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MATEMÁTICA FINANCEIRA Rodolfo Vieira Nunes Sistemas de amortização Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Explicar os principais conceitos dos sistemas de amortização. Identificar os principais tipos de sistemas de amortização em uso no Brasil. Utilizar planos financeiros para demonstrar os cálculos, as semelhanças e as diferenças entre os sistemas de amortização. Introdução Um empréstimo financeiro é uma operação atrelada a um contrato entre um cliente (tomador) e uma instituição financeira (emprestador). Por meio do empréstimo, o cliente recebe uma quantia em dinheiro, que deve ser devolvida em prazo determinado e acrescida dos juros definidos por ambas as partes. Um empréstimo que deve ser restituído em quantias periódicas iguais (mensal, trimestral ou anualmente) é chamado de “empréstimo amortizado”. A palavra “amortização” vem do termo latino mors, que significa “morte”. Assim, um empréstimo amortizado é aquele empréstimo liquidado com o passar do tempo. Um sistema de amortização se caracteriza pela definição de critérios que estabelecem quanto deve ser pago em cada parcela. Tal pagamento se divide em: principal (amortização) e encargos (juros, remuneração). Há basicamente três sistemas de amortização: Sistema de Amortização Constante (SAC), sistema francês ou tabela Price e Sistema de Amortização Americano (SAA). Neste capítulo, você vai conhecer alguns conceitos relacionados aos sistemas de amortização. Além disso, vai se familiarizar com as principais características desses sistemas e verificar as diferenças existentes entre eles. Principais conceitos A seguir, você vai conhecer alguns conceitos importantes para o seu apren- dizado ao longo deste capítulo. Como você sabe, estudar os conceitos básicos de uma área é fundamental para compreendê-la (ASSAF NETO, 2016; CARVALHO; ELIA; DECOTELI, 2009; GIMENES, 2006; HOJI, 2016; SILVA, 2012). Amortização: são os pagamentos do principal da dívida, ou seja, do montante emprestado. Não confunda a amortização com a parcela desembolsada total, que pode incluir juros. Os juros não fazem parte da amortização do principal. Carência: um fluxo de caixa com carência (ou f luxo diferido) é aquele em que os pagamentos da dívida começam a ocorrer em um período posterior ao término da carência. Assim, por exemplo, um fluxo de caixa com carência de dois períodos é aquele em que os pagamentos começam a ocorrer no terceiro período. Alguns autores usam um conceito diferente de carência, porém esse que você acabou de ver é o mais utilizado no mercado e o mais comum nos exames de certificação. Juros: são uma espécie de “aluguel” pago pelo uso do dinheiro, ou seja, uma forma de remunerar o capital que foi emprestado. Do ponto de vista de quem toma um empréstimo, os juros são o custo de captar o valor. De uma perspectiva mais financeira, os juros são o resultado da aplicação da taxa de juros sobre o saldo devedor. Prestação: é uma forma de pagamento a prazo em que o montante total é dividido e pago periodicamente pelo devedor como meio de quitar uma parte da dívida. A composição da prestação pode ser advinda da amortização e dos juros do empréstimo. Saldo devedor: é a diferença entre o valor do empréstimo atualizado e a soma das amortizações, ou seja, é o que já foi pago de juros e principal. Em uma visão simplificada, o saldo devedor é o total do principal da dívida em determinado momento. Todas as definições que você viu aqui estão relacionadas a uma abordagem financeira. Podem existir outras explicações e entendimentos sobre esses conceitos, porém com uma abordagem ou explicação não financeira. Sistemas de amortização2 Sistemas de amortização em uso no Brasil SAC No SAC, o pagamento do empréstimo ocorre por meio de um conjunto de prestações em que as amortizações do saldo devedor são constantes ao longo de todo o período do contrato (HOJI, 2016). Nesse sistema, as parcelas da amortização são sempre iguais entre si. Já os juros são calculados sobre o saldo devedor do período anterior. Na Figura 1, veja a composição das prestações no SAC. Figura 1. Composição das prestações no SAC. A Figura 1 mostra que as prestações são decrescentes ao longo do período, pois os juros incidem com um valor cada vez menor sobre o montante das prestações. A amortização do principal, como o próprio nome do sistema indica, é constante no tempo. Para compreender melhor, considere um exemplo: existe um empréstimo no valor de R$ 300.000,00 a ser pago em 5 parcelas anuais com carência no primeiro ano. A amortização estipulada em contrato deve ser de R$ 60.000,00 por ano. Esse empréstimo está condicionado a juros de 12% ao ano. Agora veja o Quadro 1, a seguir. 3Sistemas de amortização Final do ano Amortização (a) Juros SDp – 1 × 12% (b) Prestação (a) + (b) Saldo devedor (SD) Hoje 300.000,00 1 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 2 60.000,00 36.000,00 96.000,00 240.000,00 3 60.000,00 28.800,00 88.800,00 180.000,00 4 60.000,00 21.600,00 81.600,00 120.000,00 5 60.000,00 14.400,00 74.400,00 60.000,00 6 60.000,00 7.200,00 67.200,00 0,00 Total 300.000,00 144.000,00 444.000,00 Quadro 1. Aplicação do SAC Por meio dessa metodologia, as amortizações começam a ser pagas a partir do final do segundo ano, por conta do período de carência já predeterminado. Contudo, essa carência não interfere no pagamento dos juros, que já come- çam a ser pagos ao final do primeiro ano, não diminuindo o valor do saldo devedor. O cálculo dos juros é efetuado sobre o saldo devedor do período anterior. Assim, o saldo devedor diminui somente com a amortização da dívida (GIMENES, 2006). Veja alguns aspectos relevantes sobre o funcionamento do SAC: é uma opção sugerida para quem tem a possibilidade de quitar a dívida de forma antecipada; é caracterizado por uma amortização maior no início e um saldo devedor que cai mais rapidamente; demanda um capital maior para o início do financiamento. Em síntese, no método de amortização SAC, também conhecido como “método hamburguês”, as prestações ao longo do contrato ou empréstimo reúnem a composição das amortizações constantes mais os juros variáveis decrescentes (ASSAF NETO, 2016). Sistemas de amortização4 Um sistema de amortização pouco utilizado é o alemão. Ele consiste em liquidar uma dívida de modo que os juros sejam pagos antecipadamente com prestações iguais, exceto no primeiro pagamento, que corresponde aos juros cobrados no momento da operação financeira. Nesse sistema, é necessário conhecer o valor de cada pagamento e os valores das amortizações. Tabela Price O sistema Price, também conhecido como “sistema francês”, consiste no paga- mento de um empréstimo por meio de um conjunto de prestações sucessivas e constantes, de modo que a amortização do saldo devedor é realizada ao longo do contrato (HOJI, 2016). Ele é largamente utilizado no mercado fi nanceiro e de capitais brasileiro; é o sistema mais conhecido no País. A denominação deve-se ao matemático, filósofo e teólogo inglês Richard Price, que incorporou a teoria dos juros compostos às amortizações de em- préstimos. A principal característica desse sistema são as prestações cons- tantes ao longo do tempo. Para que isso ocorra, é necessário que as parcelas da amortização sejam menores no início e maiores no final. Além disso, as parcelas dos juros devem ser maiores no início e menores no final. Observe a Figura 2 para compreender melhor esse conceito. Figura 2. Composição das prestações no sistema Price. 5Sistemas de amortização Utilizando o mesmo exemplo do sistema de amortização anterior, deve-se calcular o valor de cada uma das prestações a partir do segundo ano, consi- derando que elas devem ser iguais entre si. Gimenes (2006) utiliza a equação do fluxo de caixa uniforme. Veja: Onde: VP (valor presente): 300.000 i (taxa de juros): 12% ao ano n (período de pagamento): 5 anos PMT (valor das prestações): ? Portanto, o valor de cada prestação, que é composta da amortização so- mada aos juros, deve ser o montante de R$ 83.222,92 a partir do segundo ano. O Quadro 2 apresenta de outra forma o método de cálculo do sistema Price. Final do ano Amortização (a) Juros SDp – 1 × 12% (b) Prestação (a) + (b) Saldo devedor (SD) Hoje 300.000,00 1 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 2 47.222,92 36.000,00 83.222,92 252.777,08 3 52.889,67 30.333,25 83.222,92 199.887,41 4 59.236,43 23.986,49 83.222,92 140.650,98 5 66.344,80 16.878,12 83.222,92 74.306,18 6 74.306,18 8.916,74 83.222,92 0,00 Total 300.000,00 152.114,60 452.114,60 Quadro 2. Aplicação do sistema Price Sistemas de amortização6 Nesse método, todas as prestações são iguais após o período de carência. Além disso, a amortização é calculada após o cálculo dos juros, sendo a diferença entre a prestação e os juros. A Figura 3 exemplifica o quanto a amortização e os juros compõem cada parcela de pagamento. Figura 3. Prestações — juros e amortizações. Perceba também que, por começar a amortizar com um valor menor no início, quem escolhe esse tipo de sistema acaba pagando mais juros do que no SAC. Veja alguns aspectos relevantes sobre o funcionamento do sistema Price: é caracterizado por uma amortização menor no início e por um saldo devedor que demora a cair; não é uma boa opção para quem tem a possibilidade de quitar a dívida de forma antecipada; demanda um capital menor para iniciar o financiamento. Em resumo, no sistema Price de amortização, as prestações são constantes ao longo do tempo. Tais prestações são compostas em parte por amortizações diferentes e crescentes e em parte por juros com valores diferentes e decres- centes ao longo do período (ASSAF NETO, 2016). 7Sistemas de amortização SAA No SAA, o principal da dívida só é amortizado ao final do período do contrato. Assim, ao longo do contrato, são quitados apenas os juros sobre o saldo devedor, que se mantém inalterado até o vencimento da dívida (HOJI, 2016). Nesse sistema, o principal é pago em apenas uma parcela, no final do período. Ou seja, a amortização é paga como um todo no final do contrato estipulado. Na Figura 4, veja uma representação do método de amortização. Figura 4. Composição das prestações no SAA. No Quadro 3, a seguir, veja a aplicação de um exemplo. Para esse caso, o período de carência é de 5 anos, e não de apenas 1 ano, como nos sistemas que você viu anteriormente. Sistemas de amortização8 Final do ano Amortização (a) Juros SDp – 1 × 12% (b) Prestação (a) + (b) Saldo devedor (SD) Hoje 300.000,00 1 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 2 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 3 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 4 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 5 0,00 36.000,00 36.000,00 300.000,00 6 300.000,00 36.000,00 336.000,00 0,00 Total 300.000,00 216.000,00 516.000,00 Quadro 3. Aplicação do SAA Na situação mostrada no Quadro 3, os juros pagos são os maiores dentre os três sistemas, pois a amortização ocorre apenas no final. Assim, correm juros sobre todo o saldo devedor ao longo de toda a vida do empréstimo. A seguir, veja alguns aspectos relevantes sobre o funcionamento do SAA: é caracterizado pela possibilidade de o devedor quitar a sua dívida quando quiser; permite o pagamento parcial da dívida, reduzindo o valor dos juros proporcionalmente; é indicado quando está previsto o recebimento de uma quantia futura suficiente para quitar a dívida. Esse tipo de sistema é muito utilizado na emissão de debêntures e títulos do governo com pagamentos intermediários (SILVA, 2012). Esses pagamentos intermediários recebem também o nome de “cupons”, que nada mais são do que os juros pagos sobre o saldo devedor. 9Sistemas de amortização No modelo americano de amortização, as prestações de quase todo o período envolvem o pagamento de juros fixos. Assim, a amortização do principal é paga somente no último período do empréstimo. Ou seja, durante quase todo o tempo do empréstimo, a prestação é quase toda composta pelos juros; apenas no último período essa composição se altera, pois inclui a amortização do valor principal (ASSAF NETO, 2016). A Caixa Econômica Federal possui uma política de financiamento da casa própria. Tal política é vinculada a um programa de incentivo e auxílio para a moradia criado pelo Governo Federal, o Sistema Financeiro de Habitação (SFH). No financiamento pelo SFH, é necessário definir: o valor e o prazo; se a taxa de juros será pré ou pós-fixada; a fórmula de cálculo da prestação. ASSAF NETO, A. Matemática financeira e suas aplicações. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2016. CARVALHO, L. C. S.; ELIA, B. S.; DECOTELI, C. A. Matemática financeira aplicada. Rio de Janeiro: FGV, 2009. GIMENES, C. M. Matemática financeira com HP 12c e Excel: uma abordagem descompli- cada. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006. HOJI, M. Matemática financeira: didática, objetiva e prática. São Paulo: Atlas, 2016. SILVA, J. P. Análise financeira das empresas. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2012. Leituras recomendadas BREALEY, R.; MYERS, S.; ALLEN, F. Princípios de finanças corporativas. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2018. GITMAN, L. J. Princípios da administração financeira. 12 ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2010. ROSS, S. A. et al. Fundamentos de administração financeira. 9. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013. Sistemas de amortização10