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Microbioma Humano e Dieta: E-BOOK O Papel dos Prebióticos e Probióticos na Saúde dos Adultos e Crianças 1. Microbioma e seus Conceitos 3 2. Nutrientes e o Microbioma Intestinal 10 3. A Dieta do Microbioma 14 4. Probióticos e seus mecanismos de ação na saúde digestiva e imunidade 20 5. Prebióticos: papel na programação metabólica e imunológica 23 SUMÁRIO Classificação filogenética A classificação filogenética trata da história evolutiva de uma espécie. O nome é formado pelo Gênero e a Espécie, e caso tenham a mesma espécie e características diferentes, são criadas subespécies. Quanto mais aprofundado no nível, mais específicas são as características das bactérias. Exemplo: Lactobacillus acidophillus Filo: Firmicutes Classe: Bacilli Ordem: Lactobacillales Família: Lactobacillaceae Género: Lactobacillus Espécie: L. acidophillus A microbiota pode ser definida como o conjunto dos microrganismos (bactérias, vírus, protozoários e fungos) que vivem em diferentes partes do corpo, incluindo o trato gastrointestinal (TGI), o sistema respiratório, a pele, órgãos sexuais, entre outras. Já o microbioma trata-se do genoma coletivo desses micro- organismos, responsável por mais de 98% da atividade genética no corpo humano (informação genética). Em um indivíduo de 70 kg, a microbiota corresponde a 200 g, tamanho correspondente ao de uma manga média. O TGI completo tem cerca de 7 a 10 metros de comprimento, uma super- fície que seria semelhante a um apar- tamento de 40 m². As células humanas e as bactérias estão presentes em números semelhantes no organismo humano. O genoma humano corres- ponde a 23 mil genes, enquanto o microbioma corresponde a 3 milhões de genes. Cerca de 95% das bactérias estão localizadas no intestino grosso, sendo um dos locais com maior den- sidade de microrganismos no planeta. As principais bactérias que compõem a microbiota intestinal são aquelas consi- Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc deradas benéficas por serem as pro- motoras de saúde (ex: Bifidobactérias e Lactobacilos, Bacteroides spp., Bifidobacterium spp.) e as patogênicas (ex: Enterobacteriaceae e Clostridium spp.). Seis filos predominam no microbioma humano: 1) Bacteroidetes, 2) Firmicutes, 3) Actinobactéria, 4) Proteobacteria, 5) Fusobacteria e 6) Cianobactéria. Cada um apresenta um tipo de bactéria pre- dominante e a presença relativa dos membros desses filos varia entre os diferentes locais do corpo. 3 Podemos considerar o intestino como uma porta, sendo que a microbiota intestinal desempenha um papel importante como barreira para ajudar o sistema imunológico a combater a entrada de patógenos. A microbiota intestinal de cada indivíduo é tão singular que pode ser considerada uma impressão digital, desempenhando fun- ções essenciais como digestão e pro- teção contra infecções. A microbiota possui funções anti- bacterianas, de resistência à colonização ou de proteção. Também desempenha papel na resistência à colonização e inibição da proliferação de micro- organismos potencialmente patogênicos, através da produção de metabólitos, como ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), e de substâncias antimicro- bianas, como bacteriocinas. A microbiota realiza ainda outras funções importantes, incluindo nutri- cionais, como a fermentação de fibras alimentares, com a formação de AGCC (como butirato e propionato, fontes nutritivas para os colonócitos), e a produção das vitaminas K e do complexo B. Dentre suas funções na imunologia, Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc vale destacar que as células epiteliais da mucosa intestinal são as grandes responsáveis pelo reconhecimento inicial realizado pelo sistema imunológico. Ainda, destaca-se a produção de mediadores de inflamação, pela capacidade de inibir a expressão das citocinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-6 e IL-1β). Funções da microbiota A microbiota pode ser categorizada em três variantes predominantes ou enterótipos, independente de idade, sexo, nacionalidade ou Índice de Massa Corpórea (IMC): Bacteroides, Prevotella e Ruminococcus. No entanto, nem todos os estudos identificam os três enterótipos. Atualmente, há uma discussão sobre o uso e a abrangência de tal classificação. Alguns autores reconhecem apenas dois enterótipos: Bacteroides e Prevotella, pois Ruminococcus não foi observado em todos os estudos. Alguns trabalhos avaliaram os enterótipos e suas relações com marcadores biológicos. Microbiota, enterótipos e marcadores biológicos 4 No estudo de Wu e colaboradores (2011) foram encontradas associações entre Bacteroidetes e consumo de proteínas e gordura animal, e entre Prevotella e consumo de carboidratos e fibra alimentar. Vandeputte e cola- boradores (2016) identificaram associa- ções entre Prevotella e fezes mais soltas (4 a 6 na Escala de Bristol). Lim e colaboradores (2014) descreveram a estabilidade no microbioma de gêmeos. Após 2 anos, 81,3% dos gêmeos permaneceram com o mesmo enterótipo. Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc O desenvolvimento da microbiota humana é um processo dinâmico complexo, com indivíduos exibindo diferenças em termos de diversidade microbiana e variação em diferentes fases da vida. Para bebês nascidos de parto normal, haverá o contato com microorganismos no canal vaginal. Por outro lado, para bebês nas- cidos por cesariana, o ambiente (por exemplo, equipe de enfermagem e o ar) é importante fonte de bactérias colo- nizadoras, e essas crianças têm con- tagens bacterianas intestinais mais baixas, com menor diversidade em com- paração aos bebês nascidos de parto normal. Lactentes amamentados têm uma microbiota dominada por Bifidobacterium e Ruminococcus, com taxas de colo- nização por Escherichia coli, Clostridium difficile, bactérias do grupo Bacteroides fragilis e lactobacilos significativamente menores do que aquelas observadas em lactentes alimentados com fórmulas. A composição da microbiota se altera ainda mais com a introdução de alimentos sólidos, e uma comunidade complexa e mais estável, semelhante à microbiota adulta, se estabelece após o desmame. A microbiota ao longo da vida Diversos fatores influenciam a formação da microbiota. Os primeiros 1.000 dias (concepção ao segundo ano de vida) são influenciados pela colonização intra- uterina, nutrição e saúde materna, estilo de vida materno, uso de antibióticos, tipo de parto, fatores genéticos, nascimento a termo ou pré-termo, tipo de dieta (ama- mentação ou fórmula infantil). Na vida adulta, a microbiota é impactada pela dieta, estilo de vida, uso de medi- camentos, e exercícios físicos. No enve- lhecimento, o declínio das funções fisio- lógicas se soma aos demais fatores da vida adulta. 5 Ao longo da vida adulta, a composição da microbiota intestinal é relativamente estável e alterada apenas transi- toriamente por perturbações externas. No entanto, essa estabilidade relativa é reduzida na velhice. Algumas das mudanças fundamentais que ocorrem incluem uma diminuição no número total e espécies, na diversidade microbiana e na disponibilidade de AGCC. O estudo de Akagawa e colaboradores (2019) avaliou os efeitos do tipo de parto e da nutrição na microbiota intestinal de neonatos. Utilizaram dados de 36 recém- nascidos japoneses saudáveis obtidos aos 4 dias e 1 mês de idade. Aos 4 dias de vida, Bacteroidales e Enterobacteriales foram super-representados em recém- nascidos de parto vaginal, enquanto Acillales e Lactobacillales foram super- representados em neonatos nascidos por cesariana. Com 1 mês de vida, apenas Bacteroidales apresentou uma diferença significativa. Recém-nascidos por parto vaginal tendem a ter maior proporção de Bacteroidales, independentemente do tipo de alimentação. Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc Dentre os diversos fatores que influenciam a microbiota, quatro deles merecem destaque: a dieta, o estresse, o sono e a genética. 1. Dieta: exerce um papel fundamental pois fornece nutrientes para o hospedeiro e para as bactérias no TGI. As bactérias priorizam os carboidratos comofontes primárias de energia e a fermentação de fibras alimentares resulta na produção de AGCC, que servem como fontes de energia e exercem efeitos na dife- renciação celular e na saúde intestinal. A dieta é um dos fatores que mais modula a microbiota intestinal. 2. Estresse: as células imunológicas atuam como mensageiros que transmitem o estresse psicológico ao intestino. Nesse cenário, há aumento na inflamação e proliferação de bactérias patogênicas, que levam à disbiose, ocasionando uma maior permeabilidade intestinal. Além disso, o cortisol e os mastócitos enfra- quecem as barreiras intestinais. Principais fatores que influenciam a microbiota 6 O estudo de Novak e colaboradores (2022) avaliou o efeito do lockdown durante a pandemia do COVID-19 na saúde mental, composição da microbiota intestinal e níveis de cortisol. Neste estudo com 19 adultos sau-dáveis, foram realizadas medições antro- pométricas, coleta de amostras de sangue e fezes pré e pós-lockdown, além da aplicação de questionários sobre estilo de vida e aspectos psicológicos. No pós-lockdown houve aumento na Proteobacteria. A depressão foi correlacionada positiva- mente com mudanças na abundância de Bacteroidetes e negativamente com mudanças na abundância de Firmicutes. A abundância de Alistipes pós-lockdown foi moderadamente positivamente cor- relacionada com ansiedade durante o lockdown. 4. Genética: parte das informações do microbioma é hereditária, o que implica que a genética é um fator importante para sua composição. No entanto, evidências sugerem que o impacto da estrutura genética do hospedeiro é forte em idades jovens e parece ser reduzido ao longo do tempo, enquanto o impacto ambiental fica mais forte. É difícil separar a influência genética do efeito ambiental, e mais estudos são ne- cessários para esclarecer melhor a in- fluência de ambos. Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc 3. Ritmos circadianos: o sono inade- quado está relacionado à disbiose, que afeta a regulação do sistema imuno- lógico, diminui a barreira mucosa e regu- ladores da inflamação. Além disso, essa alteração no sono pode levar ao aumento da fome e à diminuição da ativi- dade física, que também impactam a microbiota. A disbiose consiste em perturbações no ecossistema microbiano com mudanças qualitativas e quantitativas na riqueza, diversidade, atividade e distribuição de bactérias. Pode surgir como redução das bactérias bené- ficas, aumento das bactérias patogê- nicas e baixa diversidade de espé- cies. Suas principais causas são: genética, uso de antibióticos, alimen- tação inadequada e estresse. A dis- biose causa repercussões, tais como: inflamação, doenças e sintomas que podem levar ao estresse, má ali- mentação e necessidade de uso de medicamentos. Estes, por sua vez, são fatores que podem causar disbio- se, perpetuando um ciclo. 7 A chamada barreira intestinal separa o lúmen intestinal dos tecidos e órgãos internos e atua como filtro, permitindo a entrada de água, nutrientes, e impedindo a invasão por patógenos e a entrada de toxinas. Ela controla o fluxo de nutrientes e bactérias, a tolerância e a resposta imunológica a antígenos, influencia a nutrição e participa da defesa do hos- pedeiro. A barreira intestinal possui 3 camadas: ·Muco: Age impedindo a adesão bacte- riana. ·Células intestinais epiteliais (função de barreira mecânica): Regulam o trans- porte de água e nutrientes para os tecidos. ·Camada interna (lâmina própria) com células imunes (função de barreira imunológica): Faz a distinção entre patógenos e microrganismos comensais e desenvolve uma resposta imunológica apropriada contra os patógenos e an- tígenos. Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc Além disso, uma barreira biológica composta pela microbiota intestinal normal é responsável pela resistência à colonização, sendo uma importante linha de defesa. As funções mecânica, imu- nológica e biológica da barreira intestinal fornecem as três principais linhas de defesa do TGI. A barreira intestinal A permeabilidade intestinal reflete o po- tencial de transferência de materiais do lúmen para a corrente sanguínea, através da parede intestinal. Componentes ali- mentares e microbianos, que geralmente ficam restritos ao lúmen intestinal, podem passar para a corrente sanguínea e de- sencadear resposta imune inapropriada e resposta inflamatória. A permeabilidade intestinal pode au- mentar o risco de doenças, incluindo doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs), doenças gastrointestinais (colite ulcerativa e doença de Crohn), condições sistêmicas (obesidade, diabetes tipo 1 e tipo 2, hepatite autoimune, doença ce- líaca, esclerose múltipla, doenças alér- gicas) e desordens neurológicas. Permeabilidade intestinal 8 O mecanismo de defesa contra pató- genos promove resistência à colo- nização contra uma vasta gama de patógenos por mecanismos indiretos e diretos. Bactérias comensais ativam de- fesas imunes inatas da mucosa, pro- dução ou modificação de metabólitos, depleção de nutrientes ou produção de substâncias que são diretamente tóxicas para outras bactérias. Esses mecanis- mos, em conjunto, podem promover um alto nível de resistência contra coloni- zação por bactérias exógenas. É possível reforçar a barreira intestinal com fibras alimentares prebióticas e probióticos que vão melhorar a inte- gridade da barreira intestinal, ao estimu- lar o crescimento de bactérias benéficas na microbiota, atuar na competição por nutrientes, e produzir substâncias antimi- crobianas, estimulando as defesas do hospedeiro. Microbioma e seus Conceitos Luana Romão, MSc 5.DeGrutolla AK, Low D, Mizoguchi A, Mizoguchi E. Current Understanding of Dysbiosis in Disease in Human and Animal Models. Inflamm Bowel Dis. 2016;22(5):1137–1150.DOI: 10.1097/MIB.0000000000000750. 6. Faintuch J. Microbioma, disbiose, probióticos e bacterioterapia. Barueri, SP: Manole, 2017. 7.Gut microbiota for Health. Getting to know your gut microbiota. 2020. Disponível em: https://www.gutmicrobiotaforhealth.com/getting-to-know-your-gut- microbiota/. 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Os carboidratos não digeríveis não são quebrados pelas enzimas, e sim fermentados no cólon intestinal, contribuindo para a qualidade da microbiota, devido à formação de ácidos graxos de cadeia curta (ACGC). São exemplos de carboidratos não digeríveis as fibras dietéticas, como a fibra solúvel do milho, a polidextrose e os frutooligossacarídeos (FOS). Nutrientes e o Microbioma Intestinal Vanessa de Santis, MSc As fibras são nutrientes essenciais à saúde, especialmente quando falamos de saúde intestinal, uma vez que são importantes para a manutenção da microbiota intestinal, formação das fezes e adequado funcionamento do intestino. A sua recomendação de ingestão diária varia de 20 g a 35 g, de acordo com diferentes instituições. Para atingir a recomendação diária de fibras é ne- cessário o consumo de frutas, verduras, legumes, cereais e sementes, além de produtos fortificados com fibras e/ou suplementos. As fibras podem ser classificadas, de acordo com a solubilidade em água, em fibras solúveis e insolúveis. As fibras solúveis têm atração por água, con- tribuem para o controle do açúcar e gordura no sangue, possuem moderado a alto grau de fermentação no cólon, com produção de AGCC. Fibra solúvel do milho, polidextrose, FOS, inulina, pectina, gomas, psyllium e mucilagens são exem- plos dessas fibras. Podem ser natural- mente encontradas nos legumes, olea- ginosas, cereais, raízes, entre outras fontes. Classificação das fibras 10 As fibras insolúveis não dissolvem em água, tornando os movimentos peris- tálticos mais rápidos, e sendo essenciais na constipação. Lignina, celulose, hemi- celulose, amido resistente, são exemplos dessas fibras encontradas nas frutas, verduras e cereais. Uma outra forma de classificar as fibras diz respeito à sua capacidade de estimular a atividade ou aumento do número de bactérias com ação benéfica à microbiota. Essas fibras são chamadas de prebióticas. Além das fibras, outros compostos são também considerados prebióticos, como os ácidos graxos insaturados e os polifenóis. Os prebió- ticos promovem o crescimento de bacté- rias benéficas ao organismo humano, como bifidobactérias e lactobacilos, e são substrato preferencial para o cres- cimento dessas bactérias. Exemplos de fibras prebióticas incluem fibra solúvel de milho (frequentemente encontrada em alimentos com a deno- minação amido de milho resistente ou maltodextrina resistente), FOS e outros oligossacarídeos, inulina e beta-glucano, podendo ser identificados naturalmente em alimentos como alho, aspargo, cebola, chicória, entre outros vegetais, bem como em alimentos fortificados como leites e derivados. Nutrientes e o Microbioma Intestinal Vanessa de Santis, MSc O tipo de alimentação consumida inter- fere na composição e qualidade da microbiota intestinal. O consumo de carboidratos não digeríveis, em particular das fibras prebióticas, é essencial à saúde global do indivíduo, não somente à saúde intestinal. Elas desempenham papel no controle do peso corporal e na resposta insulínica, e favorecem a menor absorção da glicose e gorduras, con- tribuindo para o gerenciamento de en- fermidades como diabetes mellitus, dis- lipidemia e doenças cardiovasculares. Ainda, por fornecer benefícios à mi- crobiota e formação do muco que recobre as células epiteliais intestinais, são elementos importantes para a formação da barreira intestinal contra a entrada de bactérias patogênicas e fortalecimento do sistema imunológico. Fibras prebióticas e saúde humana 11 Image by Bernadette Wurzinger from Pixabay Algumas fibras prebióticas exercem efeitos sobre a absorção e retenção de cálcio, contribuindo para a saúde óssea. Um exemplo é a fibra solúvel do milho, um tipo de fibra que apresenta tolerância superior a outras fibras solúveis, como a inulina, mesmo quando consumida em maiores doses. Por meio das mo- dificações que realiza na composição da microbiota intestinal, como por exemplo o aumento de Bifidobacterium ssp, alta- mente benéficas, e redução de C. histolyticum/perfringens gp, bactérias pa- togênicas, e consequente formação de AGCC, essa fibra prebiótica favorece a absorção de cálcio. Um mecanismo sugerido é que os AGCC reduzem o pH luminal, contribuindo para uma maior solubilização do mineral e sua absorção. Sendo assim, o consumo de fibra prebiótica é importante para uma boa saúde óssea. Nutrientes e o Microbioma Intestinal Vanessa de Santis, MSc A quantidade de proteínas consumidas está diretamente relacionada ao tipo e quantidade de metabólitos produzidos. O consumo excessivo de proteínas gera a formação de metabólitos maléficos ao epitélio intestinal. Por outro lado, o con- sumo abaixo do recomendando, também pode aumentar a quantidade de bactérias patogênicas. Sendo assim, deve-se man- ter equilíbrio na quantidade consumida. O tipo de proteína consumido também tem relação com a qualidade da microbiota intestinal, sendo que a ingestão de proteí- nas vegetais tem se demonstrado bastan- te favorável. O consumo excessivo de gorduras satu- radas e trans aumenta o risco de enfer- midades crônicas como esteatose e doenças cardiovasculares, além de maior inflamação. No que se refere à microbiota intestinal, leva à redução de bactérias relacionadas com a formação do muco no epitélio, promovendo uma menor camada de proteção natural no intestino. Finalmente, pode gerar disbiose relacionada à maior inflamação local e aumentar o risco de doenças crônicas não transmissíveis. Proteínas, gorduras e microbiota intestinal O metabolismo das proteínas está intimamente associado à microbiota intestinal. A proteína dietética é metabolizada por proteases e peptidases no intestino delgado, sendo os produtos não digeríveis fermentados em vários metabólitos de bactérias, como AGCC. 12 1. 2013Aug;57(6):397–405. Available from: https://doi.org/10.1590/S0004-27302013000600001 2. Bisanz JE, Upadhyay V, Turnbaugh JA, Ly K, Turnbaugh PJ. Meta-Analysis Reveals Reproducible Gut Microbiome Alterations in Response to a High-Fat Diet. Cell Host Microbe. 2019 Aug 14;26(2):265-272.e4. doi: 10.1016/j.chom.2019.06.013. Epub 2019 Jul 16. PMID: 31324413;PMCID: PMC6708278. 3. Chandel NS. Carbohydrate Metabolism. Cold Spring Harb Perspect Biol 2021;13:a040568. 4. 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Os nutrientes fornecidos ao nosso orga- nismo também alimentam nossas bacté- rias, portanto diferentes tipos de dietas afetam distintamente o crescimento e a atividade bacteriana no cólon, com potencial benéfico ou prejudicial à saúde. A microbiota intestinal é principalmente modulada pelos hábitos alimentares e de estilo de vida de longo prazo. É importante esclarecer que não existe uma regra que indique qual é a melhor dieta para o microbioma, uma vez que dependerá das características, neces- sidades e preferências de cada indiví- duo. Em geral, uma dieta equilibrada em proteínas, gorduras e fibras alimentares estimula o crescimento de bactérias protetoras e gera metabólitos benéficos à saúde intestinal, como os ácidos graxos de cadeia curta (AGCC). Os AGCC produzidos por esses micro- organismos A Dieta do Microbioma Leila Hashimoto, PhD têm funções de manutenção da integridade da barreira intestinal, controle do metabolismo glicêmico e energético. Por outro lado, uma dieta com alto teor de gorduras e lipídeos e baixo teor de fibras pode promover o crescimento de bactérias relacionadas com enfermidades metabólicas e com a produção de substâncias inflamatórias, o que dese- quilibra o ambiente intestinal. Dentre as dietas mais comumente estudadas, e cujos efeitos na composição de bactérias intestinais podemos explorar, incluem-se a ocidental, a cetogênica, a mediterrânea e as dietas plant-based. Cada uma delas influencia de formas diferentes o microbioma e a constituição da barreira intestinal, impactando a camada de muco, enterócitos e células do sistema imune no intestino de forma distinta. Tipos de dieta e seus efeitos na microbiota intestinal 14 Dieta ocidental A dieta ocidental é caracterizada pela ingestão de alta densidade energética e proporções inadequadas de gorduras e proteínas, quantidades elevadas de carboidratos refinados e baixo consumo de fibras alimentares. Essa combinação favorece o aumento de bactérias malé- ficas e seus metabólitos inflamatórios, como citocinas, lipopolissacarídeos (LPS) e N-óxido-trimetilamina (TMAO). Os AGCC, por exemplo, têm sua produção reduzida, uma vez que há baixa disponibilidade de fibras ali- mentares. Isso faz com que haja alteração do ambiente intestinal, com aumento do pH e das substâncias inflamatórias. O estudo de Jian e colaboradores (2021) avaliou os efeitos da ingestão aumen- tada de gordura saturada, gordura insaturada ou açúcar simples na dieta de indivíduos com excesso de peso, durante três semanas. Esses nutrientes foram consumidos na quantidade corres- pondente a 1.000 kcal adicionais ao dia. Mesmo em um curto período de inter- venção, houve aumento significativo de bactérias inflamatórias, como Proteo- bacteria e Escherichia coli, quando as quantidades de gordura saturada e açúcares simples na dieta foram aumen- tadas. Por outro lado, uma alimentação com maior teor de gordura insaturada levou ao aumento de uma bactéria produtora de AGCC, Roseburia. Além disso, os pesquisadores também obser- varam associação positiva entre os níveis de certas bactérias (Bilophila) no início do estudo e o aumento de gordura hepática, independentemente do tipo de interven- ção. Dieta cetogênica A dieta cetogênica é um tipo de dieta com restrição de carboidratos e aumento de gorduras, levando a um estado de cetose (aumentoda produção de corpos cetônicos pela utilização de gordura e proteína como fonte de energia). Existem diversos protocolos de dieta cetogênica, com diferentes variações na porcentagem de macronutrientes. Os alimentos permitidos são, em geral, carnes, ovos, aves, laticínios, vegetais sem amido, nozes, sementes e abacate. Os alimentos não permitidos geralmente incluem os cereais refinados, aveia, tubérculos, leguminosas e frutas. Para a microbiota intestinal, os achados dos estudos científicos ainda são es- cassos, sendo a maioria desenvolvidos em modelo animal. Podemos destacar, a partir dos resultados desses estudos, a redução da diversidade e da riqueza das bactérias, com aumento, em particular, de Lactobacillus e Akkermansia muciniphila. A Dieta do Microbioma Leila Hashimoto, PhD 15 No estudo publicado por Ma e colaboradores (2018), o objetivo foi identificar se a intervenção da dieta cetogênica alterava o microbioma intestinal e as funções neurovasculares. Camundongos jovens saudáveis rece- beram uma dieta cetogênica, com 75,1% de gordura e muito baixo teor de fibras (3,2% VCT) por 16 semanas. Essa intervenção foi capaz de aumentar de modo significativo a quantidade de bactérias produtoras de AGCC e probióticas (Lactobacillus) e promotoras da renovação de muco no intestino (Akkermansia), assim como de reduzir o número de bactérias produtoras de sulfeto de hidrogênio (Desulfovibrio e Dorea), que é conhecido por induzir danos à barreira intestinal. Wan e colaboradores (2019) inves- tigaram os efeitos na microbiota intestinal e em seus metabólitos de três dietas com diferentes teores de gordura, por meio de um estudo randomizado, controlado, com 217 indivíduos sau- dáveis, durante 6 meses. As dietas diferiram exclusivamente na quantidade de gordura, variando entre 20%, 30% e 40%. A dieta com maior teor de gordura foi associada ao aumento de metabólitos fecais (LPS e ácido araquidônico) e fato- res pró-inflamatórios. Por outro lado, a dieta com menor teor de gordura reduziu os metabólitos p-cresol e indol, preju- diciais ao organismo (p<0,001). Dieta mediterrânea A dieta mediterrânea é objeto de estudo em diversos contextos de saúde e doença, uma vez que tem alta qualidade nutricional e estimula o consumo de vegetais, frutas, legumes, oleaginosas, grãos integrais, laticínios fermentados e azeite de oliva extra virgem. Dessa forma, fornece muitos nutrientes e compostos bioativos. A dieta mediterrânea é prote- tora contra inflamação e doenças crônicas, e evidências emergentes mos- traram que esses efeitos podem ser parcialmente mediados por mudanças favoráveis na microbiota intestinal. No estudo de Zhu e colaboradores (2020), a dieta mediterrânea foi com- parada com uma dieta do tipo “fast food” para avaliar os efeitos na microbiota intestinal e seus metabólitos em homens saudáveis. A dieta fast food continha alto teor de gordura saturada e consumo insuficiente de fibras alimentares (12 g/dia). Já a dieta mediterrânea apre- sentava alto consumo de vegetais, ce- reais integrais e oleaginosas, com inges- A Dieta do Microbioma Leila Hashimoto, PhD 16 No contexto da microbiota intestinal, a dieta plant-based foi capaz de promover aumento de bactérias marcadoras de saúde (Bifidobacterium, Lactobacillus, Ruminococcus, Eubacterium rectale, Roseburia) e redução de bactérias patogênicas (Clostridium perfringens e C. histolyticum), de acordo com estudos clínicos. Um estudo brasileiro (Franco-de- Moraes e colaboradores, 2017) comparou a composição da microbiota intestinal de indivíduos que seguiam dietas onívoras, lacto-ovo-vegetarianas e vegetarianas es- tritas. A dieta onívora apresentou um perfil mais inflamatório em comparação às dietas vegetariana e vegana, com base na concentração de LPS sérico e proteína C- reativa. As dietas vegetarianas, com maior teor de fibras, estimularam o crescimento de bactérias fermentadoras destes carboidratos, como Faecalibacterium, Roseburia e Prevotella, em comparação à dieta onívora. Dieta do microbioma A dieta do microbioma inclui estratégias nutricionais com o objetivo principal de reequilibrar as proporções de bactérias benéficas e prejudiciais da microbiota. Na prática clínica, propõem-se três fases para uma dieta do microbioma. A fase 1 tem por objetivo a recuperação das fun- tão de 60 g de fibra alimentar por dia. Em apenas 4 dias de intervenção, houve aumento de bactérias fermentadoras de fibras (Lachnospiraceae e Butyricicoccus) com a dieta mediterrânea. A dieta mediterrânea foi capaz de aumentar metabólitos benéficos para células neuronais, como ácido láctico-3-indole e ácido propiônico-3-indole. Observou-se, por outro lado, o aumento de bactérias tolerantes à bile (Collinsella, Para- bacteroides e Bilophila wadsworthia) com a dieta fast food. Dieta plant-based Uma dieta em evidência ultimamente é a dieta plant-based, em que há uma restrição de produtos de origem animal. É uma dieta com alto teor de fibras alimentares e outros compostos bioativos, como carotenóides, polifenóis, iso- flavonas, licopeno, fitoestrógenos, que promovem a gliconeogênese intestinal, termogênese, nutrição dos enterócitos, integridade da barreira intestinal e secreção de hormônios sacietógenos (GLP-1 e PYY). Em geral, esta dieta também promove um consumo reduzido de sódio, gordura saturada, amônia, e fenóis, compostos que estão relacionados com a lipogênese, inflamação intestinal e sistêmica, redução da oxidação lipídica e aumento do estoque lipídico. A Dieta do Microbioma Leila Hashimoto, PhD 17 Na fase 2, supõe-se que o intestino e a microbiota estejam mais equilibrados, permitindo maior flexibilidade na dieta. Nesta fase, realiza-se a reintrodução gradual dos alimentos limitados na fase 1, adaptando-a conforme a tolerância do paciente. Essa fase pode durar cerca de 30 dias. Nesta fase, o cardápio pode ter maior flexibilidade, recomendando-se limitar refeições com alto teor de calorias, gorduras, açúcares e sal. Finalmente, na fase 3, considerada uma fase de manutenção, propõe-se uma mudança de hábitos alimentares e de estilo de vida, sem tempo determinado, devendo ser mantida, preferencialmente, por longo prazo. ções do trato gastrointestinal e a qualidade da microbiota, e deve pro- longar-se por aproximadamente 20 dias. Nesta fase, a dieta pode incluir vegetais e frutas frescas, proteínas magras (aves, frutos do mar e peixe) e de vegetais (lentilha, grão de bico, feijões), gorduras boas (azeite de oliva extra virgem, ômega 3, oleaginosas), alimentos prebióticos e probióticos. Fase 1 da dieta do microbioma - Eliminar elementos da dieta que possam causar inflamação e disbiose, e evitar alimentação desequilibrada em macro- nutrientes, pobre em micronutrientes e com excesso de calorias. - Adicionar alimentos para reparar o ambiente intestinal e melhorar a função intestinal como, por exemplo, aqueles das dietas plant-based ou mediterrânea. - Consumir alimentos que ajudem a melhorar a qualidade das bactérias no intestino, incluindo os fermentados (kimchi, kombucha, kefir), gorduras de boa qualidade, frutas vermelhas e roxas, e brássicas. - Repopular o intestino com bactérias benéficas, através da ingestão de alimentos e suplementos contendo prebióticos e probióticos. A Dieta do Microbioma Leila Hashimoto, PhD 18 Image by Renata Tlałka from Pixabay Bibliografia 2. Franco-de-Moraes AC, de Almeida-Pititto B, da Rocha Fernandes G, Gomes EP, da Costa Pereira A, Ferreira SRG. 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Os tipos de dietas se diferen- ciam tanto na composição de nutrientes quanto nos efeitos à microbiota intestinal, e cada dieta possui prós e contras que devem ser considerados na escolha da melhor opção para o paciente, respei- tando as individualidades, preferências e rotina de cada um. Princípios da Dieta do Microbioma Para atingir bons resultados com a dieta do microbioma, consideram-se cinco princípios básicos: 1) Evitar alimentos que possam promover desequilíbrios na microbiota intestinal. 2) Inserir alimentos e nutrientes que promovam a recuperação do intestino e da microbiota. 3) Consumir alimentos com prebióticos. 4) Consumir alimentos com probióticos. 5) Associar hábitos alimentares ade- quados a estilos de vida saudáveis. 19 1. Fan Y, Pedersen O. Gut microbiota in human metabolic health and disease. Nat Rev Microbiol. 2021 Jan;19(1):55-71 capacidade de: (i) interagir com células do hospedeiro; (ii) modificar o ecos- sistema intestinal; (iii) produzir compos- tos antibacterianos; (iv) estimular recep- tores específicos que desencadeiam res- postas locais e periféricas; (v) maximizar a integridade da barreira intestinal para reduzir a passagem de antígenos opor- tunistas à circulação (p. ex., lipopolis- sacarídeo); e (vi) vantagem competitiva com bactérias patogênicas. Alguns probióticos, ainda, atuam mo- dificando o conteúdo de muco que faz parte da barreira física intestinal, e que é crucial para reduzir a interação entre antígenos e receptores epiteliais que deflagram as respostas imunológica e inflamatória. Os probióticos também apresentam proteínas de superfície que podem interagir com receptores ou liberar pequenas substâncias que me- diam a interação com a célula-alvo. O interesse e conhecimento sobre o efeito proveniente da interação entre microorganismos no cólon intestinal são crescentes, visto que os probióticos podem elevar a abundância de algumas bactérias que desempenham um im- portante papel na produção dos ácidos graxos de cadeia curta (AGCC). O efeito dos probióticos depende, em grande parte, da microbiota intestinal residente e também de outros fatores moderadores, como a dieta global e o exercício físico. Os principais probióticos estudados atualmente, e que contam com o maior número de estudos disponíveis são os Lactobacillus e as Bifidobacterium. Estes possuem diferentes cepas que atuam de maneiras diversas. Entretanto, há uma nova geração de probióticos, que inclui microrganismos como Roseburia intestinalis, Faecalibacterium prausnitzii, Eubacterium spp., Bacteroides spp. e Akkermansia muciniphila que merece maior atenção, tendo em vista estudos observacionais demons- trando o potencial papel benéfico destas bactérias. Os efeitos positivos dos probióticos não derivam apenas da mudança que promovem na composição bacteriana intestinal. Outros efeitos se devem à sua Probióticos e seus mecanismos de ação na saúde digestiva e imunidade Marcus Quaresma, PhD 20 Os alimentos lácteos se destacam como principal origem de bactérias que exercem efeito positivo à saúde humana. Bifidobacterium animalis subsp. lactis aumentou a frequência de evacuação, reduziu o tempo de trânsito intestinal e melhorou a consistência das fezes. A suplementação de múltiplas cepas de Lactobacillus e Bifidobacterium também exerce efeitos positivos na saúde intes- tinal, especialmente, diminuindo a fre- quência de fezes tipo 1 e tipo 2 da escala de Bristol. Os probióticos agem, sobretudo, no intestino, favorecendo modificações poten- cialmente positivas. Avaliações subjetivas de sintomas digestivos apresentam re- sultados mais positivos em resposta à suplementação probiótica (B. lactis CNCM 1-2494), embora novos estudos sejam necessários para confirmar estes efeitos. O estudo de Marteau et al. (2019) que interveio com produto lácteo adicionado de Bifidobacterium animalis subsp. lactis CNCM I-2494, Streptococcus salivarius subsp. thermophilus CNCM I-1630, Lactobacillus delbrueckii subsp. bulgaricus CNCM I-1632 e I-1519, e Lactococcus lactis subsp. lactis CNCM I-1631 por 4 semanas mostrou efeitos positivos sobre sintomas digestivos, independentemente do consumo de fibras e nível de atividade física. Entretanto, o estudo apresentava algumas limitações metodológicas. De acordo com o estudo de Rasinkangas et al. (2022), o uso de Bifidobacterium animalis subsp. lactis Bi-07 reduziu sintomas leves de dor abdominal, comparativamente à lactose e placebo. Sintomas moderados de dor abdominal também foram atenuados em comparação ao momento inicial de avaliação, apesar de não ter sido melhor que do grupo que consumiu lactose. Dr Marcus Quaresma, PhD 21 Probióticos e sintomas gastrointestinais Probióticos e sistema imunológico No que se refere ao sistema imunológico, os probióticos podem atuar sobre diferentes células. Por exemplo, podem: · Estimular as células dendríticas para apresentação de antígenos; · Estimular a diferenciação de linfócitos T Naive em Th2 (CNCM-12494), que liberam IL-4, IL-5 e IL-13; · Atenuar a diferenciação de linfócitos T Naive em Th17 (L. acidophilus), que liberam IL-17e IL-22; · Promover a diferenciação de linfócitos T Naive em Treg (L. reuteri, L. acidophilus, L. fermentum, L. Salivarius) que liberam TGF- B e IL-10; · Estimular as células NK, processo mediado por L. rhamnosus HH, L. reuteri DSM, L. casei Shirota, L. acidophilus. Isto posto, os probióticos atuam de maneira ampla para gerenciar vias infla- Probióticos e seus mecanismos de ação na saúde digestiva e imunidade Marcus Quaresma, PhD matórias e antiinflamatórias provenientes de células intestinais que residem no intestino. Cristofori et al. (2021) demonstraram que Lactobacillus plantarum, por exemplo, regula IL- 4 e IL-10 (anti-inflamatórios) e TNF-a e IFN-y (pró-inflamatórios). Lactobacillus plantarum reduziu TNF-a e IFN-y e au-mentou IL-10, sugerindo efeito positivo para regulação da inflamação. Pode-se considerar que, em doenças inflamatórias intestinais, este efeito seja benéfico, porém, são necessários estudos que os avaliem nesta condição. Considerando que citocinas são desfechos substitutos, desfechos mais importantes (infecções oportunistas) também sofrem modificações em resposta à suplementação probiótica. Probióticos reduziram a incidência de infecções de trato respiratório superior e a duração dos episódios. Segundo Coleman et al. (2022), em adultos, risco de experimentar uma ou mais infecções reduziu 9%, tempo com infecção (23%). O efeito na severidade, no entanto, ainda é nebuloso. Bifidobacterium, Lactobacillus ou ambas parecem reduzir a taxa de infecção em 38%, 21% e 18%, respectivamente. A espécie L. casei reduziu em 29% a taxa de risco de infecções do trato respiratório. Alimentos fermentados parecem exibir o maior efeito na redução das infecções (41%). A nova geração de probióticos, especialmen- te, Akkermansia muciniphila ganha destaque, sobretudo por agir de maneira protetora contra potenciais agentes patogênicos. Dr Marcus Quaresma, PhD 22 Bibliografia 1. Botelho PB, Ferreira MVR, Araujo AM, Mendes MM, Nakano EY. Effect of multispecies probiotic on gut microbiota composition in individuals with intestinal constipation: A double-blind, placebo-controlled randomized trial. Nutrition. Oct 2020;78:110890. doi:10.1016/j.nut.2020.110890 2. Brodmann T, Endo A, Gueimonde M, et al. 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Probióticos e seus mecanismos de ação na saúde digestiva e imunidade Marcus Quaresma, PhD A quantidade de bactérias que colonizam o nosso organismo, principalmente na pele e no sistema digestório, atinge números incontáveis. Atualmente se admitem quantidades próximas entre o número de bactérias que nos colonizam, e o número de células somáticas “homo sapiens”. No entanto, o genoma (microbioma) das bactérias é muito maior que o nosso, com capacidade metabólica semelhante ao fígado humano. De onde vêm essas bactérias? Uma boa parte delas já nos coloniza no nascimento, pela passagem do feto no canal vaginal e pela proximidade deste com as porções finais do sistema digestório materno. Esta colonização já funciona como estímulo antigênico para o adequado desen- volvimento anatômico e funcional do sistema imunológico de mucosas, assim como para respostas adaptativas sis- têmicas. A diversidade da microbiota intestinal humana resulta de um processo de co-evolução das comunidades bacte- rianas e do hospedeiro ao longo do tempo, onde ambas as partes se beneficiam uma da outra, determinando uma situação mutual de convivência (mutualismo). O microbioma, em sua definição mais atual, é a interação dos microorganismos (compostos de bactérias, bacteriófagos, fungos, protozoários e vírus), dos elemen- Prebióticos: papel na programação metabólica e imunológica Dr Bruno Barreto, PhD 23 tos genômicos, dos metabólitos e dos produtos resultantes em um nicho ecológico. Vários são os fatores que interferem com o desenvolvimento e composição da mi- crobiota, como por exemplo, a dieta, a localização geográfica e a cultura das populações, o gênero e a idade, além do uso de antibióticos. Embora estes fatores determinem um possível padrão para cada um deles, ainda existe a variabilidade microbiana interindividual, a qual determina um padrão para cada indivíduo, como se fosse uma assinatura microbiana. A partir do momento que temos uma microbiota bem instalada, rica e di- versificada, espera-se que ela possa exercer suas funções, as quais são variadas e extremamente importantes para a homeostasia humana. Neste sentido, destacam-se algumas de suas atividades, tais como: a função de barreira; a ação antibacteriana e antiviral; o papel na função neuromuscular e no eixo intestino-cérebro; além da função na resposta imunológica, onde destaca-se a produção de IgA secretora e a ativação de células T reguladoras. Para manter esta situação de eubiose é fundamental a participação dos “bióticos”, os quais já se faziam conhecidos pelo grupo dos prebióticos, probióticos e simbióticos, aos quais, mais recentemente, foi incorporado o grupo dos posbióticos. Para conhecer um pouco melhor a família dos “bióticos”, iniciando pelo substrato, mais recentemente a definição de pre- biótico foi modificada para: "um substrato, não-digerível, que é utilizado sele- tivamente por microrganismosintestinais, modulando a composição e atividade da microbiota, conferindo benefício à saúde do hospedeiro". Substrato este, que já deve estar presente desde os primeiros meses de vida, para que tenhamos o desenvolvimento adequado da microbiota, aproveitando a janela de oportunidade para a adequada programação imuno- metabólica da criança, que se estabelece nos primeiros mil dias de vida. Neste contexto, os principais prebióticos, para esta faixa etária, são os oligos- sacarídeos do leite humano (HMO’s), os quais já foram descritos em torno de 200 tipos. Quando clivados por enzimas específicas, dão origem aos mono ou dissacarídeos essenciais para a geração de energia, como a lactose, galactose e fucose, os quais por sua vez, sofrem processo de fermentação pela microbiota saudável, gerando substratos ativos (posbióticos), como os ácidos graxos de cadeia curta – AGCC (proprionato, butirato 24 e acetato). Os AGCC são, em grande parte, os responsáveis pelos efeitos fun- cionais, como por exemplo, a ativação de células imunológicas tolerogênicas, como os linfócitos T reguladores. Pensando num cenário mais prático, uma dieta equilibrada, rica em fibras prebióticas durante a gestação, associada ao parto por via vaginal e ao aleitamento materno exclusivo, por um período mínimo de seis meses, pode favorecer o processo de imunotolerância e, assim, diminuir a pos- sibilidade de desequilíbrios imunológicos que culminem com doenças alérgicas ou de auto-imunidade. A esta sequência de eventos, chamamos de Programação Imunológica. No entanto, nem sempre estamos diante do cenário ideal, já que muitas vezes, por vários motivos, fatores influenciadores negativos podem interferir nos períodos pré, peri ou pós-natal. Por exemplo, a impossibilidade do parto vaginal ou a impossibilidade do aleitamento materno exclusivo e prolongado. Daí a importância de utilizarmos fórmulas infantis subs- titutivas ao leite materno, de alta qualidade nutricional e que possa tentar mimetizar, o mais próximo possível, as características do leite materno. Prebióticos: papel na programação metabólica e imunológica Dr Bruno Barreto, PhD Por isso, a utilização de fórmulas que incorporam prebióticos de alta qualidade e com comprovação científica seria funda- mental para nos aproximarmos dos bene- fícios do leite materno. A utilização de galactooligossacarídeos de cadeia curta (scGOS), com frutooligossacarídeos de cadeia longa (lcFOS), em proporção de 9:1, é a combinação prebiótica mais estu- dada e com mais evidências científicas. Neste sentido, estudos que utilizaram fórmulas infantis em lactentes saudáveis com esta combinação prebiótica mos- traram redução de sintomas gastrin- testinais e melhor consistência das fezes, além da prevenção de doenças infec- ciosas respiratórias e gastrintestinais em lactentes institucionalizados. Mais recentemente, um novo elemento prebiótico denominado 2’Fucosil-lactose (2’FL), e similar a um dos HMO’s encontrados no leite materno, foi incor- porado à combinação de scGOS/lcFOS (9:1). Esta nova associação trouxe mais eficácia para a combinação inicial, mos- trando recentes e promissores estudos experimentais de melhor reversão de disbiose; melhor resposta terapêutica con- tra o rotavírus; melhor soroconversão va- cinal para influenzae e melhor desen- volvimento cognitivo. Embora mais estudos que analisem a interação da microbiota intestinal, diver- sificada e inter-variável, com os subs- tratos prebióticos sejam necessários, parece cada vez mais sedimentada a 25 importância do uso dos prebióticos na programação imunometabólica dos lactentes, sobretudo nos primeiros mil dias de vida, período no qual parece existir uma janela de oportunidade para que estas interações se fortaleçam e os resultados funcionais sejam alcançados. 1. Arslanoglu S et al. Early Dietary Intervention with a Mixture of Prebiotic Oligosaccharides Reduces the Incidence of Allergic Manifestations and Infections during the First Two Years of Life, The Journal of Nutrition, Volume 138, Issue 6, June 2008, Pages 1091–1095, https://doi.org/10.1093/jn/138.6.1091 2. Azagra-Boronat I. et al. Supplementation With 2’-FL and scGOS/lcFOS Ameliorates Rotavirus-Induced Diarrhea in Suckling Rats. Front Cell Infect Microbiol. 2018; 23(8): 372. 3. Bedu-Ferrari, C.; Biscarrat, P.; Langella, P.; Cherbuy, C. Prebiotics and the Human Gut Microbiota: From Breakdown Mechanisms to the Impact on Metabolic Health. Nutrients 2022, 14, 2096. https://doi.org/10.3390/nu14102096 4. Blander JP. Et al. Regulation of inflammation by microbiota interactions with the host. Nature Immunol. 2017; 18(8): 851-60 5. Boehm G, Stahl B. Oligosaccharides from milk. J Nutr. 2007;137(3 Suppl 2):847S–849S 6. Bohne A, Lang E, von der Lieth CW.; SWEET - WWW-based rapid 3D construction of oligo- and polysaccharides.; Bioinformatics; 1999; 15(9): 767-8. 7. Bruzzese et al. A formula containing galacto- and fructo-oligosaccharides prevents intestinal and extra-intestinal infections: an observational study. Clinical Nutrition. 2009; 28:156-161 8. Eamonn M. M. Quigley. Prebiotics and Probiotics in Digestive Health. Clinical Gastroenterology and Hepatology. 2019; 17(2): 333-344. 9.Ley, RE.; Peterson, DA.; Gordon, JI. 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Supervisor do Programa de Residência em Pediatria do Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA). Coordenador da Região Norte da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Membro dos Grupos Assessores de Alergias na Infância da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) e de Dermatite Atópica da Sociedade Latino Americana de Alergia, Asma e Imunologia (SLAAI). Nutricionista e Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP). Desde 2014, estuda a relação entre nutrição e o microbioma intestinal e tornou-se nutrigeneticista, tendo trabalhado por 10 anos em um laboratório de pesquisa da USP. Docente de cursos de pós-graduação (PUC-Goiás). Nutricionista formado pelo Centro Universitário São Camilo. Mestre (UNIFESP) e Doutor (FSP-USP) em Ciências. Docente dos cursos de graduaçãoem Nutrição e pós- graduação em Nutrição Esportiva do Centro Universitário São Camilo, onde é também Orientador do Mestrado Profissional de Nutrição. e-book Microbiona Humano e Dieta: O Papel dos Prebióticos e Probióticos na Saúde dos Adultos e Crianças Agradecimento especial Luana Romão, MSc Vanessa de Santis, MSc Nutricionista pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/Universidade de Coimbra (Portugal). Mestre em Nutrição em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo. Docente de cursos de pós-graduação (Universidade Presbiteriana Mackenzie e Estácio São Paulo) e pesquisadora no Instituto PENSI/Hospital Infantil Sabará Nutricionista e Mestre em Ciências Médicas e Biológicas pela UNIFESP. Especialista em Nutrição Clínica, Esportiva e Terapia Nutricional em Terapia Intensiva. Nutricionista clínica e Docente de cursos de pós-graduação (Centro Universitário São Camilo e Senac). 26 Material destinado exclusivamente a Profissionais da Saúde Apoio Realização