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202 DEPRESSÃO: UM OLHAR NA PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA ANALÍTICA Marcelo Araújo Pinheiro 1 Sonielson Luciano de Sousa2 RESUMO A cada dia no Brasil o número de pessoas com sintomas de depressão só aumenta. Citamos alguns sintomas como tristeza, desânimo, falta de motivação, apatia, maior esforço para realizar tarefas fáceis, entre outros. Logo, é necessário saber/conhecer a doença na perspectiva da Psicologia Analítica com fito de responder algumas perguntas, como qual seu significado, sua causa, seu sentido, seu valor. Esse artigo apresenta-se com a finalidade de discorrer acerca da depressão, por conseguinte trazendo uma visão menos detestável, insuportável, desagradável, e mais “otimista” dessa enfermidade, amplificando o conceito a partir de uma pesquisa bibliográfica, colaborando com o significado e causas da doença que assola a população mundial neste século. PALAVRAS-CHAVE: depressão, transtorno, psicologia analítica ABSTRACT Every day in Brazil the number of people with symptoms of depression only increases. We cite some symptoms such as sadness, discouragement, lack of motivation, apathy, greater effort to perform easy tasks, among others. Therefore, it is necessary to know/know the disease from the perspective of analytical psychology in order to answer some questions about its meaning, its cause, its meaning, its value. This article aims to discuss depression, therefore bringing a less hateful, unbearable, unpleasant, and more "optimistic" view of this disease, while clarifying, amplifying the concept, meaning and causes of the disease that plagues the world population. in this century. KEYWORDS: depression, disorder, analytical psychology 1 Aluna de Psicologia. Centro Universitário Luterano de Palmas. Universidade Luterana do Brasil. E-mail: marcelo.fleuvis@gmail.com 2 Psicólogo clínico (CRP-23/1853), Mestre em Comunicação e Sociedade (UFT), Professor do curso de Psicologia do Ceulp/Ulbra. E-mail: sonielson.davince@gmail.com mailto:marcelo.fleuvis@gmail.com 203 Existe o pensamento, talvez uma fantasia que se repete, de que o objetivo da vida não é alcançar a felicidade e sim o significado (HOLLIS, 2006). INTRODUÇÃO A depressão é um distúrbio afetivo que acompanha a humanidade ao longo de sua história. No sentido patológico, há presença de tristeza, pessimismo, baixa autoestima, que aparecem com frequência e podem combinar-se entre si. É imprescindível o acompanhamento médico tanto para o diagnóstico quanto para o tratamento adequado. (Ministério da Saúde, 2005). A depressão é um transtorno comum em todo o mundo: estima-se que mais de 300 milhões de pessoas sofram com ele. A condição é diferente das flutuações usuais de humor e das respostas emocionais de curta duração aos desafios da vida cotidiana. Especialmente quando de longa duração e com intensidade moderada ou grave, a depressão pode se tornar uma crítica à condição de saúde. Ela pode causar à pessoa afetada um grande sofrimento e disfunção no trabalho, na escola ou no meio familiar. Na pior das hipóteses, a depressão pode levar ao suicídio. Cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio a cada ano sendo essa a segunda principal causa de morte entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos. É a principal causa de incapacidade em todo o mundo e contribui de forma importante para a carga global de doenças. Mulheres são mais afetadas que homens. Existem vários tratamentos medicamentosos e psicológicos eficazes para depressão (OPAS, 2021). De acordo com a OMS, cerca de 5,8% da população brasileira sofrem de depressão – um total de 11,5 milhões de casos. O índice é o maior na América Latina e o segundo maior nas Américas, atrás apenas dos Estados Unidos, que registrou 5,9% da população com o transtorno e um total de 17,4 milhões de casos. A doença, segundo a entidade, afeta pessoas de todas as idades e estilos de vida, causa angústia e interfere na capacidade de o paciente fazer até mesmo as tarefas mais simples do dia a dia. “No pior dos casos, a depressão pode levar ao suicídio, segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos”, destacou a OMS. “Ainda assim, a depressão pode ser prevenida e tratada. Uma melhor compreensão sobre o que é a doença e como ela deve ser prevenida e tratada pode ajudar a reduzir o estigma associado à condição, além de levar mais pessoas a procurar ajuda”, completou a entidade. 204 Ademais, ainda há o Projeto de Lei N.º 2.635 de 2019 que cria a Cria a Política de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome da depressão nas redes públicas de saúde e dá outras providências tramitando na Câmara dos Deputados, a justificativa da criação da lei alerta para o fato de que a depressão é na realidade uma ampla família de doenças e por isso é denominada Síndrome. Conhecida como o “mal do século”, ela atinge mais de 320 milhões de pessoas de todas as idades no mundo (OMS) e no Brasil a estimativa é que 11 milhões sejam afetadas pela doença bem como a responsabilidade do Estado em relação à saúde pública e tem o dever de esclarecer esta doença que tanto desencadeia sofrimento, incapacita a pessoa de sentir prazer e a faz perder a vontade de viver, podendo levar ao suicídio. Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM 5, para o indivíduo ser diagnosticado com a depressão deve se apresentar com 05 (cinco) critérios dos 09 (nove) arrolados pelo Manual bem como ter duração de pelo menos 02 (duas) semanas de um dos sintomas: humor deprimido ou perda de interesse/prazer. Os sintomas descritos no DSM são: ● Humor deprimido em grande parte do dia, praticamente todos os dias, de acordo com o relato do paciente (por exemplo, a pessoa se sente triste, vazia ou sem esperança) ou então outra peça observa o comportamento do paciente (por exemplo, a pessoa parece chorosa). Em crianças e adolescentes, pode ser humor irritável; ● Grande diminuição de interesse ou prazer em praticamente todas ou quase todas as atividades na maior parte do dia, quase todos os dias, de acordo com o relato subjetivo ou observação); ● Perda ou ganho significativo de peso sem estar fazendo dieta (por exemplo, uma mudança de mais de 5% do peso corporal em menos de um mês) ou redução ou aumento no apetite quase todos os dias; ● Insônia ou hipersonia quase diária; ● Agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias; ● Fadiga ou perda de energia quase todos os dias; ● Sentimentos de inutilidade ou culpa excessiva ou inapropriada, podendo inclusive ser delirantes quase todos os dias, não sendo um mero autorrecriminação ou culpa por estar doente; ● Capacidade diminuída para pensar ou se concentrar, ou indecisão quase todos os dias (por relato subjetivo ou observação feita por outra pessoa); 205 ● Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para cometer suicídio. Outrossim, há outros sintomas aventados pelo Manual que não se apresentam diretamente correlacionados à doença, são eles: desesperança, pessimismo, irritabilidade, retraimento social, esquecimentos, ansiedade, sintomas físicos sem explicação, sintomas paranóides, sintomas obsessivos e compulsivos e baixa autoestima. Ainda, o Manual também classifica a depressão em 05 (cinco) tipos: Transtorno Disruptivo de Desregulação do Humor, Transtorno Depressivo Maior, Disfórico pré-menstrual, Transtorno Depressivo Induzido por Substância/Medicamento, Depressão devido a outra condição médica. Vale lembrar que conforme o DSM-5, a depressão é caracterizada por um grau de tristeza muito grave ou persistente, podendo acabar interferindo no dia a dia da pessoa, diminuindo o seu interesse ou prazer em suas atividades diárias. Percebe-seque apesar de alto grau de complexidade de sintomas que a doença apresenta, o Manual aventa uma definição simplista e simplória. MATERIAS E MÉTODO Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, a qual é classificada como uma modalidade de pesquisa exploratória. Este tipo de pesquisa tem como objetivo principal estabelecer o contato entre o pesquisador e o que já foi produzido a respeito do tema de escolha para apoiar o trabalho científico. A pesquisa foi realizada através do Google Acadêmico, incluindo somente a análise de produção científica materializada em artigos científicos, uma busca com as palavras chaves “depressão”, “C.G. JUNG”, “psicologia analítica”, “transtorno”, somente trabalhos discorridos em língua portuguesa. A busca resultou em centenas de obras acadêmicas, selecionamos 08 (oito) documentos em razão da relevância do assunto para que estes pudessem contribuir para os resultados da pesquisa. O título, o resumo e a conclusão das obras selecionadas, apresentou-se como critério para a escolha dos trabalhos. Após elegermos os documentos através de uma análise e uma leitura 206 (overview) houve a certeza de que os trabalhos selecionados apresentavam informações úteis para a pesquisa, evidenciamos que esses documentos embasaram a pesquisa. Além de artigos científicos, utilizou-se outras fontes para a construção deste trabalho como as Obras Completas de Carl Gustav Jung, composta por 35 (trinta e cinco) volumes, incluindo os índices gerais bem como outros livros de analistas junguianos. A pesquisa analisou o conteúdo dos documentos (artigos e livros) prezando pela inerência e relevância com o objetivo do artigo. Ressalta-se que os procedimentos metodológicos desta pesquisa se encontram em conformidade com o que prediz a resolução nº 510, de 07 de abril de 2016, sobre a utilização de dados em ciências humanas e sociais. O inciso VI, do parágrafo único, do art. 1 da referida resolução determina que pesquisa realizada exclusivamente com textos científicos para revisão da literatura científica não serão registradas nem avaliadas pelo sistema CEP/CONEP. Como já descrito anteriormente, para a obtenção dos dados foram utilizados livros especializados, artigos científicos e trabalhos de conclusão de curso armazenados em plataformas digitais (BRASIL, 2016). A DEPRESSÃO NA PSICOLOGIA ANALÍTICA Nas Obras Completas de C.G Jung, composta por 35 (trinta e cinco) livros, há citação da palavra depressão 106 (cento e seis) vezes, todavia o autor, não delimita, não enquadra, não conceitua taxativamente a doença, nota-se a complexidade desta doença bem como o “respeito” e a cautela que Jung apresentava em seus experimentos. [...] as depressões são um estímulo para se percorrer novos caminhos, seguir o caminho interior. Entretanto, muitas pessoas recusam-se a dar esse passo a frente. Elas ficam presas ao seu passado e procuram dar prosseguimento aos padrões de vida da primeira metade da vida. (DA SILVA, 2011) Jung arrolou que a depressão não era uma reação patológica, mas uma consequência natural da necessidade interior de modificação, isto é, apresentar-se deprimido não é necessariamente um sinal de neurose, assim chamando esse tipo de depressão como depressões transformativas. 207 Em O eu e o inconsciente (OC 7/2), no Capítulo III - A técnica de diferenciação entre o eu e as figuras do inconsciente, o autor relata que o inconsciente, tendo adquirido uma preponderância irredutível, dispõe de uma força atrativa capaz de invalidar todos os conteúdos conscientes; em outras palavras, pode desviar a libido do mundo consciente, produzindo uma “depressão”, um “abaissement du niveau mental 3” (Janet). Consequentemente, de acordo com a lei da energia, é de esperar-se um acúmulo de valor (libido) no inconsciente. Já no Símbolo da Transformação (OC 5/2), Jung ressalta que a depressão deve ser considerada como um fenômeno de compensação inconsciente, cujo conteúdo, para alcançar eficiência plena, deveria tornar-se consciente. Isto pode ser feito se se acompanhar a tendência depressiva e regredir conscientemente, integrando assim ao consciente as reminiscências animadas. Isto corresponde ao objetivo da depressão. A depressão acontece quando estamos sobrecarregados, preocupados com várias coisas, muitas distrações, as reservas físicas e psicológicas estão esgotadas conscientemente, nesses momentos, sofremos uma decepção e, naturalmente, nos sentimos vazios, como a fonte de água viva que habita em nós, fosse cortada. Certamente, assim que a depressão opera, esta interrompe as nossas energias despendidas de forma incorreta para que paremos por um tempo com intuito de recuperá-las. Para Esther Harding, considerada a primeira grande psicóloga junguiana nos Estados Unidos em seu escrito intitulado “The Value and Meaning of Depression” de 1981, o Deserto, talvez seja o símbolo mais adequado para a depressão. Simboliza uma condição ou experiência psicológica quando se tem a sensação de estar em uma região selvagem ou em um deserto – um sentimento de estar perdido, perdido em uma região inóspita, tão perdido que se está em um estado de desespero. Ainda, segundo Esther, sempre que o deserto aparece no mito ou no sonho, refere- se a um lugar ou estado de estagnação, onde não há vida, onde tudo é árido e nada pode crescer. De fato, o deserto só ganha vida no breve período da chuva da primavera. Então, como a Bíblia diz: "o deserto florescerá como a rosa", como qualquer um que esteve no deserto do Arizona na primavera viu e se maravilhou. Durante todo o resto do ano, o 3 Redução do nível mental 208 deserto é estéril, pedregoso, sujeito a extremos de calor e frio, os únicos seres vivos geralmente são espinhos e cardos - novamente cito a história da Bíblia, enquanto serpentes venenosas, insetos que picam e outras coisas nocivas geralmente abundam. A vida parece desacelerar. Provavelmente, cada um de nós, já experimentou tal depressão em algum momento de nossas vidas. Esse estado pode ser de curta duração, apenas um humor passageiro, ou pode ser prolongado de modo que não podemos mais considerá-lo como um humor passageiro, mas devemos considerá-lo como uma doença – da alma – da psique. Em sua pior forma, tal depressão pode chegar a uma psicose, uma melancolia ou a fase depressiva da chamada insanidade maníaco-depressiva. Para Esther, a causa da depressão pode ser algum revés na vida – trivial e transitório - talvez, desapontamento porque algo que se antecipou não se concretizou, ou um plano acalentado fracassou, ou um ego desejo foi frustrado. Quando a depressão é mais grave, pode ser devido a um bloqueio em toda a vida da pessoa – a morte de um ente querido, o fim de um casamento, doença grave, fracasso nos negócios ou o colapso de todas as esperanças e ambições. Mas seja qual for a causa, a causa determinante, como a chamamos, o mecanismo da depressão é a perda da libido. A energia vital e o interesse desaparecem no inconsciente, e a vida consciente fica alta e seca, estéril, árida, miserável e isolada. A pessoa sente-se em um lugar estéril, um deserto ou deserto, onde nada cresce e nenhuma vida pode florescer. Outra causa para a depressão nas situações que temos considerado, a libido cai no inconsciente porque seu fluxo para fora foi frustrado e os desejos conscientes foram controlados. Mas há situações em que a libido é retirada da consciência porque algum conteúdo inconsciente, algum elemento desconhecido, que tende a subir à consciência, exerce uma atração sobre ela. A sensação de vazio e esterilidade e depressão são muito semelhantes nos dois casos, mas o significado do acontecimento é muito diferente. Na primeira situação a depressão se deve a uma regressão, na segunda se deve a uma preocupação da libido com umconteúdo inconsciente interno que exige atenção consciente. 209 Em seu livro. The Journey Home, Richard Church fala da experiência de um ato criativo como sendo frequentemente precedido pela depressão. Ele ressalta que tal depressão não é meramente um estado de tédio e desânimo e desgosto pela vida, mas geralmente é acompanhada de inquietação e insatisfação e frequentemente com um vago sentimento de culpa, que só pode ser aplacado pelo trabalho, não o trabalho extrovertido, como Kipling aconselha a respeito da "corcova do camelo", mas o trabalho introvertido. O artista pegando suas ferramentas às vezes pode encontrar a paz, o escritor e o poeta começando a escrever. Mas não é apenas o artista que sofre desse tipo de depressão, escreve Richard Church: É uma condição perigosa (continua ele). É a causa daquela languidez4 que domina a maioria das pessoas na meia-idade. Essa 'escuridão ao meio-dia', essa acídia que interrompe o trânsito entre a terra e o paraíso, é o resultado direto da perda do lazer criativo." Quando caímos em uma depressão severa, uma que poderia realmente ser descrita como uma viagem noturna no mar, ou o vale da sombra da morte, talvez a pior parte da experiência seja a perda do sentido do significado. Parece que a vida chegou ao fim e podemos desistir. Em suas Memórias, Jung diz: "O homem não pode suportar uma vida sem sentido". É preciso um ato heróico para se manter firme nessa "noite escura da Alma". Jung achava que a neurose não apenas é uma defesa contra os ferimentos da vida, como também o esforço para curar as feridas. Assim, podemos respeitar a intenção da neurose mesmo que não respeitemos suas consequências. Os sintomas, portanto, são expressões de um desejo de cura. Em vez de reprimi-los ou eliminá-los precisamos compreender a ferida que eles representam. Então o ferimento e o motivo da cura podem contribuir para a expansão da consciência. Se conseguirmos suportar a ansiedade da solidão, novos horizontes se abrirão para nós e finalmente aprenderemos a existir independente do outro. A autora, ainda, aconselha o ar livre e o exercício, e assim discorre: A cura para este mal não é ficar parado e deitar um livro junto ao fogo, mas pegar uma enxada grande ou uma pá e cavar até você suar suavemente. Vejamos que o 4 Que se encontra em estado de abatimento, de grande fraqueza física e psicológica; sem forças, sem energia. 210 autor não somente acha importante o exercício, mas devemos ir além disso devemos voltar à Mãe Natureza que evoca o primitivo, o homem original em sua vida, ele mesmo cavando a terra. Os transtornos mentais, mais claramente a depressão, para a Psicologia Analítica, surgem enquanto tentativa de autorregulação psíquica sendo que a “busca de si mesmo, o encontro com o inconsciente e com as imagens da depressão são essenciais para o desenvolvimento pessoal” (PURCOTES, 2012, p. 618). O ego enfraquece e toda vontade de vida involui e regride para o inconsciente, lá essa vontade permanece indiferenciada. Lembra de um paciente de Jung que: A partir da ótica da Psicologia Junguiana, o sintoma é sempre uma parte de nós mesmos que está sendo negligenciada e que, por isso, sofre. Mas adoramos pensar em nossas dores como algo que não somos nós, que nos acomete de fora, que podemos extirpar com medicações e com o efeito tranquilizador dos diagnósticos (CONTRERA, 2019). CONSIDERAÇÕES FINAIS Percebe-se que a depressão é um pedido de socorro da alma, sem este, talvez, permaneceríamos incrustrados, enraizados, emaranhados na persona dominante, personificando os personagens, depreendendo que a trajetória da vida segue em linha reta, rumo a um objetivo sempre desconhecido, inencontrável, pois somente há busca de sentido na vida com o encontro de um propósito, do Self. A depressão, poderíamos conceituar como pressão para baixo, talvez esta qualificação não seja tão desprezível assim, concernente a Psicologia Analítica sem a depressão não há um caminho para o Self, para imago Dei. Metaforicamente, vejo uma árvore com seu caule e vários galhos adjacentes, imaginando o cume como o Self e os galhos “as depressões” no decorrer da vida possivelmente o indivíduo apresentará sintomas, todavia este deve superar para continuar no caule (caminho da vida) rumo ao cume (Self), a caminhada seria o processo de individuação. Agradecer, talvez não seja o adjetivo correto, ou melhor, perceber, ouvir estes sintomas que a própria doença nos apresenta para enxergarmos que há algo de errado, algo se apresenta “fora do eixo”, ter em mente que está fora de si, do objetivo, do sentido, do propósito de vida e vislumbrar, certamente, a depressão é um último aviso antes da morte, seja ela simbólica ou real. A depressão convida o indivíduo ao movimento negativo e lento: recolher-se, paralisar- se, deter-se, observar-se fora de si, ou seja, um movimento que tende à supressão do agir. Talvez seja por isso que as grandes imagens usadas para se referir a ela retratem seres pequenos e passivos 211 diante de algo maior que toma, envolve e é o verdadeiro agente da emoção: a noite que cai, a velhice que chega, o frio da separação, a certeza da perda. (GUIMARAES, 2016). Há um espírito de embotamento, desesperança, melancolia, nada vale a pena, na depressão a vida perdeu o significado, o propósito, os objetivos, ou melhor perdeu o sabor. No fim, devemos seguir a caminhada no deserto, símbolo, conforme Eliade (1952) que retrata certamente a definição, estado, significado, objetivo e de como devemos nos comportar através da simbologia do deserto: É um símbolo da alienação do homem e representa a noite escura da alma, a derrota do ego. Contudo é só a partir daí que podemos encontrar alguma manifestação de Deus pois a psique arquetípica tem maior potencial para servir de suporte quando o ego exaure seus recursos próprios e está consciente de que por si mesmo tornou-se incapaz. As imagens de deserto espelham desorientação, mas a partir delas o homem se torna capaz de entrar em sintonia com seu centro. É comum nos momentos de ruptura entre dois períodos distintos da existência que nos sintamos como que perdidos no deserto e sem orientação, mas é nessa solidão onde a dor de tão lancinante faz-se mais do que consciente que conseguimos nos redescobrir e entrar em contato com nossa totalidade (Eliade, 1952). Evidencia-se que Esther Harding, Em “The value and meaning of depression” (O valor e o significado da depressão), escrito em 1981, faz alusão no início da obra acerca do Deserto, afirmando que talvez seja o símbolo mais adequado para a depressão. Neste ambiente, ela diz, que o indivíduo está sozinho, isolado, sua vida em grande perigo. As fontes de água, de água vivificante, falharam e nenhuma chuva cai do céu. O céu e a terra parecem ter esquecido seus filhos. Talvez o psicólogo Frederic Flach esteja certo quando aduz que a depressão é sempre uma chance de vida, ela nos presta um serviço, pois nos induz de forma natural à recuperação do tempo e reflexão sobre o nosso objetivo de vida. Para Hollis (2006), evitar os sombrios estados da alma torna-se uma forma de sofrimento porque nunca podemos relaxar, nunca podemos abandonar o frenético desejo de sermos felizes e despreocupados, nunca podemos repousar tranquilos. Em vez disso somos puxados, inevitavelmente para baixo frequentemente e dolorosamente. 212 Entender o processo talvez seja a melhor forma ou a menos difícil de perpassar pelo estado da depressão de uma forma mais serena, remansada, compreender o significado, saímos do prumo da vida, a enfermidade está nos tentando mostrar isso, assim podemos ver, ter uma visão otimista, quase sempre, o tesouro se apresenta nas profundezas, era assim que os filmes do Indiana Jones nos mostravam.REFERÊNCIAS BRASIL. Presidência da República. Projeto de Lei N.º 2.635 de 2019. Acessado em: 08 de agosto de 2022. Disponível em BRASIL. Depressão. Secretaria de Vigilância em Saúde – Brasília: Ministério da Saúde, 2005. Acessado em 22 de abril de 2022. Disponível em BRASIL. Resolução Nº 510, de 07 de abril de 2016. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. Disponível em: . Acesso em: 26 out. 2022. CONTRERA, M.S. O rebaixamento dos sentidos – toda queda é uma depressão. 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Símbolos da transformação: analise dos prelúdios de uma esquizofrenia; tradução de Eva Stern ; revisão técnica Jette Bonaventure. - Petrópolis, Vozes, 2011. PURCOTES, Francisco Junior. O simbolismo da depressão na perspectiva junguiana Psicol. Argum., Curitiba, v. 30, n. 71, p. 613-620, out./dez. 2012. OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde. Depressão. Brasília (DF); 2003.