Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
110 Capítulo 7 Competência Tributária A relação obrigacional tributária é uma relação de crédito e débito em relação a tributos, tendo, por conseguinte, dois lados: o credor (sujeito ativo) e o devedor (sujeito passivo). Como já visto, o Direito Tributário disciplina as relações entre o sujeito ativo (ente público) e o sujeito passivo (contribuinte ou responsável) nas relações com tributos. Competência tributária, como já dito, é o poder que o Estado tem de cobrar tributos, de tri- butar, conferido pela CRFB/88; isto se dá por razões até muito óbvias, uma vez que, se a compe- tência para cobrar um determinado tributo ficasse à mercê de entendimento pelos entes, proble- mas haveria eternamente. Nesta hipótese, ficamos com o ensinamento do professor Geraldo Ataliba, segundo o qual: Se aos próprios interessados ficasse a tarefa de acertarem entre si tal discriminação de campos de competência, os conflitos seriam infindáveis, o acordo jamais se realizará e a insa- tisfação, concomitante e posterior ao processo, perturbaria a harmonia entre eles.1 O art. 146 de nossa Constituição determina a obrigatoriedade de lei complementar para, em especial, estabelecer normas gerais de Direito Tributário (inciso III); o art. 150, I, obriga à cobran- ça ou aumento de tributo por lei (complementar ou ordinária). Daí, concluímos que este tipo de competência somente poderá ser dado aos entes públicos, uma vez que somente os mesmos pos- suem Poder Legislativo. Parte da doutrina entende que há três etapas para a prática dessas competências, vejamos. 1. A CRFB/88 atribui a competência de cada ente público (U, E, DF e M); 2. Lei Complementar (nacional), por exemplo, estabelecerá as normas gerais para se tribu- tar – o CTN foi recepcionado como lei complementar e estabelece tais normas gerais; 3. Uma lei ordinária (federal, estadual ou municipal) regrará a cobrança de um determina- do tributo, observando a CRFB e o CTN, como, por exemplo, a lei ordinária federal, que cobra o IR, a lei ordinária estadual, que cobra o IPVA e a lei ordinária municipal, que cobra o IPTU. Importante ressaltar que o nosso Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25.10.66) é, originariamente, uma lei ordinária, que possui duas partes: Livro 1º – trata do Sistema Tributário Nacional (arts. 1º ao 95); e Livro 2º – trata das Normas Gerais de Dir. Tributário (arts. 96 ao 218). 1 ATALIBA, Geraldo. Sistema constitucional tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1968, p. 108. 111 Acontece que à época, em nosso ordenamento jurídico, a norma “lei complementar” não existia, estando, imediatamente abaixo à Constituição a lei ordinária. A Emenda Constitucional nº 01/67, além de criar a lei complementar, implantando-a em nosso ordenamento, determinou que normas gerais do Direito Tributário somente poderiam ser estabelecidas por lei complementar. Contudo, para que o CTN não fosse considerado inconstitucional em seu livro 2º (uma vez que é lei ordinária estabelecendo normas gerais tributárias), a própria Emenda recepcionou o CTN como lei complementar, dando a seu conteúdo status de lei complementar, assim como fez nossa atual Carta Política. Portanto, hoje, qualquer alteração textual no CTN somente poderá ser feita através de lei complementar, como ocorreu, por exemplo, na inclusão do inciso XI, do art. 156, pela Lei Complementar nº 104/01 e na alteração do artigo 133 com a LC 118/05. Outro ponto relevante é que a Lei nº 5.172, criada em 1966, como lei ordinária, ganhou con- teúdo de Lei Complementar em 1967, mas, na verdade, somente adquiriu denominação de Código Tributário Nacional por meio do Ato Complementar nº 36/67. Em relação à competência tributária, o CTN através dos artigos 6º, 7º e 8º disciplina a maté- ria, os quais passamos a estudar agora. Art. 6º. A atribuição constitucional de competência tributária compreende a com- petência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta lei. Parágrafo único. Os tributos cuja receita seja distribuída, no todo ou em parte, a - outras pessoas jurídicas de direito público pertencem à competência legislativa daquela a que tenham sido atribuídos. Em relação a este artigo, podemos concluir que: 1. Apesar da atribuição de competência legislativa plena aos entes públicos (cada ente poderá tributar da forma que bem entender o que for de sua competência), eles deverão observar os limites constitucionais à competência tributária (que estudaremos mais adiante) e outras normas limitadoras infraconstitucionais; 2. Mesmo com essa legislação plena, há situações em que a União irá regular a cobrança de tributos estaduais e municipais, como, por exemplo, a fixação de alíquotas do ITD, ICMS e ISS, nos termos dos art. 155, § 1º, IV, 155, § 2º, IV e V, e art. 156, § 3º, da Carta Magna; 3. Há determinados tributos, federais e estaduais, que a Constituição Federal determina que suas respectivas arrecadações sejam repartidas com os demais entes. A União, por exemplo, apesar de estar obrigada a repassar 10% do IPI para os Estados, é ela quem tem a competência para legislar sobre este imposto, mais ninguém. É o que prevê o parágra- fo único do art. 6º do CTN. O princípio da indelegabilidade da competência tributária é previsto pelo art. 7º do CTN, no qual: 112 Art. 7º. A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões adminis- trativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do § 3º do art. 18 da Constituição. Por este dispositivo, concluímos que: 1. Se a Carta designou competência tributária a um determinado ente público, este não poderá delegá-la a um outro ente. Vale ressaltar que competência tributária engloba a legislação, a fiscalização e a arrecadação de determinado tributo, portanto: Legislar COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA Fiscalizar Arrecadar 2. Contudo, a indelegabilidade diz respeito apenas a legislar. Fiscalizar e arrecadar são fun- ções que podem ser delegadas a outras pessoas de direito público. 3. Quando houver delegação da cobrança de um tributo a outra pessoa pública, as garan- tias e privilégios do mesmo continuarão, ou seja, mesmo que um tributo federal esteja sendo cobrado e arrecadado por um Estado, não significa dizer que o referido tributo passou a ser estadual, mas continua federal. 4. A delegação poderá ser revogada, pelo ente outorgante, a qualquer tempo. 5. O cometimento, que é a delegação de arrecadar determinado tributo conferida a uma pessoa jurídica de direito privado, não é considerado delegação, sendo, portanto, inócuo o disposto no § 3º deste artigo. Neste sentido, transcrevemos o ensinamento de Zelmo Denari, de que: “Não faz nenhum sentido a ressalva explicitada no § 3º do art. 7º, pois se o ente investido de competência tributária comete a entidades privadas o encargo arre- cadatório – como sucede na arrecadação de tributos através da rede bancária – não esta- rá delegando competência, mas encargos tributários”.2 Neste caminho, o STJ decidiu: REsp 28.675/PR Rel. Min. Humberto Gomes de Barros T1 – PRIMEIRA TURMA Data de julgamento: 29/09/1993 Data de publicação: 18/10/1993 PROCESSUAL – ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – AUTORIDADE – GERENTE DE BANCO COMERCIAL – ARRECADAÇÃO DE TRIBUTOS. A ARRECADAÇÃO DE TRIBUTOS NÃO TRANSFORMA O GERENTE DE BANCO COMERCIAL EM AUTORIDADE PÚBLICA, NEM O EXPÕE A MANDADO DE SEGU- RANÇA (LEI 1.533/51, ART. 1., PAR-1. E CTN, ART. 7., PAR-3.). (Grifo nosso) 2 DENARI, op. cit., p. 42. 113 Já o art. 8ºveda a possibilidade de um ente público tributar algo que era de competência de outro ente, mas que não fora exercido. Vejamos. Art. 8º. O não-exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído. Portanto, o fato de um município não instituir o IPTU, não autoriza à União, que instituiu o ITR naquele município (na zona rural), cobrá-lo; ou ainda, no caso de repartição da receita, como, por exemplo, o IPVA (que é de competência estadual com repasse aos municípios em 50% da arre- cadação), caso o Estado não o institua, seus municípios nada poderão fazer além de se lamentarem. Contudo, apesar de nossa Constituição não obrigar à instituição de todos os tributos previstos pela mesma, devemos observar o disposto na Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) no qual seu art. 11 e respectivo parágrafo único fazem previsão de san- ções para o ente que não dispor de toda a tributação permitida, como, por exemplo, não poder receber verbas voluntárias de outros entes públicos. 6.1. Classificação Somente os entes públicos possuem competência tributária, dentro das limitações impostas pela CRFB/88 (arts. 153 a 156), onde a doutrina classifica em privativa, comum, exclusiva, residual e extraordinária. Então, vejamos. • Competência privativa – prevista nos arts. 153, 155 e 156, pois compete, privativa- mente, à União cobrar o IR, II, IE, IPI, IOF, ITR e IGF; aos estados e ao Distrito Federal cobrarem o ICMS, IPVA e o ITD; e aos Municípios, o IPTU, ISS e o ITBI. Percebe-se que este tipo de competência diz respeito apenas a impostos. • Competência residual – prevista no art. 154, I, é o poder que a União tem de criar novos impostos e/ou contribuições, desde que estes novos impostos não tenham o mesmo fato gerador ou base de cálculo de algum imposto já existente e que sejam não- cumulativos.3 A nomeclatura “residual” vem do fato de a União ter um resíduo, uma sobra, um saldo de poder para, além dos impostos previstos no art. 153, criar outros impostos. O uso da competência residual necessariamente deverá ser feito por meio de lei complementar. • Competência comum – prevista no art. 145, II e III, no qual compete, de forma comum, a todos os entes públicos (U, E, DF e M) cobrarem taxas e contribuições de melhoria. • Competência exclusiva – prevista nos arts. 148 e 149, confere exclusivamente à União o poder para tributar os empréstimos compulsórios e as contribuições parafiscais. Contudo, vale lembrar que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem cobrar contribuições sociais (tipo de contribuição parafiscal) de seus servidores e em prol da seguridade deles, exclusivamente. • Competência extraordinária – prevista no art. 154, II, é a competência dada à União para instituir, extraordinariamente em caso de guerra externa ou sua iminência, um imposto para custear tais despesas – o IEG (Imposto Extraordinário de Guerra). 3 Vide Princípio da não-cumulatividade, no título “Limitações Constitucionais à Competência Tributária”. 114 • Competência cumulativa – prevista no art. 147, é aquela conferida à União para insti- tuir cumulativamente os impostos federais, estaduais e municipais no Território Federal (hoje, não existente no Brasil) e, ao Distrito Federal, os impostos estaduais e municipais. Isto se dá pelo fato de o Território Federal não possuir personalidade jurídica própria; contudo, vale ressaltar que o território federal pode ser dividido em municípios e, neste caso, cada municipalidade cobrará seus próprios tributos, ficando a cargo da União - cobrar apenas tributos federais e estaduais. Já o Distrito Federal, por não ser dividido em municípios, cobrará os tributos estaduais e, cumulativamente, os municipais. 183 Capítulo 21 Capacidade Tributária Passiva O art. 126 do CTN regula a capacidade fiscal passiva, ou seja, quem poderá praticar um fato gerador com validade jurídico-tributária. Art. 126. A capacidade tributária passiva independe: I – da capacidade civil das pessoas naturais; II – de achar-se a pessoa natural sujeita a medidas que importem privação ou limi- tação do exercício das atividades civis, comerciais ou profissionais, ou da administração direta de seus bens ou negócios; III – de estar a pessoa jurídica regularmente constituída, bastando que configure uma unidade econômica ou profissional. Resumindo: CAPACIDADE CIVIL DAS PESSOAS FÍSICAS CAPACIDADE INDEPENDE INTERDIÇÃO DE PLENAMENTE CAPAZES PASSIVA SOCIEDADE DE FATO (IRREGULAR) Baseado neste artigo, concluímos que uma criança de 5 anos de idade, ao herdar uma herança pelo falecimento dos pais e, ao praticar um fato gerador (como a renda obtida pelo aluguel dos imóveis deixados), este será válido, devendo, contudo, ser o tutor o responsável solidário (art. 134) pela declaração e pelo pagamento. Outra situação é quando um interditado (Interdição Civil) de praticar atos de alienação de bens, venha a alienar uma casa. Este ato civil será nulo, contudo o fato gerador do ITBI (devido pela venda de imóvel) terá validade, pois o fato de o alienante estar interditado para tal ato é irre- levante para o direito tributário; daí, deve-se pagar o ITBI. Exemplo do inciso III é quando o leitor, juntamente com um amigo, resolve abrir uma empresa sem fazer a devida regularização, mas que pratica vários fatos geradores de ICMS (venda de mercadorias, p. ex.); estes fatos são válidos e, por conseguinte, deve-se pagar o imposto corres- pondente. Portanto, todos podem ter a capacidade tributária passiva.
Compartilhar