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Lição 01 Bases da análise sensorial de alimentos Técnica Dietética Começar a aula 1. Introdução A disciplina de técnica dietética aborda diferentes formas de pré-preparo e preparo dos alimentos, para que sejam disponibilizados os nutrientes da melhor forma possível para o corpo humano. No entanto, o alimento, além de fornecer nutrientes, está relacionado com outras características, como memórias afetivas, fatores sociais e culturais, prazer, dentre outros. Os alimentos ou preparações precisam ter atributos sensoriais que despertem o interesse dos indivíduos em consumi-los. Sendo assim, faz-se necessário entender e analisar os alimentos em relação aos atributos sensoriais. A análise sensorial de alimentos é utilizada para identificar, evocar, medir, quantificar e analisar as características de alimentos ou preparações da maneira como são percebidas pelos indivíduos que avalia. Na nutrição, a análise sensorial pode ser utilizada para avaliar a aceitabilidade das refeições, tanto em Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN) institucionais (merenda escolar, restaurante popular, restaurante universitário, presídios, outros) quanto comerciais (restaurante tipo self- service, a la carte, outros). Além disso, há grande aplicação dos testes sensoriais na elaboração de novos produtos. Em diversos estudos de elaboração de produtos funcionais ou com substituições de ingredientes, são aplicados os testes de análise sensorial para verificar a aceitação ou preferência ou estudar as características dos novos produtos. O homem é o principal instrumento utilizado na análise sensorial de alimentos, portanto, utiliza dos sentidos, como visão, tato, olfato, audição e paladar para avaliar os alimentos e/ ou preparações. No entanto, o ser humano é influenciado por diversos fatores que, em análise sensorial, são classificados em fatores fisiológicos, fatores relacionados à personalidade e fatores psicológicos. Os fatores fisiológicos são aqueles que estão associados à exposição contínua a um estímulo. Por exemplo: nos acostumamos a sentir o perfume, conforme o uso e, com o tempo, nem sentimos mais tal cheiro. Os fatores relacionados à personalidade envolvem as características individuais das pessoas. Existem indivíduos, por exemplo, que são mais analíticos, ou seja, concentram-se nos detalhes. Já outras pessoas são mais sintéticas e analisam o alimento ou preparação como um todo, sem muitos detalhes. E os fatores psicológicos envolvem erros associados ao estado emocional dos indivíduos no momento de análise. Por exemplo: o indivíduo vai realizar uma análise sensorial de biscoito sem glúten e chega para realizar a análise com certa expectativa sobre a preparação. Com intuito de realizar adequada análise sensorial, estes fatores precisam ser controlados e, para isso, a análise deve ser bem planejada e organizada. Sentidos humanos. 2. Condições de aplicação dos testes Ao realizar um teste para analisar atributos e características sensoriais, alguns fatores precisam ser considerados no planejamento, como local do teste (análise), horário, padronização de amostras, dentre outros. O teste sensorial pode ser aplicado em laboratórios de análise sensorial ou em local externo ou também chamados de locais centrais, como supermercados, restaurantes, escolas, dentre outros. Grande parte dos testes é realizada individualmente e em laboratórios específicos para análise sensorial. Estes laboratórios possuem cabines individualizadas e mesas para discussões em grupos, quando necessário. Além disso, os laboratórios devem ser de fácil acesso, livre de odores (interfere na análise) e com conforto físico para os indivíduos. Vale ressaltar que, em análise sensorial, o indivíduo treinado para realizar um teste é chamado de julgador ou avaliador; já um indivíduo sem treinamento é denominado consumidor. Cabine individualizada para análise sensorial. O horário de realização das análises também deve ser pensado no planejamento, uma vez que o ideal é verificar a disponibilidade dos avaliadores e consumidores. Estes indivíduos não podem estar famintos ou fadigados, pois podem ocorrer interferências na análise. Além disso, o tipo de amostra a ser analisada também influencia na escolha do horário do teste. Por exemplo: ao analisar amostras de carnes, é indicado que não seja realizado logo pela manhã, já que não é habitual o consumo deste tipo de alimento neste horário. As amostras precisam ser padronizadas e uniformes, sendo que a quantidade servida deve ser suficiente para análise. Amostras sólidas, geralmente, são servidas de 15 a 20 g, líquidas, 25 mL, e bebidas, 50 mL. Algumas amostras são servidas em unidades, como balas, doces, bombom e outros. É importante dizer que avaliadores e consumidores não precisam necessariamente ingerir a amostra para a realização da análise. As amostras devem ser servidas na temperatura em que são consumidas normalmente, principalmente em testes que utilizam os consumidores. Já para os avaliadores, as amostras podem ser servidas nas temperaturas em que suas características serão intensificadas ou destacadas. Este fator dependerá do objetivo dos testes. Nos testes em laboratórios, as amostras devem ser servidas em recipientes codificadas com números de três dígitos em recipientes ou utensílios padronizados. Sabia dessa? Alimento suporte é um alimento ou substância usado como suporte para o produto que se deseja analisar. Por exemplo, nem todos conseguem ingerir o azeite puro, então, pode ser utilizado um pedaço de pão como suporte para análise do azeite. Este tipo de conduta deve ser planejado com cautela, uma vez que o alimento suporte pode interferir na análise do alimento. Além disso, em testes com avaliadores, o suporte não precisa ser utilizado. Codificação de amostras com números de três dígitos aleatórios. 3. Classificação de métodos de análise sensorial Os métodos de análise sensorial são classificados em discriminativos ou de diferença, métodos afetivos e descritivos. Os métodos discriminativos são utilizados para avaliar pequenas diferenças entre as amostras. Os métodos afetivos avaliam a preferência ou aceitação dos consumidores e os métodos descritivos caracterizam e descrevem as propriedades de uma amostra. Veremos, a seguir, exemplos dos diferentes tipos de métodos. 3.1. Métodos de diferença ou discriminativos Nos métodos de diferença, geralmente, são utilizados avaliadores para que seja possível determinar pequenas diferenças entre as amostras. Existem diferentes testes que podem ser aplicados, como o teste de comparação pareada, duo-trio, triangular, de ordenação, comparação múltipla, A não A, duas em cinco, diferença do controle, tetraédrico e outros. O teste a ser escolhido depende do objetivo da análise, disponibilidade de amostras, tempo e número de avaliadores disponíveis. O teste de comparação pareada é usado para saber se uma amostra tem alguma característica mais ou menos intensa do que outra amostra. Por exemplo: saber, entre duas amostras de suco, qual é a mais doce. A análise dos dados é dada pelo somatório do número de respostas para cada amostra e comparado com uma tabela. Assim, é possível estabelecer se há ou não diferença significativa entre as amostras. O teste duo-trio é usado para verificar a diferença entre duas amostras. O avaliador recebe uma amostra codificada com a letra R, que significa Referência, e outras duas amostras codificadas com três números aleatórios. Em seguida, os avaliadores são instruídos a identificar a amostra que é igual a amostra R. A análise dos dados acontece da mesma forma que o teste de comparação pareada, no qual é feito o somatório das respostas e comparado com valores tabelados. O teste triangular é parecido com o teste duo-trio, porém o avaliador recebe três amostras e precisa identificar a amostra diferente. A vantagem deste teste em relação ao duo-trio é que a probabilidade de acertoao acaso (chute) é de 1/3, enquanto a do duo-trio é de metade (1/2). O teste de ordenação é usado para comparar diversas amostras ao mesmo tempo, geralmente três ou mais amostras. Neste teste, o avaliador é instruído a ordenar as amostras de acordo com uma característica. Por exemplo: ordene as amostras em relação ao sabor doce (a número 1 será considerada mais doce e a última, a menos doce). Neste teste, são somados os dados, aplicado um teste estatístico de diferença mínima significativa e comparado com valores tabelados. Exemplo de ficha para teste de ordenação: O teste de comparação múltipla indica se há diferenças entre as amostras e o grau dessa diferença. O avaliador recebe uma amostra codificada com a letra R (referência) e outras amostras codificadas com números de três dígitos. Então, é instruído a comparar as amostras com a amostra referência, dizer se há diferença e o quanto difere. Por exemplo: a amostra 234 é mais escura do que a amostra R, ou a amostra 234 é menos escura do que R ou a amostra 234 é escura igual a R. A análise dos dados é feita por análise de variância (ANOVA) e, quando três ou mais amostras, é aplicado um teste de comparação de médias, como por exemplo Tukey. Tabela com resumo dos testes discriminativos e algumas características. Teste Nº de Avaliadores P.A.C Análise dos dados Comparação pareada 20 a 40 1/2 Tabelas de nº mínimo de diferença significativa Duo trio 20 a 40 1/2 Tabelas de nº mínimo de diferença significativa Triangular 20 a 40 1/3 Tabelas de nº mínimo de diferença significativa Ordenação 8 - Friedman ou Kramer Comparação múltipla 20 a 50 - ANOVA e teste de comparação de médias Nº: número; P.A.C: Probabilidade de Acerto ao Acaso. Como citado anteriormente, os métodos discriminatórios são muitos, sendo que cada um tem suas particularidades e objetividades. O analista que decidirá qual teste vai gerar as respostas esperadas. Adaptado de CHAVES, J. B. P. Métodos de diferença em avaliação sensorial de alimentos e bebidas. Viçosa: Editora UFV, 2001. 91p. Exemplo de ficha para teste comparação pareada. Adaptado de CHAVES, J. B. P. Métodos de diferença em avaliação sensorial de alimentos e bebidas. Viçosa: Editora UFV, 2001. 91p. 3.2. Métodos afetivos Os métodos afetivos, na maioria, envolvem consumidores (indivíduos sem treinamento) e expressam reações, como gostar ou não de um produto ou preferir um em relação a outro. Estes métodos são classificados em qualitativos (grupo de foco, equipe de foco, entrevistas, outros) e quantitativos (teste de aceitação e preferência). O grupo de foco é um tipo de teste quantitativo que consiste em grupos de 8 a 12 pessoas. O grupo é instruído a expor suas ideias, opiniões, atitudes, motivações sobre algo proposto pelo analista. Este tipo de teste não é utilizado exclusivamente em análise sensorial, sendo largamente utilizado em áreas como marketing, administração, seleção de recursos humanos e outros. Saiba mais sobre grupo de foco lendo o seguinte artigo. Clique aqui para acessar. Escala hedônica de 9 pontos. Adaptado de MINIM, V.P.R. (Ed) Análise Sensorial: estudos com consumidores. 4ª Ed. Viçosa: editora UFV, 2010. p.13 – 49. Escala facial. Adaptado de MINIM, V.P.R. (Ed) Análise Sensorial: estudos com consumidores. 4ª Ed. Viçosa: editora UFV, 2010. p.13 – 49. A escala não estruturada tem suas vantagens e desvantagens em relação à escala estruturada. Dentre as vantagens, destaca-se o fato de que o consumidor ou avaliador poder marcar em qualquer ponto da escala, ou seja, ausência de um valor numérico associado à resposta. A principal desvantagem é a dificuldade da repetibilidade, ou seja, dificuldade de o indivíduo marcar o mesmo ponto para a mesma resposta. A escala de atitude mede a aceitação pela atitude dos consumidores. Por exemplo: comeria sempre, comeria se fosse acessível, etc. Já a escala do ideal mede a intensidade de um atributo sensorial que o consumidor considera ideal ou não. Por exemplo: sabor doce mais intenso do que ideal, sabor doce menos intenso do que o ideal, etc. Os testes de preferências mais usados são: pareado-preferência, ordenação-preferência e comparação múltipla. A aplicação destes testes é semelhante a dos testes discriminativos, no entanto, é indicado a optar por amostras preferidas ao invés de buscar diferenças. Inclusive, as formas de análises dos dados são semelhantes, em que é realizado o somatório das notas e os valores comparados com os valores encontrados em tabelas. Escala não-estruturada. Adaptado de MINIM, V.P.R. (Ed) Análise Sensorial: estudos com consumidores. 4ª Ed. Viçosa: editora UFV, 2010. p.13 – 49. 3.3. Métodos descritivos Os métodos descritivos descrevem os alimentos qualitativamente ou quantitativamente, com objetivo de caracterizá-los sensorialmente. Exemplos de testes descritivos: Análise Descritiva (AD) ou perfil convencional, Perfil Descritivo Otimizado (PDO), perfil flash, perfil de sabor, perfil de textura, Análise Descritiva por Ordenação (ADO), Check-All-That-Apply (CATA), ,Napping e muitos outros. PARA REFLETIR: Afinal, qual motivo de tantos testes descritivos? A AD é um método muito utilizado e que possui várias aplicações como: desenvolvimento de novos produtos, comparação com produtos concorrentes, descrição de produtos com características tecnológicas inovadoras, dentre outros. Este teste foi adaptado de um teste chamado de Análise Descritiva Quantitativa, criado em 1974 por Stone e Sidel. A aplicação da AD é realizada em etapas: 1. Recrutamento; 2. Pré-seleção dos avaliadores; 3. Levantamento dos termos descritivos; 4. Definição de referências; 5. Treinamento; 6. Seleção final dos avaliadores; 7. Avaliação dos produtos; 8. Análise dos resultados. O recrutamento consiste em captar pessoas para analisarem os produtos e, geralmente, é realizado por meio de questionários. As perguntas devem fornecer informações acerca da disponibilidade de tempo dos indivíduos, habilidades em utilizar escalas, familiaridade com atributos sensoriais e outros questionamentos pertinentes ao estudo. Na pré-seleção, são aplicados testes discriminativos, como o duo trio ou triangular, com intuito de verificar a capacidade dos indivíduos em identificar diferenças mesmo que sutis. Em seguida, os julgadores pré-selecionados analisam a amostra e sugerem quais atributos devem ser avaliados. Assim, criam uma lista com os termos descritivos, por isso, esta etapa é denominada de levantamento de termos descritivos. Logo após a definição, são estabelecidas as referências, as quais são os extremos da escala. Por exemplo: se estou analisando cor de chocolate, o mais escuro pode ser um chocolate do tipo 70% e o mais claro, um chocolate ao leite. Desse modo, as amostras a serem avaliadas devem ser cor entre ambos os extremos (referências). A próxima etapa é o treinamento dos avaliadores, seguida da seleção final destes. Os avaliadores serão selecionados de acordo com sua capacidade de discriminação e repetibilidade. Só assim, a avaliação das amostras irá acontecer e os dados serão analisados. Atualmente, é crescente o interesse em testes descritivos com consumidores, os quais não recebem nenhum tipo de treinamento. A eliminação da necessidade de treinamento reduz custos, uma vez que há gasto de amostras, reduz tempo de análise, além de gerar dados com características afetivas Aprendendo mais uma! O Perfil Descritivo Otimizado (PDO) surgiu como uma forma de obter dados quantitativos e qualitativos que a AD fornece com redução de tempo. O PDO elimina a necessidade de realizar treinamento e seleção final dos avaliadores, uma vez que as referências são apresentadas junto à amostra a ser avaliada. incorporadas. São várias as propostas como o CATA, nappping, perfil flash e outras, mas é relatada baixa precisão dos dados. Este tipo de teste não é indicado para o controle de qualidade, mas é útil para o desenvolvimento de novos produtos.Saiba mais sobre testes descritivos lendo o livro: MINIM, VALERIA PAULA RODRIGUES; SILVA, R.C.S.N. Análise Sensorial Descritiva. 1. ed. Viçosa: Editora UFV, 2016. v. 1. 280p. 4. Conclusão A análise sensorial de alimentos é uma ferramenta que deve ser mais bem aproveitada pelos nutricionistas. Este tipo de análise gera dados interessantes sobre a aceitação de uma preparação, descreve as características de um produto ou preparação, indica se há diferença sensorial ao substituir ingredientes, dentre outras. No entanto, para que os dados gerados sejam confiáveis e seguros, a análise precisa ser bem planejada, desde o local em que será realizado o teste até a forma, a quantidade e o jeito de oferecimento das amostras. Além disso, a escolha do teste ideal é essencial para que as repostas alcancem o objetivo do analista. De acordo com o assunto abordado, são várias opções de testes disponíveis e, cada vez mais, vem surgindo novos testes nesta área. Por isso, você precisa estar atualizado em relação às opções disponíveis e ser crítico ao planejar uma análise sensorial de alimentos, independente da sua futura área de atuação profissional. 5. Referências ALMEIDA, T. C. A. Avanços em análise sensorial. São Paulo, SP: Varela, 1999. 286 p DELLA LUCIA, S.M. et al. Impacto de características sensoriais e não sensoriais na escolha e na aceitação de iogurte sabor morango. Enciclopédia biosfera, v. 6, n.9, 2010. PALERMO, Jane Rizzo (Ed.). Análise sensorial: fundamentos e métodos. São Paulo, SP: Atheneu, 2015. [10], 158 p.