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<p>FACULDADE PRIME</p><p>CAIO CESAR MONTEIRO AGUIRRE</p><p>LEANDRO GAMARRA</p><p>DIREITO INTERNACIONAL</p><p>TRAFICO DE PESSOAS: ESCRAVIDÃO SERVIL E SEXUAL, E A MEDICINA ILEGAL</p><p>Etapa 3, solicitada pela Disciplina de Direito Internacional. 7º semestre curso de Direito. Faculdade Prime. Orientadora: ME Gislaine Esther Luba Moreira Moura</p><p>CAMPO GRANDE – MS</p><p>2024</p><p>DIREITO INTERNACIONAL</p><p>TRAFICO DE PESSOAS: ESCRAVIDÃO SERVIL E SEXUAL, E A MEDICINA ILEGAL</p><p>RESUMO:</p><p>A necessidade da criação de mecanismos de proteção a pessoa humana em relação ao uso das pessoas com o propósito de exploração sexual, servil ou mesmo trabalhista, envolve questões alusivas a necessidade da rede protecional, visando integração entre países, tratados e organizações que possam formar um plano de integração social e de proteção a pessoa humana. A exploração sexual e servil por vezes se assemelham a casos em ocorre uma linha tênue de ocorrência descrito pelo proposito de engano direcional da pessoa em relação a condição de que esta pessoa passa a ser enganada para ir a outro local com propostas falsas de trabalho, ocorrendo nesta circunstancia, uma exploração sexual, visando um estado de escravidão. A questão alusiva a saúde demonstra uma exploração mais detalhada, em que o estado pleno de vulnerabilidade demonstra famílias que acabam vendendo entes familiares, principalmente crianças, com o intuito de terem proveitos financeiros em determinados momentos. O objetivo do presente trabalho encontra-se associado a necessidade de apresentar reflexões a respeito da ocorrência do impacto ocasional da exploração humana em determinadas ações com o propósito sexual, servil ou mesmo de extração de órgãos.</p><p>Palavras-chave: Exploração sexual; Exploração Servil; Trafico de órgãos.</p><p>1. INTRODUÇÃO</p><p>Com o desenvolvimento da sociedade, e a evolução das questões associadas à saúde e seus avanços tecnológicos, surgem também problemas associados a questões bioéticas, e questões ligadas ao desenvolvimento de novos métodos de tratamento em saúde, dentre os métodos inovadores o transplante de órgãos, antes identificado apenas em países com desenvolvimento tecnológico agora também é realizado em países pobres, popularizando uma dinâmica de saúde antes quase exclusiva a ambientes em que práticas de saúde ocorrem em valores mais módicos.</p><p>Com o desenvolvimento e a popularização do tipo de prática, surgem problemas ligados a questões éticas e econômicas, dentre as quais o trafico de órgãos, uma triste realidade que passa a fazer parte da nova sociedade global.</p><p>Bueno (2008, pg. 18) lembra que o ser humano é um ser autônomo e como tal possui o direito de dar leis ao seu próprio corpo, contudo, apesar de ser dono de seu próprio corpo, essa autonomia é relativizada diante dos aspectos legais, lembrando que homem não é dono de si sob forma absoluta. Tal condição encontra-se evidenciada como forma de proteção a integridade do indivíduo como ser humano, propiciando a garantia da manutenção de sua dignidade considerando seus valores sociais.</p><p>Como o advento da popularização de questões ligadas às novas práticas médicas, o trafico de órgãos passa a sofrer restrições legais na legislação brasileira através da Lei 9.343/97, por meio de tal normativa questões de bioética, bem como questões doutrinárias e relativas à prática de transplantes de órgãos passam a ser estruturadas dentro de parâmetros legais resguardando aos cidadãos princípios de direitos éticos, e segurança no atendimento em saúde.</p><p>Em pleno complemento de todo conceito, a exploração servil e sexual requer uma atenção especial observando a necessidade da proteção humana frente aos conceitos de escravidão.</p><p>2. TRAFICO DE PESSOAS: ESCRAVIDÃO SERVIL E SEXUAL E A MEDICINA ILEGAL</p><p>Estudos do Senado Federal apontam que no Brasil, entre 2012 a 2019, foram registradas 5.125 denúncias de tráfico humano no Disque Direitos Humanos (Disque 100) e 776 denúncias na Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), ambos canais de atendimento do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC).</p><p>Entre os anos de 2010 e 2022 foram contabilizadas 1.901 notificações no Sistema de Informação de Agravos de Notificação do Ministério da Saúde (SINAN). Além disso, 60.251 trabalhadores foram encontrados em condições análogas à escravidão entre 1995 e 2022, segundo dados do Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas.</p><p>Esses números não representam a totalidade de casos existentes no país. A suposição é de que haja muito mais, uma vez que não há um sistema unificado de coleta de dados sobre o tema. Os registros atuais são feitos por órgãos do governo e de instituições que não podem ser somados, considerando que não são utilizados os mesmos critérios para o registro das situações de tráfico, conforme aponta o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC) e o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), no Relatório Nacional Sobre Tráfico de Pessoas (2017-2020).</p><p>2.1 TRAFICO HUMANO: ESCRAVIDÃO SERVIL E SEXUAL</p><p>Segundo a Declaração de Istambul (2008, p. 2),</p><p>“O comercialismo dos transplantes é uma política ou prática segundo a qual um órgão é tratado como uma mercadoria, nomeadamente sendo comprado, vendido ou utilizado para a obtenção de ganhos materiais”.</p><p>Esse tipo de comércio acha-se afinado com o tráfico de órgãos para os turistas dos países ricos, que procuram nos países pobres pessoas portadoras de órgãos compatíveis com as suas necessidades de saúde. Isso fomentou o tráfico de órgãos pela máfia internacional, fato verificado pelas pesquisas da Organs Watch: Essa máfia, especializada na venda de rins, teve seu início em Israel, na década de 1990. Primeiramente eram buscados doadores entre refugiados palestinos. Mas o esquema foi denunciado por jornalistas e a quadrilha passou a buscar pessoas na Turquia e no Leste Europeu.</p><p>No início deste século, a quadrilha descobre os brasileiros. Os jovens do sexo masculino, entre 18 e 23 anos, com boa saúde, eram recrutados na periferia de Recife, Pernambuco. O comprador: um dos maiores polos médicos do mundo, em Durban, na África do Sul. (SIQUEIRA, 2013, p. 48). Segundo a autora, esses jovens venderam seus rins à quadrilha por até US$ 10.000.00 por unidade, todavia a alta oferta fez cair o preço da mercadoria. O tráfico de órgãos integra uma rede de compradores de órgãos vitais como fígado e rim; os preços são negociados no mercado ilícito, com valor menor caso o doador pertença a um país subdesenvolvido. A lei da oferta e da procura determina a relação de compra e venda dos órgãos nos diferentes países.</p><p>Com o desenvolvimento e a popularização do tipo de prática, surgem problemas ligados a questões éticas e econômicas, dentre as quais o tráfico de órgãos, uma triste realidade que passa a fazer parte da nova sociedade global.</p><p>Bueno (2008, pg. 18) lembra que o ser humano é um ser autônomo e como tal possui o direito de dar leis ao seu próprio corpo, contudo, apesar de ser dono de seu próprio corpo, essa autonomia é relativizada diante dos aspectos legais, lembrando que homem não é dono de si sob forma absoluta. Tal condição encontra-se evidenciada como forma de proteção a integridade do indivíduo como ser humano, propiciando a garantia da manutenção de sua dignidade considerando seus valores sociais.</p><p>Como o advento da popularização de questões ligadas às novas práticas médicas, o tráfico de órgãos passa a sofrer restrições legais na legislação brasileira através da Lei 9.343/97, por meio de tais normativas questões de bioética, bem como questões doutrinárias e relativas à prática de transplantes de órgãos passam a ser estruturadas dentro de parâmetros legais resguardando aos cidadãos princípios de direitos éticos, e segurança no atendimento em saúde.</p><p>A questão da seguridade em atendimentos de saúde normatizados pela Lei anteriormente citada propõe licitude sobre o processo de atendimentos em saúde e realização de transplantes, visando também um combate ao tráfico de órgãos promovendo maior segurança no</p><p>processo de identificação de órgãos compatíveis com o paciente a ser transplantado, e segurança ao doador no caso de órgãos transplantados em pacientes vivos.</p><p>Com o objetivo de debater as questões legais, sociais e bioéticas relacionadas ao transplante e tráfico de órgãos desenvolvemos o presente trabalho resultado de uma pesquisa bibliográfica documental, perfazendo um estudo sobre documentos descritos a respeito da temática de bioética, transplantes, e legislação vigente, bem como um estudo a respeito da ocorrência de tráficos de órgãos e sua relação com questões sociais no Brasil.</p><p>A vida e a integridade física constituem direitos inerentes ao exercício da dignidade humana sendo o ordenamento jurídico só permite a disposição do corpo diante de questões relativas à utilização mediante motivo especifico sob a forma de transplantes e atividades terapêuticas de forma gratuitas.</p><p>Como os órgãos humanos constituem parte do corpo humano, estes não podem ser tratados como objetos, sendo tal consideração incorreriam em uma fundamentação imprópria diante do ordenamento jurídico que corresponde ao cuidado da dignidade da pessoa humana.</p><p>Ao considerar o valor do ser humano, refletido por dignidade e neste caso, considera-se que a integridade e dignidade humana frente à concepção ética e filosófica não condiciona preço, é fundamental entender porque em nenhum país de ordem democrática se permita que uma pessoa possa dispor de partes de seu corpo com o objetivo de troca financeira, mesmo diante dos interesses pessoais ou contrários a esta vedação jurídica. Vale ressaltar que o público mais atingido pelo mercado de trafico de órgãos constituem pessoas de baixa renda, em situações de vulnerabilidade social.</p><p>De acordo com Sheper-Hughes (2003, pg. 21) o mercado de órgãos humanos encontra-se diretamente ligado ao crime organizado, apresentando conexões internacionais e uma estrutura fundamentada a outros mecanismos do mercado ilegal.</p><p>De acordo com Catells (1999, pg. 25) essa prática constitui um fenômeno crescente em âmbito internacional. O trafico de órgãos neste aspecto tem sido visto como uma atividade ilícita sendo uma das mais lucrativas na atualidade, perdendo apenas para o trafico de armas e drogas, atingindo uma população de aproximadamente 20 milhões de pessoas, movimentando valores aproximados a 10 bilhões de dólares a cada ano.</p><p>A Comissão de Inquérito Parlamentar de Órgão após ter ouvido médicos responsáveis pela realização de transplantes proporcionou por meio de seu relatório final a elaboração da Lei 9.434/97 incluindo na elaboração do documento final as devidas modificações na legislação inserindo em sua estrutura a perspectiva médica.</p><p>Os trabalhos desenvolvidos pela Comissão de Inquérito Parlamentar teve inicio com a denúncia do caso PAULO PAVESI, menino de 10 anos morto em 2000 na cidade de Poços de Caldas, o caso ficou amplamente conhecido após denúncias do pai da vítima ter suspeitado da venda de órgãos de seu filho que teria chegado ainda vivo ao hospital após ter sofrido uma queda no playground, o caso julgado em 1ª instancia em 2012, teve sua sentença confirmada em 2013 2ª instancia, com a condenação dos médicos, após confirmação do laudo de investigação da polícia que o garoto teria tido seus órgãos transplantados ainda vivo.</p><p>Goussinky (2015) em matéria para a revista eletrônica R7.COM, descreve que o caso Pavesi, representou apenas o inicio das investigações que levam a uma rede de trafico de órgãos no país, sendo que após a denuncia realizada pelo pai de Pavesi, as denúncias aumentaram em todo o Brasil. A exemplo do caso anterior em 2013 após a morte de Naef Ribeiro de sete anos, o pai da criança teria realizado uma denúncia que teria ocorrido no Estado do Amazonas, após a comprovação de que seu filho teria tido os fins roubados possibilitando a confirmação diante da suposta máfia do trafico de órgãos.</p><p>Goussinky ainda complementa em sua matéria que no Recife –PE, uma quadrilha com a participação de membros do exercito israelense, agenciavam pessoas da periferia com a promessa de pagamentos variáveis de 10 mil a 37 mil reais após exames pré-operatórios na capital pernambucana, sendo tais candidatos levados para a África do Sul onde a cirurgia de retirada de rins seria realizada. O caso teria sido denunciado</p><p>Castells (1999, pg. 12) afirma que “essa prática de crime global constitui um novo fenômeno que afeta profundamente a economia no âmbito internacional.” Principalmente se analisarmos que essa atividade já é a terceira atividade mais lucrativa da atualidade.</p><p>O crime organizado certamente constitui uma das principais e maiores fontes de violação diante dos direitos humanos, de acordo com Buenicore (2010, pg. 31) o crime organizado em relação ao tráfico de órgãos tem em sua internacionalização uma de suas principais características e fonte de recursos.</p><p>A Organs Watch ONG que estude casos de vítimas de vulnerabilidade social diante do tráfico de órgãos, refletem a situação comprovando em seus estudos a exploração de pessoas pobres diante da “doação” de seus órgãos como forma de obtenção de recursos para sobrevivência.</p><p>Vale ressaltar que a legislação brasileira só admite transplante em órgãos humanos sendo em casos realmente importantes e necessários a manutenção da vida humana, e se em tais casos não ocorrer à utilização de dinheiro, e sim este caso seja fruto de altruísmo baseado no desejo de contribuição da melhora da vida do indivíduo que recebera o órgão. O transplante de órgãos é um caso que representa a manutenção da vida humana, devendo ser amplamente divulgado, defendido e incentivado por autoridades públicas, considerando ser um caso essencial para que pessoas em estado precário de saúde possam ter esperança de melhoria.</p><p>O Sistema Único de Saúde – SUS tem em sua fundamentação a equidade, integralidade e universalidade, sendo embasadas pela gratuidade do serviço público em saúde, neste aspecto para garantir o atendimento de um transplante no país não se pode admitir que órgãos humanos fossem comprados. Assim interesses financeiros estruturados pelo tráfico visando a obtenção de lucro embasado na exploração das classes sociais menos favorecidas, não podem ser admitidos no país.</p><p>O tráfico de órgãos representa uma das formas que os traficantes acabam utilizando para forçar os que pretendem entrar ilegalmente em outros países e não possuem recursos para tal advento, neste aspecto, parte do pagamento do órgão a ser transplantado acaba sendo utilizado para a própria entrada do imigrante ilegal em países desenvolvidos. Esta relação também se associa a outras formas de trafico de humanos utilizando da premissa do trafico voltado para profissionais do sexo, ou ainda trabalhadores braçais.</p><p>De acordo com Correa da Silva (2013, p. 344) o processo de recrutamento relacionado ao tráfico de órgãos ocorre sob uma forma de recrutamento, ofertando ao indivíduo aliciado um processo de acolhida, normalmente este processo ocorre diante uma proposta de engano, coação, podendo chegar a situações de sequestro e raptos. A finalidade objetiva desta alienação ocorre por objetivos de intenção de exploração sexual, ou mesmo trabalho, atingindo situações referentes a retiradas de órgãos. A questão do tráfico de humanos se envolve uma diversidade de questões legais envolvendo ação criminal, de ordem pública, atingindo situações referentes à vulnerabilidade social, problemas de cunho moral e a própria violação de direitos humanos.</p><p>A questão moral e filosófica que envolve o tráfico de humanos e consequentemente o tráfico de órgãos ocorre mediante a exploração envolvendo interesses como recebimento de dinheiro, por vezes em valores prometidos desproporcional ao ponto de vista lógico, sendo uma ocasião muito semelhante a outros processos de tráficos como a exploração sexual e de trabalho escravo.</p><p>Reconhecendo a importância da intervenção cirúrgica com o propósito da manutenção da vida, ou melhora das condições de vida, bem como a necessidade de transplantes de órgãos, acabam apresentando</p><p>um leque de princípios doutrinários e presentes em diversos ramos do Direito. A respeito da criação de documentos norteadores, doutrinários e normativos a respeito do tráfico de órgãos temos a criação da Lei 9.434/97 que apresenta em seus artigos a regulamentação dos transplantes, lembrando em seu artigo 9º que só é permitido o transplante de órgãos entre pessoas vivas no país a partir do momento em que tais órgãos ocorram em duplas (a exemplo de rins), a lei ainda prevê que a retirada de tais órgãos entre pessoas vivas, não pode impedir ou reduzir a integridade e a capacidade física do doador.</p><p>A própria legislação que trata do transplante no Brasil – Lei 9.434/97 direciona em seus artigos normativas proibitivas relacionadas a auxilio médico, ou favorecimento em aspectos financeiros ou outros benefícios ao doador, apresentando em seu art. 15 indicativos de penalização de conduta para quem comprar ou mesmo vender tecidos, órgãos, ou qualquer outra parte do corpo humano, vale ainda ressaltar que o parágrafo único do mesmo artigo, prescreve que diante da Lei, aquele que oferecer vantagem ou mesmo facilitação diante da aquisição de órgãos para</p><p>No tráfico parte do corpo de um indivíduo é vendido como se fosse um objeto qualquer, e que não representasse perigo ao “doador”, não se respeita princípios básicos da dignidade humana, e por vezes, princípios básicos de higiene e segurança médica no procedimento cirúrgico. A dignidade humana é deixada de lado por um preço que por vezes não custeia o tratamento e os cuidados médicos pós-transplante.</p><p>Quanto aos atos infracionários vale ressaltar que o artigo 15º da Lei 9.434/97 que trata das penalizações, e como penalização, a lei prevê penas de reclusão e detenção, ambas de caráter restritivo de liberdade. Em apoio a diretrizes da referida lei, o Código Penal Brasileiro, define quais os tipos de crime são aplicáveis penas de reclusão dentre os quais se encontram situações referentes ao tráfico de órgãos, e em relação à detenção podemos citar casos de vilipendio a cadáver, neste último caso a lei prevê uma detenção de 1 a 3 anos de detenção. A diferença circunstancial entre detenção e reclusão ocorre no sentido que a reclusão o condenado deverá cumprir sua pena em regime fechado, semiaberto ou ainda aberto, já no caso de detenção a pena poderá ser cumprida sob o regime semiaberto ou aberto.</p><p>Após diversas denúncias de exploração social mediante o aproveitamento de pessoas em situação de vulnerabilidade para retirada de órgãos, de casos denunciados de pacientes que tiveram diagnósticos questionáveis de morte encefálica para justificar a retirada de órgãos, a Câmara Federal criou uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Tráfico de Órgãos que funcionou entre os anos de 2003 a 2004, e que apresentou em seu relatório indícios de 10 pessoas sendo a maioria médicos incursos no art. 14 da Lei 9.434/97 o que sugeriu algumas alterações e adequações no processo de penalização diante da própria lei.</p><p>Apesar da lei n.º 9.434, de 04 de fevereiro de 1997, regulamentar de forma exaustiva o procedimento cirúrgico de transplante de órgãos obstando ao máximo a comercialização, a prática vem se mostrando diferente. O sistema implantado no país não supre a necessidade dos receptores em potencial, e vem se mostrando ineficaz em cumprir com suas finalidades. É o que demonstra, por exemplo, as operações referentes a transplante de fígado. A alocação de fígados para transplante no Brasil, de doadores em morte encefálica, é baseada em critérios de urgência (MELD) desde 2006. De acordo com Silveira (2002, pg. 12) a posição em lista pode ser modificada por situações específicas de urgência médica ou pontos de ‘bônus’ para algumas doenças.</p><p>Ao tratarmos de aspectos relativos a analise do crime de tráfico de órgãos, vale ressaltar que a Lei 9.434/97 trata em seus artigos 14º e 20º quais situações incorrem em crimes de acordo com as demais referencias normatizadoras no país. Dentre as considerações de indicativos de crime podemos destacar situações como a remoção de tecidos, ou mesmo órgãos do corpo de uma pessoa ou ainda cadáver, fora dos parâmetros legais; a compra, facilitação, ou uso de benefícios diante do processo de doação e procedimentos cirúrgicos que envolvem o transplante; o recolhimento ou ainda o transporte e a guarda de partes do corpo humano sem autorizações dos órgãos competentes; e ainda após a retirada de órgãos, deixar de recompor o cadáver, de forma que possa ser devolvido seu aspecto digno para o sepultamento, assegurando a entrega de seus restos mortais aos familiares.</p><p>Os conceitos a questões relativas a transplantes e o tráfico de órgãos margeiam questões associadas ao conceito de bioética. A ideia de bioética esta relacionada ao direito de uso e a forma de lhe dar com corpos vivos, no caso em questão nos remetemos aos corpos humanos.</p><p>Apesar da legislação brasileira ser contraria a comercialização de órgãos, Passarinho, Gonçalves & Gafarra (2003, pg 223) alertam que há falhas referentes a procedimentos que envolvem a utilização de rins envolvendo doadores vivos que não pertencem ao mesmo núcleo familiar. Em complemento a tal opinião Beringuer & Garrafa (1996) ressaltam que há uma necessidade de se debater o direito de comercialização de órgãos humanos podendo tal consideração ser aceitável sobre aspectos que proporcionem a garantia da vida àqueles que necessitam do procedimento cirúrgico.</p><p>Em defesa de tal opinião Berlinguer (1993, pg. 42) ressalta ainda o conceito de altruísmo indireto utilizado para justificar a defesa de um processo de comercialização, identificando o indivíduo que vende o órgão como doador remunerado. Segundo o autor, este tipo de relação comercial transformaria o processo de comercialização de órgãos como uma forma mercado humanizado envolvendo procedimentos mais dignos entre doadores vivos, contando com um procedimento mais transparente entre doadores e compradores que não apresentam grau de parentesco. Acredita-se ainda que tal procedimento poderia aumentar significativamente o número de doadores, e consequentemente procedimentos de transplantes aumentando o número de pessoas transplantadas, reduzindo filas de espera.</p><p>A comercialização de órgãos humanos esta diretamente relacionada com situação de desigualdade econômica e consequente exploração da pobreza. A constante referencia a questões da fragilidade econômica de populações em situação de vulnerabilidade demonstram um interesse subjetivo de pessoas interessadas em vender seus órgãos como uma forma substancial de obter recursos econômicos. Helmann (2012, pg. 136) lembra que apesar do problema inicial estar diretamente relacionado com a saúde, a comercialização de órgãos alimenta uma rede de tráfico que envolve situações que somam mais que problemas econômicos, mas a exploração de humanos e o tráfico de pessoas aliciadas ao interesse em trabalho, ou pela exploração sexual.</p><p>A questão relativa ao mercado de órgãos que permeia processos associados ao tráfico de órgãos e consequentemente alimenta uma rede de crimes que podem associar em conjunto ao tráfico de órgãos ou por decorrência dele a utilização da exploração física para o trabalho, prostituição ou a própria escravidão. A exploração de humanos esta intrinsicamente relacionada à exploração social, utilizando a necessidade financeira de pessoas que vivem em situação vulnerabilidade para satisfazer as necessidades sociais de grupos com estrutura econômica.</p><p>Para Berlinguer (2004, pg. 223) a comparação da venda do esforço de trabalho do corpo ou mesmo da prostituição em relação ao mercado de órgãos humanos podem ser contra argumentados pela provisoriedade e reversibilidade dessas situações em relação à irreversibilidade e permanência da doação altruísta ou da venda de um órgão, que podem trazer prejuízos relacionados à capacidade funcional e riscos à saúde, potencialmente ainda mais graves quando extraídos de pessoas em condições de vulnerabilidade social.</p><p>Apesar do mercado de órgãos não envolverem ou cumprirem os padrões mínimos</p><p>de segurança médica, ou conduta ética envolvendo os profissionais que atuam no procedimento, a prática do transplante irregular é vista com certa naturalidade em alguns países asiáticos e do continente africano.</p><p>Em países como a Índia, por exemplo, situações que envolvem a comercialização de rins não representam fatos isolados, mas uma forma substancial de ganho e sustento financeiro para diversas famílias. A falta de estrutura sanitária e médica faz com que o governo feche os olhos para as altas taxas de mortalidade que necessitam ser combatidas com investimentos voltados a atenção primária em saúde. Por outro lado, a população em alto grau de vulnerabilidade social e dificuldades econômicas, veem na forma de comercialização de tais órgãos um meio de sobrevivência.</p><p>Visando conter o desenvolvimento do tráfico de órgãos bem como a garantia da realização de um transplante dentro de normas de segurança em saúde, a legislação brasileira se reformulou através da criação de normativas que não apenas buscaram legalizar a realização dos transplantes mas também garantir a realização de tal procedimento a pessoas diante do grau de necessidade, através de uma fila de transplantes unificada.</p><p>Apesar da legislação brasileira promover uma moralização do procedimento de transplantes, há o conhecimento de casos onde pessoas em situação de vulnerabilidade social foram levadas para outros países para então pudessem ser realizados os procedimentos médicos dando a estas pessoas uma forma de recompensa financeira promovendo assim o mercado negro de órgãos.</p><p>Tais práticas tem sido plenamente combatidas no país, contudo há países do continente Africano e outros Asiáticos aos quais cujas práticas são aceitáveis envolvendo a exploração social e financeira de pessoas de classes sociais menos favorecidas.</p><p>A consideração de tal prática nos remete a uma discussão no campo moral promovida por autores que defendem a criação de um mercado de órgãos ao considerar que a comercialização de órgãos atingiria um número maior de pessoas transplantadas, reduzindo as filas de transplantes, ampliando o acesso ao procedimento em saúde à um número maior de pessoas.</p><p>Mesmo diante do debate político a respeito da legalização, voltamos para o fato da legalização do procedimento no país que assume situações de controle de procedimento médico dentro de um aspecto moral e ético sobre a ótica de uma centralização de cadastro e ficha de espera por transplantes a partir do grau de necessidade e tempo em que o paciente se encontra na fila de espera, o outro aspecto a ser considerado é o controle do procedimento clínico cujas normas procedimentais se encontram sob a ótica do código de ética médica.</p><p>A realização de transplantes representa mais que um procedimento médico, mas uma esperança de vida para muitos pacientes, e não deve ser vista como uma forma de ganho financeiro para uns e exploração econômica para pessoas em situação de vulnerabilidade econômica e social, devendo ser combatida e amplamente fiscalizada assegurando o cumprimento da Lei Brasileira.</p><p>2.2 TRÁFICO HUMANO E A MEDICINA ILEGAL</p><p>A situação de vulnerabilidade não diz respeito às definições de pessoas vulneráveis segundo o Código Penal, como os menores de idade ou os doentes mentais, e sim à inexistência de igualdade material entre o traficante e a vítima.</p><p>Diversas são as situações de vulnerabilidade que influenciam no tráfico de pessoas, principalmente as relações desiguais de poder, tais como questões de gênero, raça, poder econômico, meio social e escolaridade, conforme evidenciado pelo relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC).</p><p>O relatório ainda explica que, no contexto do tráfico de pessoas, a vulnerabilidade se refere a fatores inerentes à pessoa ou em relação ao meio em que vive, como, por exemplo, a pobreza, a desigualdade, a discriminação e a violência de gênero.</p><p>Assim, todos esses fatores desencadeiam uma dificuldade financeira na pessoa, limitando suas escolhas e facilitando o seu recrutamento pelos traficantes.</p><p>A condição de vulnerável da vítima está diretamente ligada a fatores sociais, culturais, econômicos, políticos e ambientais, sendo entendida como uma situação de falta de opção de escolha da vítima, a qual acaba por acreditar que a exploração sexual é a sua melhor ou única saída.</p><p>Percebe-se que a vulnerabilidade possui grande influência tanto na hora do traficante escolher a sua vítima ideal e mais suscetível a aceitação da proposta, quanto na hora da vítima consentir com essa exploração.</p><p>Segundo Anália Ribeiro Pinto, as pessoas que se encontram em situações de vulnerabilidade socioeconômica, sem oportunidades de um emprego digno, são mais suscetíveis ao tráfico humano e, por isso, suas escolhas não devem ser consideradas livres e válidas.</p><p>O tráfico de mulheres com a finalidade de exploração sexual é uma das atividades criminosas mais atrativas atualmente. Isto porque, além do seu grande lucro, é um crime de difícil descoberta e denúncia.</p><p>Conforme a redação atual do artigo 231, seria perfeitamente convincente se alguém interpretasse haver ali uma previsão de punição para qualquer pessoa que ajude alguém que se dedica a atividades sexuais comerciais a atravessar a fronteira nacional. Ao conceituar prostituição como exploração e incluir no conceito de tráfico a conduta de ‘facilitar’ a saída de alguém que vá exercer prostituição no estrangeiro, prevendo multa nos casos em que se busca obter vantagem econômica e aumento de pena nos casos em que há violência, ameaça ou fraude, o Código dá espaço para que essa discursividade se instale.</p><p>Esse entendimento tem sérias implicações práticas, pois acaba funcionando como impeditivo para que mulheres pobres que se envolvem no mercado do sexo tenham oportunidades de migrar como têm outras pessoas, ainda que tenham projetos de migrar para países onde a prostituição é regulamentada. E tudo se complica ainda mais quando há a possibilidade de punição para crime tentado.</p><p>Além da exploração sexual, o trabalho escravo é outra finalidade comum ao tráfico de pessoas. A escravidão moderna atinge 50 milhões de pessoas no mundo, de acordo com a Organização Nacional do Trabalho (OIT). A procuradora do Ministério Público do Trabalho Andrea Gondim explica que o principal desafio para o combate do tráfico de pessoas, principalmente da exploração de trabalhadores escravizados, está relacionado à superação da pobreza e desigualdade social.</p><p>O Contrabando de Migrantes é um crime que envolve a obtenção de benefício financeiro ou material pela entrada ilegal de uma pessoa num Estado no qual essa pessoa não seja natural ou residente. O contrabando de migrantes afeta quase todos os países do mundo. Ele mina a integridade dos países e comunidades e custa milhares de vidas a cada ano. O UNODC, como guardião da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (UNTOC) e seus Protocolos, assiste os Estados em seus esforços para implementar o Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por via Terrestre, Marítima e Aérea (Protocolo dos Migrantes).</p><p>Além da exploração sexual, o trabalho escravo é outra finalidade comum ao tráfico de pessoas. A escravidão moderna atinge 50 milhões de pessoas no mundo, de acordo com a Organização Nacional do Trabalho (OIT). A procuradora do Ministério Público do Trabalho Andrea Gondim explica que o principal desafio para o combate do tráfico de pessoas, principalmente da exploração de trabalhadores escravizados, está relacionado à superação da pobreza e desigualdade social.</p><p>O Contrabando de Migrantes é um crime que envolve a obtenção de benefício financeiro ou material pela entrada ilegal de uma pessoa num Estado no qual essa pessoa não seja natural ou residente. O contrabando de migrantes afeta quase todos os países do mundo. Ele mina a integridade dos países e comunidades e custa milhares de vidas a cada ano. O UNODC, como guardião da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (UNTOC) e seus Protocolos, assiste os Estados em seus esforços</p><p>para implementar o Protocolo contra o Contrabando de Migrantes por via Terrestre, Marítima e Aérea (Protocolo dos Migrantes).</p><p>No Brasil, o trabalho escravo assume várias feições, mas, o que se observa comumente é a existência de tráfico de pessoas na origem. Mostrou-se, assim, um grande desafio legislativo alcançar àqueles que promovem essas práticas ilícitas, recrutando trabalhadores em pequenas cidades do interior, utilizando-se de promessas enganosas. Outro desafio legislativo foi criminalizar a conduta de manter trabalhadores submetidos a jornadas exaustivas e a condições degradantes, pois apenas o ato de restringir a liberdade, por meio do trabalho forçado, era considerado crime. Fazia-se necessário quebrar grilhões, rompendo com visões vinculadas a uma cultura colonialista escravocrata e utilizar o Direito como instrumento de evolução social e de conscientização da sociedade.</p><p>O tráfico de pessoas e o trabalho em condições análogas às de escravo configuram graves violações dos direitos humanos fundamentais e devem ser combatidos pelo Estado Brasileiro. A ratificação do Protocolo de Palermo reafirmou o compromisso do país, no âmbito do Sistema Internacional de Proteção aos Direitos Humanos, de combater essas formas contemporâneas de escravidão. Considerando que o tráfico de pessoas e o trabalho realizado em condição análoga à de escravo não são fenômenos distintos e inconciliáveis, mas interdependentes e inter- 26 relacionados, deve ser feita uma interpretação sistêmica do ordenamento jurídico brasileiro. (NOGUEIRA, 2017)</p><p>Há também a modalidade de adoção ilegal de crianças. Quadrilhas especializadas atuam no contrabando de menores através das fronteiras nacionais internacionais, vendendo-os como objetos. Vítimas de sequestro ou venda pelos próprios familiares, muitos destes menores são retirados de suas famílias e entregues a outras, que legalizam a adoção por meio de falsificação de documentos e outras práticas ilícitas. Dessa forma, famílias perfeitas são formadas em consequência do sofrimento de inúmeras outras. (CLAUDINO, 2018).</p><p>O casamento forçado é outro ramo do tráfico de pessoas, que acaba sumindo em comparação com os dois grandes braços – escravidão sexual e trabalho forçado -, mas que tem impacto significativo na China. Lá, a política de filho único levou ao infanticídio de meninas e à consequente falta de noivas. Como o tráfico atinge sempre os mais pobres, foi Mianmar que viu suas mulheres levadas à força para se casar com vizinhos chineses. Somente em 2010, foram registrados 122 casos, segundo a ONU. (COSTA E SELIGMAN, 2018)</p><p>2.3 TRÁFICO HUMANO E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E INTERNACIONAL</p><p>Tráfico de pessoas não é uma categoria sociológica. É uma categoria jurídica que nasceu dentro da discursividade da necessidade de policiamento das fronteiras transnacionais. O mote central deste artigo é historicizar esse conceito, que irradia seus efeitos precisamente de dentro do direito penal, para mostrar que não só por um sonho humanitário se move essa categoria.</p><p>As políticas sobre o tráfico de pessoas ganharam força a partir do ano de 2000, com a criação do Protocolo de Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, popularmente conhecido como Protocolo de Palermo, o principal aparato jurídico internacional sobre o tema e o grande marco da regulamentação desse crime.</p><p>O mencionado Protocolo surgiu a partir da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, aprovada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em novembro de 2000.</p><p>O conceito de tráfico de pessoas no Protocolo está previsto em seu artigo 3º, alínea “a”. Já na alínea “b”, acrescenta que o consentimento dado pela vítima será considerado irrelevante caso existe qualquer uma das modalidades de vício previstas na alínea “a”.</p><p>No Brasil, a regulamentação se dá por meio do artigo 149-A do Código Penal, o qual conceitua o tráfico de pessoas da seguinte forma:</p><p>Art. 149-A: Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:</p><p>(…)</p><p>V – exploração sexual.</p><p>Nota-se que para existir o crime de tráfico de pessoas é necessário que se tenha a presença de algum vício de consentimento, ou seja, é necessário que tenha ocorrido grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, conforme previsto no caput do artigo. Inexistindo o vício, o consentimento dado pela vítima é válido, descaracterizando o crime.</p><p>Contudo, nem sempre foi dessa forma. A redação anterior do Código Penal não incluía os vícios de consentimento como partes do conceito do crime, apenas como causas de aumento da pena. Assim, o consentimento da vítima era sempre irrelevante e desconsiderado em qualquer contexto, pois não era necessário a existência de vícios para que o crime fosse caracterizado.</p><p>Porém, com o advento da Lei n. 13.344 de 2016, os vícios passaram a fazer parte do conceito do crime de tráfico de pessoas e, por isso, sem eles o crime não existe. Assim, atualmente, o consentimento válido/livre de vícios dado pela vítima é relevante e faz com que não exista a conduta criminosa.</p><p>Aqui se faz importante destacar que o termo “abuso” utilizado no artigo 149-A do Código Penal deve ser interpretado como “abuso da situação de vulnerabilidade”, tal como previsto no Protocolo de Palermo.</p><p>Em 2016, a Lei nº 13.344, de 6 de outubro de 2016, passou a dispor sobre prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e também sobre medidas de atenção às vítimas.</p><p>Com isso, sobreveio importante alteração no Código Penal, que, no artigo 149-A, passou a prever o crime de tráfico de pessoas, nos seguintes termos:</p><p>Art. 149-A.  Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de:</p><p>I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo;</p><p>II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo;</p><p>III - submetê-la a qualquer tipo de servidão;</p><p>IV - adoção ilegal; ou</p><p>V - exploração sexual.</p><p>Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.</p><p>§ 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se:</p><p>I - o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las;</p><p>II - o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência;</p><p>III - o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou</p><p>IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional.</p><p>§ 2º A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa.</p><p>Com a referida alteração, o crime ganhou maior amplitude, passando a compreender não só exploração sexual – como era tratado pelos artigos revogados –, mas também remoção de órgãos, trabalho em condições análogas à escravidão, bem como qualquer tipo de servidão e adoção ilegal.</p><p>O artigo 149-A do CP também prevê os meios e as formas pelos quais a vítima é traficada – coação, ameaça, emprego de violência, fraude ou abuso – como elementos do tipo penal.</p><p>Trata-se de crime de alta complexidade, que envolve fatores econômicos, sociais, culturais e psicológicos, demandando a interlocução de diversas instituições do setor público e privado, bem como de toda sociedade.</p><p>O Decreto nº 5.948, de 26 de outubro de 2006 aprova a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e traz a diferença entre o tráfico internacional e o tráfico interno de pessoas (art. 2º, parágrafos 5º e 6º).</p><p>O tráfico interno de pessoas é aquele realizado dentro de um mesmo Estado-membro da Federação, ou de um Estado-membro para outro, dentro do território nacional.</p><p>O tráfico internacional de pessoas é aquele realizado entre países distintos.</p><p>Como medida de prevenção, repressão</p><p>e punição ao tráfico de pessoas, foi assinado em 2000 o Protocolo de Palermo, criado pela Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. O texto, constituído por 41 artigos, reúne orientações aos países para enfrentamento e combate ao crime. O Brasil ratificou o protocolo por meio do Decreto nº 5.017, em 2004. O documento define o tráfico humano como sendo o recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de pessoas, por meio de ameaça ou uso da força, de rapto, de fraude, de engano, do abuso de poder ou de posição de vulnerabilidade. O crime também pode ser caracterizado pela prática de dar ou receber pagamentos ou benefícios para obter o consentimento para uma pessoa ter controle sobre outra pessoa, para o propósito de exploração.</p><p>Na legislação brasileira, o crime de tráfico de pessoas abrangia apenas a exploração sexual. Só em 2016 foram incluídas outras modalidades, após os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o Tráfico de Pessoas, que funcionou no Senado entre 2011 e 2012. O relatório final da CPI mostrou que o Brasil aparece na rota do tráfico humano, tanto como origem quanto como destino final. Foram identificadas 110 rotas de tráfico interno e 131 de tráfico internacional, sendo a maioria na região Norte, onde se localiza a maior parte das fronteiras internacionais. As ações da CPI resultaram na Lei 13.344, de 2016, que incluiu na legislação novas modalidades do crime: trabalho análogo à escravidão, servidão, adoção ilegal e remoção de órgãos e tecidos.</p><p>O continente sul americano é território propício para a presença da prática do tráfico internacional de pessoas, sendo origem e destino, uma vez que possui uma diversidade de problemas sociais, e um vasto território que dificulta o combate.</p><p>A participação do Brasil nas redes internacionais do tráfico de pessoas é favorecida pelo baixo custo operacional, pela existência de boas redes de comunicação, de bancos e casas de câmbio e de portos e aeroportos, pelas facilidades de ingresso em vários países sem a formalidade de visto consular, pela tradição hospitaleira com turistas e pela miscigenação racial ( OIT, 2006).</p><p>Crimes Correlatos Identificados no Tráfico Humano (sexual, servil, órgãos)</p><p>Art. 10 LC 105</p><p>Quebra do sigilo e dados financeiros sem observância da lei</p><p>Art 238 ECA</p><p>Entrega ou promessa de entrega de filho mediante pagamento ou recompensa</p><p>Art. 16 Lei 7.492/86</p><p>Operar junto a instituição financeira sem autorização</p><p>Art 233 CP</p><p>Ato obsceno</p><p>Art. 25 XII da Lei 6.815/80</p><p>Introduzir ou ocultar estrangeiro clandestino</p><p>Art. 232 – A CP</p><p>Promoção de migração ilegal</p><p>Art. 333 CP</p><p>Corrupção ativa</p><p>Art. 230 CP</p><p>Rufianismo</p><p>Art. 317 CP</p><p>Corrupção passiva</p><p>Art. 229 CP</p><p>Casa de prostituição</p><p>Art. 304 CP</p><p>Uso de documento falso</p><p>Art. 228 CP</p><p>Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual</p><p>Art. 302 CP</p><p>Falsidade de atestado médico</p><p>Art. 227 CP</p><p>Mediação para servir a lascívia de outrem</p><p>Art. 299 CP</p><p>Falsidade ideológica</p><p>ART. 218-B CP</p><p>Favorecimento da prostituição ou exploração sexual de criança, adolescente ou vulnerável</p><p>Art. 298 CP</p><p>Falsificação de documento particular</p><p>Art. 171 CP</p><p>Estelionato</p><p>Art. 297 CP</p><p>Falsificação de documento público</p><p>Art. 149 CP</p><p>Redução a condição análoga a de escravo</p><p>Art. 289 CP</p><p>Moeda falsa</p><p>Art 158 CP</p><p>Extorsão</p><p>Art. 288 CP</p><p>Associação criminosa</p><p>Art. 148 CP</p><p>Sequestro e cárcere privado</p><p>Art. 244 ECA</p><p>Enviar criança para o exterior de forma ilegal ou para obter lucro</p><p>Art. 133 CP</p><p>Abandono de incapaz</p><p>Art. 242 CP</p><p>Dar parto alheio como próprio</p><p>A pobreza é a principal causa do tráfico humano, e o capitalismo é incapaz de resolvê-la, porquanto faz dela a matéria-prima para manter o tráfico de pessoas, uma vez que o perfil dos segmentos traficados para fins de exploração laboral, sexual e outros é de baixo nível de escolaridade, desempregados e empobrecidos economicamente. São jovens, muitos deles adolescentes, e até mesmo crianças, conduzidas à indústria do sexo, ao trabalho escravo à “doação” de órgãos. O tráfico alia-se à pobreza, o que torna evidentes as condições materiais usurpadas pela sociabilidade capitalista, naturalizadas pelo cotidiano e invisibilizadas pela forma de reificação dos flagelos vivenciados pela classe trabalhadora, incluindo os filhos desta, cujas lutas por direitos humanos não cessam.</p><p>3. CONCLUSÃO</p><p>As ações do direito internacional perfazem a necessidade de se ter determinados cuidados especiais direcionados a atenção a pessoa humana evitando o uso de pessoas com o aspecto de escravidão, seja este servil, sexual, ou mesmo para exploração de órgãos.</p><p>A necessidade de se discutir sobre condições que apropriem o cidadão a condições determinadas de combate a questões de vulnerabilidade social requerem um detalhismo de cuidado que precisa da formação não apenas de descrições sobre os direitos humanos individuais mas da composição de uma rede de atendimento as necessidades sociais.</p><p>Proteger a pessoa humana no caso de trafico sexual e servil, vai de encontro a um outro propósito de ação pessoal, que prediz a necessidade de proteger o cidadão de si mesmo.</p><p>As ações de proteção envolvem necessidade de apoio, governamental e intergovernamental, requerendo para tanto o envolvimento de rede de atenção e cuidado para que o desrespeito ao cidadão ocorra.</p><p>Os argumentos da autonomia e da liberdade individual lançados no debate em pauta passaram a ser aplicados de forma destorcida ao se desconsiderar a vulnerabilidade humana. Assim, o apelo ao princípio da autonomia acaba prevalecendo sobre o da justiça social, tornando a possibilidade de um mercado de órgãos humanos uma forma a mais de existência injusta e desigual. Quanto a uma possível comercialização ética de órgãos duplos ou que se regeneram, tal como se propõe no modelo monopsônico, vale ainda comentar seu efeito perverso de redução da solidariedade ao ampliar o sentimento de não ser necessário se preocupar com o outro, uma vez que haveria uma reparação financeira pelo dano causado pela venda do órgão.</p><p>4. REFERÊNCIAS</p><p>BANDEIRA, A.C.P.: Consentimento no transplante de órgãos: à luz da lei 9.434/97 com alterações posteriores. Curitiba: Juruá; 2001.</p><p>BERLINGUER, G.; GAFARRA, V. Bioética cotidiana. Brasília: UnB, 2004.</p><p>BOBBIO, N. Direito e Estado no pensamento de Immanuel Kant. Brasília: UNB, 1997.</p><p>BUONICORE, Giovana; ALMEIDA NETO, João Beccon de; FEIJÓ, Anamaria Gonçalves dos Santos. Dois pesos e duas medidas: considerações Jurídico-Penais e Bioéticas dos delitos de Tráfico de Órgãos e de Corpos. Boletim IBCCRIM, São Paulo, n. 215, out. 2010.</p><p>CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede – a era da informação: economia, sociedade e cultura. Tradução de Roneide e Venâncio Majer. São Paulo: Paz e Terra, 1999.</p><p>CORREA DA SILVA, Waldimeiry. In: Tráfico de Pessoas: cenário, atores e crime. Em busca do respeito à dignidade humana. FIGUEIRA, Ricardo Rezende; e, PRADO, Adonia Antunes (Org). Olhares sobre a Escravidão Contemporânea novas contribuições críticas. Ed UFMT, Cuiabá, 2011.</p><p>CUPIS, Adriano de. Os direitos da personalidade. Campinas: Romana Jurídica, 2004.</p><p>GOMES, Luiz Flávio e CERVINI, Raul. Crime Organizado: enfoques criminológico, jurídico (Lei 9.034/95) e político criminal. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 63.</p><p>PASSARINHO, L.E.V.; GONCALVES, M.P.; GARRAFA, V. Estudo bioético dos transplantes renais com doadores vivos não parentes no Brasil: a ineficácia da legislação no impedimento do comércio de órgãos. Rev. Assoc. Med. Bras., São Paulo, v. 49, n. 4, p.382-8, 2003.</p><p>RAZACK AH & DUBLIN N. Organ transplants: ethical, social, and religious issues in a multicultural society. Ásia Paca J Public. Health. 2010</p><p>RIGHTS-LATIN AMERICA: Human Traffickers Use Lure Of Better Life. Global Information Network, Nova Torque, 24 ago. 2006.</p><p>SCHEPER-HUGHES, Nancy. Rotten Trade: Millenial Capitalism, Human Values and Global Justice in Organs Trafficking. Journal of Human Rights, v. 2, n° 2, junho de 2003, Edição Especial: Human Frailty, New</p><p>York: Routledge, 2003.</p><p>TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil, 3ª edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2004.</p><p>VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007.590 p.</p><p>• De aco rdo com o art. 497 da CLT, não receberá de forma dobrada quando o empregado</p><p>image2.png</p><p>image3.png</p><p>image4.png</p><p>image1.png</p>

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