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PROJETO E CONSTRUÇÃO DE ESTRADAS E FERROVIAS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Relacionar as características de pontes e viadutos. > Identificar os locais passíveis de contenção. > Definir os tipos de contenção e obras apropriadas. Introdução Para o pleno funcionamento das rodovias e ferrovias, são necessárias obras com- plementares que permitam a passagem por obstáculos, como vales, rios, córregos ou outras vias, como as pontes e os viadutos. Na construção dessas vias, muitas vezes, é preciso construir cortes e aterros que, dependendo das características geotécnicas, devem ter estabilidade e segurança garantidas. Para isso, podem ser utilizadas as obras de contenção. Neste capítulo, você vai conhecer as características das as obras de artes especiais, como pontes e viadutos, os locais passíveis de contenções, como taludes de corte e aterro, e as estruturas de contenção, como murros de arrimo, cortinas atirantadas e estruturas de solo reforçado. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias Eduarda Pereira Barbosa Pontes e viadutos As obras de arte especiais são estruturas complementares necessárias para a implementação de rodovias e ferrovias. Em função de suas proporções e características, são executadas a partir de projetos específicos. Nesse grupo, encaixam-se as pontes e os viadutos, que são construções destinada à transposição de obstáculos para dar continuidade às vias. De acordo com a NBR 7188 (ABNT, 2013) as pontes são utilizadas para transpor obstáculos naturais, como rios, córregos e vales. Por sua vez, os viadutos são utilizados para transpor obstáculos artificiais, como avenidas, rodovias e ferrovias. O projetos dessas construções requer um conjunto de conhecimentos não apenas da área estrutural, mas também da área topográfica, cortinas atarantadas, hidrologia, geotecnia e tecnologias de sistemas construtivos, materiais de construção e fundações. É, portanto, um projeto multidisciplinar (NABAIS, 2014). A seguir estão os elementos que formam o projeto das obras de arte especiais, segundo Brasil (2015) e Nabais (2014). � Elementos topográficos: obtidos com levantamentos em campo. Con- sistem em planta topográfica, perfil longitudinal da via e do terreno, nos quais constam informações sobre o traçado, e greide. � Elementos de via: incluem as velocidades diretrizes, rampas máximas, raios mínimos, larguras da via e outras características. � Elementos geométricos: os desenvolvimentos planimétrico e altimétrico de uma obra de arte especial são definidos pelo projeto de rodovias e ferrovias conforme o traçado da via. Isso vale para transposição de pequenos obstáculos. No caso de obstáculos de médio e grande portes, o projeto de estradas é que deve ser elaborado considerando a melhor localização das pontes ou viadutos. � Elementos hidrológicos: o vão hidráulico a ser transposto por uma ponte é definido pela área da bacia de contribuição do rio, precipi- tação e intensidade da chuva, declividade do rio na região da obra, permeabilidade do terreno, velocidade de correnteza, etc. De forma geral, nos projetos rodoviários e ferroviários, é necessário desenvolver estudos hidrológicos para determinar as vazões de projeto dos cursos d’água que cruzam as vias. � Elementos geotécnicos: dados referentes às caracterizações geológica e geotécnica do solo sob o qual se situa a via, obtidos por sondagens de reconhecimento do solo, além de perfis e plantas geológicas de cartas oficiais. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias2 Os componentes principais das pontes e viadutos podem ser divididos em superestrutura, mesoestrutura, infraestrutura e encontros (Figura 1). Figura 1. Componentes de uma ponte. Fonte: Adaptada de Marchetti (2018). Aterro de acesso Aterro de acesso Viaduto de acesso Viaduto de acesso Ponte Rio Superestrutura Mesoestrutura Infraestrutura A superestrutura compreende os elementos que recebem diretamente as cargas provenientes do tráfego de veículos e transmitem-na para a me- soestrutura. É formada pelos componentes listados a seguir (BRASIL, 2016; DRESCH et al., 2018; NABAIS, 2014). � Tabuleiro: geralmente formado por uma laje de concreto ou aço que tem a função de suportar diretamente a estrutura do pavimento e as cargas de tráfego. � Vigas: transmitem as cargas do tabuleiro para os apoios laterais ou intermediários. � Juntas de dilatação: permitem os movimentos entre duas partes da estrutura, geralmente entre o tabuleiro e os concretos, ou entre partes dos tabuleiros em obras extensas. � Lajes de transição: lajes de concreto armado utilizadas para abranger a área entre a zona de aproximação da obra de arte e o encontro da estrutura. � Sistemas de segurança: protegem os veículos e as pessoas, como refúgios, guarda-corpo, guarda-rodas, defensas metálicas e barreiras de concreto. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 3 � Faixas especiais: calçadas ou faixas especiais para pedestres ou ciclis- tas, que devem garantir a separação dos fluxos e evitar as interferências nos percursos de cada usuário. � Sistemas de sinalização e iluminação: identificam a obra, informam cargas permitidas, gabarito vertical, gabarito horizontal e velocidade máxima. Têm a função de conduzir o tráfego nas pontes e viadutos e separar os fluxos, além de manter a visibilidade em qualquer horário para garantir a segurança e a uniformidade com os outros trechos da via. � Sistemas de drenagem: coletam e conduzem as águas pluviais do tabuleiro. A mesoestrutura é o conjunto de elementos responsável por dar suporte e conduzir as cargas da superestrutura para a infraestrutura. É formada pelos componentes listados a seguir. � Travessas: formam, com os pilares, uma espécie de tópico, permitindo a ligação entre as cabeças dos pilares e transmitindo a eles as cargas recebidas das vigas sob os tabuleiros. � Pilares: recebem as cargas da superestrutura e transmitem-nas para a infraestrutura. � Aparelhos de apoio: elementos intermediários entre a infraestrutura e a superestrutura, cuja função é transmitir as reações de apoio e permitir os movimentos da superestrutura. Geralmente, são elastômeros ou, em alguns casos, aparelhos deslizantes. A infraestrutura, por sua vez, é o conjunto de elementos estruturais que recebem as cargas da estrutura e transferem-nas para o solo. É formada por fundações, que diretamente transferem as cargas das pontes e viadutos para o solo. Podem ser fundações rasas, como os blocos e as sapatas, e profundas, como as estacas e os tubulões. Por fim, os encontros são elementos que fazem a transição entre as pontes e viadutos e as vias, além de serem utilizados para fazer contenção e estabilização dos aterros de acesso, recebendo os empuxos horizontais causados por estes. Podem ser cortinas, alas e lajes de transição. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias4 Um dos principais critérios de classificação das pontes está relacionado com o tipo de sistema estrutural utilizado, conforme a seguir (BRASIL, 2016; NABAIS, 2014). � Laje: laje maciça ou vazada em um vão biapoiado, sendo de concreto armado para vão de até 10 m e concreto protendido para vão de até 20 m. Umas das suas principais vantagens é a simplicidade na execução da obra. A desvantagem é que há um grande consumo de concreto e um peso próprio elevado. � Viga: a mais utilizada nas pontes e viadutos no Brasil, principalmente em vãos médios de 20 a 50 m. Pode ser de concreto armado ou pro- tendido, além de mista em aço e concreto. Pode ser de alma cheia, contínua ou elevado vazada. � Arco: uma das soluções mais utilizadas no passado, principalmente de concreto, pois predominavam os esforços de compressão. Também podem ser utilizados o aço e a madeira. Em função da necessidade de escoramento e do alto custo, passou a ser menos utilizada. � Pórtico: proporciona economia nos pilares, pois apresenta melhor desempenho em relação à flambagem, além de vencer grandesvão. A construção por balanços sucessivos possibilita também a economia de escoramentos, inclusive na transposição de vales profundos. � Estaiada: estrutura suspensa constituída por um tabuleiro apoiado em pilares e encontros também suspensos por um sistema de cabos de aço. Esses cabos são inclinados e partem de torres (pilones), que se ancoram em um ou vários pontos do vão. O tabuleiro pode ser metálico ou de concreto protendido, e as torres podem ser metálicas ou de concreto armado. São capazes de vencer vãos da ordem de 200 a 600 m, além de ter um elevado valor estético. � Pênsil: o tabuleiro é suportado por cabos verticais igualmente es- paçados, que se ligam a um cabo principal ligado a uma parábola, e ancorados nas extremidades das pontes ou viadutos. É recomendada para vencer vãos muito grandes. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 5 A Figura 2 mostra exemplos de algumas estruturas mencionadas. Figura 2. Tipos de estruturas. Fonte: Adaptada de Brasil (2016). Pênsil Viga Arco Pórtico Estaiada Os viadutos, por sua vez, podem ser divididos nos tipos a seguir (DRESCH et al., 2018). � Acesso: utilizados em vales muito abertos e que dão acesso às pontes. � Meia encosta: utilizados em estradas construídas ao longo de taludes muito inclinados, para viabilizar o tráfego. Indicado quando o uso de aterros for inviável devido aos volumes elevados. Já os viadutos construídos com a solução estrutural por meio de vigas podem ser classificados nos tipos a seguir (BRASIL, 1996; DRESCH et al., 2018). � Vales profundos com pilares esbeltos pouco espaçados e em forma de V (Figura 3a). � Vales profundos com pilares de espessura variável e grandes vãos (Figura 3b). � Vales não tão profundos, com vãos variáveis e aparência harmoniosa (Figura 3c). � Vales não tão profundos com vãos pequenos e iguais (Figura 3d). Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias6 Figura 3. Tipos de estruturas com vigas. Fonte: Adaptada de Brasil (1996). Outro fator importante a respeito de pontes e viadutos é a escolha da seção transversal, definida com base nas seguintes informações (NABAIS, 2014): � grandeza do vão longitudinal associado ao sistema estrutural; � altura da construção; � processo construtivo adotado; � equipamentos disponíveis; � economia e simplicidade das formas. As pontes e os viadutos são as obras de arte especiais mais conhe- cidas. Porém, nas rodovias e ferrovias, também são muito utilizados outros tipos, como as trincheiras (Figura 4). Figura 4. Trincheira: a) rodovia; b) ferrovia. Fonte: Adaptada de a) G1 RN (2018); b) Brasil (2021). Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 7 As trincheiras são variações dos viadutos e têm as mesmas finalidades, sendo muito utilizadas em pontos de cruzamentos entre vias. São construídas com o rebaixamento de uma dessas vias e escavações longitudinais realizadas no solo. A implantação de trincheiras é recomendada para eliminar interferências entre tráfegos de vias distintas, sendo condicionada a estudos de volume de tráfego das vias, classificação das rodovias, níveis de serviços, custos das obras, facilidade de construção e condições locais, especialmente as características geotécnicas em função das escavações e a adaptação à topografia do terreno (BRASIL, 2005). Locais passíveis de contenção Grande parte das intervenções realizadas em rodovias e ferrovias é realizada sem o cuidado adequado com as características geotécnicas dos materiais, como a adoção de taludes de corte e aterro com geometrias adotadas sem considerar o tipo de solo. Por menor que seja, qualquer intervenção resulta em danos ambientais, como a erosão (ABITANTE, 2017). A erosão é um dos principais passivos ambientais que podem ocorrer nas encostas de rodovias, sendo dividida em erosão inteira e erosão superficial. A erosão interna é causada pelo escoamento das águas da chuva, ocorrendo a remoção dos horizontes superficiais do solos, em um processo chamado de piping. A erosão superficial é causada pela concentração das linhas de fluxo de águas de escoamento superficial, que resultam em sulcos no terreno e podem evoluir para ravinas ou voçorocas. A seguir estão os locais mais suscetíveis à erosão. � Locais com mudanças bruscas no relevo natural. � Locais naturalmente sujeitos à erosão da superfície do terreno. � Taludes de corte e aterro constituídos de materiais suscetíveis à erosão e à desagregação. Os taludes representam qualquer superfície inclinada que limita um ma- ciço terroso. Podem ser naturais ou artificias, como os de corte e aterros (CAPUTO; CAPUTO, 2017; GERSCOVICH, 2016). A Figura 5 mostra a configuração de um talude. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias8 Figura 5. Componentes de um talude. Fonte: Caputo e Caputo (2017, p. 428). Os taludes naturais são formados por processos naturais, como a erosão. Caso o solo tenha resistência suficiente para suportar as solicitações atuan- tes, o talude permanece estável sem nenhum movimento de massa do solo (BARNES, 2016). Os taludes mais encontrados nas rodovias e ferrovias são os artificiais, ou construídos, que resultam de escavações, cortes e aterros (Figura 6). Figura 6. Taludes em rodovias e ferrovias. Fonte: Adaptada de Queiroz (2016). A seguir estão as características dos taludes artificiais (BARNES, 2016). 1. Escavações: permitem a construção de uma estrutura abaixo do nível do terreno ou a exploração de jazidas. Escavações com laterais ver- ticais necessitam que o solo seja apoiado por muros de contenção temporários ou permanentes. Escavações abertas sem apoio podem ser realizadas com laterais inclinadas, com um corte íngreme, respeitando os limites de segurança. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 9 2. Cortes: resultam de escavações com laterais inclinadas situadas abaixo do nível do terreno e devem ser estáveis em curto e longo prazo. Ge- ralmente utilizados na abertura das vias de transporte. 3. Aterros: resultam da deposição de material de preenchimento acima do nível do terreno, com laterais inclinadas. Geralmente utilizados para apoiar rodovias e ferrovias. Os aterros são construídos quando o solo do terreno de fundação tem baixa capacidade de suporte ou para nivelamento do terreno. Aspectos importantes na construção dos cortes e aterros devem ser considerados para garantir a estabilidade, como altura e inclinação adequada nos cortes. (GERSCOVICH, 2016). Esses locais são passíveis de deslizamentos, com diversas ocorrências ao longo da história, como os acidentes ocorridos em encostas do Rio de Janeiro e trechos das principais rodovias, entre as épocas de 1966 e 1967, que levaram à criação do Instituto de Geotécnica (CAPUTO; CAPUTO, 2017). Por isso, frequentemente os taludes necessitam de estruturas de contenção. Como noticiado diariamente, o desequilíbrio mecânico nos taludes e nas encostas ocasiona movimentos de massa. Em função de sua instabilidade, é comum ser vinculado apenas ao excesso de chuvas, porém, tecnicamente, as águas pluviais aumentam o peso do talude e, consequentemente, as ten- sões cisalhantes atuantes, que acabam por ultrapassar a resistência ao cisalhamento do maciço terroso, dando origem à ruptura deste (BARNES, 2016; FLORIANO, 2017). Além das chuvas, nas encostas naturais o intemperismo é o principal fator de ruptura, tendo em vista que os solos residuais perdem resistência ao cisalhamento ao longo do tempo. Em solos de aterros construídos pelo homem, a qualidade da compactação e as características geométricas são essenciais para que não ocorra a ruptura. Para os cortes, a geometria é o principal fator que contribui para a estabilidade do talude (FLORIANO, 2017). Os movimentos de massa podem ser definidos como qualquer tipo de ruptura e deslocamento dos solos ou rochas sob ação da gravidade. Como exemplo, podemos citar queda de solos, blocos de rochas e ruptura de taludes naturais. Esses movimentos afetam diretamenteas obras relacionadas com taludes naturais e artificias, como as rodovias e ferrovias, e podem originar desastres ou catástrofes, resultando em perdas econômicas e humanas. A seguir está a classificação desses movimentos de acordo com Das e Sobhan (2019), Queiroz (2016) e Zuquette (2015). Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias10 Queda Desprendimento do solo ou de fragmentos de rocha de um talude, em virtude do peso e da descontinuação dos maciços ou ação do intemperismo. Tombamento Movimento de rotação à frente do solo ou de massas rochosas no eixo abaixo do bloco, no sentido da encosta sob ação da gravidade. As principais causas são as forças exercidas por blocos adjacentes ou a pressão exercida pela água nas fraturas. Escorregamentos ou deslizamento Movimento descendente da massa de solo em uma superfície de ruptura. Nessa superfície, ocorre a separação do material escorregado do material subjacente, sendo conhecida pela superfície de deslizamento na qual de se dá o movimento. Pode apresentar forma cilíndrica ou côncava. No caso do deslizamento rotacional, a forma pode ser plana, sendo conhecido como des- lizamento planar. Ocorre de forma rápida com curta duração. O deslizamento rotacional geralmente ocorre em solos homogêneos, argilosos e moles. Nos materiais rochosos, pode ocorrer em maciços muito fraturados. O desliza- mento planar, por sua vez, pode ocorrer em solos, rochas e na superfície de separação entre ambos (ZUQUETTE, 2015). Expansão lateral ou espalhamento Deslocamento lateral de blocos que se formam em decorrência das fraturas ocasionadas por tração ou cortes ocasionados por liquefação. Geralmente esses materiais são areias ou siltes. Escoamentos Movimento descendente da massa de solo de forma semelhante aos fluidos viscosos. Constituem-se de movimentos rápidos com blocos de rochas ou solos que, em virtude da saturação, após chuvas intensas fluem encosta abaixo, muitas vezes ao longo de um vale. As zonas mais suscetíveis a esse tipo de movimento correspondem a encostas muito inclinadas e nuas de vegetação. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 11 O movimento de escoamento é dividido em rastejos, corridas de solo, corridas de areia ou silte, corridas de lama e avalanches de detritos (QUEIROZ, 2016). Rastejos Movimentos com velocidades lentas de solos ou rochas em encostas naturais ou taludes escavados. A velocidade ocorre em alguns poucos centímetros por ano. Ocorrem geralmente em locais com solos residuais em clima tropical úmido ou regiões de clima temperado a frio. Podem afetar muros de contenção, pilares de pontes ou edifícios, além de causar instabilidades nas obras. São identificados por sinais na superfície, como árvores com troncos curvados na direção da encosta, postes inclinados e estruturas rígidas rompidas. Além disso, funcionam como indicadores de instabilidade do maciço de solo. Corridas de solo Movimentos rápidos provocados pela ação da água, que satura o maciço e reduz o atrito entre as partículas sólidas. O solo perde totalmente a sua consistência e flui como um líquido viscoso. Ocorrem principalmente em épocas de intensa precipitação. Corridas de areia ou silte Nesse movimento, as areias e os siltes saturados escoam como se fossem líquidos. Corridas de lama Movimentos de massas de solos com grande quantidade de água e elevada fluidez, produzidos pela exposição de materiais argilosos misturados com detritos em locais de topografia inclinada. Avalanches de detritos Ocorrem em regiões de topografia acidentada, podendo envolver solos, ro- chas, neve ou gelo. Em virtude do clima, não ocorre esse tipo de movimento de massa no Brasil. A Figura 7 mostra os movimentos de massas apresentados. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias12 Figura 7. Movimentos de massas. Fonte: Adaptada de Das e Sobhan (2019). Esses movimentos podem ser prevenidos ou corrigidos com a estabilização de taludes, que inclui as opções a seguir (CAPUTO; CAPUTO, 2017; QUEIROZ, 2016). � Redução da inclinação do talude: método mais simples de redução do peso do talude, por meio da execução de um ou mais patamares. � Drenagem superficial e profunda: águas superficiais e infiltrações influenciam a estabilidade dos taludes. Podem ser utilizados furos horizontais, canaletas e outros dispositivos. � Revestimento do talude: a plantação de espécies vegetais adequadas ao clima local é uma medida eficaz contra a erosão superficial. Uma das técnicas de plantação utilizadas no Brasil é a hidrossemeadura com plantio por via líquida. � Materiais estabilizantes: melhoram as características de resistência do solo com a adição de produtos químicos, como injeções de cimento em maciços rochosos fissurados. � Bermas: banquetas de solo, em geral do mesmo material do talude, para aumentar sua estabilidade, em função da redistribuição das tensões de cisalhamento (Figura 8). Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 13 Figura 8. Berma de localização em talude. Fonte: Adaptada de Queiroz (2016). Berma de estabilização Canaleta Canaleta lateral Estrada � Estruturas de contenção: utilizadas quando a inclinação necessária para o equilíbrio das forças no interior do talude resulta em um talude aproximadamente vertical. A definição do tipo de estrutura a ser utilizado para a contenção de um maciço é determinada pelas características geotécnicas do solo e do tipo de carregamento a que está submetido. No próximo tópico, você vai conhecer as estruturas de contenção. Estruturas de contenção Nas obras de construção de rodovias e ferrovias, frequentemente, é neces- sário conter as massas de solo e, para isso, há uma grande variedade de estruturas, denominadas estruturas de contenção. Os muros de arrimo são as mais comuns. A contenção do solo se dá pelo peso próprio da estrutura. Além disso, a NBR 11682 (ABNT, 2009) classifica as estruturas de contenção em muros de gravidade, muros de flexão, estruturas ancoradas e estruturas de solo reforçado. Muros de gravidade Formam uma estrutura corrida e monolítica. Sua estabilidade e sua oposição aos empuxos horizontais são garantidas pelo peso próprio da estrutura. São utilizados para conter desníveis pequenos ou médios inferiores a 5 m. Podem ser constituídos de pedra, concreto simples ou armado, gabiões e pneus. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias14 Muros de flexão Resistem aos empuxos de flexão. Geralmente, utilizam parte do peso próprio do maciço arrimado que se apoia sobre sua base para manter o equilíbrio. Não são considerados estruturas monolíticas. Segundo Gerscovich, Danziger e Saramago (2019), essas estruturas são mais esbeltas que os muros de gravidade com seção transversal em formato de L. Geralmente são construídos em concreto armado, sendo considerados antieconômicos para alturas acima de 5 a 7 m. A face do muro trabalha à flexão e, se necessário, podem ser utilizadas vigas de enrijecimento. Para alturas acima de 5 m, são recomendados os contrafortes ou as nervuras para estabi- lidade contra risco de tombamento. Outra forma de melhorar a estabilidade dessas estruturas é ancorando a sua base com tirantes ou chumbadores. Estruturas ancoradas Nessas estruturas, a estabilidade é garantida por tirantes ancorados no terreno. Nesse grupo, encaixam-se as cortinas atirantadas, estruturas de contenção com parede de concreto armado, além de tirantes ancorados no terreno em uma profundidade em que o solo seja estável, sem possibilidade de ruptura ou movimentos indesejados (ABNT, 2009; GERSCOVICH; DANZIGER; SARAMAGO, 2019). As cortinas são estruturas de contenção esbeltas sujeitas à deforma- ção por flexão, sendo indicadas para contenção de maciços em que não há área suficiente para abrigar a base do muro em desníveis superiores a 5 m. São muito utilizadas em escavações de projetos de função e obras subterrâneas, como metrôs, galerias, subsolos, estruturas portuárias e outros. As principaissoluções em cortina são perfis com prancha de madeira, parede de concreto estroncada, perfil metálico, estacas justapostas e cortinas atirantadas. O uso de tirantes é recomendado quando o trecho enterrado da cortina, chamado ficha, não for capaz de garantir a estabilidade da estrutura (GERSCOVICH; DANZIGER; SARAMAGO, 2019). A Figura 9 mostra exemplos de muros de gravidade, flexão e arrimo. Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 15 Figura 9. Tipos de muro: a) gravidade; b) flexão; c) arrimo. Fonte: Adaptada de Gerscovich, Danziger e Saramago (2019). As ancoragens dos tirantes devem ser posicionadas ao montante de su- perfície potencial de ruptura para que possam trabalhar de forma eficiente, geralmente com inclinações na horizontal de 15 e 30º para facilitar a execução. Esses tirantes podem ser compostos por vergalhões de aço, cordoalhas ou fios tracionados por macaco hidráulico até uma carga definida em projeto e, posteriormente, fixados em um sistema de placas e porcas. Essas placas recebem esforços dos tirantes e distribuem as tensões em uma laje de concreto armado. A espessura da cortina que protege o maciço varia de 20 a 40 cm, a ser definida de acordo com as cargas dos tirantes e espaçamento da ancoragem (GERSCOVICH; DANZIGER; SARAMAGO, 2019; QUEIROZ, 2016). Além disso, devem ser utilizados drenos de saída de água, conhecidos como barbacãs, com o objetivo de evitar a pressão hidrostática sobre a cortina. Esses drenos lançam a água coletada em canaletas superficiais, colocadas longitudinalmente nas laterais da obra para promover o adequado escoamento do interior do maciço (QUEIROZ, 2016). As Figuras 10 e 11 mostram uma cortina atirantada. Figura 10. Uso de uma cortina atirantada. Fonte: Adaptada de Gerscovich, Danziger e Saramago (2019). Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias16 Figura 11. Componentes de uma cortina atirantada. Fonte: Adaptada de Queiroz (2016). Estruturas de solo reforçado A estabilidade dessas estruturas é garantida pelo reforço do terreno com elementos resistentes introduzidos no seu interior. Esses elementos são resistentes à tração e orientados adequadamente para aumentar a resistência do solo e reduzir as deformações do maciço terroso compactado. Esse me- canismo atua pela transferência de esforços para os elementos resistentes por meio do atrito e da interligação com a malha, atuando como armaduras internas do maciço. Podem ser utilizados grampos, fitas, geossintéticos, colunas de solo e cimento ou estacas que trabalham conjuntamente com o terreno (ABNT, 2009; QUEIROZ, 2016). O muro de solo reforçado atua como um muro de peso. A região reforçada do solo compactado atua como um muro de peso estabilizando o trecho não reforçado. Os maciços de solo reforçado propiciam uma redistribuição global das tensões e deformações, o que permite o uso de estruturas com face vertical, a exemplo de muros ou maciços íngremes, como os taludes, com menor volume de aterro compactado. As principais vantagens dessa técnica são a adoção de muros e taludes mais verticais, a execução de obras em locais de difícil acesso, a grande velocidade de execução, a melhoria estética da obra e a tolerância contra os recalques de fundação. Além disso, há a possibilidade de uso do próprio solo disponível como material da estrutura Obras de arte e contenção em rodovias e ferrovias 17 de contenção. A função do muro seria de evitar a erosão entre os reforços e garantir a estabilidade da estrutura como um todo (GERSCOVICH; DANZIGER; SARAMAGO, 2019). A Figura 12 mostra a configuração de uma estrutura de solo reforçado. Figura 12. Configuração de uma estrutura de solo reforçado. Fonte: Adaptada de Gerscovich, Danziger e Saramago (2019). Nível acabado Aterro compactado Solo residual Trecho não reforçado Zona reforçada Tubo dreno PEAD Viga em concreto armado Muro em solo reforçado com face em blocos pré-moldados Filtro drenante Geogrelhas Nível acabado É importante salientar que a escolha da estrutura de contenção ade- quada, assim como o projeto de construção, devem estar embasados em estudos topográficos, investigações geotécnicas e aspectos geológicos. Referências ABITANTE, A. L. Estradas. Porto Alegre: SAGAH, 2017. ABNT. 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Dnit libera tráfego de veículos em trincheira da BR-101 em Nova Parnamirim no sábado (29). G1, 27 set. 2018. Disponível em: https://g1.globo.com/rn/rio-grande-do- -norte/noticia/2018/09/27/dnit-libera-trafego-de-veiculos-em-trincheira-da-br-101- -em-nova-parnamirim-no-sabado-29.ghtml. Acesso em: 22 abr. 2021. GERSCOVICH, D. Estabilidade de taludes. 2. ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2016. GERSCOVICH, D.; DANZIGER, B. R.; SARAMAGO, R. Contenções: teoria e aplicações em obras. 2. ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2019. MARCHETTI, O. Pontes de concreto armado. 2. ed. São Paulo: Blucher, 2018. NABAIS, R. J. S. (org.). Manual básico de engenharia ferroviária. São Paulo: Oficina de Textos, 2014. QUEIROZ, R. C. Geologia e geotecnia básica para engenharia civil. São Paulo: Blucher, 2016. ZUQUETTE, L. V. Geotecnia ambiental. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. 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