Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.

Prévia do material em texto

e-MI o Cruso : o gomiflcoçõo aplicado m 
e espaços de convivêncio ................................................ ........................... 179 
9 . Ataque cyberbiológico: gomificoçõo e realidade 
aumentado aplicados em museus ..................................... .................. 195 
1 o . Picos e vales: gomificondo uma aula STEAM .......................... 205 
11 · Educoflix: como o gomificoçõo pode 
transformar suas aulas em um seriado do Netflix ...................... 219 
12. Closs Dosh: o ensino híbrido gomificodo ................................. 231 
13. Aprendendo o criar badges, cortas e avaliações 
gomificodos ....................................................................................................... 263 
PRLRIJRRS FltlRIS ............................................................................................. 279 
1 1 
-INTRODUÇAO 
CLIFT, CLOFT, STILL, 
a porta se abriul 
bordão dito por um ser mecânico sinalizava que o visitante 
havia seguido as instruções ou adivinhado a senha do dia: pu­
lar cm um pé só, imitar estátuas famosas, falar palavras começando 
· m a letra b ou citar derivados do leite. Ao menos, na minha 
memória, o porteiro do Castelo Rá-Tim-Bum1 foi o primeiro per­
s nagem que vi utilizando na prática o conceito que abordo ao 
ngo deste livro: a gamificação. 
Na minha infància, o programa era uma porta de acesso a 
um universo mágico, recheado de personagens, histórias e confli­
tos que não existiam no meu mundo real. Eu vibrava quando o 
Mau, uma criatura roxa, corria pelos encanamentos do castelo e, 
dentro de sua toca, me desafiava a repetir trava-línguas. No lustre 
do Castelo, as fadinhas Lara e Lana me deixavam curioso com os 
inúmeros enigmas que apresentavam. 
Depois de quase trinta anos, ainda me lembro do quão rico e 
educativo era o Castelo Rá-Tim-Bum. Mas jamais imaginava o poder 
1. Castclc> Rá- 'J'im-811111 é uma série de tcl('visão in fa ntojuvrn il produzida e exibida pcb TV C ultura entre 
1994 ,. 1997 . A criação é de Cao l lan1bur~11.1gt•11, que v1sitav.1m praticamrntc todo' º' d1as o Castdo. 
\ l'r· 
\t•lh 1n p 1· 1d,) 01u t thl llll 11\t 1 A, l Ml e. 111 2.7 h'v ~010. 
RULR EM JDGD 
Em 2007, no último ano da licenciatura em ciências biológi­
cas, tive a oportunidade de perceber e experimentar o poder dos 
elementos dos jogos na educação. Na ocasião, a professora de Didá­
lica de Ensino de Ciências, doutora Lúcia Maria Paleari, organizava 
uma exposição chamada Experimentando Ciência, em que os li­
·cnciandos desenvolviam um projeto de divulgação científica e, 
em seguida, preparavam para mostrá-lo, didaticamente, a toda a 
romunidade na forma de instalações. O Experimentando Ciência 
l ra temido por muitos estudantes devido ao alto nível de exigência 
da professora Lúcia, mas lembro muito bem de que minha turma 
de graduação gostou do desafio e entrou de cabeça no projeto. 
Na minha vida, considero que já existiram vários "Clift, cloft, 
-;till, a porta se abriu!", mas, definitivamente, no que diz respeito à 
.1plicação da gamificação como estratégia de ensino, o Experimen­
t.mdo Ciência foi o primeiro. Explico. Foram meses de trabalho 
d ·senvolvendo uma chave digital de identificação de artrópodes. 
No início, não fazia ideia de como realizaria o projeto, mas estava 
d ·cidido de que queria modificar a experiência de aprendizagem 
com uma chave de identificação de animais. Pensei em utilizar um 
painel magnético, tiras de papel, montar umjogo de cartas, mas as 
.1plicações interativas que via nos CD-ROMs da época chamavam 
muito a minha atenção. 
Comecei a trilhar o caminho da tecnologia querendo enten­
d ·r como se fazia aquelas imagens em movimento, as passagens 
de tela e a exploração do conteúdo de forma bonita, organizada e 
111tcrativa. A curiosidade e o desejo de dominar a ferramenta me 
inovam. Não é bem assim. 
O documentário Everything is a Remix, dirigido por Kirby Fergu­
son, mostra como toda invenção advém de uma cópia. 12 
No documentário, fala-se como Led Zeppelin fez sucesso no 
mundo copiando estilos musicais de outros artistas. E, no despertar 
de seu enorme sucesso, a banda mudou o status: passou de copiadora 
para copiada por outros grupos, como Aerosmith, Heart, Boston e 
até Eminem. Na segunda parte, Kirby fala que transformar o velho 
no novo é um dos maiores talentos de Hollywood: livros viram fil­
mes, que viram musicais ou vice-versa. Videogames viram filmes, que 
depois viram desenhos e até seriados de TV e vice-versa. 
12. Assista ao documentário kgcndado produzido por Kirby Ferguson. Disponível cm: . Acesso cm: 29 frv. 2020. 
50 
A' l 011tinua~· . Acc,so c m : 2y Story cm 1995. D isponível cm:. 
Artsso '' m : 29 fcv. 2020. 
53 
sobr a imp rtân ia daCur,mdo Nemo, lançado cm 200.l. Disponível cm: . Acesso cm: 29 fcv. 2020. 
16. Confira um trecho do filme Monslrs S.A., lançado cm 2001. Disponível cm: . Acesso em: 29 fcv. 2020. 
17. Confira um trecho do filme Os incríveis, lançado em 2004. Disponível cm: . Acesso cm: 29 fcv. 2020. 
18. Confira um trecho do fi lme Carros, lançado em 2006. D1sponívd cm: . Acesso cm: 29 fev. 2020. 
19. Confira um trecho do fil me Rarmouillc. lançado cm 2007. Disponível cm: . Acc·sso cm: 29 ti:v. 2020. 
20. Confir,1 o trailer do filme Wa ll-t:. lançado nn 2008. Disponível cm: . Acesso cm:29 Fcv 2020. 
54 
11
1
1 pc1 so11agc11. principJts 11, o f:tlam nenhuma palavra, somente 
111 11c111 sinais , ruídos sonoros. Mas, mesmo assim, é possível sentir 
, 1111cxao amorosa entre os dois, atingindo o ponto alto do filme: 
11111.,t1.1r que os sentimentos dos robôs também são os nossos. 
P ·r eba que todos os filmes da Pixar têm o compromisso de 
1 , .11 uma mensagem que se conecta de alguma forma com todos. 
1 11 111 i, afio e tanto fazer isso, mas eles escolheram uma estrutura e 
1
, 1 •,t l' ii ·ntes bem conhecidos pela literatura de contos de fada focada 
11 1 .1ventura, desafios, magia, comicidade e metáforas. Daí vem a 
11111a lição: transforme seu conteúdo em metáforas e desa­
hos, recheado de magia e com uma pitada de comicidade. 
l lci1c, o que mais se fala é sobre a importância de ensinar as chama­
' 1.1., competências socioemocionais para as crianças; e por que não 
111 dizar o contexto de Vida de inseto para destacar o trabalho em gru-
21 . ft • 
pn, u então de Divertida Mente (2015) para mostrar a 1mportanc1a 
, 1.1 tristeza? Você pode criar percursos gamificados contextualizados 
pm esses cenários, todos já bem conhecidos e amados pelas crianças. 
V l:ja, você não precisa criar uma história/narrativa toda nova, elas já 
, . · 1stem e você pode utilizá-las para inspirar seus alunos para que eles 
11
1terajam com o seu material e se conectem de forma plena e rica, 
pt mcipalmente, com a sua intencionalidade pedagógica. 
• J Confira 
0 
trailer do filme Oii1ertida Mente, lançado cm 2015. Disponívd rni: . Acesso «111: 29 fcv. 2020. 
ss 
GAMIFICAÇÃO 
ct cultura pop na sala dct aula 
O autor israelen e Yuval Noah Harari, professor de história na 
Universidade Hebraica de Jerusalém, que escreveu os dois grande 
best-sellers Sapiens e Homo-Deus, disse em um encontro de educação, 
em São Paulo, que não sabemos, pela primeira vez, o que ensinar 
' . 22 -
. 
as nossas cnança . Nao temos certeza de quais serão os conteú-
dos válidos daqui a vinte, trinta ou quarenta anos. Na concepção 
de Bauman (2013),
23 essa incerteza é um reflexo direto dos tempos 
liquidos cm que vivemos. Mas o que isso quer dizer? Que as coi­
sas mudam muito rapidamente. Segundo o filósofo polonês, nada é 
para durar, nada é capaz de manter a mesma fonna por muito tem­
po. Porém, há uma questão a considerar: mesmo que eu não saiba 
o conteúdo, é fundamental entender que o interesse e a curiosidade 
de uma criança e um jovem devem ser despertados. 
Com esse mundo saturado de informações e da possibilidade de 
satisfazer as necessidades mais básicas do ser humano por meio de 
um simples smartphone, é preciso que a sala de aula se inspire para 
além dos escritos e dizeres de doutores e pensadores da educa­
ção moderna e pós-moderna do século XIX e XX. A consciência 
crítica de um professor cresce quando ele reconhece que, neste 
mundo liquido, a educação está também na mídia, nos movimen­
tos sociais e nos espaços públicos de encontro da diversidade. 
Ao fazer isso, o professor amplia sua visão e possibilita diferentes 
22. Para conhecer maisª-' icbas de 1 laran. rcco1 11cndo assrsnr a sua cntr. Ac. Acesso cm: I'' rn,1r. 2020. 
1 
1 
1 1 
l 
M tivar p sso. 
Acesso cm: 1 º mar. 2020. 
60 
l"l , 1u.1n 1 ·ria111 >Sut11 ,1 ,1v,tl1a\·ã , precisamos atribuir algumas 
•1.1s .1 ela. P r exempl , imputamos pontos a cada questão. To­
l 1 pod •111 valer a mesma quantidade de pontos ou então algumas 
ilrn1 mais - por serem mais difkeis e exigirem mais dos estudan-
11 (,( , tumamos fazer o seguinte: "Ah, essa pergunta de múltipla 
l 1 lha vale 0,2 pontos, como há cinco perguntas, o questionário 
.de 1 ponto. O trabalho em grupo vale mais 2 pontos. Para fina-
11:1'.lr bimestre, aplico uma prova com questões discursivas e de 
1111'dtipla escolha que vale 7 pontos, assim fecho meu bimestre com 
1 ,oma de todas atividades valendo 10 pontos" . 
Ainda, com base na nota final, você atribui um conceito a 
, .ida aluno. Por exemplo, se ele tirou entre 9 e 10, é um aluno A 
l' , clente! Se tirou entre 7 e 8, é B - ótimo. Se tirou entre 5 e 
. {.· C - regular. Se somou abaixo de 5, é D - insuficiente. Nesse 
pt ocesso, que é rotineiro a todos os professores, temos as bases da 
•.1mificação como os pontos e os badges, e um desenho de nível, 
l lc lassificação do estudante. Não é para menos que afirmo que a 
tn io momento professores estão criando sistemas que são, por na­
tureza, gamificados. O que a gamificação pode agregar ao trabalho 
1 lo professor em sala é transformar esse raciocínio em um processo 
111ais leve, contextualizado, imersivo e propositivo. 
Assim, as notas podem ser transformadas em pontos de ex­
p ·riências,5 os quais podem ser obtidos à medida que os alunos 
,1lingem objetivos e avançam nos níveis. Conceitos podem ser 
11 ansformados em badges6 visuais que podem ser armazenados e 
1 olecionados, tanto digitalmente como fisicamente. As atividades 
podem ser transformadas em missões. Dessa forma, ao completá-la, 
~. 1 ambérn conhecido como X I' (F.xpcricncc Points). Os pontos de . Acesso cm: 
1 rnar. 2020. 
63 
ali111 nt an ~llis · 
profunda sobre a gam.ificação tem gerad div ·rs s cquív 
do termo. Esses chamo, genericamente, de GRMEMITOS. 
Vej amos os cinco maiores deles a seguir: 
O~ 
Gamificaçõo é criar 
e utilizar jogos de 
tabuleiro ou digitais. 
0 ---
Gome e gamificaçõo 
têm os mesmos 
propósitos. 
º"----
Gamificaçõo visa 
ao divertimento. 
Gamificaçõo 
é sinônimo de 
entretenimento. 
Gamificaçõo 
usurpa as pessoas. 
Vamos desfazê-los um a um, começando pelo mais enraizado . 
o 
Gamificação 
não é o mesmo 
que criar e 
utilizar jogos. 
Esse é o primeiro gamemito que desfaço quan­
do realizo uma palestra sobre o tema. 
Gamificar não é a mesma coisa que jogar um 
jogo ou então transformar palestras, aulas, 
reuniões ou treinamentos em um j ogo. Esse 
tipo de conceituação, embora p ossa fazer cer­
to sentido, não é coerente com a definição da 
metodologia e sua aplicação prática. 
64 
N ·ss · s ·11Lid , vai · .1 1 ·11 .1 l.1z ·r uma difcren iação conceitual. 
0 1111 lo Karl Kapp (2012, p. 125),8 "gamificação é o uso das 
111 e. :lni as baseadas em jogos, da sua estética e lógica para 
11 •.1jar as pessoas, motivar ações, promover a aprendiza­
m resolver problemas em contextos de não jogos". 
1 \S. a diferença é reforçada por outros especialistas da área como 
1 v111 W erbach ,9 Brian Burke,10 Andrzej M arczewski,11 dentre ou-
111 1' , bnbora os conceitos estejam relacionados, um não é sinônimo 
111 n ulro, são bem distintos e essas diferenças precisam ser levadas em 
11 11s1d ·ração no momento de apresentar soluções gamificadas. 
() segundo gamemito é mais discreto, mas seu entendimento 
111ui to im portante para compreender o valor da gamificação en­
p1.111to m étodo para transformar o m undo. 
e 
1ome é produto, 
gamificação é 
processo. 
A Khan Academy é uma plataforma de apren­
dizagem de conteúdos escolares. Ela é um 
produto. Você pode acessá-la via aplicativo 
ou página web. Agora, dentro do produto 
Khan Academy, há um processo de gamifica­
ção que motiva o usuário a cumprir as 
atividades, assistir os vídeos e estudar cada vez 
mais por meio de barra de progresso, badges e 
KAl'P, Karl M. TI1r Camificatio11 of L.ca111i1~~ a11d lnstructio11: Garne-b.1scd Mcthod' JJ1d Stratcgics for 
l o 111 11 11g and Educnion. Washington: Pft:1ffer & Company, 2012. 
1) pro tessor Kcvm Werbach tl'm vários livros publicados, o que mais gosto é o For thc Win: How Camr 
l /1111 ki11;: Ca 11 ReFconferi- lo. D isponívd cm: 
h11ps://pt.courscra.org/karn/s>:1mificatio11>. Acc•so em: 1° mar. 2020. 
Ili HUR.KE, Bri.111. Cam!/lcar: como a gamificação motiva as pessoas a fa7crcm coisas extraordinárias. São 
l' 11duc DVS Edit0ra, 2015. 
11 Conheça o site deste incrível autor sobre gamificação. Disponível cm: . 
,."º cm: I" mar. 2020. 
65 
' li 
li 
1 
po11tos rmt> Ludms. São Pau lo: l'crspcctiva, 2014. 
68 
( h.Js 11, tê111 outro pr >pósit s ·nã o de entreter os par-
111 q1.111t ·s (salv hamad serious games). Já a gamificação gira 
111 torn d' motivar jogadores a atingirem objetivos que são com-
1'·11 t ti lt ados pelo professor e pelo aluno jogador. 
Gamificação 
não usurpa, 
mos engajo 
as pessoas. 
Finalmente, o último grande gamemito: a ga­
mificação, como qualquer outra metodologia 
ou ferramenta, é uma faca de dois gumes. 
Tudo depende do design, propósito e uso dela 
no contexto escolhido. Gamificação exige sen­
so crítico e apuração ética rigorosa para separar 
o joio do trigo. Como qualquer outra tecnolo-
gia ou metodologia, o juízo de valor atribuído 
111 seu uso depende exclusivamente do ser humano que a utiliza. 
l 'omo professor ou instrutor, você pode utilizar a gamificação para 
, 11.ir um senso genuíno de colaboração entre a tum1.a ou, então, uma 
l rdadeira batalha competitiva e nociva entre os alunos. 
Como qualquer cozinheiro, você precisa saber escolher bem 
11s ingredientes (elementos dos jogos) e misturá-los de forma har-
111 oniosa (criar um bom game design) para obter um bom prato 
(resultado). O que observo é que, quando a gamificação é mal 
planejada e executada, o processo pode, de fato, explorar o usuário 
ou amargar as relações e criar um ambiente não esperado. Contu­
do, quando é bem-feita, engaja as pessoas e promove mudanças de 
assim como Macio Kart, Pac-Man 
1 
Minecraft, são jogos propriamente ditos, pois têm como finalida-
1 li· básica o entretenimento dos usuários . Jogos sérios, por sua vez, 
1 
u idem ser utilizados de diversas formas, mas com um propósito 
ill' aprendizagem que vai além do entretenimento. Por exemplo, 
1 
H idemos criar quiz es para testar ou facilitar a memorização de 
1
1
1 
terminados conteúdos ou para lembrar com mais eficácia de 
, .1racterísticas de um produto. 
Jogos de tabuleiro podem ser utilizados para desenvolver nos 
.tlunos 0 senso de cooperação, destacar a importância do plane-
1,1111ento, do trabalho em equipe e do cumprimento das metas 
.ir rdadas em um período de tempo limitado. Na mesma linha, 
71 
11 
1 
T1AGO EuGENIO 
jogos digitais como o famoso StarCraft podem ser adotados para 
trabalhar com planejamento estratégico e tomada de decisão. 
No âmbito dos chamados seríous games, jogos prontos e focados 
no entretenimento, como Minecraft, SimCity e Civilization, podem 
ser adaptados e utilizados com um propósito de aprendizagem mais 
específico. Ainda, jogos, tanto digitais quanto analógicos, podem ser 
criados com uma intencionalidade pedagógica explícita.14 Quando 
utilizamos jogos para facilitar processos de aprendizagem, na verdade 
estamos falando de uma aprendizagem baseada em jogos.15 Essa 
metodologia ativa é fabulosa, eficaz e deve ser celebrada tanto quan­
to as conquistas obtidas pela gamificação. Piagct, Vygotsky e Wallon 
defenderam em suas teorias a importância da educação mediada por 
jogos, visando ao desenvolvimento pleno das crianças. 
A aprendizagem baseada em jogos é uma tendência que vem 
sendo incorporada cada vez mais na educação . Não é para menos 
que hoje os jogos digitais são um dos meus principais eixos de 
trabalho. Dessa forma, a apropriação dos jogos e de seus ele­
mentos em contextos educacionais pode ser vista em diversas 
configurações. Em jogos projetados especificamente para a edu­
cação, conhecidos como jogos educacionais, jogos educativos 
ou edutenimento, conteúdo e jogabilidade são criados especifica­
mente para abordar temas de interesse de um professor. 
Já a gamificação utiliza elementos e dinâmicas dos jogos, como 
níveis, progressões e pontuações, de forma lúdica, em ambientes ana-
14. Recomendo os jogos sérios prodmidos pelo grupo de pcsq nis.1 Comunidades Virtuais da UNEll. Todos 
os jogos são gratuitos e contérn guias de orin1ta~·õcs para o professor utilizá-los em sala de aula. Disponível 
cm: . Acesso t•m: 1" mar. 2020. 
15. Em parceria com a ncuropsicopcdagoga Ana Lúcia l lenncmann. criamos a Plataforma Educac1011.1l 
Ncurons com jogos voltados p.1ra o . Arcsso ,·111: 1" 111.1r. "020 
RULR EM JOGO 
lc'igicos ou virtuais de aprendizagem. No que tange à aprendizagem 
1 distância (e-learning) ou então à implementação de metodologias 
111 vas como ensino híbrido e sala de aula invertida, a gamificação é 
11111a ferramenta estratégica poderosa por motivar e engajar os usuá-
1111s a participarem das atividades e discussões virtuais. 
DESISH 
'"IPIRADD 
"SllHE'1 
Reprodução 
ndedlqna da 
realidade 
Desenhado 
como um qamc 
Lembra um gomes. 
Possui usado 
elementos como um 
de qamc qamc 
usado 
apenas 
para 
diversão 
'"""'o 2.1: Além dos dife renças e ntre gomes. serious gome e gomificoçõo. devemos ta mbém lembrar 
• .1rnulodores e os aplicações insp irados em gomes têm suas dife renças. 
1 '"' Atloptodo de Mo rczewski (2015, p. 15).17 
(; ;unificação é um dialeto que emergm a partir do jogo. A 
• 111t·1gênóa das tecnologias digitais transformou esse dialeto pri-
111t·110 em uma linguagem própria, viva e vibrante. Entenda assim: 
• 1 'I " 11 11 10 "' 1.1' uso de elementos de imagens, sons e intcraçfü·s qu1r;1 11m,1 barra de progresso sendo preenchida. 
1-\ lt( / l ·WSllny: Gamification, Game T hinking and 
1 •li 1111111.11 1 k'it-:n South .aro lina: Crcatcspace lndcpt•ndcm l'ublishing l'latfonn , 2015. 
ga111ijicaticm '. uma h11guagc111 que pode \ ·r ,1p l1r.1d ,1 cm conte tos 
não as ociados djretamente a jogos. nquanto linguagem, a gami­
ficação extrapola a estrutura do jogo e se mistura com o dia a dia 
do usuário - você mal percebe que ela faz parte do seu cotidiano 
quando utiliza Linkedln, Waze, Instagram, Facebook ou, ainda, 
usa o cartão de crédito para acumular milhas e depois trocar por 
uma passagem área. 
Não há 
gomeploy 
Figura 2.3 
Diversão/Entretenimento 
F ante: Traduzida de Marczewski (2015). 
74 
Há 
gomeploy 
VOCÊ QUER 
SIMULAR, JOGAR 
OU GAMIFICAR? 
Figura 2.4 
F ante: Traduzida de Marczewski (2015). 
ÁRVORE DE 
TOMADA DE DECISÃO 
DE MARCZEWSKI 
Desejo e 1or um ambiente 
virtual seg ro paro testar 
de formo fidedigno 
s da VIDA AEAL? 
otne digital 
m 
os p soas em 
SEU PROPÓSITO? 
ne 
Voce provavelmente quer 
um DESIGN INSPIRAOO 
~M GAMI. 
75 
A despeito d ·ssas dt1rn1: . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
12 
di111i11uía .is lwH ·s d· .1 1d · 11td1ca~·ã ser fi·ita 'X Ju ivamcntc por 
t1·11t.1tiva · ·rr - que nã cria condizente com a minha propos-
1.1, qu' ·ra a de fazer o aluno observar minuciosamente o exemplar 
dl' s ·u intcrc se e diagnosticar suas peculiaridades. Por outro lado, 
,t' t e tudante escolhesse corretamente todas as opções da chave, 
t cria acesso a uma recompensa - um vídeo que lhe oferecia infor­
ma õcs sobre os aspectos biológicos e ecológicos do grupo ao qual 
o seu exemplar de interesse pertencia. 
A atividade com a chave de identificação digital no Experi­
llll'lltando Ciência foi um grande sucesso, mas não fiquei satisfeito 
.1pcnas com a empolgação dos estudantes. Em 2009, no estado 
do Rio Grande do Norte, enquanto fazia mestrado e já atuava 
1 01110 professor de ensino fundamental em Parnamirim, repliquei 
1> projeto e coletei dados, buscando testar o efeito da ferramenta 
1 ksenvolvida e da experiência sobre a percepção e a aprendizagem 
1 los alunos. Os resultados da pesquisa mostraram que os alunos 
qu' interagiram com a chave de identificação digital tiveram um 
11 ·scmpenho melhor do que os alunos que assistiram a uma aula 
t 1 .1dicional, sugerindo um impacto positivo da ferramenta no pro­
sso t '·1d)fo, n s 
e rp nos , mbicnte, mediada pela percepção e ação. 5 
Na primeira vez que submeti o artigo à revista, considerei a 
chave dicotômica como um jogo digital, tanto que a minha pri­
meira sugestão de título era: "Utilização de um jogo digital para 
identificação de artrópodes: avaliação de estudantes do Ensino 
_Fundamental"; mas um dos revisores recomendou mudar o nome 
para ferramenta multimídia. De fato, há quase dez anos, a ideia de 
jogo em sala de aula era muito mais associada ao puro lazer e à sim­
ples diversão. Os especialistas da área não enxergavam ainda o jogo 
digital, muito menos sua linguagem, como um recurso poderoso 
de aprendizagem. E a gamificação? Ela estava dando os primeiros 
passos e sua aplicação era mais restrita ao marketing e aos negócios 
- pelo menos aqui no Brasil. Nos Estados Unidos, o conceito já 
era uma realidade na educação e estava repercutindo significativa­
mente na organização de currículos e escolas. 
Em 2012, aconteceu o meu segundo "clift, cloft, still, a porta 
b . I" d nh se a nu. quan o co eci a Quest to Learn (Q2L), uma escola 
pública nova-iorquina que trabalha com alunos do Ensino Fun­
damental II e Ensino Médio. Fundada em 2009, após anos de 
planejamento curricular, a Q2L ganhou destaque internacional 
pelo seu pioneirismo no uso da gamificação para estruturar o cur­
rículo escolar. 6 No curso de pequena duração de que participei 
em Manhattan, fui impactado pela forma como eles enxergavam 0 
professor a partir de seis dimensões de desenvolvimento. 7 
5. Eu5;ENIO, Tiago josé Benedito. ( ltilizar111> de """'ferramenta 111ultimldi11 para ide111i/iração de . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
6. Conhl"ça ma.is sobre a Qucst to L. Aw•so cm: 27 fev. 2020. 
7. Palestra ministrada por Katie S.Ucn no WISE 2013 Focus. No vídeo. Salcn nos conta rnmo a c.:.scola Qucst 
to Lt·am fo1 msp1radJ nos JOgos e ~omo uahzou "" linb•uagcm para cnJr urna experiência dl" •prendiz•gcm 
mov•dorn para seus d.lunos. D1spo111vcl l"m: . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
14 
p1 ok'lso1 '• wn1pr' · n. id ·rad um DESIGNER 
111c implcm ·nt e r ·visa materiais gamifi ados cm conjunto com 
\!''""'designers. Além disso, o professor é um ORIENTADOR, res­
IH 11sávcl pela avaliação do aprendizado dos alunos. Essa avaliação 
(: utilizada para gerar dados que são analisados e usados para fazer 
.11 ustes no currículo, além de ajudar os alunos a definirem suas pró­
pria metas de aprendizado. O professor também precisa ser um 
I' NSADOR SISTÊMICO e um INTEGRADOR DO BEM-
E 'T AR - capaz de entender o relacionamento entre os alunos e a 
t munidade escolar; e INTEGRADOR DE TECNOLOGIA pre­
parado para utilizar a tecnologia como uma ferramenta de ensino. 
i> r fim a sexta dimensão é denominada como PROFISSIONAL 
' 
integra o conteúdo, faz uma boa gestão de sala de aula, estabelece 
uma boa comunicação com os pais, planeja suas aulas e se preocupa 
e m o engajamento dos alunos e os resultados pedagógicos. 
O currículo da Q2L é estruturado e executado por meio de dois 
tipos de atividades principais: Discovery Missions e Boss Level. 
As Discovery Missions são compostas por Quests, que são na ver­
dade desafios que motivam os alunos a buscarem informações em 
livros e na internet, realizar experimentos e elaborar pesquisas com 
pessoas reais para chegar a um objetivo específico a partir dos da­
dos. O Boss Level é uma espécie de avaliação em que os alunos 
não apenas respondem a questões discursivas e de múltipla escolha, 
mas também apresentam os resultados de suas Quests, muitas delas 
exibidas no formato de um jogo - tanto digital como analógico. 
A Q2L conta ainda com uma rede social fechada, desenvolvida 
especialmente para os alunos da escola. A rede permite que apenas 
os alunos postem seus trabalhos e criem comunidades de discussão. 
Nessa rede, os professores também podem postar atividades valen-
15 
d hrul.i!cs, p n l s · rga 111 za r alun s ' s grupos d· .ilunt s '111 
um ranking. 
Na Q2L vi na prática a gamificação sendo aplicada em sala 
de aula e modificando por completo a experiência de centenas de 
alunos. Foi nessa escola também que conheci o trabalho de Jane 
McGonigal, uma game designer norte-americana responsável por 
um dos TEDs mais assistidos no mundo inteiro. 8 Jane é uma pa­
lestrante e autora muito engajada no mundo dos jogos. Seu livro 
A realidade em jogo tem um discurso tão eloquente sobre o poder 
dos jogos para transformar a realidade, que a gente às vezes se 
sente desanimado por não viver de corpo e alma em realidades 
alternativas. O livro coloca em xeque a realidade em que vive­
mos, explicando como ela é mais chata e desinteressante do que 
os games. Por exemplo, McGonigal diz que "em comparação aos 
jogos, a realidade é deprimente. Os jogos concentram nossa energia, 
com otimismo incansável, em algo no qual somos bons e aprecia­
mos fazer". 9 
Depois que escrevi todos os capítulos deste livro e o revisei, 
não tive dúvidas de que deveria seguir a mesma linha do livro de 
Jane: colocar em xeque a aula tradicional, mostrando que ela pode 
ser mais motivadora e interessante com a adição dos elementos 
dos jogos. Nasceu assim a ideia de nomear esta obra simplesmente 
como Aula em jogo. É importante destacar que isso não significa 
transformar a aula em umjogo propriamente dito, mas sim adicio­
nar elementos dos jogos em seu planejamento e execução. Mostrar 
essas possibilidades de forma descomplicada é um dos propósitos 
deste livro. 
8. MCGON IGAL, Janl'. Garning can make a bettcr workl. TED. fov. 2010. Disponível cm: . Acc&so cm: 27 tcv. 2020. 
9. MCGON IGAL,Jane. A realidade em joJ!''· R.io de Janeiro: BcstSdlcr. 2012. p.47. 
16 
Ouua rd'·1 "" nria i1nporl.111t • qu ·e nhc ·i no ur o da Q2L 
lll1 o l111gui. ta Jame. Paul G e, autor de vários livros sobre o uso 
1 ll' flidco.~mnes na educação. 10 Além disso, outro autor bastante co-
1 n ·11tad no curo foi Marc Prensky. 11 Ao ler as obras de ambos fui 
111 • nutrindo cada vez mais com ideias e argumentos sólidos para 
defender a bandeira do uso dos jogos e, principalmente, de seus 
1 ll'mcntos e sua linguagem na educação. 
e volta ao Brasil, comecei a implementar o que aprendi nos 
1-.stados Unidos. É óbvio que não era possível fazer muita coisa, 
11111a vez que eu não contava com tantos recursos e apoio para 
.1 realização das atividades. Nessa época lecionava em cursos de 
graduação na Universidade Paulista (UNIP) e minha ferramenta 
te ·nológica principal de trabalho era o Power Point. Foi com ela 
que segui minha jornada de gamificação, adicionando quests12 no 
111eio das aulas, atribuindo pontos, organizando os alunos em gru­
p s, realizando minigincanas, entre outros. 
Recebia uma resposta positiva dos alunos, mas confesso que 
muitas vezes me sentia cansado e perdido na aplicação dos elemen­
tos dos jogos em sala de aula.Já começava a perceber os desafios na 
.1plicação da estratégia relacionados à imersão, ao monitoramento 
ao feedback instantâneo aos alunos, e sentia cada vez mais ne­
cssidade de tecnologias digitais para me auxiliar a reproduzir uma 
xperiência de aprendizagem gamificada mais consistente. 
10. Visite a página oficial de James I'. Gcc. C lique em "Uooks" e "l'ublications" para conhecer os Li vros e 
.irtigos do autor (a maioria cst.i cm ing!Cs). Disponívd cm: . Acesso cm: 27 
lcv. 2020. 
11 . Conheça a página oficial de Marc l'rl'n ksy. Disponível cm: . Acesso c111: 
27 tCv. 2020. 
12. No universo dos gam~s. quests são missões realizadas por um ou vários jogadores para rr t d )S c;11111lios,111H'llll' r m ' ris. A lado dessa incrível 
1 der · edu adora, me ·ei a participar de uma série de projetos 
1 11 .1dos e liderados por ela e outros professores. O primeiro foi a 
11! 1 ·ina de Mundos Virtuais, na qual os estudantes reproduziam oco-
1{,gi dentro do ambiente virtual do Minecraft. Para além do jogo, 
. Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
14. Confira a inatéria: Professores usarn investigação fOrcnsc para ensinar conceitos de rnatcmática e fisica, 
frita pelo programa Hoje Em Dia e publicada no Portal R 7. Dispon ível cm: . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
19 
l 111 ·stt 1 .1~. o 1 irn111.1l.
1 ~ ss' projeto s· t 1 rH u t1111 L1l oratóri à 
part , mu1t n · e signifi ativo para cu de envolver e testar mi­
nhas habilidades de gamificação, tanto que há um capítulo neste 
livro em que conto com mais detalhes a minha jornada e as práticas 
de gamificação que desenvolvi com ele. 
Fora do Colégio Bandeirantes, ocorreu também outro "clift, 
cloft, still, a porta se abriu!". Para não perder a conta, esse foi o 
quarto! Sempre tive curiosidade para entender como eram criados 
os games. Então, no início de 2014, entrei como aluno em um cur­
so de desenvolvimento de jogos digitais da Escola de Arte, Game e 
Animação, a SAGA. No curso, aprendi mais sobre os processos de 
criação dos jogos digitais, entrando em contato com os programas 
responsáveis pela sua produção. Nessa época conheci diversos pro­
gramas que abriram literalmente minha cabeça. Aprendi o básico 
de Maya, 3D Max, Mudbox, Unreal e Unity - programas úteis 
para o desenvolvimento de jogos digitais sofisticados para consoles 
como PlayStation e Xbox. 
No entanto, já percebia que a área de educação não absor­
veria tão fácil essas tecnologias, especialmente pelo poder de 
processamento que esses softwares demandam. Mesmo em escolas 
de ponta não há computadores com placas de vídeo e de última 
geração para rodar qualquer tipo de jogo ou aplicação desenvol­
vida no ambiente 3D. Além disso, o fluxo de desenvolvimento 
com seftwares e tecnologia 3D exige muito tempo e conhecimento 
de linguagem de programação específica. 
15. ASSUMPÇÃO. Cristina Mmos; EUGENIO. TiagoJ 13.Casos crilllinais viraram jogos de invcsti!!:lçào 
forense Porvir. 22 jul. 2015. Disponível cm: . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
l'ALI IAR.ES, lsabcla. l:'..scolas de São Paulo se inspiram c111 sé1ic rn lllinal para rnsinar. O H. Ac digitais, mas im pt, r mai ideias e recursos para melho-
1 ,11 111i11has aulas criar experiências de aprendizagem garnificadas 
111.1is m tivadoras e eficazes. Esse sempre foi o meu propósito. En­
t. o, comecei a explorar e aprender com softwares mais simples. O 
( :on truct 2 caiu como uma luva, permitindo criar experiências 
111ais próximas de um game, conectando diferentes elementos de 
ll g s às aulas. O Construct 2 é um editor de jogos 2D baseado em 
1 I MLS. 16 É um software destinado tanto para não programadores 
quanto para programadores experientes. Ele permite a criação rápida 
d, jogos, por meio do estilo Drag And Drop, usando um editor vi­
sual e um sistema de lógica baseado em blocos e comportamento. 
A maior parte das experiências compartilhadas na segunda 
parte deste livro foi possível graças ao uso de aplicações criadas 
no Construct 2 e em uma série de outras ferramentas gratuitas e 
disponíveis na internet. Outra plataforma importante, sem dúvida, 
foi o Genial.ly, onde é possível criar gameaulas interativas e com 
templates predefinidos .17 Você perceberá que um bom número das 
ideias compartilhadas ao longo dos capítulos deste livro pode ser 
reproduzido sem o uso do Construct, apenas utilizando o Power 
Point ou outros programas como editores de vídeo e de imagens. 
A utilização de softwares de criação rápida de jogos me permi­
tiu reproduzir com mais contundência os elementos dos jogos em 
sala de aula. Foi assim que comecei a montar gameaulas que são 
na verdade storylines digitais que contam uma história (imersão); 
orientam os alunos nas atividades (ação); e os engajam na pesquisa 
e na coleta de dados para descobrir uma senha específica (desafio). 
16. Além do Constmct 2. existe também a wrsão mais moderna deste s~/iware chamado Consm1ct 3. Disponível 
c· m: . Acc·sso cm: 27 fcv. 2020. 
17. Disponívd cm: . Acesso cm: 21 jon. 2020. 
21 
:// 
Acc.:rtandc · )dig . · ·r t , n vas telas surgem (1 · 0111pcnsa), p r-
mitindo que os grupos progridam sobre a narrativa (progressão). 
O storyline digital também modificou a forma como eu (pro­
fessor) lidava com o conteúdo. Como ocorre em uma série de 
TV, um filme ou em um livro, o conteúdo se revelava conforme 
os grupos progrediam na narrativa, não sendo mais necessário que 
eu antecipasse ou até comprometesse esse importante processo de 
descoberta. A necessidade de o professor fazer contextualizações e 
explanações no início de uma aula é praticamente eliminada com 
a presença das gameaulas. O professor na verdade deve focar mais a 
organização dos grupos e aguardar até que solicitem algo - moti­
vados por uma necessidade real de auxilio pelo professor diante de 
um problema revelado pela narrativa. 
Todo esse processo é detalhado no capítulo 6, no qual conto 
como gamifiquei o Bandforense. Ainda dentro desse contexto e 
desse objetivo de transformar a linguagem e a organização das aulas 
tradicionais em uma série de TV com temporadas e episódios, no 
capítulo 11 conto como isso pode ser feito por qualquer professor 
com auxilio do Educaflix. 
Além do meu trabalho no Bandeirantes, criei e coordenei uma 
pós-graduação. 
18 
Esse curso também foi um laboratório de apren­
dizagem e um espaço ímpar para criar diversas experiências que 
compartilho também neste livro, inspirado principalmente pelos tra­
balhos desenvolvidos e publicados pela professora Eliane Schlemmer. 19 
Em 2017, decidi que ajudaria outros professores e instituições 
de ensino a usar todo o potencial da linguagem dos jogos para 
18. OL!VEIRA, Maria Victória. Cm,;o de pós rnsina cultura pop e games a profcs,,orcs. f',m,ir. 9 jun. 2015. 
Dispornvcl cm: . Acesso cin- "7 
fc~ww. ·-
19. Sc~1lcmmer {· u111a cLis. 111aiorc~. Acesso cm: 21 jun. 2U2U. 
22 
1 11 111 ,ti -. l' ll •,I ,llll ' lll O Jl l' ,tllllHlS l' lllll , l ,qlll lllll / I ' l Ili 11111 
11. 11 ,1 e oi >rar ·m pdtica os digirnis chamada "C.mie St ,,dw: criação e progra111açao de 
llllCIC l 111 "' I ' . ll d . . N t' 1ogos digitais" para alunos do oitavo e nono ano do Ensino Fundamental li no Co c~10 an c1rantcs. cs e 
ln;k, você pode assistir a minha palestra. cm que compartilho os procc.ssos de cnaçao de JOgos e dicas P"; 
11npkmcntar uma oticina de jogos cm uma escola. Disponível cm: . Acesso cm: _7 de fcv. -020. 
21. Para ma1' informações. accsst·: . Acesso cm: 27 de fev. 2020. 
22. Para mais infonnações, acesse: . Acesso em: 27 fcv. 2020. 
23. Para mais informações, ,1c,·ssc: . Acesso cm: 27 fcv. 2020. 
24. Para mais informações. acesse: . Acesso n n : 27 fcv. 2U2U. 
23 
.1 li11 •u.i •t'lll lmjogos 11 · nt' t p •tL1góg1to l.1 111 ·lhrn forma 
possí ·J. s ·r ·ver st' Jivr me motivou a dar mai um pa o: criei 
um njunt de te1nplates e painéis interativos inspirados em jogos 
digitai famosos. A este cortjunto dei o nome de Class Dash. 
livro também foi um bom pretexto para documentar e comparti­
lhar minha trajetória como professor e, mais recentemente, como 
autor e empreendedor na área de educação. 
Quando se lê este texto como deve ser lido, de cima para baixo, 
até parece que minha jornada foi linear - tanto que poderia ser repre­
sentada por uma curva contínua de crescimento linear. Ledo engano. 
Diria que essajornada mais se parece com uma montanha-russa com 
inúmeros altos e baixos. Praticamente, todos os momentos de "clift 
' 
cloft, still, a porta se abriu!" exigiram renúncias de segurança e de-
sapego da zona de conforto da minha parte. Mudar nossos hábitos, 
costumes e práticas cotidianas não é algo que agrade tanto nosso cé­
rebro. Exige muita disciplina, coragem e, principalmente, propósito! 
Então, eu lhe pergunto: qual é o seu propósito? Minha tra­
jetória, assim como este livro, é parte de um processo inacabado 
- não tenho dúvidas que muitas portas e momentos de "clift, cloft, 
still" estão por vir ainda. Mas chegou o momento em que não 
quero mais atravessar apenas as portas. Desejo também as construir 
para que sirvam de passagem para outras pessoas. 
Este livro tem como propósito mostrar o uso da linguagem 
dos jogos na educação, inspirando professores e profissionais que 
trabalham de alguma forma na área. Meu intuito é apresentar uma 
pequena porta a você. Neste momento, por favor, considere-me 
como uma espécie de Porteiro do Castelo. No entanto, para entrar 
nele, você não deve adivinhar a senha do dia, mas sim seguir a 
leitura dos capítulos a seguir. 
24 
Atada p.1rlc e .1pítulo 1 ·~l.l bra pr ur apre entar a arquite-
1111 .1 1 )S ~ mod , as passa. Acesso cm: 22 frv. 2020. 
26 
' l ' I v.rnd. 
Acesso cm: 22 fCv. 2020. 
27 
A gamifi açã também p Tmit · por aos .dunos dif •rcnt · 
contextos de competição e colaboração. A vivência desses con­
textos, permeados por conflitos, interesses e objetivos comuns e 
individuais são fundamentais para criarem um repertório de ex­
periências sociais, por meio do qual podem expressar emoções e 
comportamentos, praticando as competências socioemocionais e 
desenvolvendo as chamadas funções executivas. 
O uso dos elementos de jogos em contextos que não são pro­
priamente para jogos, como a sala de aula, torna viável também 
o chamado ensino híbrido - o ensino que mescla estratégias de 
ensino on-line e off-line.29 Plataformas virtuais de conhecimento 
podem se tornar inúteis quando não são gamificadas. Os alunos 
não encontram muito propósito em acessar um ambiente diferente 
e executar uma tarefa como assistir a um vídeo antes da aula. Para 
que isso ocorra, o professor precisa agir, por exemplo, relembran­
do diversas vezes ao aluno sobre o material postado ou então 
' ' 
atribuindo uma nota (recompensa) para o aluno que fizer o dever 
de casa. Plataformas que exploram oselementos dos jogos encora­
jam mais os alunos a realizarem as atividades, diminuindo o esforço 
pessoal do professor de repetir e criar regras rígidas para forçá-los a 
usufruírem do material criado com tanto esforço para ele. A gami­
ficação costuma automatizar processos e retira a responsabilidade 
do professor também de gerenciar informações geradas pelos alu­
nos. Nesse ponto é que entra um pilar importante da gamificação: 
as tecnologias digitais - que diminuem o esforço atencional e o 
serviço braçal do professor de gerenciar tantas informações e dados 
criados em uma experiência de aprendizagem. 
29. H ORN, Michael; S1 AKER. Hcathcr. Bl1'11ded: usando a inovação disruptiva para aprimorar a educação. 
Porto Alegre: Pen,o, 2015. 
28 
N.1 sl •11 a de hc11cfü 1os ( bs ·1 vamos ainda 111 a gamifi-
1 .1\, o .lll ilia na d ·s · 11stru\·ã d ambiente tradicional da sala 
d1 .1ul.1. Até algun. ano atrás, a formação escolar e também do 
1 11 .. 1110 superior geralmente tinham como base ir até a escola, 
11 11111panhar todas as aulas de forma presencial, contar com ma-
11·11.1 is d· suporte em papel (livros didáticos e paradidáticos) e ter 
, 111pr ·a obrigatoriedade de cumprir uma carga horária com datas 
1 horas marcadas, diariamente ou quase todos os dias. Contudo, 
1 nm o passar dos anos e com a crescente oferta de tecnologias 
p.11.1 todos os segmentos, a sala de aula começou a passar por uma 
t 1.111sformação. 
Se antes era imprescindível acompanhar uma aula presencial, 
,1 •ora é possível fazer isso de forma parcial, ou seja, uma parte na 
111stituição e outra em qualquer lugar que você estiver, contando 
q11 • tenha internet e um aparelho com acesso à rede. Mas, mais 
11111a vez, é um pouco ingênuo acreditar que os alunos realizarão as 
.1tividades postadas em uma plataforma, especialmente adolescen­
t cs e crianças do Ensino Fundamental 1 e II. 
A gamificação, nesse sentido, modifica esse comportamento 
por adicionar um propósito explícito, um senso claro de pro­
•rcssão e oportunidades de competir e colaborar remotamente 
 _ Acesso cm: 22 Íl' V. 2020. 
29 
R.ep.1r ·: .1 ga111Jf1 · .l~· j t '111 uma natu1Tz.1 111.11s 111.111tll.1tiva 
fi a a per rman e do u uário cm determinada tare a. É a sim que 
a gamificação gera dados e permite anali tas, professores, coorde­
nadores e gestores a olharem para esse conjunto de dados e tomar 
uma decisão mais assertiva. Por exemplo, entender se determinada 
estratégia está funcionando ou não, se os alunos estão aprendendo 
ou não, se o u o de certo elemento de jogo está gerando mais re­
sultado ou não. Essa é a base do Big Data que entende padrões de 
comportamento, e, a partir disso, cria-se novas soluções, produtos 
e demandas para a educação e a sociedade. 
L Como este livro r ~stá orqanizado? 
A gamificação e o game design são propostas educacionais 
muito defendidas por pesquisadores e especialistas das áreas de ino­
vação, mas ainda pouco utilizadas em ambientes de aprendizagem. 
Na verdade, professores alegam que a gamificação é uma estratégia 
dificil de colocar em prática e demanda muito tempo de planeja­
mento e conhecimento. 
Não vou mentir, implementar bons processos de gamificação 
é um trabalho árduo e requer muito planejamento. Mas existem 
atalhos interessantes que facilitam o processo de implementa­
ção. Nesse sentido, este livro tem como propósito mostrar 
como pode ser mais simples do que você imagina traba­
lhar com gamificação dentro da sala de aula. M eu intuito 
é apresentar, na primeira parte, os princípios básicos da gamifi­
cação. Todavia, este livro está bem longe de trilhar um caminho 
30 
1 1111.1111 ·11t • l · ' J H > .ti •o qur >bscrv ·m muita pr duções bi-
lilH> •1.ífi ·as sobr · ) l ·111.1. 
( objetivo desta primeira parte é introduzir o uruverso da 
•.11111(1 ação, mas sempre aproximando seu conceito e sua aplica­
, o .1 ontcxto pedagógico. Por isso, vamos discutir no primeiro 
1 .1 pítul o que os games e a cultura pop podem ensinar aos 
pr fessores. No segundo capítulo , - o que é gamificação? -, 
.111 ,tli s de perto o conceito de gamificação e desfaço uma série de 
". 
32 
Ih tl.1 ~Ó i a útil •m quaisqu •r ontexto s da aprendizagem 
ljllC pode gerar beneficios tanto para alunos quanto para 
1 r of • ores em qualquer disciplina ou tipo de currículo.Por fim, apresento ferramentas e templates para auxiliar o 
p1 nf ·ss r a implementar a gamificação dentro da sala de aula. Par-
111 11larmente, acredito que as tecnologias digitais sejam próteses 
111 •nitivas que nos auxiliam a implementar e gerir processos. No 
1 ,1\0 da gamificação, a tecnologia é útil para modificar a experiên-
1 1.1 d aluno no que diz respeito à interface em que os conteúdos 
. o disponibilizados, o tipo de acesso, a maneira como ele observa 
1·1 1 progresso e obtém feedback. Com auxílio da tecnologia, o 
professor consegue monitorar com mais eficiência o desempenho 
1 le seus alunos , além de gerar experiências mais imersivas e com 
11111a interface mais próxima dos games que os alunos tanto gostam. 
N os últimos anos, venho estudando e criando ferramentas 
t ,\da vez mais rápidas e descomplicadas para professores gamifica-
1 cm suas aulas, tanto que desenvolvi um curso on-line chamado 
Gamificação descomplicada para educadores,32 no qual 
·ompartilho uma série de ferramentas que possibilitam gamificar 
qualquer aula por meio de planilhas do Google Drive. Neste livro , 
apresento algumas delas . A primeira é a Educaflix, que poderá 
ser acessada em um curso de curta duração indicado neste livro. 
Assim, o primeiro capítulo dessa parte mais técnica tem como 
obj etivo mostrar a Educaflix e como o professor pode trans­
formar suas aulas em um seriado de sucesso.33 
32. EUGENTO. Tiago J. ll. e,,,,,, cm-/í,,e Ca111ijicnção desam1plírmla para cducadorc•s. Disponível crn: . Acesso rni: 22 fCv. 2020. 
33. O tcm10 "série" aqui é uti lizado como série tckvisiva, série de TV ou tcksséric. isto é, um tipo de 
programa televisivo ou programa on-line com um número predefinido de capítulos por temporada, 
chamados episódios. 
33 
-
Figura 1: Organizaçõo geral das partes e dos temas trabalhados nos capítulos deste livro. 
Fonte: O autor. 
O próximo capítulo foi inspirado em diversos jogos que gosto 
bastante como Plants Vs Zombies, Final Fantasy, Chrono Trigger, 
Angry Birds, dentre outros. O capítulo Class Dash: o ensino 
híbrido gamificado tem como objetivo compartilhar uma série 
de templates para você gamificar aulas de qualquer disciplina, re­
produzindo na sala de aula dinâmicas competitivas e colaborativas. 
Pensando em um processo de gamificação estruturada, no capítulo 
Aprendendo a criar badges, cartas e avaliações gamificadas, 
compartilho também modelos de planilhas úteis para monitorar e 
gerenciar o progresso dos alunos em uma sala de aula gamificada. 
Finalizo o livro listando ferramentas para criar e exemplos de 
uso de cartas para você experimentar tanto em situações analógicas 
quanto em ambientes digitais. Na última seção do capítulo final, 
compartilho os caminhos para você acessar um template de uma 
avaliação gamificada feito em Power Point - mais uma prova de 
que a gamificação está realmente ao alcance de todos. 
34 
p 
A 
R 
T 
E 
• 
O QUE OS GAMES 
E A CULTURA POP 
PODEM ENSINAR 
AOS PROFESSORES? 
R psicologia nos ensina e a indústria de game comprova que 
todas as pessoas buscam três coisas: autonomia, competên­
ria e conexões sociais. Se você não sabe, esses três ingredientes e 
elementos mágicos são as bases da chamada teoria da autodetermi­
nação. Somos motivados quando interagimos em ambientes que 
ferecem de forma rápida e descomplicada esses três itens. Neste 
·apítulo, vamos conhecer as bases da teoria da autodeterminação e 
como os jogos eletrônicos fizeram uso dela para se reinventarem e 
se tornarem a terceira maior indústria do planeta. 
Tenho certeza de que, em algum momento da vida, todo 
mundo jogou algum tipo de jogo - seja quando criança no parqui­
nho, chutando uma bola e tentando marcar um gol, seja jogando 
um jogo de cartas, de tabuleiro ou algum jogo digital no smartphone 
ou no console de videogame. 
Os jogos fazem parte de todas as culturas e participam de qual­
quer experiência humana compartilhada. Mas, deixe-me fazer um 
aviso: usar jogos prontos em sala de aula é uma coisa; usar elementos 
dos jogos em uma aula (que não é umjogo) é outra. Essa outra coisa é o 
que chamamos de ga111ifi ação. De forma bem ol~wt1v.1, a gamificação 
permite usar os elementos dos jogos e integrá-los à inten ionaJidade 
pedagógica do professor. Essa integração oferece oportunidades únicas 
para um engajamento dos alunos, tomando o aprendizado não apenas 
tolerável, mas reahnente divertido e desejado. 
Basicamente, garnificação é sobre motivação e comportamento 
humano. Como professores, queremos que os alunos prestem aten­
ção ao conteúdo dado, cumpram as atividades e interajam com seus 
pares para aprender e desenvolver novas habilidades. Então, quando 
me refiro à gamificação na educação, estou falando sobre como os 
jogos podem ser modelos inteligentes e inspiradores para modificar 
a experiência dos alunos em uma experiência de ensino e aprendi­
zagem, e não simplesmente utilizar um.jogo pronto. 
Em uma sala de aula tradicional, provavelmente, muitos alu­
nos preferem jogar um jogo do que prestar atenção no professor. 
Mas por que isso acontece com tanta frequência? Afinal, o que 
faz dos games recursos tão fascinantes? Ironicamente, games são 
recursos poderosos para a aprendizagem humana. Gostamos de 
desafios. Nossos cérebros adoram receber feedbacks para saber se 
estamos indo bem ou mal em uma determinada atividade. Gos­
tamos também de perceber que estamos avançando, crescendo e 
desenvolvendo competências, ficando cada vez melhor no que fa­
zemos. Não gostamos de ficar presos e reféns de outros. Zelamos 
e lutamos pennanentemente pela nossa autonomia e buscamos 
constantemente novos vínculos sociais. 
Mas o que os games têm a ver com isso? A resposta é bem 
simples: os jogos conseguem reproduzir situações por meio das 
quais todas essas necessidades são satisfeitas de forma muito eficaz, 
rápida e barata. 
38 
A 111dlistri,1 de g11111cs 101 p.1ulat111a111ente entendendo o com­
i 01t.11nent do jogador e criando jogos cada vez mais alinhados 
111111 os pre supostos da teoria da autodetenninação. O mais sur-
1'' cc11d ·nte é que a incorporação dos pontos centrais ocorreu 
11111110 mais rápido do que a pedagogia - que sofre ainda muitas 
l'/l'S ·om uma práxis descontextualizada e desmotivadora. 
A teoria da autodeterminação é uma abordagem para a moti­
v.1~ iío e a personalidade humana sistematizada por Richard Ryan 
l' Edward Deci na década de 1970. A teoria compreende o estudo 
d.is necessidades psicológicas que constituem as bases da motivação 
pessoal, assim como as condições que promovem processos positi­
vos de engajamento, envolvimento e aprendizagem. 
Ryan e Deci (2000) 1 identificaram três necessidades básicas: a 
m-rcssidade de autonomia, a necessidade de competência e a neces­
'itdade de pertencimento. De forma bastante resumida, a necessidade 
de autonomia se refere ao senso de autodireção, de perceber que 
uma ação ocorre por vontade própria do indivíduo e não por pres­
são externa; a necessidade de competência se refere ao senso de 
.1pcrfeiçoamento constante no domínio ou na aprendizagem de 
uma nova habilidade; e a necessidade de pertencimento se refere à 
percepção de que existem vínculos interpessoais e duradouros. 
Essas necessidades são inatas, mas hoje, com a explosão das 
tecnologias digitais e dos diversos canais de comunicação via inter­
net, elas estão mais latentes e realçadas,justamente porque há muitos 
meios interessantes para satisfazê-las de forma segura, rápida e bara­
ta. Não me refiro somente aos jogos, mas também às redes sociais, 
às plataformas de streaming, aos blogs, aos softwares de edição, às 
1. D EC I, Edward !. : R YAN, R1 t hard M_ T lw "What" and "Why". of Go:i l l'msuits: 1 lurna n Ncl'ds and 
thc Sclf- Dçtcrmination of Bchav1or. l'syr/10/oiical l11q11 iry, v. 11 , n. 4. 2000. p. 227-268. Disponlwl l'rn: 
https://www.tandfonli 11l' .co rn/do1/abs/1O. 1207 /s15327965pli1104_01 >. Acesso c111: 29 frv_ 2020. 
39 
plataformas de curso AD, ao apli ativos d· tlll't1s.1gens instan­
tâneas, aos fóruns, às comunidades virtuais, dentre muitos outros 
canais. As pessoas usam esses recursos simplesmente porque encon­
tram neles espaço para se expressarem, construírem novos vínculos 
e desenvolverem novas habilidades. 
GAMIFICAÇÃO 
e o upqrade na educação 
Veja bem, o computador e o smartphone são esteiras rápidas 
para o ser humano satisfazer todas as necessidades previstas pela 
teoria da autodeterminação. Mas não há outro produto que repro­
duza de forma tão contundente essas necessidades senão os jogos 
digitais. Assim, profissionais que trabalham com aprendizagem 
podem aprender muito com a evolução dos jogos eletrônicos, ob­
servando-os como modelos inspiradores. 
Antes de entender isso, vamos a um adendo importante ou, 
melhor dizendo, a uma crença. Acredito que a gamificação seja 
uma das estratégias mais certeiras e eficazes para promover um up­
grade do modelo educacional - de um mundo obsoleto, baseado na 
lógica fabril e de produção em massa, para um mundo novo e con­
temporâneo, caracterizado pela sociedade em rede, multiplicação 
dos canais de produção e personalização -, assim como fez a in­
dústria de jogos com a experiência do jogador. Vejamos por que. 
No passado, a educação, conhecida como tradicional, tinha as 
seguintes características: 
40 
IJ Caminhos unidirecionais e métodos únicos de 
aprendizagem, fortemente caracterizados pelo controle; 
. 1liva~· · o da motiva~· ;io ·, lt ínse a - baseada cm recompen­
sas, notas e aprovação cm exames; 
IJ Alunos passivos - sem autonomia e que só recebiam a 
informação. 
IJ Lições padronizadas e aprendizado robotizado, dire­
tamente associado à memorização. 
Agora, neste mundo contemporâneo, pensa-se em múltiplos 
1 1111inhos e formas de aprendizagem. Mais do que ensinar, é im­
p111 t,mte inspirar os alunos, ativar a motivação intrínseca, ou seja, a 
1111t,1de própria do estudante de aprender e descobrir coisas novas 
11111 prazer e autossatisfação. 
Além disso, em vez do controle, temos liberdade e flexibili­
dade como ideias predominantes. Pensa-se também em um senso 
111.1is voltado para a descoberta e a exploração, com alunos mais ativos 
,. protagonistas, que produzam novos conhecimentos para o mundo. 
O mais interessante é que essa atualização de mundo é tam­
li{· m percebida quando analisamos a evolução dos próprios jogos 
digitais. Vamos entender como a mudança dessa indústria do en-
11ctenimento se relaciona com as transformações do mundo. 
EVOLUÇÃO DOS GAMES 
e a teoria da autodeterminação 
Nos anos 1960 e 1970, os games não ofereciam muita liber­
dade para os jogadores. Vejamos o exemplo de Pac-Man. Nele o 
jogador movimentava o personagem somente para cima, para baixo, 
para a esquerda e a direita. Não havia tanta autonomia, nem víncu-
41 
si. tema, p i. Pa -M, n s ·111p1 t ' 101 u111.1 p po. ta 
de jogo solitário. Mas logo surgiram alguns mais m d 'm s, como 
foi o caso do Space Panic, que tem um herói que deve escalar es­
cadas e cavar buracos pelo cenário. Depois surgiram outros jogos 
como Donkey Kong Jr. e o famoso Super Macio Bros., que per­
mitia ao jogador ter mais autonomia e liberdade de movimento. 
Era possível andar para frente, para trás, dar pulos e coletar itens 
como cogumelos e estrelas. Mas mesmo nesses jogos icônicos o 
jogador permanecia em um único caminho, enfrentando os mes­
mos desafios e, basicamente, só precisava ter uma boa coordenação 
mão-olho, apertando corretamente os botões no joystick para ser 
bem-sucedido no jogo. Com o passar do tempo, surgiram jogos 3D 
com visão 360°, como ocorreu com o lançamento do Super Macio 
64 da Nintendo. Esses jogos ofereceram muito mais liberdade e 
flexibilidade aos jogadores. Assim, o jogo ganhou uma dimensão de 
exploração e não simplesmente de cumprimento de fases e tarefas. 
Em Journey,2 por exemplo, o jogador deve vagar por um 
deserto. A grande sensação é justamente explorar o cenário. Algo 
que acontece também em ABZÚ,3 no qual o jogador é um mer­
gulhador e deve explorar as profundezas do mar. Nesse jogo, não 
há uma recompensa e um propósito épico tão explícito como sal­
var uma princesa ou derrotar monstros alienígenas que desejam 
destruir o planeta Terra, mas sim uma liberdade absurda que supe­
ra a gana do jogador de cumprir qualquer objetivo. 
E, quando falamos sobre protagonismo, todos os jogos abrem 
espaço para isso. Na verdade, a grande cereja do bolo de qualquer 
2. Confira o trailer oficial de lançamento para Playstanon 4 do jogo !Cito cm 2014. Disponível cm: . Acesso cm 29 ícv. 2020. 
3. Confira o trailer oficia! de lançamento para Playstation 4 do jogo !Cito cm 2016. Disponível cm: . Acesso cm 29 fcv. 2020. 
42 
111 •11 {· o po 1 ·r d.t ,1g'\ n 1,1. 1 • ·ss · poder de agência foi crescendo 
11 l.1 ".! mais, culminand em jogos em que a graça é geren-
1 11 1 t·c urso ou construir suas próprias cidades, como é o caso de 
1111 :ny, ou então, planejar e mobiliar uma casa virtual, além de 
11 1 l nriar a vida de avatares que formam uma verdadeira família -
111110 , ntece em The Sims. 
As possibilidades de criação foram ficando cada vez mais 
11 crsificadas, especialmente após a comunicação em rede e o sur­
•1111ento dos jogos on-line. Veja o caso do Minecraft,5 um dos 
111 •os mais amados e idolatrados por crianças. Nele, o jogador 
p11 1 · construir tudo e ainda convidar outras pessoas para jogar no 
1 11 mundo, conhecendo e navegando pelas suas construções. 
"olocar os jogadores na posição de criadores é uma tendência 
1111! '. A própria franquia de jogos do Super Macio da Nintendo 
1 ompreendeu bem a importância disso e criou o Super Macio Maker, 6 
111> qual os jogadores podem criar seu próprio levei design e compar-
1 ilhar com quem desejar. 
Em todos esses exemplos, percebemos os valores que a in­
dústria de jogos tem para ensinar para a pedagogia. Se desejamos 
1 ealmente que os alunos prestem mais atenção nas aulas e se envol-
am na proposta pedagógica do professor, precisamos criar cenários 
cm que o aluno tenha mais liberdade, flexibilidade e protagonismo. 
!'recisamos pensar em itinerários em que os alunos se sintam auto­
motivados e autodeterminados, que possam tomar decisões (senso 
1 l',1ra conhecer mais sobre a relaçao cntn: os jogos e o poder de agênci;1, leia o livro Hamlet "º Halodcck, 
,.,trito pda doutora cm literatura Janet Murray. MURR.A Y, Janet. H1111let "'' I lofodeck. São Paulo: Editora 
lllll'.Sp, 2003. 
Veja o primeiro trailer oficial do jogo de 2011. Na época, ele ainda pertencia:\ Mojang. Disponível cm: 
lmps://youtu.be/MmB9bSnjVbA>. Acesso cm: 29 fcv. 2020. 
11. Confira o trailer oficial ele lançamento do jogo para Wii U cm 2014. Disponível cm: . Acc·sso crn: 29 frv. 2020. 
43 
k aut li mia); qu' visualií'c1n c tenh,1111 ,wlrn um( ll'JH 1,1 de s us 
aprendizados e de env lvimcnt de nov s hal 1lidad ·s (s ' ll de 
competência) e que possam estabelecer vínculos com outro alu­
nos, trabalhando em grupo e aprendendo em comunidade (senso 
de pertencimento). 
~LIÇÕES DA 
cultura pop para a ftducação 
A biologia nos ensina e a cultura pop comprova que inova­
ção tem mais a ver com cópia, combinação e rem.ixagem do que 
com criação e originalidade propriamente dita. 7 Para inovar em 
qualquer contexto, você provavelmente vai ter que olhar a grama 
do vizinho. No início, você pode ficar receoso de copiar, mas se 
não tiver repertório, talvez seja melhor isso do que não fazer nada. 
Mas, é claro, eu não estou falando e fazendo apologia à uma cópia 
despudorada. Existem limites e meios para você não copiar, mas 
adaptar ideias e criar o seu próprio caminho. Saiba que esse é um 
dos grandes segredos de sucesso da cultura pop. 
Quando falo de culturapop, refiro-me a uma representação 
artística que tem grande difusão na mídia e que aspira a atingir um 
público cada vez maior. Falo do movimento do pop art que se ini­
ciou principalmente nas artes plásticas, ligado ao pintor e cineasta 
americano Andy Warhol - que registrou os rostos de famosos do 
7. As evidências da ''volução dds cspfrics en1 11os;o planeta apontam que todos llÓS somos cópias de genes 
ancestrais com ligeiras modifi cações. Essas P'' qunias modificações (combinação ,. remixagcrn da in fonnação 
genética) foram e são responsáveis por gerar a vanabi lidade genérica e traços que todas a5 espécies detêm. Para 
mais infon naçõc·s. leia o livro r;,.,,/uçifo: e> sentido da bioloxia, escrito pelos bri lhantes proÍC'ssorcs e pesquisadores 
Diogo Meycr e C harbcl Ni1io El- Ham. MEYER., Diogo; EL-H AN I, Charbcl Nií'io. Evolução: o sentido da 
biologia. São Paulo: Editora Uncsp, 2005 . 
44 
1111•111.1 n mo M,11 d li Mon1 o· · ' lizab ·th aylor. O movimento 
111 i~11 o ' pi diu n s meio de comunicação, em uma época que 
111111 1diu om o auge do cinema e da televisão e com a ascensão 
li li.inda e artistas, como The Beatles. 
( utra importante característica da cultura pop é que ela pro­
l 111 l' limenta produtos voltados para um público essencialmente 
I"' L 111, exercendo influência sobre ele, principalmente na moda 
11 > 'tilo. É o que aconteceu com a banda The Who, nos anos 
l 1>111 outrns rnt ·úd s 
e conhecem também formas diferentes de contribuir e produzir 
para seus pares. 8 
Foi assim que o Y ouTube cresceu e deu uma guinada im­
portante com as famosas lives e partidas gravadas pelos próprios 
jogadores (muitos deles crianças e adolescentes). Hoje, a Twitcam 
é uma poderosa plataforma, na qual milhares de jogadores se co­
nectam para ver outros jogadores em ação. 
Esse fenômeno nos conduz à primeira lição que devemos 
aprender com a cultura pop: transforme seus conteúdos em 
desafios e desperte a curiosidade do aluno para que ele 
possa navegar por outros mares, descobrindo novos assun­
tos e conteúdos por conta própria. 
Com a ascensão das mídias sociais , os fãs passaram a participar 
cada vez mais ativamente da produção e da distribuição dos pro­
dutos culturais. E a cultura pop se consolidou como movimento 
de época porque passou a escutar ativamente seus fãs . Vamos co­
nhecer dois exemplos rápidos, um que envolve o lançamento de 
um filme e outro sobre a ação criativa de uma jovem que criou um 
programa de letramento midiático e pedagógico inforn1al inspira­
do nos livros de Harry Potter. 
Exemplo 1: no início de 2019, a internet foi sacudida com 
a apresentação do visual de um dos personagens mais queridos 
pela geração gamer: Sonic , o porco-espinho azul. Os fãs ficaram 
assustados com a versão live-action do personagem e teceram 
8. Aqui rr1c refiro à aprcndi:ragcm tangencial. P~ra mais infOrmaçõcs, rcconH.:ndo.i leitura dJ scg;u intc rcfcrfoncia: 
WEX ELL-MACHADO, Luís Eduardo; MA' !'TA R.,João. Apre11dingcm tangencial: revisão de litaaturasobrc 
os usos contcmporâm·os do concei to. Re11ista Hduca011/i11c, V. 11. n. 1, 2017. Disponível cm: . 
Acesso crn: 29 fcv. 2020. 
Assista ao vídeo Video Cawe a11d framing de Daniel Floyd para entender melhor o conceito de aprcndiragem 
tangcncia l. Disponível cm: . Acesso cm: 29 frv. 2020. 
46 
! 111tm >111 • 11t~1ri os n ·g,1t1 vos que a Paramount decidiu refa-
' n p · rs nag ·m e adiar o lançamento do filme para 2020. 
l 111l.1via , mais do que criticar, alguns fãs decidiram recriar o 
11111( p r conta própria e publicá-lo em suas contas pessoais 
1111 ' l'witter. 9 
bx ·mplo 2: no livro Cultura da convergência, 10 Henry Jenkins 
11 l.11.1 um exemplo interessante de um grupo de crianças dos Estados 
l !111 1 s que não esperou]. K. Rowling lançar a continuação da saga 
d1· l lnrry Potter e resolveu criar suas próprias histórias alternativas. 
1 k.tlhcr Lawver, uma menina de 13 anos, lançou na internet o The 
I >,11/y Prophet (O prefeta diário). Hoje o site está fora do ar, mas você 
pud ' encontrar informações no blog da Heather. 11 
Heather criou uma espécie de jornal escolar, no qual dava 
1 011tinuidade às histórias de ]. K . Rowling, autora de Harry Potter. 
A J vem começou então a encorajar seus colegas para participar da 
publicação - se colocando no papel de um personagem que vive 
cm Hogwarts - , por causa de frustrações com a escola ou com a 
f.1mília. Ela pensou no jornal como um recurso para superar um 
evento traumático ou para compensar a hostilidade de crianças de 
'lia comunidade. De fato, as crianças usam histórias para fugir de 
1 fitar D\~ital. 2 mai. 2019. Disponível cm: . Acesso cm: 29 fev. 2020. 
10. JENKINS, Henry. Cultum da wnve~~êuâa. São l'aulo: Alcph, 2009. 
11. Veja o blog da 1-l cathcr, disponível cm: . Acesso cm: 
'9 fcv. 2020. 
47 
rganizaçã ia. id 'ias. A publi ar os t · tos, o~ .tlun s rc ·cbi, m 
melhores feedbacks dos leitores, estabelecendo-se também uma 
relação social mais ampla. 
A cultura pop também ensina que para inovar não é n e­
cessário reinventar a roda. Como falei no início, inovação tem 
mais a ver com combinação, cópia e rernixagem do que com cria­
ção e originalidade propriamente dita. Veja o caso, por exemplo, 
do modelo de talk show apresentado antigamente por Jô Soares, 
praticamente uma cópia do programa norte-americano de David 
Letterman. Tatá Wemeck, Danilo Gentile e Ratinha Bastos têm 
programas muito parecidos com os de Jimmy Fallon. A apresen­
tadora Xuxa Meneghel cortou o cabelo, mudou a vestimenta e 
apostou em um clone tropical de Ellen DeGeneres, uma das apre­
sentadoras de maior sucesso nos Estados Unidos. Em seus clipes, 
a cantora Anitta não hesita em reproduzir elementos do estilo de 
Beyoncé e Demi Lovato. Mas falando assim, até parece que os bra­
sileiros copiam e os norte-americanos

Mais conteúdos dessa disciplina