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<p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>1. A RAZÃO NA CULTURA ILUMINISTA (História da Filosofia, vol. 4, de Reale e</p><p>An�seri)</p><p>. O Iluminismo é a filosofia hegemônica da Europa no séc. XVIII:</p><p>- Inserindo-se em tradições diversas e não formando um sistema compacto de</p><p>doutrinas, o Iluminismo se configura como um ar�culado movimento filosófi-</p><p>co, pedagógico e polí�co que captura progressivamente as classes cultas e a</p><p>burguesia em ascensão nos diversos países europeus.</p><p>- A caracterís�ca fundamental do movimento iluminista consiste em uma deci-</p><p>dida CONFIANÇA A RAZÃO HUMANA, cujo desenvolvimento é visto como o</p><p>progresso da humanidade, e em um desinibido uso crí�co da razão dirigido:</p><p>-- (a) à libertação em relação aos dogmas metafísicos, aos pre-conceitos</p><p>morais, às superstições religiosas, às relações desumanas entre os homens, às</p><p>tiranias políticas;</p><p>-- b) à defesa do conhecimento científico e técnico e dos inalienáveis direitos</p><p>naturais do homem e do cidadão. Kant dirá que o lema do Iluminismo é:</p><p>“Sapere aude!”</p><p>. A razão dos iluministas é limitada pela experiência:</p><p>- O lluminismo é uma filosofia o�mista que se empenha e trabalha pelo pro-</p><p>gresso e na base deste progresso espiritual, material e polí�co, os iluministas</p><p>põem o uso crí�co e constru�vo da razão.</p><p>- Todo séc. XVIII não entende mais a razão como o território das “verdades</p><p>eternas” e das “essências” (como ocorria nos grandes sistemas meta�sicos dos</p><p>séculos precedentes). A razão dos iluministas é a do empirista Locke, que en-</p><p>contra o seu paradigma metodológico na �sica de Newton; trata-se, portan-</p><p>to, de uma RAZÃO LIMITADA À EXPERIÊNCIA E CONTROLADA PELA EXPERIÊN-</p><p>CIA, que procura as leis do funcionamento dos fenômenos e as coloca em</p><p>prova. E o uso desta razão é um uso eminentemente público.</p><p>. O racionalismo iluminista se opõe ao conhecimento meta�sico:</p><p>- A razão dos iluministas não está, porém, confinada aos fatos de natureza:</p><p>ela não se fecha a nenhum campo de pesquisa, e olha ao mesmo tempo a na-</p><p>tureza e o homem (princípios do conhecimento, comportamentos é�cos,</p><p>estrutura e ins�tuições polí�cas, sistemas filosóficos, fés religiosas).</p><p>- A RAZÃO ILUMINISTA É CRÍTICA ENQUANTO EMPÍRICA, isto é, enquanto</p><p>1ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>ligada indu�vamente à experiência, e se opõe ao conhecimento meta�sico lar-</p><p>gamente dedu�vista e sistemá�co.</p><p>- Em tal contexto, a filosofia não é mais separada dos outros conhecimentos,</p><p>mas torna-se o sopro vivificante para a ciência natural, a história, a ciência do</p><p>direito, a polí�ca etc.; e a originalidade filosófica do pensamento iluminista</p><p>está não tanto nos conteúdos, mas no crivo crí�co desses conteúdos e no uso</p><p>deles feito em vista da melhoria do mundo e do homem.</p><p>. A filosofia do deísmo:</p><p>- O Iluminismo é, no conjunto, um movimento leigo no que se refere aos</p><p>“mitos” e às “supers�ções” das religiões posi�vas, mas sua filosofia é substan-</p><p>cialmente uma filosofia do deísmo, isto é, da única religião natural concebí-</p><p>vel pela razão (lockianamente compreendida).</p><p>- E a razão dos deístas admite:</p><p>-- 1) a existência de Deus;</p><p>-- 2) a criação e o governo do mundo por parte de Deus;</p><p>-- 3) a vida futura em que são pagos o bem e o mal.</p><p>- Trata-se de uma religiosidade racional, natural, leiga, à qual se une uma mo-</p><p>ralidade leiga, baseada sobre os princípios morais comuns a todo o gênero</p><p>humano; é em tal perspec�va, portanto, que a tarefa da razão se torna a de ilu-</p><p>minar as trevas das religiões posi�vas, analisando suas origens históricas e</p><p>seus usos sociais, e pondo às claras toda a sua desumanidade absurda. A ten-</p><p>dência ateia e materialista foi, ao contrário, minoritária e se difundiu no Ilumi-</p><p>nismo francês, principalmente depois de Voltaire.</p><p>. A razão na base das normas jurídicas e das teorias econômicas:</p><p>- O lluminismo põe a razão também como fundamento das normas jurídicas,</p><p>das concepções do Estado e das teorias econômicas.</p><p>- O direito natural significa direito racional e, melhor ainda, não-sobrenatural,</p><p>e as leis jurídicas são entendidas como as relações necessárias e imutáveis que</p><p>derivam da natureza das coisas.</p><p>- Sobre a base das ideais jusnaturalistas dos iluministas foi elaborada a doutri-</p><p>na dos direitos naturais e invioláveis do homem e do cidadão: a liberdade, a</p><p>igualdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.</p><p>- Esses princípios, expressos nas Declarações dos direitos americana (1776) e</p><p>francesa (1789), estão no fundamento das ordens cons�tucionais dos Estados</p><p>2ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>democrá�cos de �po ocidental.</p><p>. Os meios usados para a circulação das ideias iluministas:</p><p>- Em linha geral, as classes populares permaneceram estranhas ao movimen-</p><p>to iluminista, enquanto os iluministas conseguiram difundir as novas ideais</p><p>nas classes intelectuais e entre a burguesia avançada de toda a Europa. Os</p><p>meios usados para acelerar a circulação das ideias iluministas foram:</p><p>-- a) as Academias, em que se conseguiu dar maior espaço às ciências naturais,</p><p>�sicas e matemá�cas, à crí�ca da cultura e dos costumes;</p><p>-- b) a Maçonaria, que, surgindo em Londres em 1717, logo se tornou moda na</p><p>Europa com acentos an�clericais e an�dogmá�cos;</p><p>-- c) os salões, principalmente os parisienses, que permi�ram às mulheres</p><p>inserir-se vivamente na cultura do século;</p><p>-- c) a Enciclopédia francesa, que teve estrepitoso sucesso editorial;</p><p>-- e) o intercâmbio epistolar, muito intenso, principalmente para além dos</p><p>confins nacionais;</p><p>-- f) os ensaios, isto é, escritos breves, densos, em geral vivazes e argutos, pro-</p><p>positalmente polêmicos;</p><p>-- g) os jornais e os periódicos, cunhados à moda dos ensaios e prodigiosa-</p><p>mente mul�plicados nos úl�mos dois decênios do século.</p><p>. A filosofia iluminista conquista o mundo histórico:</p><p>- O iluminismo foi acusado pelos român�cos, por Hegel e Marx de ser a filoso-</p><p>fia de uma razão abstrata e anti-histórica.</p><p>- Na realidade, como mostram em nosso século W. Dilthey, E. Cassirer e F.</p><p>Meinecke, foi justamente a filosofia iluminista que conquistou o mundo histó-</p><p>rico do qual se vangloriará, com toda conquista jus�ça, o roman�smo. Com o</p><p>lluminismo, a história universal chegou pela primeira vez a uma conexão de</p><p>todos os eventos histórico sobre a base da mesma consideração empírica.</p><p>. Alguns nomes importantes do Iluminismo:</p><p>- Iluminismo na França (e a “ideologia da razão”): 1. Enciclopédia; 2. D’Alem-</p><p>bert: a filosofia como ciência dos fatos e o deísmo; 3. Diderot: do deísmo ao</p><p>materialismo; 4. Condillac: sensismo; 5. La Me�rie, Helvé�us e D’Holbach: o</p><p>materialismo iluminista; 6. Voltaire: deísmo, crí�ca ao o�mismo e a batalha</p><p>pela tolerância; 7. Montesquieu: o espírito das leis, as formas de governo e a</p><p>3ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>teorização da divisão dos poderes;</p><p>- Iluminismo na Inglaterra (e a “sociologia das virtudes”): 1. a controvérsia</p><p>sobre o deísmo e a religião revelada: Toland e o mistério como objeto de pes-</p><p>quisa; Clarke e a revelação explícita às leis morais; Collins e o livre pensamento</p><p>crí�co da fé religiosa; Tindal e as religiões posi�vas como contrafação da natu-</p><p>ral; Josef Butler e a razão impotente diante da fé; 2. A reflexão sobre a moral:</p><p>Anthony Ashley Cooper (Conde de Sha�esbury) e Francis Hutcheson; 3. Man-</p><p>deville e a fábula das abelhas; 4. Reid, Stewart e a escola escocesa do senso</p><p>comum;</p><p>- Iluminismo na Alemanha (e o “sapere aude”): 1. pré-iluminismo: Ehrenfried</p><p>Walter von Tschirnhaus, Samuel Pufendorf e Chris�an Thomasius; 2. Pie�s-</p><p>mo: Philipp Jacob Spener; 3. Chris�an Wolff: a figura mais emblemá�ca do ilu-</p><p>minismo alemão: Seus discípulos são: Mar�n Knutzen, Franz Albert Schultz,</p><p>Adolph Hoffmann, Chris�an Crusius, Johann Lambert</p><p>e Johann Tetens; 4.</p><p>Baumgarten: colocou as bases filosóficas da esté�ca; 5. Reimarus e Mensels-</p><p>sohn: debate sobre a religião; 6. Go�hold Ephraim Lessing: arte, teatro e reli-</p><p>gião;</p><p>- Iluminismo na Itália: 1. pré-iluminismo: Giannone e a libertação em relação</p><p>ao catolicismo; Mauratori e a necessidade da religião; 2. iluminismo lombar-</p><p>do: Pietro Verri e Alessandro Verri; Cesare Beccaria e a crí�ca à tortura e à</p><p>pena de morte; segunda geração dos iluministas lombardos: Paolo Frisi, Gian</p><p>Rinaldo Carli, Tiago Pelizzari, Benvenuto Robbio, Giuseppe Garoni, Luigi</p><p>Torri, Melchior Gioia e Francisco Soave; 3. Iluminismo napolitano: Antonio</p><p>Genovesi, Ferdinando Galiani e Gaetano Filangieri.</p><p>2. GÊNESE E CARACTERÍSTICAS DO ROMANTISMO (História da Filosofia, vol.</p><p>5, de Reale e An�seri; Curso de Filosofia, vol. 3, de Mondin; As raízes do</p><p>romantismo, de Isaiah Berlin)</p><p>. Sturm und Drang (tempestade e ímpeto):</p><p>- Movimento literário român�co alemão, que levou gradualmente à supera-</p><p>ção do iluminismo e afirmação do roman�smo, aproximadamente de 1770 a</p><p>1780.</p><p>- Caracterís�cas: natureza é força onipotente e criadora de vida; gênio é força</p><p>originária; panteísmo; sentimento pátrio; dúvida ao racionalismo puro; predi-</p><p>leção pelos sentimentos fortes e paixões; individualismo, sentimentalismo,</p><p>4ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>culto pela natureza etc.</p><p>- Nomes: Goethe, Schiller, Jacobi e Herder.</p><p>. Os três princípios do Roman�smo:</p><p>- Movimento espiritual que envolveu a poesia, a filosofia, as artes figura�vas</p><p>e a música; desenvolveu-se na Europa entre o fim do séc. XVIII e a primeira</p><p>metade do séc. XIX; a par�r da Inglaterra, ele se expandiu em toda a Europa,</p><p>na França, na Itália, na Espanha, mas sua manifestação paradigmá�ca foi na</p><p>Alemanha, entre o séc. XVIII e XIX.</p><p>- Nomes: Schlegel, Novalis, Schleiermacher, Hölderin, Schiller, Goethe,</p><p>Hamann, Jacobi, Herder e Humboldt.</p><p>- Seus 3 princípios são:</p><p>-- 1) natureza superior à cultura: o reino da natureza é o maior e mais autên�-</p><p>co do que o da cultura. Ele transborda de esplendor e brilho, enquanto o da</p><p>cultura é cheio de misérias e iniquidades. O reino da natureza é tranquilo,</p><p>sereno, imperturbável, enquanto o da cultura é inquieto, angus�ado, acossa-</p><p>do pela exigência de progresso; o reino da natureza é sempre inocente, repou-</p><p>sante, restaurador; o da cultura é sempre sujeito ao erro e à dor. Em decorrên-</p><p>cia deste princípio, os român�cos subs�tuem a concepção mecanicista da na-</p><p>tureza, própria do iluminismo, pela imagem de um universo animado por uma</p><p>substância viva, que se desdobra em múl�plas formas naturais de inesgotável</p><p>poder cria�vo;</p><p>-- 2) paixão, sen�mento e fantasia percebem dimensões da realidade que</p><p>escapam à razão: o sen�mento e a fantasia estão em condições de perceber</p><p>dimensões (religiosas, morais e esté�cas) da realidade que escapam à razão.</p><p>Além disso, o sen�mento é de capital importância por ser mola que leva o</p><p>homem a pra�car as ações mais heroicas e a tomar as a�tudes mais genero-</p><p>sas;</p><p>-- 3) história: o indivíduo não é uma ilha nem um satélite vagando sozinho pelo</p><p>mundo, mas é parte de um grande organismo (a nação, o povo, a pátria), e a</p><p>sua ambição maior deve ser a de contribuir para a realização dos des�nos de</p><p>sua pátria. Cada nação, cada povo tem uma história própria, um des�no pró-</p><p>prio. Deste princípio nasce o interesse dos român�cos pelo passado. Em pri-</p><p>meiro lugar, pelo mundo clássico como realização máxima do ideal do homem,</p><p>ideal que consiste na formação da alma bela, segundo a expressão cara a Schil-</p><p>ler. O seu significado é este: a alma, forjada pela lei moral, impregnou de si</p><p>5ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>mesma o fundo sensível de nossa individualidade a tal ponto que age nela sem</p><p>ser percebida como constrição, como se se tratasse de uma disposição natural.</p><p>O interesse dos român�cos se volta, em segundo lugar, para o mundo medie-</p><p>val, para a época na qual, por mérito de alguns grandes espíritos, dispostos a</p><p>pagar qualquer preço pela conquista da liberdade, começaram a diferençar os</p><p>povos e a formar as nações.</p><p>- Estes três princípios dão a chave para a compreensão do espírito de toda a</p><p>literatura român�ca, a qual é sempre e, principalmente, EXALTAÇÃO DA NATU-</p><p>REZA, DAS PAIXÕES E DA HISTÓRIA.</p><p>3. VOLTAIRE E A TOLERÂNCIA</p><p>3.1 O DEUS DE VOLTAIRE</p><p>. Quem foi Voltaire?</p><p>- François-Marie Arouet (conhecido sob o pseudônimo de Voltaire) nasceu em</p><p>Paris, úl�mo dos cinco filhos de um rico notório, em 1694. De família rica bur-</p><p>guesa, Voltaire é o maior propagador do Iluminismo na França. Hábil escritor,</p><p>denunciava constantemente a intolerância religiosa, o clero e a prepotência</p><p>dos poderosos, sendo muito vezes perseguido, preso e exilado. Mas sempre</p><p>comba�vo.</p><p>- Em 1704, tornou-se aluno de um pres�giado colégio man�do pelos jesuítas.</p><p>Aí, deu provas de vivaz precocidade. Tendo recebido uma herança, deixou o</p><p>colégio e passou a frequentar o círculo dos jovens “livres-pensadores” e ini-</p><p>ciou seus estudos de direito. Envolto em desavenças por causa de seus escri-</p><p>tos, Voltaire ficou preso mais de uma vez na Bas�lha. Saindo da prisão, par�u</p><p>em exilio para a Inglaterra, onde permaneceu por três anos. Na Inglaterra, foi</p><p>introduzido nos círculos da alta cultura inglesa. Estudou as ins�tuições polí�-</p><p>cas inglesas e aprofundou o pensamento de Locke e de Newton.</p><p>- O grande resultado de sua estadia inglesa são as Cartas filosóficas sobre os</p><p>ingleses, publicadas pela primeira vez em inglês em 1733, e depois em França,</p><p>em 1734 (mas impressas na Holanda e distribuídas clandes�namente na</p><p>França). Nessas Cartas, Voltaire contrapõe as liberdades inglesas ao absolu�s-</p><p>mo polí�co francês, expõe os princípios da filosofia empirista de Bacon, Locke</p><p>e Newton e contrapõe a ciência de Newton a de Descartes. Voltaire não nega</p><p>os méritos matemá�cos de Descartes, mas sustenta que ele “fez uma filosofia</p><p>6ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>como se faz um bom romance: tudo parecia verossímil e nada era verdadeiro”.</p><p>- Voltaire retornou à França em 1729. Em 1734, são publicadas as Cartas filosó-</p><p>ficas sobre os ingleses. O Parlamento as condenou e o livro foi queimado no</p><p>pá�o da Cúria Parlamentar. Novamente, Voltaire fugiu de Paris. Reconciliado</p><p>com a Corte, Voltaire foi nomeado historiógrafo da França pelo rei, e em 15 de</p><p>abril de 1746 foi eleito membro da Academia. Em 1749, Voltaire par�u para</p><p>Berlim, onde Frederico 1º da Prússia lhe havia oferecido um alto posto em seu</p><p>governo. Recebido com grandes honras, Voltaire terminou, depois de três</p><p>anos, o período prussiano com uma prisão. Em 1756, publicou o Poema sobre</p><p>o desastre de Lisboa. Nesse meio tempo, colaborou com a Enciclopédia. Em</p><p>1762, foi condenado injustamente o comerciante protestante Jean Calas, acu-</p><p>sado, juntamente com sua família, de ter assassinado um filho que pretende-</p><p>ria se converter ao catolicismo.</p><p>- Voltaire escreveu então o Tratado sobre a tolerância, no qual denuncia im-</p><p>piedosamente e com nobre paixão humana os erros judiciários, o fana�smo, o</p><p>dogma�smo e a intolerância religiosa. O Dicionário filosófico é de 1764; a Filo-</p><p>sofia da história, publicada na Holanda, é de 1765; e o Comentário sobre o</p><p>livro dos delitos e das penas de Beccaria (cujo ensaio havia aparecido dois</p><p>anos antes, em 1764). Ele é um dos grandes defensores da liberdade de</p><p>crença. A biógrafa de Voltaire resumiu as ideias do pensador sobre a liberdade</p><p>de expressão em uma sentença: “Posso não concordar com nenhuma palavra</p><p>que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-la”. Concordava</p><p>com Locke sobre a necessidade de limitações ao poder real, assim como o fato</p><p>dos homens serem dotados de direitos naturais que não podiam ser violados</p><p>pelo governo.</p><p>- Não era</p><p>um democrá�co, pois acreditava que o povão não �nha capacidade</p><p>para par�cipar da polí�ca. Era defensor de uma monarquia esclarecida que go-</p><p>vernasse de acordo com a razão. Trocava cartas com Frederico II da Prússia e a</p><p>imperatriz Catarina da Rússia, aconselhando-os a tomar decisões racionais</p><p>que levassem ao progresso de seus países, como em inves�r em educação.</p><p>Embora já es�vesse em idade avançada, a a�vidade de Voltaire não cessou.</p><p>Após um período de produção intelectual intenso, Voltaire volta a Paris, para a</p><p>apresentação de sua úl�ma peça (uma comédia), Irene. Durante a viagem foi</p><p>aclamado por imensas mul�dões, aos gritos de “Viva Voltaire!” Algumas</p><p>semanas mais tarde, em 30 de maio de 1778, Voltaire morreu.</p><p>7ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>. O Deus de Voltaire:</p><p>- Há dicionários segundo os quais o voltairianismo define-se como a�tude de</p><p>incredulidade irônica em relação às religiões. Todavia, para Voltaire, Deus</p><p>existe ou não existe? Pois bem, na opinião de Voltaire não há qualquer dúvida</p><p>de que Deus existe.</p><p>- Para ele, como para Newton, Deus é o grande engenheiro ou mecânico que</p><p>idealizou, criou e regulou o sistema do mundo.</p><p>- E Deus, na opinião de Voltaire, existe porque existe a ordem do mundo. Em</p><p>suma, a existência de Deus é atestada pelas “simples e sublimes leis em virtu-</p><p>de das quais os mundos celestes correm no abismo dos espaços”.</p><p>- No Tratado de metafísica, Voltaire escreve que “depois de sermos tão arras-</p><p>tados de dúvida em dúvida, de conclusão em conclusão, [...] podemos consi-</p><p>derar esta proposição: Deus existe, como a coisa mais verossímil que os</p><p>homens podem pensar [...] e a proposição contrária como uma das mais ab-</p><p>surdas”.</p><p>- Deus existe. Mas também existe o mal. Como conciliar a presença maciça do</p><p>mal com a existência de Deus? A resposta de Voltaire é que Deus criou a</p><p>ordem do universo �sico, mas que a história é uma questão dos homens.</p><p>- E esse é o núcleo doutrinário do deísmo. O deísta é alguém que sabe que</p><p>Deus existe. VOLTAIRE, PORTANTO, É DEÍSTA. E justamente em nome do</p><p>deísmo ele rejeita o ateísmo. Para o deísta, a existência de Deus não é ar�go</p><p>de fé, e sim resultado da razão.</p><p>- A existência de Deus, portanto, é um dado de razão. A fé, ao contrário, é</p><p>apenas supers�ção. Por isso, com suas crenças, seus ritos e liturgias, as religi-</p><p>ões posi�vas são quase completamente acúmulos de supers�ções. Não é de</p><p>admirar que uma seita considere supers�ciosa outra seita e todas as outras</p><p>religiões. Depois de fazer longas relações de supers�ções, Voltaire conclui:</p><p>“Menos supers�ções, menos fana�smo; menos fana�smo, menos desventu-</p><p>ras”.</p><p>- Segundo Voltaire, negar o mal é absurdo. O mal existe: os horrores da mal-</p><p>dade humana e as penas das catástrofes naturais não são invenções dos</p><p>poetas. São fatos nus e crus que se chocam com força decisiva contra o o�mis-</p><p>mo dos filósofos, contra a ideia do “melhor dos mundos possíveis”.</p><p>- Já no Poema sobre o desastre de Lisboa, Voltaire perguntava-se o porquê do</p><p>sofrimento inocente, a razão da “desordem eterna” e do “caos de desventu-</p><p>ras” que nos cabe ver neste “melhor dos mundos possíveis”. E dizia que se é</p><p>8ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>verdade que “tudo um dia ficará bem” cons�tui a nossa esperança, entretanto</p><p>é ilusão sustentar que “tudo está bem hoje em dia”.</p><p>3.2 CÂNDIDO OU O OTIMISMO DE VOLTAIRE</p><p>- É com Cândido ou o otimismo, verdadeira obra-prima da literatura e da filoso-</p><p>fia iluminista, que Voltaire procura despedaçar aquela filosofia o�mista que</p><p>trata de jus�ficar tudo, proibindo assim compreender alguma coisa.</p><p>- O Cândido é um relato tragicômico. A tragédia está no mal, nas guerras, nas</p><p>opressões, na intolerância, na supers�ção cega, nas doenças, nas arbitrarieda-</p><p>des, na estupidez, nas roubalheiras e nas catástrofes naturais (como o terre-</p><p>moto de Lisboa) com que Cândido e seu mestre Pangloss (contrafigura de Leib-</p><p>niz) se defrontam. E a comédia está nas jus�ficações insensatas que Pangloss</p><p>e Cândido, seu aluno, procuram dar às desventuras humanas.</p><p>- Que �po de mestre é Pangloss? “Pangloss ensinava a metafisico-teológico-</p><p>-cosmológico-idiotologia. Demonstrava admiravelmente que não há efeitos</p><p>sem causas e que, neste melhor dos mundos possíveis, o castelo do senhor</p><p>barão era o mais belo dos castelos e que sua senhora era a melhor baronesa</p><p>possível. Dizia: Está provado que as coisas não podem ser de outro modo: com</p><p>efeito, como tudo é feito para um fim, tudo existe necessariamente para o</p><p>melhor fim. Observai que os narizes são feitos para que neles repousem os</p><p>óculos e, com efeito, nós temos óculos; notai que as pernas são evidentemente</p><p>conformadas para vestirem calças e, com efeito, nós temos calças. Da mesma</p><p>forma, as pedras foram criadas para serem lapidadas e delas serem feitos cas-</p><p>telos e, com efeito, meu senhor tem um belíssimo castelo; o mais poderoso</p><p>barão da província deve ser o melhor alojado. E, como os porcos foram criados</p><p>para serem comidos, nós comemos porco o ano inteiro. Consequentemente,</p><p>aqueles que afirmaram que tudo vai bem disseram uma asneira: é preciso</p><p>dizer que tudo vai da melhor maneira possível”.</p><p>- E, de modo verdadeiramente eficaz, Voltaire, de forma elíp�ca, elabora um</p><p>conto que, com ironia levada aos extremos limites, mostra como o contrário é</p><p>em larga medida verdadeiro. O mundo “como vai” é muito frequentemente a</p><p>an�tese de como “deveria ir” segundo o o�mismo.</p><p>- E o que acontece aos protagonistas e o modo em que o interpretam resultam</p><p>na prova irrefutável, bem orquestrada com vários jogos narra�vos, parodias</p><p>pungentes e sá�ras sarcás�cas. Mas Voltaire não cri�ca apenas a interpreta-</p><p>9ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>ção abstrata deste nosso mundo como “o melhor dos mundos possíveis”,</p><p>mas, ao contrário, cri�ca em contraponto todas as maldades que caracteri-</p><p>zam o mundo como efe�vamente vai.</p><p>- Mas o que se pode fazer então, para sair dos males do mundo? Voltaire o diz</p><p>como conclusão do relato com duas afirmações significa�vas: “trabalhemos</p><p>sem discu�r, pois é o único modo de tornar suportável a vida”; e sobretudo: “é</p><p>preciso cul�var nossa horta”.</p><p>- Esse “cul�var nossa horta” não é fuga dos compromissos da vida, mas o</p><p>modo mais digno para vivê-la e para mudar a realidade naquilo que nos é</p><p>possível.</p><p>- Nem tudo é mal e nem tudo é bem. O mundo, porém, está cheio de proble-</p><p>mas. Cabe a cada um de nós não fugir dos nossos problemas, e sim enfrentá-</p><p>-los, fazendo aquilo que for possível para resolvê-los.</p><p>- Nosso mundo não é o pior dos mundos possíveis, mas também não é o</p><p>melhor. “É preciso cul�var nossa horta”, isto é, precisamos enfrentar os</p><p>nossos problemas, para que este mundo possa melhorar gradualmente ou,</p><p>pelo menos, não se torne pior.</p><p>- Julgando o mundo e a vida, Leibniz afirma que vivemos no “melhor dos</p><p>mundos possíveis”. Já Pascal diz que a infelicidade e a dor cons�tuem a essên-</p><p>cia da natureza humana, sendo que a condição do homem é a inconstância, o</p><p>tédio e a inquietação. Ao falar da existência humana, Pascal aborda dois con-</p><p>ceitos: 1) Miséria: não é a baixeza de condição, mas o traço caracterís�co em</p><p>que nos instala nossa finitude; 2) Grandeza: não é o poder social, mas a digni-</p><p>dade. O par miséria/grandeza exprime nossa ambivalência. Voltaire, na obra</p><p>Cândido narra a história do jovem Cândido, educado na doutrina do tudo vai</p><p>da melhor forma, pregada pelo seu tutor Pangloss (ni�damente uma paródia</p><p>de Leibniz). Cândido representa o incurável o�mista, capaz de sentenciar,</p><p>diante das piores desgraças, que não poderia ser diferente, porque vivemos no</p><p>melhor dos mundos possíveis. Mas a obra de Voltaire retrata uma abrupta</p><p>interrupção deste es�lo de vida quando Cândido se desilude ao testemunhar</p><p>e experimentar dificuldades.</p><p>Voltaire conclui sua obra — se não rejeitando o</p><p>o�mismo — ao menos subs�tuindo o mantra leibniziano de Pangloss, “tudo</p><p>vai pelo melhor no melhor dos mundos possíveis”, por um preceito enigmá�-</p><p>co: “devemos cul�var nosso jardim.”</p><p>3.3 A TOLERÂNCIA EM VOLTAIRE</p><p>10ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>- E exatamente para que este mundo se tornasse mais civilizado e a vida mais</p><p>suportável, Voltaire travou durante toda a sua vida a batalha pela tolerância.</p><p>Para ele, a tolerância encontra seu fundamento teórico no fato de que, con-</p><p>forme demonstraram homens como Locke, apenas com as nossas próprias</p><p>forças nós não podemos saber nada dos segredos do Criador.</p><p>- Não sabemos quem é Deus, nem o que é a alma e muitas outras coisas. Mas</p><p>há quem se arrogue o direito divino da onisciência – e daí a intolerância. No</p><p>verbete “tolerância”, do Dicionário filosófico, podemos ler: “O que é a tolerân-</p><p>cia? É o apanágio da humanidade. Nós todos estamos prenhes de fraqueza e</p><p>de erros: perdoemo-nos reciprocamente nossas bobagens, essa é a primeira</p><p>lei da natureza”.</p><p>- Nosso conhecimento é limitado e nós todos estamos sujeitos ao erro, nisso</p><p>reside a razão da tolerância recíproca: “Em todas as outras ciências nós esta-</p><p>mos sujeitos ao erro. Qual teólogo, tomista ou escotista, ousaria então susten-</p><p>tar seriamente que está absolutamente seguro de sua posição?” No entanto,</p><p>as religiões estão armadas umas contra as outras e, no interior das religiões, as</p><p>seitas geralmente são terríveis no combate reciproco. A intolerância se entre-</p><p>laça com a �rania. E “o tirano é aquele soberano que não conhece outras leis</p><p>além de seus caprichos, que se apropria dos haveres de seus súditos, e depois</p><p>os recruta para que tomem os bens dos vizinhos”. Mas, voltando à intolerância</p><p>mais especificamente religiosa, o que Voltaire sustenta é que a Igreja cristã</p><p>quase sempre esteve estraçalhada pelas seitas. Pois bem, afirma Voltaire:</p><p>“uma tão horrível discórdia, que dura há tantos séculos, é uma claríssima lição</p><p>de que devemos perdoar uns aos outros nossos erros: a discórdia é a grande</p><p>peste do gênero humano e a tolerância é o seu único remédio”.</p><p>- Na obra Tratado sobre a tolerância, Voltaire relata a história de Jean Calas.</p><p>Jean Calas e sua esposa eram protestantes. A França então era um país predo-</p><p>minantemente católico; o catolicismo era a religião de Estado. Embora a dura</p><p>repressão ao protestan�smo iniciada pelo rei Luís XIV �vesse retrocedido em</p><p>larga escala, os protestantes eram, na melhor das hipóteses, tolerados. Louis,</p><p>um dos filhos de Calas, converteu-se ao catolicismo em 1756. Entre 13 e 14 de</p><p>outubro de 1761, outro dos filhos de Calas, Marc-Antoine, foi encontrado</p><p>morto no andar térreo da residência da família. Segundo rumores correntes,</p><p>Jean Calas assassinara o próprio filho porque este também pretendia conver-</p><p>ter-se ao catolicismo. No interrogatório, a família inicialmente fingiu que Mar-</p><p>c-Antoine havia sido morto por um ladrão. Depois, declararam que haviam</p><p>11ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>encontrado Marc-Antoine morto, enforcado. Visto que o suicídio era conside-</p><p>rado um crime abominável ao extremo e o corpo dos suicidas era impuro, eles</p><p>�nham arranjado as coisas de tal modo que o suicídio parecesse um assassina-</p><p>to.</p><p>- Voltaire, avisado sobre o caso, iniciou uma campanha para �rar Calas da</p><p>prisão, depois de arrefecida a suspeita inicial de que o réu fosse um faná�co</p><p>an�católico. A inicia�va foi infru�fera: em 9 de março de 1762, o parlement</p><p>(corte de apelação) de Toulouse sentenciou Jean Calas à morte na roda. Em 10</p><p>de março ele foi supliciado, clamando sua inocência até o fim. Jean Calas foi</p><p>condenado pelo tribunal em 9 de março de 1762 a ser quebrado vivo, depois</p><p>de estrangulado e a�rado numa fogueira ardente. Jean Calas foi condenado a</p><p>uma morte atroz com base numa mera verossimilhança. Os juízes não obtêm</p><p>a confissão de seu crime, o que levou o condenado, no dia 10 de março. Sub-</p><p>me�do à execução, teve seus membros es�cados por talhas, depois fizeram-</p><p>-no ingerir dez moringas de água. Jean Calas permanece protestando sua ino-</p><p>cência até o fim. Em 9 de março de 1765, descobriu-se que Jean Calas não era</p><p>culpado. De fato nesta data, ele foi declarado inocente, de forma póstuma.</p><p>Este clamoroso caso de preconceito contra os huguenotes tornou-se num dos</p><p>mais célebres processos do mundo.</p><p>4. MONTESQUIEU E OS TRÊS PODERES</p><p>4.1 LEI E SEPARAÇÃO DOS PODERES EM MONTESQUIEU</p><p>. Quem foi Montesquieu?</p><p>- Charles Louis de Secondat (barão de Montesquieu) nasceu em Bordeaux no</p><p>ano de 1689. Montesquieu (1689-1755) era um nobre que desde muito cedo</p><p>recebeu formação iluminista, tornando-se um crí�co severo das monarquias</p><p>absolu�stas e do clero. Tendo realizado seus estudos jurídicos inicialmente em</p><p>Bordeaux e depois em Paris, foi conselheiro (1714) e, posteriormente, em</p><p>1716, presidente de seção do Parlamento de Bordeaux (antes da Revolução, os</p><p>parlamentos franceses eram órgãos judiciários). Realizou viagens à Itália,</p><p>Suíça, Alemanha, Holanda e Inglaterra.</p><p>- Neste úl�mo país, ficou mais de um ano (1729-1731) e, estudando a vida po-</p><p>lí�ca inglesa, concebeu aquela opinião elevada sobre as ins�tuições polí�cas</p><p>dos ingleses, que encontraremos em sua obra maior, O espirito das leis. Ele é</p><p>12ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>fã de John Locke e em Londres estuda o funcionamento da monarquia cons�-</p><p>tucional parlamentarista, que é o modelo de governo que ele defende,</p><p>sendo a favor de um liberalismo aristocrá�co e não da democracia.</p><p>- Voltando à França em 1731, viveu trabalhando em suas obras até sua morte,</p><p>ocorrida em 1755. Montesquieu escreveu sobre diversos assuntos, tanto de</p><p>natureza literária como cien�fica, embora seu maior interesse, o da ciência po-</p><p>lí�ca, já se manifestasse em algumas de suas Cartas persas, publicadas anoni-</p><p>mamente em 1721. Somente em 1748, depois de vinte anos de trabalho, pu-</p><p>blicou O espírito das leis, onde ele analisa o comportamento polí�co dos dife-</p><p>rentes �pos de sociedades apresentadas pela história e suas relações com o</p><p>poder. A par�r daí ele traça um panorama geral da natureza, do espírito, das</p><p>leis.</p><p>. Sobre leis e separação dos poderes:</p><p>- Ele não está interessado na discussão da legi�midade dos governos, como</p><p>Hobbes e Locke, o que ele quer entender é o funcionamento dos governos e</p><p>como eles se mantêm.</p><p>- E para começar a discussão, contrapondo ao conceito medieval de Lei como</p><p>fruto da vontade divina, ele apresenta uma nova concepção de Lei influencia-</p><p>do pela �sica newtoniana, com o intuito claro de tratar de polí�ca como uma</p><p>área totalmente independente da religião.</p><p>- Para ele, Lei é a relação necessária que deriva da natureza das coisas. Subs�-</p><p>tuindo o an�go conceito religioso da lei-mandamento pela categoria moderna</p><p>da lei cien�fica (relação constante entre fenômenos) para pensar as ins�tui-</p><p>ções humanas, Montesquieu revoluciona a abordagem da polí�ca e da histó-</p><p>ria. Sendo, como todas as leis, “relações necessárias que derivam da natureza</p><p>das coisas”, as leis posi�vas se tornam susce�veis de uma explicação determi-</p><p>nista.</p><p>- Com essa concepção ele quer mostrar que apesar da variedade de costumes</p><p>das diferentes sociedades que funcionam por regimes polí�cos dis�ntos, po-</p><p>demos encontrar uma uniformidade/universalidade (como na �sica) no fun-</p><p>cionamento (movimento) dos governos (massa/matéria/corpos).</p><p>- Dessa análise do funcionamento das diversas FORMAS DE GOVERNO (MO-</p><p>NARQUIA, REPÚBLICA, DESPOTISMO), ele chega à conclusão de que A LIBER-</p><p>DADE (O DIREITO DE FAZER TUDO AQUILO QUE A LEI PERMITE) SÓ PODE EXIS-</p><p>TIR VERDADEIRAMENTE QUANDO HÁ A SEPARAÇÃO (BEM DEFINIDA),</p><p>13ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva</p><p>- jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>HARMONIA E INDEPENDÊNCIA ENTRE OS PODERES EXECUTIVO, LEGISLATIVO E</p><p>JUDICIÁRIO.</p><p>- O princípio da separação dos poderes: a liberdade polí�ca (é a liberdade</p><p>segundo as leis do cidadão, que deve ser dis�nguida da independência própria</p><p>ao estado de natureza, onde não há governo nem lei) não pode exis�r, a não</p><p>ser nos regimes “moderados” que são a república e a monarquia, na medida</p><p>em que ela supõe leis, ausentes do regime despó�co. Mas não basta que um</p><p>Estado seja moderado para haver liberdade nele: sua cons�tuição, que organi-</p><p>za as três instâncias do Estado (os poderes legisla�vo, execu�vo e judiciário),</p><p>deve também prevenir o abuso de poder. Se está na natureza do poder não</p><p>conter em si mesmo seus próprios limites, é preciso agir de tal forma que “o</p><p>poder embargue o poder”: distribuindo os três poderes em mãos diferentes</p><p>(princípio da separação dos poderes), cada um, controlado pelos dois outros,</p><p>se mantém em seu lugar.</p><p>- Montesquieu teve uma confiança bastante grande nas ciências naturais e seu</p><p>intento foi o de examinar os acontecimentos históricos e sociais com o método</p><p>das ciências naturais. A análise empírica dos fatos sociais, que já se manifesta-</p><p>ra nas Cartas persas, também é �pica de O espirito das leis, que em muitos</p><p>aspectos é sua obra prima.</p><p>- Escreve Montesquieu: “Muitas coisas governam os homens: os climas, as reli-</p><p>giões, as leis, as máximas de governo, os exemplos das coisas passadas, os cos-</p><p>tumes, os usos, e disso tudo resulta um espirito geral”. Por espírito das leis,</p><p>portanto, devem-se entender as relações que caracterizam um conjunto de</p><p>leis posi�vas e históricas que regulam as relações humanas nas várias socie-</p><p>dades.</p><p>- “A lei, em geral, é a razão humana, enquanto governa todos os povos da</p><p>terra. As leis políticas e civis de cada nação nada mais devem ser do que os</p><p>casos particulares aos quais se aplica tal razão humana. Elas devem se adaptar</p><p>tão bem ao povo para o qual foram feitas, que somente em casos raríssimos as</p><p>leis de uma nação poderiam convir a uma outra [...]. Elas devem ser [...] relati-</p><p>vas à geografia física do país; ao clima glacial, tórrido ou temperado; à quali-</p><p>dade, situação e grandeza do país; ao gênero de vida dos povos, camponeses,</p><p>caçadores ou pastores; devem estar em relação com o grau de liberdade que a</p><p>constituição pode tolerar; à religião dos habitantes, às suas inclinações, às</p><p>suas riquezas, ao seu número, ao seu comércio, aos seus costumes, aos seus</p><p>usos. Por fim, elas estão em relação entre si e com a sua origem, com as finali-</p><p>14ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>dades do legislador e com a ordem das coisas nas quais se fundamentam. Por-</p><p>tanto, é necessário estudá-las sob todos esses diversos aspectos. E foi essa a</p><p>empresa que tentei realizar em minha obra. Examinarei todas essas relações –</p><p>e o seu conjunto constitui aquilo que chamo de espírito das leis.”</p><p>- AS LEIS, PORTANTO, SÃO DIFERENTES DE POVO PARA POVO, EM FUNÇÃO DO</p><p>CLIMA, DAS OCUPAÇÕES FUNDAMENTAIS, DA RELIGIÃO E ASSIM POR DIANTE.</p><p>Pois bem, Montesquieu não trata de toda a enorme massa de fatos empíricos</p><p>rela�vos às “leis” dos diversos povos com um esquema apriorista, abstrato e</p><p>absoluto. Entretanto, da ordem ilimitada série de observações empíricas por</p><p>meio de princípios precisos, que, ao mesmo tempo em que dão ordem a tais</p><p>observações empíricas, delas recebem forte suporte empírico.</p><p>4.2 TIPOLOGIA DOS REGIMES POLÍTICOS EM MONTESQUIEU</p><p>. República, monarquia e despo�smo:</p><p>- Eis os esquemas de ordenação de Montesquieu: “Existem três espécies de</p><p>governo: O REPUBLICANO, O MONÁRQUICO E O DESPÓTICO [...]. O governo</p><p>republicano é aquele em que o povo, em sua totalidade ou uma parte dele,</p><p>possui o poder soberano; o monárquico é aquele em que só um governa, mas</p><p>com base em leis fixas e imutáveis; ao passo que o despó�co é aquele em que</p><p>também um só governa, mas sem leis e sem regras, decidindo de tudo com</p><p>base em sua vontade e ao seu bel-prazer”.</p><p>- Essas três formas de governo são �pificadas pelos respec�vos princípios</p><p>é�cos, que são A VIRTUDE PARA A FORMA REPUBLICANA, A HONRA PARA A</p><p>MONÁRQUICA E O MEDO PARA A DESPÓTICA. A forma ou natureza do governo</p><p>“é aquilo que o faz ser tal, isto é, o princípio que o faz agir. Um é movido por</p><p>sua estrutura peculiar, outro é movido pelas paixões humanas”. E claro, diz</p><p>Montesquieu, que as leis devem ser rela�vas tanto ao princípio de governo</p><p>como a sua natureza. Assim, para sermos mais claros, “não é preciso muita</p><p>probidade para que um governo monárquico ou despótico possa se manter e</p><p>defender. A força das leis em um e o braço ameaçador do príncipe no outro</p><p>regulam e governam tudo. Mas, em um estado popular, é preciso uma mola a</p><p>mais, que é a virtude. Essa afirmação está em conformidade com a natureza</p><p>das coisas e, ademais, é confirmada por toda a história universal. Com efeito,</p><p>é evidente que, em uma monarquia, onde quem faz cumprir as leis se conside-</p><p>ra acima delas há menos necessidade de virtude do que em um governo popu-</p><p>15ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>lar, onde quem faz cumprir as leis está consciente de também submeter-se a</p><p>elas, e sabe que deve suportar seu peso [...]. Quando tal virtude é deixada de</p><p>lado, a ambição penetra nos corações a ela mais inclinados e a avareza pene-</p><p>tra em todos. As aspirações voltam-se para outras finalidades: aquilo que</p><p>antes se amava agora é desprezado; antes, era-se livre sob a lei, mas agora se</p><p>quer ser livre contra as leis”.</p><p>- Temos, portanto, três formas de governo inspiradas em três princípios.</p><p>Essas três formas de governo podem se corromper, e “a corrupção de todo go-</p><p>verno começa quase sempre pela corrupção de seu princípio”.</p><p>- Assim, por exemplo, “o princípio da democracia se corrompe não somente</p><p>quando se perde o princípio da igualdade, mas também quando se difunde um</p><p>espírito de maldade extrema e cada um pretende ser igual àqueles que esco-</p><p>lheu para comandá-lo”. Montesquieu esclarece esse importante pensamento</p><p>com as seguintes palavras: “O verdadeiro espírito de igualdade está tão distan-</p><p>te do espírito de extrema igualdade quanto o céu está distante da terra. O pri-</p><p>meiro não consiste em absoluto em fazer com que todos comandem ou que</p><p>ninguém seja comandado e sim no obedecer e comandar a iguais. Ele não pre-</p><p>tende de modo algum que não se tenha senhores, mas sim que só tenha iguais</p><p>como senhores [...] O lugar natural da virtude é ao lado da liberdade, mas ela</p><p>não pode sobreviver ao lado da liberdade extrema mais do que poderia sobre-</p><p>viver na escravidão”.</p><p>- E, em segundo lugar, no que se refere ao princípio monárquico, ele “se cor-</p><p>rompe quando as máximas dignidades se tornam símbolos da máxima escravi-</p><p>dão, quando os grandes ficam privados do respeito popular e tornam-se ins-</p><p>trumentos vis de um poder arbitrário. Ele se corrompe ainda mais quando a</p><p>honra é contraposta às honras e quando se pode ser ao mesmo tempo coberto</p><p>de cargos e de infâmia”.</p><p>- E, por fim, “o princípio do governo despó�co se corrompe incessantemente,</p><p>porque é corrupto por sua própria natureza”.</p><p>- Em suma, um governo se define pela unidade formada por sua natureza (sua</p><p>estrutura polí�ca: quem governa e como?) e seu princípio (o motor que o faz</p><p>agir, a saber, a “paixão” que permite concretamente a esta estrutura exis�r).</p><p>Há três �pos de governos:</p><p>-- na república, o povo (democracia) ou uma parte do povo (aristocracia) é</p><p>soberano e reina respeitando as leis; seu princípio é a virtude ou o civismo, o</p><p>amor à pátria e a igualdade de todos diante da lei;</p><p>16ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>-- na monarquia um só governa segundo leis fixas e estáveis (leis fundamentais</p><p>do reino) e admi�ndo poderes intermediários (nobreza e clero)</p><p>que canalizam</p><p>seu poder; seu princípio é a honra, sen�mento de superioridade que exige o</p><p>reconhecimento das prerroga�vas da categoria;</p><p>-- no regime despó�co, um só homem detém o poder absoluto e arbitrário;</p><p>seu princípio é o temor que constrange seus súditos à escravidão.</p><p>. A liberdade polí�ca:</p><p>- A obra maior de Montesquieu não é composta apenas de análise descri�va</p><p>e de teoria polí�ca explica�va. Ela também é dominada por uma grande</p><p>paixão pela liberdade.</p><p>- E Montesquieu elabora o valor da liberdade polí�ca na história, estabele-</p><p>cendo na teoria aquelas que são as condições efe�vas que permitem que se</p><p>desfrute a liberdade. Montesquieu explicita esse interesse central sobretudo</p><p>no capítulo que dedica à monarquia inglesa, no qual é delineado o Estado de</p><p>direito que se havia configurado depois da revolução de 1688. Mais par�cular-</p><p>mente, Montesquieu analisa e teoriza aquela divisão de poderes que cons�tui</p><p>um fulcro inex�rpável da teoria do Estado de direito e da prá�ca da vida demo-</p><p>crá�ca.</p><p>- Afirma Montesquieu: “A liberdade política não consiste de modo algum em</p><p>fazer aquilo que se quer. Em um Estado, isto é, em uma sociedade na qual exis-</p><p>tem leis, a liberdade não pode consistir senão em poder fazer aquilo que se</p><p>deve querer e em não ser obrigado a fazer aquilo que não se deve querer [...].</p><p>A liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem”.</p><p>- Nesse sen�do, não é que as leis limitem a liberdade, elas a asseguram para</p><p>cada cidadão, e este é o fundamento cons�tu�vo do Estado de direito mo-</p><p>derno. Em todo Estado, diz Montesquieu, existem três �pos de poder: o poder</p><p>legisla�vo, o execu�vo e o judiciário.</p><p>- Pois bem, “por força do primeiro, o príncipe ou magistrado faz leis, que tem</p><p>duração limitada ou ilimitada, e corrige ou revoga as leis já existentes. Por</p><p>força do segundo, faz a paz ou a guerra, envia ou recebe embaixadas, garante</p><p>a segurança, previne as invasões. Por força do terceiro, pune os delitos ou julga</p><p>as causas entre pessoas privadas”.</p><p>- Estabelecidas essas definições, Montesquieu assevera que “a liberdade polí-</p><p>tica em um cidadão é aquela tranquilidade de espírito que deriva da persuasão</p><p>que cada qual tem de sua própria segurança; para que se goze de tal liberdade</p><p>17ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p><p>é preciso que o governo esteja em condições de libertar cada cidadão do temor</p><p>em relação aos outros”.</p><p>- Entretanto, se o obje�vo é precisamente a liberdade, então “quando uma</p><p>mesma pessoa ou o mesmo corpo de magistrados concentra os poderes legis-</p><p>lativo e executivo, não há mais liberdade, porque subsiste a suspeita de que o</p><p>próprio monarca ou o próprio senado possam fazer leis tirânicas para depois,</p><p>tiranicamente, fazê-las cumprir”. E nem teríamos mais liberdade “se o poder</p><p>de julgar não estivesse separado dos poderes legislativo e executivo. Com</p><p>efeito, se estivesse unido ao poder legislativo, haveria uma potestade arbitra-</p><p>ria sobre a vida e a liberdade dos cidadãos, posto que o juiz seja legislador. E se</p><p>estivesse unido ao poder executivo, o juiz poderia ter a força de um opressor”.</p><p>Por fim, “tudo estaria [...] perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos</p><p>governantes, dos nobres ou do povo exercesse juntamente os três poderes: o</p><p>de fazer as leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os delitos ou</p><p>as causas entre os privados”.</p><p>INDICAÇÕES DE LEITURAS</p><p>História da liberdade religiosa: Da reforma ao Iluminismo, de Humberto Schu-</p><p>bert Coelho</p><p>As raízes do romantismo, de Isaiah Berlin</p><p>O Romantismo, J. Guinsburg</p><p>Cartas filosóficas, de Voltaire</p><p>Cândido, ou o otimismo, de Voltaire</p><p>Tratado sobre a tolerância, de Voltaire</p><p>Do espírito das leis, de Montesquieu</p><p>18ILUMINISMO, ROMANTISMO,</p><p>VOLTAIRE E MONTESQUIEU</p><p>Licensed to Jonathan Gueron Cordeiro da Silva - jonsilva49@gmail.com - 092.558.279-44</p>