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<p>AULA 2 MOD 8 MICHAEL DE CERTEAU O QUE FAZ O HISTORIADOR QUANDO FAZ HISTÓRIA</p><p>Professor: DR. JOÃO MUNIZ JÚNIOR</p><p>SUMÁRIO</p><p>1. Operação historiográfica e o agir do historiador</p><p>2. Usos da noção de operação historiográfica</p><p>Operação historiográfica e o agir do historiador</p><p>Michel de Certeau, um historiador francês, da ordem dos Jesuítas, foi um intelectual que se debruçou sobre áreas como psicanálise, filosofia, ciências sociais, teologia e teoria da história. Entre seus livros está um que se tornou célebre entre historiadores em virtude da riqueza conceitual contida, trata-se de A escrita da História. Aqui, utilizamos a versão traduzida em língua portuguesa, de 1982.</p><p>Nessa obra, Certeau escreve um capítulo intitulado “Operação Historiográfica”, considerado um texto seminal para pensarmos a escrita da história. Certeau parte de uma questão aparentemente simples: o que faz o historiador quando “faz” história?, a fim de pensar sobre as características, possibilidades, limites e tensões de um ofício, que inclusive ele próprio exercia, por meio de uma reflexão teórica sobre o lugar social a partir do qual o profissional de história atua e produz conhecimento.</p><p>O que seria essa operação historiográfica que Certeau menciona? Esse conceito considera um conjunto formado por três instâncias: lugar social, procedimentos de análise e produção de um texto. Ou seja, a combinação desses três elementos contribuiria para que um historiador possa produzir uma obra historiográfica.</p><p>O referido lugar social não se trata de um ambiente físico (apesar de também considerar ambientes físicos), seria, ainda, a comunidade de pesquisadores, as redes de sociabilidade, os postos de trabalho, ensino e pesquisa e as maneiras como essas esferas estão submetidas a pressões e ligadas a privilégios, formando uma particularidade. É a partir desses lugares e envolto por tais pressões que os métodos de trabalho são fabricados e instaurados.</p><p>O segundo elemento da operação historiográfica, ou seja, as práticas historiográficas, possuem relação direta com o lugar social. Isso porque as técnicas de produção da história estão inseridas em um lugar e em um tempo específicos. O estabelecimento de fontes ou a redistribuição do espaço é uma operação técnica na qual o historiador transforma um objeto em documento por meio da seleção e da reunião. Sendo assim, as “maneiras de se fazer” história e as técnicas por ela empregadas vão variar de acordo com os distintos contextos culturais que cada sociedade poderia vir a possuir (Certeau, 1982, p. 78).</p><p>O terceiro elemento do tripé da operação historiográfica – a produção de um texto – é controlado pelo segundo elemento, as práticas, sendo que a escrita é também uma prática social. A História, como uma escrita, é o produto da experiência de pesquisa do historiador por meio do uso de uma prática. Esse processo ocorreria pela própria relação com o limite, a qual a atividade histórica possui.</p><p>Para Michel de Certeau, a escrita da história está submetida a uma ordem cronológica do discurso, a uma arquitetura harmoniosa do texto e a uma conclusão do artigo ou livro. Ou seja, mesmo que o processo de pesquisa possa ser considerado interminável, inesgotável, o resultado deste processo, o produto da pesquisa que o historiador realizou é o texto escrito e este precisa ser concluído, finalizado (Certeau, 1982, p. 94).</p><p>Sendo assim, operação historiográfica se constituiria a partir da relação entre um lugar, que poderia ser um recrutamento, um meio, uma profissão; procedimentos de análise, ou seja, uma disciplina; e a construção de um texto, leia-se uma literatura, um discurso. Nas palavras do autor, essa operação estaria baseada no tripé formado pela “combinação de um lugar social, de práticas ‘científicas’ e de uma escrita” (Certeau, 1982, p. 66, grifos do autor).</p><p>Chama a atenção a reflexão de Certeau sobre as várias formas de discurso existentes: o literário, o lógico e o do historiador. Certeau enfatiza que o discurso histórico busca possuir um conteúdo verdadeiro, verificável, assumindo a forma de uma narração, para se ter validade (Certeau, 1982, p. 101). A citação seria uma das maneiras de outorgar legitimação a uma ideia proposta por um historiador. Este recurso confere ao citado a categoria de referencial, para dar credibilidade às ideias defendidas. Haveria um comprometimento nos estudos históricos com aquilo que pode ser verificado e atestado cientificamente.</p><p>Na concepção de Certeau, a escrita da História seria a ação do conteúdo sobre a forma (Certeau,1982, p. 105). Esta concepção se baseia na construção e desconstrução, ações que integram o cotidiano da operação historiográfica, na qual o conceitual serve como a base para a exposição do conteúdo. Sendo assim, a escrita é o lugar do discurso histórico, da delimitação de um recorte, espacial e temporal, a ser analisado.</p><p>A publicação da obra A escrita da História [...] demonstrou o anseio de Michel de Certeau em estabelecer postulados que apresentassem ferramentas capazes de dissecar o discurso histórico e, a um só tempo, ratificar o caráter científico do fazer historiográfico. [...] Mesmo após 30 anos de sua morte, as contribuições de Certeau se mantêm hígidas, justamente por não desconsiderarem o caráter singular que o ato de escrever história pressupõe, ou seja, a narrativa histórica seria um processo construtivo e transformador. Não obstante o caráter performativo da produção histórica disfarçado de releitura do passado, é possível estabelecer balizamentos utilizando os elementos componentes da operação historiográfica.</p><p>Fonte: artigo intitulado “As regras por detrás do jogo: a operação historiográfica de Michel de Certeau, na obra de Wlamyra R. Albuquerque”, de autoria de Rômulo Gonçalves Bittencourt.</p><p>Usos da noção de operação historiográfica</p><p>Podemos pensar os usos de uma proposta teórica de maneiras aplicáveis. Ou seja, podemos realizar alguns ajustes a fim de atender às nossas demandas, sem, com isso, desvirtuar a concepção teórica original. É possível aplicar os conceitos de Certeau na análise do trabalho de um historiador, de um grupo de historiadores ou, até mesmo, de toda uma geração de historiadores.</p><p>O importante é estar ciente de que ao nos valermos de uma proposta teórica, estaremos sempre agindo sobre um referencial que ao ser postulado, no geral, contém uma carga de abstração cujo intuito é o de ser permeável a infiltrações de ordem externa em que as necessidades de adaptação encontrem possibilidades.</p><p>Raimundo Magalhães Júnior foi um dramaturgo, escritor, jornalista, contista, cronista, tradutor, editor, biógrafo e escritor de história, como ele próprio se autodenominava. Se pensarmos a sua escrita biográfica, poderíamos estabelecer uma relação entre esta e a sua escrita da história.</p><p>Para isso, seria importante enquadrarmos o seu processo de produção de livros biográficos como uma operação biográfica. Isso mesmo, podemos fazer aqui uma adaptação do conceito original proposto por Certeau. Assim, no caso de Magalhães, o seu lugar social seria a Academia Brasileira de Letras, a Biblioteca Nacional, o Arquivo Nacional, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, que são locais físicos aos quais era ligado. Mas podemos, ainda, relacionarmos esse autor a ambientes não físicos: os laços de amizade, as influências de editores e colegas de trabalho, as cartas que trocou com figuras da nossa intelectualidade e da nossa literatura.</p><p>Sobre as técnicas dessa operação biográfica, poderíamos ressaltar a grande preocupação de Raimundo Magalhães em referenciar, por meio de citações, notas de rodapé e anexos, as fontes consultadas. Isso evidencia uma das técnicas típicas do trabalho do historiador: relacionar as fontes como maneira de subsidiar o discurso e garantir-lhe uma certa legitimidade.</p><p>Por fim, podemos pensar o texto desse biógrafo como sendo conduzido pela constante preocupação de atingir um nível de verossimilhança com o real a partir da conjuração de uma escrita criativa, portanto literária, mas ancorada na pesquisa de documentos históricos.</p><p>Por</p><p>conseguinte, quando propomos estudar o biografismo desse autor a partir da chave de leitura de uma operação biográfica, nos preocupamos em enquadrar a narrativa de vidas de autoria de Raimundo Magalhães Júnior, com base no conceito de operação historiográfica originalmente pensado por Certeau. Ou seja, apesar de no geral esse conceito ser utilizado para pensar a produção de historiadores, é possível encaixar alguns ajustes para analisarmos outras formas de produção escrita, como a de um biógrafo, por exemplo, que se esmerou em constituir biografias que fossem respaldas pelo método historiográfico.</p><p>Podemos concluir que é preciso pensar o historiador como sendo o aspecto central na produção do conhecimento historiográfico. Até porque é justamente a ação desse profissional que ao agir na articulação dos três elementos da operação historiográfica produz um discurso que, por si mesma, não fala. Ou seja, mais uma vez, nos voltamos para a ideia da não dissociação entre teoria e prática. Pois é, precisamente, na junção da base teórica e da ação do historiador, que este produz história.</p><p>Compreender o complexo ato de fazer história como uma operação significa, para Certeau, estabelecer critérios teóricos que delimitem a produção historiográfica. Limites estes, contudo, que não desconsideram o caráter inventivo, transformador e literário do historiador. Sua maior contribuição é não colocar tais questões para debaixo do tapete. Ao revés: escancara as influências externas, denuncia as regras que permeiam o ato de escrita e, sobretudo, revela que a narração, mesmo sendo performática, pode ser controlada.</p><p>Fonte: artigo intitulado “As regras por detrás do jogo: a operação historiográfica de Michel de Certeau, na obra de Wlamyra R. Albuquerque”, de autoria de Rômulo Gonçalves Bittencourt.</p><p>Para Certeau, a História, como disciplina, é fruto do contexto social na qual está situada. Somado a isto, e sob a regência de uma prática, tal disciplina possui um conjunto de técnicas normatizadoras da operação historiográfica. O historiador, ao seguir as normas estabelecidas, obtém credibilidade para a sua produção histórica. A produção de uma escrita “não é ‘histórica’ senão quando articulada com um lugar social da operação científica e quando institucional e tecnicamente ligada a uma prática do desvio, com relação aos modelos culturais ou teóricos contemporâneos” (Certeau, 1982, p. 93).</p><p>2</p><p>image1.png</p><p>image2.jpeg</p><p>image3.jpeg</p>

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