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<p>A</p><p>Linus Pauling</p><p>CIÊNCIA HUMANISTA</p><p>ELE É CONSIDERADO O QUÍMICO MAIS INFLUENTE DESDE</p><p>LAVOISIER E O PAI</p><p>FUNDADOR DA BIOLOGIA MOLECULAR. SEU TRABALHO COM AS</p><p>LIGAÇÕES</p><p>QUÍMICAS – AS FORÇAS QUE UNEM OS ÁTOMOS EM MOLÉCULAS</p><p>– FORMOU</p><p>A BASE DE NOSSA COMPREENSÃO DESSAS ESTRUTURAS</p><p>pesar do papel central de Linus Pauling na descoberta dos</p><p>elementos que tornam a vida possível, essa é apenas metade da</p><p>história. Ele trabalhou também com devoção pela paz mundial e</p><p>pelas liberdades civis. Com isso, foi ganhador do Prêmio Nobel de</p><p>Química em 1954 e da Paz em 1962.</p><p>Pauling, diferentemente da maioria dos outros grandes cientistas, não é</p><p>famoso por uma ou duas descobertas importantes. Em vez disso, sua</p><p>influência se difundiu amplamente, e podemos pensar nele como a pessoa</p><p>que uniu todo o trabalho mais importante do século XX em química e</p><p>bioquímica.</p><p>COMEÇANDO CEDO</p><p>A infância de Linus Carl Pauling foi marcada pela pobreza e pela tragédia.</p><p>Ele nasceu em Portland, Oregon, EUA, em 28 de fevereiro de 1901. Seu pai</p><p>era um farmacêutico falido, que morreu quando o filho tinha 9 anos. Dali</p><p>em diante, a mãe criaria Linus e os dois irmãos sozinha. Aos 13 anos, ele já</p><p>trabalhava para ajudar a sustentar a família.</p><p>Apesar da dificuldade, Pauling era uma criança curiosa, que lia</p><p>vorazmente – o pai escrevera para um jornal local pedindo sugestões de</p><p>livros para o filho. Ele mostrou um interesse precoce pela ciência,</p><p>particularmente pela química, e amava experimentar no pequeno</p><p>laboratório que um amigo, Lloyd Jefress, tinha no quarto. Pauling, porém,</p><p>não conseguiu obter seu diploma do colegial porque se recusou a participar</p><p>de um curso de história americana da forma que a escola determinava. A</p><p>escola só cedeu depois de ele ter ganhado dois prêmios Nobel.</p><p>Após o colegial, Pauling foi para o Oregon State Agricultural College, em</p><p>1917, estudar engenharia química. Ele trabalhava em tempo integral</p><p>enquanto estudava. De 1919 a 1920, lecionou no curso de análise que</p><p>acabara de concluir, ganhando o epíteto de “professor menino”. Foi isso</p><p>que o salvou de ser obrigado a voltar a Portland para ajudar a mãe,</p><p>mergulhada na pobreza.</p><p>Após ter concluído a graduação, Pauling mudou-se para o Instituto de</p><p>Tecnologia da Califórnia (Caltech), onde lecionou de 1922 a 1925 e obteve</p><p>seu Ph.D. em química em 1925. Em 1923, casou-se com Ava Helen Miller,</p><p>apaixonada ativista dos direitos femininos, que mais tarde trabalharia com</p><p>Pauling em suas campanhas contra as armas nucleares. Juntos, tiveram três</p><p>filhos e uma filha.</p><p>ÁTOMOS E LIGAÇÕES</p><p>Já em 1919, Pauling se interessava pela forma como os átomos se ligam</p><p>uns aos outros. Esse seria o motor principal de sua carreira. Ele se inspirou</p><p>na teoria que diz que pares de elétrons são compartilhados entre átomos,</p><p>unindo-os. Pauling começou a trabalhar em estruturas cristalinas no</p><p>Caltech em 1922, esperando descobrir por que os átomos dos metais se</p><p>dispõem em padrões regulares.</p><p>Pauling aprendera sobre a difração dos raios X como estudante e a</p><p>utilizou para determinar a estrutura cristalina do molibdênio em 1922.</p><p>Quando se direcionam raios X para um cristal, alguns são desviados da rota</p><p>ao colidir com átomos, enquanto outros passam diretamente. O resultado é</p><p>um padrão de difração – um padrão de linhas claras e escuras que revela as</p><p>posições dos átomos no cristal. Pauling, em 1928, publicou suas</p><p>descobertas como um conjunto de regras para calcular prováveis</p><p>estruturas cristalinas a partir de padrões de difração dos raios X.</p><p>Em 1925, Pauling viajou à Europa por dois anos com uma bolsa</p><p>Guggenheim e estudou com figuras como Niels Bohr e Edwin Schrödinger.</p><p>Sua maior inspiração, no entanto, foi sua observação do trabalho de Fritz</p><p>London e Walter Heitler na mecânica quântica do átomo de hidrogênio. De</p><p>volta aos EUA, ele se tornou um dos primeiros a aplicar as novas teorias da</p><p>mecânica quântica à estrutura molecular.</p><p>Já se sabia que os átomos podem se combinar com outros, formando</p><p>ligações que poderiam ser iônicas ou covalentes. Pauling acabaria com essa</p><p>classificação organizada, mas simples demais. Ele publicou seu trabalho</p><p>sobre ligações químicas em 1931, após uma segunda visita à Europa em</p><p>que aprendeu como usar a difração de elétrons (similar à difração dos raios</p><p>X, mas usando um feixe de elétrons). O artigo foi um entre os 50 que ele já</p><p>havia publicado aos 30 anos.</p><p>O trabalho de Pauling, de 1939, tornou-se o mais influente livro de</p><p>química do século. Ao trazer a mecânica quântica para a sua formulação</p><p>das ligações, ele explicava como e por que os elementos formam compostos</p><p>e os materiais se comportam da forma como vemos.</p><p>Pauling usava a difração de raios X e de elétrons, via os efeitos</p><p>magnéticos e media o calor das reações químicas para calcular as</p><p>distâncias e ângulos entre átomos que formavam ligações. Ele introduziu o</p><p>conceito de eletronegatividade como uma medida da atração exercida por</p><p>um átomo sobre os elétrons envolvidos na ligação, e desenvolveu uma</p><p>tabela de valores para diferentes átomos.</p><p>Finalmente, Pauling examinou a forma como o carbono forma ligações,</p><p>abrindo as portas para o reino da química orgânica. Compostos orgânicos</p><p>são aqueles em que todas as formas de vida da Terra se baseiam. A partir</p><p>dessa pesquisa, ficou demonstrado que a estrutura da hemoglobina (que</p><p>leva o oxigênio no sangue) muda quando o oxigênio se liga a ela. Ele foi um</p><p>dos primeiros a explicar como anticorpos e enzimas funcionam. Seu</p><p>trabalho mostrou que a físico-química, no nível molecular, poderia ser</p><p>usada para resolver problemas da biologia e da medicina.</p><p>LIBRARY OF CONGRESS</p><p>Explosão nuclear nas Ilhas Marshall: Pauling foi um dos responsáveis pela assinatura do tratado</p><p>entre EUA e URSS, em 1963, que limitou os testes com armas nucleares</p><p>A LIGAÇÃO QUE POSSIBILITA A VIDA</p><p>No entanto, o principal desafio para os bioquímicos era entender as</p><p>proteínas – as substâncias que controlam todos os processos nas células.</p><p>De novo, o trabalho de Pauling foi crucial para o progresso.</p><p>A ligação do hidrogênio é um tipo especial de ligação formada entre um</p><p>átomo de hidrogênio e um átomo próximo com carga negativa. Pauling não</p><p>a descobriu, mas a explicou em termos de comportamento quântico e</p><p>calculou um valor para a energia envolvida. Com isso, ficou claro que a vida</p><p>na Terra depende da existência dessa ligação pequena e fraca, e muitos</p><p>pedaços do quebra-cabeça bioquímico finalmente se encaixaram.</p><p>Pauling trabalhou com Alfred Mirsky por um longo período, interrompido</p><p>pela Segunda Guerra Mundial, para descobrir a estrutura das proteínas. A</p><p>equipe de William Bragg, em Cambridge, no Reino Unido, estava</p><p>trabalhando no mesmo problema. Quando Bragg publicou suas</p><p>descobertas, em 1950, ficou claro que não estavam muito certas. Pauling</p><p>chegou à resposta correta, publicando-a no ano seguinte – a forma</p><p>característica de uma proteína é uma longa cadeia torcida em forma de</p><p>hélice, ou espiral, hoje conhecida como alfa-hélice. A forma da estrutura se</p><p>mantém por ligações de hidrogênio. Em maio de 1951, a equipe de Pauling</p><p>sacudiu o mundo da bioquímica ao publicar a estrutura de sete proteínas</p><p>fibrosas, incluindo as do cabelo, da seda e do músculo.</p><p>A maior, mais complexa e mais importante molécula bioquímica é o DNA,</p><p>a substância da qual todos os cromossomos são feitos. Nessa estrutura</p><p>estão codificadas todas as características de um organismo vivo. Descobrir</p><p>a estrutura do DNA era o óbvio passo seguinte para Pauling e Bragg, mas</p><p>nenhum deles ganharia essa corrida.</p><p>PACIFISTA E ATIVISTA</p><p>Pauling foi convidado a se juntar ao Projeto Manhattan para desenvolver</p><p>armas atômicas durante a Segunda Guerra Mundial. Ele tinha sido</p><p>amigo</p><p>próximo do líder do projeto, Robert Oppenheimer, apesar de sua amizade</p><p>ter terminado abruptamente quando Robert tentou convencer a esposa de</p><p>Pauling a fugir com ele para o México. Foi o pacifismo, porém, que</p><p>impossibilitou a participação de Pauling, o que levaria a constantes</p><p>problemas com as autoridades dos EUA nos anos após a guerra, quando ele</p><p>foi incansável na luta pelo controle das armas nucleares. Ao receber o</p><p>Nobel, em 1954, seu passaporte estava confiscado e só foi devolvido em</p><p>cima da hora da viagem para Estocolmo. Na verdade, a apreensão do</p><p>documento o impediu de ir à Inglaterra para ver as fotografias de raios X do</p><p>DNA feitas por Rosalind Franklin. Elas poderiam tê-lo levado a revelar a</p><p>estrutura correta do DNA – uma dupla hélice, em vez da tripla hélice que</p><p>ele havia sugerido.</p><p>Pauling era incansável em sua campanha pelo controle das armas</p><p>nucleares. Em 1958, ele e a esposa coletaram mais de 11 mil assinaturas de</p><p>cientistas para uma petição pelo fim dos testes de armas. A pressão pública</p><p>decorrente levou à assinatura, em 1963, do Tratado de Interdição Parcial</p><p>de Testes Nucleares, por EUA e Rússia. No dia da assinatura, Pauling</p><p>recebeu o Nobel da Paz.</p><p>O prêmio não melhorou sua situação doméstica. O subcomitê Interno de</p><p>Segurança do Senado o considerava “nome científico número um em</p><p>praticamente todas as maiores atividades da ofensiva de paz comunista</p><p>neste país” e a revista Life chamou sua premiação de “insulto</p><p>extraordinário à América”. No final da vida, Pauling voltou sua atenção à</p><p>medicina alternativa, particularmente à aplicação de altas doses de</p><p>vitamina C como forma de evitar o câncer. Ironicamente, ele morreu de</p><p>câncer na próstata, em 19 de agosto de 1994, em seu rancho próximo a Big</p><p>Sur, na Califórnia, aos 93 anos.</p><p>A. BARRINGTON, BROWN/PHOTO RESEARCHERS</p>