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<p>CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI</p><p>INTRODUÇÃO A SOCIOLOGIA</p><p>GUARULHOS – SP</p><p>2</p><p>SUMÁRIO</p><p>1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 4</p><p>2 A sociologia como ciência .............................................................................. 5</p><p>2.1 Compreendendo o conceito de sociologia ................................................. 5</p><p>2.2 O percurso histórico do surgimento da sociologia ..................................... 7</p><p>2.3 Características da sociologia como ciência ............................................... 9</p><p>3 TEORIAS SOCIOLÓGICAS CLÁSSICAS .................................................... 11</p><p>3.1 Teorias sociológicas clássicas e a solução das questões sociais............ 12</p><p>3.2 Teorias sociológicas contemporâneas: funcionalista, de conflito e</p><p>interacionista .................................................................................................... 13</p><p>3.3 Teorias sociais contemporâneas e a profissionalização da sociologia .... 14</p><p>4 A SOCIOLOGIA DO DIREITO COMO CIÊNCIA SOCIAL ............................ 15</p><p>4.1 Conceito e objeto da sociologia do Direito ............................................... 16</p><p>4.2 Sociologia do Direito e no Direito ............................................................. 18</p><p>4.3 Influência da sociologia no estudo do Direito ........................................... 20</p><p>5 ÉMILE DURKHEIM E A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA AUTÔNOMA ....... 23</p><p>5.1 Émile Durkheim e a sociologia do Direito ................................................ 24</p><p>5.2 Sociologia do Direito ................................................................................ 26</p><p>5.3 Fato social e instituições .......................................................................... 27</p><p>5.3.1 Objeto .................................................................................................... 27</p><p>5.3.2 Método ................................................................................................... 28</p><p>5.4 Principais conceitos ................................................................................. 28</p><p>5.4.1 Solidariedade ......................................................................................... 28</p><p>5.4.2 Divisão do trabalho social ...................................................................... 29</p><p>6 EFICÁCIA DAS NORMAS JURÍDICAS E OS SEUS EFEITOS SOCIAIS .... 30</p><p>6.1 Validade e eficácia das normas ............................................................... 31</p><p>6.2 Efeitos sociais da norma jurídica ............................................................. 33</p><p>6.3 Antinomias ............................................................................................... 35</p><p>3</p><p>6.3.1 Conflitos de primeiro grau ...................................................................... 35</p><p>6.3.2 Conflitos de segundo grau ..................................................................... 37</p><p>7 RELAÇÃO ENTRE SOCIEDADE, DIREITO E ESTADO ............................. 38</p><p>7.1 Função do Direito na sociedade .............................................................. 39</p><p>7.2 Relação entre Direito e Estado ................................................................ 41</p><p>7.3 Direito como meio de controle social ....................................................... 43</p><p>8 DEMOCRACIA, POLÍTICAS PÚBLICAS E CONTROLE DA POBREZA ..... 45</p><p>8.1 Democracia, políticas sociais e pobreza .................................................. 46</p><p>8.2 Controle social e a expressão da democracia ......................................... 51</p><p>8.3 Políticas públicas e a materialização dos direitos sociais ........................ 53</p><p>9 CONCEITOS BÁSICOS DE SOCIOLOGIA.................................................. 57</p><p>9.1 Fato Social e Ação Social ........................................................................ 57</p><p>9.2 Estratificação social e classe social ......................................................... 58</p><p>9.3 Sociedade, interação e cultura................................................................. 61</p><p>10 REFERÊNCIAS ............................................................................................ 64</p><p>4</p><p>1 INTRODUÇÃO</p><p>Prezado aluno!</p><p>O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante</p><p>ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um</p><p>aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma</p><p>pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é</p><p>que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a</p><p>resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas</p><p>poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em</p><p>tempo hábil.</p><p>Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa</p><p>disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das</p><p>avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora</p><p>que lhe convier para isso.</p><p>A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser</p><p>seguida e prazos definidos para as atividades.</p><p>Bons estudos!</p><p>5</p><p>2 A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA</p><p>O ser humano apresenta, no percurso de seu desenvolvimento histórico,</p><p>inúmeras mudanças nas suas maneiras de viver e relacionar-se em sociedade, desde</p><p>as estruturas comunitárias mais simples, como a família, até a complexidade das</p><p>grandes corporações empresariais e das relações de governo estabelecidas. Para</p><p>analisar e entender como essas mudanças ocorreram, identificar os fatores que as</p><p>ocasionaram e compreender como a sociedade tem evoluído nas últimas eras,</p><p>podemos contar com a sociologia, que você vai conhecer neste capítulo.</p><p>(GOLDSPAN, 2018)</p><p>http://teoriacomprensivabeatrizcastro.blogspot.com/2016/10/que-es-la-teoria-comprensiva.html</p><p>2.1 Compreendendo o conceito de sociologia</p><p>O primeiro ponto a destacar quando falamos no ser humano é sua capacidade</p><p>e necessidade de viver como um ser social, de maneira organizada e interdependente,</p><p>em que suas características culturais podem ser ensinadas e aprendidas. Neste</p><p>processo de convivência social, as estruturas que constituem tais associações vão</p><p>sendo modificadas, incorporando novas maneiras de viver e de agir.</p><p>A vida do homem em sociedade passa por inúmeros movimentos e</p><p>reconfigurações associadas a diversos fatores, como o próprio desenvolvimento da</p><p>6</p><p>noção de comunidade, dos avanços nas áreas que envolvem as questões econômicas</p><p>e de governo, as mudanças de paradigmas nas buscas por explicações para os</p><p>fenômenos, entre outros. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>O ser humano apresentou, no percurso de seu desenvolvimento histórico,</p><p>inúmeras mudanças nas suas maneiras de viver e relacionar-se em sociedade, desde</p><p>as estruturas comunitárias mais simples, como a família, até a complexidade das</p><p>grandes corporações empresariais e das relações de governo estabelecidas.</p><p>A busca pela conceituação do que vem a ser a sociologia enquanto ciência</p><p>passa pela percepção e pelo entendimento do que vem a ser o conceito de sociedade</p><p>em si e de como se organizam e se movimentam os mais diversos grupos humanos e</p><p>seus fenômenos sociais. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>Temos que destacar que as reflexões em torno de como os seres humanos</p><p>vivendo em sociedade se organizavam remontam à Antiguidade Clássica, muito antes</p><p>da elaboração do conceito de sociologia por Auguste Comte, na Modernidade, mais</p><p>especificamente no século XIX. Sobre este fato, Vila Nova (2013, p. 29) comenta:</p><p>É óbvio que a reflexão sobre os fenômenos sociais não começou com a</p><p>sociologia, no século XIX. Antes que Auguste Comte inventasse, na primeira</p><p>metade daquele século, a palavra</p><p>relação entre sociedade e</p><p>Direito:</p><p> fato, que consiste na determinação de uma relação permanente do</p><p>poder, com uma discriminação entre governantes e governados;</p><p> valor, em virtude do qual o poder é exercido (o ideal de justiça, por</p><p>exemplo);</p><p> norma, que expressa a medição do poder na atualização dos valores da</p><p>convivência social (o próprio Direito).</p><p>Assim, sempre que houver um fenômeno jurídico, haverá também: um fato</p><p>subjacente, que poderá ser de ordem econômica, por exemplo) um valor, que confere</p><p>significação a esse fato (inclinando ou determinando a ação dos homens no sentido</p><p>de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo) e, principalmente, uma norma, que</p><p>representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato</p><p>43</p><p>ao valor. Tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados um</p><p>dos outros, mas coexistem em uma unidade concreta, e não só exigem reciprocidade,</p><p>mas atuam como elos de um processo de tal modo que a vida do direito resulta na</p><p>interação dinâmica e dialética dos três elementos que a integram (GIACOMELLI,</p><p>2011).</p><p>7.3 Direito como meio de controle social</p><p>É de ressaltar, de início, que o Direito não é o único responsável pela harmonia</p><p>da vida em sociedade. A religião, a moral e as regras de trato social igualmente</p><p>contribuem para o sucesso das relações sociais. Se devemos dizer que o direito não</p><p>é o único valor, nem o mais alto, ele é, contudo, a garantia da vida em sociedade</p><p>(GIACOMELLI, 2011).</p><p>Há outros instrumentos de controle social, e cada um o é na sua faixa própria.</p><p>A do Direito, por exemplo, é regrar a conduta social, com vistas à ordem e à justiça, e</p><p>os fatos sociais mais importantes para o convívio social é que são juridicamente</p><p>disciplinados.</p><p>44</p><p>É no meio social que o Direito surge e se desenvolve para a concretização dos</p><p>objetivos buscados pela sociedade, como, por exemplo, a manutenção da paz, da</p><p>ordem, da segurança e do bem-estar comum, de maneira a tornar possível a</p><p>convivência e o progresso social (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Assim, o Direito é fruto de uma realidade social. O Direito, decorrente da criação</p><p>humana, é direcionado de acordo com os interesses impostos pela sociedade. Tal fato</p><p>o torna dinâmico, exigindo que ele, à cada época, acompanhe os anseios e interesses</p><p>da sociedade para qual foi criado. Desse modo, verifica-se, concretamente, constante</p><p>mutação dos significados dos institutos jurídicos. As instituições jurídicas são criações</p><p>da sociedade, que sofrem variações no tempo e no espaço. Como processo de</p><p>transformação e adaptação social, o Direito deve estar sempre evoluindo,</p><p>considerando a grande mobilidade social (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Portanto, como o Direito decorre da criação humana, isto é, da vontade da</p><p>sociedade em se autorregulamentar, ele se manifesta como controlador do homem</p><p>social ou como sistema de controle social. Sob esse prisma, o Direito é utilizado como</p><p>instrumento de dominação da sociedade, pois esta se submete, em grau de</p><p>obediência, às regras de controle instituídas para organizar a sua convivência.</p><p>Esse poder de dominação social característico do Direito, deve ser muito bem</p><p>estruturado, pois, caso seja irrestrito, há o sério risco de o Direito ser percebido como</p><p>força escravizadora, no lugar de libertadora. Essa estruturação deve ocorrer em</p><p>conjunto com outras formas de controle social (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Para ilustrar esse entendimento, tracemos um paralelo entre Direito e religião.</p><p>Verificamos que, no início das civilizações, a religião exercia domínio absoluto sobre</p><p>45</p><p>o homem, e o Direito nada mais era do que expressão da vontade divina. A classe</p><p>sacerdotal possuía o monopólio do conhecimento jurídico.</p><p>Durante a Idade Média, ficaram famosos os Juízos de Deus com as suas</p><p>ordálias, em que as decisões eram condicionadas a jogo de sorte e azar, pois Deus</p><p>interferia diretamente no julgamento. Um prato de louça era jogado ao alto, por</p><p>exemplo. Caso se quebrasse ao cair, o réu seria considerado culpado; caso o prato</p><p>não se quebrasse, seria absolvido.</p><p>Foi só a partir do século XVII que o Direito começou a se desvincular dos</p><p>conceitos divinos, e temos hoje que Direito e religião são fenômenos distintos. Não</p><p>obstante, a todo momento, buscam inspiração um no outro. Há normas jurídicas de</p><p>conteúdo religioso, como a proibição do aborto e da bigamia, por exemplo. Ora, ao</p><p>tentar organizar a vida em sociedade, o Direito não pode se esquecer das</p><p>preocupações de cunho religioso, tão importantes para o homem. Além do mais, a</p><p>preocupação com o bem é inerente a ambos, Direito e religião (GIACOMELLI, 2011).</p><p>8 DEMOCRACIA, POLÍTICAS PÚBLICAS E CONTROLE DA POBREZA</p><p>Neste capítulo, você vai estudar os processos históricos que levaram ao</p><p>surgimento da democracia e conhecer suas principais formas de organização ao longo</p><p>dos tempos. Também vai ver alguns conceitos relacionados às políticas públicas e</p><p>sociais. Além disso, você vai verificar a importância dos sistemas democráticos de</p><p>governo para a aplicação dessas políticas. Nesse sentido, o Estado pode assumir</p><p>posturas tanto de combate como de desresponsabilização (BARBOSA, 2019).</p><p>Você ainda vai conhecer alguns conceitos relativos ao controle social. Por fim,</p><p>vai ver como esses conceitos se relacionam com algumas políticas públicas de</p><p>46</p><p>combate às desigualdades sociais, que são uma forma de concretização do processo</p><p>democrático em uma sociedade.</p><p>https://www.filantropia.ong/imagens/conteudo/RFKA179UMKN9VR0BR4IU/democracia-controle-</p><p>social-e-direitos-humanos3032.jpg</p><p>8.1 Democracia, políticas sociais e pobreza</p><p>O conceito moderno de Estado democrático tem origem no século XVIII. De</p><p>acordo com esse conceito, o Estado deve aplicar determinados valores que são</p><p>fundamentais para o bom andamento das engrenagens sociais e para o bom convívio</p><p>humano. Assim, ele deve ser organizado e trabalhar na tutela desses valores. Para</p><p>entender a ideia de Estado democrático, você deve conhecer seus princípios</p><p>implícitos, verificar os meios utilizados para a sua aplicação e as consequências</p><p>surgidas dessa aplicação, até mesmo como análise da viabilidade ou não desse</p><p>modelo (BARBOSA, 2019).</p><p>A palavra “democracia” vem do termo grego demokratía, que é composto por</p><p>demos (povo) e kratos (poder). Ou seja, a base do conceito de Estado democrático é</p><p>a noção de “governo do povo”. Portanto, é necessário analisar como esse modelo se</p><p>47</p><p>consolidou e que instituições surgiram pela efetivação desse tipo de governo. Nesse</p><p>percurso histórico, três modelos compõem os princípios básicos da democracia: a</p><p>democracia direta; a democracia indireta; e a democracia representativa semidireta</p><p>do século XX (BARBOSA, 2019).</p><p>A Grécia Antiga é o berço da democracia direta. Mais precisamente em Atenas,</p><p>o povo reunia-se em praça pública para a execução direta e imediata do poder político.</p><p>Nesse período, a democracia era tida como objeto de devoção do povo, que dedicava</p><p>a sua vida à coisa pública, priorizando as questões do Estado até mesmo em</p><p>detrimento de sua vida privada. Cada cidade mantinha um sistema democrático</p><p>próprio e tratava com orgulho sua ágora, praça onde os cidadãos se reuniam para</p><p>celebrar o exercício político daquela cidade. Esta fazia o papel do parlamento dos</p><p>tempos modernos (BARBOSA, 2019).</p><p>A crítica dos pensadores modernos ao sistema democrático dos gregos é que</p><p>este, na realidade, era uma aristocracia democrática. Afinal, os escravos, que eram</p><p>esmagadora maioria, não tinham direito de participação política. Essa base social</p><p>escrava permitia ao homem livre dedicar-se inteiramente aos negócios públicos, não</p><p>possuindo preocupações materiais. O homem econômico contemporâneo</p><p>corresponde ao homem político daquela época (BONAVIDES, 2011).</p><p>Essa distinção entre homens talvez represente a maior divergência</p><p>entre a ideia</p><p>moderna de democracia e aquela da Grécia Antiga. Sobre isso, Dallari (2014, p. 146)</p><p>afirma:</p><p>No livro III de A Política, Aristóteles faz a classificação dos governos, dizendo</p><p>que o governo pode caber a um só indivíduo, a um grupo, ou a todo o povo.</p><p>Mas ele próprio já esclarecera que o nome de cidadão só se deveria dar com</p><p>propriedade àqueles que tivessem parte na autoridade deliberativa e na</p><p>autoridade judiciária. E diz taxativamente que a cidade-modelo não deverá</p><p>jamais admitir o artesão no número de seus cidadãos. Isto porque a virtude</p><p>política, que é a sabedoria para mandar e obedecer, só pertence àqueles que</p><p>não têm necessidade de trabalhar para viver, não sendo possível praticar-se</p><p>a virtude quando se leva a vida de artesão ou de mercenário. Esclarece,</p><p>finalmente, que em alguns Estados havia-se adotado orientação mais liberal,</p><p>quanto à concessão do título de cidadão, mas que isso fora feito em situações</p><p>de emergência, para remediar a falta de verdadeiros e legítimos cidadãos. A</p><p>regra, entretanto, era a restrição que em alguns lugares era bastante rigorosa</p><p>[...]. Como se vê claramente, essa ideia restrita de povo não poderia estar</p><p>presente na concepção de democracia do século XVIII, quando a burguesia,</p><p>economicamente poderosa, estava às vésperas de suplantar a monarquia e</p><p>a nobreza no domínio do poder público.</p><p>48</p><p>Após a democracia direta da Grécia Antiga, surge a democracia indireta nos</p><p>tempos modernos, que tem por característica a presença do sistema representativo.</p><p>Antigos pensadores, como Montesquieu, diziam que o povo era excelente para</p><p>escolher, mas péssimo para governar. Assim, necessitava de representantes que</p><p>decidissem e desejassem em nome dele. O povo, no entanto, não era o real</p><p>argumento que tornaria inviável de forma prática o antigo sistema grego de</p><p>representação direta (BARBOSA, 2019).</p><p>O Estado moderno não era mais a cidade-estado de outros tempos, e sim um</p><p>Estado-nação, de caráter unificador e com a missão de legislar todas as instituições</p><p>sociais que agora estavam alocadas em uma ampla base territorial. A ideia de um</p><p>corpo de cidadãos congregados em praça pública para administrar as leis do Estado</p><p>tornara-se impraticável nessa época. Bonavides (2011) afirma que o homem da</p><p>democracia direta, grego, era integralmente um homem político, ao contrário do</p><p>homem do Estado moderno, que era apenas acessoriamente político. Assim, o</p><p>homem, perante as esferas políticas, deixa de ser sujeito ou pessoa, tornando-se</p><p>objeto da organização política e social vigente. Veja:</p><p>Dizia Rousseau, criticando a democracia indireta ou representativa, que o</p><p>homem da democracia moderna só é livre quando vai às urnas depositar seu</p><p>voto. Para os opositores do filósofo contratualista, uma verdade fica patente:</p><p>não há fugir ao imperativo de representação, porquanto, no contrário, não</p><p>haveria nenhum governo apoiando no consentimento, tomando-se em conta</p><p>a complexidade social, a extensão e a densidade demográfica do Estado</p><p>moderno, fatores estes que embaraçam irremediavelmente o exercício da</p><p>democracia direta (BONAVIDES, 2011, p. 274).</p><p>Bonavides (2011) destaca que as principais características da democracia</p><p>indireta ocidental são:</p><p> a soberania popular como fonte de todo poder legítimo;</p><p> o sufrágio universal e a pluralidade de candidatos e partidos;</p><p> a igualdade de todos perante a lei;</p><p> a limitação de poder dos governantes;</p><p> a adesão aos princípios da fraternidade social;</p><p> a liberdade de opinião, de reunião, de associação e de fé religiosa;</p><p> a defesa de um Estado de Direito com a proteção da ordem jurídica;</p><p> a temporalidade dos mandatos;</p><p>49</p><p> a defesa e a garantia de direitos das minorias políticas e sociais, com</p><p>incentivo à representação destes indivíduos na busca pela redução das</p><p>desigualdades sociais (talvez a mais importante das características).</p><p>Avançando historicamente, há a democracia representativa semidireta do</p><p>século XX. Ela se proliferou nas primeiras três décadas deste século, gozando de</p><p>grande prestígio, em especial no continente europeu. Tendo a Suíça como berço</p><p>tradicional, esse modelo espalhou-se por todo o continente europeu e pela América</p><p>do Norte. Assumindo características e peculiaridades em cada Estado, a democracia</p><p>representativa semidireta seguiu avançando até a Segunda Guerra Mundial. Nesse</p><p>período, ocorreu um movimento de transposição do poder para os partidos políticos,</p><p>que se tornaram depositários da esperança e da fantasia de uma sociedade melhor.</p><p>Assim, as forças democráticas deixam de pertencer ao povo como massa numérica e</p><p>mandatário direto do exercício plebiscitário e passam a ser do povo organizado, que</p><p>se concretiza por meio dos partidos políticos. Ocorre, assim,</p><p>[...] o declínio da democracia semidireta, que foi, segundo dizem, um grau</p><p>qualitativo apreciável no processo de dinamização e amadurecimento dos</p><p>princípios de organização democrática, volvidos porém à impotência, na</p><p>forma ainda há pouco adotada, face a prementes necessidades</p><p>contemporâneas, impostas pela nova e profunda revolução da ciência e da</p><p>técnica, inspirando a máxima racionalização do poder, até mesmo do poder</p><p>democrático (BONAVIDES, 2011, p. 276).</p><p>Deste movimento, então, surge uma descrença generalizada nos partidos</p><p>políticos, o que resulta em algumas iniciativas que incentivam a participação popular.</p><p>A Constituição brasileira de 1988, em seu art. 14, por exemplo, faz referência à prática</p><p>de plebiscito, referendo e iniciativa popular. Como você sabe, no entanto, essas</p><p>práticas no Brasil não são efetivas. Raras são as iniciativas que culminaram nessas</p><p>formas de participação popular no País. De 1993 a 2014, foram realizados três</p><p>plebiscitos e dois referendos no Brasil. Destes, somente um plebiscito e um referendo</p><p>realizaram-se a nível nacional (BARBOSA, 2019).</p><p>A democracia, no geral, é, portanto, um sistema político em que cidadãos</p><p>elegem seus representantes para gerir os interesses de determinada sociedade ou</p><p>nação. Uma das principais atribuições desses representantes eleitos é a elaboração,</p><p>a execução e o monitoramento de políticas públicas de interesse social. As políticas</p><p>públicas ou sociais são, então, parte do processo estatal de alocação e distribuição</p><p>50</p><p>de recursos, mediando valores e interesses de grupos e classes distintas. Seu objeto</p><p>é a realocação de recursos públicos obtidos por meio da tributação (BARBOSA, 2019).</p><p>Eis aqui o ponto crucial: de um lado estão os interesses do mercado e do</p><p>grande capital, que prezam por uma política social mínima de pouca ou nula</p><p>intervenção estatal; de outro, uma população em grande parte empobrecida que é</p><p>reflexo do processo de acumulação capitalista e que necessita de políticas sociais</p><p>para a garantia de suas necessidades básicas de subsistência. As políticas sociais</p><p>são, portanto, reflexo da política de relações econômicas. Elas são determinadas</p><p>pelas opções políticas dos representantes eleitos. Veja:</p><p>A política social intervém no hiato derivado dos desequilíbrios na distribuição</p><p>em favor da acumulação e em detrimento da satisfação das necessidades</p><p>sociais básicas, assim como na promoção da igualdade. A ação social do</p><p>Estado diz respeito tanto à promoção da justiça social, quanto ao combate à</p><p>miséria, embora sejam objetivos distintos. No primeiro caso, a busca da</p><p>equidade se faz, comumente, sob a forma da garantia e da promoção dos</p><p>direitos sociais da cidadania. No segundo, a intervenção do Estado se</p><p>localiza, sobretudo, no campo definido por escolhas políticas quanto ao modo</p><p>e ao grau de correção de desequilíbrios sociais, através de mudanças</p><p>setoriais e reformas estruturais baseadas em critérios de necessidade</p><p>(ABRANCHES, 1998, p. 11).</p><p>Políticas públicas ou políticas sociais são, então, um instrumento de combate à</p><p>pobreza e de nivelamento social. É por meio do compromisso político de determinado</p><p>Estado que se pode observar</p><p>se essa política será uma política social de ruptura, que</p><p>visa à emancipação dos sujeitos, ou de viés assistencialista, que tem como finalidade</p><p>somente mascarar as mazelas sociais, mantendo o status quo efetivado. A política</p><p>social tida como obrigação permanente do Estado tem duas faces: a política, enquanto</p><p>garantia de padrões mínimos de vida; e a política de redução da pobreza, que objetiva</p><p>retirar os indivíduos da condição de miséria total, em que são impedidos de obter os</p><p>recursos mínimos à sua sobrevivência. A política de combate à pobreza estrutural tem</p><p>por finalidade eliminar a miséria e a destituição de bens ou direitos em um espaço de</p><p>tempo limitado, ainda que por vezes prolongado. Você pode tomar o programa Bolsa</p><p>Família como exemplo. Ele tem como objetivo incorporar os indivíduos ao meio social,</p><p>compensando as carências que comprometem a sua vida e a sua sanidade</p><p>(BARBOSA, 2019).</p><p>Essa política é formulada por equipes multidisciplinares que atuam no campo</p><p>social, preferencialmente com aval e participação dos usuários assistidos, e</p><p>51</p><p>combinam ações sociais compensatórias e permanentes. Ela é executada pelo Estado</p><p>e possui identidade e estratégias próprias (ABRANCHES, 1998).</p><p>8.2 Controle social e a expressão da democracia</p><p>A Constituição Federal de 1988 estabelece algumas estratégias de participação</p><p>e controle social no âmbito das políticas públicas. Entre elas, você pode considerar o</p><p>plebiscito, o referendo, a iniciativa popular para a elaboração de projetos, as</p><p>conferências e a criação dos conselhos de direitos. As conferências são espaços</p><p>democráticos, encontros com ampla participação social. Nelas, se reúnem gestores,</p><p>trabalhadores e usuários de determinada política que têm por objetivo refletir sobre as</p><p>práticas utilizadas e gerar novas contribuições. Após a realização da conferência, os</p><p>assuntos tratados são sistematizados com a finalidade de contribuir para a melhoria</p><p>da temática em questão e para a elaboração de programas e projetos de interesse</p><p>público. Sobre isso, considere o seguinte:</p><p>A Constituição Federal de 1988 consagrou o princípio da participação social</p><p>como forma de afirmação da democracia. Desde então houve uma</p><p>proliferação de formas e instâncias de participação em todos os níveis da</p><p>Federação, cumprindo o papel de verdadeiras arenas públicas, lugares de</p><p>encontro entre sociedade e Estado. De 1941 a 2013 foram realizadas 138</p><p>conferências nacionais, das quais 97 aconteceram entre 2003 e 2013,</p><p>abrangendo mais de 43 áreas setoriais nas esferas municipal, regional,</p><p>estadual e nacional. Aproximadamente nove milhões de pessoas</p><p>participaram do debate sobre propostas para as políticas públicas — desde</p><p>52</p><p>as etapas municipais, livres, regionais, estaduais até a etapa nacional. As</p><p>etapas preparatórias (municipais, territoriais, temáticas) são momentos</p><p>importantes e ricos no processo de uma conferência. É nelas que o debate</p><p>se intensifica, tanto nos temas nacionais como nos locais, proporcionando ao</p><p>cidadão oportunidade de propor soluções para os problemas da sua cidade,</p><p>estado e do país (BRASIL, 2018, documento on-line).</p><p>De acordo com BARBOSA (2019), outra importante ferramenta de participação</p><p>e controle social são os conselhos de direitos. Eles são formados por integrantes da</p><p>sociedade civil que, juntamente ao poder público, têm por objetivo elaborar, executar</p><p>e fiscalizar políticas sociais em determinados segmentos da sociedade. Os conselhos</p><p>caracterizam-se pela atuação em áreas estratégicas que demandam o controle social,</p><p>objetivando a garantia de direitos e a criação de políticas de proteção, inclusão e</p><p>emancipação dos sujeitos ou da temática. Eles possuem composição paritária. São</p><p>formados por representantes da sociedade civil e do governo, com finalidade</p><p>deliberativa. A ideia é trabalhar na mediação das relações contraditórias da sociedade.</p><p>Você pode considerar, por exemplo, os conselhos que atuam nas áreas de saúde,</p><p>assistência social, infância e adolescência, terceira idade, educação, meio ambiente</p><p>e outros.</p><p>Os conselhos de direitos são compreendidos como mecanismos de</p><p>participação social e controle que possibilitam a atuação de sujeitos políticos coletivos.</p><p>São considerados espaços privilegiados de participação e deliberação da democracia.</p><p>A participação de diferentes sujeitos, com histórias e demandas distintas, possibilita a</p><p>discussão sobre demandas públicas que remetem à reflexão sobre a importância do</p><p>debate democrático. Isso permite a redistribuição do poder decisório entre os</p><p>diferentes indivíduos (BARBOSA, 2019).</p><p>53</p><p>Assim, os conselhos permitem a representatividade de classes com vistas ao</p><p>atendimento das necessidades oriundas do segmento social representado por eles.</p><p>Cabe destacar que o surgimento dos conselhos possibilitou a representação direta da</p><p>sociedade nas decisões políticas, ampliando o controle social da gestão pública e</p><p>fortalecendo o Estado Democrático de Direito.</p><p>O art. 204 da Constituição Federal de 1988 demonstra a preocupação do</p><p>constituinte com esse tipo de problemática e institui os conselhos municipais, órgãos</p><p>de representatividade, como forma de descentralização da gestão pública. A ideia é</p><p>aumentar o controle e a participação social nas administrações e reduzir os índices</p><p>de desigualdade social. Veja:</p><p>Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão</p><p>realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art.</p><p>195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes:</p><p>I — descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as</p><p>normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos</p><p>programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades</p><p>beneficentes e de assistência social; II — participação da população, por meio</p><p>de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle</p><p>das ações em todos os níveis (BRASIL, 1988, documento on-line).</p><p>Os conselhos, apesar de não serem órgãos governamentais, organizam-se de</p><p>forma autônoma, com estruturas jurídicas próprias. É obrigação do município fomentar</p><p>e, acima de tudo, garantir o funcionamento desses espaços. Além disso, é dever do</p><p>ente público municipal promover a descentralização do poder, fomentando a</p><p>elaboração de projetos que visem à criação desses espaços deliberativos,</p><p>propositivos e fiscalizadores, a fim de que se tornem órgões permanentes de</p><p>participação nas decisões políticas.</p><p>8.3 Políticas públicas e a materialização dos direitos sociais</p><p>O plebiscito, o referendo, a iniciativa popular e os conselhos são alguns</p><p>exemplos de mecanismos de participação popular e controle social existentes na</p><p>sociedade. Assim, cabe refletir sobre o papel desses instrumentos e a relação deles</p><p>com as políticas públicas e sociais que se materializam para garantir direitos e</p><p>combater desigualdades sociais (BARBOSA, 2019).</p><p>O debate sobre políticas públicas ou sociais tem como norte a busca por</p><p>estratégias de superação que contribuam para uma sociedade mais justa e menos</p><p>54</p><p>desigual. As relações de luta que surgem em meio a esse debate são historicamente</p><p>mais fortes e organizadas junto às classes sociais dominantes. Não por acaso, estas</p><p>são as detentoras do poder e, na maioria das vezes, representantes do Estado.</p><p>Zitkoski (2000) afirma que o rompimento desses processos deve ocorrer a partir do</p><p>empoderamento político dos oprimidos, para a desestruturação do sistema social</p><p>vigente em busca de uma nova sociedade mais humana e digna para todos. A tomada</p><p>de consciência de que as políticas públicas e o acesso a bens e serviços são direitos</p><p>deve ser o “impulso fundante desta utopia”. Assim:</p><p>A utopia política de libertação dos oprimidos, que historicamente têm sofrido</p><p>as consequências das práticas políticas alienantes promovidas pela elite</p><p>dominante, é o ponto de partida para</p><p>já foi regrado socialmente. A generalidade</p><p>diz respeito ao referir-se a toda a população. A coercitividade, por sua vez, traz o</p><p>caráter obrigatório e do dever em envolver-se nas ações que ocorrem na sociedade.</p><p>Nas palavras de Durkheim (1996, p.2), os fatos sociais são “maneiras de agir, de</p><p>pensar e de sentir que apresentam esta notável propriedade de existirem fora das</p><p>consciências individuais”.</p><p>58</p><p>Para exemplificar, podemos dizer que a lei caracteriza bem a ideia de fato</p><p>social, pois todos os indivíduos precisam segui-la, independentemente de</p><p>concordarem ou não, ou de terem participado de sua criação. E, claro, optar por não</p><p>seguir a lei traz consequências aos indivíduos (BES, 2018).</p><p>Já o conceito de ação social foi desenvolvido por Max Weber e se traduz na</p><p>ideia de que as pessoas fazem escolhas, possuem poder e participam ativamente da</p><p>criação de regras e condutas sociais que serão estabelecidas. Ou seja, os indivíduos</p><p>participam da formação da sociedade, não são passivos a ela, simplesmente</p><p>conduzidos. Pelo contrário, são responsáveis pela criação das regras, normas,</p><p>regulamentos e condutas da vida social, de forma racional.</p><p>Um exemplo desta ação social desenvolvida por Weber pode ser a criação de</p><p>uma medida econômica a ser posta em prática num determinado país ou, ainda, uma</p><p>decisão sobre pesquisa científica a ser realizada para um determinado fim (BES,</p><p>2018).</p><p>É interessante perceber, nesta lógica weberiana, que os sentidos que os</p><p>indivíduos dão às coisas têm muita relação com seus valores pessoais, individuais.</p><p>Podemos reconhecer este aspecto quando nos sentimos compelidos no cumprimento</p><p>de algum dever ou algum ato diante do qual nossa consciência ou senso de dignidade</p><p>nos chame a atenção (BES, 2018).</p><p>9.2 Estratificação social e classe social</p><p>Durante toda a existência da humanidade, as sociedades sempre foram</p><p>constituídas seguindo algum critério de divisão ou hierarquia que separava seus</p><p>membros e os enquadrava em grupos específicos, de acordo com algumas</p><p>59</p><p>características particulares. Podemos exemplificar valendo-nos das sociedades</p><p>feudais, nas quais basicamente existiam três divisões hierárquicas na sociedade da</p><p>época: o clero, os nobres e os camponeses. Estas categorias apresentavam uma</p><p>interdependência e tinham posições de poder bem marcadas por ocasião do</p><p>Feudalismo (BES, 2018).</p><p>Saindo da Idade Medieval, porém, estas divisões vão se modificando, aderindo</p><p>outros extratos, como a burguesia, e, então, novos formatos começam a ser utilizados</p><p>para realizar essa divisão da sociedade em grupos, também chamada de</p><p>estratificação social pelos teóricos da Sociologia (BES, 2018).</p><p>Émile Durkheim, influente pensador da Sociologia, ao analisar as divisões do</p><p>trabalho e suas influências na constituição da sociedade, ao defender o conceito de</p><p>solidariedade orgânica, compreende que:</p><p>No âmbito da solidariedade orgânica, os indivíduos são agrupados não mais</p><p>segundo suas relações de descendência, mas segundo a natureza particular</p><p>da atividade social a que se dedicam, seu meio natural e necessário deixa de</p><p>ser o meio de origem; agora é determinante o meio profissional. (DURKHEIM</p><p>apud GONZÁLES, 1998, p.185).</p><p>Este entendimento proposto pelas ideias de Durkheim é muito produtivo para</p><p>que possamos compreender como a nossa sociedade atual se encontra estratificada</p><p>também, tomando como um de seus parâmetros a questão profissional. Uma vez que</p><p>as pessoas acabam ocupando posições sociais mais ou menos elevadas de acordo</p><p>com os rendimentos auferidos na sua vida profissional, estas acabam determinando</p><p>as condutas a serem mantidas e perseguidas. Se não tenho uma profissão devo</p><p>buscar tê-la; se já a tenho, devo manter-me atualizado, procurando mais e mais</p><p>educação formal, aperfeiçoando-me, o que irá me proporcionar uma ascensão no meu</p><p>emprego, consequentemente, maior renda e, assim, ascensão social também (BES,</p><p>2018).</p><p>Porém, o estabelecimento do meio profissional como parâmetro de</p><p>estratificação nos leva, necessariamente, ao entendimento de que esta prática produz</p><p>desigualdades sociais. Cabe-nos, agora, antes de explorar melhor este tema,</p><p>conhecer o conceito de classe social (BES, 2018).</p><p>O conceito de classe social foi desenvolvido por Karl Marx, outro importante</p><p>pensador da Sociologia, que entendia que a divisão (estratificação) social era</p><p>60</p><p>ocasionada muito mais pelas questões de ordem econômica do que por quaisquer</p><p>outras. Segundo as palavras de Marx e Engels (1998, p. 7):</p><p>A história de todas as sociedades até o presente é a história das lutas de</p><p>classes. Homem livre e escravo, patrício e plebeu, senhor feudal e servo,</p><p>membro de corporação e oficial-artesão, em síntese, opressores e oprimidos</p><p>estiveram em constante oposição uns aos outros, travaram uma luta</p><p>ininterrupta, ora dissimulada, ora aberta, que a cada vez terminava com uma</p><p>reconfiguração revolucionária de toda a sociedade ou com a derrocada</p><p>comum das classes em luta.</p><p>Marx e Engels trazem o entendimento de que as classes sociais são</p><p>organizadas, divididas agrupando os indivíduos por características econômicas,</p><p>relacionadas à renda dos mesmos, modelo este utilizado ainda hoje nas classificações</p><p>da economia. Os autores entendiam haver uma discrepância muito grande, uma</p><p>relação fortemente assimétrica de poder entre aqueles que detinham o capital (no</p><p>momento de expansão e consolidação do sistema capitalista) e os trabalhadores,</p><p>entendidos como oprimidos pelo poder do capital (BES, 2018).</p><p>Trazendo as discussões propostas por Durkheim e Marx para a análise da</p><p>sociedade contemporânea, podemos perceber que a estratificação social ocorre em</p><p>nossos dias seguindo uma lógica de mercado, que leva às questões profissionais</p><p>citadas por Durkheim. Questões estas, porém, que acabam sendo determinantes da</p><p>classe social à qual o indivíduo irá pertencer, uma vez que seus rendimentos obtidos</p><p>profissionalmente lhe fornecem condições de pertencimento a esta ou àquela classe</p><p>(BES, 2018).</p><p>Realizando ainda uma conexão com a área da Educação, podemos perceber</p><p>que esta pode auxiliar, e muito, na inserção e nas melhorias conquistadas pelo</p><p>trabalhador frente a sua empresa. Atualmente, é notório o quanto a formação tem sido</p><p>valorizada pela absoluta maioria das organizações. Logo, quanto maior o nível de</p><p>educação formal a pessoa adquira, maiores chances tem de encontrar uma boa vaga</p><p>de emprego, com salário melhor, o que incide diretamente no pertencimento a uma</p><p>determinada classe. Isso nos leva a pensar naqueles que, por sua vez, não tiveram</p><p>acesso a uma educação formal de qualidade, que estarão em condição muito desigual</p><p>ou inferior no mercado de trabalho. Dessa forma, a própria educação, dentro desta</p><p>lógica de estratificação social, acaba agindo como mecanismo de produção de</p><p>desigualdades sociais (BES, 2018).</p><p>61</p><p>9.3 Sociedade, interação e cultura</p><p>Para que possamos ter um claro entendimento do conceito da própria</p><p>Sociologia enquanto ciência, precisamos ter bem estabelecido em nossas mentes o</p><p>conceito de sociedade. Conceito este que deve sempre ser entendido como o</p><p>somatório das ações, pensamentos e práticas que constituem os grupos que a</p><p>compõem, que transmitem suas regras e valores através da linguagem e de sua</p><p>cultura (BES, 2018).</p><p>Para melhor entendermos o conceito de sociedade, vamos acompanhar a</p><p>definição de Vila Nova (2013, p.221):</p><p>A sociedade humana nada mais é do que uma complexa teia de indivíduos e</p><p>grupos interagindo de acordo com significado por eles atribuídos a suas</p><p>ações, principalmente os significados derivados da cultura, em função de</p><p>interesses e objetivos interpessoais.</p><p>Partindo da citação do autor, temos elementos bem importantes para utilizar</p><p>em busca do entendimento mais amplo do que vem a ser a sociedade, de como esta</p><p>funciona. Basta pensar que, dentro desta “teia de grupos e indivíduos”, existem muitos</p><p>arranjos e combinações nas formas de ser e agir que foram sendo criadas,</p><p>desenvolvidas e perpetuadas através das culturas destes grupos. Cultura, aqui, é</p><p>entendida como este conjunto de práticas que são ensinadas, transmitidas de geração</p><p>a geração como as práticas sociais aceitas e legitimadas pela sociedade (BES, 2018).</p><p>A cultura dos grupos sociais dos quais participamos acaba influenciando,</p><p>moldando e, muitas vezes, até mesmo regulando e conduzindo nossas condutas.</p><p>Através da cultura, aprendemos o significado de alguns papéis que iremos assumir</p><p>dentro desta população e nos posicionamos por entender que os objetivos desta</p><p>coletividade se aproximam ou se igualam aos nossos.</p><p>É claro que um dos aspectos a ser observado ainda é que, no interior da</p><p>sociedade, dentro do universo cultural e intercultural (entre as diferentes culturas),</p><p>ocorrem as interações que são objeto de estudo da Sociologia. Interações estas que,</p><p>ao mesmo tempo que ocorrem de forma harmoniosa em alguns casos, também</p><p>podem produzir preconceitos, discriminações e desigualdades (BES, 2018).</p><p>Como vimos anteriormente, ao estudarmos o conceito de classes sociais e</p><p>estratificação, podemos perceber que, no interior de cada classe, os indivíduos se</p><p>agrupam em torno da identificação de suas semelhanças e percebem, normalmente,</p><p>62</p><p>sua relação de inferioridade ou superioridade econômica em relação aos demais, o</p><p>que acaba trazendo à tona estes efeitos, como o racismo e o preconceito.</p><p>Numa sociedade global, marcada pelo governo através das leis do mercado e</p><p>que sugere o consumo como um dos principais objetivos a ser perseguido pelos</p><p>indivíduos, fica evidente que as assimetrias entre os grupos sociais que possuem</p><p>maior ou menor renda se acentuem (BES, 2018).</p><p>Cabe ao docente, ao desenvolver suas atividades no interior das escolas,</p><p>sejam públicas ou privadas, conversar com seus alunos sobre estas questões</p><p>sociológicas, fazendo com que adquiram consciência crítica e capacidade de análise</p><p>sobre as diversas situações observadas na sociedade, como a histórica má</p><p>distribuição de renda no Brasil, a pobreza que ainda existe, o analfabetismo, o trabalho</p><p>infantil, a prostituição, o tráfico de drogas que alicia e recruta crianças diariamente,</p><p>entre tantas outras mazelas sociais que estão ao nosso redor (BES, 2018).</p><p>Cabe destacar que os indivíduos, dentro da visão da Sociologia, não são</p><p>autônomos, mas sim o produto das sociedades em que nasceram, cresceram e se</p><p>desenvolveram. Nestas relações e interações que ocorrem na sociedade, os</p><p>indivíduos também irão participar, porém, continuarão vivendo a partir dos preceitos,</p><p>regras e normas adotados/criados pela sociedade.</p><p>Segundo Tomazi (2000, p.16):</p><p>Interessa para a Sociologia, portanto, não o indivíduo isolado, mas inter- -</p><p>relacionado com os diferentes grupos sociais dos quais faz parte, como a</p><p>escola, a família, as classes sociais, etc. Não é o “homem” enquanto ser</p><p>isolado da história que interessa a estudo da sociedade, mas “os homens”</p><p>enquanto seres que vivem e fazem a história.</p><p>Finalizando essa análise sobre as inter-relações entre as interações que</p><p>ocorrem no interior das diversas culturas que compõem a sociedade, objeto de estudo</p><p>da Sociologia, cabe-nos destacar da citação do autor que a ênfase das análises</p><p>sociológicas sempre recairá sobre os homens em sua coletividade. Observamos,</p><p>ainda, que uma das instituições na qual ocorrem estas relações sociais entre os</p><p>indivíduos é a escola, onde podemos estar atuando e, de certa forma, ajudando a</p><p>construir e projetar os balizadores da sociedade atual e futura (BES, 2018).</p><p>63</p><p>64</p><p>10 REFERÊNCIAS</p><p>ARAUJO, Sandro A. Fundamentos Da Sociologia E Antropologia. Soluções</p><p>Educacionais Integradas – SAGAH, 2019.</p><p>AUGUSTINHO, Aline M. N. Sociologia Contemporânea. Soluções Educacionais</p><p>Integradas – SAGAH, 2017.</p><p>BARBOSA, Anderson. Questão Social, Direitos Humanos E Diversidade. Soluções</p><p>Educacionais Integradas – SAGAH, 2019.</p><p>BES, Pablo R. Sociologia Da Educação. Soluções Educacionais Integradas –</p><p>SAGAH, 2018.</p><p>GIACOMELLI, Cinthia L. F. Introdução Ao Estudo Do Direito. Soluções</p><p>Educacionais Integradas – SAGAH, 2011.</p><p>GOLDSPAN, P. B. R. B, Sociologia Da Educação. Soluções Educacionais</p><p>Integradas – SAGAH, 2018.</p><p>MELO, Débora. Fundamentos Da Sociologia E Antropologia. Soluções</p><p>Educacionais Integradas – SAGAH, 2016.</p><p>sociologia para denominar a nova ciência</p><p>e proclamasse a necessidade, a conveniência e a possibilidade de aplicação</p><p>dos princípios da ciência – até então aplicados apenas ao estudo dos</p><p>fenômenos da natureza – ao conhecimento da sociedade, os filósofos se</p><p>ocuparam da explicação dos fenômenos sociais. As reflexões de Platão, de</p><p>Aristóteles, por exemplo, na Antiguidade, ou mesmo de Maquiavel, já no</p><p>século XVI, apesar de toda a revisão, no Renascimento, das ideias</p><p>tradicionais até então predominantes, são muito diversas das teorias</p><p>sociológicas. A reflexão filosófica a respeito da sociedade difere da sociologia</p><p>tanto nos resultados quanto, principalmente, na maneira de alcançá-los.</p><p>A citação do autor nos aponta algumas questões muito interessantes, como a</p><p>busca do homem em fornecer explicações para os fenômenos sociais que nos</p><p>acompanham há muito tempo e a distinção entre a sociologia e a Filosofia enquanto</p><p>ciências.</p><p>Dentre os inúmeros conceitos apontados em busca de uma definição do que</p><p>seria a sociologia, veja o que nos dizem Lakatos e Marconi (1990, p. 22):</p><p>Estudo científico das relações sociais, das formas de associação,</p><p>destacando-se os caracteres gerais comuns a todas as classes de</p><p>fenômenos sociais, fenômenos que se produzem nas relações de grupos</p><p>entre seres humanos. Estuda o homem e o meio humano em suas interações</p><p>reciprocas. A sociologia não é normativa, nem emite juízos de valor sabre os</p><p>tipos de associação e relações estudados, pois se baseia em estudos</p><p>7</p><p>objetivos que melhor podem revelar a verdadeira natureza dos fenômenos</p><p>sociais. A sociologia, desta forma, é o estudo e o conhecimento objetivo da</p><p>realidade social.</p><p>Como podemos perceber na conceituação das autoras, para a sociologia</p><p>interessam como principais focos de análise as relações entre os homens no meio em</p><p>que vivem.</p><p>2.2 O percurso histórico do surgimento da sociologia</p><p>Para que possamos entender de forma mais consistente o surgimento da</p><p>sociologia, precisamos pontuar alguns aspectos históricos que colaboram para que</p><p>isto ocorra. Para essa tarefa iremos nos remeter ao século XVIII e às transformações</p><p>que ocorrem na sociedade nos aspectos políticos e econômicos.</p><p>Claro que, antes disso, devemos apontar grandes acontecimentos históricos</p><p>que antecedem o surgimento da ciência como um todo e que modificam a forma como</p><p>a sociedade irá pensar e agir. Entre eles, temos, no século XV, os esforços em busca</p><p>de expansão territorial das nações europeias, conhecido como o período das Grandes</p><p>Navegações, e o estabelecimento de colônias nas Américas, na Ásia e na África, o</p><p>que acelera o desenvolvimento da economia monetária e fortalece a burguesia destes</p><p>países. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>No século XVI, temos a Reforma Protestante, que marca um rompimento entre</p><p>o pensamento ou conhecimento teológico (explicações divinas) e o conhecimento</p><p>racional (explicações pela razão do homem). A Reforma Protestante vai muito além</p><p>da simples ruptura do modo de pensar da Igreja da época e da contestação dos</p><p>poderes papais, pois representa a busca do próprio homem para as explicações dos</p><p>8</p><p>fenômenos que ocorrem ao seu redor. Segundo Tomazi (2000), essa nova forma de</p><p>conhecimento da natureza e da sociedade, na qual a experimentação e a observação</p><p>são fundamentais, aparece neste momento, representada pelas ideias e pelas obras</p><p>de diversos pensadores, entre os quais Nicolau Maquiavel (1469-1527), Galileu Galilei</p><p>(1564-1642), Thomas Hobbes (1588-1679), Francis Bacon (1561-1626), René</p><p>Descartes (1596-1650). Junto com esses, há outros dois pensadores que farão a</p><p>ponte entre esses novos conhecimentos e os que se desenvolverão no século</p><p>seguinte: John Locke (1632-1704) e Isaac Newton (1642-1727).</p><p>Já no século XVII, percebemos a ascensão da burguesia comercial nos países</p><p>europeus, que se estendia a todo o restante do mundo. Nesta época, irão surgir novos</p><p>formatos de organização da produção das manufaturas, criando novos inventos que</p><p>pudessem aprimorar os processos e diminuíssem o número de pessoas envolvidas</p><p>neles. É quando surgem as primeiras máquinas de tecer, descascar algodão, as</p><p>máquinas a vapor, etc. O trabalho mecânico começa a ser utilizado paralelamente ao</p><p>trabalho artesanal. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>O século XVIII começa em meio a toda essa ebulição de novas descobertas</p><p>focadas na produção e numa sociedade em modificação, proposta pelos eventos</p><p>anteriores. Da mesma forma, a Revolução Inglesa ocorrida no século anterior irá</p><p>inspirar as Revoluções Americanas e Francesas e irá trazer novos formatos de</p><p>organização política para as nações. As transformações nas esferas da produção, a</p><p>emergência de novas formas de organização política e a exigência de representação</p><p>popular dão características muito específicas a esse século, em que pensadores como</p><p>Montesquieu (1689-1755), David Hume (1711-1776), Jean-Jaques Rousseau (1712-</p><p>1778), Adam Smith (1723-1790) e Immanuel Kant (1724-1804), entre outros,</p><p>procurarão, por caminhos às vezes divergentes, refletir sobre a realidade, na tentativa</p><p>de explicá-la (TOMAZI, 2000).</p><p>Estas tentativas de busca por explicações das novas realidades no século XVIII</p><p>citadas pelo autor irão servir de base para o surgimento da sociologia como uma</p><p>ciência; ciência esta que nasce em meio à consolidação do sistema capitalista. No</p><p>início do século XIX, pensadores como Saint-Simon, Hegel e David Ricardo irão fazer</p><p>com que Auguste Comte (1798-1857) e Karl Marx (1818-1883) venham a refletir sobre</p><p>a sociedade, porém de maneiras muito divergentes. Comte irá focar seus</p><p>pensamentos em busca de uma filosofia positiva, que busca a explicação dos</p><p>9</p><p>fenômenos e a modificação da maneira de pensar do homem utilizando as ciências</p><p>existentes na época e propondo uma reforma prática das instituições. Outro expoente</p><p>da sociologia que irá se inspirar nas ideias propostas por Comte nesta época é Emile</p><p>Durkheim.</p><p>Karl Marx e Friederich Engels, por sua vez, irão analisar os aspectos sociais,</p><p>econômicos, políticos, ideológicos, religiosos, entre outros, sem a preocupação de</p><p>definição de uma ciência específica para tal, como a sociologia representava para</p><p>Auguste Comte. Suas análises procuraram focar as mudanças nos processos</p><p>produtivos, o surgimento da sociedade capitalista, visando fornecer aos trabalhadores</p><p>condições de melhor analisar o contexto em que se encontram vivendo e as relações</p><p>entre as classes trabalhadoras e capitalistas. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>Podemos dizer que a sociologia como ciência, acadêmica, irá afirmar-se nas</p><p>obras de Émile Durkheim, na França, e de Max Weber, na Alemanha; ambos</p><p>preocupados em integrar a sociologia aos aspectos científicos necessários para</p><p>garantir os métodos e teorias necessárias para tal afirmação.</p><p>2.3 Características da sociologia como ciência</p><p>A sociologia apresenta alguns aspectos bem particulares que a distinguem de</p><p>outras Ciências Sociais, como a Antropologia, a Economia ou a Filosofia Social.</p><p>Vamos conhecer, agora, alguns destes aspectos que caracterizam a sociologia</p><p>enquanto ciência. (GOLDSPAN, 2018)</p><p> Indução como método predominante — através da observação</p><p>sistemática e planejada dos fatos, de casos bem particulares e</p><p>específicos, a sociologia vai formulando, construindo suas teorias e</p><p>10</p><p>explicações acerca da vida em sociedade. Lembramos que a</p><p>observação sistemática faz parte da própria característica de toda a</p><p>ciência que se vale do método científico para o estabelecimento de suas</p><p>regras e verdades sobre o objeto estudado; com a sociologia não é</p><p>diferente!</p><p> Neutralidade valorativa — não cabe à sociologia realizar juízos de valor</p><p>sobre os objetos e fatos pesquisados, ou afirmar e estabelecer o certo e</p><p>o errado, o justo e o injusto, como faria a Ética. Tampouco apontar o que</p><p>deveria ser feito, o que seria legítimo, como faz o Direito. A sociologia</p><p>estuda as relações que ocorrem na sociedade,</p><p>tentando classificar e</p><p>identificar seus componentes, porém isentando-se de julgá-los,</p><p>deixando de exercer os juízos binários que comentamos anteriormente</p><p>entre o que é bom e mau para a sociedade.</p><p> Moralmente neutra — este aspecto refere-se ao não estabelecimento de</p><p>juízos de valores que falamos antes; porém, o sociólogo possui</p><p>compromisso moral com a verdade que foi buscada através da</p><p>observação realizada sobre os fenômenos sociais. É preocupação dos</p><p>sociólogos, também, não permitir que suas questões morais pessoais</p><p>interfiram nos resultados de suas análises, nas suas percepções e</p><p>leituras sobre as mais diversas realidades sociais que estejam sendo</p><p>observadas/ pesquisadas.</p><p> A transitoriedade — a sociologia estabelece o estudo de fatos que</p><p>venham a acontecer na sociedade com uma certa regularidade. Esta</p><p>observação, porém, pode ser modificada com o próprio desenvolvimento</p><p>ou reconfiguração destes aspectos observados pelo pesquisador com o</p><p>passar do tempo. Ou seja, as teorias e análises sociológicas efetuadas</p><p>anteriormente sobre algum fato social poderão vir a ser reformuladas em</p><p>observações posteriores sobre este mesmo objeto pesquisado, o que</p><p>caracteriza este aspecto da transitoriedade.</p><p> A busca pela classificação — as atividades do cientista sociólogo vão</p><p>além dos pressupostos estabelecidos pelo método científico, como a</p><p>elaboração de hipóteses, a observação em si, as generalizações típicas</p><p>e a criação de teorias. O sociólogo também se encarrega da busca pela</p><p>11</p><p>classificação dos fenômenos que ocorrem no tecido social. Essas</p><p>classificações são observadas nos esforços em dividir a sociedade em</p><p>partes, como: grupos, culturas, categorias, castas, classes, entre outros.</p><p>Entender estes princípios é muito importante neste momento, pois são</p><p>marcadores que serão utilizados pelo sociólogo em suas análises e são estes que</p><p>reforçam o caráter científico da sociologia, ciência, conforme vimos anteriormente, que</p><p>nasce dentro do contexto do surgimento e afirmação da própria racionalidade</p><p>científica proposta no século XIX, através dos estudos de Francis Bacon e Renée</p><p>Descartes, principalmente com a criação do Método Científico. (GOLDSPAN, 2018)</p><p>3 TEORIAS SOCIOLÓGICAS CLÁSSICAS</p><p>Neste capítulo, você vai conhecer as principais teorias que fundamentaram a</p><p>abordagem clássica da sociologia. Essas teorias foram a razão da consolidação da</p><p>sociologia como ciência. Além disso, forneceram as bases para a profissionalização</p><p>do campo, no século XX. Como você vai ver, as teorias clássicas estão intimamente</p><p>ligadas com rupturas estruturais e com a reorganização das relações sociais</p><p>provocada pela Revolução Industrial.</p><p>Você vai ver que essas teorias deram origem a correntes sociológicas</p><p>específicas no século XX, como o funcionalismo, a teoria do conflito, o estruturalismo</p><p>e o interacionismo simbólico. Além disso, você vai verificar que as transformações</p><p>ocorridas entre o final do século XX e o início do XXI promoveram novos olhares sobre</p><p>e da sociologia. Porém, esses novos olhares continuam buscando referências nas</p><p>teorias clássicas (AUGUSTINHO, 2017).</p><p>12</p><p>https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/pensadores-classicos-sociologia.htm</p><p>3.1 Teorias sociológicas clássicas e a solução das questões sociais</p><p>As teorias sociológicas combinam instrumentos de identificação de estruturas</p><p>e dinâmicas sociais a uma teoria que as explica. São compostas, portanto, por teoria</p><p>e método de análise específicos. É possível que um pesquisador utilize uma teoria</p><p>sociológica já estabelecida como base para o seu trabalho, mas acrescente a ela suas</p><p>perspectivas particulares, novos conceitos. Quando isso acontece, há a criação de</p><p>uma “corrente” ou uma “escola sociológica”: um conjunto de pesquisadores que</p><p>utilizam como base as teorias e métodos de um pesquisador pioneiro. Nesse caso,</p><p>eles corroboram a visão precursora, mas acrescentam suas perspectivas particulares</p><p>ou novas possibilidades de metodologia de pesquisa ou análise/interpretação de</p><p>dados (AUGUSTINHO, 2017).</p><p>Por exemplo: Marx elaborou a teoria do materialismo histórico. Essa é uma</p><p>teoria marxista. Autores que posteriormente utilizam esse aporte teórico estão se</p><p>valendo de uma teoria marxista. Se eles utilizam a mesma teoria para explicar outras</p><p>abordagens, que aprofundam, esclarecem ou fortalecem essa teoria, então são parte</p><p>de uma “escola” de produção de conhecimento — no caso, a escola marxista. O</p><p>mesmo acontece com os outros teóricos clássicos da sociologia.</p><p>13</p><p>3.2 Teorias sociológicas contemporâneas: funcionalista, de conflito e</p><p>interacionista</p><p>O século XX não ofereceu rupturas tão intensas como as vividas pelos teóricos</p><p>da sociologia no século XIX. Contudo, ofereceu transformações mais rápidas e mais</p><p>eventos de instabilidade social, política e econômica, além de duas guerras mundiais.</p><p>Por isso, os sociólogos que emergem nesse contexto trabalham com cenários</p><p>diferentes dos vividos pelos autores clássicos. Mas, por outro lado, se apoiam nas</p><p>teorias desses autores para estabelecer suas próprias leituras, fomentando o que se</p><p>denomina sociologia contemporânea (AUGUSTINHO, 2017).</p><p>A sociologia contemporânea passa a produzir análises segmentadas das</p><p>interações culturais, menos amplas do que as dos teóricos clássicos, que abarcavam</p><p>economia, política e sociedade. Elas se concentram em facetas, como a cultura, o</p><p>trabalho ou a identidade, por exemplo, embora esses segmentos tenham conexões</p><p>com os cenários políticos e econômicos e estes permaneçam sendo estudados. Uma</p><p>marca da sociologia do século XX foi a continuidade das escolas sociológicas. Por</p><p>isso, as produções marxistas, weberianas e durkheimianas fomentaram as leituras</p><p>contemporâneas, como o funcionalismo, o interacionismo e a teoria do conflito.</p><p>A perspectiva funcionalista compreende a função social sistêmica como um</p><p>organismo ou uma engrenagem. Assim, cada parte contribui para a formação do todo.</p><p>Nesse sentido, o todo é o foco, já que o objetivo dos órgãos é permitir que o organismo</p><p>sobreviva, ou o objetivo das engrenagens é permitir que o maquinário funcione.</p><p>Derivado especialmente da abordagem de Durkheim, o funcionalismo teve especial</p><p>influência nas leituras e produções antropológicas da primeira metade do século XX,</p><p>nas obras de Marcel Mauss e Radcliffe-Brown, por exemplo. Há ainda a derivação</p><p>teórica para o funcional-estruturalismo.</p><p>As teorias sociológicas do conflito são aquelas derivadas da noção de</p><p>mudança estrutural a partir de tensões entre partes sociais, como no caso em que</p><p>Marx definiu a luta de classes como o motor da história. Portanto, tratam-se de leituras</p><p>marxistas (que aplicam as mesmas teorias em suas abordagens científicas) e</p><p>derivadas do marxismo (que utilizam o aporte metodológico de Marx, mas que</p><p>consideram outras particularidades e teorias).</p><p>A teoria sociológica interacionista, conhecida também como interacionismo</p><p>simbólico, é derivada da sociologia compreensiva, que esteve presente nas leituras</p><p>14</p><p>weberianas. Parte do princípio de que as sociedades e culturas são diferentes.</p><p>Portanto, o significado social de uma ação precisa ser compreendido a partir do</p><p>sistema simbólico presente naquela cultura. A ação seria preenchida de significado</p><p>por meio da leitura simbólica de outras ações semelhantes que dão sentido à ação</p><p>individual.</p><p>3.3 Teorias sociais contemporâneas e a profissionalização da sociologia</p><p>A sociologia contemporânea surge de um processo que só foi possibilitado</p><p>pelas leituras e teorias promovidas pelos autores das teorias clássicas: a</p><p>profissionalização. A profissionalização trouxe a possibilidade de que profissionais da</p><p>área da sociologia exercessem as análises, em detrimento de profissionais de áreas</p><p>correlatas, especialmente da filosofia, da economia e do direito. Trata-se do produto</p><p>de um esforço realizado por décadas até que, a partir</p><p>da década de 1930, pudesse se</p><p>concretizar. A profissionalização, no entanto, levou os sociólogos profissionais à</p><p>especialização. As teorias sociais clássicas emergem como forma de resposta ao</p><p>caos e à instabilidade provocados pelas rupturas sistêmicas dos séculos XVIII e XIX;</p><p>elas procuravam demonstrar uma saída. As teorias sociais especializadas, porém,</p><p>oferecem inúmeras abordagens intelectuais sobre especificidades das ações e</p><p>comportamentos sociais (AUGUSTINHO, 2017).</p><p>Entre 1930 e 1960, a teoria social proposta por Talcott Parsons fundamentou</p><p>as leituras sociológicas em todo o mundo. Parsons propunha uma leitura social</p><p>estrutural-funcionalista, segundo a qual as estruturas sociais, especialmente as de</p><p>dominação, condicionavam os comportamentos sociais (BAERT; SILVA, 2014). Por</p><p>isso, leituras em que existiam parâmetros de transferência de valores e regras de</p><p>comportamento se estabeleceram, como as que tratam de trocas entre culturas e</p><p>entre gerações. A alteração de paradigma acontece com as mobilizações estudantis</p><p>na década de 1960 e os confrontos contra as ditaduras no Cone Sul e na África. As</p><p>mobilizações sociais colocaram a sociedade civil numa forma de diálogo</p><p>horizontalizado com os Estados, e não mais verticalizado, seguindo as determinações</p><p>políticas institucionais.</p><p>Sociólogos como Karl Mannheim têm suas leituras pautadas nesse contexto,</p><p>assim como profissionais brasileiros, como Marialice Foracchi. As décadas de 1970 e</p><p>15</p><p>1980 abriram o espaço para as leituras do interacionismo simbólico, que relativizavam</p><p>as ações sociais a partir da constituição do espaço social em que emergiam. Afinal,</p><p>as mobilizações estudantis, por exemplo, que emergiram num mesmo segmento</p><p>temporal, se desenrolaram com múltiplos resultados nos diversos países em que</p><p>aconteceram. Nesse momento, emergem sociólogos como Pierre Bourdieu (que</p><p>carrega também pontos da sociologia francesa pautada em Durkheim). Há a tentativa</p><p>de aliar a sociologia estruturalista à perspectiva interpretativa, de modo que</p><p>extrapolasse as versões anteriores que se pautavam em determinismo e voluntarismo.</p><p>Os sociólogos procuravam o caminho do meio, com propensão a uma ou outra</p><p>direção.</p><p>O fim do século XX trouxe aos sociólogos novas perspectivas e novas questões</p><p>sociais (provocadas pela Terceira Revolução Industrial), que algumas das teorias</p><p>clássicas já não ajudavam a responder. As tecnologias alteraram novamente os</p><p>sistemas e padrões de produção e consumo. Mas a mais intensa alteração se deu no</p><p>tocante à maleabilidade das fronteiras territoriais provocadas pela globalização e</p><p>pelas telecomunicações, especialmente pela internet. O novo paradigma põe em</p><p>questionamento o que é o Estado e quem é o indivíduo na modernidade. As</p><p>identidades se tornam voláteis e, ao mesmo tempo, há uma busca para que elas não</p><p>se dissolvam completamente. Nesse cenário, emergem leituras que analisam as</p><p>relações estabelecidas, como em Manuel Castells, e a quebra de conexões sociais</p><p>reais fomentada pelo isolacionismo tecnológico, como em Zygmunt Bauman e em</p><p>Boaventura Sousa Santos (AUGUSTINHO, 2017).</p><p>O século XXI permite à sociologia uma abordagem mais etnológica quanto às</p><p>questões identitárias, mas também imprime a responsabilidade política da</p><p>manutenção das identidades culturais, especialmente nas temáticas sobre feminismo</p><p>e raça, como em Judith Butler e na retomada de Angela Davis por trabalhos como os</p><p>de Chimamanda Ngozi Adichie.</p><p>4 A SOCIOLOGIA DO DIREITO COMO CIÊNCIA SOCIAL</p><p>A sociologia do Direito como ciência social tem por objeto o estudo das relações</p><p>concretas entre o Direito e a sociedade. Para compreender tal fenômeno, você vai</p><p>estudar, neste capítulo, o conceito de sociologia do Direito, também chamada de</p><p>16</p><p>sociologia jurídica, após recordar os conceitos da sociologia e do Direito. Além disso,</p><p>você vai identificar a sociologia do Direito e no Direito, e como essas ciências se</p><p>relacionam, bem como ler sobre a influência da sociologia no estudo do Direito e</p><p>analisar as abordagens aqui destacadas (MELO, 2016).</p><p>https://estudodireito.com/resumos-esquematizados/sociologia-juridica/</p><p>4.1 Conceito e objeto da sociologia do Direito</p><p>Para que você entenda o conceito da sociologia do Direito, também conhecida</p><p>como sociologia jurídica, é importante recordar as definições da sociologia e do Direito</p><p>para precisar o conceito e o objeto da sociologia do Direito ou jurídica.</p><p>De acordo com o professor Ricardo Soares (2012, p. 15), a sociologia “é uma</p><p>ciência que estuda os modos de criação e organização das relações e instituições</p><p>sociais, abordando as conexões recíprocas entre os indivíduos e a sociedade”.</p><p>17</p><p>Tratando-se do conceito de Direito, para o professor Sérgio Cavalieri Filho</p><p>(2015), o Direito é um conjunto de normas de conduta, universais, abstratas,</p><p>obrigatórias e mutáveis, impostas pelo grupo social, destinadas a disciplinar as</p><p>relações externas do indivíduo com o objetivo de prevenir e compor conflito.</p><p>Partindo dessas definições, é possível destacar e traçar os principais aspectos</p><p>da sociologia e do Direito:</p><p> estudo das relações e instituições sociais, sociedade, em relação à</p><p>sociologia;</p><p> conjunto de normas de conduta que disciplinam as relações externas do</p><p>indivíduo (prevenção), pontos destacáveis em relação ao Direito.</p><p>Nesse sentido, segundo entendimento do professor Ricardo Soares (2012, p.</p><p>16), a sociologia do Direito, ou sociologia jurídica, é um:</p><p>Ramo da Sociologia Geral e que tem por objeto o estudo das relações</p><p>concretas entre o Direito e a sociedade, ou seja, busca investigar a influência</p><p>da sociedade na formação do direito, bem como o influxo do fenômeno</p><p>jurídico no campo das relações humanas em sociedade.</p><p>Para o professor Sérgio Cavalieri Filho (2015), a sociologia do Direito, ou</p><p>sociologia jurídica, descreve a realidade social do Direito sem levar em conta a sua</p><p>normatividade. Preocupa-se com a existência do Direito como produto ou fenômeno</p><p>social, decorrente das inter-relações sociais, não como foi concebido ou equacionado</p><p>pelo legislador. Dessa forma, fica evidenciado que o objeto da sociologia jurídica, ou</p><p>18</p><p>sociologia do Direito, é o estudo dos fatos sociais com relação à criação e aplicação</p><p>do Direito.</p><p>A definição da sociologia do Direito, ou sociologia jurídica, evidencia como é</p><p>constante e profunda a relação entre as duas ciências, ou seja, entre o Direito e a</p><p>sociologia, visto que, independentemente das suas definições primárias, ambas se</p><p>encontram conexas no que diz respeito à sociedade.</p><p>4.2 Sociologia do Direito e no Direito</p><p>Com o avanço da tecnologia, novas formas de relações sociais foram</p><p>estabelecidas na sociedade, principalmente quanto à comunicação e mudança</p><p>comportamental em relação a opiniões públicas sobre temas considerados polêmicos.</p><p>A globalização repercute diretamente no modo de vida do indivíduo, bem como no</p><p>funcionamento do Estado, que, apesar das suas debilidades funcionais estruturais,</p><p>busca assegurar, como um todo, as garantias constitucionais aos cidadãos. Nesse</p><p>sentido, convém destacar a opinião do professor Antonio Sérgio Spagnol (2013, p.</p><p>20):</p><p>O Estado, que antes aparecia como intervencionista através de planos</p><p>mirabolantes, sofre agora com a influência de novos agentes políticos,</p><p>econômicos e sociais que não levam em consideração nenhum tipo de</p><p>fronteira e estão presentes em todos os momentos e lugares. Temos diante</p><p>de nós um novo cenário que se descortina e que exige uma nova</p><p>configuração nas relações humanas. A sociologia busca assim analisar essas</p><p>mudanças e instrumentalizar o direito para tentar compreender esse novo</p><p>cenário.</p><p>De acordo com o professor Reinaldo Dias (2014), os sociólogos Émile</p><p>Durkheim (1858–1917) e Max Weber (1864–1920) foram responsáveis por consolidar</p><p>19</p><p>a sociologia do Direito como uma disciplina autônoma e com um sistema</p><p>conceitual</p><p>próprio no campo jurídico. Além disso, os métodos científicos utilizados por estes e</p><p>outros pensadores, como, por exemplo, Karl Marx, contribuíram para o estudo da</p><p>sociedade.</p><p>Segundo o professor Richard Schaefer (2006, p. 45), o método científico “é uma</p><p>série organizada e sistemática de passos que garante a máxima objetividade e</p><p>uniformidade à pesquisa de um problema”. Seguindo o raciocínio sobre a aplicação</p><p>dos métodos, é importante destacarmos que, segundo o filósofo e sociólogo francês</p><p>Levy Brühl (1997, p. 100–117), os métodos empregados por um juristicista ao realizar</p><p>pesquisas se resumem em:</p><p>Observação — apresenta-se sob aspectos diferentes, dependendo de se os</p><p>fenômenos jurídicos estudados se encontram em sociedades contemporâneas de tipo</p><p>moderno (a sua principal fonte de informação são as fontes escritas, como a</p><p>jurisprudência, coletânea de leis e registro, sendo o inquérito e as estatísticas</p><p>procedimentos técnicos que facilitam o trabalho do juristicista), sociedades</p><p>contemporâneas de tipo arcaico (em consequência da falta da escrita, a observação</p><p>do pesquisador é realizada no próprio lugar, pois assim o pesquisador terá ampla</p><p>visão sobre a estrutura jurídica e econômica das sociedades contemporâneas de tipo</p><p>arcaico) ou sociedades desaparecidas (a observação é baseada na natureza dos</p><p>vestígios deixados pelos povos, por exemplo, os documentos jurídicos de povos da</p><p>Mesopotâmia).</p><p>Interpretação — consiste no exame e na classificação dos fatos sociais</p><p>coletados, extraindo-se deles as primeiras conclusões. Para isso, o pesquisador utiliza</p><p>vários métodos, como, por exemplo, o dedutivo (o que vale para o geral há de valer</p><p>para o particular) e o indutivo (o que vale para o particular há de valer para o geral).</p><p>Convém destacar que a aplicação dos métodos dedutivo e indutivo é objeto de</p><p>questionamento.</p><p>Comparação — ao aplicar o Direito, o jurista recorre à comparação (outras</p><p>sentenças, costumes, entre outros). O método comparativo pode ser realizado por um</p><p>plano temporal, histórico (também chamado de plano vertical, no qual comparam-se</p><p>os resultados de observações realizadas em uma mesma sociedade, mas em épocas</p><p>diferentes) e pode ser realizada por um plano espacial, geográfico, também chamado</p><p>20</p><p>de plano horizontal. Nesse plano, a comparação é feita entre os resultados obtidos</p><p>nas observações efetuadas em diferentes sociedades contemporâneas.</p><p>O jurista, ao valer-se de tais métodos, principalmente da observação e da</p><p>comparação, evita que haja violação da norma jurídica e que não seja preciso a</p><p>aplicação de sanções, visto que, segundo o professor Eduardo Iamundo (2013, p. 60),</p><p>“as normas do Direito servem simultaneamente como instrumentos para conformar de</p><p>modo sistemático a convivência social”. Cabe destacarmos, nesse sentido, que a</p><p>eficácia da norma jurídica depende de uma circunstância sociológica, ou seja, social.</p><p>Além disso, quanto à interação da sociologia do Direito ou jurídica no Direito, a</p><p>lei, segundo Eduardo Iamundo (2013, p. 62), “tem participação na manutenção e</p><p>transmissão dos fatores que compõem o meio social, assim as transformações sociais</p><p>devem ser observadas e obrigatoriamente incorporadas à lei”. Nesse sentido,</p><p>analisando a atualidade, temas como a transexualidade, o aborto de filhos gerados</p><p>por barriga de aluguel e a robótica humana devem ser observados, comparados,</p><p>interpretados e incorporados à lei, compaginado assim a sociologia, o Direito em</p><p>profusão dos estudos e do aperfeiçoamento da aplicação de estudos da sociologia</p><p>jurídica.</p><p>A legalização da maconha, por exemplo, destaca-se como tema de constante</p><p>debate sociojurídico no cenário brasileiro.</p><p>4.3 Influência da sociologia no estudo do Direito</p><p>Partindo do pressuposto de que o Direito é um fenômeno social, no qual as</p><p>normas são, em regra, estabelecidas para prevenir e sancionar os conflitos individuais</p><p>ou coletivos, a sociologia jurídica ou sociologia do Direito serve como ferramenta para</p><p>que o legislador crie, altere ou extinga uma norma jurídica.</p><p>21</p><p>Dessa forma, é importante que o legislador esteja atento à realidade social, pois</p><p>é por meio da observação da mudança comportamental da sociedade que o legislador</p><p>terá condições de idealizar a melhor norma para assegurar ou punir determinado ato.</p><p>A inobservância das mudanças sociais faz leis obsoletas seguirem existindo e projetos</p><p>de leis inócuos serem criados, que de nada contribuem para o progresso jurídico social</p><p>democrático de um Estado.</p><p>Além disso, os operadores do Direito — como juízes, advogados, promotores,</p><p>defensores, delegados e outros — valem-se da sociologia jurídica para analisar o caso</p><p>sobre o qual terão que expressar uma opinião jurídica. Como consequência, é cada</p><p>vez mais comum que juízes realizem interpretações extensivas ou restritivas a partir</p><p>da coleta de informações sociais sobre o caso em apreciação.</p><p>Nesse sentido, os costumes, a analogia e a eficácia da norma são utilizados</p><p>como recursos na aplicação da norma jurídica e, por exemplo, no convencimento de</p><p>um juiz.</p><p>A observância dos fatos sociais contribui para que o jurista, ao aplicar o Direito,</p><p>busque previamente entender o motivo da motivação do ato que requer a aplicação</p><p>do Direito, pois, assim, a partir da sociologia do Direito, o profissional do Direito terá</p><p>condições de estabelecer parâmetros e propor medidas de combate ao crescente</p><p>número de casos de violência sexual realizados em transportes públicos, suicídio de</p><p>jovens incentivados por jogos virtuais, alimentos geneticamente modificados, entre</p><p>outros.</p><p>Segundo o professor Reinaldo Dias (2014), os principais fatores sociais que</p><p>influenciam o Direito são:</p><p>Desenvolvimento econômico — as normas jurídicas são adaptadas segundo</p><p>o processo de produção, forma de distribuição e níveis de consumo. Um exemplo</p><p>disso é a diferenciação de sociedades agrícolas e industrializadas.</p><p>Transformações sociais — a Lei Maria da Penha (Lei nº. 11.340, de 7 de</p><p>agosto de 2006, que combate à violência doméstica) e a Lei Carolina Dickman (Lei nº.</p><p>12.737, de 30 de novembro de 2012, que combate ao crime cibernético) são exemplos</p><p>de fatos sociais que implicaram na mudança no Direito. Acompanhando as</p><p>transformações sociais e a evolução da ciência, é cada vez mais comum a divulgação</p><p>de novas pesquisas de reprodução humana, como a divulgada no ano de 2014, que</p><p>causou polêmica social em consequência de cientistas ingleses e americanos criarem</p><p>22</p><p>embriões humanos a partir do DNA de um homem e duas mulheres. Em caso de</p><p>conflito, o operador do Direito teria que precisar quem seria a mãe biológica e o destino</p><p>dos embriões não utilizados.</p><p>Política — em decorrência da luta por poder e considerando a realidade atual,</p><p>é constante a judicialização política. Com relação ao poder e ao domínio da política e</p><p>do Estado, na concepção marxista, seria o Direito um mecanismo de domínio da</p><p>classe dominante sobre a dominada.</p><p>Tecnologia — os avanços da tecnologia são temas de embate social</p><p>principalmente em razão dos costumes e da religião. Contudo, influenciados pela</p><p>sociologia, os operadores do Direito, cada vez mais, têm recorrido à tecnologia para</p><p>avançar o acesso jurídico à população em geral, outro ponto que, em países como</p><p>Brasil, ainda carece de regulamentações.</p><p>Cultura — a cultura, um dos principais campos de estudo da sociologia, serve</p><p>como instrumento para compreendermos a formação e evolução social. Em</p><p>consequência disso, é notório o fato de que o Direito se relaciona diretamente com a</p><p>cultura da comunidade na qual está imerso, ou seja, integra-a, sofre influência e a</p><p>influencia.</p><p>Partindo de tais pressupostos, fica visível como a sociologia influencia</p><p>significativamente os estudos do Direito, visto que ambas as ciências, de modo direto</p><p>ou indireto, analisam os aspectos sociais, e, em comunhão com outros ramos da</p><p>ciência,</p><p>os operadores do Direito impedem que sejam realizadas injustiças sociais e</p><p>que o Direito seja aplicado à letra fria da lei.</p><p>O cenário jurídico e social mundial demonstra como ainda é latente a</p><p>inobservância dos aspectos sociais na aplicação da norma, ponto esse que bloqueia</p><p>o progresso da justiça. Além disso, o desconhecimento e a confusão da sociologia</p><p>jurídica com outros ramos favorecem análises superficiais e aplicação errônea de</p><p>métodos científicos (MELO, 2016).</p><p>Assim, é importante que a sociologia do Direito siga influenciando o estudo do</p><p>Direito, possibilitando ao indivíduo perceber o fenômeno jurídico como fato social.</p><p>23</p><p>5 ÉMILE DURKHEIM E A SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA AUTÔNOMA</p><p>Neste capítulo, você vai ler sobre um dos maiores nomes da sociologia pura e</p><p>do Direito: Émile Durkheim, um clássico que influencia autores até os dias de hoje.</p><p>Ainda neste capítulo, você vai conhecer os conceitos fundamentais da sua obra, como</p><p>de anomia, solidariedade e divisão do trabalho, conceitos interligados fundamentais</p><p>para a compreensão da teoria de Émile Durkheim (ARAUJO, 2019).</p><p>https://www.clicksociologico.com/2017/03/emile-durkheim-o-metodo-de-estudo-da.html</p><p>24</p><p>5.1 Émile Durkheim e a sociologia do Direito</p><p>Preliminares biobibliográficas</p><p>Émile Durkheim (1858–1917), junto com Karl Marx e Max Weber, é considerado</p><p>um dos pilares da disciplina que conhecemos hoje como sociologia. Nasceu em 15 de</p><p>abril de 1858, em Épinal, França. Formou-se na École Normale Superieure (Paris), à</p><p>época dirigida por Fustel de Coulanges, e, mais tarde, lecionou em Bourdoux, onde</p><p>escreveu:</p><p> A divisão do trabalho social, como tese de doutoramento (1893);</p><p> As regras do método sociológico (1895);</p><p> O suicídio (1897);</p><p> Lições de sociologia;</p><p> Física dos costumes e do Direito (cursos ministrados entre 1896–1900).</p><p>Lecionou na Sorbonne em 1902, como professor auxiliar na cátedra de</p><p>educação, disciplina da qual se tornou titular em 1906, mudando, em 1910, o nome</p><p>da cátedra para sociologia. Assim, tornou-se o primeiro professor dessa disciplina. Os</p><p>seus principais discípulos foram:</p><p> o antropólogo Marcel Mauss, que era seu sobrinho;</p><p> o historiador Gustav Glotz;</p><p> o jurista Léon Duguit.</p><p>A Figura 1 apresenta a biografia de Émile Durkheim.</p><p>25</p><p>26</p><p>5.2 Sociologia do Direito</p><p>Para Durkheim, a sociologia do Direito tem a incumbência de dar conta de</p><p>certas tarefas. Segundo ele, tendo em vista o papel que o Direito representa na</p><p>manutenção da ordem, o sociólogo deve investigar:</p><p> as causas históricas das regras jurídicas;</p><p> as funções das regras jurídicas;</p><p> o funcionamento (como são aplicadas) das regras jurídicas.</p><p>Para ele, o Direito é coextensivo à vida social: “A sociedade tende</p><p>inevitavelmente a se organizar, e o Direito é a esta organização naquilo que ela possui</p><p>de mais estável e mais preciso” (DURKHEIM, 1995, p. 31-32).</p><p>Para Durkheim, a regra jurídica é definida como uma regra de conduta dotada</p><p>de uma sanção (DURKHEIM, 1995). Essa ênfase dada à sanção é típica de um</p><p>pensamento obcecado com a ordem.</p><p>Ao analisar a sanção, ele a divide em duas: a repressiva e a restitutiva. A</p><p>primeira consiste em impor um sofrimento ao indivíduo, privando-o de algum bem,</p><p>como a vida, a liberdade, a honra, a fortuna, entre outros. A segunda consiste na</p><p>recondução de uma relação perturbada à sua forma normal (DURKHEIM, 1995). Cada</p><p>tipo de sanção corresponde a uma função e um fundamento (Quadro 1).</p><p>Dessa forma, podemos também classificar o Direito em Direito repressivo, que</p><p>é aquele que utiliza as sanções repressivas, e o Direito restitutivo ou cooperativo, que</p><p>é aquele que utiliza as sanções restitutivas.</p><p>27</p><p>5.3 Fato social e instituições</p><p>5.3.1 Objeto</p><p>Embora Durkheim tenha estabelecido como conceito central do seu</p><p>pensamento o conceito de fato social, na segunda edição das Regras do método</p><p>sociológico, ele começa a utilizar o termo instituição. Instituição e fato social são</p><p>termos que preservam a objetividade do fenômeno social. Por ser mais corrente no</p><p>âmbito do pensamento jurídico, parece mais adequado a uma sociologia do Direito</p><p>(ARAUJO, 2019).</p><p>Assim, Durkheim define sociologia como “[...] a ciência das instituições, de sua</p><p>gênese e de seu funcionamento” (DURKHEIM, 1986. p. 31). Segundo ele, as</p><p>instituições são as “[...] crenças e modos de conduta instituídos pela comunidade”</p><p>(DURKHEIM, 1986. p. 31). Como exemplos de instituições, ele traz o Estado, a família,</p><p>o Direito de propriedade e o contrato (DURKHEIM, 1986).</p><p>Os fatos sociais e as instituições trazem consigo duas características</p><p>essenciais: a exterioridade e o caráter vinculativo ou coercitivo. O autor conceitua</p><p>exterioridade da seguinte forma:</p><p>Para que haja um fato social, é preciso que vários indivíduos combinem sua</p><p>ação e que desta combinação resulte um produto novo. E como esta síntese tem lugar</p><p>fora de nós (posto que nela entra uma pluralidade de consciências), tem</p><p>necessariamente como efeito o de fixar, instituir fora de nós certas maneiras de agir e</p><p>certos juízos que não dependem de cada vontade individual considerada à parte</p><p>(DURKHEIM, 1986, p. 30-31).</p><p>Como exemplo, podemos citar o sistema linguístico, a moral, a moda, a moeda,</p><p>entre outros, que são típicos fenômenos exteriores às consciências individuais.</p><p>Com relação à segunda característica, temos que tanto a instituição quanto o</p><p>fato social se impõem ao indivíduo. Um exemplo disso é a paternidade, que é um</p><p>fenômeno biológico, mas, enquanto instituição/fato social, cria uma série de deveres.</p><p>É certo que: “[...] cada um de nós fabrica para si, sua moral, sua religião, sua técnica.</p><p>Não há conformismo social que não comporte toda uma série de matizes individuais.</p><p>Contudo, o campo de variações permitidas é limitado” (DURKHEIM, 1986, p. 31).</p><p>28</p><p>5.3.2 Método</p><p>Quanto ao método utilizado por Durkheim, temos três regras:</p><p>Primeira regra — “Os fatos sociais devem ser concebidos como coisas”</p><p>(DURKHEIM, 1986, p. 18). Decorrem dessa regra duas consequências: a coisa é</p><p>exterior ao indivíduo, o que acarreta que essa coisa só pode ser conhecida pela</p><p>experiência; o elemento psicológico não é relevante: na verdade, é impossível</p><p>determinar com exatidão os motivos subjetivos que deram origem a uma instituição.</p><p>Segunda regra — deve haver uma prioridade do todo, da sociedade, com</p><p>relação à parte, o indivíduo. Pois, segundo Durkheim, a vida de uma célula não se</p><p>encontra nos átomos que a compõem, mas no modo como estão associados</p><p>(DURKHEIM, 1986). Desse modo, o todo mostra-se irredutível às partes que o</p><p>compõem, uma vez que possui propriedades que não estão presentes nas partes. A</p><p>sociedade, pois, é irredutível à soma dos indivíduos. De fato, se partirmos dos</p><p>indivíduos, nunca podemos compreender o que ocorre no grupo, uma vez que os</p><p>membros do grupo agem de modo diferente do que fariam se estivessem isolados.</p><p>Terceira regra — a ideia de que um fato social só pode ser explicado por um</p><p>outro fato social.</p><p>5.4 Principais conceitos</p><p>5.4.1 Solidariedade</p><p>Esse conceito fundamental na teoria de Durkheim pode ser descrito como o</p><p>vínculo objetivo, relação pacífica, existente entre os indivíduos em determinada</p><p>sociedade. A solidariedade, por sua vez, pode fundamentar-se na semelhança entre</p><p>indivíduos — chamada, então, de solidariedade mecânica — ou na sua diferença —</p><p>denominada, então, solidariedade orgânica.</p><p>A solidariedade mecânica é típica de sociedades primitivas, nas quais não</p><p>ocorreu uma especialização das funções sociais. A consciência individual depende</p><p>diretamente da consciência coletiva e segue todos os seus movimentos, “[...] como o</p><p>objeto possuído segue aqueles que o seu proprietário lhe imprime” (DURKHEIM,</p><p>1995, p. 107). É essa analogia que justifica o termo mecânica. Mas como se dá a</p><p>consciência coletiva na solidariedade</p><p>mecânica? A consciência coletiva é o conjunto</p><p>29</p><p>das crenças e sentimentos comuns à média dos membros de uma mesma sociedade.</p><p>Como é forte, abrange todas as esferas da vida.</p><p>A solidariedade orgânica, por sua vez, é a solidariedade fundada na diferença.</p><p>É típica das sociedades modernas, em que a divisão do trabalho provoca a</p><p>diferenciação entre as pessoas. O termo orgânica é utilizado em analogia com os</p><p>órgãos de um ser vivo: estes são diferentes, e é a sua diferença que os torna</p><p>indispensáveis uns aos outros. Cada membro da sociedade funciona como órgão de</p><p>um organismo.</p><p>5.4.2 Divisão do trabalho social</p><p>A divisão social do trabalho consiste na especialização das funções em todos</p><p>os âmbitos da vida social: econômico, político, religioso, militar, político, científico,</p><p>artístico, entre outros. Essa divisão não pode ser confundida com a divisão técnica do</p><p>trabalho, que consiste na decomposição do trabalho em várias fases, atribuindo a</p><p>cada trabalhador a responsabilidade sobre uma fase (ARAUJO, 2019).</p><p>As causas da divisão do trabalho dizem respeito à passagem da solidariedade</p><p>mecânica para a orgânica, em que pode haver:</p><p> crescimento demográfico;</p><p> crescimento da densidade demográfica (razão entre indivíduos e</p><p>superfície);</p><p> crescimento no número de trocas entre os indivíduos de uma sociedade</p><p>(a chamada densidade moral).</p><p>30</p><p>6 EFICÁCIA DAS NORMAS JURÍDICAS E OS SEUS EFEITOS SOCIAIS</p><p>A norma jurídica isolada sequer pode ser válida. Para ser estudada, ela precisa</p><p>ser considerada com as demais normas que, juntas, compõem o ordenamento</p><p>jurídico. Para a análise desse conjunto de normas, é necessário estudarmos conceitos</p><p>essenciais, como validade e eficácia. O primeiro diz respeito a estabelecer se uma</p><p>norma pertence ou não ao ordenamento jurídico; o segundo define o grau de</p><p>efetividade que essa norma encontra na sociedade — em outras palavras, se ela é</p><p>obedecida ou não.</p><p>Como o ordenamento deve ser um todo coerente, livre de contradições, quando</p><p>encontramos normas que se contradizem no sistema, devemos recorrer a algum</p><p>critério que defina qual norma deve prevalecer. Em nome da segurança jurídica,</p><p>recorremos aos critérios de resolução de antinomias (ARAUJO, 2019).</p><p>Neste capítulo, você vai descobrir quais são os tipos de antinomias que trazem</p><p>incoerência ao ordenamento jurídico e qual é o critério utilizado para a sua resolução.</p><p>Além disso, vai conhecer a hierarquia existente entre os critérios para solucionar os</p><p>conflitos entre os próprios critérios de resolução de antinomias.</p><p>https://diegoleonardoadvogado.jusbrasil.com.br/artigos/555790945/aplicabilidade-imediata-dos-</p><p>direitos-fundamentais</p><p>31</p><p>6.1 Validade e eficácia das normas</p><p>Validade e eficácia são dois termos que têm relação íntima. O primeiro diz</p><p>respeito à correspondência da norma a outra norma ou decisão superior estabelecida</p><p>formalmente pelo Estado; o segundo se refere a como as normas são realmente</p><p>observadas na sociedade. No Brasil, em termos simples, dizemos que uma lei “pegou”</p><p>ou “não pegou” se ela é considerada eficaz ou não. (ARAUJO, 2019)</p><p>O maior autor do positivismo jurídico, Hans Kelsen, vincula um conceito ao</p><p>outro dizendo que:</p><p>Uma norma jurídica é considerada como objetivamente válida apenas quando</p><p>a conduta humana que ela regula lhe corresponde efetivamente, pelo menos</p><p>numa certa medida. Uma norma que nunca e em parte alguma é aplicada e</p><p>respeitada, isto é, uma norma que — como costuma dizer-se — não é eficaz</p><p>em uma certa medida, não será considerada como norma válida (vigente).</p><p>Um mínimo de eficácia (como sói dizer-se) é condição da sua vigência.</p><p>Porém, uma norma jurídica deixará de ser considerada válida quando</p><p>permanece duradouramente ineficaz. A eficácia é, nesta medida, condição</p><p>da vigência, visto ao estabelecimento de uma norma se ter de seguir a sua</p><p>eficácia para que ela não perca a sua vigência (KELSEN, 1996, p. 12).</p><p>Portanto, a eficácia, ao mesmo tempo em que é a conformidade de uma</p><p>conduta à norma ou à sua aplicação pelos órgãos competentes, quando é seguida e</p><p>aplicada, é também a condição de validade de uma norma. Aqui, encontramos um dos</p><p>grandes problemas da teoria de Kelsen (1996), pois, ao separar ser e dever–ser e</p><p>dizer que o Direito corresponde somente ao segundo, ele cria um problema para a</p><p>sua estrutura teórica, pois a eficácia, que ele diz ser condição de validade da norma,</p><p>está no campo do ser, na dimensão dos fatos, e não do dever–ser (ARAUJO, 2019).</p><p>Norberto Bobbio, com a sua conhecida clareza na forma de desenvolver as</p><p>ideias, faz correspondência da validade da norma com a sua existência, afirmando</p><p>que a validade jurídica de uma norma equivale à sua existência. Vale a pena a</p><p>transcrição da sua obra:</p><p>[...] O problema é o problema da existência da regra como tal,</p><p>independentemente do julgamento de valor se for justa ou não. Enquanto o</p><p>problema da justiça é resolvido com um julgamento de valor, a questão da</p><p>validade é resolvida com um julgamento de fato. Trata-se, então, de ver se</p><p>existe uma regra legal ou não, ou melhor se essa regra assim determinada é</p><p>uma regra legal. A validade jurídica de uma regra é equivalente à existência</p><p>de tal norma como regulamentação legal. Embora para julgar a justiça de uma</p><p>norma seja necessário compará-la com um valor ideal, para julgar sua</p><p>validade, é necessário realizar pesquisas empírico-racionais, aquelas</p><p>32</p><p>pesquisas que são realizadas quando se trata de determinar a magnitude e</p><p>alcance de um evento (BOBBIO, 1993, p. 24, tradução nossa).</p><p>E continua dizendo que, para determinarmos a validade de uma norma,</p><p>devemos observar três critérios:</p><p> verificar se a autoridade que criou a norma tem poder legítimo para fazê-</p><p>lo;</p><p> verificar se não foi ab-rogada por outra norma;</p><p> verificar se não é incompatível com o sistema.</p><p>Ou seja, a validade corresponde a um problema ontológico do Direito. Bobbio</p><p>também faz referência ao tema eficácia da norma, que se refere ao fato de saber se</p><p>as pessoas às quais as normas são direcionadas seguem-nas ou não, chegando à</p><p>conclusão de que a eficácia da norma diz respeito a um problema fenomenológico do</p><p>Direito. Nas suas palavras:</p><p>[...] o problema da eficácia de uma norma é o problema de saber se aquela</p><p>norma é seguida ou não por aquelas pessoas as quais ela é dirigida (os</p><p>considerados destinatários da norma jurídica) e, no caso de que seja violada,</p><p>seja feita valer com os meios coercitivos da autoridade que a postou. Que</p><p>uma norma exista em quanto norma jurídica não implica que essa seja</p><p>constantemente seguida. [...] A pesquisa para verificar a eficácia ou a</p><p>ineficácia de uma norma é uma pesquisa histórico-sociológica destinada a</p><p>estudar o comportamento dos membros de um grupo social particular e que</p><p>difere tanto da busca mais filosófica em torno da justiça quanto da natureza</p><p>de validade mais tipicamente legal. Mesmo aqui, para usar a terminologia</p><p>ensinada, se em um sentido diferente do habitual, pode-se dizer que o</p><p>problema da eficácia das regras legais é o problema fenomenológico do</p><p>Direito (BOBBIO, 1993, p. 25, tradução nossa).</p><p>Ou seja, o problema relativo à eficácia da norma jurídica é o que se relaciona</p><p>mais diretamente com a sociologia jurídica. (ARAUJO, 2019)</p><p>33</p><p>6.2 Efeitos sociais da norma jurídica</p><p>Ao pensarem de forma diferente da dos autores da Antiguidade Clássica, os</p><p>modernos fizeram a separação do ser e do dever–ser, e, ao fazer essa separação,</p><p>criaram um problema lógico, pois do ser não pode derivar nenhum dever–ser</p><p>(ARAUJO, 2019).</p><p>Na lógica, existe uma falácia chamada de non sequitur, que surge quando, na</p><p>conclusão de um argumento, deduzimos mais do que aquilo que estava nas</p><p>premissas. Se, na conclusão, temos um elemento normativo, ele também deve estar</p><p>presente em uma das minhas premissas. Ou seja, segundo a lógica, do plano dos</p><p>fatos, nunca vamos poder tirar uma norma.</p><p>De premissas factuais, nunca chegamos</p><p>a conclusões normativas. Assim, para haver uma coerência lógica, deve haver uma</p><p>junção entre o ser e o dever–ser. O ser está no fato de que homens se reúnem para</p><p>votar e, ao levantarem o braço ou apertarem um botão, decidem criar algo que</p><p>chamam de norma e no elemento normativo anterior ao ato, que é uma norma que os</p><p>autoriza a fazer isso. Assim, podemos dizer que uma norma isolada não traz efeito</p><p>34</p><p>social algum, pois só pode produzir efeitos se for considerada com outras normas</p><p>jurídicas. Disso, surge a ideia de ordenamento (ARAUJO, 2019).</p><p>O professor Luis Fernando Barzotto, ao analisar a obra de Kelsen, evidencia a</p><p>separação entre ordenamento e sistemas normativos de natureza moral:</p><p>O ordenamento jurídico se diferencia dos sistemas normativos de natureza</p><p>moral por ser um sistema dinâmico. Sistema dinâmico é aquele em que as</p><p>normas estão ligadas entre si por uma relação de autorização, e não de</p><p>derivação lógica. Uma norma pertence a um ordenamento jurídico por ter sido</p><p>produzida segundo o procedimento previsto em outra norma, e não pelo fato</p><p>de ter sido derivada logicamente desta. Quando a norma veio à existência</p><p>segundo os modos autorizados pelo ordenamento, dizemos que a norma é</p><p>“válida” (BARZOTTO, 1999, p. 37).</p><p>Norberto Bobbio, na obra Teoria geral do Direito, compartilha da ideia de que é</p><p>o sistema de normas que importa, em detrimento da norma isolada. Ele divide a obra</p><p>em dois momentos: no primeiro, estuda a norma jurídica isoladamente (teoria da</p><p>norma jurídica) e, no segundo, o ordenamento jurídico (teoria do ordenamento</p><p>jurídico), concluindo que as normas nunca existem isoladamente e usando a metáfora:</p><p>“considerava-se a árvore e não a floresta” (BOBBIO, 1996, p. 20).</p><p>Segundo o mesmo autor, Kelsen foi o primeiro a fazer essa divisão na obra</p><p>Teoria geral do Direito e do Estado, dividindo o estudo em nomoestática e</p><p>nomodinâmica, sendo o primeiro o estudo das normas jurídicas isoladas e o segundo</p><p>o estudo do conjunto do ordenamento jurídico.</p><p>Agora que sabemos que os efeitos sociais das normas jurídicas só podem</p><p>existir quando se parte da premissa que só podem ser observadas em conjunto,</p><p>analisaremos os problemas referentes à incompatibilidade dessas normas na</p><p>regulação da sociedade.</p><p>O ordenamento jurídico deve possuir três características principais:</p><p> unidade;</p><p> coerência;</p><p> completude.</p><p>Como uma das características do ordenamento jurídico é a coerência, é</p><p>necessário resolver os conflitos que surgem entre normas jurídicas, para que se</p><p>observe um dos principais elementos do Direito: a segurança jurídica. Afinal, como</p><p>devemos agir diante de duas normas válidas que prescrevem comandos diferentes?</p><p>35</p><p>6.3 Antinomias</p><p>6.3.1 Conflitos de primeiro grau</p><p>Aqui não faz sentido falarmos em conflito entre ordenamentos, mas entre</p><p>normas.</p><p>Portanto, não é exato falar, como se faz frequentemente, de coerência do</p><p>ordenamento jurídico no seu conjunto; pode-se falar de exigência de</p><p>coerência somente entre suas partes simples. Num sistema dedutivo, se</p><p>aparecer uma contradição, todo o sistema ruirá. Num sistema jurídico, a</p><p>admissão do princípio que exclui a incompatibilidade tem por consequência,</p><p>em caso de incompatibilidade de duas normas, não mais a queda de todo o</p><p>sistema, mas somente de uma das duas normas ou no máximo das duas</p><p>(BOBBIO, 1996, p. 80).</p><p>Dessa ideia, surge o critério de resolução de conflito entre normas, para que o</p><p>ordenamento permaneça coerente. Pressupõe-se, portanto, a regra de coerência, que</p><p>diz que “num ordenamento jurídico, não devem existir antinomias”.</p><p>As regras fundamentais para a solução do conflito de antinomias são:</p><p> critério cronológico;</p><p> critério hierárquico;</p><p> critério da especialidade.</p><p>36</p><p>Critério cronológico</p><p>O critério cronológico ocorre quando duas normas se contradizem, sendo uma</p><p>mais recente do que a outra. Nesse caso, a mais nova deve prevalecer, ou seja, lex</p><p>posterior derogat priori. “Existe uma regra geral no Direito em que a vontade posterior</p><p>revoga a precedente, e que de dois atos de vontade da mesma pessoa vale o último</p><p>no tempo” (BOBBIO, 1996, p. 93). Assim, justifica-se, na ordem do sistema, que a</p><p>última vontade do legislador deve prevalecer, pressupondo que o legislador não faria</p><p>algo novo se o considerasse inútil.</p><p>Critério hierárquico</p><p>O critério hierárquico diz que, entre duas normas contraditórias, deve</p><p>prevalecer a norma superior, ou seja, lex superior derogat inferiori. Esse critério está</p><p>em consonância com a ideia de ordenamento hierárquico das leis, em que a superior</p><p>tem validade à inferior.</p><p>A inferioridade de uma norma em relação a outra consiste na menor força de</p><p>seu poder normativo; essa menor força se manifesta justamente na</p><p>incapacidade de estabelecer uma regulamentação que esteja em oposição à</p><p>regulamentação de uma norma hierarquicamente superior (BOBBIO, 1996, p.</p><p>93).</p><p>Critério da especialidade</p><p>O critério da especialidade afirma que, entre duas normas incompatíveis do</p><p>mesmo ordenamento jurídico, sendo uma mais geral e outra mais especial, prevalece</p><p>a mais especial, ou seja, lex specialis derogat generali. O motivo desse critério é claro.</p><p>Nesse caso, ou uma lei especial anula uma lei mais ampla ou simplesmente retira de</p><p>uma norma mais geral alguns elementos para submetê-la a uma legislação que pode</p><p>ser contrária ou contraditória. Essa característica é fundamental em termos de justiça,</p><p>porque aplica melhor a lei geral às particularidades de uma categoria de pessoas,</p><p>obedecendo a uma das regras fundamentais do Direito: suum cuique tribuere.</p><p>A passagem da regra geral à regra especial corresponde a um processo</p><p>natural de diferenciação das categorias, a uma descoberta gradual, por parte</p><p>do legislador, dessa diferenciação. Verificada ou descoberta a diferenciação,</p><p>a persistência na regra geral importaria no tratamento igual de pessoas que</p><p>pertencem a categorias diferentes, e, portanto, numa injustiça. Nesse</p><p>processo de gradual especialização, operado por meio de leis especiais,</p><p>encontramos uma das regras fundamentais da justiça, que é a do suum</p><p>cuique tribuere (dar a cada um o que é seu). Entende-se, portanto, por que a</p><p>37</p><p>lei especial deva prevalecer sobre a geral: ela representa um momento</p><p>ineliminável do desenvolvimento de um ordenamento. Bloquear a lei especial</p><p>frente à geral significaria paralisar esse desenvolvimento (Bobbio, 1996, p.</p><p>96).</p><p>6.3.2 Conflitos de segundo grau</p><p>Vimos que, entre normas conflitantes, podemos usar os métodos de resolução</p><p>de antinomias. Porém, se os critérios entrarem em conflito, o que devemos fazer? Se,</p><p>por exemplo, estivermos diante de uma dicotomia entre uma norma constitucional</p><p>superior e uma norma ordinária posterior, o que fazer, já que não podemos aplicar</p><p>concomitantemente dois critérios? A esse conflito de critérios, dá-se o nome de</p><p>antinomia de segundo grau (ARAUJO, 2019).</p><p>6.3.2.1 Conflito entre o critério hierárquico e o cronológico</p><p>Se uma norma superior entra em conflito com uma nova posterior, normas</p><p>diferentes prevalecerão de acordo com o critério que utilizarmos. Nesse caso, sempre</p><p>deve prevalecer o critério hierárquico sobre o cronológico.</p><p>Essa solução é bastante óbvia: se o critério cronológico devesse prevalecer</p><p>sobre o hierárquico, o princípio mesmo da ordem hierárquica das normas</p><p>seria tornado vão, porque a norma superior perderia o poder, que lhe é</p><p>próprio, de não ser ab-rogada pelas normas inferiores (BOBBIO, 1996, p.</p><p>108).</p><p>Portanto, aplicamos o método cronológico somente com normas de mesmo</p><p>nível hierárquico. Conflito entre o critério de especialidade e o cronológico Aqui há o</p><p>conflito entre uma norma especial que existe antes de uma geral. Nesse caso, deve</p><p>38</p><p>prevalecer, a princípio, a lei especial. A regra geral então seria: lex posterior generalis</p><p>non derogat priori speciali,</p><p>mas isso deve depender da análise do caso em questão.</p><p>6.3.2.2 Conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade</p><p>O conflito entre o critério hierárquico e o de especialidade não é de fácil solução,</p><p>não existindo uma resposta segura para a questão.</p><p>A gravidade do conflito deriva do fato de que estão em jogo dois valores</p><p>fundamentais de todo ordenamento jurídico, o do respeito da ordem, que</p><p>exige o respeito da hierarquia e, portanto, do critério da superioridade, e o da</p><p>justiça, que exige a adaptação gradual do Direito às necessidades sociais e,</p><p>portanto, respeito do critério da especialidade (BOBBIO, 1996, p. 109).</p><p>O mais de acordo com a teoria da norma seria prevalecer a superior ante a</p><p>especial e inferior, pois, ao preferir as inferiores, haveria um esvaziamento das normas</p><p>materialmente constitucionais, no entanto, a especialidade da justiça que traz o</p><p>princípio do Direito suum cuique tribuere também deve ser considerada.</p><p>Como observamos, os critérios de resolução de conflitos de segundo grau</p><p>estão dispostos em nível crescente de incerteza, mas funcionam como regra geral</p><p>para se alcançar a coerência do sistema de normas no ordenamento jurídico</p><p>(ARAUJO, 2019).</p><p>7 RELAÇÃO ENTRE SOCIEDADE, DIREITO E ESTADO</p><p>O Direito é um importante mecanismo de controle social, o que denota a sua</p><p>importância para a sociedade, assim como a sociedade também contribui para o seu</p><p>desenvolvimento e para a consequente construção de uma convivência justa e</p><p>solidária (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Neste capítulo, você vai compreender o quanto Direito e sociedade se</p><p>relacionam, como instrumento de controle e como meio de atuação do Estado para</p><p>regular as relações sociais. O Direito e a sociedade contribuem mutuamente para o</p><p>desenvolvimento social, enquanto o Estado desempenha a função de legitimar a</p><p>aplicação do Direito, com foco em garantir uma convivência harmônica na sociedade.</p><p>39</p><p>https://vermelho.org.br/2018/11/27/defender-o-estado-democratico-nao-e-apenas-um-exercicio-</p><p>retorico/</p><p>7.1 Função do Direito na sociedade</p><p>Para viver em sociedade, o ser humano deve enfrentar um processo de</p><p>adaptação, que ocorre tanto interna quanto externamente. É um processo interno no</p><p>que se refere ao corpo, sem a interposição da vontade, como o funcionamento dos</p><p>órgãos diante de diferentes situações às quais deva se adaptar. Quanto ao aspecto</p><p>externo, a relação é do homem com o espaço em que habita: o ser humano tem</p><p>inúmeras necessidades, que são satisfeitas pela natureza, e cabe a ele adaptar e</p><p>transformar o mundo à sua volta para a satisfação dessas necessidades</p><p>(GIACOMELLI, 2011).</p><p>40</p><p>O Direito e o homem se influenciam mutuamente. Enquanto o Direito faz parte</p><p>do processo de adaptação do homem, devendo este se adequar e obedecer às</p><p>normas, o homem também influencia na criação do Direito, vez que este deve estar</p><p>focado e adaptado ao meio para o qual foi produzido, obedecendo aos valores que a</p><p>sociedade elege como essenciais.</p><p>O Direito possui importante missão: serve como instrumento para gerar a paz</p><p>e harmonia nas diversas relações sociais. É importante salientar que o Direito não</p><p>deve refletir interesses individuais, mas interesses de toda a coletividade, que muitas</p><p>vezes colidem com os interesses individuais, gerando conflitos que serão resolvidos</p><p>pelo próprio Direito (GIACOMELLI, 2011).</p><p>O Direito, por ser fruto da elaboração humana, sofre influência do tempo e do</p><p>local em que se aplica, e por isso, ele deve estar sempre aberto às mudanças que</p><p>ocorrem durante as diferentes épocas. As inúmeras e constantes transformações que</p><p>se verificam com o passar do tempo refletem nas normas de conduta impostas pelo</p><p>Direito, motivo pelo qual se deve buscar atualizações recorrentes (GIACOMELLI,</p><p>2011).</p><p>O reflexo do Direito na sociedade ocorre de duas maneiras principais, tendo em</p><p>vista o sistema normativo que constrói a ordem social: são as normas positivadas e</p><p>as normas de costume. Em geral, as normas de costume acabam sendo positivadas;</p><p>porém, as que não são, continuam valendo com igual força.</p><p>O direito à vida é um exemplo de norma de costume que também é uma norma</p><p>positivada, pois, trata-se de um valor social que prepondera nas sociedades em geral.</p><p>Já a união de pessoas do mesmo sexo é uma norma de costume, que a sociedade</p><p>reconhece como válida, mas que ainda sofre um processo de positivação no Brasil,</p><p>não sendo absoluta: a sociedade se transformou e agora cabe ao Direito tornar essa</p><p>norma de costume, também uma norma positivada (GIACOMELLI, 2011).</p><p>41</p><p>7.2 Relação entre Direito e Estado</p><p>O Estado é a sociedade politicamente organizada, que utiliza a aplicação do</p><p>Direito para estabelecer uma ordem da conduta humana: apresenta as condições</p><p>universais da ordem social em determinados território, povo e governo (GIACOMELLI,</p><p>2011).</p><p>O Estado, portanto, caracteriza-se pela soberania, internamente representada</p><p>pela faculdade de impor a sua vontade, por meio da força, se necessária,</p><p>independente da vontade do cidadão em particular, o que se legitima com o Direito.</p><p>Com relação aos demais Estados (países), a afirmação máxima da soberania é a</p><p>independência absoluta, admitindo que todos estão no mesmo nível de hierarquia,</p><p>não admitindo que nenhum Estado que superior a outro.</p><p>A relação entre Direito e Estado, no entanto, se explica por meio de três teorias</p><p>básicas: teoria monista, teoria dualista e teoria do paralelismo (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Para a teoria monista, também conhecida como teoria do estatismo jurídico, o</p><p>Estado e o Direito se confundem em uma única realidade. No entendimento monista,</p><p>só existe o Direito estatal, não se admitindo a ideia de qualquer regra jurídica fora do</p><p>Estado. E o Estado é a fonte única do Direito, pois só ele dispõe de força coativa para</p><p>estabelecer normas. Logo, como só existe o Direito emanado do Estado, ambos se</p><p>confundem em uma só realidade (GIACOMELLI, 2011).</p><p>Já a teoria dualista, também conhecida como teoria pluralista, sustenta que o</p><p>Estado e o Direito são duas realidades distintas, independentes e inconfundíveis.</p><p>Nessa teoria, o Estado não é a única fonte do Direito, nem com este se confunde. O</p><p>que provém do Estado é apenas uma categoria especial do Direito: O Direito Positivo.</p><p>Em conjunto com o Direito Positivo, existem e vigoram os princípios do Direito Natural,</p><p>as normas do Direito Costumeiro e as regras que se firmam na consciência coletiva.</p><p>Essa corrente afirma que o Direito é uma criação social, não estatal, pois, é um fato</p><p>social em contínua transformação. A função do Estado é positivar o Direito, isto é,</p><p>traduzir em normas escritas os princípios que se firmam na consciência social</p><p>(GIACOMELLI, 2011).</p><p>A teoria do paralelismo entende que o Estado e o Direito são realidades</p><p>distintas, mas de natureza interdependentes. Essa corrente, procurando solucionar a</p><p>antítese monismo–dualismo, reconhece que o Direito não é estatal — sustenta que</p><p>vários centros de determinação jurídica surgem e se desenvolvem fora do Estado,</p><p>42</p><p>obedecendo a uma graduação de positividade. Sobre todos esses centros particulares</p><p>do ordenamento jurídico, prepondera o Estado como centro de irradiação da</p><p>positividade.</p><p>Convergindo com a teoria do paralelismo, Miguel Reale (REALE, 2010), jurista</p><p>de grande destaque no meio jurídico brasileiro, desenvolveu a teoria tridimensional do</p><p>Estado e do Direito. De acordo com essa teoria, o Estado não é apenas um sistema</p><p>de normas, como dita a teoria monista, nem um fenômeno estritamente sociológico,</p><p>como prevê a teoria dualista, mas, simultaneamente é a organização fática do poder</p><p>público, a realização do objetivo da convivência social e o órgão produtor e</p><p>mantenedor do ordenamento jurídico (REALE, 2010).</p><p>Diante disso, o Estado se compõe de três elementos, tornando a teoria</p><p>tridimensional a mais aceita pela doutrina para explicar a</p>arranjos e combinações nas formas de ser e agir que foram sendo criadas, desenvolvidas e perpetuadas através das culturas destes grupos. Cultura, aqui, é entendida como este conjunto de práticas que são ensinadas, transmitidas de geração a geração como as práticas sociais aceitas e legitimadas pela sociedade (BES, 2018). A cultura dos grupos sociais dos quais participamos acaba influenciando, moldando e, muitas vezes, até mesmo regulando e conduzindo nossas condutas. Através da cultura, aprendemos o significado de alguns papéis que iremos assumir dentro desta população e nos posicionamos por entender que os objetivos desta coletividade se aproximam ou se igualam aos nossos. É claro que um dos aspectos a ser observado ainda é que, no interior da sociedade, dentro do universo cultural e intercultural (entre as diferentes culturas), ocorrem as interações que são objeto de estudo da Sociologia. Interações estas que, ao mesmo tempo que ocorrem de forma harmoniosa em alguns casos, também podem produzir preconceitos, discriminações e desigualdades (BES, 2018). Como vimos anteriormente, ao estudarmos o conceito de classes sociais e estratificação, podemos perceber que, no interior de cada classe, os indivíduos se agrupam em torno da identificação de suas semelhanças e percebem, normalmente, 62 sua relação de inferioridade ou superioridade econômica em relação aos demais, o que acaba trazendo à tona estes efeitos, como o racismo e o preconceito. Numa sociedade global, marcada pelo governo através das leis do mercado e que sugere o consumo como um dos principais objetivos a ser perseguido pelos indivíduos, fica evidente que as assimetrias entre os grupos sociais que possuem maior ou menor renda se acentuem (BES, 2018). Cabe ao docente, ao desenvolver suas atividades no interior das escolas, sejam públicas ou privadas, conversar com seus alunos sobre estas questões sociológicas, fazendo com que adquiram consciência crítica e capacidade de análise sobre as diversas situações observadas na sociedade, como a histórica má distribuição de renda no Brasil, a pobreza que ainda existe, o analfabetismo, o trabalho infantil, a prostituição, o tráfico de drogas que alicia e recruta crianças diariamente, entre tantas outras mazelas sociais que estão ao nosso redor (BES, 2018). Cabe destacar que os indivíduos, dentro da visão da Sociologia, não são autônomos, mas sim o produto das sociedades em que nasceram, cresceram e se desenvolveram. Nestas relações e interações que ocorrem na sociedade, os indivíduos também irão participar, porém, continuarão vivendo a partir dos preceitos, regras e normas adotados/criados pela sociedade. Segundo Tomazi (2000, p.16): Interessa para a Sociologia, portanto, não o indivíduo isolado, mas inter- - relacionado com os diferentes grupos sociais dos quais faz parte, como a escola, a família, as classes sociais, etc. Não é o “homem” enquanto ser isolado da história que interessa a estudo da sociedade, mas “os homens” enquanto seres que vivem e fazem a história. Finalizando essa análise sobre as inter-relações entre as interações que ocorrem no interior das diversas culturas que compõem a sociedade, objeto de estudo da Sociologia, cabe-nos destacar da citação do autor que a ênfase das análises sociológicas sempre recairá sobre os homens em sua coletividade. Observamos, ainda, que uma das instituições na qual ocorrem estas relações sociais entre os indivíduos é a escola, onde podemos estar atuando e, de certa forma, ajudando a construir e projetar os balizadores da sociedade atual e futura (BES, 2018). 63 64 10 REFERÊNCIAS ARAUJO, Sandro A. Fundamentos Da Sociologia E Antropologia. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2019. AUGUSTINHO, Aline M. N. Sociologia Contemporânea. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2017. BARBOSA, Anderson. Questão Social, Direitos Humanos E Diversidade. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2019. BES, Pablo R. Sociologia Da Educação. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2018. GIACOMELLI, Cinthia L. F. Introdução Ao Estudo Do Direito. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2011. GOLDSPAN, P. B. R. B, Sociologia Da Educação. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2018. MELO, Débora. Fundamentos Da Sociologia E Antropologia. Soluções Educacionais Integradas – SAGAH, 2016.