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<p>Universidade Federal de Pelotas</p><p>Centro de Letras e Comunicação</p><p>Curso de Pós-Graduação em Letras</p><p>Especialização em Literatura Comparada</p><p>Metodologias do Ensino da Leitura e da Literatura</p><p>1</p><p>Pessoal,</p><p>Este material é parte de um trabalho feito para um curso dado a</p><p>distância. Apesar de ser de minha autoria, não quis alterar a</p><p>estrutura.</p><p> Leitura e Cultura</p><p> Nesta semana, começaremos a tratar do aparecimento da escrita, abordando sua</p><p>evolução ao longo da história da humanidade. Nessa esteira, refletiremos sobre</p><p>como ela chega e interfere nos rumos culturais da humanidade.</p><p>O objetivo dessa unidade é pensar sobre como o nascimento da cultura escrita</p><p>influenciou na construção da sociedade e desenvolveu novas relações entre o</p><p>homem e as produções culturais. Também vamos refletir sobre os aspectos</p><p>cognitivos e afetivos dos quais a leitura se vale.</p><p>Se a escrita nasce para facilitar as relações comerciais, em breve ela toma outro</p><p>caminho: auxilia o homem no registro de sua própria memória social e individual.</p><p>Assim, o nascimento da cultura escrita modificou as relações sociais, já que a própria</p><p>forma de manter a memória das sociedades ganhou outro formato. Nesse aspecto, a</p><p>produção escrita ganha corpo e também formas de se propagar e se perpetuar.</p><p>Desenho rupestre peruano em Toro Muerto, datado de</p><p>14 mil anos atrás.</p><p>Placa de Barro com escrita</p><p>cuneiforme dos sumérios</p><p>4000 a.C.</p><p>Escrita hieroglífica em pergaminho (Egito Antigo).</p><p>A escrita precisou de um suporte material para ser registrada. Assim, ao longo da</p><p>evolução da humanidade, o homem foi experimentando materiais diversos a fim de que</p><p>as informações veiculadas pela escrita não se perdessem. Higounet (2003) nos diz que:</p><p>Universidade Federal de Pelotas</p><p>Centro de Letras e Comunicação</p><p>Curso de Pós-Graduação em Letras</p><p>Especialização em Literatura Comparada</p><p>Metodologias do Ensino da Leitura e da Literatura</p><p>2</p><p>A pedra sempre foi o suporte por excelência das escritas monumentais. Os</p><p>hieróglifos egípcios, as inscrições hititas, os fragmentos de Biblos, os</p><p>caracteres monumentais gregos e latinos são gravados na pedra dura ou, vez</p><p>por outra, incisos em relevo. A escrita dita cuneiforme da Suméria e da Ásia</p><p>anterior era, por outro lado, preferentemente traçada em tabuletas de argila</p><p>fresca, depois cozidas ao forno. Os mais antigos caracteres chineses são</p><p>gravados no bronze ou no casco da tartaruga. No tempo de Maomé, os</p><p>árabes usavam muito ossos de camelo (p.16).</p><p>Além desses materiais duros, o autor cita ainda outros suportes que foram</p><p>utilizados para a escrita, como a madeira, a casca de árvore, as folhas de palmeira, a</p><p>tela, a seda, as peles de animais, as tabuletas de cera, o couro, a casca de bétula, o</p><p>papiro, o pergaminho e o papel. Esses três últimos são considerados os materiais mais</p><p>utilizados desde o início de nossa era (HIGOUNET, 2003, p.17).</p><p>Antes de pensarmos na invenção da prensa por Gutenberg (1390?-1468), o</p><p>homem tinha seus mecanismos de reprodução do material escrito, pois, mesmo após</p><p>abandonar os pergaminhos, a era medieval utilizava-se de mãos humanas para duplicar</p><p>e difundir a produção cultural através da atividade dos monges copistas. Ainda que o</p><p>material ficasse sob a guarda da igreja, não era proibido consultá-lo, era apenas</p><p>necessário obter permissão para ter acesso a material guardado em armários chaveados e</p><p>até acorrentados.</p><p>Iluminura</p><p>Monge Copista</p><p>Gutenberg substituiu as pranchas xilográficas por</p><p>caracteres móveis de madeira, depois pelo cobre e,</p><p>finalmente, pelo aço.</p><p>Universidade Federal de Pelotas</p><p>Centro de Letras e Comunicação</p><p>Curso de Pós-Graduação em Letras</p><p>Especialização em Literatura Comparada</p><p>Metodologias do Ensino da Leitura e da Literatura</p><p>3</p><p>Diante do fato de a cultura escrita estar sob o domínio de poucos durante muito</p><p>tempo, podemos perceber o quanto a apreensão do código escrito é importante para o</p><p>indivíduo, já que, sem esse domínio, jamais terá acesso a essa cultura. A importância da</p><p>cultura e do livro também se traduz na trajetória desse objeto que, por vezes, foi</p><p>considerado tão perigoso, pois o domínio da leitura dá ao homem a liberdade de</p><p>determinadas escolhas. A inquisição condenava não apenas pessoas perigosas, mas</p><p>livros perigosos que, em mãos erradas, poderiam causar grandes danos às leis</p><p>instituídas.</p><p>Para exemplificar, lembremos da passagem significativa de Dom Quixote, em</p><p>que sua biblioteca é condenada à fogueira por ser considerada a responsável pelo estado</p><p>mental e emocional da personagem.</p><p>“Pidió las llaves a la sobrina del aposento donde estaban los libros autores del daño, y</p><p>ella se las dio de muy buena gana” (CERVANTES, 2004, p. 50).</p><p>Atualmente, a escola é a responsável pelo acesso ao código escrito, pelo</p><p>letramento. Evidentemente que o trabalho da escola deve ir além do ensino da apreensão</p><p>do significado do código escrito, já que necessita proporcionar ao aluno o acesso a</p><p>diferentes gêneros discursivos, a fim de que ele seja um leitor crítico. Sabemos que há</p><p>uma relação intrínseca entre escrita e leitura, entretanto, devemos realizar a</p><p>diferenciação entre elas. Fischer (2006), em seu livro História da leitura, ressalta as</p><p>diferenças entre as duas habilidades de forma didática, poética e precisa:</p><p>Apesar de a leitura e a escrita estarem plenamente relacionadas, a leitura é,</p><p>na verdade, a antítese da escrita. Na realidade, cada uma ativa regiões</p><p>distintas do cérebro. A escrita é uma habilidade, a leitura uma aptidão</p><p>natural. A escrita originou-se de uma elaboração; a leitura desenvolveu-se</p><p>com a compreensão mais profunda pela humanidade dos recursos latentes da</p><p>palavra escrita. A história da escrita foi marcada por uma série de</p><p>influências e refinamentos, ao passo que a história da leitura envolveu</p><p>estágios sucessivos de amadurecimento social. Escrita é expressão, leitura é</p><p>impressão. A escrita é pública; a leitura, privada. A escrita é limitada; a</p><p>leitura, infinita. A escrita congela o momento. A leitura é para sempre (p.8).</p><p>Ao pensarmos sobre essas afirmações do autor, questionamo-nos acerca das</p><p>habilidades necessárias para a realização de uma leitura competente. Além disso, temos</p><p>a oportunidade de refletir sobre em que momento o indivíduo adquire essas habilidades,</p><p>de que forma ele as adquire e quem pode auxiliá-lo nessa caminhada.</p><p>No Brasil, o índice de analfabetismo ainda é alto, entretanto, muitas têm sido as</p><p>formas utilizadas pelo poder público para oferecer educação a jovens e adultos. Nesse</p><p>processo de letramento de adultos, percebe-se que, ao serem alfabetizados, os alunos</p><p>são expostos a uma experiência de leitura que, muitas vezes, não condiz com sua faixa</p><p>etária. Diante dessa disparidade entre leitor e leitura, criou-se a concepção de neoleitor.</p><p>Universidade Federal de Pelotas</p><p>Centro de Letras e Comunicação</p><p>Curso de Pós-Graduação em Letras</p><p>Especialização em Literatura Comparada</p><p>Metodologias do Ensino da Leitura e da Literatura</p><p>4</p><p>Com base nessa concepção, buscou-se também criar uma literatura específica</p><p>para essa fase transitória de leitor, visto que a literatura infanto-juvenil pode estar</p><p>adequada na questão linguística, mas não no que diz respeito aos assuntos e à maneira</p><p>de ver o mundo.</p>