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Ribeiro de Souza (2005)

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TOPICOS ESPECIAIS EM PSICOLOGIA II
MAB ABREU
CAPITULO 1 - TERRA DE NINGUÉM: VIOLÊNCIA E VULNERABLIDADE
REFERÊNCIA: Ribeiro de Souza, M. L. Violência – clínica psicanalítica. Ed. casa do psicólogo, SP, 2005.
Resumo
Um certo medo tem se popularizado entre as sociedades e encontram motivos e consequências muito parecidos onde quer que se esteja: a violência como principal causa da aversão social e um comportamento de isolamento como consequência direta desse medo.
Trancafiadas em casas de muros altos e cercas elétricas ou vivendo em apartamentos em condomínios fechados e cheios de seguranças e câmeras, as pessoas estão cultivando mais a solitude desde o século passado. Esse novo estado – estar sozinho – tem dificultado o desenvolvimento das idiossincrasias coletivas, uma vez que estimula o individualismo e a intolerância com as diferenças. A violência “lá fora” que obriga o cidadão a tomar certas decisões faz com que a escolha de estar em casa não tenha o significado de escolha mas sim de imposição e, muitas vezes, a solitude acaba se confundindo com solidão. Com a perda do espaço social como lugar de troca e de construção coletiva, perde-se também a noção de história, de memória, de lugar simbólico que se transmite pelas diferentes gerações.
E o que fazer quando a violência acaba invadindo as casas? Através de violência doméstica, invasões domiciliares ou até mesmo através da televisão, se vivencia um estado de pânico e horror, que comprova que, por mais que se tente, nenhum lugar está a salvo. O desamparo fica maior por não se saber ao certo quem é o inimigo; o assalto pode vir de qualquer um, a qualquer momento.
Mas a violência não é um fato novo e relatos históricos mostram que a sua manifestação acompanha o processo civilizatório. O que há de específico neste momento histórico é que nunca se matou tanta gente como no século XX; cerca de 187 milhões de pessoas foram mortas ou abandonadas à morte por decisão humana. Eric Hobsbawn (2002) nomeia as três últimas décadas como “Era do Desmoronamento”.
O avanço científico e tecnológico permitiu a apropriação de armamentos cada vez mais sofisticados, tornando a ameaça sempre presente. Aumentaram os ataques ao meio ambiente, a abolição das fronteiras pelos meios de difusão e a globalização das informações tornou guerras distantes em cenário cotidiano. Estetizaram a violência e banalizaram conflitos, apresentando-os como espetáculos ou jogos virtuais.
A violência surge como efeito de sociedades que convivem cruelmente com desigualdades, com cenas cotidianas de humilhação social e com formas perversas de governabilidade. Num mundo onde o medo, o isolamento e a solidão acentuam o desamparo do sujeito e criam condições para o fascínio por qualquer promessa idealizada de plenitude, a experiência analítica, ao colocar em cena o exercício da palavra dirigida a um outro, torna-se um dos microespaços privilegiados nos quais o circuito da violência pode ser interrompido, evitando-se sua cristalização no sofrimento, na mortificação, na alienação ou na compulsividade retaliativa.

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