Prévia do material em texto
– 63 P O R T U G U ÊS MÓDULO 1 Classicismo (I): Camões lírico FRENTE 2Literatura 1. O Renascimento � Conceito e âmbito O Renascimento foi um dos perío- dos mais férteis da cultura ocidental: Dante, Camões, Petrarca, Rabelais, Ronsard, Shakespeare, Cervantes, Tasso, Ariosto, Da Vinci, Michelângelo alinharam-se como as mais porten tosas figuras da arte em todos os tempos. Foi um período marcado pela supervalori - zação do homem, pelo antropocentrismo, pelo hedonismo, em oposição ao teocentrismo, misti cis - mo e ascetismo medievais. O interesse pelo homem e pelo que ele poderia realizar de alto, profundo e glorioso (Humanismo) inspirou o conceito de homem in - tegral, se nhor do mundo, sequioso para co nhe cê-lo totalmente. � Características centrais do Renascimento • Equilíbrio e harmonia de forma e fundo. Clareza, mentalidade aberta, intensidade vital, ímpeto progressista, euforia, ânsia de glória e perenidade, apreço pelo humano. • Universalismo, apego aos valores transcendentais (o Belo, o Bem, a Verdade, a Perfeição) e aos sistemas racionais; simplificação por lucidez técnica, simetria. • Culto da Antiguidade gre co- -latina. Deuses pagãos usa dos co mo figuras literárias e claras alegorias. � O Renascimento português O Renascimento em Portugal cor - respondeu ao período de apo geu da Nação, cujo império, à semelhan ça do império inglês do século XIX, abrangia do Oriente (China, Índia) ao Ocidente (Brasil), e marcou, com Camões, a plena maturação da lín gua portuguesa. Sob o reinado de D. Manuel, o Ven turoso, Portugal gozou de mo - men tânea mas intensa euforia, gra - ças a grandes cometimentos: des co berta do caminho marítimo para as Índias, empreendida por Vasco da Gama em 1498; desco brimento do Brasil em 1500; con quista de Goa e de regiões da África entre 1507 e 1513; viagem de circum-navegação rea lizada por Fer não de Magalhães entre 1519 e 1520. Desses fatos sobreveio uma ex- traordinária prosperidade econô mi ca: Lisboa transformou-se num impor tan - te centro comercial; na corte im pe rava o luxo desmedido, na certeza de que a Pátria havia chegado a uma inal te rável riqueza material. Este ufanis mo, contudo, foi declinan do até a der - rocada final em Alcácer-Quibir, em 1578, com a destruição do exército por tu guês e morte de D. Se bastião. A lite ratura começou a refletir a co - moção épica ge ra da pelo progres so nas primeiras dé cadas do século XVI, mas refletiu tam bém, vez por ou tra, o desalento e a adver tên cia, lúci dos perante a dúbia e provi só ria su pe - rioridade. O Renascimento português não representou, como nos países protes - tantes, uma revolução cultural tão extensa e profunda. Na facção pro - tes tante, as condições foram mais fa voráveis à liberdade de pensa - mento e à difusão popular da cul tu ra, gra ças à propagação da impren sa, veí culo privilegiado pela Refor ma Lute ra na. Em Portugal, como na Espanha e Itália, a Contrarreforma Católica inau gurou, preco cemente, um período de recalque ideológico e de repres são. Em 1547, o Santo Ofício visitou ca sas e livra rias à procura de livros heréticos. Gil Vicente, Camões, Sá de Miranda, Antônio Ferreira, entre ou tros, foram consi de - rados “agentes con tra a Fé e os Costumes”. 2. A escola clássica renascentista (1527-1580) Ainda que, já no fim da Idade Mé - dia, os autores da Antiguidade Clás sica fossem conhecidos em Por tugal, só se pode falar na existência de um estilo renascentista expressivo a partir de 1527, quando o poeta Sá de Miranda regressa da Itália, local em que viveu, entre 1520 e 1527, e onde esteve em contato com a lite ra tura da Renas cença ita liana, o dolce stil nuovo, iniciando a divul ga ção, em Por tu gal, das mo da - lidades poéticas clás sicas. Esse conjunto de procedi men tos artísticos, que, em ter ritório luso, chamou-se me dida no - va, consistia: • na utilização do verso decassíla - bo, em lugar dos redondilhos tra di cionais; • na predileção pelas formas fi - xas, inspiradas nos modelos latinos e italianos: o soneto, o terceto, a sex ti - na, a oitava, a ode, a elegia, a can ção, a écloga, a epístola, o epigrama, o epitalâmio; além do teatro clássico, com a tragédia grega e a comédia latina, regidas pela “lei das três uni - dades” (de tempo, de lugar e de ação); • na assimilação da influência te - mática e formal de autores como Ho - rácio, Virgílio, Ovídio, Plauto, Terên cio, Homero, Píndaro, Anacreonte, Sannazzaro, Boccaccio, Boiardo, Tor qua - to Tasso, Ariosto, Dante Alighieri e Petrarca, além da releitura dos filó so fos gregos Platão e Aristóteles, filtra dos pelo pensamento cristão de São Tomás de Aquino e Santo Agostinho. Contudo, o espírito medieval não foi completamente abandonado. Por isso, o Quinhentismo luso constituiu uma época bifronte, pela coexistência e, não raro, a interinfluência das duas formas de cultura: a medieval, popular, tradicional, materializada na medida velha, e a clássica, erudita, renascentista, que se expressou por meio da medida nova. Esse bifrontismo foi lugar-comum entre os autores portugueses da época renas - CONCEITO E ÂMBITO A MEDIDA NOVA LUÍS DE CAMÕES C1_3A_VERMELHO_2021_PORT_GK.qxp 22/09/2020 19:23 Página 63