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21UNIDADE I História e Cultura Africana
5. A RESISTÊNCIA NEGRA
 
A resistência à escravização começava na África onde os capturados frequente-
mente tentavam fugas e revoltas e continuava nos navios negreiros, exemplo disso foi o 
navio La Amistad[12], quem em 1839 transportava clandestinamente pessoas para vender 
em Cuba, mas que foram frustrados por uma rebelião. Eles acabaram chegando ao sul dos 
Estados Unidos, onde a escravidão era legal, mas não o tráfico internacional de escraviza-
dos, o que levou essa situação a um tribunal. Segundo Baquaqua, os navios eram a pior 
parte da experiência, mas também era apenas o começo.
Mohammah Baquaqua relatou que o padeiro que o comprou em Pernambuco tinha 
tentado convertê-lo ao catolicismo à base de ameaças e açoites. Assim como aconteceu 
no caso das culturas e religiosidades indígenas os africanos eram submetidos às leis e 
instituições europeias que agiam em nome da conversão dos pagãos ao cristianismo[13].
Muitas tradições com origens africanas e indígenas se mantiveram e se mantêm 
vivas, além de terem se incorporado ao sincretismo religioso brasileiro. A sobrevivência 
de tradições, línguas e religiões e formas de expressão corporal e artística ao longo dos 
séculos foi o resultado de esforços imensos de muitas gerações para resistir às estratégias 
da elite escravista brasileira.
A imposição violenta também era uma das estratégias dos senhores para obter seu 
domínio sobre os escravizados. Torturas, marcas à ferro, correntes e troncos foram usa-
dos consistentemente no período escravagista. É algo próprio da natureza da escravidão. 
Enquanto no trabalho assalariado trabalha-se para não ficar sem dinheiro, na sociedade 
escravista trabalha-se para não ser torturado ou mesmo assassinado. A violência era a 
base do funcionamento do sistema escravista. A violência não era a única forma de con-
trole do sistema escravocrata, ela convivia com estratégias, negociações e promessas de 
liberdade.
Baquaqua conta que se esforçou ao máximo para mostrar serviço aos seus se-
nhores e também para aprender coisas que tornavam seu trabalho melhor, tipo a língua 
portuguesa. Quando aprendeu a contar até 100 em português, foi encarregado de vender 
pão na vila onde vivia e também nos campos e no mercado local, mas como ele conta no 
seu relato essas melhorias não significavam o fim da violência. Quando ele não conseguia 
vender todos os pães era açoitado no fim do dia.
Negociações entre senhores de escravos também aconteciam nas fazendas, sendo 
que neste caso as melhorias podiam incluir um pedaço de terra e um dia de folga por sema-
na. Alguns até mesmo conseguiam vender uma parte do que plantavam e juntar pequenas 
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economias que podiam ser usadas para comprar alforria para si ou para os filhos. Era muito 
comum que pais e mães passassem a vida dedicados a livrar os filhos da escravidão. Para 
os senhores conceder melhorias e alforriar algumas pessoas era vantajoso, pois diminuía 
as chances de rebeliões.
Ainda em seu relato, Baquaqua conta alguns episódios que cogitou a possibilidade 
de atacar seus agressores, mesmo sabendo que suas chances eram muito pequenas e 
que sofreria as piores consequências possíveis. Além disso, muitos buscavam o suicídio e 
o desespero de saber que os filhos também sofreriam com a escravidão fazia com que as 
grávidas provocassem abortos. Os escravizados também manifestavam sua insatisfação 
prejudicando os lucros do senhor de escravos. Quebravam peças do engenho que demo-
ravam para serem substituídas, incendiavam plantações, escondiam e contrabandeavam 
ouro e diamante dentre outras coisas.
Baquaqua tentou o caminho da lealdade ao seu senhor, mas acabou desiludido. 
Segundo ele, o padeiro não oferecia qualquer retorno a seus esforços por se mostrar 
prestativo e obediente. Sem o reconhecimento de seu senhor, abandonou a estratégia da 
obediência. Ao ser vendido pelo padeiro a um traficante, foi levado para ser comercializado 
no Rio de Janeiro e quase foi comprado por um senhor de escravos também negro. O que 
acontecia no Brasil, não chegava a ter uma relevância tão expressiva quanto o número de 
senhores de escravos brancos, porém, a escravização de negros por outros negros no Bra-
sil era frequente e bem mais comum no nosso país do que em outras regiões escravistas 
do continente.
Negociantes de Portugal e do Brasil controlavam o grande negócio do tráfico ne-
greiro por meio dos domínios de regiões estratégicas. Esse controle garantia baixos custos 
e estabilidade no fornecimento de pessoas escravizadas para as lavouras brasileiras, ao 
contrário dos Estados Unidos, por exemplo. Como era barato e fácil comprar escravos 
recém-chegados não era mal negócio para os senhores alforriar alguns escravizados. 
Desta forma os senhores podiam contar com aliados no controle dos escravos. Além de 
a promessa de alforria de alguns estimulava outros a serem leais em busca de liberdade.
As chances reais de alcançar a alforria eram muito pequenas. No caso baiano, por 
exemplo, apesar da maioria dos escravizados terem vindo da África, 69% dos alforriados 
eram negros nascidos escravos no Brasil. Quanto mais se distanciavam de suas origens, 
mais tinham acesso às brechas do sistema. Os nascidos no Brasil tinham mais chances 
que os nascidos na África, assim como os que falavam bem o português e seguiam a Igreja 
Católica. Os referidos como pardos também tinham mais chances que os referidos como 
pretos, isto é, quanto mais escura era a pele, menores eram as chances de conseguir a 
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carta de alforria. Os escravizados que trabalhavam na Casa Grande tinham mais chances 
de alforria que os trabalhadores nas plantações e apenas da grande maioria das pessoas 
trazidas serem homens, libertavam duas vezes mais mulheres. Isso não representa um me-
lhor trato à mulher negra em relação ao homem negro. Muitas alforrias dadas às mulheres 
e crianças eram na verdade consequência da violência sexual realizada pelos senhores. 
De acordo com as leis escravistas o que definia se uma criança era livre ou escrava era a 
condição da mãe, sendo assim, se a mãe fosse livre, a criança era livre, se fosse escraviza-
da, a criança também era. Desta forma, mesmo os filhos bastardos dos senhores com uma 
escravizada, também nascia escravo.
Os senhores tratavam alguns escravizados melhores que os outros, por ter a pele 
menos escura, por trabalhar na Casa Grande, por ter nascido no Brasil, etc. Essas dife-
renças de tratamento por parte dos senhores criavam hierarquias e rivalidades entre os 
escravizados, sobretudo entre nascidos no Brasil e os nascidos na África e também entre 
os trabalhadores do campo e os que trabalhavam na Casa Grande.
Como já vimos no relato de Baquaqua, o tráfico negreiro separava pessoas que 
tinham origens e culturas em comum exatamente para dificultar a união entre os escravi-
zados e no interior dos engenhos o tratamento desigual também servia para reforçar essa 
desunião, dificultando a resistência. Os escravizados não eram geralmente um grupo uni-
forme e unido, mas sim pessoas muito diferentes entre si, se preocupando com sua própria 
sobrevivência, e apesar de todos os esforços dos senhores, continuaram resistindo, fosse 
através da lealdade conquistando pequenas melhorias no dia-a-dia, fosse pela obtenção 
do documento de alforria, fosse pelo boicote à produção da cana-de-açúcar, fosse pelo 
assassinato do feitor, fosse pela fuga para um quilombo.
24UNIDADE I História e Cultura Africana
6. OS QUILOMBOS COMO SINÔNIMO DE RESISTÊNCIA NEGRA
A palavra quilombo existe no Brasil a quase 450 anos e já esteva presente em 
textos escritos pelos colonizadores portugueses desde 1559. Nos textos escritos pelos 
portugueses a palavra quilombo tinha um significado muito simples: “um grupo de escravos 
fugidos que cabia às autoridades capturar ou exterminar” de acordo comas leis da época. 
Para os que viviam em quilombos, a palavra tinha um significado muito mais profundo, 
era uma forma de organização social para a defesa da liberdade. Na formação do Brasil 
a escravidão estava por toda a parte, nos engenhos, nas vilas e cidades criadas pela co-
lonização europeia e os quilombos eram uma negação deste mundo em uma busca pela 
emancipação.
Em cartas, relatórios, leis e outras fontes portuguesas temos acesso a diversas 
informações sobre como eram os quilombos e quem eram seus habitantes. Nessas fontes 
são descritas as habitações, as roças plantadas, o tempo de permanência da comunidade 
no local, as tecnologias que elas dominavam e as pessoas capturadas ou mortas. Nem sem-
pre os portugueses destacavam o nome dos escravizados, costumavam anotar as idades, 
sexo, locais de origem, etc. Essas informações eram importantes para as estratégias dos 
colonizadores que buscavam entender a resistência dos negros para melhor combatê-la e 
hoje servem para que conheçamos suas histórias, lutas e como era viver em um quilombo.
Para a historiadora, Maria Beatriz Nascimento, pioneira nos estudos dos quilombos, 
brasileira, trabalhou em Angola onde investigou o que significa quilombo na época em que 
essa palavra atravessou o oceano e chegou ao Brasil. Sua pesquisa concluiu que quilombo 
é um conceito que tem origem nos povos bantos, habitantes da África Centro-Ocidental e 
Leste.
Precisamente, a palavra é usada durante os séculos XVI e XVII para definir os 
acampamentos dos guerreiros jaga que resistiram por muito tempo aos colonizadores gra-
ças à sua forma de organização guerreira, mas acabaram se aliando aos europeus como 
forma de sobrevivência. Resistir à colonização era defender a própria liberdade, já que os 
europeus vinham realizando guerras para transformar o tráfico de pessoas escravizadas 
em um grande negócio. No Brasil, essa forma de organização serviu para que esses es-
cravizados continuassem resistindo à violência da escravização nos engenhos e em outras 
atividades.
Os primeiros quilombos da América surgiram em meados do século XVI e isso 
aconteceu não somente no Brasil, mas em todo o continente. “Onde houve escravidão, 
houve resistência”[14]. Segundo os historiadores João José Reis e Flávio dos Santos Go-
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mes, de todas as formas de resistência à escravidão que existiram no Brasil, a mais típica 
foi a fuga para formação de quilombos. Esses quilombos existiram do Rio Grande do Sul ao 
Amazonas e se formaram em todas as épocas da história do Brasil, desde o século XVI ao 
final do século XIX, quando foi abolida a escravidão.
O mais importante e conhecido quilombo do Brasil foi Palmares, também conhecido 
por seus habitantes por Angola Janga. O quilombo surgiu na Serra da Barriga entre os 
estados de Alagoas e Pernambuco por volta de 1580. A Serra da Barriga era uma região 
afastada das áreas ocupadas pelos portugueses e o acesso que já era difícil, passou a ser 
cada vez mais vigiado pelos quilombolas permitindo que a população dos Palmares cres-
cesse e um pequeno agrupamento se tornasse em um grande complexo de povoações. 
Sua produção incluía o plantio de milho, batata-doce, feijão, banana, criação de porcos e 
galinhas, a pesca, a caça, a fabricação de utensílios e instrumentos musicais e armar, in-
clusive de metal. Toda essa produção estava voltada para objetivos da própria comunidade, 
sendo o primeiro deles a proteção contra ameaças de escravização.
Ao longo de mais de um século, Palmares acolheu diferentes gerações de pessoas 
que conseguiam escapar das senzalas e dos canaviais. O quilombo dos Palmares não só 
cresceu como se tornou um Reino, Angola Janga, era provavelmente o fruto de uma união 
de duas linhagens de guerreiros africanos, a linhagem do reino fundada por Mbundu N’Go-
la, que também é a origem do nome do país africano, Angola e a linhagem dos guerreiros 
jagas[15], que utilizavam a denominação quilombo para seus acampamentos. É possível 
que o Reino Angola Janga (Palmares) tenha origem na liderança de uma princesa que já 
havia comandado batalhas contra os europeus na África antes de ser escravizada. Seu 
nome era Aqualtune e seu caso não foi o único, pois muitos herdeiros de linhagens reais 
africanas foram trazidos para a América para serem escravizados, além de chefes políticos, 
militares e religiosos.
A existência desses líderes as vezes se tornava uma ameaça séria para a escravi-
dão, já que podiam reorganizar as estruturas de poder que existiam na África. A história do 
Quilombo dos Palmares está cheia de exemplos dessa reinvenção das tradições africanas. 
O primeiro Rei de Angola Janga que teve contato com os europeus foi Ganga Zumba, 
mesmo nome que era dado aos reis Imbangala no Leste da África. Além do nome, Ganga 
Zumba também usava o cabelo em tranças longas e adornadas de conchas que, de acordo 
com sua tradição, representava autoridade, exatamente como os reis Imbangala. Como 
já expresso por Baquaqua, a primeira coisa que os colonizadores faziam ao capturar ou 
traficar um africano para ser escravizado, era cortar seus cabelos para tentar eliminar suas 
tradições.
26UNIDADE I História e Cultura Africana
O estilo de guerra praticado em Palmares ou Angola Janga, também eram inspira-
dos em tradições africanas. O quilombo se organizava em torno de povoados que recebiam 
o nome de mocambos e que mesmo sendo distantes entre si estavam ligados por uma 
rede mito eficaz de comunicação e mobilização de guerreiros. Uma estrutura pensada para 
defesa contra investida dos colonizadores que atacavam sempre de surpresa e que tornava 
necessária uma vigilância constante.
A estratégia de defesa foi tão bem-sucedida que ao longo do século XVII Palmares 
derrotou inúmeras tentativas portuguesas e holandesas de destruição. A primeira expedi-
ção conhecida ocorreu em 1655 quando o governo português conseguiu capturar alguns 
quilombolas e descobrir mais ou menos como se organizavam os mocambos. Nesta época, 
Pernambuco vivia o pior momento de uma grave crise de fome que atingiu principalmente 
as vilas e cidades portuguesas, como Olinda e Recife.
A fome era uma consequência do tipo de economia que os portugueses se estabe-
leceram na região com o foco total na produção de açúcar, deixando pouco espaço para a 
produção de artigos de primeira necessidade. Com a fome, as fugas para Palmares aumen-
taram, pois chegavam as notícias de que por lá havia comida. Com as fugas, os quilombos 
aumentavam sua população e sua capacidade de resistência a cada dia, levando senhores 
de engenho e autoridades portuguesas a concentrarem suas forças na sua destruição.
Destruir Palmares não era fácil, tanto pela distância e dificuldade do caminho quanto 
pelas técnicas de guerra que iam de postos de observação a armadilhas. Também ajudavam 
na defesa habitantes da região que dependiam dos alimentos do quilombo e o apoiavam. 
Pequenos proprietários de terras de origem portuguesa compravam comida de Palmares 
em troca de pólvora e armas de fogo, já que em Palmares não faltava comida, mas faltavam 
armas e munições para fazer frente às expedições portuguesas. Os quilombolas também 
trocavam seus alimentos por informações sobre os movimentos das tropas inimigas, além 
de manterem uma rede de informantes.
Apesar de todas as estratégias, as expedições dos portugueses e holandeses 
fizeram muitos estragos com a destruição de plantações, o incêndio de casas e a morte ou 
captura de muitos habitantes. Com as perdas dos Palmares, o rei Ganga Zumba aceitou 
fazer um acordo de paz com o capitão-general de Pernambuco, que representava o rei de 
Portugal. Esse acordo reconhecia a liberdade das pessoas nascidas em Palmares, mas 
não das pessoas que continuavam fugindo dos engenhos e das cidades. O acordo de paci-
ficação já havia sido proposto em 1663. O governador de Pernambuco enviara intérpretes 
de línguas africanas para negociações,mas foram assassinados pelos quilombolas.
Para quem tinha nascido em Palmares, aceitar um acordo poderia ser uma forma 
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de tentar garantir sua liberdade sem precisar viver em constante ameaça, mas ao mesmo 
tempo o acordo enfraquecia Palmares, pois se fechava a novos membros em busca de 
emancipação. Depois de aceitar o acordo, o Rei Ganga Zumba acabou desacreditado e 
foi envenenado por seus próprios súditos, dando lugar ao último e mais importante líder 
de Palmares, Zumbi, que havia nascido em Palmares e teria sido um dos beneficiários do 
acordo de Ganga Zumba, mas entendia que a liberdade não poderia ser apenas para os 
que haviam nascido em Angola Janga (Palmares), mas sim para todos os negros, africanos 
ou não.
Zumbi nasceu livre, na Serra da Barriga, mas a liberdade durou pouco, quando 
ele ainda era bebê foi capturado por uma expedição e dado de presente a um padre que 
o rebatizou com um nome europeu, Francisco, em homenagem ao padre católico protetor 
dos pobres. Aos 15 anos o jovem se recusou a continuar sendo o escravo Francisco e 
retornou à sua terra natal para se tornar Zumbi[16]. Aos 17 anos comandou os guerreiros 
que venceram a maior expedição que já tinha sido montada para destruir Palmares.
Zumbi se tornou rei quando já era um guerreiro famoso depois de liderar uma rebe-
lião contra Ganga Zumba e contra a aliança de paz com os portugueses. Em seu reinado 
Palmares virou uma fortaleza e o mocambo principal chamado Macaco chegou a contar 
com uma muralha de cerca de cinco quilômetros de extensão.
A cada expedição portuguesa, Zumbi reagia com ataques aos engenhos que re-
sultavam na libertação de mais pessoas escravizadas, na aquisição de novas áreas para o 
quilombo e no incêndio dos canaviais que destruía a fonte de riquezas das forças inimigas. 
Zumbi usava verdadeiras táticas de guerra contra os colonizadores.
Os portugueses tentaram um novo acordo de paz rejeitado por Zumbi. Então, o 
governador de Pernambuco decidiu chamar um exército de bandeirantes paulistas para 
tentar destruir Palmares. Os bandeirantes eram comandados por Domingos Jorge Velho 
que tinha uma longa experiência nas guerras por escravização de povos indígenas em São 
Paulo.
Os Bandeirantes chegaram em 1691 em Pernambuco e foram derrotados na pri-
meira investida contra Palmares. Em 1693 voltaram com um exército de nove mil homens e 
continuaram avançando. No dia 20 de novembro de 1695 Zumbi foi morto numa emboscada 
armada pelos bandeirantes.
Depois de mais de um século de resistência o quilombo dos Palmares teve seus 
últimos habitantes degolados. Era o fim do maior quilombo que já existiu no Brasil, mas 
era apenas um capítulo da longa história da resistência quilombola que se reinventou e se 
espalhou por todas as regiões do país por muitos anos que viriam.
28UNIDADE I História e Cultura Africana
SAIBA MAIS
Mahommah Gardo Baquaqua foi um homem africano, sequestrado escravizado por tra-
ficantes. Nativo de Zooggoo na África Central (atual municipalidade de Djougou, no 
Benim), um reino tributário do reino de Bergoo, trabalhou no Brasil como cativo, contudo 
conseguiu fugir para Nova York em 1847 garantindo sua liberdade. O navio, que chegou 
a Nova Iorque em junho, foi abordado por abolicionistas locais, que o incentivaram a fugir 
do navio. Após a fuga, no entanto, foi preso na cadeia local, e apenas a colaboração dos 
abolicionistas (que facilitaram a fuga da prisão) impediu que fosse restituído ao navio. 
Foi então enviado ao Haiti, onde passou a viver com o reverendo Judd, um missionário 
batista. Convertido e batizado, em 1848, Baquaqua retornou aos Estados Unidos devido 
à instabilidade política que o Haiti vivia então; estudou no New York Central College, 
em McGrawville, por quase três anos. Em 1854 foi para o Canadá e sua bibliografia foi 
publicada no mesmo ano por Samuel Downing Moore em Detroit.
Não se sabe o que acontece com Baquaqua depois de 1857. Ele estava então na Ingla-
terra e havia recorrido à Sociedade da Missão Livre Batista Americana para ser enviado 
como missionário à África.
Em 2018, a biografia de Mahommah Baquaqua foi apresentada como enredo no carna-
val virtual, pelo G.R.E.S.V. Recanto do Beija-flor.
Sua biografia foi publicada pelo abolicionista estadunidense Samuel Moore em 1854, 
seu relato foi fundamental pois revelou detalhes das operações do tráfico negreiro da 
época.
 
REFLITA
“Oh! a repugnância e a imundície daquele lugar horrível (navio negreiro) nunca serão 
apagadas de minha memória. Não: enquanto a memória mantiver seu posto nesse cé-
rebro distraído, lembrarei daquilo. Meu coração até hoje adoece ao pensar nisto.”
Baquaqua. Mohammah Gardon. Biografia. p. 272.
 
29UNIDADE I História e Cultura Africana
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nossa viagem chega ao fim. O espaço de experiência contemplado nos apresentou 
um negro no Brasil que fora trazido à revelia ao país. Não foi uma bela viagem, porém, 
humanizante.
Conforme vimos, o negro no Brasil fora colocado sob um trabalho compulsório. 
Uma vez aqui, teve de resistir das mais diversas formas. Uns optaram pela estratégia da 
obediência e lealdade. Era a melhor forma, para alguns, de se apegarem às suas próprias 
vidas. Outros, boicotaram a produção, quebraram peças dos mecanismos do engenho ou 
queimaram as lavouras podendo garantir algum tempo de descanso. Ou isso ou continuar 
trabalhando dezesseis horas por dia cortando cana-de-açúcar. Alguns, em total desespero, 
ou tiravam as vidas de seus senhores ou até mesmo tiravam suas próprias vidas, pois para 
estes, a morte era a única saída de tal situação. E ainda tiveram aqueles que braviamente 
fugiram das fazendas e construíram vilas chamadas de concentrações quilombolas.
Aprendemos que o africano no Brasil tem sua própria história e que essa história 
é a história do próprio Brasil. Ela nos construiu e continua nos construindo, sendo assim, 
não podemos deixar que ela seja esquecida, não apenas porque a escravidão é um crime 
contra a humanidade, mas porque a cultura africana está presente no nosso dia-a-dia e 
muitas vezes nem percebemos.
 
30UNIDADE I História e Cultura Africana
Leitura Complementar
LARA, Silvia Hunold. Biografia de Mohammah Gardon Baquaqua. Revista História Brasilei-
ra, São Paulo, v. 8, n. 16, p. 269-284, 1988. 
Material Complementar
 
LIVRO 
Título: O Trato dos Viventes: Formação do Brasil no Atlântico Sul 
– Séculos XVI e XVII.
Autor(a): Luiz Felipe de Alencastro.
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: O padre Antônio Vieira escrevia: “Angola... de cujo triste 
sangue, negras e infelizes almas se nutre, anima, sustenta, serve 
e conserva o Brasil”. Em O trato dos viventes, o historiador Luiz 
Felipe de Alencastro mostra que a colonização portuguesa, ba-
seada no escravismo, deu lugar a um espaço econômico e social 
bipolar, englobando uma zona de produção escravista situada no 
litoral da América do Sul e uma zona de reprodução de escravos 
centrada em Angola.
FILME/VÍDEO 
Título: Amistad
Diretor: Steven Spielberg
Ano: 1997
Sinopse. Costa de Cuba, 1839. Dezenas de escravos negros se li-
bertam das correntes e assumem o comando do navio negreiro La 
Amistad. Eles sonham retornar para a África, mas desconhecem 
navegação e se vêem obrigados a confiar em dois tripulantes so-
breviventes, que os enganam e fazem com que, após dois meses, 
sejam capturados por um navio americano, quando desordenada-
mente navegaram até a costa de Connecticut. Os africanos são 
inicialmente julgados pelo assassinato da tripulação, mas o caso 
toma vulto e o presidente americano Martin Van Buren (Nigel Haw-
thorn), que sonha ser reeleito, tenta a condenação dos escravos, 
pois agradaria aos estados do Sul e também fortaleceria os laços 
com a Espanha, pois a jovem Rainha Isabella II (Anna Paquin) 
alega que tanto os escravos quanto o navio são seus e devem ser 
devolvidos. Mas os abolicionistas vencem, e no entanto o governo 
apela e a causachega a Suprema Corte Americana. Este quadro 
faz o ex-presidente John Quincy Adams (Anthony Hopkins), um 
abolicionista não-assumido, sair da sua aposentadoria voluntária, 
para defender os africanos.

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