIRA, Mirian Santos de; SILVA, Leosmar Aparecido Da. As Funções</p><p>Sintáticas Adjunto de nome e complemento de nome no ensino de Língua</p><p>Portuguesa: Contribuições da gramática gerativa. 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Sendo assim, a variável sexo pode</p><p>ser uma influenciadora de padrão de comportamento</p><p>linguístico, pois a sociedade espera um comportamento X das</p><p>mulheres diante de uma dada situação. A faixa etária do falante</p><p>também é um fator de influência, já que há acentuadas</p><p>mudanças de uma geração para outra. A variável nível de</p><p>escolaridade do falante também pode influenciar o seu padrão</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>14</p><p>de comportamento, pois a sociedade espera das pessoas letradas</p><p>comportamento distintos daquelas não letradas.</p><p>Embora a língua passe por constantes evoluções e</p><p>transformações para facilitar a comunicação, há alguns</p><p>fenômenos linguísticos usados pelos falantes que merecem</p><p>destaque e estudos, até mesmo para explicar a língua como um</p><p>fenômeno complexo, segundo estudiosos como Labov</p><p>(1983/2008), Bueno (2003), Mollica e Braga (2015), entre outros.</p><p>A partir desse pressuposto, pode-se dizer que existem</p><p>desvios linguísticos que podem ser usados no dia a dia, sem</p><p>comprometer o processo da comunicação, e outros usados pelos</p><p>falantes da língua portuguesa de forma diferente do que</p><p>prescreve a gramática normativa, porque normalmente no</p><p>processo de comunicação, falante pode estar desatento às regras</p><p>gramaticais estabelecidas, uma vez que na fala elas não são tão</p><p>obedecidas como na escrita. Essa pressuposição foi perceptível</p><p>entre os entrevistados quando estes empregaram as variantes</p><p>estudadas de maneira informal.</p><p>Bagno (2007, p. 9), escreve a respeito do assunto: “o</p><p>preconceito linguístico está ligado, em boa medida, à confusão</p><p>que foi criada no curso da história, entre a língua e a gramática</p><p>normativa. Nossa tarefa mais urgente é desfazer essa confusão”.</p><p>O papel do linguista, de modo especial do sociolinguista, é</p><p>desfazer tal confusão mostrando os diferentes contextos de uso</p><p>da língua e que, como organismo vivo, ela pode e deve</p><p>acompanhar a evolução e variar com o indivíduo,</p><p>acompanhando o nos diferentes contextos em que for</p><p>empregada, de acordo com as necessidades reais de</p><p>comunicação do falante.</p><p>Veja posição de gramáticos e de estudiosos da língua com</p><p>relação ao emprego das formas pronominais eu e mim e a</p><p>variação em “para eu” e “para mim”, objeto desse estudo.</p><p>As formas pronominais eu e mim segundo o viés de</p><p>gramáticos normativos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>15</p><p>O uso das formas pronominais eu e mim tem extensão</p><p>linguística e desdobramentos nas expressões “para eu” e “para</p><p>mim” e seu uso pode causar estranhamento entre os falantes em</p><p>contexto linguístico em que é utilizada. Infanti, et alii. (1997, p.</p><p>199) em sua Gramática contemporânea da língua portuguesa</p><p>trata do assunto: “Empresta teu caderno pra mim estudar?</p><p>Podemos ter um pronome oblíquo como sujeito?” Ao responder</p><p>a indagação o gramático posiciona-se negativamente</p><p>justificando que se trata de uma função “exclusiva dos</p><p>pronomes pessoais retos”. E aponta como forma correta “[...]</p><p>empresta teu caderno pra eu estudar?” Fatos dessa natureza são</p><p>registrados na gramática que “os pronomes retos nunca são</p><p>precedidos de preposição; como temos um pra (para) na</p><p>construção acima, deveríamos usar um pronome oblíquo</p><p>regendo o pronome” (p. 199).</p><p>As gramáticas ditam as normas e são elas ensinadas para</p><p>os alunos como uma matéria estabelecida na grade curricular</p><p>das séries e dos cursos, mas como falantes e também como</p><p>profissionais da língua, deve-se aprender e também a trabalhar</p><p>com as normas dessa língua, mas jamais ignorar o ato</p><p>espontâneo de fala de cada indivíduo em situações reais de</p><p>comunicação linguística, Lemle (1978).</p><p>Considera-se desvio linguístico o uso dos pronomes</p><p>pessoais eu e mim diante de preposição e sua variação em “para</p><p>eu” e “para mim”. As regras gramaticais normativas registram</p><p>que antes de um verbo que esteja no infinitivo, isto é, de forma</p><p>nominal do verbo que termine em “r” (comprar, fazer, pedir),</p><p>deve-se usar o pronome pessoal do caso reto “eu”, que funciona</p><p>como sujeito do verbo. Bechara (2007, p.173), outro gramático</p><p>se posiciona sobre o assunto explicitando que “o pronome</p><p>pessoal reto funciona como sujeito e predicativo, enquanto o</p><p>oblíquo pode funcionar como complemento. Entre os oblíquos,</p><p>a forma átona vem desprovida de preposição, enquanto a tônica</p><p>exige, no português moderno, esta partícula”. Este gramático</p><p>mostra as contrariedades da norma quando ocorrer a</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>16</p><p>substituição da forma reta pela oblíqua “em coordenações de</p><p>pronomes ou com um substantivo introduzido pela preposição</p><p>entre: entre eu e tu (por entre mim e ti); entre eu e o aluno, entre</p><p>José e eu.” E aponta as concessões de alguns gramáticos</p><p>“quando o pronome eu ou tu vem em segundo lugar: Entre mim</p><p>e ti. Entre o José e eu. Um exemplo como Entre José e mim</p><p>dificilmente sairia hoje da pena de um escritor moderno”.</p><p>As gramáticas normativas (GN) doravante chamadas de</p><p>gramáticas da norma padrão prescrevem como a língua deve ser</p><p>usada. São elas que normatizam e ditam as regras que devemos</p><p>considerar corretas no uso da língua para falar e escrever</p><p>corretamente. Com relação aos pronomes Cegalla (2005, p.180)</p><p>apresenta explicações semelhantes às de Bechara, quando</p><p>posiciona que “pronomes pessoais são palavras que substituem</p><p>os substantivos e representam as pessoas do discurso- 1ª pessoa:</p><p>a que fala; 2ª pessoa: a com quem se fala; 3ª pessoa: a pessoa ou</p><p>coisa de que se fala”</p><p>A Sociolinguística, de acordo com Bagno (2013), trabalha</p><p>com aspectos que vão além da norma culta, uma vez que não se</p><p>pode estigmatizar o falante em certo ou errado, pois os falantes</p><p>não têm um único estilo de se expressar, até porque se amparam</p><p>em normas linguísticas que estão associadas aos diferentes</p><p>contextos de uso da língua. Para este linguista a norma padrão</p><p>é um “modelo artificial de língua criado justamente para tentar</p><p>‘neutralizar’ os efeitos da variação, para servir de padrão para</p><p>os comportamentos linguísticos considerados adequados,</p><p>corretos e convenientes” (Bagno, 2013, p. 38-39).</p><p>Bagno (2007) chama atenção dos professores no sentido de</p><p>que as escolas “abandonem o mito da “unidade” do português</p><p>no Brasil e passem a reconhecer a verdadeira diversidade</p><p>linguística de nosso país para melhor planejarem suas políticas</p><p>de ação junto à população amplamente marginalizada dos</p><p>falantes das variedades não padrão” (p.18). Ao referir-se às</p><p>gramáticas o linguística observa uma inversão da realidade</p><p>histórica, pois as “gramáticas foram escritas precisamente para</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>17</p><p>descrever e fixar como “regras” e “padrões” as manifestações</p><p>linguísticas usadas espontaneamente pelos escritores</p><p>considerados dignos de admiração, modelos a ser imitados” (p.</p><p>64). Assim, a gramática normativa passou a ser uma imposição</p><p>do falar correto, e o que não está na gramática normativa “não é</p><p>português”.</p><p>No transcurso desse estudo encontramos alguns desvios</p><p>linguísticos na fala e informantes que se posicionaram como</p><p>uma maneira incorreta de uso da língua ficando a favor das</p><p>normas gramaticais, todavia sabe-se que há uma consciência de</p><p>que cada falante se expressa conforme o meio social em que</p><p>vive. Castilho</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>126</p><p>Revista Brasileira de Política e Administração da Educação - Periódico</p><p>científico editado pela ANPAE, [S. l.], v. 28, n. 1, 2012. DOI:</p><p>10.21573/vol28n12012.36066. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/i</p><p>ndex.php/rbpae/article/view/36066. Acesso em: 7 nov. 2023</p><p>GIVÓN, T. Prospectus, Somewhat Jaundiced. In Functionalism and grammar.</p><p>Amsterdan, Philadelphia: J. Benjamins, 1995, p. 1-23.</p><p>HALLIDAY, Michael Alexander Kirkwood. An Introduction to Functional</p><p>Grammar. London: Edward Arnold, 1994.</p><p>HALLIDAY, Michael A. K. An Introduction to Functional Grammar. Hodder</p><p>Education, 2004.</p><p>KENEDY, E; MARTELOTTA, M. E. T. . A visão funcionalista da linguagem no</p><p>século XX. In: Maria Angélica Furtado da Cunha; Mariangela Rios de</p><p>Oliveira; Mário Eduardo Toscano Martelotta. (Org.). 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Rio de Janeiro | Volume 16 | Número Especial Comemorativo</p><p>| p. 595-621 | nov. 2020.</p><p>SAUSSURE, F. de (1916/1970). Curso de Linguística Geral, 2ª ed. São Paulo:</p><p>Cultrix.</p><p>SILVA, Jefferson IIdefonso da. Estruturalismo e educação. Educ. e Filos.</p><p>Uberlândia, 7 (13): 179- 191, jan. jun. 1993. Disponível em:</p><p>https://seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/article/view/1123. Acesso</p><p>em 2022</p><p>VEIGA-NETO, Alfredo (Org.). Crítica pós-estruturalista e educação. Porto</p><p>Alegre: Sulina, 1995.</p><p>VEIGA-NETO, Alfredo. Olhares... In: COSTA, Marisa Vorraber Costa (org.).</p><p>Caminhos investigativos I. Rio de Janeiro: Lamparina Editora, 2007.</p><p>VEIGA-NETO, Alfredo. Teoria e método em Michel Foucault: (im)</p><p>possibilidades. Cadernos de Educação, Pelotas, n. 34, p. 83-94, set./dez.</p><p>2009</p><p>VEIGA-NETO, A ,Michel Foucault e os estudos culturais. In: COSTA, M. (org.)</p><p>Estudos culturais em educação. Porto Alegre: Universidade/UFRGS, 2000.</p><p>p.37-72.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>128</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>129</p><p>ESTUDO DO LÉXICO AFRICANO EM COMUNIDADES</p><p>AFRO-BRASILEIRAS DE MATO GROSSO1</p><p>Antônio Carlos Santana de Souza2</p><p>Cristiane Schmidt3</p><p>Maria Elaine Vila de Pinho4</p><p>O Estado de Mato Grosso possui características linguísticas</p><p>peculiares, desde sua fundação, quando teve como primeira</p><p>capital a cidade de Vila Bela da Santíssima Trindade. No</p><p>entanto, percebemos que os estudos da linguagem estão</p><p>miscigenados por várias ramificações e as abordagens teóricas</p><p>se consolidam a partir do objeto a ser analisado.</p><p>Para tanto, o estudo da linguagem nos permite pensar em</p><p>língua, pensar em língua portuguesa, em história do português</p><p>no Brasil, especificamente, no período em que os colonizadores</p><p>chegaram ao Brasil a partir de 1500, trazendo essa língua que se</p><p>expandiu em terras de além mar. Mas, também sabemos que</p><p>1 Parte deste capítulo tem como referência PINHO, Maria Elaine Vila de. Análise do</p><p>Português Falado em Comunidades Afro-brasileiras de Cáceres-MT. Dissertação de</p><p>Mestrado. Programa de Pós-graduação em Linguística da UNEMAT. Cáceres, 2019. E</p><p>outras partes constam em SOUZA, Antônio Carlos Santana de. Macroanálise</p><p>pluridimensional da variação do português em comunidades afro-brasileiras de Mato</p><p>Grosso: das línguas africanas ao português brasileiro falado. Relatório Final de Pós-</p><p>Doutorado pelo PNPD/CAPES. Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem do</p><p>Instituto de Linguagens. Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, 2019. (Inédito)</p><p>2 Docente Permanente PROFLETRAS-UEMSCG e Docente Permanente PPGL-UNEMAT</p><p>(Cáceres). UEMS/UNEMAT (Cáceres). Campo Grande/Cáceres. Brasil. acsantan@uems.br</p><p>3 Docente Permanente do Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade</p><p>Estadual do Mato Grosso/PPGL-UNEMAT . Pós-Doutorado em Linguística pela</p><p>Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul/UEMS (2018). Doutora em Letras, área de</p><p>concentração em Linguagem e Sociedade pela Universidade Estadual do Oeste do</p><p>Paraná/UNIOESTE (2016). Atualmente é Docente Adjunto do Curso de Letras da</p><p>Universidade Federal do Mato Grosso do Sul/UFMS. Líder do Grupo O que vem te</p><p>constituindo professor? Memoriais autobiográficos entre a vida e a formação na docência</p><p>de Pesquisa e Estudos de Narrativas de Sujeitos-Professores em Formação-SUPROF do</p><p>CNPq (FALEM/UFPA). Orcid https://orcid.org/0000-0003-0514-2035. E-mail: cristiane_</p><p>schmidt@ufms.br</p><p>4 Mestre em Linguística. UNEMAT (Cáceres). Cáceres. Brasil. memariaeliane74@gmail.com</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>130</p><p>nesse período, houve contatos divergentes com outras línguas,</p><p>como as línguas indígenas (na sua maioria Tupi) e as línguas</p><p>africanas, tal contato foi fortalecido, devido ao forte tráfico de</p><p>escravizados, vindos da África para o Brasil. Esse contato</p><p>linguístico, despertou muito interesse dos estudiosos em buscar</p><p>entender e conceituar a língua e a linguagem.</p><p>Já os estudos relacionados com o Africanismo, analisam a</p><p>relação das línguas africanas com o português falado no Brasil,</p><p>conforme Petter; Fiorin (2009, p. 01), “esse estudo objetiva</p><p>identificar os traços linguísticos atribuídos ao contato do</p><p>português com as línguas africanas que aqui aportaram no</p><p>período da colonização”.</p><p>Para este estudo focaremos na cidade de Cáceres. Foram</p><p>visitadas</p><p>as comunidades de Santana, Exu, Chapadinha e Pita</p><p>Canudo. Buscamos verificar, constatar e comparar os traços</p><p>linguísticos em termos de africanismos. Esse caso específico, por</p><p>meio da pesquisa de Petter e Alkmim (2009), intitulada</p><p>“Palavras da África no Brasil de ontem e hoje”, no livro África</p><p>no Brasil, propomos ainda, verificar a existência e a</p><p>permanência de africanismos no município em estudo e suas</p><p>variações.</p><p>Cáceres está localizado, no Alto Pantanal Mato Grossense</p><p>na Mesorregião Centro-Sul do Estado a 220 Km da capital</p><p>Cuiabá. Fica entre a depressão cuiabana e a planície do Pantanal</p><p>de Mato Grosso. Aplicamos o Questionário elaborado por Tânia</p><p>Alkmim por ter sido produtivo entre os entrevistados a questão</p><p>lexical em estudos anteriores.</p><p>Africanismos no Brasil: palavras de origem africana</p><p>Desde o período da colonização no Brasil houve uma</p><p>miscigenação de línguas, devido à presença de outros povos que</p><p>aqui aportaram, resultando em contato linguístico. Pensar em</p><p>contato linguístico, é pensar em uma conjuntura de línguas ou</p><p>dialetos que influenciam mutuamente, seja pela adjacência</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>131</p><p>geográfica ou social. Esse resultado que denominamos como</p><p>contato linguístico, ou simplesmente um “empréstimo” de</p><p>palavras, pode afetar tanto a gramática, quanto a fonologia, ou</p><p>uma mistura de línguas, gerando os chamados “pidgins e</p><p>crioulo”. Segundo alguns estudos, os “pidgins” surgiram</p><p>através desses contatos de uma língua com outras, que foram</p><p>usadas na época da colonização para um entendimento rápido,</p><p>ou seja, uma comunicação acelerada com pessoas que falavam</p><p>línguas diferentes. Já o crioulo, poderíamos dizer que é quando</p><p>os pidgins passam a fazer parte de uma comunidade.</p><p>Identificar esses traços linguísticos deixados pelos</p><p>escravos, em contato com o português brasileiro, demanda</p><p>muitos estudos, e dentre as muitas teorias encontradas,</p><p>apresentamos o livro África no Brasil: a formação da língua</p><p>portuguesa, publicado pela Editora Contexto em 2008, com</p><p>reedição em 2009.</p><p>Para a constituição do corpus do trabalho apresentado por</p><p>elas, buscaram os mais avançados estudos do léxico de origem</p><p>africana no Brasil, como: Falares africanos na Bahia, de Castro</p><p>(2001). Nesse estudo as autoras distribuem conforme a sua</p><p>origem, seja banta, ioruba, fon e de formação brasileira. Partindo</p><p>dos contextos sociolinguísticos diversos, constituíram-se cinco</p><p>níveis de contribuições africanas, sendo: 1) linguagem religiosa</p><p>dos candomblés da Bahia ou língua de santo; 2) linguagem usual</p><p>do povo de santo; 3) linguagem popular da Bahia; 4) linguagem</p><p>cuidada e corrente, familiar na Bahia; e 5) o português do Brasil</p><p>em geral. Resultando em 3.517 vocábulos de origem africana, e</p><p>ainda define e separa quantitativamente a origem de cada</p><p>vocábulo estudado. Neste sentido, o corpus do trabalho em</p><p>estudo se constituiu de 400 vocábulos.</p><p>Conforme o resultado obtido, elaborou-se um segundo</p><p>questionário com 249 palavras totalmente de origem africana.</p><p>Partindo desse contexto, as autoras compararam os dados do</p><p>corpus com os registros feitos pelos pesquisadores dos séculos</p><p>XIX e XX, nessa comparação, perceberam quais expressões</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>132</p><p>permaneceram na linguagem e quais já desapareceram,</p><p>verificaram ainda, se houve ou não mudanças nos significados</p><p>usados atualmente. Concluindo esse trabalho, as autoras</p><p>finalizam ressaltando, que muitos desses vocábulos</p><p>desapareceram da linguagem falada, e outros são</p><p>desconhecidos ou de uso restrito. Os termos referidos a</p><p>“escravidão”, permaneceram na escrita, marcando a história.</p><p>Por fim, as pesquisadoras dizem que, as etimologias dos</p><p>termos de origem africana representam um grande desafio a</p><p>cumprir, chegaram ainda a conclusão, de que os vocábulos</p><p>estudados são quase de origem banta, excetos alguns, mas a</p><p>predominância da origem banta confirma a antiguidade do</p><p>contato do português com as línguas do grupo banto, não</p><p>excluindo, a presença dos termos de línguas oeste-africanos</p><p>(fon, ioruba, eve, gun, maí, huça).</p><p>Caminhos Metodológicos da Pesquisa</p><p>Abordaremos aqui, o processo metodológico que norteou</p><p>nosso estudo. Esta pesquisa está composta pelos estudos de</p><p>Alkmin e Petter (2009, p. 145-177), designada “Palavras da</p><p>África no Brasil de ontem e de hoje”; texto de suma importância</p><p>que descreve como os estudos e levantamentos dos africanismos</p><p>foram feitos no Brasil.</p><p>O corpus deste estudo foi constituído por meio da aplicação</p><p>do questionário elaborado por Alkmin (S/D), composto por 249</p><p>palavras de origem africana. Deste modo, apresentaremos aqui,</p><p>um breve histórico das comunidades em estudo, os</p><p>discernimentos para a seleção dos entrevistados e coleta de</p><p>dados.</p><p>Análise e comparação de dados</p><p>Esta análise é importante dizer, foi elaborada a partir de um</p><p>questionário com 249 vocábulos de origem africana, dos estudos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>133</p><p>de Alkmim; Petter (2009, p. 145-177), sendo submetida a 70</p><p>pessoas das comunidades de Cáceres-MT. A aplicação desse</p><p>questionário permitiu-nos, identificar 110 vocábulos comuns ao</p><p>universo dos entrevistados.</p><p>Para Alkmim; Petter (2009, p. 157), os resultados</p><p>encontrados em sua pesquisa foram organizados em três</p><p>divisões, na primeira elas incluem os termos de uso em qualquer</p><p>interação social, nesse estudo foram selecionados trinta</p><p>vocábulos de origem africana, desses 30 termos classificados por</p><p>elas, nós encontramos vinte e sete termos em uso na</p><p>comunidade em estudo, como: caçamba, cachaça, cachimbo,</p><p>caçula, canga, capanga, carimbo, caxumba, cochilar, corcunda,</p><p>dengo, fubá, gibi, macaco, maconha, macumba, marimbondo,</p><p>miçanga, molambo, moleque, moringa, quilombo, quitanda,</p><p>quitute, senzala, tanga, xingar. E todos com o mesmo</p><p>significado, com exceção de algumas variações para as palavras:</p><p>capanga, encontramos apenas como guarda costas; macaco,</p><p>como animal e como peça para trocar pneu; quitute, como</p><p>comida feita pelos grandes chefes e como uma partilharia de</p><p>alimentos.</p><p>Passando para a segunda divisão, com termos de uso</p><p>coloquiais, informais, citadas pelas autoras, vem apresentando</p><p>nove termos, desses encontramos seis: bambambã, banguela,</p><p>cafuné, catinga, mandinga e muamba, todos com a mesma</p><p>definição dada pelas autoras, havendo apenas, mais de uma</p><p>variação na palavra banguela, uma pessoa sem dente e também</p><p>uma descida.</p><p>A terceira divisão apresenta os vocábulos informais de uso</p><p>limitado, com 17 termos. Destes encontramos quinze: angu,</p><p>babaca, babau, biboca, bunda, cafofo, cafundó, cambada,</p><p>cucuia, muquifo, muquirana, muvuca, muxiba, sacana e</p><p>zumbi. Houve variação apenas no sentido da palavra angu, não</p><p>como confusão citado pelas autoras, mas como comida, as</p><p>demais tiveram o mesmo sentido.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>134</p><p>Comparações dos vocábulos encontrados na comunidade com</p><p>os autores dos séculos XIX e XX</p><p>Para este estudo comparativo dos vocábulos encontrados</p><p>na comunidade urbana Pita Canudo, buscamos aporte na</p><p>pesquisa de Alkmim; Petter (2009). Nessa pesquisa elas</p><p>apontam dois dicionaristas do século XIX e dois trabalhos do</p><p>século XX. Os dois dicionaristas do século XIX são: A.J. de</p><p>Macedo Soares, e Visconde de Beaurepaire-Rohan. Do século XX</p><p>são os trabalhos: “A influência africana no português do Brasil”</p><p>(Renato Mendonça) e “O elemento afro-negro na língua</p><p>portuguesa” (Jacques Raimundo).</p><p>Iniciaremos as nossas comparações com os autores do</p><p>século XIX, citados por Alkmim; Petter (2009). Conforme as</p><p>autoras, os dicionaristas desse século estão divididos em dois</p><p>grupos: 1) os que mantêm os mesmos significados atuais, e 2) os</p><p>que apresentam altercações de significado, em relação ao uso</p><p>atual. Apresentamos as palavras</p><p>encontradas pelos dois</p><p>dicionaristas com o mesmo sentido atual: banzo, cachimbo,</p><p>caçula, canga, capanga, carimbo, caxumba, cochilar, fubá,</p><p>miçanga, molambo, moringa, quilombo, quitanda, quitute,</p><p>senzala e xingar. De todos esses vocábulos registrados pelos</p><p>autores no século XIX, com exceção do termo banzo, que no</p><p>entanto houve desconhecimento desse termo na comunidade.</p><p>As demais são características comum na comunidade Pita</p><p>Canudo em uso real, e o interessante é que mesmo com o passar</p><p>do tempo permanece com o mesmo sentido.</p><p>Alguns termos registrados por Macedo Soares, como:</p><p>cachimbo, canga, carimbo, dengo, miçanga, também</p><p>encontramos em uso na comunidade em estudo, como está claro</p><p>foram palavras utilizadas no século XIX; quanto ao significado</p><p>desses termos, são praticamente idênticos aos apresentados pelo</p><p>autor, ele traz outra variação para o termo canga, como uma</p><p>“espécie de mineral argiloso” na Província de São Paulo, com o</p><p>qual não identificamos na comunidade, encontramos como algo</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>135</p><p>que coloca no pescoço do animal e como saída de praia. Afirma</p><p>ainda, que todos esses vocábulos foram originários da língua</p><p>congo, de origem africana.</p><p>Os termos encontrados apenas em Beaurepaire, como</p><p>moringa, significando “bilha de barro para água”, em nossa</p><p>pesquisa encontramos como objeto de barro para colocar água.</p><p>Indicando assim, que esse vocábulo permanece em nossa língua</p><p>portuguesa, em uso real. As autoras encontraram o termo</p><p>quitute, significando como “pessoa hábil para fazer quitute”,</p><p>em nossa pesquisa encontramos esse termo na fala de todos os</p><p>entrevistados, significando “grandes chefes de cozinha”. E com</p><p>a variação de partilha de alimentos, ou seja, uma junção de</p><p>pessoas, que partilham alimentos e depois juntam tudo que foi</p><p>coletado, para preparar um almoço.</p><p>Há um grupo de expressões que foram registradas de</p><p>forma quase idêntica pelos dois dicionaristas como: Quilombo,</p><p>designado por eles como esconderijo de escravos fugitivos, mas</p><p>apenas Beaurepaire registra como língua bunda, significando</p><p>acampamento. Esse termo foi identificado por todos os</p><p>entrevistados como espaço, esconderijo, lugar, aldeia, onde</p><p>moravam os refugiados, os negros escravos. Percebe-se o uso</p><p>desse termo em tempo real na comunidade em estudo com o</p><p>mesmo significado.</p><p>As palavras: senzala e xingar, encontramos na comunidade</p><p>em estudo como: lugar, moradia, espaço, alojamento, grande</p><p>casa dos negros. E para a palavra xingar, encontramos como:</p><p>falar palavrão, ato de falar palavrão, ofender alguém. Alkmim;</p><p>Petter (2009), apontam os dois dicionaristas, trazendo apenas</p><p>uma variação para o termo senzala, como sanzala, que significa</p><p>moradia de escravos, povoação. E para o termo xingar como:</p><p>insultar com palavras, afirmam que são termos da etimologia</p><p>bunda. Isso nos reforça dizer que as palavras estão vivas na</p><p>comunidade.</p><p>As autoras observam, ainda, outros vocábulos registrados</p><p>pelos dois dicionaristas: banzo, com a variante banzar,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>136</p><p>registrado como: ficar pensativo, triste. Não encontramos esse</p><p>termo em nenhuma das 20 entrevistas realizadas, podemos</p><p>dizer que houve certo desaparecimento desse termo.</p><p>O vocábulo caçula, segundo as autoras, é registrado pelos</p><p>dois dicionaristas como: filho ou filha mais jovem, com a</p><p>variante caçulê, nos nossos estudos, o significado para esse</p><p>termo foi idêntico ao encontrado pelos dois autores,</p><p>encontramos como: filho mais novo ou o último filho.</p><p>Para os termos caxumba, cochilar, fubá, quitanda, os dois</p><p>autores do século XIX, registram essas palavras de forma</p><p>idênticas as que encontramos em nossos estudos. Embora</p><p>alguns termos apresentem variação como, por exemplo, o termo</p><p>fubá, os autores trouxeram de forma figurada, como: “fazer</p><p>tudo em fubá”, nós encontramos apenas como “farinha de</p><p>milho”. Outro termo que também apresentou variação para os</p><p>autores do século XIX foi a palavra quitanda, para os autores</p><p>esse termo, além de ser um lugar que vende frutas, hortaliças,</p><p>pescado, varia também como: sentido de ocupação como, por</p><p>exemplo: “A clínica é minha quitanda”, e também como “venda</p><p>ambulante” para esses autores a etimologia do vocábulo nessa</p><p>época significava cama, liteira, maca, além de registrar seus</p><p>derivados quitandeiro/ quitandeira e quitandar. Mas esse</p><p>sentido feminino quitandeira assume como mulher sem</p><p>educação. Em nossos estudos encontramos significados para</p><p>esse termo apenas como: lugar que vende coisas variadas,</p><p>mercadinho, bolinhos, venda de frutas, lugar pequeno, vende</p><p>verdura, e também quitandeira mulher que faz doces, comida.</p><p>Percebe-se que não há presença também das variações usadas</p><p>nos dicionários do século XIX, houve modificação ou</p><p>apagamento de um dos significados, mudança nesse termo</p><p>quitandeira, mudou de sentido, não encontramos como mulher</p><p>sem educação apenas como mulher que cozinha bem, que faz</p><p>doces.</p><p>Continuamos com os dois dicionaristas do século XIX,</p><p>trazidos por Alkmim; Petter (2009, p.161), os vocábulos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>137</p><p>caçamba, cachaça, candango, corcunda, macaco, marimbondo,</p><p>moleque e tanga são vocábulos que apresentaram diferenças</p><p>nos significados em relação ao uso atual. Destaca a palavra</p><p>candango que somente Macedo Soares apresentou o sentido,</p><p>hoje desconhecido, era nome que os africanos nomeavam os</p><p>portugueses, e atualmente tem o sentido como construtores de</p><p>Brasília. Em nossa pesquisa, tivemos apenas um registro como:</p><p>trabalhadores e como pessoas que vem de uma cidade para</p><p>outra. Percebemos que houve um certo apagamento de sentido</p><p>como era usada essa palavra, embora não encontremos como</p><p>construtores de Brasília, mas como trabalhadores isso nos</p><p>reforça que esse termo realmente houve mudança.</p><p>Partimos para o termo caçamba, os dois dicionaristas</p><p>registram variações como um “balde preso em uma corda”,</p><p>também como expressão popular “a corda e a caçamba”, e</p><p>ditado popular “aonde vai a corda vai a caçamba”, registram</p><p>também o sentido de “estribo em forma de chinela”, assim como</p><p>“balde em geral” e o nome dado por jovens ao carro de aluguel.</p><p>Os mesmos dicionaristas registram como sentido em uso</p><p>permanecendo o sentido de “recipiente”, caçamba de lixo e</p><p>caminhão caçamba. Em registro da nossa pesquisa,</p><p>concordamos com os dicionaristas, mas desconhecemos o</p><p>significado de caçamba como balde, ditado ou expressão</p><p>popular, encontramos em uso atual apenas como caçamba de</p><p>lixo, caminhão de areia. No entanto esse termo mudou o seu</p><p>significado.</p><p>Para o termo cachaça, as autoras registram pelos</p><p>dicionaristas como: aguardente, aguardente feita com mel ou</p><p>borras de melaço, cachaça, justificam que a cachaça era retirada</p><p>da cana de açúcar uma escuma grossa contendo impurezas</p><p>tirado do cozimento da cana de açúcar. Também apresentam a</p><p>variação com o sentido figurado “paixão predominante”</p><p>também analisado hoje como “A cultura das flores é a minha</p><p>cachaça”, mas Macedo sugere a definição de “bêbado”. Como</p><p>derivados os dois dicionaristas registram “cachaceira”, como</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>138</p><p>(lugar onde se deposita a cachaça). Em nossos estudos</p><p>encontramos as variações para o termo: pinga, aguardente,</p><p>branquinha, cinquenta e um, caninha. Encontramos também a</p><p>palavra “cachaceira” em uso real, pessoa do sexo feminino,</p><p>mulher que bebe muito ou todos os dias. Entende-se que houve</p><p>um certo apagamento da definição do termo do século XIX, para</p><p>os dias atuais.</p><p>O termo corcunda, cacunda, registrado por Macedo Soares,</p><p>conforme as autoras, como: dorso, costas, aproximando de</p><p>corcova. De forma derivada cacundeiro, significando</p><p>carregador que leva carga nas costas, ou animal que na tropa</p><p>gosta de andar atrás dos outros pelas costas e</p><p>homem de baixa</p><p>condição. Neste termo, os dicionaristas não deixam claro o</p><p>sentido atual de “pessoa com deformidade nas costas”. E para</p><p>Beaurepaire, registra apenas como “Cacunda”, no sentido de</p><p>dorso costas, ainda considera a hipótese do termo cacunda, seja</p><p>uma alteração do termo vulgar corcunda. Em nossos estudos</p><p>encontramos como definição para o termo “Corcunda”, pessoas</p><p>com deficiência nas costas, pessoas curvadas para frente.</p><p>Encontramos também cacunda, significando costas.</p><p>Observamos que esse termo houve diferença de sentido, foram</p><p>duas palavras parecidas com sentido diferente. Que no entanto</p><p>para os dicionaristas permanecia os mesmos sentido para as</p><p>duas palavras “corcunda” e “cacunda”.</p><p>Para o termo macaco, foi registrado pelos dois dicionaristas</p><p>como: “máquina para suspender peso” em uso atual.</p><p>Consideram um sentido desconhecido “pilar em cuja construção</p><p>se empregam apenas dois tijolos por camada”. Também</p><p>vocábulo bunda macacu no sentido de macaco-animal, sujeito</p><p>esperto, sujeito feio e engraçado. Encontramos os mesmos</p><p>significados para esse termo, mas com uma diferença na escrita</p><p>do século XIX “macacu” e em nossos dias atuais “macaco”.</p><p>O vocábulo marimbondo registrado como “espécie de</p><p>vespas”, Macedo Soares registra como “marimbundo”, de</p><p>forma derivada “marimbondada”, ferroada do marimbondo, e</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>139</p><p>também um outro significado que o autor considera</p><p>desconhecido hoje iguaria de carne desfiada com outros</p><p>preparos. Beaurepairea forma “marimbondo”, com diferenças</p><p>apenas na escrita, que na língua bunda marimbondo,</p><p>marimbundo, malimbundo é indiferente. Em nossa pesquisa</p><p>encontramos como: bicho que ferra, inseto, vespas. Vejamos que</p><p>houve variação nas palavras, mas com o mesmo sentido dos</p><p>dicionaristas.</p><p>Apresentaremos aqui os vocábulos encontrados por</p><p>Alkmim; Petter (2009), registrados de forma idêntica pelos dois</p><p>dicionaristas Macedo Soares e Beaurepaire. Moleque/ muleque:</p><p>este termo vem significando criança/ jovem/ escravo ou negro,</p><p>originado da língua bunda. Aparece também no sentido de</p><p>pessoa de mau procedimento, digno de um moleque, gaiato,</p><p>engraçado. Os dois dicionaristas concordam com os derivados</p><p>da palavra, que são moleca/molecada/ molecagem/</p><p>molequeira/molecão etc. Nomeando também o pé-de-moleque</p><p>que é um doce feito com amendoim torrado característico da</p><p>festa de São João. Em nossos estudos encontramos significado</p><p>para esse termo como menino, criança pequena, garoto, guri,</p><p>gurizote. Percebemos as variações para esse termo, mas com o</p><p>mesmo significado dos autores, e são palavras de uso e</p><p>conhecidas pela comunidade.</p><p>A palavra Tanga é apresentada por eles como “um pedaço</p><p>de pano das dimensões de um lençol”, marcado como vestuário</p><p>de escravo africano; e o sentido da palavra hoje corresponde a</p><p>peça reduzida de vestuário, eles também citam a expressão</p><p>“ficar de tanga”, que corresponde a ficar na miséria, sem nada.</p><p>Consideram como vestuário indígena e tipo de vestuário</p><p>feminino de banho, no tamanho reduzido. Concordando com as</p><p>autoras encontramos o significado dessa palavra praticamente</p><p>idêntica a citada pelos dicionaristas, ou seja, um tipo de</p><p>vestuário feminino, peça de roupa feminina. Mas o ditado</p><p>popular não aparece em nossos estudos.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>140</p><p>Seguimos o nosso trabalho sob a perspectiva do trabalho de</p><p>Alkmim; Petter (2009), em que os dicionaristas separaram os</p><p>vocábulos em dois grupos: grupo 1 e o grupo 2. No grupo 1, as</p><p>autoras não registraram os seguintes termos: abadá, gibi,</p><p>maconha, macumba, mas elas comentam esses vocábulos. Para</p><p>os termos maconha e macumba, Macedo Soares define maconha</p><p>como: liamba e pango e Beaurepaire define como liamba, pango</p><p>e riamba. As duas afirmam que são significados desconhecidos</p><p>atualmente.</p><p>Para o termo macumba, ambos registram como candomblé</p><p>uma etimologia africana, também como dança dos negros,</p><p>batuque sagrado, dança ritual com prática de feitiçaria. Como</p><p>derivado registrado pelos dois autores candombeiro,</p><p>“dançador”, ou frequentador de candomblé. Também</p><p>apresentam a variação do termo candomblé no sentido de “um</p><p>tipo de rede de pescar”. Em nossa pesquisa, o termo macumba</p><p>foi encontrado como feitiço, maldade que fazem para os outros,</p><p>feitiçaria, despacho que fazem nas encruzilhadas. Para este</p><p>termo, podemos dizer que embora muitas haja variações ao</p><p>nome, mas permanece o mesmo significado. Para o termo</p><p>maconha as autoras apresentam significando liamba, pango,</p><p>riamba. Em nossa pesquisa, para o termo maconha, deparamos</p><p>com o sentido de erva e droga em uso atual. Percebe-se que esse</p><p>termo, apresenta uma mudança no nome, mas permanece o</p><p>mesmo significado encontrado no século XIX.</p><p>O temo cafuné, com o significado de “gesto carinhoso”, que</p><p>simula gesto de catar piolho, também foi encontrado como “os</p><p>cocos menores do cacho de dendê”, embora este último seja</p><p>desconhecido. Em nosso trabalho encontramos cafuné como:</p><p>carinho na cabeça das pessoas, tipo de agrado, carinho.</p><p>Percebemos que o significado é idêntico com o encontrado pelas</p><p>autoras em uso atual.</p><p>Seguimos por analisar os termos registrados no grupo 2,</p><p>segundo as autoras Alkmim; Petter (2009), são os termos que</p><p>apresentaram diferença de significado, registrado pelas dois</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>141</p><p>dicionaristas, em relação ao uso atual. O termo Catinga teve</p><p>registro como uso atual “mau cheiro”, o outro significado é o de</p><p>“espécie de mato”, com vegetação esparsa, rala. Sua origem</p><p>tupi. Em nossos estudos encontramos no sentido de mau cheiro,</p><p>odor, vegetação cerrado. Aqui confirmamos o que os</p><p>dicionaristas apresentaram a palavra com dois sentidos em uso</p><p>atual.</p><p>A palavra mandinga, conforme Alkmim; Petter (2009), foi</p><p>registrado apenas por um dicionarista, como arte de fechar o</p><p>corpo, feitiçaria, dificuldades imprevistas, mas no uso atual</p><p>permanece apenas o sentido geral feitiçaria. Para o mesmo</p><p>termo, em nossos estudos, encontramos como feitiço,</p><p>macumbeiro, simpatia, reforçando o registro do dicionarista.</p><p>Para o termo muamba, registrado pelos dois dicionaristas</p><p>como fraude, engano, doloso, velhacaria. No uso atual define</p><p>como produto comercializado de forma ilegal. Nós também</p><p>encontramos com o sentido de: pessoa que vende muita coisa;</p><p>mexer com contrabando; pessoa que vende roupas e outras</p><p>coisas de forma ilegal.</p><p>Biboca, segundo as autoras, tanto Macedo quanto</p><p>Beaurepaire, significa buraco, escavação formada por água.</p><p>Beaurepaire acrescenta que são terrenos que se tornam de difícil</p><p>acesso; e ainda define um segundo sentido: qualquer terreno</p><p>brenhoso, de difícil trânsito, ainda trazem-no como sentido</p><p>figurado “casinha de palha”. No sentido atual “habitação</p><p>precária, localizada em lugar esquisito e suspeito. Em nossa</p><p>pesquisa encontramos como lugar pequeno e feio, casa longe,</p><p>feia, suja, buraco onde moro. Para tanto, o significado desse</p><p>termo em uso não difere dos sentidos colocados pelos</p><p>dicionaristas.</p><p>A palavra Muquirana é encontrada com dois sentidos,</p><p>como “piolho que se agarra ao corpo”, que não é reconhecido</p><p>atualmente e como “pessoa avarenta, pão duro”. Nós também</p><p>encontramos a palavra com o sentido de “pessoa pão dura”,</p><p>“pessoa econômica que não gosta de gastar”.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>142</p><p>Os termos quizumba e Sacana, segundo as autoras, apenas</p><p>Macedo Soares registra esses termos, no sentido de rapaziada,</p><p>no uso atual como bagunça, confusão. Sacana no sentido de</p><p>copular, fornicar. Diferente do sentido atual “pessoa sem</p><p>vergonha, mau caráter”. Encontramos em nossos estudos a</p><p>definição para o termo quizumba como briga, farra, confusão. E</p><p>para o termo sacana é não ter compromisso com o outro, pessoa</p><p>sem caráter, sem vergonha.</p><p>O termo</p><p>zumbi, conforme as autoras, Macedo Soares</p><p>define como “alma do outro mundo”, um ser sobrenatural e</p><p>Beaupaire aponta um sentido mais estreito: entre o fantástico</p><p>que segundo a crendice vagueia no interior das casas em horas</p><p>mortas. Encontramos como acordado a noite toda, pessoa que</p><p>anda a noite.</p><p>As autoras Alkmim; Petter (2009) trazem os vocábulos</p><p>registrados no século XX, por R. Mendonça (1933) e por J.</p><p>Raimundo (1933), nas três divisões: No grupo 1: apresenta</p><p>sentido atual; grupo 2: deslocamento de sentido em relação ao</p><p>uso atual, e por último grupo 3: que não apresentaram diferença</p><p>no significado em relação ao uso atual.</p><p>Com o mesmo sentido atual, foi registrado apenas por</p><p>Mendonça. Como o termo banzo no sentido de aldeia, saudade</p><p>da aldeia, da terra natal. Esse termo consideramos instinto, pois</p><p>não encontramos em nenhuma fala.</p><p>Cachaça neste século, conforme as autoras, têm sentido</p><p>único “aguardente”, diferente do século XIX, afirmando que</p><p>esse termo é de origem africana. Mas em nossa pesquisa</p><p>encontramos vários sentidos para a palavra, como no século</p><p>anterior.</p><p>A palavra Canga também aparece aqui como sentido único</p><p>“trave de madeira adaptada no pescoço de animais”, originário</p><p>do quimbundo kanga, significando prender, ligar. Em nosso</p><p>trabalho além de ser objeto que coloca no animal, também</p><p>encontramos outro significado como saída de praia.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>143</p><p>O termo Macumba, conforme as autoras, aparece</p><p>significando “feitiçaria, candomblé, magia, despacho”, é</p><p>conhecido por todo País, mas é um culto próprio do Rio de</p><p>Janeiro. Em nossos estudos encontramos também como feitiço e</p><p>despacho.</p><p>Apresentamos dois termos registrados apenas por J.</p><p>Raimundo (1933):</p><p>Capanga: este apresenta dois sentidos, como “guarda-</p><p>costas, cangaceiro e como bolsa saco de couro e lona.</p><p>Encontramos apenas com um sentido de guarda-costas em uso</p><p>atual.</p><p>Moringa: como “bilha de barro em forma de garrafa,</p><p>bojuda e de gargalho comprido”. Em nossos estudos</p><p>encontramos com o significado de jarro de barro para colocar</p><p>água.</p><p>Apresentamos alguns vocábulos do grupo 1 que foi</p><p>registrado pelos dois autores com sentido muito próximo ao</p><p>atual:</p><p>Cachimbo: como “aparelho de fumar”, de forma idêntica e</p><p>único sentido que encontramos em nossa pesquisa.</p><p>Caçula: como “filho mais moço” e também como “ato de</p><p>socar milho no pilão”. Nós encontramos o significado para esse</p><p>termo como: filho mais novo e último filho.</p><p>Caxumba: como “inflamação das paratóditas”. Nós</p><p>também encontramos apenas como doença que dá no pescoço.</p><p>Cochilar: como “cabecear com sono”, já em nossos estudos,</p><p>encontramos como “dormir pouquinho”.</p><p>Corcunda, Carcunda: com o mesmo sentido de: jiba,</p><p>corcova, indivíduo giboso. Em nosso trabalho, encontramos o</p><p>significado de pessoas curvadas para frente.</p><p>Dengo/Dengue: “termo carinhoso para se dirigir à criança,</p><p>comportamento feminino, manha, birra, afetação”. Em nossos</p><p>estudos, encontramos como termo carinhoso, criança manhosa.</p><p>Fubá: “farinha de milho, mandioca ou arroz”. Em nosso</p><p>trabalho, encontramos apenas como farinha de milho.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>144</p><p>Marimbondo: “vespas”, encontramos de forma idêntica</p><p>como vespas.</p><p>Miçanga: contas de vidro, joias de pouco valor. Para esse</p><p>termo, encontramos com bolinhas para bordar.</p><p>Molambo: “trapo, pedaço de pano velho”. Encontramos</p><p>apenas como pessoas mal vestidas.</p><p>Moleque: “preto jovem, menino de pouca idade, patife,</p><p>velhaco”. Deparamos com: criança, menino, guri.</p><p>Quilombo: “povoação fortificada dos negros fugitivos do</p><p>cativeiro”. Deparamos com sentido de local onde ficava os</p><p>escravos fugitivos, espaço somente de negros.</p><p>Quitanda: “venda de verduras frutas e outros vegetais”.</p><p>Em nosso trabalho encontramos como vendinha, venda</p><p>pequena de frutas, e também como bolo, doce.</p><p>Quitute: “iguaria fina, delicada, saborosa”. Mas nos</p><p>deparamos como: comida e partilharia de alimentos.</p><p>Senzala: “alojamento ou conjunto de alojamento dos</p><p>escravos nas fazendas”. Deparamos como: “espaço onde os</p><p>negros vivam no tempo da escravidão, tempo dos escravos,</p><p>alojamento dos negros”.</p><p>Tanga: “pano que encobre as genitais”. E para a expressão</p><p>estar de tanga, significa estar na penúria. Em nossos registros</p><p>encontramos apenas como peça de roupa pequena, pouca</p><p>roupa.</p><p>Xingar: “insultar com palavras, ofender”. Encontramos</p><p>como: falar palavrão, ofender outra pessoa com palavrão.</p><p>Apresentamos os termos que houve deslocamento de</p><p>sentido em relação ao uso atual, registrado apenas por</p><p>Raimundo:</p><p>Caçamba: “balde preso a uma corda para apanhar água no</p><p>poço”. Também registra como sentido figurado de</p><p>“companheiro, companheira”. E ainda afirma o sentido de</p><p>“recipiente”, observado nos autores do século XIX. Em nossos</p><p>estudos deparamos com “caçamba de lixo, caminhão”.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>145</p><p>Candango: “nome com que os negros designavam o</p><p>português”. Não tivemos registro desse termo.</p><p>Carimbo: “marca usada nas repartições e casas de</p><p>negócio”. Em nossos estudos encontramos como marca, objeto</p><p>usado para marcar.</p><p>Houve vocábulos que não foram registrados nesse século</p><p>por nenhum dos dicionaristas como: abadá, gibi, macaco e</p><p>maconha. Mas em nossos estudos encontramos significados</p><p>para o termo gibi, como “revistinha em quadrinhos”; e macaco</p><p>com dois sentidos “bicho” e “peça para levantar carro”. O termo</p><p>abadá não encontramos.</p><p>No grupo 2, a maior parte dos vocábulos registrados pelos</p><p>dicionaristas permaneceram com o mesmo sentido do século</p><p>XIX, e alguns deles foram registrados apenas por Mendonça:</p><p>Catinga, como “mau cheiro”. Nós encontramos também</p><p>com esse sentido, e com variação para vegetação.</p><p>Muamba: “negócio ilícito, velhacaria”, também como</p><p>“cesto em que os carregados retrazem a carga”, que depois</p><p>passou a significar carga contrabandeada. Em nossos registros</p><p>encontramos com o sentido de: pessoas que vendem diversas</p><p>coisas, em porta em porta, na rua, que não possui comercio fixo,</p><p>não paga impostos.</p><p>Únicos termos registrados apenas por Raimundo são:</p><p>bamba e bambambã. Bamba no sentido de “forte, temível,</p><p>valente”. Bambambã no sentido de “o mais forte, valente,</p><p>respeitado”. Em nossos estudos foram poucos resultados, mas</p><p>encontramos no sentido de: “o maior”, “que se acha”.</p><p>Expomos os vocábulos registrados por Mendonça e por</p><p>Raimundo com significados aproximados:</p><p>Banguela: “nome de um povo da região de Benguela: e</p><p>“pessoa desdentada”. Nós registramos esse termo como: pessoa</p><p>sem dente e também como uma descida.</p><p>Cafuné: “estalidos com o polegar no alto da cabeça”. Em</p><p>nossos estudos no sentido de: carinho, chamego.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>146</p><p>Mandinga: “feitiço, sortilégio”. Nós encontramos no</p><p>sentido de “macumba, fazer mal, trabalho.</p><p>Muxoxo: “som produzido com a língua aderida aos dentes</p><p>ou estalo que se dá com os lábios”. Para esse termo não</p><p>encontramos em nenhuma fala.</p><p>No grupo 2, o único termo que os dicionaristas não</p><p>registraram foi: catimba / catimbeiro. Em nossos estudos não</p><p>registramos nenhum sentido para essa palavra, houve</p><p>desconhecimento.</p><p>No grupo 3, os dicionaristas consideraram seis vocábulos</p><p>que não apresentaram diferença no significado em relação ao</p><p>uso atual, sendo:</p><p>Angu: “comida”, ainda apresenta no sentido figurado</p><p>“mistura confusa”, “trapalhada”, “intriga”. Em nossos trabalhos</p><p>encontramos apenas como “comida feita de milho”.</p><p>Bunda: “nádegas, assento”. Em nossos estudos</p><p>encontramos como: partes do corpo e nádegas.</p><p>Cambada: “agrupamento de pessoas”, “agrupamento de</p><p>vagabundos”, “corja”. Mas Raimundo se estende para o sentido</p><p>de: “qualquer conjunto de coisas”. Em nossa pesquisa</p><p>registramos como: “grupo de pessoas, ou pessoas aglomerados</p><p>em um mesmo espaço e</p><p>como cambada de peixe.</p><p>Muxiba: “carne magra e caída, pelanca”. Em nossos</p><p>estudos define como: encontrado na vaca, pelanca. E também</p><p>como uma pessoa segura, pão dura.</p><p>Zumbi: “ente fantástico que, segundo a crença popular,</p><p>vagueia dentro das casas a horas mortas da noite. Em nossos</p><p>estudos no sentido de: “morto vivo”, “alma penada”, “pessoa</p><p>que não dorme”.</p><p>E para finalizar, os termos do grupo 3: babaca, babau,</p><p>biboca, cafofo, cucuia, muquifo, muquirana, muvuca,</p><p>quizomba, sacana, ziquizira. Esses termos não foram</p><p>registrados por nenhum dos dicionaristas citados pelas autoras.</p><p>Enquanto em nossos estudos de uso atual, encontramos todos</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>147</p><p>esses termos, com exceção do termo ziquizira, o único</p><p>desconhecido na comunidade em estudo.</p><p>Concluindo, na primeira análise apresentada a</p><p>predominância das variantes [+ afro], de uma certa forma, se</p><p>abonou na comunidade Exú (Q3), embora as demais também</p><p>tenham aparecido muitos termos de origem afro, mas a</p><p>comunidade MT03 liderou em número, forma espontânea e</p><p>conhecimento dos termos e das suas variações. E as variantes [-</p><p>afro] ou desconhecidos foram: jibi/gibi para menino; furdunço</p><p>para desordem; nevoeiro para sereno; forrobodó para confusão;</p><p>ebó para feitiço; milonga/quelelê/candonga para</p><p>mexerico/fofoca; biraia para prostituta; mocambo; mocó para</p><p>moradia; bolinha de gude para bolita; gimbo/</p><p>jimbo/jimbra/zimbro para dinheiro. Neste sentido, de uma certa</p><p>forma tanto a MT01, quanto a MT02, apresentaram de uma</p><p>forma semelhante a ausência desses termos [-afro].</p><p>Apresentamos os resultados da segunda análise deste trabalho,</p><p>obtido em campo. Esta análise permitiu-nos, identificarmos 110</p><p>vocábulos comuns ao universo dos entrevistados, além dos</p><p>outros 46 manifestados particularmente.</p><p>À guisa de conclusão</p><p>Nosso trabalho de pesquisa objetivou analisar e descrever</p><p>o português falado em comunidades afro-brasileiras rurais e</p><p>urbana no município de Cáceres-MT. Alvitramos ainda,</p><p>entender os fatos linguísticos e verificar a existência e a</p><p>permanência da língua africana no município em estudo.</p><p>Evidenciando a existência e permanência do português em</p><p>contato com as línguas africanas, assim como, a pressuposição</p><p>da existência das palavras de origem africana. Para buscar</p><p>respostas as nossas inquietações, nos aportamos nos estudos de</p><p>Alkmim; Petter (2009), com os Africanismos no Brasil dentre</p><p>outros.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>148</p><p>Este relato de pesquisa está contém análise nas</p><p>comunidades afro-brasileiras de: Santana (Q1), Chapadinha</p><p>(Q2) e Exú (Q3), de Cáceres-MT. Os resultados foram obtidos</p><p>através do questionário das autoras, composto por 249 palavras</p><p>de origem africana. Apresentamos os resultados da segunda</p><p>analise deste trabalho, obtido em campo. Esta análise permitiu-</p><p>nos, identificar 110 vocábulos comuns ao universo dos</p><p>entrevistados. Além dos outros 46 manifestados</p><p>particularmente.</p><p>Como esta análise foi baseada nos estudos de Alkmim;</p><p>Petter (2009), elas apresentam vocábulos usados no século XIX</p><p>por dois dicionaristas e vocábulos do século XX baseados em</p><p>dois estudos. Nos termos encontrados por Alkmim; Petter</p><p>(2009), no século XIX com os nossos resultados obtidos na</p><p>comunidade, dos 30 vocábulos selecionados por elas no século</p><p>XIX, encontramos 27 em uso nas comunidades. Interessante que</p><p>praticamente todos com os mesmos sentidos, diferindo apenas</p><p>o sentido de dois termos.</p><p>Para os termos de uso coloquial, elas apresentaram nove,</p><p>desses, encontramos seis. Nos termos informais, as autoras</p><p>trouxeram dezessete, desses, encontramos quinze. Os que</p><p>mantêm os mesmos significados atuais: de todos apresentados,</p><p>apenas o termo (banzo), um não é reconhecido pelos</p><p>entrevistados, podemos dizer que esse termo modestamente</p><p>desapareceu neste século atual. Na junção dos termos</p><p>encontrados pelos dois dicionaristas somam aproximadamente</p><p>uns oitenta vocábulos, nestes oitenta vocábulos podemos dizer</p><p>que em nosso estudo encontramos aproximados setenta e cinco.</p><p>Claro que alguns apresentaram variações diferentes, como por</p><p>exemplo, no termo canga, registrado como uma espécie de</p><p>mineral argiloso; em nossos estudos encontramos somente</p><p>como saída de praia e objeto de colocar no pescoço do animal.</p><p>Quitute registrado como pessoa hábil para fazer quitute, e nós</p><p>encontramos como grande chefe e como partilha de alimentos.</p><p>Fubá, registrado como forma figurada para “fazer tudo em</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>149</p><p>fubá”, em nossos estudos apenas como “farinha de milho”.</p><p>Quitanda, registrado como um lugar que vende frutas,</p><p>hortaliças, pescado, varia também com o sentido de ocupação,</p><p>como por exemplo, “A clínica é minha quitanda”, e também</p><p>como “venda ambulante”, encontramos como vende coisas</p><p>variadas, mercadinho, bolinhos, venda de frutas, lugar</p><p>pequeno, vende verdura. Como derivado a palavra quitandeira,</p><p>que siginifica mulher sem educação. Em nossos estudos</p><p>encontramos significados quitandeira para mulher que faz</p><p>doces, comida. Percebe-se a modificação ou apagamento de um</p><p>dos significados, mudança nesse termo quitandeira, mudou de</p><p>sentido. Caçamba, aparece como um “balde preso em uma</p><p>corda”, também como expressão popular “a corda e a caçamba”,</p><p>e ditado popular “aonde vai a corda vai a caçamba”; registram</p><p>também o sentido de “estribo em forma de chinela”, assim como</p><p>“balde em geral” e o nome dado por jovens ao carro de aluguel,</p><p>recipiente”, caçamba de lixo e caminhão caçamba. Em nossos</p><p>estudos, encontramos apenas como caçamba de lixo, caminhão</p><p>de areia. No entanto esse termo mudou o seu significado.</p><p>Cachaça, foram registrados como: aguardente, aguardente feita</p><p>com mel ou borras de melaço, cachaça, “paixão predominante”,</p><p>“A cultura das flores é a minha cachaça”. Como derivados</p><p>“cachaceira”, como (lugar onde se deposita a cachaça). Em</p><p>nossos estudos encontramos as variações como: pinga,</p><p>aguardente, branquinha, cinquenta e um, caninha. Encontramos</p><p>também a palavra cachaceira em uso real, pessoa do sexo</p><p>feminino, mulher que bebe muito ou todos os dias. Entende-se</p><p>que houve um certo apagamento da definição do termo do</p><p>século XIX, para os dias atuais. Corcunda, cacunda, registrado</p><p>como dorso, costas, aproximando de corcova. De forma</p><p>derivada, cacundeiro significa carregador que leva carga nas</p><p>costas, ou animal que na tropa gosta de andar atrás dos outros</p><p>pelas costas e homem de baixa condição. Cacunda, seja uma</p><p>alteração do termo vulgar corcunda. Em nossos estudos</p><p>encontramos como definição para o termo Corcunda, pessoas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>150</p><p>com deficiência nas costas, pessoas curvadas para frente.</p><p>Encontramos também cacunda, significando costas.</p><p>Observamos que esse termo houve diferença de sentido, foram</p><p>duas palavras parecidas com sentido diferente. Que no entanto</p><p>no século XIX, permanecia os mesmos sentido para as duas</p><p>palavras “corcunda” e “cacunda”.</p><p>Macaco, registrado como máquina de suspender algo e</p><p>macacu como animal. Em nossos estudos encontramos apenas a</p><p>escrita de macaco significando animal e objeto para trocar pneu.</p><p>Neste século desapareceu o termo “macacu”, o que houve foi</p><p>uma junção de significados, uma única palavra com dois</p><p>significados. Marimbondo / marimbundo, registrado como</p><p>“espécie de vespas”, na forma derivada “marimbondada”,</p><p>ferroada do marimbondo, e também um outro significado que o</p><p>autor considera desconhecido hoje “iguaria de carne desfiada</p><p>com outros preparos”. Em nossa pesquisa, encontramos como</p><p>“bicho que ferra, inseto, vespas”. Vejamos que houve variação</p><p>nas palavras, mas com o mesmo sentido do século XIX. O termo</p><p>Tanga, registrado como “um pedaço de pano das dimensões de</p><p>um lençol”, marcado como vestuário de escravo africano e o</p><p>sentido da palavra</p><p>hoje corresponde a peça reduzida de</p><p>vestuário, também cita a expressão “ficar de tanga”, que</p><p>corresponde a ficar na miséria, sem nada. Consideram como</p><p>vestuário indígena e tipo de vestuário feminino de banho no</p><p>tamanho reduzido. Em nossos estudos, aparece como “tipo de</p><p>vestuário feminino”, “peça de roupa feminina”, “peça</p><p>pequena”. Como podemos ver, praticamente o significado não</p><p>mudou de sentido, apenas o ditado popular desaparece em</p><p>nossa comunidade. A palavra Macumba eles registram como</p><p>“candomblé, dança dos negros, batuque sagrado, dança ritual</p><p>com prática de feitiçaria”. Apresentam a variação do termo</p><p>candombe no sentido de “um tipo de rede de pescar”. Em nossa</p><p>pesquisa encontramos como feitiço, maldade que fazem para os</p><p>outros, feitiçaria, despacho que fazem nas encruzilhadas, neste</p><p>termo podemos dizer que embora muitas variações ao nome,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>151</p><p>mas segue com o mesmo significado. O termo Maconha,</p><p>registrado como liamba, pango e riamba, na nossa pesquisa</p><p>aparece como “erva e droga em uso atual”. Como se pode</p><p>peceber, houve mudança no nome do termo, mas permanece o</p><p>mesmo sentido.</p><p>Os termos registrados no século XX. Cachaça têm sentido</p><p>único “aguardente”, diferente dos nossos estudos em que</p><p>encontramos vários sentidos para a palavra, como no século</p><p>anterior. Canga também sentido único “trave de madeira</p><p>adaptada no pescoço de animais”. Em nosso trabalho além de</p><p>ser objeto que coloca no animal, também encontramos outro</p><p>significado como saída de praia. Macumba, registrado como</p><p>aparece “feitiçaria, candomblé, magia, despacho”. Em nossos</p><p>estudos encontramos também como feitiço e despacho.</p><p>Capanga, registrado como “guarda-costas, cangaceiro e como</p><p>bolsa saco de couro e lona”, na nossa pesquisa, encontramos</p><p>apenas com o sentido de guarda-costas em uso atual. Algumas</p><p>palavras, do século XX, que analisamos, apresentaram</p><p>mudança, redução de sentido, sentido único. A palavra Caçula</p><p>encontrada como “filho mais moço” e, também, como “ato de</p><p>socar milho no pilão”, na nossa pesquisa, encontramos um</p><p>sentido único, como “filho mais novo e último filho”, assim,</p><p>podemos dizer que houve desaparecimento nas variações do</p><p>século passado para este. Estes termos caxumba, cochilar,</p><p>dengo, fubá, marimbondo, miçanga, molambo, moleque,</p><p>quilombo, quitanda, quitute, xingar, tanga, carimbo, catinga,</p><p>muamba, banguela, cafuné, mandinga, registrados no século</p><p>XX, não apresentaram mudanças de sentido, apenas houve</p><p>redução de variantes. Neste século, dos termos registrados, os</p><p>únicos que consideramos desaparecidos são muxoxo, ziquizira,</p><p>não tivemos nenhum registro desses vocábulos.</p><p>Após as análises e comparações dos termos afro-brasileiros,</p><p>constatamos que o nosso português brasileiro, ponderado nas</p><p>comunidades afro-brasileiras, estão repletos de variações, e</p><p>essas variações nos comprovam que o português falado nessas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>152</p><p>comunidades são termos afro-brasileiros. E com isto só temos a</p><p>dizer que a existência dos vocábulos nas comunidades é muito</p><p>forte. São traços de mais de dois séculos atrás. A partir dos</p><p>resultados desta pesquisa, esperamos que muitos outros</p><p>trabalhos possam ser realizados, pois como a língua é viva</p><p>acreditamos que outros estudos trarão novas versões, novos</p><p>resultados, novos recortes. Enfim, muito ainda há por se</p><p>pesquisar em Mato Grosso nessa perspectiva teórica.</p><p>Referências</p><p>ALKMIM, Tania; PETTER, Margarida Maria Taddoni. Palavras da África no</p><p>Brasil de ontem e de hoje. IN: PETTER, M. M. T.; FIORIN, J. L. África no</p><p>Brasil: a formação da língua portuguesa. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2009.</p><p>ALKMIN, Tânia. Questionário de palavras/termos de origem africana.</p><p>Campinas: Universidade Estadual de Campinas (Instituto de Estudos da</p><p>Linguagem), s/d.</p><p>BONVIN, E. Línguas africanas e português falado no Brasil. IN: FIORIN, José</p><p>Luiz; PETTER, Margarida Maria Taddoni. África no Brasil – a formação da</p><p>língua portuguesa. São Paulo: Contexto, 2009. p. 15-62.</p><p>BONVINI, E. Palavras de origem africana no português do Brasil: do</p><p>empréstimo à integração. In: NUNES, J. H. História do saber lexical e</p><p>constituição de um léxico brasileiro. São Paulo: Humanitas / FFLCH / USP:</p><p>Pontes, 2002.</p><p>CUNHA, A. S. de A.; SOUZA, A. C. S. de. A Variação da Concordância de</p><p>Gênero na Linguagem do Cafundó. In: Anais do XLIV Seminários do GEL.</p><p>Taubaté: Universidade de Taubaté, 1997.</p><p>MENDONÇA, R. A influência africana no português do Brasil. Rio de Janeiro:</p><p>Sauer, 1933.</p><p>PESSOA DE CASTRO, Yeda. Falares africanos na Bahia: um vocabulário afro-</p><p>brasileiro. Rio de Janeiro: Topbooks, 2001. p. 25-47.</p><p>PETTER, M. M. T. Africanismos no português do Brasil. In: Eni P. Orlandi (org.).</p><p>História das ideias linguísticas: Construção do saber metalinguístico e</p><p>constituição da língua nacional. Campinas: Pontes; Cáceres: Unemat</p><p>Editora, 2001.</p><p>PETTER, M. M. T. Termos de origem africana no léxico do português do Brasil.</p><p>In: NUNES, J. H. História do saber lexical e constituição de um léxico</p><p>brasileiro. São Paulo: Humanitas / FFLCH / USP: Pontes, 2002.</p><p>PETTER, M. M. T.; FIORIN, J. L. África no Brasil: a formação da língua</p><p>portuguesa. 1. ed. São Paulo: Contexto, 2009.</p><p>PINHO, Maria Elaine Vila de. Análise do Português Falado em Comunidades</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>153</p><p>Afro-brasileiras de Cáceres-MT. Dissertação de Mestrado. Programa de</p><p>Pós-graduação em Linguística da UNEMAT. Cáceres, 2019.</p><p>RAIMUNDO, J. O elemento afro-negro na língua portuguesa. Rio de Janeiro:</p><p>Renascença, 1933.</p><p>SOUZA, A. C. S. de. A concordância de gênero entre o sujeito e o predicativo</p><p>na fala da comunidade quilombola da Caçandoca. Dissertação de</p><p>Mestrado em Semiótica e Linguística Geral. São Paulo: Faculdade de</p><p>Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2000.</p><p>SOUZA, A. C. S. de. A variação da concordância de gênero entre o sujeito e o</p><p>predicativo na linguagem do Cafundó. Estudos Linguísticos XLVI.</p><p>Seminários do GEL. Bauru: Universidade do Sagrado Coração, pp. 208-</p><p>214, 1999.</p><p>SOUZA, A. C. S. de. Africanidade e contemporaneidade do português de</p><p>comunidades afro-brasileiras no Rio Grande do Sul. (Tese de Doutorado).</p><p>Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2015. Disponível</p><p>em: http://hdl.handle.net/10183/122568</p><p>SOUZA, Antônio Carlos Santana de. Macroanálise pluridimensional da</p><p>variação do português em comunidades afro-brasileiras de Mato Grosso:</p><p>das línguas africanas ao português brasileiro falado. Relatório Final de Pós-</p><p>Doutorado pelo PNPD/CAPES. Programa de Pós-Graduação em Estudos</p><p>de Linguagem do Instituto de Linguagens. Universidade Federal de Mato</p><p>Grosso. Cuiabá, 2019. (Inédito)</p><p>SOUZA, A. C. S.; SCHMIDT, C. Variação da concordância em gênero entre o</p><p>sujeito e o predicativo em comunidades afro-brasileiras de Mato Grosso.</p><p>IN: PHILIPPSEN, N. I.; STEFFEN, J.; KRUG, M. J. (Orgs.) Novas</p><p>perspectivas da diversidade e variação linguística em Mato Grosso.</p><p>Norderstedt: PubliQation, 2023. DOI: https://doi.org/10.22602/IQ.97</p><p>83745870824.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>154</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>155</p><p>POSFÁCIO</p><p>Inovações destacam desafios e oportunidades na integração</p><p>de novas tecnologias digitais na aliança com o ensino formal</p><p>Juliana Tófani de Sousa1</p><p>O avanço das Tecnologias Digitais de Informação e</p><p>Comunicação (TDIC) e a crescente presença de dispositivos</p><p>tecnológicos conectados à internet, nas instituições</p><p>educacionais, sinalizam mudanças significativas nas dinâmicas</p><p>sociais e no processamento de informações. Essas</p><p>transformações contemporâneas impactam diretamente o</p><p>cenário educacional, influenciando as abordagens de ensino e as</p><p>interações</p><p>relacionadas ao conhecimento em diversos</p><p>componentes curriculares. A introdução contínua de</p><p>ferramentas tecnológicas digitais nas escolas remodela a forma</p><p>como os estudantes aprendem, interagem e se comunicam,</p><p>resultando na emergência de um novo perfil de aprendizes.</p><p>Ademais, qualquer tipo de inovação precisa ser</p><p>intensificada, e para tanto, melhor analisada. Para Nóvoa (2015,</p><p>não paginado), aprendizagem não é saber muito, “é</p><p>compreender bem aquilo que se sabe. É preciso desenvolver nos</p><p>alunos a capacidade de estudar, de procurar, de pesquisar, de</p><p>selecionar, de comunicar. Para isso, o professor é</p><p>insubstituível.”</p><p>Para tal cenário, aponta-se por exemplo, a Inteligência</p><p>Artificial (IA), que nos últimos anos, tem desempenhado um</p><p>papel transformador na educação, oferecendo uma variedade</p><p>de benefícios tanto para alunos quanto para professores. Para os</p><p>estudantes, a IA proporciona uma personalização do</p><p>1 Pedagoga (UFMG). Mestra em Educação e Formação Humana (UEMG). Psicopedagoga</p><p>(FESL/RP). Especialista em Educação Infantil (CEPEMG) e em Educação Empreendedora</p><p>(UFSJ). Professora aposentada da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte.</p><p>Assessora Pedagógica. SL/MG (Em Caminhar Assessoria Psicopedagógica). E-mail:</p><p>em.caminhar@emcamnhar.com</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>156</p><p>aprendizado, adaptando-se ao ritmo e estilo de aprendizagem</p><p>individual. Plataformas de ensino baseadas em IA podem</p><p>oferecer conteúdo educacional personalizado, identificar</p><p>lacunas de conhecimento e fornecer feedback instantâneo,</p><p>permitindo que os alunos progridam de maneira mais eficaz.</p><p>Além disso, a IA também facilita a acessibilidade, tornando o</p><p>ensino mais inclusivo para estudantes com alguns tipos de</p><p>deficiência, ao oferecer recursos personalizados e adaptados às</p><p>suas necessidades específicas.</p><p>Para os professores, a IA simplifica tarefas administrativas,</p><p>permitindo que eles foquem mais em atividades de ensino</p><p>criativas e interativas. Sistemas baseados em IA podem auxiliar</p><p>na avaliação automática de trabalhos, economizando tempo e</p><p>possibilitando que os educadores dediquem mais atenção ao</p><p>desenvolvimento de estratégias pedagógicas inovadoras. Além</p><p>disso, a IA pode apoiar os professores na identificação de</p><p>padrões de desempenho dos alunos, permitindo intervenções</p><p>personalizadas e estratégias de ensino mais eficazes. Ao integrar</p><p>a IA na educação, cria-se um ambiente mais dinâmico e</p><p>eficiente, beneficiando tanto educadores quanto alunos.</p><p>Analisando o documento Base Nacional Comum</p><p>Curricular (BNCC) (2018), é possível perceber a perspectiva de</p><p>uma formação tecnológica, incorporando as tecnologias digitais</p><p>na educação, com o objetivo de promover aprendizagens ou</p><p>despertar o interesse dos alunos. Por meio de habilidades</p><p>propostas no documento, busca-se auxiliar os alunos para que</p><p>construam conhecimentos sobre e como se dá o uso dessas</p><p>TDIC. Nessa perspectiva, todas as áreas de conhecimento</p><p>contribuem para este aprendizado, de uma forma transversal,</p><p>na tentativa de garantir a efetivação do trabalho em sala de aula</p><p>onde desenvolvimento das tecnologias transformam a vida</p><p>humana de forma cada vez mais veloz.</p><p>A escola seria o lugar das crianças e jovens aprenderem</p><p>conceitos e práticas acerca da importância competitiva fazendo</p><p>uso das tecnologias digitais. Arruda (2018) afirma que existe</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>157</p><p>uma urgência de novos paradigmas educacionais quando se</p><p>refere à implementação de tecnologias digitais nas salas de aula:</p><p>o que seria o pensamento computacional (computacional</p><p>thinking).</p><p>A definição de pensamento computacional encontra-se no</p><p>documento Referenciais de Formação em Computação:</p><p>Educação Básica, organizado pela Sociedade Brasileira de</p><p>Computação2 (SBC), que trata das competências e habilidades</p><p>para os eixos Pensamento Computacional, Mundo Digital e</p><p>Cultura Digital:</p><p>O Pensamento Computacional se refere à capacidade de</p><p>sistematizar, representar, analisar e resolver problemas.</p><p>Apesar de ser um termo recente, vem sendo considerado</p><p>como um dos pilares fundamentais do intelecto humano,</p><p>junto com leitura, escrita e aritmética, pois, como estes, serve</p><p>para descrever, explicar e modelar o universo e seus</p><p>processos complexos (SBC, 2017, p. 3).</p><p>Portanto, considerando o conceito de pensamento</p><p>computacional, passa-se a entender que todas as áreas do</p><p>conhecimento são afetadas, direta ou indiretamente, pelo</p><p>desenvolvimento das tecnologias digitais, tanto em seu processo</p><p>de produção do conhecimento, quanto nas inferências que tais</p><p>tecnologias promovem na produção científica e escolar dessas</p><p>áreas (ARRUDA; MILL, 2021).</p><p>Percebe-se a ampliação da produção científica e de</p><p>trabalhos midiáticos que discutem a incorporação das</p><p>tecnologias digitais no ambiente escolar brasileiro, uma vez que</p><p>cabe à própria instituição escolar formar nas e para as mídias.</p><p>Este movimento envolve os sujeitos que ali estão, com suas</p><p>narrativas, culturas e conhecimentos, o que fomenta a ideia de</p><p>se considerar pertinente a constante reformulação dos cursos de</p><p>formação de professores. Outro ponto que é preciso levar-se em</p><p>2 https://www.sbc.org.br/ acesso em janeiro de 2024</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>158</p><p>conta, nesse processo de reflexão sobre o papel da escola, é a</p><p>formação crítica e o protagonismo das crianças e jovens</p><p>estudantes, que considerando Moran (2018, p. 22), “o aluno</p><p>aprende o básico sozinho, no seu ritmo, e o mais avançado por</p><p>meio de atividades em grupo e com a supervisão de professores.</p><p>Quanto mais o aluno se envolve em desafios possíveis a sua</p><p>idade, melhor ele aprende.”</p><p>A escola é lugar de tradição, considerando o seu sentido</p><p>histórico, porém, é também lugar de formação das novas</p><p>gerações para a compreensão e análise dos desafios</p><p>contemporâneos da sociedade. Desta forma, compreende-se que</p><p>problematizar o lugar que o desenvolvimento tecnológico</p><p>digital ocupa no mundo é uma atividade esperada ao professor</p><p>que forma um aluno para a criticidade e a construção do</p><p>conhecimento, ampliando as discussões de forma mais</p><p>complexa, garantindo que elas partam da relação entre as</p><p>tecnologias antigas e as novas e atuais e que envolvam os</p><p>conteúdos necessários à formação docente, considerando a</p><p>sociedade onde alunos e professores convivem rodeados por</p><p>mídias digitais que transformam suas relações sociais, culturais,</p><p>econômicas e educacionais (ARRUDA; MILL, 2021).</p><p>Os educandos, mesmo quando apresentam algum tipo de</p><p>dificuldade de acesso, exploram as potencialidades das</p><p>tecnologias e a internet a partir de diferentes espaços e contextos</p><p>sociais (trabalho, família, amigos, igreja). Também o fazem</p><p>quando estão em modo offline. Fotografar é uma atividade que</p><p>atrai crianças e jovens, assim como a produção de vídeos e</p><p>áudio. Essa possibilidade de produção de conteúdos</p><p>multimidiáticos com o uso tecnológico os insere nesse novo</p><p>cenário da Cultura Digital3, minimizando a brecha digital entre</p><p>3 Para conseguir estabelecer comunicação e expressão através do Mundo Digital, é</p><p>necessário um letramento em tecnologias digitais, que neste documento denominou-se de</p><p>Cultura Digital. Também faz parte da Cultura Digital uma análise dos novos padrões de</p><p>comportamento e novos questionamentos morais e éticos na sociedade que surgiram em</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>159</p><p>conectados e desconectados, produtores e consumidores. “O ato</p><p>de produzir suas próprias mídias (e não apenas consumir), de</p><p>ser crítico, de compartilhar e de disseminar conhecimentos e</p><p>cultura é uma forma emergente desse grupo se incluir</p><p>digitalmente” (NOGUEIRA; PADILHA, 2014, p. 271).</p><p>A linguagem multimodal, abordada hoje na BNCC (2018),</p><p>amplia as formas de comunicação, permitindo que textos, sons,</p><p>vídeos e imagens possam ser produzidos e codificados de forma</p><p>plural, colocando diferentes elementos de forma simultânea e</p><p>complementar nas relações entre os sujeitos, o que permite</p><p>imaginação, criatividade, afetividade, construção de novos</p><p>significados e a organização do pensamento simbólico</p><p>(NOGUEIRA; PADILHA, 2014, p. 279).</p><p>Desta forma, compreendendo que as mídias não apenas</p><p>veiculam, mas também possibilitam a construção de discursos e</p><p>produção de novos sentidos e significados para os aprendentes,</p><p>aqui alunos e professores, a função da escola se amplia ao</p><p>incorporar as tecnologias digitais às suas práticas</p><p>metodológicas.</p><p>A dinâmica do processo educacional passa por uma</p><p>reconfiguração significativa com a adoção de metodologias mais</p><p>ativas. O papel de cada participante no processo sofre</p><p>transformações marcantes. O docente deixa de ser simplesmente</p><p>um transmissor de conhecimento ou um orador em aulas</p><p>expositivas, passando a desempenhar o papel de um mediador</p><p>do aprendizado, atuando como um problematizador. As</p><p>estratégias pedagógicas empregadas proporcionam a</p><p>construção interativa do conhecimento, o que redefine o papel</p><p>do aluno no processo de ensino-aprendizagem. Este deixa de ser</p><p>um mero receptor passivo e assume uma posição mais</p><p>participativa e ativa no desenvolvimento do conhecimento.</p><p>decorrência do Mundo Digital. A Cultura Digital compreende as relações interdisciplinares</p><p>da Computação com outras áreas do conhecimento, buscando promover a fluência no uso</p><p>do conhecimento computacional para expressão de soluções e manifestações culturais de</p><p>forma contextualizada e crítica (SBC, 2017).</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>160</p><p>Isto posto, com a inserção das TDIC nas relações cotidianas,</p><p>fica evidenciado que grandes e rápidas mudanças têm</p><p>acontecido nas formas que as interações ocorrem, alterando a</p><p>maneira das pessoas se comunicarem. De acordo com Zacharias</p><p>(2016, p. 16):</p><p>Uma consequência dessas mudanças se faz notar nas</p><p>práticas de leitura, com a emergência de textos híbridos, que</p><p>associam som, ícones, imagens estáticas e em movimento,</p><p>leiautes multissemióticos, alterando os gestos dos leitores, o</p><p>processamento da informação e a concentração de</p><p>significados.</p><p>O principal suporte para tais textos é a tela, o que exige</p><p>conhecimentos além daqueles que o material impresso favorece</p><p>e que já são de domínio de muitos e praticados nas escolas. A</p><p>internet, grande promotora de informação e comunicação em</p><p>rede, modifica hábitos de leitura, difundindo-a universalmente,</p><p>assim como amplia os hábitos de escrita e oralidade, de</p><p>interpretação de fatos, de compreensão e significação de ideias.</p><p>A conexão favorece profundas modificações no universo da</p><p>cultura digital (Zacharias, 2016).</p><p>Ao se deparar com tal realidade, tão presente no universo</p><p>social, a escola, que tem a importante responsabilidade na</p><p>formação de leitores competentes, não poderá seguir um</p><p>caminho pedagógico em que seus recursos sejam as mídias</p><p>impressas, unicamente. Ao viver novos tempos, vive-se,</p><p>consequentemente, novos letramentos.</p><p>O fato é que a humanidade está presenciando mudanças</p><p>significativas no que diz respeito à produção de textos, assim</p><p>como na programação desses, a partir do surgimento dos</p><p>gêneros chamados digitais e pela integração crescente de</p><p>dispositivos eletrônicos sofisticados na vida cotidiana. O avanço</p><p>das TDIC produz mudanças na textualização. De acordo com</p><p>Zacharias (2016, p. 20), estas mudanças “influenciam na maneira</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>161</p><p>como as pessoas produzem ou leem os textos considerando os</p><p>seus objetivos, suas expectativas, seus conhecimentos, crenças e</p><p>valores [...]”.</p><p>Por conseguinte, considerando a forma como as interações</p><p>acontecem, a partir da influência das tecnologias digitais, é</p><p>necessário incluir no contexto escolar uma pedagogia que</p><p>valorize e reconheça o universo multimodal4, multimidiático e</p><p>multissemiótico5 marcado pelos ambientes digitais, uma</p><p>pedagogia que não se restringe à cultura do impresso. Assim,</p><p>cabe aqui um conceito de letramento que se encaixa na análise</p><p>feita durante este capítulo: “Letramento é um fenômeno plural,</p><p>historicamente e contemporaneamente: diferentes letramentos</p><p>ao longo do tempo, diferentes letramentos no nosso tempo”</p><p>(Soares, 2002, p. 156).</p><p>A escola é um cenário privilegiado de interação social,</p><p>assemelhando-se a um organismo vivo com um ciclo de vida</p><p>dinâmico, sujeito a padrões e comportamentos específicos que</p><p>orientam seu desenvolvimento e evolução. Nesse contexto, é</p><p>imperativo que a escola se articule e integre efetivamente com</p><p>outros espaços de conhecimento existentes. Diante desse</p><p>movimento, torna-se evidente que a instituição educacional</p><p>deve incorporar as TDIC às suas práticas pedagógicas. Essa</p><p>integração visa possibilitar que os principais atores sociais</p><p>dentro da escola, especialmente professores e alunos,</p><p>estabeleçam conexões mais eficazes entre os contextos</p><p>4 Um texto ou enunciado é um dito (ou cantado, escrito ou mesmo pensado) concreto e</p><p>único, “irrepetível”, que gera significação e se vale da língua/linguagem para sua</p><p>materialização, constituindo o discurso. Um texto é “irrepetível”, pois ainda que seja “o</p><p>mesmo”, ou muito semelhante a um outro texto, estará enunciado em um novo contexto, o</p><p>que modifica suas relações de sentido [...] na vida contemporânea, em que os escritos e falas</p><p>se misturam com imagens estáticas (fotos, ilustrações, gráficos, infográficos) e em</p><p>movimento (vídeos) e com sons (sonoplastias, músicas), a palavra texto se estendeu a esses</p><p>enunciados híbridos de “novo” tipo, de tal modo que hoje falamos também em textos orais</p><p>e em textos multimodais, como as notícias televisivas e os vídeos de fãs no YouTube.</p><p>(FaE/UFMG, [S.d.])</p><p>5 São aqueles textos que envolvem o uso de diferentes linguagens. Neste sentido, a maioria</p><p>dos gêneros que circulam socialmente são multissemióticos, pois envolvem no mínimo a</p><p>linguagem verbal e a visual (fotos, ilustrações, cores). (BNCC, [S.d.])</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>162</p><p>contemporâneos, os desafios apresentados e os novos</p><p>conhecimentos disponíveis. Esse processo, por sua vez,</p><p>contribui para a transformação, cooperação e enriquecimento do</p><p>fazer pedagógico, propiciando o desenvolvimento contínuo da</p><p>instituição.</p><p>Sendo um organismo vivo, cabe à escola administrar e</p><p>enfrentar cada novo desafio que se apresenta, pois disso</p><p>depende a sua evolução e o sucesso de seus objetivos. De acordo</p><p>com Pereira (2021, p.13), “Os mesmos métodos que produziram</p><p>sucesso no estágio passado podem não ter serventia alguma no</p><p>estágio atual ou no futuro”.</p><p>Em um mundo que está cada vez mais digital, faz-se</p><p>necessário repensar a organização escolar, no sentido de</p><p>favorecer o letramento digital, desenvolvendo competências e</p><p>habilidades fundamentais para que os alunos e professores</p><p>possam ter maior domínio das TDIC, fazendo parte dos novos</p><p>desafios contemporâneos da educação.</p><p>Referências</p><p>ARRUDA, E. P. Implementação das tecnologias digitais nos currículos das</p><p>escolas de Educação Básica dos países membros da OCDE. In: SIQUEIRA,</p><p>I. C. P. (org.). Subsídios à elaboração da BNCC: estudos sobre temas</p><p>estratégicos da parceria CNE e Unesco. 1. ed. São Paulo: Moderna, 2018, v.</p><p>1, p. 32-79.</p><p>ARRUDA, E. P.; MILL, D.: Tecnologias digitais, formação de professores e de</p><p>pesquisadores na pós-graduação: relações brasileiras e internacionais. Rev.</p><p>do Cen de Educ UFSM, vol. 46 2021, dez./jan. Disponível em:</p><p>https://periodicos.ufsm.br/reveducacao/article/view/41203/html. Acesso</p><p>em: 15 jan. 2024.</p><p>BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular- BNCC.</p><p>Versão final. [Documento digital]. Brasília: MEC, 2018. Disponível em:</p><p>http://basenacionalcomum.mec.gov.br/ Acesso em: 24 jan. 2024.</p><p>MORAN, J. Metodologias</p><p>ativas para uma aprendizagem mais profunda. In:</p><p>BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação</p><p>inovadora. Porto Alegre: Penso, 2018.</p><p>NOGUEIRA, M. G.; PADILHA, M. A. S. Cultura digital jovem: as TIMS invadem</p><p>as periferias, e agora? ETD - Educação Temática Digital, Campinas, v. 16,</p><p>n. 2, p. 268-286, maio/ago. 2014. ISSN 1676-2592.</p><p>http://basenacionalcomum.mec.gov.br/</p><p>http://basenacionalcomum.mec.gov.br/</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>163</p><p>NÓVOA, A. Aprendizagem não é saber muito. Carta Capital, 27 abr. 2015.</p><p>Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/educacao/Antônio-</p><p>novoa-aprendizagem-nao-e-saber-muito/ Acesso em: 15 jan. 2024.</p><p>PEREIRA, J. T. Educação e sociedade da informação. In: COSCARELLI, C. V.;</p><p>RIBEIRO, A. E. (orgs.). Letramento Digital: aspectos sociais e</p><p>possibilidades pedagógicas. 3. ed. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2021.</p><p>SBC – SOCIEDADE BRASILEIRA DE COMPUTAÇÃO. Referenciais de</p><p>Formação em Computação: Educação Básica. SBC, 16 ago. 2017. Disponível</p><p>em: https://www.sbc.org.br/noticias/10-slideshow-noticias/1996-referen</p><p>ciais-de-formacao-em-computacao-educacao-basica. Acesso em: 07 dez.</p><p>2022.</p><p>SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na Cibercultura.</p><p>Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002.</p><p>ZACHARIAS, V. R. de C. Letramento digital: desafios e possibilidades para o</p><p>ensino. In: COSCARELLI, C. V. (org.). Tecnologias para aprender. São</p><p>Paulo: Parábola Editorial, 2016.</p><p>https://www.cartacapital.com.br/educacao/antonio-novoa-aprendizagem-nao-e-saber-muito/</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>164</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>165</p><p>SOBRE OS ORGANIZADORES</p><p>Neide Castilho de Araújo Teno</p><p>Doutora em Educação /Mestre em Letras. Pesquisadora Sênior do</p><p>Programa de Mestrado Profissional em Letras–PROFLETRAS, e do</p><p>Programa de Mestrado Acadêmico em Letras da Universidade</p><p>Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS/Dourados /Campo</p><p>Grande. Coordena os projetos de Pesquisa: (Multi) Letramentos e</p><p>Os Gêneros Textuais e/Ou Discursivos: Contribuições para o Ensino</p><p>e Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais e o Projeto</p><p>Memórias de Professores: diálogos sobre o letramento e o ensino da</p><p>língua portuguesa. Colaborou no projeto de pesquisa Apoio à</p><p>Qualificação Docente: PROFLETRAS em Mato Grosso do Sul</p><p>financiado com recurso da FUNDECT. Orcid. https://orcid.org/</p><p>0000-0001-5062-9155 E-mail: cteno@uol.com.br</p><p>Ivo Di Camargo Junior</p><p>Possui estágio de Pós-Doutorado em Formação de Professores</p><p>(PPGFP-UEPB). É Mestre e Doutor em Linguística (UFSCar).</p><p>Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional (Faculdade</p><p>Metropolitana); Educação Infantil (UFU); Ensino de Filosofia no</p><p>Ensino Médio (UnB); Educação Empreendedora (UFSJ); Gestão</p><p>Escolar, Orientação e Supervisão (Faculdade São Luís); Pedagogia</p><p>Universitária (UFTM); Mídias na Educação (UFSCar). Licenciado</p><p>em Letras (UNESP/Assis), Filosofia (UFSJ) e Bacharel em História</p><p>(UNESP/Franca). Atua como professor de Língua Portuguesa</p><p>Efetivo no Centro Educacional Paulo Freire da Secretaria Municipal</p><p>de Educação de Ribeirão Preto/SP. Desenvolve pesquisas sobre</p><p>Mikhail Bakhtin, cinema e outras mídias/linguagens e educação.</p><p>Trabalha com relações dialógicas, polifonia, Memória de futuro e</p><p>outros conceitos Bakhtinianos aliados ao audiovisual e à educação.</p><p>E-mail: side_amaral@hotmail.com</p><p>(1989, p.54), assevera essa posição ressaltando</p><p>que: “na verdade, não há português certo ou português errado</p><p>e, sim, modalidades de prestígio e modalidades desprestigiadas,</p><p>cada qual correspondendo ao meio em que se acha o falante”.</p><p>Dourados (MS) é uma região de fronteira Brasil/Paraguai,</p><p>propícia para diversidade, cultural, racial, nos costumes, na</p><p>literatura e também na linguística com falares diversificados por</p><p>ser um espaço com populações oriundas de diferentes lugares</p><p>geográficos.</p><p>Fatores linguísticos e sociais são temas tratados pelas</p><p>estudiosas Mollica e Braga (2015, p. 28) que entendem que a</p><p>língua muda no tempo e no espaço e essa mudança é</p><p>determinada tanto por fatores linguísticos como sociais como o</p><p>sexo do falante, a sua idade, o seu nível de escolaridade, sua</p><p>profissão, entre outras variáveis que podem auxiliar ou</p><p>influenciar sobremaneira o processo da comunicação. Assim,</p><p>considera o modelo variacionista, um modo propício para</p><p>estudar a língua enquanto “objeto heterogêneo, devidamente</p><p>ordenado, em constante processo de mudança, determinada por</p><p>fatores linguísticos e sociais. Essas mudanças, contudo, não</p><p>ocorrem ao acaso, sendo tarefa do linguista determinar a forma</p><p>como estão associadas no sistema” (Mollica e Braga, 2015, p. 28).</p><p>O estudo desenvolvido partilhou com as concepções de</p><p>Mollica e Braga (2015), em que foi possível examinar variáveis</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>18</p><p>externas à língua que podem determinar o uso de um fenômeno</p><p>linguístico em detrimento de outro. De tal modo, foram</p><p>examinadas as seguintes variáveis sociais: sexo, idade e nível de</p><p>escolaridade dos falantes envolvidos na pesquisa.</p><p>Percursos metodológicos do estudo: os sujeitos e o corpus da</p><p>pesquisa</p><p>O percurso metodológico do estudo foi o da pesquisa</p><p>sociolinguística variacionista, ou teoria da variação linguística,</p><p>que tem como precursor o americano William Labov (2008) que</p><p>entende que a variação se trata de um fenômeno inerente às</p><p>línguas e passa por processos de transformações. Por isso os</p><p>pesquisadores buscam analisar as variações que estão em</p><p>concorrência, as usadas ao mesmo tempo, e as concorrentes, as</p><p>formas linguísticas que concorrem entre si. O modelo teórico</p><p>metodológico, da Sociolinguística consiste em uma ciência da</p><p>linguagem social que estuda a coexistência de variantes</p><p>linguísticas e suas probabilidades de uso.</p><p>Na pesquisa sociolinguística os dados são coletados por</p><p>meio de entrevistas estruturadas, previamente elaboradas pelo</p><p>pesquisador, cumprindo as etapas e analisando os fenômenos</p><p>encontrados considerando os fatores sociais como: faixa etária,</p><p>escolaridade, sexo, nível socioeconômico e formalidade ou</p><p>informalidade do falante. Em nosso estudo o uso das formas</p><p>pronominais eu e mim, suas variantes “para eu” e “para mim” e</p><p>sua importância na fala espontânea dos falantes selecionados,</p><p>com escolaridade variando entre ensino médio e ensino</p><p>superior.</p><p>Um outro passo consisti na transcrição das entrevistas orais</p><p>dos informantes, e codificação da seleção dos fatores que</p><p>podiam motivar as ocorrências de determinadas variantes.</p><p>Considerou-se o perfil dos sujeitos da pesquisa que serviu de</p><p>suporte para a análise dos dados, as variáveis sociais envolvidas</p><p>na pesquisa, a saber: sexo, faixa etária, escolaridade do falante</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>19</p><p>uma vez que os sujeitos estão inseridos em um curso superior</p><p>e/ou já o concluíram e estão pleiteando vagas no mercado de</p><p>trabalho, ou egressos inseridos no trabalho.</p><p>Quanto ao fato de serem pesquisados apenas informantes</p><p>de nível superior completo ou incompleto, vai ao encontro dos</p><p>objetivos de analisar o grau de atenção que o falante dá à língua</p><p>ao se comunicar em sociedade, pois por estar cursando o nível</p><p>superior, possui um conhecimento mais aprofundado da língua</p><p>padrão e do sistema linguístico, além do conhecimento com</p><p>relação às normas de uso da língua em situações reais de</p><p>comunicação.</p><p>Assim, para confirmação das hipóteses levantadas e dos</p><p>objetivos traçados para o estudo foram investigadas três</p><p>variáveis sociais: sexo, faixa etária e nível de escolaridade do</p><p>falante, para examinar os possíveis desvios linguísticos na fala</p><p>dos homens e das mulheres investigados. Nossa atenção, quanto</p><p>ao primeiro grupo está voltada àqueles que estão entrando e/ou</p><p>saindo das do ensino superior, pautando-se o fato de estarem</p><p>envolvidos com o ambiente universitário que exige uma forma</p><p>de falar mais polida e mais próxima à língua padrão. E no</p><p>segundo grupo, moderamos no fato de serem sujeitos que estão</p><p>ingressando no mercado de trabalho, já voltados a concursos e</p><p>seleções; com relação ao terceiro grupo, esse já está inserido em</p><p>uma vida profissional, já despreocupado com alguns fatores dos</p><p>quais o primeiro e segundo grupos ainda têm que se preocupar</p><p>que é o comportamento linguístico e a forma de falar de acordo</p><p>com as exigências da profissão e o mais próximo possível dos</p><p>padrões normativos da língua portuguesa.</p><p>O quadro a seguir apresenta dados para traçar o perfil dos</p><p>sujeitos envolvidos na pesquisa.</p><p>Quadro 1 – Perfil dos sujeitos da pesquisa</p><p>Local Sexo</p><p>Nível de</p><p>escolaridade</p><p>Faixa etária</p><p>UEMS Feminino Ensino Médio 18 -23</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>20</p><p>UEMS Feminino Ensino Médio 18 -23</p><p>UEMS Feminino Ensino Médio 24-30</p><p>Escola Feminino Ensino Superior 24-30</p><p>Escola Feminino Ensino Superior 31 em diante</p><p>Escola Feminino Ensino Superior 31 em diante</p><p>UEMS Masculino Ensino Médio 18 -23</p><p>UEMS Masculino Ensino Médio 18 -23</p><p>UEMS Masculino Ensino Médio 24-30</p><p>Escola Masculino Ensino Superior 24-30</p><p>Escola Masculino Ensino Superior 31 em diante</p><p>Escola Masculino Ensino Superior 31 em diante</p><p>TOTAL 12</p><p>Fonte: Quadro elaborado pelas autoras</p><p>Para construção do corpus recorremos à modalidade oral da</p><p>linguagem dos doze informantes, homens e mulheres, com</p><p>idades variadas e nível de escolaridade distinto envolvidos na</p><p>pesquisa. Foi organizado um plano, com base nos dados</p><p>coletados nas fichas sociais dos informantes a partir das</p><p>perguntas envolvendo as seguintes motivações: brincadeiras</p><p>preferidas na infância, travessuras, ou seja, sobre fatos que leve</p><p>o informante a pensar em acontecimentos de sua vida, deixando</p><p>de lado a atenção ao modo como fala, sendo espontâneo com</p><p>despreocupação às normas gramaticais em uso na língua,</p><p>lembrando que este plano foi uma estratégia para o</p><p>monitoramento da conversação durante as entrevistas.</p><p>As entrevistas foram transcritas com base nas normas do</p><p>Projeto NURC/SP4, com adaptações para a linguagem popular</p><p>falada. Essas normas sugerem que os dados sejam transcritos</p><p>respeitando-se fielmente o modo de falar característico de cada</p><p>falante.</p><p>Quadro 2 - Normas para transcrição das entrevistas</p><p>4 Projeto desenvolvido em cinco capitais do País com o objetivo de analisar o português</p><p>padrão falado por informantes com nível universitário de escolaridade.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>21</p><p>NORMAS PARA TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTAS</p><p>OCORRÊNCIAS SINAIS EXEMPLOS</p><p>Incompreensão de</p><p>palavras ou</p><p>segmentos</p><p>( )</p><p>num vortava mai num tinha</p><p>dinheru ( ) i a genti guentô</p><p>Hipótese do que se</p><p>ouviu</p><p>(hipótese)</p><p>us mininu tãu aí... um</p><p>trabaia de motoris otru</p><p>(trabaia) pur conta</p><p>Trucamento de</p><p>palavras</p><p>/</p><p>i quanu mesmu era PA nóis</p><p>ca/nóis da us nomi</p><p>Entonação enfática Maiúscula trabaiei aTÉ casá</p><p>Prolongamento de</p><p>vogais e/ou</p><p>consoantes</p><p>:: ou ::::</p><p>u donu mesmu era:::: isqueci</p><p>u nomi deli...ah::::achu qui é</p><p>antonhu</p><p>Silabação - - -</p><p>a genti cresceu me-dron-ta-</p><p>du dus pais</p><p>Interrogação ?</p><p>pu cê vê comu era u pessoar</p><p>di antigo pra agora né?</p><p>Comentários do</p><p>transcritor</p><p>((minúscu</p><p>la))</p><p>((risos))</p><p>Comentário que</p><p>quebra a sequência</p><p>da exposição</p><p>do tema</p><p>- - - -</p><p>a genti – nói somu crenti - - a</p><p>genti si viu i gosto</p><p>Sobreposição de</p><p>vozes ou entrada</p><p>indevida</p><p>[</p><p>A. pra::: ficá lisinhu</p><p>B. [a pu chãu ficá..</p><p>A. [parei</p><p>B. pareinhu pa prantá</p><p>OBSERVAÇÕES:</p><p>1. Iniciais maiúsculas: só para nomes próprios ou siglas.</p><p>2. Números: transcrevem-se por extenso.</p><p>3. Não se usa ponto de exclamação.</p><p>4. Início de frase: usam-se letra minúscula.</p><p>5. Registram-se as pronúncias do e e do o como realmente são</p><p>pronunciados.</p><p>6. Nada se corrige na transcrição do texto gravado.</p><p>Fonte: (Adaptações Projeto NURC/SP) Prof. Dr. Pedro Caruso</p><p>(UNESP/Assis)</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>22</p><p>Os dados transcritos e coletados das entrevistas com os</p><p>informantes, em que consta o uso da variante linguística “para</p><p>eu” e “para mim”, nos diferentes contextos linguísticos, foram</p><p>tratados e analisados estatisticamente por meio de programa</p><p>computacional e seus resultados são mostrados em gráficos para</p><p>uma melhor visualização desse uso na língua portuguesa falada</p><p>pelos informantes da região de Dourados-MS.</p><p>Vale ressaltar ainda que o índice de uso de cada uma das</p><p>variantes foi expresso por meios das variáveis sociais já descritas</p><p>anteriormente, que foram testadas para verificar e analisar o</p><p>percentual de uso das referidas formas pronominais cujos</p><p>resultados são apresentados em gráficos na terceira parte desse</p><p>estudo.</p><p>A seguir relaciona-se e se descreve as variáveis sociais e sua</p><p>importância no processo de ensino de língua, no uso das formais</p><p>pronominais e nos possíveis desvios linguísticos no uso das</p><p>expressões “para eu” e “para mim”.</p><p>Estudo da variável sexo/gênero do falante</p><p>A opção dessa variável sexo/gênero do falante se deu</p><p>motivada pelo fato de que pesquisas realizadas na área dos</p><p>estudos sociolinguísticos, como os de Paiva (2015), por exemplo,</p><p>demonstram que existem diferenças significativas na fala de</p><p>homens e de mulheres. A autora (2015, p.69) salienta que as</p><p>diferenças linguísticas mais acentuadas entre os homens e as</p><p>mulheres ficam no plano lexical, e admite que alguns termos</p><p>como palavrões e gírias estão mais presentes na fala dos homens</p><p>do que na fala das mulheres, já que o “o papel social que o</p><p>homem ou a mulher exercem poderá influenciar em seu</p><p>comportamento linguístico” (p.69). Essa mesma estudiosa</p><p>adverte que a variável gênero/sexo nas sociedades ocidentais</p><p>apresentam diferenças. Determinadas palavras situam mais na</p><p>fala dos homens e reforça que essa variável extralinguística deve</p><p>ser analisada realizando o cruzamento com outras variáveis</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>23</p><p>independentes da classe social, idade ou estilo de fala.</p><p>Acrescenta Paiva (2015, p. 69) que essas condições não impedem</p><p>o uso de expressões do tipo “não fica bem para uma garota falar</p><p>desta forma”.</p><p>É importante destacar que, segundo Paiva (2015), em uma</p><p>análise onde se correlacionam a variável sexo e o fenômeno</p><p>linguístico mormente no uso das formas pronominais eu e mim</p><p>e suas variantes “para eu” e “para mim” são admissíveis desvios</p><p>linguísticos desses usos, por isso é importante fazer referência</p><p>não só ao prestígio atribuído pela comunidade de fala às</p><p>variantes linguísticas, mas também à forma de organização</p><p>social dessa comunidade.</p><p>Assim, Ceccarelli (2010, p. 283) ressalta que o sexo se trata</p><p>de uma variável social muito importante para uma pesquisa de</p><p>cunho sociolinguístico, pois "sabemos que homens e mulheres</p><p>falam de maneiras distintas", Bortoni-Ricardo (2004), por sua</p><p>vez, salienta que é essencial para a pesquisa sociolinguística</p><p>considerar a variável sexo do falante para testar o uso de um</p><p>determinado fenômeno linguístico e sua importância no</p><p>processo de ensino e aprendizagem de língua, seja materna ou</p><p>estrangeira.</p><p>Partindo dessa perspectiva, a variável sexo foi testada com</p><p>o objetivo de verificar de que forma homens e mulheres fazem</p><p>uso da variável linguística “para eu” e “para mim”, se de forma</p><p>semelhante ou se há divergência nesse uso. Caso haja diferenças,</p><p>mostrar quais são essas divergências e o porquê.</p><p>A variável faixa etária do falante em igual condições pode</p><p>influenciar a fala da comunidade e da sociedade de modo geral,</p><p>visto que a língua está em constante processo de transformação</p><p>e, com isso, surge a necessidade de renovação do repertório</p><p>linguístico e da criação de novos vocábulos para designar os</p><p>novos referentes utilizados pela comunidade para expressar os</p><p>fatos da língua. Assim, as pessoas mais velhas tendem à</p><p>conservação, em sua fala, de vocábulos mais conservadores,</p><p>porque têm menos contato com as mudanças e com as inovações</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>24</p><p>que surgem a todo momento na realidade ao seu entorno, do</p><p>que as mais jovens, Naro (2015) e Bueno (2003).</p><p>Sobre a importância de considerar a faixa etária, Naro</p><p>(2015, p.43), assevera que "os falantes mais velhos costumam</p><p>preservar as formas mais antigas ou de maior prestígio", sendo</p><p>mais ou menos conservadores no que tange à escolha das</p><p>palavras ou de uma determinada expressão linguística em</p><p>detrimento de outras.</p><p>Os informantes entrevistados compreendem as seguintes</p><p>faixas etárias de 18 a 23 anos, de 24 a 30 anos e informantes com</p><p>idade acima de 31 anos, perfazendo um total de doze</p><p>informantes, todos escolarizados e residentes na cidade de</p><p>Dourados-MS e inseridos no ensino superior ou já egressos de</p><p>curso superior e buscando vagas no mercado de trabalho.</p><p>E, por fim, a variável escolaridade do falante se deu</p><p>considerando os ensinamentos de Votre (2015), que aponta que</p><p>quanto maior for o nível de instrução maior as mudanças</p><p>geradas na fala e na escrita das pessoas e, consequentemente,</p><p>ocorrem as mudanças discursivas na comunidade acentuadas</p><p>em função do aprendizado oficial adquirido por esse falante.</p><p>De acordo com Votre (2015), para fazer uma análise precisa</p><p>sobre a variável escolaridade dos falantes é fundamental</p><p>entender algumas distinções dessa modalidade, levando em</p><p>conta o contexto e o local em que ocorre a variação linguística.</p><p>O autor ressalta ainda que não basta e não se pode considerar a</p><p>variável escolaridade de forma generalizada, mas é necessário</p><p>analisar alguns conceitos de modalidades da fala e enquadrar e</p><p>avaliar o falante, levando em conta as dualidades: forma de</p><p>prestígio vs forma neutra; fenômeno estigmatizado vs não</p><p>estigmatizado; casos que são objetos do ensino escolar, além da</p><p>distinção entre língua escrita vs língua falada, que podem</p><p>contribuir para traçar o perfil escolar do falante.</p><p>A forma denominada de prestígio é aquela em que a</p><p>comunicação ocorre em situações mais formais, em ambientes</p><p>que exijam essa formalidade e é também a forma empregada nas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>25</p><p>escolas, nos jornais e nos meios de comunicação em geral. É a</p><p>forma conhecida como elitizada ou padrão, ou seja, é a</p><p>teoricamente considerada “correta” pelos defensores da</p><p>gramática normativa. Quando se fala em ensino da gramática,</p><p>parece ser este o foco, isto é, a instituição de normas que possam</p><p>reger a forma de falar, tarefa que na escola, geralmente, cabe aos</p><p>professores de Língua Portuguesa.</p><p>Assim, convém ressaltar que existe em todas as línguas um</p><p>padrão a ser seguido, isto é, uma forma norteadora de como se</p><p>deve usar cada elemento do sistema linguístico e é esta a</p><p>modalidade chamada de prestígio, em que tudo aquilo que foge</p><p>a tais padrões é considerado inadequado, Bagno (2007).</p><p>A forma estigmatizada parece ser exatamente a que se opõe</p><p>ao primeiro conceito, pois é nela que ocorrem usos que</p><p>apresentam desvios linguísticos, desvios estes que dão um tom</p><p>de inferioridade e de negatividade ao fenômeno linguístico em</p><p>questão, sendo vistos, por alguns teóricos, como a maneira</p><p>“errada” de falar a</p><p>língua. É importante lembrar que a forma</p><p>estigmatizada não se dá, por descuido ou desinteresse, mas,</p><p>muitas vezes, por fatores culturais, regionais, dificuldades</p><p>fisiológicas que geram expressões diferentes, Bueno (2009) e por</p><p>repetição acabam se fixando e sendo incluídas no vocabulário</p><p>linguístico do sistema da língua.</p><p>Nas escolas, geralmente, se privilegia o ato de ler e escrever</p><p>e, muitas vezes, não se dá atenção especial aos discursos livres e</p><p>espontâneos em que o falante age de maneira natural e se fosse</p><p>reproduzir o mesmo discurso de maneira escrita se preocuparia</p><p>e teria maior incidência do uso de regras e normas que conhece</p><p>e sabe onde empregá-las no texto escrito, porém não se atém a</p><p>elas no discurso oral espontâneo. Esta realidade é comprovada</p><p>na própria composição do corpus desta pesquisa, pois ao</p><p>transcrever as entrevistas realizadas com os informantes, fica</p><p>evidente o quanto diferimos nossos conhecimentos linguísticos</p><p>nos atos da fala e da escrita. É surpreendente perceber o quanto</p><p>o falante altera à sua maneira de usar a norma padrão e como</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>26</p><p>varia o uso de uma modalidade para outra, de acordo com o</p><p>contexto em que se encontra e das necessidades reais de</p><p>comunicação linguística.</p><p>Dessa forma, se considerarmos os vários tipos de variações,</p><p>é possível entender as ocorrências dos fenômenos linguísticos</p><p>na oralidade e traçar o perfil linguístico do falante. Vale lembrar</p><p>que quando se trata da variável escolaridade, os falantes que</p><p>apresentam um nível maior de escolaridade tendem a nivelar</p><p>também o uso das regras e a ocorrência de desvio é menos</p><p>acentuada, tanto para os homens como para as mulheres,</p><p>confirmando a teoria de que a escola age como preservadora das</p><p>formas de prestígio diante das comunidades de fala. Segundo</p><p>Votre (2015), conforme já afirmado, as mulheres tendem a</p><p>valorizar mais a forma de prestígio e a utilizam com maior</p><p>frequência, fazendo com que a variável sexo prevaleça quando</p><p>se desconsidera o nível escolar do falante.</p><p>Apresentação das análises dos dados e discussão dos</p><p>resultados obtidos</p><p>O uso das formas pronominais pessoais eu e mim diante de</p><p>preposições, acrescidas de verbos na sua forma infinitiva nas</p><p>variantes “para eu” e “pra mim” no falar dos informantes</p><p>douradenses selecionados para o estudo, pode ser influenciado</p><p>por variáveis sociais como: sexo, idade e grau de escolaridade,</p><p>uma vez que os sujeitos da pesquisa são falantes que estão</p><p>cursando ou já cursaram o ensino superior e que pleiteiam uma</p><p>vaga no mercado de trabalho, mas que, de acordo com a situação</p><p>de comunicação, também fazem uso das variáveis em estudo.</p><p>A partir do presente estudo foi possível averiguar se essas</p><p>pessoas ao se comunicar utilizam ou não e com que frequência</p><p>as estruturas gramaticais prescritas pelas gramáticas</p><p>normativas, uma vez que são falantes com nível médio e/ou</p><p>superior de escolaridade e que sentem a necessidade de estreitar</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>27</p><p>os laços entre as normas prescritivas, isto é, a língua na sua</p><p>modalidade padrão.</p><p>A seguir apresentam-se alguns resultados do uso das</p><p>formas linguísticas estudadas, de acordo com as variáveis</p><p>sociais: sexo, a faixa etária e o nível de escolaridade dos falantes.</p><p>Resultados de uso, de acordo com a variável sexo do falante</p><p>Os dados analisados e apresentados por meio de gráficos</p><p>nessa pesquisa foram coletados a partir de um roteiro com</p><p>perguntas previamente estabelecidas, envolvendo o processo de</p><p>conversação espontânea acerca do uso das formas pronominais</p><p>eu e mim e suas variantes para mim e para mim na função de</p><p>sujeito.</p><p>Ao optar pela variável sexo do falante nossa proposta foi</p><p>verificar as possíveis diferença no falar de homens e mulheres,</p><p>já que na maioria das vezes as mulheres são linguisticamente</p><p>mais cobradas tanto no seio familiar como na sociedade.</p><p>Considerando essas cobranças sociais e os seus papeis muito</p><p>bem marcados que elas exercem na sociedade, as mulheres</p><p>agem de forma cautelosa, seja nos aspectos sociais, linguísticos</p><p>e/ou culturais, de forma que seu comportamento não destoa</p><p>daquele prescrito e pelas pessoas ao seu entorno e pela</p><p>sociedade, de modo geral.</p><p>Assim, foi observado que, com relação ao sexo feminino, o</p><p>índice de desvios linguísticos é menor do que aqueles</p><p>acometidos pelos falantes do sexo masculino, o que já se</p><p>esperava, considerando as variáveis descritas e as justificativas</p><p>anteriores. Entretanto, para efeito de análise, não se deve colocar</p><p>em questão apenas a variável sexo, já que estão em pauta outras</p><p>variáveis como idade, nível de escolaridade do falante e o</p><p>contexto de uso da variável linguística em situação espontânea</p><p>de conversação face a face, Marcuschi (2006).</p><p>É possível observar, por meio dos dados e dos percentuais</p><p>apresentados nos gráficos, a influência das variáveis estudadas</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>28</p><p>no uso dos fenômenos linguísticos pesquisados, em que, de</p><p>acordo com o sexo do falante, os percentuais de uso entre as</p><p>mulheres foi menos expressivo do que aquele usado pelos</p><p>homens, confirmando a hipótese inicial, de que as mulheres</p><p>cuidam da linguagem ao fazer uso de uma determinada</p><p>variante, até mesmo porque elas são mais cobradas socialmente.</p><p>Vejamos os percentuais do gráfico a seguir, com relação à</p><p>variável sexo do falante.</p><p>Gráfico 1- dados de “para eu” e “para mim” vs sexo do falante</p><p>Fonte: Dados da pesquisa</p><p>Os resultados do gráfico nº 1 evidenciam que a variável</p><p>sexo do falante influencia sobremaneira o falar espontâneo no</p><p>momento da comunicação e da interação linguística.</p><p>Considerando que estamos trabalhando com falantes homens e</p><p>mulheres com formação média e superior, ou seja, com falantes</p><p>que possuem um conhecimento mais aprofundado do sistema</p><p>linguístico da língua e que, por que razão, tomam mais cuidado</p><p>com a linguagem ao falar, fazendo com que seu linguajar se</p><p>aproxime o quanto possível do padrão linguístico prescrito</p><p>pelas gramáticas normativas com relação ao uso da língua na</p><p>sua modalidade padrão, uma vez que são mais cobradas pela</p><p>sociedade.</p><p>Assim, de acordo com os dados do referido gráfico, pode-</p><p>se inferir que as mulheres fizeram mais uso da forma “para eu”</p><p>0%</p><p>10%</p><p>20%</p><p>30%</p><p>40%</p><p>50%</p><p>60%</p><p>70%</p><p>80%</p><p>"para</p><p>eu"</p><p>"para</p><p>mim"</p><p>feminino</p><p>masculino</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>29</p><p>ou seja, a forma considerada padrão e conservadora pela</p><p>gramática normativa e menos da forma “para mim” com um</p><p>percentual de uso 67% para a primeira forma, contrapondo-se</p><p>ao uso pelos homens que foi de 33%.</p><p>O com relação ao uso “para mim” os percentuais foram os</p><p>seguintes 75% na fala dos homens e 25% na fala das mulheres, o</p><p>que mais uma vez vai ao encontro dos resultados de outras</p><p>pesquisas sociolinguísticas que comprovam que as mulheres</p><p>são mais cuidadosas ao fazerem uso da língua, aproximando a</p><p>sua fala o mais próximo possível do padrão linguístico da</p><p>língua, Votre (2015).</p><p>Resultados de uso das variantes, conforme a variável faixa</p><p>etária do falante</p><p>Com relação à variável faixa etária do falante há que levar</p><p>em conta o tempo aparente e tempo real, Tarallo (2007) ou as</p><p>épocas na vida do ser humano, pois enquanto crianças somos</p><p>espontâneos sem grandes preocupações com estudos e outros</p><p>fatores que fazem parte da fase adulta de nossa vida com mais</p><p>cobranças e mais responsabilidades.</p><p>A variável idade foi analisada em três fases distintas cujo</p><p>propósito foi verificar se a idade pode influenciar o</p><p>comportamento linguístico do falante no uso de um dado</p><p>fenômeno da língua.</p><p>A primeira faixa etária contemplou jovens universitários</p><p>entre 18 e 23 anos, ainda sem grandes preocupações com</p><p>profissão, responsabilidade familiares que normalmente não</p><p>são alvos de preocupação dessa faixa etária. A precaução maior</p><p>nessa fase é se esforçar para fazer um curso superior com</p><p>qualidade e com um bom aproveitamento do ensino e da</p><p>aprendizagem.</p><p>À segunda fase, de 24 a 30 anos, pertencem jovens recém-</p><p>formados, em busca de uma vaga no mercado de trabalho,</p><p>concursos, vagas em seu ramo de formação e que estão na “luta”</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>30</p><p>pela conquista de um espaço para trabalhar. Quanto à última</p><p>fase, temos os informantes com experiências em seu ramo de</p><p>atuação, pessoas normalmente preocupadas também com a</p><p>família, mais atentas às questões familiares e com uma visão</p><p>mais objetiva do seu futuro e do futuro de sua família. Nessa</p><p>fase com idade acima de 31 anos, o sujeito já está estabilizado no</p><p>mercado de trabalho e já constituiu família.</p><p>Como sabemos, do ponto de vista linguístico, a idade do</p><p>falante pode interferir numa pesquisa de cunho sociolinguístico,</p><p>pois em determinadas fases de nossa vida, pensamos e agimos</p><p>conforme a situação em que nos encontramos, assim os mais</p><p>jovens tendem a ter uma linguagem mais despreocupada em</p><p>relação aos que estão com uma idade mais amadurecida e isto</p><p>se dá pelo fato de que existem fases em nossa vida que</p><p>determinam nossa maneira de pensar, falar, agir e de nos</p><p>comportar diante de um dado assunto.</p><p>Partindo, portanto, desse ponto de vista, não poderíamos</p><p>deixar de testar, nesse estudo, a variável idade, pois sabemos</p><p>que assim como nosso comportamento, a linguagem também</p><p>difere nos vários momentos de nossa vida, pois com o decorrer</p><p>dos anos passamos por experiências que nos deixam mais</p><p>preparados profissionalmente, o que pode ser observado no</p><p>jeito de falar de cada um, já que a língua é um fenômeno que</p><p>não para no tempo, pois ela é falada e praticada por cada falante</p><p>que a utiliza para se comunicar, “mas é o indivíduo quem fala</p><p>quem muda ou quem deixa de mudar sua maneira de falar”</p><p>Mollica e Braga (2015, p. 82).</p><p>A variável idade não foi um fator relevante, pois vimos que</p><p>o desvio estudado independe dessa variável. Essa informação</p><p>pode ser confirmada no gráfico 2, que trata do uso da variável</p><p>linguística com base na idade do informante.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>31</p><p>Gráfico 2- dados de “para eu” e “para mim” vs idade do falante</p><p>Fonte: Dados da pesquisa</p><p>O referido gráfico mostra que a variável idade não trouxe</p><p>alterações significativas para a pesquisa, evidenciando que os</p><p>desvios linguísticos estudados independem da idade do falante,</p><p>uma vez que, quase todos os falantes entrevistados apresentam</p><p>percentual semelhante de uso das formas em estudo, ou seja, o</p><p>fato de o falante usar as formas pronominais “para eu” ou “para</p><p>mim” independe da sua idade.</p><p>Assim, é possível inferir que independe da idade o falante</p><p>dessa comunidade fará uso tanto da forma “para eu” ou “para</p><p>mim” em seu falar espontâneo. Os percentuais de uso ficaram</p><p>em torno do 33% para os falantes das três faixas etárias.</p><p>Resultados de uso da variável nível de escolaridade do falante</p><p>Quanto à variável nível de escolaridade do falante, foram</p><p>entrevistados universitários e recém-formados já inseridos ou</p><p>pleiteando um vaga de emprego no mercado de trabalho. Essa</p><p>variante foi posta em questão por se tratar de realidades</p><p>diferentes já que aqueles que se encontram nas universidades</p><p>estão mais preocupados em concluir o curso, tendo como</p><p>objetivo a formação acadêmica, em que há mais preocupação em</p><p>0%</p><p>5%</p><p>10%</p><p>15%</p><p>20%</p><p>25%</p><p>30%</p><p>35%</p><p>"para</p><p>eu"</p><p>"para</p><p>mim"</p><p>18-23 anos</p><p>24-30 anos</p><p>31 a cima</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>32</p><p>concluir as disciplinas do curso com a conquista do sonhado</p><p>diploma de curso superior.</p><p>Há também um segundo grupo, aqueles que estão saindo</p><p>da universidade e à procura de um emprego, na busca de sua</p><p>realização profissional, tendo assim uma maior preocupação</p><p>com suas atitudes, com a maneira de se comunicar, visto que</p><p>como formados são mais cobrados pela sociedade que espera de</p><p>uma pessoa com curso superior um comportamento linguístico</p><p>com uso padrão da língua portuguesa.</p><p>Ao testar essa variável, foi possível observar que pelo fato</p><p>de os informantes serem graduados ou a caminho de uma</p><p>graduação, quase não cometeram desvios linguísticos em sua</p><p>fala, já que, todos tiveram a oportunidade de frequentar os</p><p>bancos escolares se utilizando, na maioria das vezes, da forma</p><p>padrão da língua portuguesa, tonto falada como escrita. Esse</p><p>fato nos mostra que o acesso ao ensino e à aprendizagem</p><p>interfere sobremaneira na forma de utilização da língua falada</p><p>ou escrita, fazendo com que os indivíduos se aproximem mais</p><p>da leitura e tenham um maior cuidado com a fala e a escrita nas</p><p>suas atividades cotidianas.</p><p>Os resultados e os percentuais constantes do gráfico 3, a</p><p>seguir, mostram um uso discreto dos desvios linguísticos na fala</p><p>dos entrevistados.</p><p>Gráfico 3 – dados de “para eu” e “para mim” vs escolaridade do</p><p>falante</p><p>Fonte: Dados da pesquisa</p><p>0%</p><p>20%</p><p>40%</p><p>60%</p><p>80%</p><p>100%</p><p>"para</p><p>eu"</p><p>"para</p><p>mim"</p><p>Universitários</p><p>Recém formados</p><p>Formados</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>33</p><p>O gráfico 3 apresenta percentuais que confirmam o que foi</p><p>dito anteriormente, ou seja, os informantes, por estarem</p><p>inseridos em um grupo de universitários ou recém formados,</p><p>apresentam, de forma bastante sútil, o uso de desvios da norma</p><p>padrão da língua, com relação ao uso dos pronomes em estudo,</p><p>uma vez que, de acordo com Naro (2015), falantes com maior</p><p>nível de escolaridade tendem a fazer mais uso de norma padrão</p><p>da língua, fato que nos faz inferir que quanto mais estuda, maior</p><p>a probabilidade de o falante fazer uso da norma padrão da</p><p>língua.</p><p>Esse é um dos aspectos positivos dessa pesquisa, em que é</p><p>possível constatar que a leitura, a pesquisa e a aproximação com</p><p>a cultura auxiliam em todos os campos de nossa vida, inclusive</p><p>na maneira de expressar e utilizar as normas prescritas nas</p><p>gramáticas normativas da língua.</p><p>Considerações finais</p><p>Diante da diversidade existente na língua falada no país, o</p><p>falante pode comunicar e compreender independente da região</p><p>em que se encontrem. Observa-se ainda que não existe falar</p><p>“certo” e/ou “errado”, mas desvios linguísticos influenciados</p><p>por fatores linguísticos e sociais (Bagno, 2007).</p><p>Nos dados das entrevistas foi possível observar que os</p><p>desvios existem, porém não foram tão acentuados, dando</p><p>margem a que tenhamos um resultado provável da influência</p><p>do processo de ensino e de aprendizagem na fala dos</p><p>informantes selecionados para esse assunto.</p><p>Partimos de grupos como: sexo, idade e escolaridade do</p><p>falante foi observado que as variáveis idade e nível de</p><p>escolaridade não se colocaram em evidência. Quanto ao sexo,</p><p>esse, por sua vez, mostrou que no falar feminino há menos</p><p>desvios no uso das formas pronominais “para eu” e “para mim”</p><p>como variantes dos pronomes pessoais eu e mim, do que na fala</p><p>dos homens, resultado já esperado pelo fato de que na maioria</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>34</p><p>dos casos, a mulher tende a cuidar mais da sua fala que os</p><p>homens, fato este corroborado com as pesquisa de Mollica e</p><p>Braga (2015), Paiva (2015), Bueno (2003) e outros estudiosos da</p><p>língua que verificam que as mulheres, ao falar, tendem</p><p>aproximar a sua fala da modalidade padrão da língua, por</p><p>diferentes fatores, inclusive, pelo fato de elas serem mais</p><p>cobradas socialmente que os homens.</p><p>Assim, diante do exposto, com base nos dados analisados</p><p>verifica-se que a variável que mais exerceu influência na</p><p>presente pesquisa foi o sexo do falante, em que foram</p><p>observados desvios mais acentuados, em relação às demais</p><p>variáveis estudadas. Assim, observa-se que a variável</p><p>nível de</p><p>escolaridade também pode ser vista como um aspecto positivo</p><p>na fala desses informantes, sobre o uso das formas pronominais</p><p>“para eu” e “para mim”.</p><p>Os desvios encontrados só foram colhidos por meio dessas</p><p>entrevistas quando o informante era submetido a perguntas que</p><p>o remetiam à sua fase infantil, a assuntos familiares, a</p><p>acontecimentos relacionados a risco de morte ou perigos já</p><p>enfrentados pelos mesmos, fatos que o levam a lembranças ou</p><p>fatos vividos que marcaram suas vidas. Isso não foi algo que</p><p>surgiu de um acaso, mas uma atitude pensada, pois quando o</p><p>falante relata sobre sua infância, sobre fatos marcantes de sua</p><p>vida, não se preocupa com a maneira como fala, e sim, do que</p><p>está a falar e a sentir com as recordações de passagens</p><p>importantes de sua vida, de sua infância, de seus entes queridos.</p><p>Diante dos resultados elencados, é possível inferir que o</p><p>ensino contribui de forma satisfatória para que os informantes</p><p>não utilizem os desvios linguísticos, com relação ao uso de “para</p><p>eu” e “para mim” contribuindo para os resultados satisfatórios</p><p>com relação ao emprego das formas pronominais em estudo, a</p><p>saber: eu e mim, na função de sujeito, no português falado em</p><p>Dourados-MS.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>35</p><p>Referências</p><p>AMARAL, A. O dialeto caipira. São Paulo: Contexto, 1976.</p><p>BAGNO, M. 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Rio de Janeiro: Ao</p><p>Livro Técnico, 1974.</p><p>MCCLERAY, L. Sociolinguística – Curso de Letras – Libras. Santa Catarfima:</p><p>UFSC, 2007.</p><p>MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão</p><p>textual. São Paulo: Parábola, 2008.</p><p>MARCUSCHI, L. A. Análse da conversação. São Paulo: Ática, 2006.</p><p>MOLLICA, M. C.; BRAGA, M. L. Introdução à Sociolinguística: o tratamento</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>36</p><p>da variação. São Paulo: Contexto, 2015.</p><p>MONTEIRO, J. L. Para Compreender Labov. Petrópolis-RJ: Vozes, 2000.</p><p>NARO, J. A. Idade. In: UFRJ). MOLLICA, M. C. e BRAGA, M. L. (orgs.).</p><p>Introdução à sociolinguística – o tratamento da variação. São Paulo:</p><p>Contexto, 2015.</p><p>PAIVA, M. da C. Sexo. In MOLLICA, M. C. e BRAGA, M. L. (orgs.). Introdução</p><p>à sociolinguística – o tratamento da variação. São Paulo: Contexto, 2015.</p><p>SAUSSURE, F. de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 1989.</p><p>SIMKA, S. É pra mim colocar crase ou não? Uma análise crítica do emprego de</p><p>para mim / para eu e do acento indicativo de crase. São Paulo: Musa, 2001.</p><p>SOARES, M. Linguagem e escola: uma perspectiva social. São Paulo: Contexto,</p><p>2017.</p><p>TARALLO, F. A pesquisa sociolinguística. São Paulo: Ática, 2007.</p><p>VOTRE, S. Escolaridade. In MOLLICA, M. C. e BRAGA, M. L. (orgs.).</p><p>Introdução à sociolinguística – o tratamento da variação. São Paulo:</p><p>Contexto, 2015.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>37</p><p>GÊNEROS ACADÊMICOS</p><p>Recorrência da modalidade oral nos cursos de graduação</p><p>Ana Paula Faustino de Oliveira1</p><p>Edineia Leite dos Santos Oliveira2</p><p>O estudo que ora apresentamos está relacionado a um</p><p>projeto3 de pesquisa denominado “(Multi) Letramentos e Os</p><p>Gêneros Textuais e Ou Discursivos: contribuições para o Ensino</p><p>e Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais”, que tem</p><p>desenvolve pesquisas com alunos das diferentes áreas de</p><p>comunicação, com professores do ensino fundamental</p><p>envolvendo o processo de ensino e aprendizagem, os usos das</p><p>tecnologias, das multimídias.</p><p>Os estudos a cerca do uso da linguagem têm constituido</p><p>uma tematica de interesse de varios estudiosos da lingua, pois</p><p>quanto mais utiliza das modalidades oral e escrita , mais</p><p>interesse de conhecer como essas modalidades ocorrem e por</p><p>que ocorrem. A pratica academica dos universitarios mostram</p><p>uma gama de producoes escritas com o fito de aquisicao do</p><p>letramentos acadêmicos durante a graduação, tanto que</p><p>encontramos mais estudos explicando aobre os gêneros</p><p>textuais escritos na academia do que trabalhos acerca das</p><p>práticas de oralidade.</p><p>1Mestre em Linguística pelo Programa de Mestrado Acadêmico em Letras da Universidade</p><p>Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Unidades Universitárias de Dourados e Campo</p><p>Grande-MS. Professora na EE Prof.ª Neyder Suelly Costa Vieira. Colaboradora no Projeto</p><p>de Pesquisa “ (Multi) Letramentos e os Gêneros Textuais e ou Discursivos: Contribuições</p><p>para o Ensino e Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais” Diálogos Sobre o Agente</p><p>de Letramento e o Ensino". ORCID https://orcid.org 0000-0003-2187-1422 E-mail:</p><p>anapaulafaustinodeoliveira82@gmail.com</p><p>2 Mestre em Linguística pelo Programa de Mestrado Acadêmico em Letras da Universidade</p><p>Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Unidades Universitárias de Dourados e Campo</p><p>Grande-MS. Professora na EE Teotônio Vilela. Colaboradora no Projeto de Pesquisa “</p><p>(Multi) Letramentos e os Gêneros Textuais e ou Discursivos: Contribuições para o Ensino e</p><p>Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais” Diálogos Sobre o Agente de Letramento e</p><p>o Ensino". ORCID https://orcid.org 0000-0003-1973-4090 E-mail: edineia67@gmail.com</p><p>3 O Projeto em referência encontra-se cadastrado na Divisão de Pesquisa/ PROPP /UEMS,</p><p>sob a coordenação da Dra. Neide Araújo Castilho Teno.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>38</p><p>As mais diversas ações comunicativas são realizadas por</p><p>meio da língua falada ou escrita quer seja para ensinar,</p><p>trabalhar, divertir, participar de eventos, etc. Para isso nos</p><p>valemos dos diferentes gêneros textuais que circulam</p><p>socialmente. No cotidiano oralizamos ou escrevemos por meio</p><p>dos gêneros, e a academia não seria diferente. Os alunos dos</p><p>diferentes cursos utilizam os gêneros textuais para sucesso na</p><p>profissão e construir seus saberes, embora muitos deles muito</p><p>pouco conhecem acerca dos gêneros acadêmicos. Por mais que</p><p>os alunos conhecem e utilizam as modalidades oral e escrita</p><p>ainda lhes falta o domínio de determinados gêneros orais.</p><p>Torna visível nos meios academicos e na Universidade que</p><p>a modalidade oral não assume primasia nas aulas de Língua</p><p>com a mesma forca da modalidade escrita. (Marcuschi</p><p>e</p><p>Dionisio, 2007). Assim, a finalidade deste estudo é o de</p><p>identificar quais gêneros textuais orais são mais utilizados na</p><p>academia pelos graduandos. Na literatura são expressivas as</p><p>publicações fazendo referência aos gêneros escritos acadêmicos</p><p>produzidos na academia, todavia em menos escore a literatura</p><p>faz registros sobre as práticas de oralidade nesse espaço.</p><p>A metodologia utilizada foi da pesquisa online com a</p><p>utilização de questionário, destinada aos graduandos dos cursos</p><p>de graduação da UEMS/MS, seguida de análises para o</p><p>conhecimento dos gêneros orais mais recorrentes. Vinculamos</p><p>estudiosos como: Bezerra (2012), Schneuwly; Dolz (2006),</p><p>Lousada (2014), Marcuschi (2005), entre outros que apresentam</p><p>trabalhos com os gêneros orais em diferentes contextos. Um</p><p>ponto de relevância que podemos apontar com o estudo é a</p><p>evidência das confusões na nomeação dos gêneros orais a</p><p>medida que os graduandos anotam suas respostas.</p><p>Pressupostos teóricos</p><p>As reflexões realizadas iniciam nos pressupostos teóricos</p><p>do Interacionismo Sociodiscursivo que são referências no Brasil</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>39</p><p>e fora do país para o ensino-aprendizagem de gêneros</p><p>textuais/discursivos, seu uso como instrumento de</p><p>aprendizagem e estudos epistêmicos sobre os gêneros orais</p><p>acadêmicos. Visto que os estudantes apresentam dificuldade em</p><p>dominar o gênero oral, bem como, compreender e apropiar dos</p><p>eventos de esfera discursiva no contexto acadêmico.</p><p>Os gêneros textuais orais são desenvolvidos por meio da</p><p>interação sociocomunicativa humana, estão presentes nos mais</p><p>diversos eventos do cotidiano histórico e cultural da sociedade,</p><p>provoca à produção de diferentes práticas sociais situadas na</p><p>educação, ciência, lazer, igreja entre outras. Esses campos</p><p>sociais corroboram com a comunicação no sentido da realização</p><p>do domínio discursivo, ou seja, quando permite as pessoas se</p><p>comunicarem por meio de textos – orais e escritos, o que</p><p>constitui os gêneros, tais como: prova oral, e-mail, seminários,</p><p>conferências, resumos de textos e debates regrados. Por isso,</p><p>estão interligados aos gêneros escritos ocupando o mesmo</p><p>espaço de produção, circulação e compreensão, são práticas</p><p>sociais que se completam, ou seja, textos mistos.</p><p>Os gêneros contribuem para a organização de um texto,</p><p>com base em suas principais características: a linguagem,</p><p>construção composicional, estilo, conteúdo o que permite</p><p>identificar, empregar e reconhecer. São capazes de adaptação e</p><p>evolução, não desaparecem, são substituíeis, tal como a carta</p><p>escrita ocorreu à substituição pelo e-mail de característica ágil e</p><p>resposta em tempo real, o telefonema em orelhão por mensagem</p><p>de voz no Whatsapp e chamada de vídeo.</p><p>Na visão de Bezerra “trata-se de práticas complexas que</p><p>envolvem a orientação do aluno para o desenvolvimento de</p><p>múltiplas competências, numa complexa inter-relação entre</p><p>aspectos linguísticos, cognitivos e socioculturais’’(2012, p. 247).</p><p>Conforme o autor menciona Assim, conhecer o gênero textual</p><p>oral e suas especificidades torna fundamental nas situações</p><p>sociocomunicativas de convívio em sociedade, pois amplia as</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>40</p><p>competências linguísticas de ouvir, falar, ler e escrever e</p><p>capacita o acadêmico para a vida profissional.</p><p>As diversas ações comunicativas verbais e não verbal,</p><p>ocorre antes do ingresso na graduação, estão presentes em todas</p><p>as etapas escolares do estudante, contudo a prática do gênero</p><p>oral como o debate e seminário pouco acontece, não são</p><p>desenvolvidos como deveria. Para Schneuwly; Dolz (2006)</p><p>“cada gênero oral é sempre também sustentado por outro</p><p>gênero oral, isto é, há sempre um gênero oral e um gênero oral</p><p>sobre o gênero oral, um discurso sobre’’.</p><p>As palavras de Schneuwly; Dolz (2006) vincula se a uma</p><p>valorização intrínseca para o gênero oral à medida que</p><p>reportam a questão da oralidade como prática social de</p><p>interação que permeia as ações comunicativas. Essa alusão aos</p><p>textos orais é justificável pois são encontradas nos diversos</p><p>contextos de uso e diferentes gêneros textuais constructos da</p><p>realidade sonora, por exemplo, o debate (presente no campo</p><p>político), apresentação de trabalho (presente na agência</p><p>publicitária e na escola), seminários (agronegócio e ou religioso).</p><p>Todavia quando o estudante ingressa na graduação</p><p>conhece novo saber, ou seja, o gênero oral acadêmico para</p><p>aquele contexto e para a vida profissional, tal como, a entrevista,</p><p>seminário, sessão de comunicação e arguição (dissertação ou</p><p>teses), tendo como origem outro gênero oral de uso formal ou</p><p>informal. Nesse sentido, surge o problema dos estudantes</p><p>perante os gêneros acadêmicos de não obter apropriação e</p><p>domínio, pois confundem com os gêneros escolares, porém são</p><p>saberes com traços distintivos.</p><p>Lousada (2012, p. 48) “ele fala de órgão de seleção, de filtro,</p><p>mas também de um funil que se estreita. Todos esses</p><p>instrumentos têm uma função em comum, a saber, a de</p><p>‘’escolher’’, de selecionar, de deixar passar certos elementos da</p><p>realidade e reter outros’’ (2012, p. 48). Toda ação enunciativa é</p><p>constructo de algum enunciado, ou situação de fala, no</p><p>ambiente acadêmico o graduando realiza escolhas linguísticas,</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>41</p><p>cognitivas, mobiliza os gêneros constructos de práticas sociais,</p><p>seleciona novos conhecimentos, e assim o seu saber discursivo é</p><p>formado, por meio de escolhas, opções tanto incorporados na</p><p>sociedade como para aquele contexto.</p><p>Visto que na literatura se encontra uma vasta produção</p><p>com referência aos gêneros escritos, estudos no campo da</p><p>Linguística Aplicada e Educação que aborda e discuta o gênero</p><p>oral acadêmico são pertinentes, pois a literatura carece de mais</p><p>registros e produção de material que contribua com o</p><p>conhecimento em aquisição. O contato com as novas</p><p>publicações pode direcionar o graduando a desenvolver a sua</p><p>capacidade de linguagem, compreensão, interpretação e</p><p>orientar a prática contextualizada dos gêneros, amenizando a</p><p>dificuldade de apropriação e domínio.</p><p>Na concepção de Lousada “uma interpretação ou uma</p><p>reconstrução de um fato se realiza sempre por intermédio de um</p><p>conhecimento já existente [...] que mediatiza, seja</p><p>imediatamente, enquanto conhecimento seja sob a forma de um</p><p>construto [...] (2012, p. 46) ”. Apresentação em Seminários</p><p>Acadêmicos parte da premissa do evento de fala que ocorre por</p><p>meio de outro gênero, mas para acontecer o evento discursivo,</p><p>o acadêmico busca construir o seu conhecimento com base em</p><p>outras práticas discursivas existentes.</p><p>Por mais que os alunos conhecem e utilizam as</p><p>modalidades oral e escrita ainda lhes falta o domínio de</p><p>determinados gêneros orais. Dessa forma o objetivo deste artigo</p><p>é de identificar quais gêneros textuais orais são mais utilizados</p><p>na academia pelos graduandos. A metodologia utilizada para</p><p>alcançar a finalidade foi uma pesquisa online com a utilização</p><p>de questionário, destinada aos graduandos dos cursos de</p><p>graduação da UEMS/MS, seguida de análises para o</p><p>conhecimento dos gêneros orais mais recorrentes. Um ponto de</p><p>relevância que podemos apontar com o estudo é a evidência das</p><p>confusões na nomeação dos gêneros orais a medida que os</p><p>graduandos anotam suas respostas.</p><p>ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na</p><p>contemporaneidade</p><p>42</p><p>Caminhos Metodológicos</p><p>A tessitura deste capitulo inicia a partir das experiências</p><p>vivenciadas no processo do mestrado e a constante frequência e</p><p>contato com professores iniciantes dos cursos de graduação de</p><p>uma universidade pública. Assim, definimos como contexto</p><p>cursos de graduação, polo de Campo Grande da UEMS /MS que</p><p>tem oferta de três cursos de Letras ( Inglês, Espanhol e</p><p>Bacharelado) com uma oferta de 40 vagas anual em cada curso.</p>ativas para uma aprendizagem mais profunda. In: 
BACICH, L.; MORAN, J. (org.). Metodologias ativas para uma educação 
inovadora. Porto Alegre: Penso, 2018. 
NOGUEIRA, M. G.; PADILHA, M. A. S. Cultura digital jovem: as TIMS invadem 
as periferias, e agora? ETD - Educação Temática Digital, Campinas, v. 16, 
n. 2, p. 268-286, maio/ago. 2014. ISSN 1676-2592. 
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/
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163 
 
NÓVOA, A. Aprendizagem não é saber muito. Carta Capital, 27 abr. 2015. 
Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/educacao/Antônio-
novoa-aprendizagem-nao-e-saber-muito/ Acesso em: 15 jan. 2024. 
PEREIRA, J. T. Educação e sociedade da informação. In: COSCARELLI, C. V.; 
RIBEIRO, A. E. (orgs.). Letramento Digital: aspectos sociais e 
possibilidades pedagógicas. 3. ed. Belo Horizonte: Ceale; Autêntica, 2021. 
SBC – SOCIEDADE BRASILEIRA DE COMPUTAÇÃO. Referenciais de 
Formação em Computação: Educação Básica. SBC, 16 ago. 2017. Disponível 
em: https://www.sbc.org.br/noticias/10-slideshow-noticias/1996-referen 
ciais-de-formacao-em-computacao-educacao-basica. Acesso em: 07 dez. 
2022. 
SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na Cibercultura. 
Educação e Sociedade, Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002. 
ZACHARIAS, V. R. de C. Letramento digital: desafios e possibilidades para o 
ensino. In: COSCARELLI, C. V. (org.). Tecnologias para aprender. São 
Paulo: Parábola Editorial, 2016. 
https://www.cartacapital.com.br/educacao/antonio-novoa-aprendizagem-nao-e-saber-muito/
ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na 
contemporaneidade 
 
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ENSINO, DISCURSO E TEORIA: cenários dos estudos linguísticos na 
contemporaneidade 
 
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SOBRE OS ORGANIZADORES 
 
Neide Castilho de Araújo Teno 
 
Doutora em Educação /Mestre em Letras. Pesquisadora Sênior do 
Programa de Mestrado Profissional em Letras–PROFLETRAS, e do 
Programa de Mestrado Acadêmico em Letras da Universidade 
Estadual de Mato Grosso do Sul - UEMS/Dourados /Campo 
Grande. Coordena os projetos de Pesquisa: (Multi) Letramentos e 
Os Gêneros Textuais e/Ou Discursivos: Contribuições para o Ensino 
e Aprendizagem de Línguas em Tempos Digitais e o Projeto 
Memórias de Professores: diálogos sobre o letramento e o ensino da 
língua portuguesa. Colaborou no projeto de pesquisa Apoio à 
Qualificação Docente: PROFLETRAS em Mato Grosso do Sul 
financiado com recurso da FUNDECT. Orcid. https://orcid.org/ 
0000-0001-5062-9155 E-mail: cteno@uol.com.br 
 
Ivo Di Camargo Junior 
 
Possui estágio de Pós-Doutorado em Formação de Professores 
(PPGFP-UEPB). É Mestre e Doutor em Linguística (UFSCar). 
Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional (Faculdade 
Metropolitana); Educação Infantil (UFU); Ensino de Filosofia no 
Ensino Médio (UnB); Educação Empreendedora (UFSJ); Gestão 
Escolar, Orientação e Supervisão (Faculdade São Luís); Pedagogia 
Universitária (UFTM); Mídias na Educação (UFSCar). Licenciado 
em Letras (UNESP/Assis), Filosofia (UFSJ) e Bacharel em História 
(UNESP/Franca). Atua como professor de Língua Portuguesa 
Efetivo no Centro Educacional Paulo Freire da Secretaria Municipal 
de Educação de Ribeirão Preto/SP. Desenvolve pesquisas sobre 
Mikhail Bakhtin, cinema e outras mídias/linguagens e educação. 
Trabalha com relações dialógicas, polifonia, Memória de futuro e 
outros conceitos Bakhtinianos aliados ao audiovisual e à educação. 
E-mail: side_amaral@hotmail.com

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