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1
2
amor...
de todos os lados
 A décima segunda edição 
da ComTempo vem recheada de 
informação, histórias, opiniões e, 
acima de tudo, amor. Nessas 35 
páginas que foram elaboradas 
por uma equipe comprometida, 
profi ssional e voluntária, você vai 
encontrar motivações para amar, 
seja uma causa, uma pessoa, 
um projeto ou uma fi cção. 
 O amor que estampa 
A ComTempo é uma revista independente que aborda 
temas pouco explorados pela mídia ou que merecem 
outras perspectivas. Trabalhamos por um jornalismo 
cada vez mais plural, sério e verdadeiro.
DIRETORIA
KIMBERLY SOUZA
MARCOS PITTA
MARIANA VALVERDE
EQUIPE DE REDAÇÃO
BRUNA CAGNIN
LAIZA CASTANHARI
LUIS HENRIQUE DE MELO
LÍVIA RÉGIS
ALINE ANTUNES
SÉRGIO FRAGA
MARIANA PADILHA
RODRIGO FOLTER
MARCIA MORENO
BRUNA VOLTOLINI
THALITA VIEIRA
CAIO BARROSO
DIRETOR DE MÍDIAS SOCIAIS
HENRIQUE ESCHER
EQUIPE DE MÍDIAS SOCIAIS
TATIANA CONSTANTINI
PÂMELA PITTA
KETLYN PITTA
JARDEL OLIVEIRA
PEDRO LEAL
FERNANDO RAVANELLI
DIRETORA DE ARTE
MARÍLIA TOFFOLI
AUDIOVISUAL
CAROLINA VIEIRA
JOSÉ PIUTTI
CAIO SIQUEIRA
AUGUSTO MARINHEIRO
GABRIEL ZANON
CARLOS TOMAZELLI
TIAGO RODRIGUES
ATUALIZAÇÃO
VINICIUS SARTORI
Os artigos publicados nas edições, 
bem como em nosso site, são de 
total responsabilidade de seus au-
tores. Toda a equipe é composta por 
profi ssionais voluntários(as).
FALE CONOSCO
revistacomtempo@gmail.com
CHEFE DE REDAÇÃO
GABRIELA BRACK
esse título começa justamente 
pela própria revista. A ComTempo, 
como mencionado anteriormen-
te, foi toda produzida por volun-
tários e isso é a maior prova viva 
de amor, neste caso, à profi ssão 
e ao exercício de ser e fazer jor-
nalismo.
 Essa edição de número 
12, inclusive, vai valer até no-
vembro, isso porque em agosto 
vem mais uma 
edição do Ca-
derno Cultural. 
 Com essa 
matemática, é 
possível saber 
que essa será a 
edição da Com-
Tempo que esta-
rá em vigor na 
data dos seus 
três anos, em 
julho, e por isso 
precisa ser mais 
do que especial. 
 O que en-
tão, de mais es-
pecial poderia 
ser importante 
do que o amor?
 A capa 
desta vez é so-
bre AME, Atrofi a 
Muscular Es-
pinhal, doença 
c o n s i d e r a d a 
rara. Na repor-
tagem você 
vai conhecer 
a história do 
João Pedro, de 
Jaboticabal-SP 
e da Anne Ma-
ria, de Porto 
Alegre-RS. As 
duas crianças 
foram diagnosti-
cadas com AME 
e precisam to-
mar uma dose 
de Zolgensma, 
COMTEMPO
um remédio com custo milionário 
que se aproxima da casa dos R$ 
12 milhões.
 Familiares, amigos, se-
guidores e até famosos se empe-
nham em divulgações e doações 
constantes para ajudar não so-
mente esses dois personagens 
que vamos mostrar, mas tantos 
outros espalhados pelo Brasil. 
 O intuito da ComTempo em 
contar essas histórias é espalhar 
amor e ver como cada uma des-
sas crianças precisam ser ama-
das, não importa como, mas pre-
cisam de amor. Portanto, leia a 
reportagem à partir da página 6.
 Da capa para a contra-
capa, nós também falamos de 
amor. No fi nal desta edição, lan-
çamos uma campanha contra 
o Projeto de Lei 504/2020 que 
proíbe a publicidade, através 
de qualquer veículo de comuni-
cação e mídia de material que 
contenha alusão a preferências 
sexuais e movimentos sobre di-
versidade sexual relacionados a 
crianças no Estado de São Pau-
lo. Esse PL foi protocolado por 
Marta Costa (PSD) que está em 
seu segundo mandato como de-
putada estadual. 
 A ideia desta represen-
tante é tão equivocada que não 
acrescenta em absolutamente 
nada na vida dela e da popula-
ção que ela deveria amar, afi nal 
foi eleita para servir e cuidar do 
povo, mas esse dever do políti-
co, com certeza passa longe das 
políticas desta mulher. 
 Por isso, essa edição 
está aqui para ensinar a deputa-
da uma coisa que ela, provavel-
mente, ao autorar este Projeto 
de Lei, não entende, não sabe e 
não sente, o amor. Fica o convite 
para ela ler a ComTempo, não só 
essa edição, mas todas as ou-
tras onze, incluindo o Caderno 
Cultural. Fica o convite também 
para ela se preocupar com o va-
lor do medicamento para uma 
criança com AME conseguir um 
tratamento adequado, isso sim 
merecia uma atenção política.
Boa leitura a todos.
3
ARTIGO
A luz no fim do túnel quei-
mou? Pois não estou con-
seguindo enxergá-la. Digo 
isso, pois tem sido difícil 
manter a esperança em tempos tão 
difíceis, incertos e sombrios. Mor-
tes, sofrimento, desespero, fome, 
pobreza, violência, desrespeito, de-
sumanidade, (...). Lágrimas que não 
secam. Todos os dias no noticiário 
e à nossa volta. Todos estão sofren-
do de alguma maneira. Quem não 
está vendo ou percebendo, está 
negando a realidade.
 Diante de tantos ruídos e 
de tanta escuridão, às vezes fica di-
fícil se situar em tempos tão com-
plexos. Encontro nos livros e nos 
textos acadêmicos que leio focos 
de luz que me ajudam a compre-
ender, aos poucos, os caminhos 
que nos trouxeram até aqui. É sis-
têmico, é projeto, é intencional, é 
interseccional (como nos apontam 
muitas pensadoras feministas). O 
Brasil me faz querer estudar! Pois 
não existem respostas fáceis, cami-
nhos óbvios, explicações prontas. 
São muitas as questões que pre-
cisamos superar e resolver coleti-
vamente, e é preciso comprometi-
mento, seriedade, embasamento e 
humanidade. Precisamos de ética! 
Mas não qualquer ética. 
 A escritora estadunidense 
e pensadora feminista bell hooks 
em seu livro “Tudo sobre o amor: 
novas perspectivas” (2021) nos 
apresenta uma definição de ética 
do amor:
 “Abraçar uma ética amoro-
sa significa utilizar todas as dimen-
sões do amor - “cuidado, compro-
misso, confiança, responsabilidade, 
respeito e conhecimento” - em 
nosso cotidiano. Só podemos fa-
zer isso de modo bem-sucedido ao 
cultivar a consciência. Estar cons-
ciente permite que examinemos 
A luz no fim do 
túnel queimou?
ARTHUR FACHINI
nossas ações criticamente para ver 
o que é necessário para que possa-
mos dar carinho, ser responsáveis, 
demonstrar respeito e manifestar 
disposição de aprender” (p. 130). 
 Não é exatamente disso 
que precisamos? Amor: e todo o 
conjunto que o acompanha nesta 
definição. Mas parece que as pes-
soas não compreendem nem o 
“amar ao próximo como a si mes-
mo”. Estaríamos dispostos a der-
rubar os muros que nos separam? 
Estaríamos dispostos a identificar 
o que precisamos desconstruir e 
construir em nós mesmos? Estarí-
amos dispostos a viver através da 
ética do amor?
 Em tempos tão sombrios, 
são livros como este de bell hooks, 
e tantos outros, que não só me 
dão esperança, como também me 
nutrem de conhecimento e ideias 
para poder refletir e compreender 
a nossa realidade, a fim de sonhar 
com um futuro diferente. Livros, in-
formações e conhecimento são os 
focos de luz que nos guiarão em 
qualquer desafio. E não nos faltam 
desafios a serem superados no 
nosso país. E ainda querem dificul-
tar o acesso aos livros! A quem isso 
interessa? Defendamos os livros! 
 Se tudo indica que a luz do 
fim do túnel queimou, precisamos 
trocar a lâmpada. Não dá mais para 
ficarmos no escuro. Nós sabemos 
que o caminho não é nada fácil, e 
que este precisa ser um movimento 
coletivo, sem deixar ninguém para 
trás. Precisamos pôr em prática essa 
ética do amor defendida por hooks. 
Ninguém solta a mão de ninguém?! 
Estamos coletivamente determina-
dos a cumprir essa promessa? 
Referência: HOOKS, bell. Tudo so-
bre o amor: novas perspectivas. São 
Paulo: Editora Elefante, 2021.
BIT.LYY3VMF5L4
ACESSE:
FUTURO DO
JORNALISMO?
LEIA NO NOSSO
 SITE TODOS
OS EPISÓDIOS 
GRATUITAMENTE!
QUAL É O
A ComTempo prepa-
rou uma série de 
reportagens com 6 
episódios exploran-
do o impresso, o 
rádio, a televisão e a 
internet e conversou 
com profissionais que 
opinaram sobre os 
caminhos que a pro-
fissão está tomando. 
https://revistacomtempo.com/category/reportagens-especiais/futuro-do-jornalismo/
4
Encontrar um nódulo na 
mama é sinal de alerta para 
as mulheres. Geralmen-
te, o medo e as incertezas 
são uma das principais reações, 
por temerem ser um câncer de 
mama. No entanto, além dos nó-
dulos malignos, mais conhecidosobrigada 
a cuidar.”
Auxílio
 Kétani lembra que, no come-
ço da pandemia, o auxílio emergencial A psicóloga Rafaela Cortez. (Foto: Arquivo Pessoal)
21
a ajudou. “Como eu era sozinha, rece-
bia R$ 1.200,00. Perdi meu emprego, 
mas o auxílio supriu”. A estudante de-
clara, porém, que, na Educação, o go-
verno falhou.
 Benício reaparece quando es-
tamos conversando sobre uma possível 
volta às aulas e se ela deixaria os filhos 
retornarem. Envergonhado, depois de 
dizer um oi, ele permanece atrás da 
mãe. “Me questiono sobre isso. De ver-
dade, não sei responder. Às vezes fico 
pensando que seria bom. A rotina da 
escola faz falta pra eles. Mas, ao mesmo 
tempo, não sei se seria bom. Crianças 
não tomam cuidado, né? Tanto para 
eles quanto para os professores, que, 
geralmente, são mais velhos.”
 A conversa termina com Kéta-
ni receosa sobre o futuro. Ela não sabe 
se tudo voltará ao “normal”.
Longe de casa
 É uma tarde de quarta-feira 
quando falo com Poliana Araújo, de 27 
anos. Em Franca, os termômetros mar-
cam 29 graus. Enquanto a espero termi-
nar o almoço, reviso as perguntas que 
pretendo fazer. A conversa, por telefone, 
começa minutos depois. Poliana mora 
em Presidente Prudente, a 535 quilô-
metros de Franca. É mãe de Pedro e de 
Felipe, de 8 e 6 anos, respectivamente.
 Após ganhar uma bolsa de 
estudo pelo Prouni, Poliana se mudou 
de Franca para Presidente Prudente 
para cursar Agronomia. Nesse proces-
so, perdeu a guarda do primogênito. O 
pai da criança tinha uma estabilidade 
financeira melhor. O juiz determinou 
que era melhor a criança ficar com ele, 
enquanto a mãe terminava o curso. Já 
Felipe, seguiu com ela.
 Os meninos são filhos de pais 
diferentes. Poliana conta que o de Feli-
pe é ausente. Apenas manda a quantia 
da pensão no final do mês. Em com-
pensação, a avó paterna gosta muito 
do neto. Apesar de morar longe do 
filho mais velho, a estudante confia na 
rede de apoio. E no próprio Pedro, que, 
desde o princípio, compreendeu que a 
mãe precisava estudar. “Desde quando 
me mudei, ele entendeu que a mamãe 
estava indo pra ter uma vida melhor. E 
como ele é próximo do pai, não sentiu 
tanta diferença. O que foi pesado pra 
ele foi se afastar do irmão.”
 Mãe e filho conversam todos 
Vivian e Caio. 
(Foto: Arquivo Pessoal)
os dias por telefone. E 
jogam um game que 
ficou bastante famo-
so na quarentena, o 
Amoung Us, em que 
uma tripulação preci-
sa descobrir quem é o 
impostor e expulsá-lo.
Sobrecarga
 Um dos 
primeiros efeitos da 
pandemia na vida de 
Poliana foi o fecha-
mento da universi-
dade. “Fechou antes 
mesmo da es-
cola do Felipe. 
Agora, fican-
do em casa, 
achei que 
daria tudo 
certo. Mas 
está tudo 
corrido. Es-
tou no últi-
mo semestre. 
Tem TCC, horas 
extras para entre-
gar, estágio. Depois 
que comecei a ter aulas online, a escola 
do Felipe fechou.”
 A fala é cortada pela do filho, 
que a chama. Poliana pede licença e diz 
que vai ajudar o pequeno. Logo, volta 
partindo de onde paramos a conversa. 
“A professora fez um grupo e começou 
a mandar as atividades. Mas, para mim, 
é muito complicado auxiliá-lo, porque 
tenho aula online todos os dias, das 
sete e meia da manhã às seis da tarde. E 
ele tem uma dificuldade gigante de se 
concentrar. Na escola, é mais fácil, pois 
tem os amiguinhos fazendo. Isso o es-
timula. Aqui em casa, sou só eu. Tento 
fazer, mas é bem difícil. Ele ficou com 
bastante atividade atrasada.”
A professora Vivian Delfino lembra que, 
quando as atividades pararam, as mães 
foram impactadas financeiramente. 
“Você tem que atender uma deman-
da de filhos que ficam em casa, que 
vão comer mais, gastar mais energia, 
vão exigir que você consiga providen-
ciar uma distração. E tem a questão da 
escola virtual, que exige que essa mãe 
tenha condição de ofertar: um com-
putador, um celular ou os dois, além 
de uma internet capaz de manter uma 
aula online, a assistência da realização 
dos trabalhos ou, então, arcar com o 
ônus de ver seu filho não estudando.”
Vivian ainda destaca que, ao ficarem 
em casa, as pessoas perceberam a 
importância dos cuidados, e, no caso 
das mães solo, isso significou uma so-
brecarga maior. “As crianças ficaram 
em casa e exigem um cuidado 24 ho-
ras, não só de cozinhar, passar… É de 
olhar, de atender, ser requisitada muito 
mais vezes. O fato de não ter o tempo 
da escola fez com que elas tivessem 
uma sobrecarga imensa. Exigem que 
tenham paciência para estar sempre à 
disposição de atender o ‘mãe’ que vai 
vir durante todo o dia.”
 Com a quarentena, Felipe, 
por exemplo, ficou bastante ansioso. 
Poliana conta que ele engordou e tem 
que fazer uma dieta por estar acima 
do peso. “Ele passa por uma psicólo-
ga, também faz tratamento com uma 
fono, porque tem deficiência auditiva.”
 No aspecto financeiro, Polia-
na recebe uma bolsa de R$ 400,00 da 
universidade, além da pensão do filho. 
E também conseguiu o auxílio emer-
gencial de R$ 300,00 reais. Pelo fato 
de o cadastro único estar em conjun-
22
to com o da mãe, que é 
aposentada, não teve a 
ajuda inicial de R$ 1.200 
paga pelo Governo Fe-
deral.
Um dia de cada vez
 Ao mesmo 
tempo que Poliana dis-
serta que os estudos 
pesam até mais do que 
cuidar dos filhos, se ouve 
a voz de Felipe ao fundo. 
Ele brinca com algum 
objeto perto da mãe. 
“No meu curso, muita 
coisa é aula prática e a 
gente não está apren-
dendo direito. Ainda 
bem que minha facul-
dade oferece terapia de 
graça. Faço toda sema-
na, senão tinha surtado 
ainda mais. Evito sair de casa, mas isso 
me sufoca um pouco. Sou uma pessoa 
sociável, gosto de encontrar os amigos. 
São coisas que estou evitando. Mas a 
gente vai levando, um dia de cada vez.”
 O tempo que consegue para 
ela é na hora de dormir. Após terminar 
os estudos, por volta das seis da tarde, 
dá banho em Felipe, arruma a cozinha, 
faz janta. Às vezes, ainda brinca um 
pouco com o filho ou assiste a um de-
senho.
 Com a voz demonstrando o 
cansaço de um dia que está longe de 
acabar, diz que o que mais deseja é uma 
vacina. “Para poder voltar tudo ao nor-
mal. Ano que vem, saio para o estágio, 
e provavelmente não vai ser aqui [em 
Presidente Prudente], nem em Franca. 
De novo, terei que ficar longe das crian-
ças. O Felipe é muito sentido com essas 
coisas.”
 Mesmo que o “normal” não 
seja o de antes, ela espera que, pelo 
menos, a rotina seja diferente. “Que a 
gente consiga voltar um pouquinho da 
nossa vida. Que eu consiga trabalhar e 
dar início ao que eu vim buscar quan-
do vim fazer faculdade, que é ter uma 
estabilidade financeira e dar uma vida 
melhor para os meninos.”
A última festa
 Vivian Delfino, que, durante 
a entrevista, revelou também ser mãe 
solo, aceitou dar seu depoimento so-
Poliana com os filhos, Pedro e Felipe.
bre isso. Por causa dos compromissos 
dela, combinamos outra data para que 
a conversa continuasse. Mas foi difícil. 
Mãe, professora e doutoranda, não ti-
nha dias compatíveis com os meus. Na 
agenda dela, muitos congressos e pa-
lestras.
 Depois de muito tentar, consi-
go para um dia que chovia muito, em 
São Paulo, onde ela mora, e em Franca. 
Vivian se mostra preocupada. A energia 
oscila na cada dela, o que também é 
uma preocupação da minha parte. Mas 
o universo comanda e, no final, corre 
tudo bem.
 No início, quando vieram as 
primeiras notícias sobre um vírus que 
circulava na China, Vivian não se preo-
cupava. Não fazia ideia de que chegaria 
ao Brasil. A família comemorava o ani-
versário de Caio, o filho único dela, que 
completava 13 anos naquele janeiro de 
2020.
A vida antes da chegada do novo co-
ronavírus era como um filme clichê. 
As ruas cheias, crianças brincando nos 
playgrounds, amigos se juntando para 
o churrasquinho de domingo, os bares 
lotados. Os corredores das escolas e 
universidades contavam histórias por 
meio dos falatórios, risadas e cochichos.
Haveria tempo, ainda, para a última 
festa antes do distanciamento social. O 
aniversário da mãe de Vivian, em 7 de 
fevereiro. “Pouco tempo depois, o Caio 
parou de ir à escola. Já fechou tudoe, 
quando teve o primeiro caso de mor-
te aqui, ele ficou muito 
angustiado. Eu também. 
Mas a gente achava que 
ia passar rápido.”
 Mesmo de longe, já 
que a entrevista é via 
WhatsApp, é possível 
identificar o cansaço 
na voz de Vivian, prin-
cipalmente quando 
lembra o começo da 
pandemia. No primeiro 
mês, o sentimento foi 
de surpresa, que, com 
o passar do tempo, foi 
virando medo e apre-
ensão. “O problema 
mesmo começou a ficar 
punk quando chegou 
no meio do ano e nada 
tinha mudado, quando 
deu um semestre en-
fiado em casa. O que o 
Caio teve muito no início foi medo de 
pegar, que os avós ficassem doentes.”
Relação mãe e filho
 Entre as mães entrevistadas 
para a reportagem, Vivian é a única de 
um menino entrando na adolescência. 
Antes da pandemia, eles saíam muito 
juntos. A praia e o cinema estavam en-
tre os passeios prediletos. E não é difícil 
visualizá-la curtindo um dia com o filho. 
Nas poltronas do cinema, rindo com 
uma comédia ou tapando os olhos em 
um filme de terror, com ele rindo do 
medo que ela sente. Ou um domingo 
na areia, com raios de sol que confor-
tam e aquecem, como um convite para 
um banho de mar.
 Caio fazia muitas atividades. 
Aulas de bateria e marimba, jogar fute-
bol, reunir um grupo grande de amigos 
para dormir na casa dele ou de outro. 
Vivian também levava amigos para a 
fazenda da família, em Mairinque-SP. 
“Quando isso começou a faltar, foi so-
frido pra ele. Com dois meses, começou 
a ficar muito triste, e a gente começou a 
discutir muito.”
 Ela se deparou com outro 
Caio. Não era mais aquele menino 
alegre e ativo., estava sem ânimo para 
nada. “Não queria ler, fazer as coisas da 
escola. Tive que aprender a lidar com 
essa nova realidade. Estava prostrado, 
só jogava videogame e dizia que era a 
única coisa legal para fazer. O quarto 
dele virou uma caverna. Foi horrível.”
23
A chuva em São Paulo continua forte. 
É possível ouvir as trovoadas pelos áu-
dios que Vivian manda. Um reflexo da 
vida dela, que se viu no meio de um 
temporal: cuidar do filho enquanto o 
volume de trabalho aumentava absur-
damente. “No mundo pré-pandemia, 
o Caio ia para a aula à tarde. Quando 
começou o ensino a distância, a escola 
mudou as aulas para o período da ma-
nhã. Então, ele teve que levantar cedo. 
Achou super legal, mas, em 15 dias, os 
alunos passaram a desligar a câmera.”
 A própria Vivian testemunhou 
o filho várias vezes voltando a dormir. 
“Essa ausência do convívio, da dinâmi-
ca da sala de aula, não refletia a escola. 
Eu tinha que convencê-lo a ir pra aula. 
Lição não fazia, estudar não estudava, 
coisas que ele nunca me deu trabalho. 
Não tive trabalho de colocá-lo na frente 
do celular. Tive trabalho pra fazer com 
que ele entendesse que aquilo era a 
escola agora e, infelizmente, aceitasse.”
 Caio passou a odiar os estu-
dos e arrumar intriga com os profes-
sores. As notas caíram. Conhecendo a 
área educacional e preocupada com o 
rumo que as coisas tomavam, Vivian 
entrou em contato com a escola, fa-
lou sobre a quantidade de atividades e 
opinou que a forma de aprender deve-
ria ser diferente. “No começo, os pro-
fessores, com receio, sabendo que os 
alunos não estavam indo para a aula, 
mandavam um monte de trabalhos. 
Ele chorava para fazer. Eu e outras mães 
conversamos na escola para reduzirem 
o número de atividades.”
 O apelo foi ouvido. A escola 
marcou algumas aulas para a tarde, 
para que os alunos não ficassem qua-
tro horas seguidas online. “Fiz alguns 
trabalhos com ele, para que ficassem 
mais lúdicos. Mas confesso que, para 
os adolescentes, as coisas bateram di-
ferentes. A convivência, o grupo, são 
muito importantes.”
 Para Vivian, o filho ainda não 
teve oportunidades de viver fases típi-
cas da adolescência, como aprender a 
andar pela cidade sozinho e paquerar. 
“A escola é o ponto em que isso acon-
tece, e tudo pra ele rolou online. Está 
perdendo essa coisa de a escola ser 
mais que estudar.”
Autocuidado
 Um estrondo reverbera pela 
casa dela. A chuva ainda está forte. É 
possível escutar Caio gritando que a 
energia acabou e voltou em segundos. 
Vivian ri e começa a contar como ficou 
seu trabalho e a saúde mental. “Sei 
que estou totalmente descompensada 
com essa pandemia”.
 No Instituto Federal, foi con-
templada com afastamento remu-
nerado para cursar o Doutorado, em 
Campinas. Mesmo na correria do dia a 
dia, com todos os afazeres de casa e do 
trabalho, a viagem era um momento 
prazeroso. “Quando eu pegava o carro 
e dirigia uma hora e vinte minutos, ia 
escutando música e cantando dentro 
do carro. Pensava na vida, conversava 
comigo mesma”. Lembra, com entu-
siasmo, do ambiente universitário, do 
qual sente falta. “Estava adorando ir pra 
aula. Pra mim, era massa.”
 Para ela, também não foi fácil. 
Logo, o semestre começou online, com 
aulas três vezes na semana, quatro ho-
ras por dia. Não bastasse isso, o Insti-
tuto Federal precisou de um apoio dos 
professores afastados.
 Na Unicamp, assumiu a coor-
denação de um grupo de trabalho. Ti-
nha que escrever muito e publicar. “Me 
empolguei. Na minha cabeça, como 
trabalho em São Roque, que fica a 60 
quilômetros da minha casa, e estudo 
em Campinas, que é mais 90 quilôme-
tros, em casa eu teria tempo sobrando. 
Doce ilusão. Comecei a trabalhar mais.”
 Como antes, a carreira pro-
fissional estava entrelaçada à vida do-
méstica, mas agora ambas exigindo 
mais, gritando, sem dar tempo para 
refletir. A vida se tornou um malaba-
rismo: cuidar da casa, do trabalho, do 
filho, da mãe idosa. “Trabalho o dia in-
teiro, essa é a verdade. Continuo em 
home office, mas não tem um dia que 
não esteja trabalhando. Sábado e do-
mingo, é tudo igual. No meu celular, 
recebo em torno de 200, 300 men-
sagens para responder, todo dia. Um 
monte de e-mails. E, em meio a isso, 
vieram os convites para participar de 
lives. Uma virou duas, dez. Quando vi, 
todo dia estava fazendo lives. Cheguei 
a fazer três no mesmo dia.”
 Procurou ajuda, mas a terapia 
online não deu certo. “Preciso de um 
profissional que se encaixe comigo. Meu 
cérebro não relaxa, não desliga”. Ela con-
ta que não tem mais hora certa pra dor-
mir, passou a ter vício com o celular e 
insônia, além de ansiedade. “Tenho que 
me controlar. Caso contrário, como o dia 
inteiro. Estou sempre com a sensação 
de estar atrasada, que estou devendo. O 
turbilhão de informações sobre cursos 
sempre me dá impressão de que estou 
perdendo uma oportunidade, mas, na 
verdade, não tenho mais condição de 
fazer nada. É angustiante. Não tenho 
ideia de como vai ser quando retornar 
ao processo presencial.”
Lamenta não ter tempo para se cuidar. 
“Acho que tem uns cinco meses que 
não faço a unha, só corto. Faço o básico, 
lavo o cabelo, tomo banho, escovo os 
dentes, uso desodorante. Tem dias que 
uso hidratante, dias que não consigo. O 
tempo pra mim é zero.”
 Também precisa zelar pelos 
pais, idosos. A mãe, que mora com ela, 
era ativa, saía muito para dançar e, de 
repente, se viu presa em casa. Também 
perdeu muitas amigas para a Covid-19. 
Vivian teme pela saúde dela. “Tinha dia 
que eu acordava e ela estava triste. Eu 
perguntava o que tinha acontecido e 
ela falava que uma amiga dela tinha fa-
lecido. Pelo que acompanho, ela perdeu 
cinco ou seis amigas. Ainda tem isso, né? 
A pessoa vê outras da sua idade indo.”
Vivian é a pessoa que mais conversa 
com a mãe. Mesmo com muitos traba-
lhos, não deixa que ela fique num canto 
sozinha. “Quando vou comer ou no fim 
do dia, quando sento pra assistir televi-
são, converso com ela. É necessário que 
eu converse. E todos os dias ligo para o 
meu pai. Estou no computador, mas es-
tou falando com ele.”
 Para a professora, a ideia de 
normal mudou. “A vida antes da pan-
demia acabou. Agora, vamos construir 
um novo processo de vida, que não sei 
como vai ser”. Entre todos os desejos 
dela, está o de poder sair de casa. “Não 
para aglomerar ou fazer festa, mas ir ao 
cinema, o que eu gostava muito antes da 
pandemia. Às vezes, vinha do trabalho e 
pegava uma sessão às novee meia da 
noite. O shopping é perto de casa. Vou 
passar a dar mais valor a essas coisinhas 
sabe, como ir a uma praia também.”
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SOBRE ESSE TEMA.
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24
O mercado editorial começou 
a respirar em 2020 e a se 
acomodar, depois de anos 
em queda. Embora alguns 
editores estejam esperançosos com 
a possibilidade de uma retomada 
ao hábito de leitura, com as pessoas 
aproveitando o tempo isoladas para 
ler mais, a conclusão é unânime en-
tre todos: o impacto será devastador. 
O ano de 2020 foi desafiador para o 
mercado editorial brasileiro, que viu 
todas as livrarias físicas fechadas por 
conta da pandemia. Mesmo sem sa-
ber o que aconteceria no mundo dali 
pra frente, as editoras resolveram de-
sacelerar seus trabalhos e cancelar ou 
adiar seus projetos. E, mesmo sendo 
contra todas as expectativas, o mer-
cado acabou fechando o ano recupe-
rado.
 Um levantamento feito pelo 
13° Painel do Varejo de Livros no Bra-
sil de 2020, pela Nielsen Bookscan e 
pelo Sindicato Nacional dos Editores 
de Livros (Snel), aponta que o mês de 
dezembro foi o período com maior 
registro de vendas do ano, apresen-
tando 4,98 milhões de livros vendidos 
e faturamento de R$ 197,81 milhões, 
mostrando um crescimento de 7,6% 
comparado com o mesmo período 
em 2019.
 Ainda que ao longo dos anos 
o preço médio do livro tenha diminu-
ído 34%, o número de volumes ven-
didos aumentou no Brasil entre 2016 
e 2018. Contrariando todas as aflições 
desses últimos anos, livrarias menores 
abriram as portas, clubes de leitura 
deram nova vida ao hábito, e as edi-
toras médias e pequenas começaram 
a surgir e crescer. Esse foi o caso da 
Editora Flyve, criada por um escritor 
em busca de contratos mais justos 
MERCADO&LITERATURA
Como os livros e escritores sobreviveram 
às sucessivas crises no mercado 
editorial no Brasil?
BRUNA VOLTOLINI
para os jovens 
autores brasi-
leiros. “Eu errei 
muito, e foi 
aprendendo 
que quis abrir 
uma editora 
que impedisse 
que os autores 
brasileiros er-
rassem como 
eu. É muito fá-
cil a gente de-
sistir quando 
as coisas dão 
errado, e às 
vezes a gente 
acha que não 
tem opção. Na 
época não tinha, mas começaram a 
nascer e a Flyve foi uma delas”, conta 
o editor da Flyve, Lucas de Lucca, so-
bre a ideia de abrir a editora.
Pequenas editoras, 
grandes negócios 
 Editoras de pequeno porte 
tendem a pensar mais no conteúdo 
que querem produzir do que no lu-
cro que podem alcançar, tendo uma 
diversidade de livros maior e de forma 
menos massificada. Além de ser possí-
vel encontrar livros em um estilo mais 
livre e diferente, é muito mais comum 
que editoras menores tenham um re-
lacionamento mais próximo com os 
escritores. “Nós fornecemos para os 
autores uma formação técnica. Então, 
eles têm cursos, e-books e aulas online 
(...). Além dessa formação toda, o autor 
tem acesso direto a mim, o editor, a 
equipe de produção e ao nosso time 
de marketing para que ele consuma 
o conteúdo pronto e nos apresente a 
sua ideia.”, diz Lucas sobre o contato e 
ajuda que os autores da casa editorial 
recebem. “Baseado no que eles falam, 
a equipe ajuda esse autor a melhorar 
o plano dele”, conclui.
E foi pensando no melhor para todos 
os tipos de escritores que a Flyve criou 
a Voe, um selo dentro da editora que 
permite a publicação de autores que 
acreditam em seu material, mas são 
impedidos pela falta de dinheiro. “A 
Voe é um selo que vai investir no seu 
livro e tirar o seu sonho do papel. Só 
que o único responsável pelo seu su-
cesso continua sendo você, e a gente 
deixa isso muito claro o tempo inteiro. 
A primeira coisa que acontece quan-
do a pessoa envia a inscrição é a ava-
liação do perfil do escritor. E às vezes 
esse autor não está pronto para pu-
blicar um livro, e quando percebemos 
isso, falamos: você não está pronto, 
não quero o seu dinheiro, quero que 
você tenha uma experiência legal”, 
Lucas explica.
Foi com a Voe que a escritora Rafae-
la Amaral conseguiu lançar seu livro, 
Lucas de Lucca, editor da Flyve que nasceu com objetivo de propo-
rionar contratos mais justos para os jovens autores brasileiros.
25
Festival das Estrelas, em 2020. “Eu 
assinei o contrato com a editora uns 
20 dias antes do início da pandemia. 
(...) O livro teve uma pré-venda onli-
ne, assim como toda a divulgação 
que eu fiz nas minhas redes sociais. 
Até hoje eu não pude fazer nenhum 
evento desses que eu gostaria, e nem 
sei quando poderei. Mas, mesmo 
de ‘leia nacionais’ ou ‘leia mulhe-
res, ‘leia mulheres vivas’. Essa é uma 
parte da nossa luta, mas ela é muito 
maior que isso. Existe um palco muito 
grande para autores gringos. Sempre 
serão deles os hypes, os livros mais 
vendidos e melhor avaliados, e isso 
é meio que um ciclo sem fim, pois a 
cabeça dos leitores acaba ficando fe-
chada para livros brasileiros, por eles 
não figurarem nessas listas quase 
nunca”, diz Rafaela, que mostra seu 
ponto de vista como autora sobre 
essa desigualdade cada vez mais 
aparente. 
 É preciso se abrir 
mais para as obras produzidas 
no nosso país, não podendo se 
limitar a ler somente literatura 
estrangeira, tendo em mente 
que nem todos os livros pro-
duzidos no mesmo ambiente 
são iguais. “Hoje, como auto-
ra, vejo o quanto é difícil atingir 
leitores aqui. Tem perfil literário 
do instagram que vem pedir meu 
livro para parceria, e daí eu vou ver, 
a pessoa compra horrores de livros 
gringos, mas os nacionais ela quer 
de graça, sabe? Livro gringo a galera 
compra, livro nacional eles procuram 
um e-book pirata para ler sem pagar. 
Ainda falta muito incentivo, muito 
mesmo, e eu sei que não é do dia 
para a noite que a cabeça dos leitores 
vai mudar no Brasil, mas precisamos 
seguir tentando. Não dá para desistir, 
não”, conclui.
Existe uma necessidade de incentivar 
o hábito da leitura, principalmente 
com os livros produzidos no nosso 
país, permitindo que se crie uma co-
nexão não só com as palavras mas 
também com o nosso território.
 Outro incentivo que temos 
visto com mais frequência no merca-
do literário é o crescimento dos clubes 
do livro, que vieram como uma alter-
nativa cômoda para alimentar o hábi-
to de leitura durante o confinamento. 
Com o objetivo de unir esse hábito de 
leitura com autores nacionais, foi cria-
do O Clube de Leitura Flyve, que teve 
início em abril desse ano, estreando 
com o livro “O Corvo Negro” do escri-
tor e editor Lucas de Lucca. 
 O clube foi pensado pelo 
autor e advogado Adam Mattos em 
parceria com a editora com a ideia 
de promover a leitura de autores na-
cionais contemporâneos de diversos 
gêneros. Os escritores que terão seus 
livros lidos dentro do clube não são to-
dos da mesma editora, o que faz com 
que o grupo promova a leitura de au-
tores nacionais com trajetórias diversas. 
“A ideia da casa foi exatamente com o 
que a gente quer. Porque a Flyve não 
tem como objetivo ser uma editora 
que vai colocar livros em todas as livra-
rias do país e vai vender um milhão de 
livros. O nosso foco é ser um celeiro de 
autores. (...) O que a Flyve quer como 
empresa dentro desse mercado edito-
rial é que os autores brasileiros entrem 
mais, que eles tenham mais espaço (...) 
Como o nosso objetivo é esse, não faz 
sentido nenhum a gente ser egoísta e 
focar só em nós.”, fala Lucas sobre o 
clube de leitura.
 Os interessados nesta inicia-
tiva podem entrar em um grupo do 
aplicativo Telegram que já está aberto 
ao público e a participação é comple-
tamente gratuita.
Uma editora do novo normal
 Atualmente, o e-commerce 
permite comprar diretamente pela 
internet, e centenas de editoras co-
meçaram a apresentar catálogos 
diferenciados, com autores que não 
frequentam os circuitos mais comer-
ciais da literatura. Segundo a Neo-
trust/Compre&Confie, empresa de 
inteligênciade mercado focada em 
e-commerce, foram realizadas, em 
2020, 14,2 milhões de compras onli-
ne dessa categoria, valor 44% maior 
em relação ao ano anterior.
 Com todas as dificuldades 
que o mercado editorial vem sofren-
do, algumas livrarias e editoras têm 
recorrido a métodos alternativos nos 
negócios para a recuperação de suas 
vendas. Muitas delas estão de olho nas 
novas tendências de mercado para 
conquistar leitores e manter a relevân-
cia. Uma dessas tendências é o estímu-
lo da tecnologia na indústria literária.
 Com a pandemia pegando 
todos de surpresa, as editoras deci-
diram redesenhar suas estratégias 
de lançamentos e vendas, migrando 
para o digital, e fazendo com que o 
futuro desse mercado e talvez a sua 
retomada seja por meio de uma “li-
vraria digital”.
Rafaela Amaral, autora do livro ‘Festival 
das Estrelas’, lançado em 2020.
durante a pandemia, o livro foi super 
bem recebido pelas pessoas que me 
conhecem e as que não conhecem 
também. Só na pré-venda, que du-
rou 30 dias, eu vendi quase 100 livros. 
Isso foi incrível”, conta sobre a publi-
cação de seu livro.
Incentivo 
 O hábito da leitura foi sendo 
deixado de lado nos últimos anos de-
vido ao aumento da tecnologia. Mes-
mo com todo esse distanciamento 
entre as pessoas e os livros, ninguém 
pode negar que a cultivação des-
se hábito traz inúmeros benefícios. 
A leitura nos proporciona liberdade 
de pensamento, de informação e de 
criatividade. Além da empatia sen-
tida por diversos personagens, pois 
somos colocados em realidades dife-
rentes da nossa e aprendemos a nos 
colocar no lugar do outro.
 No Brasil, é possível se notar 
que a maioria das estantes em livra-
rias e nas casas dos leitores são es-
trangeiros. “Nós, escritores brasileiros, 
sempre acabamos naquele discurso 
26
O seu fone
de ouvido 
nunca esteve
tão cheio de
conteúdo!
Ouça na sua 
plataforma de 
áudio favorita. 
Não se esqueça de curtir o nosso 
perfil para ficar por dentro de todos 
os nossos programas.
TaComTempo
TÁ COM
TEMPO?
3 VEZES NÃO! A CPI da Covid é o 
assunto do momento, só se fala disso 
no âmbito político. Os depoimentos 
coletados pelos senadores despertam 
sentimentos como indignação e medo. 
Medo do que vem pela frente. Afinal, 
onde vamos parar com tudo isso que 
está acontecendo? O presidente da Pfi-
zer na América Latina, Carlos Murilo, dis-
se que a farmacêutica fez três ofertas de 
vacina em 2020 e o governo brasileiro 
não aprovou e nem desaprovou, ou seja, 
a resposta foi não para a vacina naquelas 
ocasiões. Fomos renegados 3 vezes... Se 
bobear, até mais do que isso.
ACABA OU NÃO? Hoje em dia, quase 
que 100% dos professores de jornalismo 
devem apontar o fim do impresso como 
um fato consumado. Só que isso está 
‘perto de acontecer ‘desde 2014 quando 
eu iniciava a graduação. Falavam-se em 
cinco anos para o findar do jornalismo 
impresso. Já se passaram 7 e ele se mos-
tra resistente. Durante a produção da série 
especial para o site da ComTempo, em 
conversa com profissionais, nos bastido-
res, é notável que essa questão divide opi-
nião. A leva de episódios sobre o futuro 
desta profissão serviu para mostrar uma 
coisa: é impossível prever como será a luz 
que brilha no túnel chamado jornalismo. 
DESINFORMAÇÃO Ao desenvolver 
a reportagem que ilustra a capa des-
ta edição sobre a AME, ficou claro que 
muitas pessoas ainda têm dúvidas so-
bre a doença. Um dos propósitos da 
ComTempo com essa pauta é esclarecer 
todas as esferas da doença considerada 
rara. Um dos questionamentos feitos 
pela reportagem é do motivo pelo qual 
o Zolgensma, medicamento que pode 
ser indicado a esses pacientes, é tão caro. 
Tivemos essa resposta da farmacêutica 
Novartis. No entanto, em contrapartida, 
o Ministério da Saúde retornou nosso 
e-mail, mas respondeu tudo em curtas 
palavras, falando mais do mesmo e sem 
se aprofundar nas explicações Mais uma 
da pasta à favor da desinformação. Não 
podemos esperar muito mesmo, basta 
ver como a pandemia é comandada. 
TÓ PICO..
POR MARCOS PITTA
27
.
Ni Una Menos é um movi-
mento contra a violência 
sexista e o feminicídio que 
teve origem na Argentina 
e conquistou adeptos em outros 
países da América Latina e Europa. 
A onda de protestos cresceu após o 
assassinato da jovem de apenas 14 
anos Chiara Páez em 2015. Ela esta-
va grávida de seu namorado de 16 
anos, que a matou e enterrou em 
seu jardim com a ajuda de seus pais.
 Um tweet da jornalista 
Marcela Ojeda foi o pontapé ini-
cial que futuramente desencade-
aria na mobilização. “Nem uma 
SOCIEDADE
A nova onda feminista 
da América Latina veste verde
JOÃO LUCAS DA SILVA, JÚLIA KOPP 
WAGNER, LUÍS HENRIQUE DE MELO 
E MARÍA BELEN FERREYRA
Manifestantes ocupam o Congressional Plaza, parque público de frente para o Congresso Argentino em Buenos Aires.
mulher a menos, nem mais uma 
morte” foi e ainda é a reivindi-
cação das mulheres argentinas 
tendo em vista os números alar-
mantes do feminicídio do país, em 
que a cada 30 horas uma mulher é 
assassinada.
A onda verde
 O lenço verde passou a 
ser um símbolo, das mulheres ar-
gentinas, pela luta pelo direito de 
decidir sobre o próprio corpo. Em 
dezembro de 2020 o objeto se 
tornou símbolo de conquista após 
a aprovação da Lei do Aborto, as-
sim, a Argentina se tornou o pri-
meiro país da região a conquistar 
o aborto legal, seguro e gratuito.
Mas por que um lenço e de tom 
verde?
 O lenço é símbolo de resis-
tência política na Argentina desde 
1977. Quem o utilizava eram mães 
que tiveram os filhos desapareci-
dos durante a ditadura militar ins-
taurada no país no ano de 1976. As 
mulheres protestavam em frente à 
Casa Rosada, sede da presidência, e 
para reconhecerem umas às outras 
elas começaram a utilizar um pano 
branco na cabeça. No início, eram 
fraldas de bebês, logo depois se 
tornaram lenços com os nomes dos 
filhos desaparecidos bordados no 
tecido. Essas mulheres e mães fica-
ram conhecidas como Las Madres 
de Plaza de Mayo.
O movimento “Ni Una Menos” teve início em 2015 na Argentina
e, após cinco anos de luta, o aborto legal, seguro e gratuito foi aprovado no país.
28
sociais Twitter, Facebook e WhatsApp 
são os primeiros canais a se expressar, 
compartilhar suas opiniões, mensa-
gens e se organizar. A primeira cha-
mada foi organizada pelo Facebook 
desde que nasceu o canal oficial do Ni 
Una Menos naquela rede. Mas depois 
de cinco anos consecutivos de orga-
nização e preenchimento das praças, 
acontece algo que paralisa o mundo, 
uma pandemia. Em 21 de março, o 
presidente Alberto Fernandez decre-
tou a quarentena no país. O que deu 
origem a dois acontecimentos imedia-
tos: não foi possível festejar e reclamar 
como todos os 3Js, mas foi instado a 
“seguir nas redes” e foi acrescentada 
uma nova reclamação, o aumento das 
reclamações. O isolamento social, pre-
ventivo e obrigatório obrigou as víti-
mas de violência de gênero a conviver 
24 horas com seus agressores.
 Todos os encontros que 
aconteceram até então na seguinte 
ordem: 
• 3 de junio de 2015 #Niunamenos; 
• 3 de junio de 2016 #Vivanosque-
remos; 
• 3 de junio de 2017 Basta de femi-
cidios, el gobierno es responsable; 
Mulheres se emocionam com a aprovação da Lei do Aborto no país.
• 4 de junio de 2018 Sin #AbortoLe-
gal no hay ##NiUnaMenos, No al 
pacto de Macri con el FMI; 
• 3 de junio de 2019 “Ni Una 
Menos por violencias sexistas, 
económicas, racistas, clasistas a 
las identidades vulneradas. Aborto 
legal ya y abajo el ajuste del 
gobierno y el FMI”; 
• 3 de junio de 2020 #Vivas, Libres 
y Desendeudadas Nos Queremo;
 
 Uma das maneiras de convi-
dar todos a se reunirem foi através de 
posts no Facebook.
A vigília verde
Apesar das medidas de saúde contra 
a Covid-19, o movimento feminista 
Ni Una Menos e a Campanha pelo 
Aborto Legal, Seguro e Gratuito se 
reuniram novamente no dia 29 de de-
zembro de 2020. Em um dia de mais 
de 20 horas se encontraram para ver 
a transmissão ao vivo da sessão ex-
traordinária em tela gigante da apro-
vação da lei. Uma vigíliafoi realizada 
com barracas, cobertores, fogueiras e 
música ao vivo. Nas redes, uma cam-
panha forte com as hashtags #EsAho-
raSenado #AbortoLegal2020 #Que-
SeaLey encheu as redes novamente.
 Já o tom verde foi escolhido 
em 2003 pelo movimento feminista. O 
motivo? Praticidade. A cor não era usa-
da no país para outros movimentos po-
líticos e as próprias feministas utilizavam 
e utilizam a cor lilás para o feminismo, 
então o verde foi escolhido para repre-
sentar a luta das mulheres em decidi-
rem sobre os próprios corpos.
Praças, avenidas e redes.
 A primeira reunião do Ni Una 
Menos foi no dia 3 de junho de 2015. 
O local acertado foi o Congresso Na-
cional da província de Buenos Aires. 
Por que aquele lugar? Porque ali foi 
promulgada, em 2009, a Lei 26.648 de 
Proteção Integral à Mulher, que a po-
pulação entendeu como ineficaz. De 
acordo com estatísticas de ONGs, os 
assassinatos de mulheres com média 
de 1 morte a cada 36 horas causaram 
indignação popular. Naquele dia, cer-
ca de 250.000 pessoas compareceram 
voluntariamente. A convocatória se 
espalhou por meio de redes sociais 
em outras 12 capitais argentinas, onde 
as principais praças e avenidas esta-
vam repletas de milhares de mulheres 
vítimas e familiares, artistas e atrizes 
reconhecidas, funcionários públicos e 
estudantes militares. Um fato surpre-
endente foi a quantidade de jovens 
adolescentes que estavam nas ruas.
Pandemia, redes e movimento.
 Dos espaços virtuais o movi-
mento feminista também esteve pre-
sente. Desde aquele primeiro tweet 
da jornalista Marcela Ojeda, as redes 
29
Conquistas
 Nos últimos 5 anos, o 
movimento feminista e outras 
organizações finalmente posicio-
naram o debate feminista como 
um eixo central na sociedade ar-
gentina. Muitos falaram a favor e 
contra. Embora possamos falar de 
mais acertos do que erros, como 
a criação de um Observatório da 
Violência de Gênero, Centros de 
cuidado feminino, debates para 
equalização de salários, assistên-
cia às mulheres em todas as áre-
as, educação sexual abrangente, 
discussão por uma linguagem 
inclusiva e atualmente um Esta-
do separado da Igreja. Tem duas 
frentes de oposição, o movimento 
Pró-Vida contra o aborto e em de-
fesa da vida e os partidos políticos 
de direita e as multinacionais. No 
que diz respeito à legislação, ob-
teve-se a aprovação dos seguin-
tes projetos:
LEI DE PARIDADE (2017): Esta-
belece que a real igualdade de 
oportunidades entre homens e 
mulheres no acesso aos cargos 
eletivos e partidários será garan-
tida por ações positivas na regu-
lação dos partidos políticos e no 
regime eleitoral.
LEI DA MICAELA (2018): Capa-
citação sobre gênero e violência 
contra a mulher. Obriga todas as 
pessoas que trabalham nos 3 ra-
mos do Estado Nacional a receber 
formação em questões de gênero 
e violência contra a mulher. Algu-
mas províncias fazem uso desta lei 
em ambientes acadêmicos supe-
riores e nas forças policiais.
LEI DA BRISA (2019): Estabelece 
que filhos e filhas de mulheres ví-
timas de feminicídio ou homicídio 
no contexto de violência domésti-
ca e/ou de gênero devem ser pro-
tegidos para que possam crescer 
em um ambiente saudável e livre 
de violência. Por isso, têm direito 
ao recebimento de uma remune-
ração econômica mensal, ao aces-
so à cobertura integral de saúde 
e ao acompanhamento integral 
durante sua formação.
LEI DE INTERRUPÇÃO VOLUN-
TÁRIA DA GRAVIDEZ (2020): 
Estabelece que as mulheres e as 
pessoas com outras identidades 
de gênero com capacidade para 
engravidar têm direito a: a) De-
liberar sobre a interrupção da 
gravidez de acordo com; b) Re-
querer atendimento nos serviços 
do sistema de saúde; c) Receber 
atenção pós-aborto nos serviços 
do sistema de saúde; d) Prevenir 
gravidezes indesejadas por meio 
do acesso à informação, educação 
sexual abrangente e métodos an-
ticoncepcionais eficazes.
Uma pedagogia da crueldade
Rita Segato, antropóloga argen-
tina que reside há décadas no 
Brasil, é uma das vozes mais lú-
cidas para pensar sobre a política 
de violência contra as mulheres 
na América Latina. Para Segato, 
toda essa violência não pode ser 
desconectada das estruturas ca-
pitalistas que depredam o corpo 
e o senso de empatia das pesso-
as — uma “pedagogia da cruel-
dade”, conforme suas palavras.
 Em uma entrevista para 
o jornal argentino Página 12, 
Manifestantes com os lenços verde, símbolo de luta e conquista.
Segato afirma que o corpo das 
mulheres é o suporte privilegia-
do para se escrever e transmitir 
a mensagem violenta por parte 
do patriarcado, que conta com o 
apoio também da violência midi-
ática que afirma recorrentemente 
os padrões de beleza a serem se-
guidos por todas elas.
 Segato foi a pioneira em 
colocar uma hipótese política e 
econômica na violência femini-
na na América Latina, principal-
mente em seu país de origem, a 
Argentina. Em seu livro “As Estru-
turas Elementares da Violência” 
(2003) ela já induzia o leitor a 
pensar sobre a “violência expres-
siva” nos mais variados crimes de 
gênero. No posfácio da obra que 
dá continuidade ao trabalho, “As 
novas formas de guerra e o cor-
po da mulher”, ela e a escritora 
Raquel Gutiérrez escrevem: “Há 
uma novidade, mesmo em sua 
repetição. A guerra assume no-
vas formas, assume roupas des-
conhecidas. E a metáfora têxtil 
não é por acaso: seu principal 
marco nessa época é o corpo fe-
30
minino. Texto e território de uma 
violência que ali se escreve privi-
legiadamente. Uma guerra de um 
novo tipo. A dificuldade de com-
preensão, acreditamos, deve ser 
analisada como um elemento es-
tratégico da novidade: como uma 
verdadeira dimensão da contra 
insurgência”
 “Acho que um primeiro 
pano de fundo que precisa ser 
esclarecido é a atual fase de ex-
ploração, que envolve uma espé-
cie de retorno ao trabalho servil, 
semiescravo e até escravo, pro-
duzido pela queda da centralida-
de dos salários”, afirma Rita à jor-
nalista Verônica Gago, do Página 
12. “Esse modo de sujeição das 
pessoas como mercadorias exi-
ge uma insensibilidade particular 
[…] Refiro-me a uma nova fase de 
conquista dos territórios, de sa-
queio de tudo, sem limites legais”.
 Para ela, o momento vi-
vido é comparável à época do 
reinado: a Coroa passou a ter o 
poder centralizado, suspenden-
do leis e códigos de justiça no 
momento. O vivenciado no hoje 
não é diferente, pois a ferocidade 
mercantilista escorada nos mais 
diversos governos garante a to-
mada de territórios, despejando 
seus povos de seus espaços de 
convivência. “Muitas vezes essa 
crueldade é exibida ainda mais 
no corpo das mulheres. É o que 
ocorre, por exemplo, no desloca-
mento de populações no Pacífico 
colombiano”, complementa.
A América Latina
 Segato contextualiza as 
ações de discriminação que ocor-
rem em toda a nossa América La-
tina, visto que há forte influência 
estatal-mercantilista por quase 
todo seu território. Segundo ela, 
o espaço comunitário está cada 
vez mais sendo tomado pelo 
poder do Estado-Mercado, des-
truindo todos os laços coletivistas 
e empáticos. Essas apropriações 
geram tensões à medida que o 
poder do Estado não é somente 
estatal, mas sim estatal e midiáti-
co, fazendo frente aos interesses 
empresariais.
O papel da 
subjetividade masculina
 “Obviamente a masculi-
nidade está mais disponível para 
a crueldade porque treinar para 
se tornar masculino força o de-
senvolvimento de uma afinidade 
significativa, ao longo da história 
da espécie, entre masculinidade 
e guerra, entre masculinidade e 
crueldade, e entre masculinidade 
e capitalismo’, enfatiza Rita Sega-
to. Essa relação da subjetividade 
masculina não significa não con-
siderar fora de seu contexto his-
tórico, não assistindo somente 
como uma relação entre homens 
e mulheres, mas como essas re-
lações são vivenciadas diante das 
circunstâncias históricas.
O feminismo como
frente da realidade
 Segato acredita que as 
mulheres nunca puderam usu-
fruir de tantos direitos, leis, po-
líticas públicas e instituições de 
apoio como no século XXI. Mas 
nisso há um entrave:esses di-
reitos não podem ser comple-
tamente utilizados porque “na 
cama em que estão inscritos há 
uma pressão na direção oposta”, 
segundo suas próprias palavras. 
“Então, ou atacamos esse pro-
jeto histórico da capital ou não 
vamos resolver o problema das 
mulheres. O feminismo hege-
mônico apostou todas as suas 
fichas na conquista de direitos. 
Isso mostra uma forte influência 
europeia, onde a relação entre 
Estado e sociedade é bastante 
diferente por razões históricas”, 
afirma. No recorte histórico, a 
América Latina os estados repu-
blicanos foram construídos pelas 
elites crioulas, e até hoje somos 
descendentes do modo adminis-
trativo colonial que nos criou. “A 
luta não pode ser essa [na Amé-
rica Latina], porque já tivemos 
muitas vitórias nesse campo e, 
ainda assim, o Estado em nossas 
sociedades tem seu foco na pro-
teção da propriedade e não deu 
mostras de ser capaz de proteger 
as mulheres e as pessoas”.
A solução
 Por fim, Rita traz como so-
lução que as mulheres precisam 
sair do campo do Estado. Isso não 
significa abandoná-lo, mas sim 
realizar outras lutas, somente as 
lutas das mulheres e em outros 
campos, principalmente nas áreas 
“marginais”, como o próprio Esta-
do denomina. “Precisamos de la-
ços mais fortes entre as mulheres, 
laços que protejam os espaços de 
nossas vidas, independentemente 
de leis e instituições, e que rom-
pam o modelo de família nuclear”.
Mulheres se emocionam com a aprovação da Lei do Aborto no país.
31
O plano de vacinação 
dos estados, no Brasil, 
continua lento pelo nú-
mero baixo de vacinas 
disponíveis para a população. Por 
isso, mesmo já tendo conseguido 
tomar as duas doses do imuni-
zante contra a Covid-19, os ido-
sos ainda não podem voltar para 
as atividades sociais que partici-
pavam antes da pandemia.
 Depois de todo esse tem-
CORONAVÍRUS
Idosos pós-vacina e a volta 
para a vida em sociedade
ALINE ANTUNES
po isolado, surge a preocupação 
por parte da família e cuidado-
res de como conseguir continuar 
mantendo seus senhores e se-
nhoras em casa, e como vai ser 
a volta desse grupo para a rotina 
que tem feito tanta falta também 
na vida dessas pessoas. 
 Do ponto de vista clínico, 
ainda é mais seguro continuar 
respeitando as medidas sanitá-
rias. “Uma vez imunizado, o idoso 
ainda pode se contaminar e apre-
sentar sintomas leves e modera-
dos da doença, o que pode tra-
zer desconforto, além de poder, 
mesmo imune, ao entrar em con-
tato com alguém infectado, car-
regar o vírus e ser o transmissor 
dele para outro indivíduo ainda 
não vacinado”, explica a geriatra 
e professora da pós-graduação 
em Geriatria e Gerontologia da 
Faculdade IDE (Instituto de De-
Especialistas explicam como continuar cuidando desse grupo
e como vai ser voltar dessa população para a vida social.
32
senvolvimento Educacional), San-
dra Brotto.
 Os cuidados não ficam 
apenas com o corpo, mas tam-
bém com a mente dessas pesso-
as, que sofrem ainda mais com os 
impactos de uma pandemia. “O 
envelhecimento, por si só, contri-
bui para desencadear ou agravar 
as condições de saúde mental, 
entre as quais se tem ansiedade 
e depressão, sendo consideradas 
as mais graves e mais inciden-
tes no idoso, merecendo ainda 
mais destaque neste período de 
pandemia. Isso nos faz pensar 
e refletir o quão importante é a 
participação e o convívio desses 
idosos no meio social”, obser-
va a psicóloga e pós-graduanda 
em Neuropsicopedagogia, Ema-
nuella Gouveia. 
 “A vacina vem como um 
alento no meio disso tudo, e a 
ansiedade por se proteger faz 
parte da natureza humana, prin-
cipalmente nos idosos, por ser o 
grupo de maior risco. Estratégias 
como prática de meditação e ati-
vidade física, alimentação leve e 
balanceada, vídeo-chamada com 
familiares e amigos, além de ati-
vidades de lazer e de estimulação 
cognitiva podem ajudar a passar o 
tempo com qualidade como, por 
exemplo: leitura, trabalhos manu-
ais, dança, canto, quebra-cabeça, 
palavras cruzadas, caça-palavras, 
bordado e pintura, dentre tantas 
outras”, orienta Sandra. 
 Daqui para frente, os fa-
miliares e amigos serão os gran-
des aliados dos anciões. “Cada 
família, em conjunto com o ido-
so, precisa refletir e discutir as 
estratégias importantes para o 
seu contexto. Nesse momento 
de pandemia, o afastamento físi-
co reflete ato de amor, carinho e 
consideração, além de ser estra-
tégia de proteção. A família e a 
sociedade podem se tornar um 
sistema de apoio ao idoso, reco-
mendando-se um relacionamen-
to permeado por respeito e ativi-
dades diárias de apoio”, esclarece 
a profissional de psicologia. 
 A ansiedade é muito gran-
de para poder voltar a frequentar 
os lugares que antes faziam parte 
da rotina, e muitos se questio-
nam quando isso vai acontecer. 
“Acredito que todo recomeço é 
um processo gradual, afinal esta-
mos lidando todos os dias com o 
desconhecido, desde o início da 
pandemia. Porém, quando atin-
girmos 75% da população vaci-
nada e a transmissão começar 
a cair, o que observaremos com 
a redução de hospitalizações e 
morte pela Covid, creio que a se-
gurança voltará, assim como toda 
a agenda social dos idosos, que 
retornarão aos seus pilates, cur-
sos, bailes, trabalho e viagens. A 
família e os amigos serão primor-
diais na recuperação dessa socia-
lização”, relata a professora. 
 Essa volta vai precisar de 
bastante cuidado pois, com o 
isolamento, alguns transtornos 
podem ter sido desencadeados. 
“Situações como a quarentena 
tendem a despertar sentimentos 
como solidão, estresse, ansieda-
de, tristeza, depressão, entre vá-
rios outros transtornos mentais. 
É importante ficar atento a qual-
quer sinal que indique algum dos 
sintomas. O fator emocional dos 
Sandra Brotto, geriatra.
Emanuella Gouveia, neuropsicopedagoga.
idosos em tempos de coronaví-
rus e pós-pandemia necessita de 
atenção”, finaliza Emanuella so-
bre a cautela que vai precisar ter 
quando o antigo normal estiver 
de volta. 
33
Evandro Marcelo de Castro, o entrevistado desta edição do Perso-
na, é um psicólogo que, na ânsia de ajudar o próximo, atravessou 
fronteiras geográficas, sociais e emocionais, e estabeleceu para si 
o propósito de vida de servir usando de sua formação acadêmica.
Apoia-se na Psicologia Positiva para auxiliar com eficácia no desenvol-
vimento e valorização da felicidade, trabalhando com a positividade ou 
com as emoções positivas por meio do otimismo aprendido.
PERSONA
Um psicólogo dedicado a dar 
sentido à vida dos fragilizados
MÁRCIA MORENO
ComTempo - Quem é Evandro?
Evandro de Castro - Sou, antes de 
tudo, uma pessoa dedicada ao que 
faço, gosto de ver resultados, emo-
ciono-me com as mudanças que 
vejo nas pessoas e nos movimentos, 
tenho uma sensibilidade bem aguça-
da para identificar as necessidades, 
os conflitos, os problemas, as dificul-
dades para, assim, poder ajudar as 
pessoas. Gosto de servir aqueles que 
me pedem ajuda.
 Sou bastante criativo, apre-
cio a beleza da vida, tenho coragem 
para enfrentar desafios e sou muito 
otimista. Não desisto e não me entre-
go com facilidade diante dos obstá-
culos da vida.
 Dedico-me a projetos de 
prevenção ao suicídio, ao uso abu-
sivo de drogas, a questões relacio-
nadas a sexualidade, a mobilização 
social de organizações não-governa-
mentais (ONGs), a gestão de pessoas, 
a orientação profissional, a jovens in-
gressantes no mercado de trabalho e 
muitos outros...
CT - Qual a sua formação?
Evandro - Sou psicólogo, pedago-
go, professor, mestre em Psicologia 
Clínica, tenho MBA em Coaching e 
Liderança, especialista em Gestão de 
Pessoas, tutor em Educação a Distân-
cia, voluntário de inúmeros projetos 
sociais e também atendo em consul-
tório de Psicologia Clínica na cidade 
de Ribeirão Preto-SP.
CT - Você queria ser padre quan-
do era criança?
Evandro - Verdade! Eu queria ser 
padre. Sempre admirei bastante a 
mística católica dos jesuítas e os san-
tos, tais como São Francisco de Assis, 
Santo Inácio de Loyola e Nossa Se-
nhora de Guadalupe, mas não me 
adaptei ao rigor dos seminárioscató-
licos porque sou muito independen-
34
te, mas encontrei outras maneiras de 
me dedicar ao sacerdócio ao ajudar 
as pessoas.
 A Igreja Católica me inspira 
muito, o Papa Francisco principal-
mente... Os movimentos católicos 
nos oferecem grande oportunidade 
de dedicar-se ao próximo. Desde o 
Movimento Vicentino de apoio aos 
pobres, a Toca de Assis que ampara 
pessoas em situação de rua e as con-
gregações com seus carismas e pas-
torais. Participo de muitas iniciativas e 
isso me faz muito bem.
CT - O que te levou a formar-se 
em Psicologia?
Evandro - Antes de desejar ser psi-
cólogo, as pessoas me diziam que eu 
tinha que ser psicólogo porque sabia 
ouvir, aconselhar e apoiar as pessoas 
em crises. Sempre fui líder nos grupos 
que participava e sempre tomava ini-
ciativas que, normalmente, as pessoas 
não estavam dispostas. Daí refleti e 
concluí que devia ser psicólogo e esta 
decisão foi a melhor que tomei em 
toda a minha vida. 
CT - Qual a sua orientação teórica 
na Psicologia?
Evandro - Tenho simpatia pela Psi-
canálise porque Sigmund Freud é de 
um brilhantismo ímpar, mas a prática 
levou-me para a Psicologia Positiva, 
movimento científico capitaneado 
por Martin Seligman que preconiza a 
valorização dos potenciais humanos, 
daquilo que temos de melhor e o seu 
constante florescimento.
CT - Como foi sua estada em Ha-
vana, Cuba por dois anos e meio?
Evandro - Fiz mestrado em Psico-
logia Clínica na Universidade de Ha-
vana. Foi uma experiência incrível 
tanto nos aspectos cultural, social, 
educacional, humano, espiritual, po-
lítico, etc. Conhecer a realidade dos 
cubanos com tamanha dificuldade 
econômica, a falta de liberdade, os 
conflitos da ilha caribenha e a cultu-
ra resiliente dos cubanos me emo-
cionou profundamente. O cubano é 
um forte.
 Mesmo não estando mais lá, 
ainda admiro profundamente esta 
Psicologia Comunitária Cubana que 
é de fácil acesso a toda sua popula-
ção e está inserida em toda a rede de 
saúde pública, realidade esta que nós 
não temos no Brasil. Eu mesmo sem-
pre estou aberto a convites de proje-
tos comunitários.
CT - Fale sobre a sua atuação 
como no Vale do Jequitinhonha, 
em Minas Gerais. 
Evandro - Foi uma entrega profis-
sional imensa a pessoas em diversas 
situações de vulnerabilidade. Apren-
di muito, servi bastante e sempre fui 
acessível e aberto. 
Lembro-me com um certo orgulho 
de poder ter ajudado no dia em que 
o bispo da cidade pediu que eu fosse 
ao hospital local convencer uma re-
cém parturiente a entregar seu bebê 
natimorto para ser velado pois ela se 
recusava a soltar do colo a pequena 
criatura sem vida. Ninguém conse-
guia fazê-la resignar-se com a situ-
ação dramática. Eu disse a ela: “Seus 
outros filhos estão te esperando em 
casa, estão sentindo a sua falta e você 
precisa ajudá-los. Vamos entregar 
este bebezinho a Deus. A vida precisa 
continuar”. Foi difícil, mas deu certo. 
CT - Como é seu engajamento 
como psicólogo voluntário em 
instituições, escolas, igrejas, etc?
Evandro - Minha missão sempre foi 
a de fazer diferença e apoiar àqueles 
que muitas vezes não têm acesso a 
este tipo de atendimento. Um psi-
cólogo tem inúmeras ferramentas 
técnicas para apoiar àqueles que 
enfrentam um sofrimento psíquico, 
tais como depressão, ansiedade, an-
gústia, incerteza, insegurança, etc. Eu 
estou aberto aos movimentos sociais 
que apoiam os Direitos Humanos. 
São, realmente, projetos sensacio-
nais e tenho muito interesse em estar 
sempre engajado.
CT - Como você ingressou na 
Educação?
Evandro - Comecei como professor 
de espanhol. Somos poucos e as es-
colas começaram a pedir para eu dar 
aula. Eu já tinha a licenciatura em Psi-
cologia e então fiz Letras Português/
Espanhol. Foi um ótimo começo. 
Continuo lecionando espanhol e, re-
centemente, concluí a terceira facul-
dade: Pedagogia.
CT - Fale sobre seu segundo 
livro, “Florescendo o Seu Pro-
pósito de Vida - Em Busca de 
Autorrealização”. 
Evandro - Este meu trabalho 
veio reforçado pela Escrita Tera-
pêutica como técnica a ser uti-
lizada de forma multidisciplinar 
dentro da abordagem da Psico-
logia Positiva. 
 É um conjunto de exercí-
cios temáticos que ajuda demais 
na reflexão e na intervenção, tan-
to individual como grupal. Muitos 
profissionais usam o meu livro em 
suas práticas e me elogiam pelo 
apoio do livro. Pessoas que estão 
em busca de autoconhecimento 
sentem-se muito satisfeitas com 
meu livro. 
CT - Você tem um propósito 
de vida definido?
Evandro - Sim. Meu propósito de 
vida é servir por meio da Psico-
logia, amenizando o sofrimento 
psíquico das pessoas, ajudando
-as a encontrar caminhos e solu-
ções para seus problemas.
CT - Como devemos enfrentar 
este momento desafiador cha-
mado de “novo normal” no 
qual estamos submersos?
Evandro - O momento é desafia-
dor, mas não tem volta. Se temos 
que mudar... vamos mudar... não 
há escolha! A questão é: como 
vamos fazer? Cada um terá sua 
maneira peculiar e vitoriosa de 
superar cada momento.
O futuro é incerto para todos, 
mas o presente tem que ser feito 
de boas escolhas. Temos que ter 
fé, otimismo, esperança, abertura 
ao novo, flexibilidade e acreditar 
que tudo vai dar certo.
CT - Uma reflexão para nossos 
leitores.
Evandro - Vamos seguir em frente. 
Não importa de que maneira. Muitas 
pessoas dependem da nossa decisão 
de não desistir, de continuar a cumprir 
com o propósito de nossas vidas. 
CT - Evandro por Evandro.
Evandro - Evandro é uma pessoa 
que vale a pena ter por perto.
35
https://revistacomtempo.com/colunas/como câncer, existem os nódulos 
benignos, que são mais comuns 
em adolescentes e jovens com 
menos de 30 anos, mas podem 
também ser encontrados em 
mulheres de qualquer idade. Esse 
tumor é classifi cado como fi broa-
denoma. O real motivo pelo qual 
esses nódulos surgem ainda é 
desconhecido.
O fi broadenoma pode ser detec-
tado através da palpação das ma-
mas, complementado por exame 
de ultrassom, e o diagnóstico de 
certeza é realizado através de 
exame histológico. Geralmen-
te, o nódulo tem uma caracte-
rística ovalada com as margens 
regulares, movem-se facilmen-
te pela pele, com tamanhos de 
aproximadamente 2 a 3 cm, mas 
existem casos excepcionais que 
podem chegar até 8 cm, sendo 
denominados como fi broade-
noma gigante. Os nódulos que 
surgem ainda na adolescência 
são chamados de fi broadenoma 
juvenil, costumam crescer rápi-
do, causando desconforto e al-
teração estética da mama. Nesse 
caso, o aconselhável é a cirurgia 
para a retirada dos nódulos.
De acordo com informações di-
vulgadas pela Febrasgo (Fede-
ração Brasileira das Associações 
de Ginecologia e Obstetrícia), a 
presença do fi broadenoma não 
aumenta o risco de se tornar um 
câncer de mama, apenas 0,1% a 
ARTIGO
Fibroadenoma: 
devo me 
preocupar?
ELENILDE CORRÊA
0,3% dos casos apre-
sentam uma transfor-
mação maligna.
Diagnóstico
O diagnóstico do nó-
dulo pode ser feito 
através do exame de 
ultrassom das ma-
mas, porém a bióp-
sia é importante para 
determinar o grau de 
benignidade. A bióp-
sia é realizada com o 
auxílio de uma agulha 
que retira fragmentos 
do tecido do nódulo.
Tratamento
O acompanhamen-
to clínico realiza-se a 
cada seis meses. Caso 
o nódulo não apresen-
te nenhum desconfor-
to, pode ser mantido 
sem a necessidade da 
paciente se submeter 
a uma cirurgia para a 
retirada dos fi broade-
nomas existentes na 
mama. No entanto, 
se o nódulo mamário 
classifi cado como fi -
broadenoma aumen-
tar de tamanho, tor-
nando-se incômodo, 
o recomendado pelos 
ginecologistas é a reti-
rada.
De acordo com Rodri-
go Colmanetti, gine-
cologista e obstetra, o 
fi broadenoma não é 
considerado uma le-
são pré-maligna.
“Mulheres com diag-
nóstico de fi broade-
noma devem, inicial-
mente, consultar seu 
ginecologista semes-
tralmente até a estabi-
lização do crescimen-
to desses nódulos e, 
posteriormente, ter 
consultas anuais sem-
pre complementadas 
por exames radiológi-
cos”, orienta o médico.
5
 De tempos em tempos, nos 
deparamos com alguma produção 
– seja um filme ou livro – que coloca 
nossa percepção sobre a realidade em 
xeque. A pandemia tem sido um perí-
odo de fertilidade para isso, proporcio-
nando inúmeras revisões de obras que, 
até então, eram consideradas como 
ficção (científica ou não), algumas até 
sofríveis, fazendo com que a categoria 
dessas narrativas chegasse a um novo 
patamar muito superior e, também, 
duvidoso: tornaram-se “premonições”.
 Do ponto de vista coletivo, 
espera-se que seja um evento passa-
geiro (o efeito “premonição”; a pan-
demia é algo muito mais complexo!), 
logo caindo no esquecimento, uma 
moda promovida por explorações 
excessivas da mídia e do mercado. É 
possível que o maior destaque seja 
Dan Brown, ao conseguir esse feito 
com primor no seu livro “O Código 
da Vinci”. Considero um exercício de-
licioso de imaginação e criatividade, 
um jogo linguístico, principalmente 
por fazer com que tantos componen-
tes distantes entre si, no tempo e no 
espaço, unam-se em uma narrativa 
convincente. Uma parcela significativa 
de leitores se entregou ao conto dos 
descendentes de Maria e Jesus, bus-
cando mais informações a respeito 
COLUNISTA
Limites: ficção ou realidadeCÉSAR BELARDI
de seitas obscuras, signos espalhados 
pelo mundo e as figuras históricas que 
construíram tudo isso.
 E, para o prazer desses leito-
res curiosos, incluindo este que vos es-
creve, havia uma profusão de subpro-
dutos disponíveis para suprir os mais 
ávidos teóricos da conspiração. Não 
foi um grande problema, afinal ne-
nhum estrago permanente foi cau-
sado e, logo, essa diversão curiosa foi 
caindo no esquecimento. Houve um 
breve retorno quando da estreia do 
filme, mas o terreno já estava bastante 
ressecado para dar mais algum fruto.
 O mesmo pode acontecer 
com outros temas. Discos voadores, 
por exemplo. Alienígenas são um 
cardápio básico, mas se colocar um 
tempero novo, voilà! Temos uma nova 
corrente conspiratória, com novos 
livros, revistas, podcasts, documen-
tários e tudo o mais que for possível 
receber uma grife.
 Pode fazer a lista: meteoros 
apocalípticos, criaturas das profun-
dezas-das-montanhas-das-geleiras 
ou de onde quer que você imaginar, 
vírus + bactérias + epidemias, fantas-
mas e assombrações...
E é aqui que vou parar!
 Não em uma categoria espe-
cífica, do “sobrenatural”, mas em uma 
categoria que coloca em dúvida nossa 
percepção da realidade individual-
mente, não apenas como um coletivo. 
Socialmente, podemos até entender e 
participar de eventos de catarse como 
“Corra!” ou “O Poço”, instigantes e 
perturbadores em uma certa dose 
que funciona para o coletivo. Nesse 
ambiente, poderão surgir discussões 
as mais diversas sobre as motivações 
e conflitos propostos pelas obras, mas 
com uma certa parcimônia. Sempre 
haverá alguém a discutir com maior 
profundidade, sob o olhar psicológi-
co, sociológico, antropológico aquela 
narrativa. Mas, e na intimidade? Qual 
o motivo de você ter perdido o sono 
depois de ver “Midsommar”? Afinal, 
não é só um filme?
 Algumas das provocações 
promovidas por poucas obras nos fa-
zem adotar um olhar de dúvida, qua-
se desconfiança, direcionado para os 
outros quando, na verdade, o impasse 
está dentro de nós, nos fazendo en-
frentar nosso íntimo com questiona-
mentos no lugar de um personagem 
específico, nem sempre o herói.
 Quer continuar mergulhado 
nesse universo? A continuação deste 
texto (partes 2 e 3) você encontra no 
nosso site, na coluna Belardi ComTempo.
https://revistacomtempo.com/category/belardi-comtempo/
6
Heitor, João Pedro, Anne Ma-
ria, Sarah, Eloá, Miguel, Ga-
briella, Gabriel, Manuela, João 
Guilherme, Sofia Helena, Isis, 
Cecília, Giovanna, Heloisa, Lavínia, An-
tony, Aghata, Jamilly, Joaquim, Lucas, 
Bianca, Maria Alice, Davi… Todos eles 
clamam por amor, um pouquinho a 
mais, e este pedido vem por um gesto 
e pode ser dado pela atenção ou um 
olhar mais apurado para cada uma 
destas vidas.
 Todos estes nomes e tantos 
outros são de crianças diagnosticadas 
com AME, a Atrofia Muscular Espinhal, 
doença rara que, de acordo com o 
Ministério da Saúde, entra nessa clas-
sificação atingindo 65 a cada 100 mil 
pessoas. Ainda no site do MS, é apon-
tado que, “de acordo com estudos, 
80% das doenças raras decorrem de 
fatores genéticos e 20% estão distri-
buídas em causas ambientais, infec-
ciosas e imunológicas”.
 A AME, segundo o Iname 
(Instituto Nacional da Atrofia Muscular 
Espinhal), afeta até 1 em cada 11 mil 
nascimentos, mas também é a princi-
pal causa genética de morte infantil.
Nesta reportagem, a ComTempo vai 
lhe contar a história de algumas des-
tas crianças citadas no início do texto, 
através de seus familiares que lutam, 
diariamente, em campanhas nas redes 
sociais e nas ruas para conseguirem 
valores milionários para salvar a vida 
de cada uma. 
 Você também confere en-
trevistas com grupos voluntários que 
auxiliam estas famílias e vai entender 
quais são os tipos da doença, quem 
ela afeta em suas variações e conhecer 
os medicamentos disponíveis. 
SAÚDE
AME-OS
MARCOS PITTA
O que é a AME 
 O Iname disponibiliza um li-
vro que explica a AME como: “uma 
doença genética que causa fraqueza 
dos músculos que controlam o mo-
vimento e a respiração. A doença é 
progressiva, o que significa que os sin-
tomas pioram com o tempo. A AME é 
causada pela degeneração progressi-
va dos neurônios motores da medu-
la espinhal e dos núcleos motores de 
nervos cranianos”.
 A explicação no livro continua 
enfatizando que “os neurônios moto-
res são as células que controlam as ati-
vidadesmusculares essenciais como 
andar, falar, engolir e respirar. Eles li-
gam a medula espinhal aos músculos 
do corpo. Uma pessoa nasce com to-
dos os neurônios motores que ela terá 
durante toda a sua vida. Neurônios 
motores são células que não se rege-
neram, logo, quando morrem, não se 
desenvolvem novamente.
TIPO INÍCIO DOS SINTOMAS SINTOMAS
Hipotonia profunda e insuficiência 
respiratória grave já ao nascimento. 
Não consegue sentar sem apoio.
Permanece sentado de forma in-
dependente, porém não consegue 
andar dessa mesma forma.
Anda de forma independente, porém 
pode perder esta habilidade com a 
progressão da doença.
Anda e não perde esta habilidade, 
podendo apresentar certa fraqueza 
muscular.
mais de 21 anos
mais de 18 meses
menos de 18 meses
0 a 6 meses
Pré-natal0
1
2
3
4
Causas e tipos da AME
 Uma mutação no gene 
SMN1, no cromossomo 5, faz com 
que sejam produzidos baixos níveis de 
proteína de sobrevivência do neurô-
nio motor, o SMN. É justamente essa 
proteína, a responsável por ajudar a 
manter saudáveis os neurônios moto-
res que estão na medula espinhal.
 Por conta da baixa produção, 
eles começam a se degenerar e, con-
sequentemente, os músculos ficam 
fracos e, com o tempo, atrofiam-se, o 
que gera fraqueza nos braços e per-
nas, além da dificuldade em engolir e 
até respirar.
 Na explicação do livro pre-
parado pelo Iname, entende-se que a 
doença geralmente ocorre em pesso-
as que herdam duas cópias defeituo-
sas do gene SMN1, uma vem do pai e 
a outra da mãe.
7
Medicamentos para tratamento da AME
 Ainda no texto elaborado pelo Iname, independente do tipo de 
tratamento recomendado, é importante ser iniciado o mais rapidamente 
possível. “O início precoce da terapia é a única maneira de evitar a de-
generação dos neurônios. Em ensaios clínicos de terapias baseadas em 
SMN, os pacientes que iniciaram o tratamento mais cedo tiveram melho-
res resultados do que aqueles que iniciaram o tratamento mais tarde”. 
Alguns medicamentos já estão aprovados para uso, são eles: Spinraza, 
Risdiplam e Zolgensma.
Spinraza
 O medicamento foi aprova-
do pela Anvisa (Agência Nacional 
de Vigilância Sanitária) e a forma 
de administração é intratecal e 
deve ser conduzida por profis-
sionais. Mais conhecido por seu 
nome comercial, Spinraza é uma 
terapia que aumenta a produção 
da proteína SMN funcional pelo 
gene SMN2. 
 O tratamento consiste em 
duas fases: na chamada fase de ata-
que, são administradas 4 doses por 
2 meses. Na fase de manutenção, 
que se inicia a partir da 5ª dose, o 
paciente deve receber a aplicação 
a cada 4 meses, pelo resto da vida. 
Portanto, no primeiro ano de trata-
mento, o paciente recebe seis do-
ses. A partir do segundo ano, rece-
be três doses por ano. 
 O Spinraza é disponibilizado 
pelo SUS desde 2019 por meio do 
PCDT (Protocolos Clínicos e Dire-
trizes Terapêuticas) para pacientes 
diagnosticados com AME Tipo 1. 
Embora existam evidências de que a 
medicação traga benefício para pa-
cientes de todos os tipos e idades, 
o protocolo tornou o nusinersena 
Risdiplam 
 Este medicamento é uma terapia que atua no gene SMN2. É uma 
molécula pequena que faz com que esse gene produza uma proteína SMN 
mais completa. É administrado via oral, atravessa a barreira hematoencefálica 
e tem ampla distribuição tecidual. 
 O Ministério da Saúde afirma que a Anvisa registrou o produto “con-
forme as normas da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 205/2017, que 
estabelece procedimento especial para o registro de medicamentos destina-
dos ao tratamento de doenças raras, como é o caso da AME”.
Zolgensma
 É este o medicamento 
herói dos pacientes com AME, e 
custa valor milionário em dólares 
que, convertidos em reais, apro-
xima-se hoje da casa dos R$ 12 
milhões. É o Zolgensma que está 
na vaquinha online das campa-
nhas de doações do João Pedro 
e da Anne Maria. É também o 
medicamento do tão esperado 
Dia Z do João Emanuel, persona-
gens que você irá conhecer, nas 
suas histórias adiante.
 Este medicamento me-
lhora os níveis de proteína SMN 
funcional através da introdução 
na célula do paciente de um novo 
gene SMN1. A terapia gênica Zol-
gensma, cuja via de administração 
é endovenosa, em dose única, foi 
aprovada pela Anvisa em agosto 
de 2020. Nesta terapia, uma có-
pia do gene SMN1 é inserida em 
um vetor viral AAV9 não replican-
te. No DNA viral, eliminam-se os 
genes que permitem replicação 
e patogenicidade do vírus e, no 
lugar, é inserido o transgene hu-
mano normal com o respectivo 
promotor. O vetor AAV9 é capaz 
de atravessar a barreira hemato-
encefálica, permitindo assim a ad-
ministração endovenosa. Como o 
fragmento de DNA inserido fica 
retido no núcleo da célula de for-
ma permanente, o medicamento 
é aplicado em uma só dose. 
 É este o medicamento 
que o João Pedro precisa.
(nome oficial do medicamento) dis-
ponível na rede pública para pacien-
tes pré-sintomáticos com até 3 có-
pias do SMN2, e para pacientes com 
AME do Tipo 1 com início dos sin-
tomas antes de 6 meses de idade e 
sem necessidade de ventilação me-
cânica permanente, como também 
para pacientes com diagnóstico 
molecular em fase pré-sintomática 
e até 3 cópias do gene SMN2. An-
tes de qualquer movimentação para 
buscar o tratamento com Spinraza, 
é preciso confirmar o diagnóstico 
através do exame de DNA. 
 De acordo com o site do 
Ministério da Saúde, o processo 
de registro deste medicamento foi 
priorizado na análise assim que foi 
protocolado junto à Anvisa, “com 
o imediato início da avaliação tan-
to da documentação referente à 
comprovação de segurança e efi-
cácia, quanto do dossiê de tecno-
logia farmacêutica’’.
 Na ocasião, o diretor-pre-
sidente da Anvisa, Jarbas Barbo-
sa, dizia: “É um medicamento que 
muda a história da AME, dando 
uma possibilidade concreta de 
melhora significativa na qualidade 
de vida dos portadores dessa do-
ença”. O MS ainda elucida: “Como 
se trata de uma substância inédi-
ta no país, foi um processo mais 
complexo, envolvendo a avalia-
ção crítica de informações legais 
e técnicas. Mesmo assim, dado o 
caráter prioritário que a Anvisa im-
pôs, a análise foi feita de maneira 
célere, com o registro sendo con-
cedido em cinco meses, desde sua 
solicitação junto à Agência”. 
8
Ame o João Pedro
 O João Pedro é de Jaboti-
cabal, no interior de São Paulo, e é 
o primeiro personagem real a en-
trar nesta reportagem. Os pais, em 
entrevista a ComTempo, contam 
que o diagnóstico de AME Tipo 2 
foi confirmado após teste genético: 
“Percebemos que ele não firmava 
as pernas quando estava com 9/10 
meses e não engatinhava. Ficamos 
preocupados e procuramos um 
neuropediatra que, de cara, já ficou 
desconfiado e pediu o teste que 
confirmou a doença”.
 Para a mãe de João Pedro, 
sua rotina é de muito empenho 
para conciliar todas as atividades 
que ele precisa fazer durante a se-
mana: “Nós não podemos parar, 
são graças a estas ações diárias 
que ele ainda está bem. O nosso 
dia a dia na convivência com a 
doença é normal, dentro do cro-
nograma dele. De segunda a sexta 
ele faz as terapias: três vezes por 
semana tem fisioterapia; duas ve-
zes por semana tem terapia ocu-
pacional; uma vez é atividade com 
fono e, outro dia da semana, ele 
faz uma terapia que se chama bo-
bath. Além disso, o João tem, duas 
vezes por semana, hidroterapia”.
 A mãe explica que, exceto a 
hidro, todas as outras terapias são 
realizadas pela APAE de Jaboticabal: 
“Os profissionais são maravilhosos e 
ele gosta muito”, completa. 
 O Zolgensma, medicamen-
to que ele precisa para conti-
nuar vivendo, precisa ser apli-
cado antes dele completar 2 
anos de vida, é o que conta a 
mãe na entrevista: “A aplica-
ção do medicamento é feita 
no Brasil, o remédio vem para 
cá e é feita num hospital em 
São Paulo, com a médica dele. 
Trata-se de uma aplicação sim-
ples, intravenosa, com duração 
de mais ou menos uma hora”.
 Para que João consiga 
o medicamento, familiares, 
amigos, conhecidos e muitas 
pessoas se mobilizaram em 
campanhas como vakinha vir-
tual,pedaladas, lives, feiras, 
venda de copos e camisetas 
e diversos outros meios para 
arrecadarem o total de R$ 12 
milhões: “As arrecadações es-
tão indo bem, as pessoas têm 
ajudado bastante. Para quem 
quiser contribuir, temos as pla-
taformas digitais, como o face-
book e instagram e as pessoas 
podem entrar, seguir e contri-
buir. Se não puder contribuir, 
pode ajudar divulgando para 
amigos e conhecidos. Isso já 
ajuda muito. O prazo final de 
arrecadação é setembro, no 
máximo outubro”, enfatiza a 
mãe de João Pedro.
 O custo do medicamento 
é elevado mesmo e a família 
nunca recebeu parecer oficial 
sobre o motivo pelo qual Zol-
gensma é tão caro: “Ele resti-
tui o gene que a pessoa com 
AME não tem. É muito estudo 
envolvido, acredito ser por 
isso o custo tão elevado do 
medicamento”.
Ajude o João Pedro. Clique aqui.
https://www.instagram.com/ameojoaopedro/
9
O que diz a farmacêutica
 Novartis é a farmacêutica 
responsável pelo Zolgensma que 
explica: “Este é um medicamento 
classificado como terapia avançada 
e tem mecanismo de ação único, 
não existindo, atualmente, no mer-
cado brasileiro, medicamento que 
trate a AME com terapia gênica”.
 A farmacêutica conversou 
com a ComTempo para explicar 
que Zolgensma é uma terapia ino-
vadora que agrega valor aos pa-
cientes que sofrem de uma doen-
ça genética grave e progressiva e 
abre novas possibilidades devido 
ao potencial de tratar doenças até 
então com poucas opções tera-
pêuticas, melhorando a qualidade 
de vida dos pacientes por evitar a 
progressão de sintomas degene-
rativos característicos da doença; 
contribuindo também para a so-
ciedade em geral, na medida que 
reduz os impactos na saúde.
 A reportagem procurou 
entender também como é a pro-
dução do medicamento, compo-
sições e benefícios do Zolgens-
ma para os pacientes com AME 
e de acordo com a resposta da 
farmacêutica, esse remédio é “o 
único tratamento para AME de-
senvolvido para abordar direta-
mente a causa raiz da doença, 
fornecendo uma cópia funcional 
do gene SMN1. Por se tratar de 
uma terapia gênica baseada em 
um vetor viral adeno-associa-
do, o Zolgensma é administrado 
por meio de uma injeção intra-
venosa única, em procedimento 
hospitalar conduzido por médi-
co especialista, conforme méto-
dos estabelecidos — enquanto 
outras terapias disponíveis para 
AME são de uso crônico. A admi-
nistração necessita de uma série 
de preparos e exames prévios e 
posteriores à infusão, de forma 
a garantir que o paciente esteja 
em condições clínicas adequadas 
para receber o tratamento e que, 
posteriormente, continue sendo 
monitorado por seu médico”.
 A explicação continua: 
“Zolgensma é uma inovação que 
traz novas possibilidades para 
o tratamento da AME. Ao inter-
romper ou evitar a progressão 
da doença, os tratamentos mul-
tidisciplinares complementares 
passam a visar a melhoria contí-
nua dos pacientes. Até o presente 
momento, o tratamento demons-
trou durabilidade sustentada de 
5,2 anos após a administração, 
sendo que o paciente mais velho 
tratado tem 6,7 anos de idade.
 As evidências científicas 
sobre a eficácia e durabilidade do 
efeito de Zolgensma têm aumen-
tado gradativamente, demons-
trando benefícios em relação à 
melhora da sobrevida, função 
motora, conquista e manutenção 
de marcos do desenvolvimento, 
função respiratória e bulbar”.
 Outro questionamento 
foi a precificação do medicamen-
to no Brasil, caso haja aprovação 
para colocá-lo à venda aqui no 
país. A explicação foi a seguinte: 
“Tendo sempre em vista a reali-
dade socioeconômica local, foi 
realizado um grande esforço pro-
pondo que o preço lista, que é o 
(maior preço possível de ser uti-
lizado), de Zolgensma no Brasil, 
seja o menor preço lista praticado 
no mundo. Uma vez que o pro-
cesso de definição final do preço 
lista seja finalizado, a empresa 
pretende ofertar ao setor público, 
condições diferenciadas, de forma 
a reduzir o impacto orçamentário 
e viabilizar o acesso dessa terapia 
reconhecidamente inovadora aos 
pacientes, no país”.
 Questionada sobre o núme-
ro de pedidos para o medicamento 
no Brasil, a Novartis disse que a em-
presa não comenta o assunto. 
O que diz o SUS
 A ComTempo procurou o 
Ministério da Saúde e questionou 
quantos pacientes são atendidos 
pelo SUS e recebem o tratamento 
gratuitamente para AME. O MS 
retornou nossa pergunta espe-
cificando: “O medicamento nusi-
nersena 2,4 mg/ml foi distribuído 
em novembro de 2019 e, desde 
então, foram atendidos 201 pa-
cientes, sendo que, desse total 
169 continuam ativos. Portanto, 
não existem pacientes diagnos-
ticados com AME tipo 1 em lis-
ta de espera para recebimento 
deste medicamento. A partir do 
momento em que as Secretarias 
Estaduais de Saúde (SES) e do 
Distrito Federal encaminhem as 
informações sobre cada paciente 
novo com AME tipo 1 cadastra-
do no Componente Especializa-
do da Assistência Farmacêutica 
(CEAF), o medicamento é envia-
do imediatamente”.
 Nós também pergun-
tamos como as famílias destes 
pacientes recebem o tratamen-
to: “Para ter acesso aos medica-
mentos, o paciente deve se en-
quadrar nos critérios de inclusão, 
condutas descritas nos Protoco-
los Clínicos e Diretrizes Terapêu-
ticas (PCDT) de Atrofia Muscular 
Espinhal (PCDT) e apresentar os 
seguintes documentos: 
• Cópia do Cartão Nacional de 
Saúde (CNS);
• Cópia de documento de iden-
tidade;
• Laudo para Solicitação, Ava-
liação e Autorização de Me-
dicamentos do Componente 
Especializado da Assistência 
Farmacêutica (LME), adequa-
damente preenchido e assi-
nado pelo médico prescritor;
• Prescrição médica devida-
mente preenchida;
• Demais documentos e exa-
mes exigidos no PCDT de 
AME 5q tipo 1, publicado 
pelo Ministério da Saúde.
 
O Ministério da Saúde informou 
ainda, que em relação aos pacien-
tes com AME Tipos 2 e 3, o me-
dicamento nusinersena não foi 
incorporado no âmbito do SUS.
Quer saber mais 
sobre a AME?
Clique neste quadro 
e se informe!
https://iname.org.br/
10
Ame a Anne Maria
 Borboletinha. É assim que a 
pequena Anne Maria é conhecida 
nas redes sociais, pela campanha 
para arrecadar os mesmos R$ 12 
milhões que João Pedro precisa. 
Anne é de Porto Alegre-RS e a 
mãe dela também conversou com 
a ComTempo para contar a história 
desta guerreira que luta contra a 
AME: “Quando nasceu, ela estava 
bem, não apresentava nada 
que nos chamasse a atenção e, 
por isso, foi para casa com dois 
dias de vida”.
 A mãe continua con-
tando que, antes mesmo de 
completar 1 mês de vida, a pe-
quena tinha um ronco no pei-
to e ao ser amamentada, esse 
ronco aumentava e a deixava 
preocupada e frustrada: “Eu le-
vava no posto e eles só me da-
vam soro fisiológico pra por no 
nariz dela e essa rotina foi se 
repetindo por mais ou menos 
um mês, até que marcaram 
pediatra no ambulatório, em 
26 de fevereiro [de 2021]. Foi 
o dia em que Anne nunca mais 
voltou pra casa, pois ficou in-
ternada porque engasgava-se 
muito no peito e apresentou 
uma hipotonia, uma paralisia 
nos músculos”.
 A partir disso, Anne 
passou fazer, todos os dias, exa-
mes diversificados, e os médi-
cos não encontravam nada que 
pudesse orientá-los, segundo 
relato da mãe, que continua: 
“Foi, então, que eles partiram 
para o lado das doenças raras 
e foi realizado um exame e, de 
cara, já diagnosticou AME Tipo 
1 severa. Esse resultado preci-
sou vir de São Paulo e demorou 
cerca de três semanas”.
 A mãe de Anne Maria 
conta que ao ser confirmada a 
AME, os médicos logo solicita-
ram vaga no Hospital das Clí-
nicas: “O problema é que ela já 
estava na UTI e encontrar uma 
vaga foi difícil, demorou para 
encontrar um leito. Ela estava 
entubada e precisaram retirar 
o tubo para colocar o bipap, no 
formato de girafinha para ela 
continuar respirando. Com isso, foi 
solicitada vaga na enfermaria do HC 
de Porto Alegre e conseguimos”.
 A mãe da Anne conta ain-
da que, no mês de maio, pouco 
antes do fechamento desta edição, 
já haviam sido aplicadas três doses 
do Spinraza e ela já havia notado 
diferença nos braços da filha:“Os 
médicos dizem que para confir-
marem algo no quadro dela, só é 
eficaz depois de 2 ou 3 meses de 
aplicação. Ela passou por duas ci-
rurgias recentemente, uma gastro 
e outra para corrigir o refluxo”. Até 
o fechamento desta reportagem, 
Anne permanecia no hospital e, de 
acordo com a mãe, poderia receber 
alta a qualquer momento para con-
tinuar o tratamento em casa. 
 Para ajudar a Anne Maria, 
clique aqui.
https://www.instagram.com/ameannemaria/
11
João Emanuel teve seu dia “Z”
 Dia “Z” é como as famí-
lias denominam o dia em que o 
paciente vai, finalmente, receber 
a aplicação do Zolgensma. Quem 
conseguiu o medicamento foi João 
Emanuel, do Rio Grande do Sul, 
que teve seu dia “Z” em 4 de maio 
de 2021. 
 Para entender como foi a 
história do João até a tão aguar-
dada aplicação, nós conversamos 
com os pais que contaram como 
o diagnóstico surgiu: “Aos 4 meses 
percebemos fraqueza muscular, 
então foi coletado exame de san-
gue, que deu positivo para AME 
Tipo 1”, explicam os pais que nos 
falam também da arrecadação: “A 
campanha teve duração de 1 ano. 
Iniciou pequenininha e no início 
foi bem difícil. Tínhamos poucos 
voluntários e já estávamos na pan-
demia. Mas, com o esforço das 
pessoas que chamamos de “Anjos 
do João” conseguimos alcançar o 
Brasil e até o mundo. Então, a his-
tória do João se espalhou e a cam-
panha cresceu. O valor necessário 
foi conquistado através da ajuda 
de muitas pessoas, que doaram, 
fizeram rifas, eventos, caixinhas 
de troco solidário, pedágios, lives, 
teve também um grupo que bus-
cou apoio de artistas, e muito mais. 
Os voluntários ajudaram de todas 
as formas, e somos imensamente 
gratos a eles”.
 A ComTempo quis saber a 
sensação dos pais quando soube-
ram que Zolgensma seria possível: 
“Uma mistura de emoções como 
esperança, alegria, gratidão, amor 
e muita felicidade. O coração ficou 
a mil. A notícia nos mostrou que 
quando temos fé em Deus, tudo é 
possível, e o sentimento de grati-
dão ficará pra sempre em nossos 
corações”, emocionam-se os pais.
Após a aplicação do medicamento, 
os pais contam que “ainda são ne-
cessárias as terapias que João con-
tinua fazendo: fisioterapia, acom-
panhamento com fonoaudiólogo, 
nutricionista, pneumologista. As 
terapias são necessárias para que 
os músculos sejam exercitados e, 
aos pouquinhos, os movimentos 
perdidos possam voltar”.
 Como mensagem final às 
famílias que estão passando pelo 
tratamento da AME ou para aque-
las que ainda estão no estágio 
inicial, acompanhando a arrecada-
ção, os pais do João Emanuel di-
zem que, em primeiro lugar, deve 
vir a confiança em Deus: “Ter fé e 
esperança que tudo dará certo 
apesar de parecer quase impossí-
vel; confiar nas pessoas que estão 
com vocês nessa luta e passar con-
fiança em tudo; ser muito transpa-
rente em tudo”, finalizam. 
12
Como age Zolgensma no cor-
po: explica quem entende
 ComTempo conversou 
com Ana Lúcia Langer, médica, 
pediatra e Presidente da Associa-
ção Paulista de Distrofia Muscu-
lar. 
 A especialista começa di-
zendo o que é importante: “É bas-
tante importante que o pediatra 
acompanhe o desenvolvimento 
neurológico do paciente, qual-
quer atraso é preciso que seja 
identificado e investigado. Uma 
criança que demora para se sen-
tar, uma cabeça que demora para 
se fixar no pescoço, uma demo-
ra na marcha, tudo isso precisa 
ser investigado”, explica a médi-
ca, que continua: “Muitas vezes, 
a gente percebe que os médicos 
taxam as crianças de preguiço-
sas, começam fisioterapia para 
estimular e, na verdade, o diag-
nóstico é colocado em segundo 
plano”.
 Segundo Langer, sobre o 
diagnóstico da AME, “a primei-
ra coisa que eu falo, se eu tenho 
alguma suspeita de hipotonia ou 
atrofia, é ir direto para um diag-
nóstico genético para pesquisar 
AME. Alguns colegas dosam a en-
zima creatinofosfoquinase, uma 
enzima dentro do músculo que 
pode estar aumentada nas formas 
menos severas, como a AME Tipo 
3, quando o paciente chega a ter 
marcha, por exemplo”.
 A médica diz ainda que 
outro exame pedido por médicos 
é a eletroneuromiografia: “Isso 
acontece quando os médicos es-
tão mais perdidos nos casos. Para 
realizar este exame, são colocadas 
duas agulhas dentro dos múscu-
los, por onde passa uma corrente 
elétrica e, através disso, pode-se 
saber se a doença investigada en-
contra-se no músculo ou no mo-
tor”, detalha.
 No entanto, Langer res-
salta que o padrão ouro para 
diagnosticar a AME, atualmente, 
é o exame genético: “Muitas as-
sociações têm se esforçado para 
colocar esse exame dentro do 
teste neonatal, para um diagnós-
tico precoce que possibilite 
tratamento prévio que os 
danos sejam menores às 
crianças”. 
 
Zolgensma no corpo 
do paciente e o diag-
nóstico da AME atra-
vés do gene SMN1
 Langer explica 
que existem duas di-
ferenças de aprovação 
do uso do Zolgensma em 
pacientes. A primeira é pela 
Agência Regulatória Ameri-
cana e a segunda pela Agência 
Europeia de Medicamentos: “Para 
que o paciente tome Zolgensma, 
a partir das exigências do corpo 
americano, o paciente precisa ter 
o diagnóstico de AME Tipo 1 ou 2 
até os dois anos de idade. Já pelo 
corpo europeu, não existe limite 
de idade, mas uma exigência de 
tomar o medicamento até que a 
criança alcance os 21 quilos”, ex-
plica a médica. 
 Apesar desta diferença, 
as famílias das crianças com AME 
ainda precisam entender os pro-
tocolos rígidos para aplicação do 
medicamento. Langer explica a 
recomendação: “O uso concomi-
tante de corticoide desde alguns 
dias antes da aplicação até algum 
tempo depois. É um protocolo clí-
nico e existe a possibilidade tam-
bém de efeitos colaterais, princi-
palmente relacionados ao fígado, 
então é necessário uma monito-
rização desses pacientes, através 
de enzimas hepáticas para que 
estes efeitos sejam controlados. 
Por isso, os corticoides são pres-
critos”. 
 Sobre a atuação do me-
dicamento, a médica explica, de-
talhadamente, como é o funcio-
namento do organismo de um 
paciente com AME, comparando 
com quem não tem a doença: 
“Existe uma proteína no neurô-
nio motor chamada SMN1 e essa 
proteína é codificada pelo gene 
de mesmo nome. Do lado desse 
gene existe um outro gene meio 
defeituoso que é o SMN2 que, 
provavelmente, durante a evolu-
ção, foi perdendo a importância. 
Quando se compara esses dois 
genes, percebe-se que o SMN1 
fabrica 100% de proteínas funcio-
nais e o SMN2 é truncado, é de-
feituoso e só fabrica 10% de pro-
teína funcional e 90% de proteína 
truncada. 
 Uma pessoa que não tem 
AME, possui o gene SMN1 e fabri-
ca essa proteína. Quando se tem 
AME, o paciente apresenta defei-
to na produção desse gene SMN1 
e só pode contar com o SMN2 e 
quanto mais cópias SMN2 o pa-
ciente tiver, melhor será o fenóti-
po dela. Então, quando se tem en-
tre uma e duas cópias de SMN2, 
o diagnóstico é do tipo grave, a 
AME 1; de duas a três cópias, po-
de-se diagnosticar a AME de tipo 
2 e; quando se tem mais de três 
cópias, é possível diagnosticar o 
tipo 3”.
 Langer segue seu racio-
cínio dizendo que o Zolgensma, 
para atuar no organismo, como 
está prescrito na bula: “É neces-
sário pelo menos 3 cópias do 
SMN2”, e continua: “Zolgensma 
pega o gene SMN1 e injeta na 
criança. Então, o paciente vai fabri-
car o SMN1 e, quanto mais preco-
ce isso acontecer, melhores serão 
os efeitos. Portanto, eu vou dar 
para o paciente o gene SMN1 que 
é exatamente a causa da doença e 
quanto mais precocemente eu der 
esse gene, mais próximo do nor-
mal eu vou ter essa criança”. 
13
Zolgensma para todos
 A reportagem entrevistou, 
ainda, Carina Galvão Freitas, idealiza-
dora do Movimento Zolgensma para 
Todos. Abaixo, você confere a íntegra 
da entrevista com a coordenadora 
que explica a ideia deste grupo de 
voluntários, cujo único objetivo é: dar 
esperança às famílias dos pacientes 
com AME através de muita ajuda. 
 
ComTempo - Como e quando sur-
giu o movimento Zolgensma para 
Todos? 
Carina Galvão Freitas - A ideia do 
Movimento nasceu após o término 
da Campanha da Antonella de Blu-
menau-SC,primeiro bebê com AME 
a conseguir comprar o Zolgensma 
através de Campanha. Eu, Carina, fui 
voluntária na campanha dela, pois a 
causa era muito nobre: uma família 
lutando para salvar sua filha da do-
ença genética que mais mata bebês 
no mundo, contra o remédio mais 
caro do mundo. Quando ela conse-
guiu alcançar o valor, foi um grande 
milagre (véspera de Natal de 2019), 
mas ao mesmo tempo, sentíamos 
apagar um incêndio na floresta com 
um balde d’água, pois ela apresentou 
a nós (através de sua página) outras 6 
crianças que iniciaram o mesmo tipo 
de campanha. E entendemos que, 
a partir da vitória dela, tantas outras 
apareceriam, e se demoramos quase 
1 ano para ajudá-la alcançar o medi-
camento, escolher a próxima criança 
também significava deixar todas as 
outras “pra morrer de AME”. Senti-
mos que tínhamos que ajudar todas! 
Não dava pra escolher apenas uma 
e permitir que a história se repetisse 
infinitas vezes. 
 A ideia surgiu em janeiro de 
2020 e se consolidou a partir de mar-
ço do mesmo ano, quando come-
çamos a fazer contato com políticos 
que pudessem ajudar e a formar o 
grupo voluntariado. Em dezembro 
de 2020 fizemos nosso 1° manifes-
to presencial em diversas cidades de 
cinco estados do país.
 
CT - Qual o foco deste grupo de 
voluntários?
Carina - Nossa luta é voluntária e tem 
foco em políticas públicas, que deem 
acesso ao medicamento. Nosso lema 
costuma ser “Não queremos seu di-
nheiro, queremos a sua voz” porque 
é através da consciência e pressão 
popular que podemos cobrar das 
autoridades, providências. Uma vez 
que uma campanha de arrecadação 
expõe a criança, sacrifica a família a 
julgamentos e é incerta. Entendemos 
que o direito à vida, à dignidade e à 
saúde está garantido às nossas crian-
ças pela Constituição, pelos Direitos 
Humanos e pelo ECA.
 Lutamos burocraticamente, 
na prática, desde março de 2020 por:
• Registro do Zolgensma no Brasil 
(ocorreu em agosto de 2020);
• Precificação do Zolgensma no 
Brasil (estamos nessa etapa);
• Inserção do Zolgensma no SUS;
• Diagnóstico precoce (AME no 
teste do pezinho, aprovado dia 
21 deste mês no senado, faltan-
do sanção do presidente, no mo-
mento);
• Capacitação de profissionais na 
especialização de AME;
• Que a Novartis abaixe o preço! 
 
CT - Quantas crianças diretamente 
vocês conseguem ajudar? Existe 
número aproximado?
Carina - Sobre o número de crianças, 
é difícil definir pois, a AME, no teste 
do pezinho, por exemplo, é algo que 
vai impactar milhares de AME que 
ainda nem nasceram. 
 Temos uma lista de cadastra-
mento de crianças que buscam Zol-
gensma, seja por campanha ou via 
judicial. Ela se mantém, no momento, 
na média de 50 crianças no Brasil. Po-
rém, é importante entender que nas-
ce 1 AME para cada 10 mil nascidos 
vivos no Brasil. Estima-se que cerca 
de 250 a 300 bebês ao ano. Muitos 
acabam falecendo antes mesmo do 
diagnóstico (pois a doença atrofia 
músculos e prejudica o funciona-
mento de órgãos, principalmente o 
pulmão). Sua detecção, normalmen-
te, é pelo avanço e a criança está so-
frendo intercorrências em casa. Então, 
o número de crianças que buscam o 
tratamento pode ser muito maior. 
 Como nosso foco são pe-
los direitos dos AME de acesso ao 
diagnóstico precoce e ao melhor tra-
tamento precoce, se conseguirmos 
avançar nas políticas públicas que 
permitem esse acesso, o número de 
crianças ajudadas ao longo do tempo 
é incontável.
 
CT - Vocês têm uma campanha 
nacional para tratamento gratuito 
da AME. Já obtiveram algum re-
torno? Quando montaram a cam-
panha?
Carina - Temos um abaixo-assinado 
nacional pelos direitos que reivindica-
mos. Estamos aguardando obter 100 
mil assinaturas (porém a meta é 1 mi-
lhão, atualmente tem cerca de 70 mil) 
para protocolarmos nos órgãos com-
petentes. Sabemos que abaixo-assi-
nado não é instrumento jurídico, mas 
é instrumento de pressão e expressa 
a vontade do povo. Acreditamos que 
todo poder emana do mesmo, como 
diz nossa Constituição, por isso a 
ideia é registrar esse pedido! 
 Ainda não obtivemos retor-
no porque não o protocolamos, a 
intenção é que seja em agosto, ape-
sar de muitas das nossas bandeiras 
já estarem sendo conquistadas no 
país. O abaixo-assinado é de julho 
de 2020.
14
O papel do Iname
 Outra entrevista que a Com-
Tempo traz para finalizar essa repor-
tagem sobre a AME é com Juliane 
Arndt de Godoi, diretora do Instituto 
Nacional de Atrofia Muscular Espi-
nhal, o Iname. Godoi conta sobre o 
papel do Instituto, os pacientes ca-
dastrados e como funciona o projeto 
que eles fazem acontecer dentro dos 
hospitais, capacitando profissionais 
para lidarem com a doença. 
ComTempo - Qual o papel do Ina-
me?
Juliane Arndt de Godoi - O papel do 
Iname, como associação, é atuar na 
busca de tratamento e cuidados ade-
qua Aedos para todos os portadores 
da doença no Brasil, bem como no 
suporte incondicional às necessidades 
das famílias, desde o diagnóstico até a 
rotina diária de atuação multidiscipli-
nar. Para isso, atuamos em 3 frentes 
principais: assistência a famílias com 
AME; advocacia, que é a busca por 
políticas públicas para AME; e tam-
bém na capacitação de profissionais.
CT - Quantos pacientes com AME o 
Iname têm cadastrados atualmen-
te? 
Juliane - Hoje, em nossa base de 
dados, temos 1.316 pacientes, entre 
crianças e adultos com todos os tipos 
de AME.
CT - Quantas pessoas já foram aju-
dadas com o projeto RespirAME? 
Como ele começou?
Juliane - O projeto RespirAME sur-
giu pela necessidade que víamos de 
pacientes recém diagnosticados que 
não tinham acesso rápido aos respi-
radores e, com isso acabavam, agra-
vando o quadro clínico e muitas vezes 
indo para UTI. Através desse progra-
ma, nós alugamos os equipamentos 
e emprestamos para as famílias sem 
nenhum custo, por um período de 3 
meses, para que o paciente comece 
usar rapidamente a ventilação quan-
do é necessária e, nesse meio tempo, 
consiga seu próprio equipamento. Já 
atendemos por esse projeto 38 pa-
cientes, entre crianças e adultos, for-
necendo equipamentos, máscaras e 
ambu.
CT - Como funciona o projeto Ina-
me nos Hospitais? E o que precisa 
ser feito para uma instituição re-
ceber este treinamento? 
Juliane - O projeto Iname nos Hos-
pitais é uma capacitação local para 
hospitais que atendem pacientes 
com AME. Já levamos esse projeto 
para São Luís-MA, Natal-RN e Ca-
choeiro de Itapemirim-ES. Devido à 
pandemia, este ano estamos fazen-
do de forma online, então, todos os 
hospitais do Brasil podem participar, 
basta fazer a inscrição dos profissio-
nais pelo site: eventos.iname.org.br 
Este projeto tem por objetivo capa-
citar profissionais de saúde que atu-
am em equipes multidisciplinares 
de Hospitais que atendem pacientes 
com AME: médicos, fisioterapeutas, 
profissionais de enfermagem, fo-
noterapeutas, nutricionistas, entre 
outros.
CT - Quantos voluntários com-
põem o Iname, atualmente? Como 
o Instituto consegue se manter ati-
vo?
Juliane - Hoje temos 13 voluntários 
no Iname, que compõem a diretoria, 
conselho e representantes regionais. 
Para o instituto se manter ativo, rece-
bemos doações espontâneas que são 
direcionadas aos nossos projetos.
Capa do livro desenvolvido pelo Iname.
https://eventos.iname.org.br/
15
A cultura pode trazer para a 
população o acesso ao la-
zer, ao conhecimento e ao 
prazer. A sociedade adquire 
novas tradições, consegue combater 
graves problemas socioeconômicos, 
além de fortalecer os aspectos e a 
identidade pessoal e social de cada 
indivíduo.
 E é justamente esse segmen-
to um dos mais prejudicados pela 
pandemia de Covid-19. Segundo uma 
análise das medidas de governos, 
para socorrer o setor em vários países, 
feita pela Organização das Nações 
Unidas para Educação, Ciência e Cul-
tura (Unesco), em dezembro de 2020, 
durante seis meses de confinamento 
social, a área de produção musical, por 
exemplo, pode ter 
perdido mais de US$ 
10 bilhões em patro-
cínio e apoio institu-
cional. 
 No Brasil, a 
Lei Aldir Blanc foi san-
cionada pelo presi-
dente JairBolsonaro, 
em junho de 2020, 
com intuito de apoiar 
profissionais da área 
que sofreram com 
impacto das medidas 
de distanciamento 
social por causa do 
coronavírus. O total 
do repasse previsto 
era de R$ 3 bilhões.
 Com ob-
jetivo de entender 
como alguns setores 
da cultura estão so-
brevivendo à crise, a 
CULTURA
A cultura resiste
SÉRGIO FRAGA
Segundo o dicionário Aurélio, um dos significados 
da palavra cultura é o complexo dos padrões de 
comportamentos, das crenças, das instituições, das 
manifestações artísticas e intelectuais, transmitidas 
coletivamente e típicas de uma sociedade. 
Espetáculo Natal Encantado - 2019, do grupo Carroça Teatral.
Foto: Arquivo Prefeitura de Barueri.
ComTempo conversou com membros 
de três segmentos diferentes. O grupo 
Carroça Teatral, o Museu da Vida e a 
banda Detonautas Roque Clube.
De repente uma pandemia
 O grupo Carroça Teatral surgiu 
em 2014 em uma comunhão dos alu-
nos, jovens e adolescentes, e do profes-
sor de uma oficina de teatro, Paulinho 
do Boi, ministrada em uma Organiza-
ção não Governamental (ONG) na pe-
riferia da cidade de Sete Lagoas-MG. 
Paulo Henrique de Souza (o Paulinho 
do Boi) é artista e diretor artístico do 
grupo. Ele comenta que os trabalhos 
de formação foram iniciados em praças 
da cidade e, logo em seguida, ocupa-
ram o quintal da sua residência, criando 
o primeiro espetáculo de repertório “O 
Auto do Boi da Manta – De Repente o 
Milagre da Ressurreição”. 
 Com a chegada da Covid-19, 
tudo ficou mais difícil e o Paulinho 
do Boi nos relata como foi a reação 
do grupo aos acontecimentos. “No 
primeiro momento, a pandemia nos 
deixou pouco apreensivos. Tínhamos 
esperança de que tudo voltasse ao 
normal após a primeira parada de 14 
dias (lockdown). Até então, não co-
nhecíamos as vítimas, e as imagens 
mais fortes estavam na Itália. Está-
vamos criando a expectativa de nos 
apresentar em Portugal nos próximos 
anos, mas essa foi a nossa primeira 
frustração”. 
 Para o diretor, por falta de 
manejo social e político, a cidade onde 
mora resolveu abrir tudo e voltar ao 
normal. Estarrecidos com a situação 
reportada em Manaus, São Paulo e 
Rio de Janeiro, em agosto de 2020, 
começaram a esbarrar com uma rea-
lidade mais próxima. Amigos de gru-
pos teatrais desses locais começaram 
a mandar mensagens com fotos e ví-
deos de parentes e colegas falecidos. 
 “Após uma tentativa de fun-
cionar normalmente, perto das elei-
ções, a pandemia tomou proporções 
maiores no estado e chegou até a 
gente. Toda nossa agenda, inclusive 
do espetáculo natalino que apresen-
tamos em Barueri-SP, em 2019, já tinha 
sido cancelada por completo e, junto 
16
a esse desespero, aprofundaram-se as 
dificuldades financeiras. O que estava 
longe chegou perto demais da gente 
e as mães de duas atrizes do grupo ti-
veram Covid-19. Uma delas chegou a 
ser entubada, mas se recuperou. Mo-
mento difícil demais para nosso elen-
co. Nos vemos impotentes diante da 
situação”, desabafa o diretor. 
 Através da Associação Cul-
tural Boi da Manta, mantenedora do 
grupo, eles conseguiram participar do 
edital da Lei Aldir Blanc em Sete La-
goas. “Foi pouco, mas conseguimos, 
no ano passado, colocar as contas bá-
sicas em dia. Entramos também em 
um edital da Câmara Municipal, o que 
nos possibilitou uma ajuda nas con-
tas pessoais do elenco. Nossa cidade 
não absorve políticas culturais para a 
promoção do setor, a lei de incentivo 
à cultura nunca saiu do papel duran-
te 26 anos de existência. Estamos so-
frendo com o desmanche em plena 
pandemia”, pontua Paulinho.
 Ainda se adaptando a todos 
esses acontecimentos, uma das coi-
sas que eles mais sentem falta é o 
calor humano de uma plateia, pres-
tigiando os espetáculos do grupo, 
já que eles trabalham com o teatro 
popular na rua. “Sem plateia tudo se 
agrava, já que afeta também a ques-
tão financeira. Estamos reunidos em 
coletivos de artistas para exigir do 
poder público o direito constituído 
ao povo de acesso pleno às expres-
sões culturais, bem como da manu-
tenção dos mesmos. Estamos sem 
cachês, para se ter uma ideia nossas 
despesas eram cobertas com venda 
de ingressos, pastel e souvenir dos 
espetáculos. Tudo que surge como 
alternativa a gente experimenta 
criando vídeos. Nossa direção agora 
tem que se preocupar com o posi-
cionamento de câmeras e com o 
distanciamento”, explica o diretor.
 “Criamos vídeos e adap-
tamos filmagens de espetáculos 
para compor os editais do gover-
no. Partimos para as redes sociais 
e experimentamos a concorrência 
dos algoritmos. Estamos, ainda em 
franca formatação de possibilidades, 
na tentativa de driblar a situação. O 
grande plano do momento é poder 
chegar com vida até 2022”, conclui o 
Paulinho do Boi.
Adaptação: alternativas para se 
manter ativo na pandemia
 O Museu da Vida é um espa-
ço de integração entre ciência, cultura 
e sociedade. Inaugurado em 25 de 
maio de 1999, ele está localizado em 
Manguinhos, na Zona Norte do Rio de 
Janeiro, dentro do campus da Funda-
ção Oswaldo Cruz (Fiocruz) — uma das 
maiores instituições de ciência e saúde 
da América Latina — e tem a missão de 
promover a participação da população 
nas questões ligadas a esses temas. Ele 
está vinculado à Casa de Oswaldo Cruz, 
um instituto dedicado à preservação da 
memória da Fiocruz e às atividades de 
pesquisa, ensino, documentação e di-
vulgação da história da saúde pública 
e das ciências biomédicas no Brasil.
 Héliton Barros, biólogo e co-
ordenador do Serviço de Educação do 
museu, nos conta como eles se adap-
taram a essa crise sanitária. “Estamos 
100% no formato virtual por meio do 
site e principalmente através das redes 
sociais. O sucesso do nosso trabalho é 
basicamente medido pela capacidade 
de aglomerar pessoas, seja nos espa-
ços do campus da Fiocruz, em Man-
guinhos, nas exposições itinerantes 
que viajam todo o país ou por meio do 
museu itinerante Ciência Móvel - Arte 
e Ciência sobre Rodas, que percorre a 
região Sudeste do Brasil. Desde o fe-
chamento ao público, em março de 
2020, aguardamos ansiosamente o 
momento do retorno, já temos todos 
os procedimentos planejados, mas só 
vamos reabrir quando tiver certeza de 
que é realmente seguro, para o público 
e para a nossa equipe”.
 O biólogo explica que “passa-
do o primeiro impacto do fechamento 
total do Museu da Vida, percebemos 
que era preciso nos manter conectados 
de alguma maneira com o nosso pú-
Atividade interativa desenvolvida no Museu da Vida. Foto: Renata Fontanetto.
blico. Ainda não tínhamos a dimensão 
do que estava por vir, mas começamos 
a nos organizar para trabalhar remota-
mente e continuar fazendo o que sabe-
mos fazer de melhor, que é a divulga-
ção e a popularização da ciência. Aos 
poucos fomos ajustando as equipes e 
replanejando nossas atividades”.
 Segundo Hélito, o Museu da 
Vida já tinha uma presença ativa nos 
meios digitais. E isso facilitou um pou-
co, porém, não se tratava de simples-
mente intensificar essa presença virtual. 
Boa parte da equipe se dedicava às ati-
vidades presenciais com o público, mas 
com o tempo eles foram potencializan-
do o que já era feito e criando novas 
atividades que contam com grande 
engajamento.
 “Hoje, as redes sociais da 
Fiocruz estão ainda mais conectadas. 
Como o Museu da Vida é o braço de 
divulgação científica da Fundação, esta-
mos sempre reverberando tudo o que 
há de mais importante acontecendo na 
instituição. Também estamos promo-
vendo a campanha ‘Se liga no Corona’, 
feita com a participação de coletivos e 
comunicadores de favelas e periferias, 
entre outras, com articulação do Museu 
da Vida”, pontua o coordenador.
 O biólogo ainda comenta 
que o museu não fazia muitas lives em 
canais oficiais (Instagram e YouTube), 
porém, além de se tornarem mais fre-
quentes, eles também apostaram na 
produção de vídeos. “Acho que as lives, 
que foram realizadas com diferentes 
temáticas, talvez tenham sido o grande 
diferencial, principalmente nos primei-
ros meses da pandemia. Mas eu gosta-
ria de destacar a série de vídeosintitu-
lada ‘Experimentando com o Museu da 
Vida’, que teve bastante engajamento. 
Em breve teremos muitas novidades, 
como a Websérie ‘Invasores’ que será 
17
divulgada por meio do nosso YouTube”.
 Para o coordenador, a essência 
do museu é estar próximo das pessoas. 
Ver o estabelecimento e as atividades 
fora dele cheias é sempre um motivo 
de orgulho para os colaboradores. No 
entanto, alguns projetos que foram de-
senvolvidos somente para os ambien-
tes virtuais vão sim continuar. Pois, eles 
aproximaram o museu a um público 
que não têm a oportunidade de estar 
presencialmente no Rio de Janeiro, ou 
mesmo recebendo algumas das ativi-
dades itinerantes.
 “O Museu da Vida Fiocruz se-
gue o seu plano de expansão. Mesmo 
na pandemia, nós continuamos traba-
lhando no planejamento das novas áre-
as de visitação que já estavam previstas. 
Estamos articulando também, com a 
participação de outros museus, a cria-
ção de uma agenda para comemorar 
o bicentenário da Independência do 
Brasil, em 2022. Portanto, em breve te-
remos muitas novidades para os nossos 
visitantes”, conclui Hélito. 
Aprendendo a se reinventar
 O grupo Detonautas Roque 
Clube, formado por Tico Santa Cruz 
(músico e vocalista), Fábio Brasil (bate-
ria), André Macca (baixo), Phil (guitarra 
e vocais) e Renato Rocha (guitarra, vio-
lões, teclados e vocais), surgiu em 1997. 
É a primeira banda do mundo constitu-
ída pela internet que conseguiu chegar 
a uma grande gravadora e se desenvol-
ver em uma carreira do meio streaming. 
 Luís Guilherme Brunetta, o Tico 
Santa Cruz, nos relata como foi a rea-
ção do grupo à chegada da Covid-19. 
“Num primeiro momento, ficamos na 
expectativa para saber qual seria a di-
mensão da pandemia. Em março do 
ano passado, eu falei para eles que 
não voltaríamos em 2020 e que talvez 
a gente pudesse começar a pensar em 
voltar em março de 2021. Naquele pe-
ríodo, eu comecei a compor e escrever 
muito, e nos concentramos em traba-
lhar em um disco de músicas inéditas 
que acabou sendo produzido no perí-
odo de abril até julho. E, depois disso, 
em agosto, surgiu a música ‘Carta ao 
Futuro’, que acabou ditando a nova fase 
do grupo, com as composições ‘Miche-
que’, ‘Kit Gay’, ‘Político de Estimação’, 
‘Mala Cheia’ e ‘Racismo é Burrice’ [com 
Gabriel O Pensador]. Apesar de tudo 
que estamos enfrentando, em termos 
de produção, a banda avançou bastan-
te em 2020, e está avançando bastante 
em 2021. Até nas formas de produção 
e na criação de novos métodos de tra-
balho, por conta do distanciamento”. O 
último lançamento da banda, antes do 
fechamento da edição, aconteceu em 
21 de maio, com “Roqueiro Reaça”.
 Para Tico, o Detonautas en-
tende que o setor deles será o último 
a voltar. Pois, eles precisam esperar 
que pelo menos 70% da população 
seja vacinada, para conseguir pensar 
em como eles podem voltar a traba-
lhar. “É muito triste, é muito angus-
tiante, mas a gente entende que nesse 
momento de pandemia é impossível 
aglomerar as pessoas, o risco é muito 
grande para todos nós, tanto para os 
trabalhadores quanto para os fãs. É 
uma pausa muito grande e sabemos 
que isso traz prejuízos irremediáveis e 
imensuráveis na vida das pessoas, dos 
trabalhadores, das nossas equipes, de 
todos esses setores. Então, é muito di-
fícil lidar com isso, ainda mais saben-
do que o governo não tem nenhuma 
política pública eficiente para atuar na 
nossa área, que possa resguardar to-
dos os profissionais”.
Segundo o músico, os técnicos e ou-
tros profissionais da banda consegui-
ram receber uma verba, durante alguns 
meses, através de um fundo criado 
pela Live Nation (maior produtora de 
eventos do mundo). E, individualmente, 
alguns deles conseguiram uma repara-
ção através da Lei Aldir Blanc.
 “O grupo entendeu que preci-
sávamos buscar outras alternativas, mas 
todas dentro do universo que a gente 
vive. Então, eu mesmo, por minha con-
ta, fiz algumas lives para fazer doações 
para a Central Única das Favelas (CUFA), 
para o AfroReggae, para uma série de 
ONGs e também para nossa equipe. 
Depois, eu comecei a entender que pre-
cisava fazer alguns movimentos, cada 
membro do grupo fez o seu. O Fábio, 
por exemplo, tem o estúdio; o Renato 
também tem um e eles trabalham com 
trilhas, com outras coisas relacionadas à 
música no âmbito do entretenimento; 
já o Phil montou um restaurante. Enfim, 
cada um deu uma alternativa para sua 
profissão, para sua atividade, porque 
como não estamos trabalhando com o 
que a gente, efetivamente se sustenta, 
tivemos que rever todo o nosso crono-
grama”, explica o vocalista.
 Tico Santa Cruz pontua que 
todos os brasileiros, todas as pessoas 
do mundo e eles também sofreram 
com o impacto da pandemia na vida 
pessoal e profissional, porém o Deto-
nautas conseguiu se adaptar de forma 
rápida. “Através do grupo de WhatsA-
pp a gente mandava as ideias, os ar-
ranjos e cada um gravava da sua casa, 
mandando de volta o projeto pronto. 
Eu gravava voz, a galera mandava para 
um estúdio de mixagem e masteriza-
ção, depois seguia com os clipes, junto 
com as produtoras, fazendo esse tra-
balho de produção para poder conse-
guir adaptar a essa nova realidade”.
“Aprendemos a reinventar a banda, a 
reinventar a nossa forma de produzir, a 
nossa forma de criar. Estamos passando 
por um momento que não sabemos 
até quando vai durar. Então, a gente 
aprendeu a ter paciência, a controlar a 
ansiedade, a se juntar, a se unir cada 
vez mais e a repensar certas questões 
que são importantes para conseguir se 
reestruturar num momento de crise” 
acrescenta o músico.
 Para concluir, o vocalista des-
taca que o plano da banda é voltar a 
tocar e fazer shows. “Temos um disco 
inédito para lançar esse ano e ainda 
temos mais quatro músicas desse dis-
co que estamos lançando desde 2020. 
Ainda temos muita coisa e quando vol-
tar ou sair da pandemia, bom, a gente 
tem grandes projetos para apresentar, 
junto com a Sony Music, a nossa gra-
vadora. Então, fiquem atentos que, em 
breve, a gente tem novidades”.
“Dentro do nosso trabalho, em termos de lançamentos e produção, a gente avançou bastante e o Detonau-
tas, com certeza, sai muito maior da pandemia do que ele entrou”, Tico Santa Cruz. Foto: Bruno Kaiuca
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19
“A pandemia do novo coronavírus 
certamente visibilizou e deixou à 
mostra o quanto as mulheres es-
tão em uma situação de fragilidade 
e, ao mesmo tempo, de sobrecarga de 
trabalho, que tem a ver com questões 
de gênero, raça, e também com seu 
direito de uso da cidade, sua posição 
geográfica, sua posição no coletivo 
onde mora: se ocupa um espaço de 
poder, mesmo que seja em um coleti-
vo periférico, como uma comunidade 
rural, um grupo de mulheres, se está ou 
não em uma rede de interação social. A 
pandemia explicitou o quanto é impor-
tante o trabalho dos cuidados.”
 A reflexão é de Vivian Delfino, 
que mora em São Paulo, é doutoranda 
em Ciências Sociais pela Universidade 
Estadual de Campinas-SP (Unicamp) e 
docente no Instituto Federal de Educa-
ção, Ciência e Tecnologia de São Paulo 
(IFSP), em São Roque-SP. Segundo ela, 
o cuidar, que, no caso das mães, não 
é visto como um trabalho, mas como 
uma obrigação, é economicamente 
fundamental para a manutenção da 
sociedade. E, quando a mulher que fica 
em casa por causa da Covid-19 é uma 
mãe solo, passa a ter sobrecarga ainda 
maior: além de casa e emprego, os fi-
lhos demandam atenção intensa.
 O termo “mãe solo” é usado 
para designar mulheres inteiramente 
responsáveis pela criação dos filhos. 
Com ele, o conceito de “mãe solteira” 
caiu em desuso, já que estar ou não em 
um relacionamento não quer dizer, ne-
cessariamente, compartilhar a missão 
de cuidar.
 Quatro histórias. Quatro mães 
MATERNIDADE
Mães solo 
JÚLIA PAIVA
Mulheres que cuidam 
sozinhas dosfilhos relat-
am trabalho e apreensão 
aumentados durante 
a pandemia de Covid-19.
solo contaram à reportagem suas vi-
vências durante a pandemia. Medos, 
receios, ansiedade, angústia… são te-
mas comuns a elas. E a expectativa é 
que a Covid-19 dê uma trégua, para 
que possam respirar. Nem que seja um 
pouco.
O começo
 Franca-SP está ensolarada. 
Enquanto me preparo para conver-
sar com Daniele Lima, que mora em 
Iguatu-CE, arrumo a casa. Sinto o suor 
pingando. Duas horas da tarde e está 
muito calor. Não sou mãe e a rotina já 
é dura. Me imagino no lugar dela, que 
coloca o filho para brincar antes de falar 
comigo.
 “Chamada de vídeo? Não 
posso responder em áudio? É melhor 
pra mim. Meu filho é 24 horas no meu 
pé”, pede Daniele. Digo que sim, ao 
perceber, também, que ela é tímida. Ao 
ficar confortável, poderia me contar so-
bre a vida dela de forma mais aberta.
 Daniele tem 28 anos e um 
dia a dia que não é nada remoto. Pas-
sa o tempo inteiro em casa com José 
Kauan, de 5 anos, brincando, ajudando 
nas atividades escolares e cuidando da 
casa. “Sou uma pessoa extremamente 
nervosa. Então, evito sair de casa, prin-
cipalmente com ele. Só se for algo ur-
gente. As pessoas da minha cidade não 
têm respeito.”
 Era março do ano passado 
quando começaram os alertas sobre 
o novo coronavírus. O que parecia ser 
apenas um resfriado encheu ainda 
Kétani com os filhos, Valentina e Benício. (Foto: Arquivo Pessoal)
mais os hospitais, que já eram lotados. 
Não havia leito para todo mundo. Co-
mércios foram fechados, trabalhadores 
dispensados. As escolas pararam. As 
recomendações eram evitar aglomera-
ções e usar máscara e álcool em gel.
 “Entrei em pânico”, lembra Da-
niele. A maior preocupação era com o 
pequeno José Kauan, que tem autismo. 
Tem a imunidade baixa. Já teve pneu-
monia e come muito pouco de comida 
saudável. “Até hoje estou assustada. 
Cheguei a fazer terapia, porque real-
mente me encontrei com medo. Foi e 
ainda é bastante complicado.”
Tudo no seu tempo, meu filho
 O menino, que estuda em es-
cola particular, passou a receber as ati-
vidades em casa. Mas, segundo Danie-
le, é preciso seguir o tempo dele para 
cumpri-las. “Tiro o tempo em que ele 
está apto. Quando está com vontade 
de fazer a tarefinha, faz direitinho. Ago-
ra, se estiver irritado, já fica complicado 
de ensinar, porque, geralmente, quan-
do erra alguma coisa, fica agitado, quer 
rabiscar a tarefa toda. Sempre procuro 
o horário em que ele está mais calmo. 
Não importa se é manhã, tarde ou noi-
te.”
Para cuidar do filho, Daniele até recebe 
a ajuda da mãe dela, mas só quando 
ele está a fim de ficar com outra pes-
soa. Enquanto ela limpa a casa, a avó 
de José Kauan fica com o neto. Mas, 
quando ele só quer a mãe, não tem 
jeito: Daniele precisa estar disposta a 
tudo. A psicóloga Rafaela Cortez, de 
20
Ribeirão Preto-SP, diz que, nesses ca-
sos, uma rede de apoio é fundamental. 
“Geralmente, essa rede é a família. Todo 
esse conjunto e esse contexto acabam 
contribuindo.”
 Entretanto, a psicóloga destaca 
que as mães devem estar abertas a essa 
ajuda. “Existe muito na cabeça da mãe 
que ela precisa tomar conta de tudo, 
mas está tudo bem se não conseguir. É 
muita coisa, muito pesado. E não é só 
ter à disposição essa rede. Temos um 
ponto importante aqui: saber até onde 
consigo ir e até onde não consigo, reco-
nhecendo que preciso de auxílio.”
 Enquanto conversamos, é pos-
sível ouvir a voz de José Kauan ao fun-
do, cantando. Sinto que, em algum mo-
mento, vai chamar pela mãe. E chama. 
Daniele o atende, encerrando o áudio.
Tudo vai passar
 Apesar de morar com a mãe, a 
irmã, um sobrinho de 13 anos e o filho, 
Daniele se sente sozinha. Ainda mais 
sendo a maior responsável por José 
Kauan. Nos primeiros segundos de 
um de seus áudios, de três minutos, a 
voz dela está embargada. Ela para pra 
respirar e volta a falar. “Sim… ele é uma 
criança que é indecisa, às vezes quer fa-
zer tudo ao mesmo tempo. Quer coisas 
que não pode. Tem dias que estou can-
sada, mas não fisicamente, psicologica-
mente.”
 Os momentos em que o filho 
vê objetos na internet e deseja tê-los 
estão entre os mais difíceis. Explicar que 
não tem condições de dar ou que, ali 
onde moram, não tem o que o filho de-
seja, a deixa exausta. A situação piora 
porque ele não entende o “não”.
 Daniele segue o que a psicólo-
ga do filho, Nathalia, orientou para essas 
situações: substituir o “não” por outras pa-
lavras. “É o que exige muita paciência. Tem 
que sentar, explicar, acalmar. E você tem 
que ser uma pessoa bem trabalhada.”
 Todo dia é de cansaço. Difícil 
lidar com tudo à volta. A preocupação 
de adoecer, do filho ou de qualquer ou-
tra pessoa dentro de casa recai, sobre 
ela. “Faço sempre o possível pra ele ficar 
dentro de casa, longe de poeira. Tem 
dias que deito e estou exausta. Tenho 
crises de ansiedade, gastrite nervosa. Fiz 
um tempo de terapia online para ajudar 
a trabalhar isso tudo.”
 O filósofo sul-coreano Byung-
Chul Han, no livro “Sociedade do can-
saço”, afirma que a busca implacável 
pelo “seu melhor”, “dando tudo de si”, 
leva ao adoecimento psicológico. Han 
argumenta que são comuns, em nossa 
sociedade, a depressão e a Síndrome 
de Burnout, uma condição que afeta 
as pessoas que se submetem ao can-
saço constante.
 Nesse caso, os sintomas recor-
rentes são a insônia (ou excesso de sono 
sem descanso) e o estresse contínuo, 
que também aparecem na depressão e 
na síndrome do pânico. Desse modo, o 
indivíduo não possui mais amarras que 
o prendem fisicamente, mas um siste-
ma em que ele perde a liberdade sem 
que perceba.
 Para a psicóloga Rafaela, a 
saúde mental dessas mães é um caos, 
pois tudo é responsabilidade delas. “O 
lado que vejo que foi mais prejudicado 
foi a autoestima. Elas priorizam tudo e 
acabam se deixando por último. E, nas 
24 horas, muitas vezes não dá tempo 
de chegar nesse último. O que tem 
acontecido é essas mães, por exemplo, 
começarem a ver que não estão dando 
conta dessas crianças”.
Ainda conforme a psicóloga, “elas se 
olham no espelho e não se sentem 
mais poderosas, donas de si mesmas, 
suficientes, capazes. E isso tudo acaba 
prejudicando.”
Entre chuva e relâmpagos
São quase dez horas da noite quando 
começa a chover em Franca. A internet 
da minha casa começa a oscilar. Fico 
apreensiva. O bairro onde moro, o City 
Petrópolis, na zona norte, não pode 
ver uma chuva que a energia cai. Ape-
sar de morarmos na mesma cidade, a 
entrevista será feita remotamente, por 
preocupação com saúde das duas e de 
todos ao nosso redor, e devido ao fato 
de Kétani Amaral trabalhar e estudar.
 Kétani me manda o link de 
uma sala no Google Meet para que 
possamos conversar. Ela está no quar-
to dela. O filho, em pé ao lado, desvia o 
olhar do celular que segura para a câ-
mera do computador. “Benício, vai ver 
no seu quarto”, pede a mãe. O garoti-
nho atende e sai.
 Kétani tem 25 anos, trabalha 
numa grande rede de lojas e estuda 
Direito. Tem dois filhos: Valentina, de 9 
anos, e Benício, de 5. No começo da 
pandemia, trabalhava em outra empresa 
e conta que foi complicado. Morava no 
centro da cidade com os filhos e preci-
sava deixá-los na casa da mãe e do pa-
drasto. Depois de ficar desempregada, 
tinha dificuldade para conciliar o trabalho 
doméstico, a faculdade, pela qual passou 
a ter aulas online, e o cuidado com os fi-
lhos. Ainda mais morando sozinha com 
eles. “Não tínhamos nenhuma rotina. 
Eles em casa só queriam ficar assistindo 
televisão, deitados. Não queriam brincar 
e, muito menos, fazer as atividades da 
escola. Tento fazer uma coisa diferente, 
incentivar, mas é muito difícil mesmo”. 
Com o aumento no número de casos 
de Covid-19, a mãe e o padrasto foram 
morar com ela. Um alívio.
 Para a professora Vivian Del-
fino, a rede de apoio familiar deve ser, 
também, uma rede de afeto. “Geral-
mente, as mães solo contam com um 
elemento-chave, que é a avó materna 
das crianças. Muitas vezes parceira, 
apoia a criação dos netos de forma afe-
tuosa e não joga na cara que é

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