Buscar

7-Gnarus5-Ricardo+Luiz+de+Souza-As+relações+internacionais+entre+o+Congresso+de+Viena+e+a+Grande+Guerra

Prévia do material em texto

G N A R U S | 55 
 
 
Artigo 
 
 
 
AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS ENTRE O 
CONGRESSO DE VIENA E A GRANDE GUERRA. 
 
Por Ricardo Luiz de Souza 
 
 
Resumo: O presente artigo tem por objetivo realizar um debate historiográfico acerca das relações 
internacionais entre as grandes potências europeias e mundiais entre o congresso de Viena e a primeira Grande 
Guerra. Como metodologia de trabalho, serão utilizados alguns autores que trabalham com esse recorte 
histórico que vai de 1815 até 1914, buscando assim com esse debate, corroborar quais os principais nuances e 
fatos que ocorreram nesse período, no que concerne principalmente as relações entre as nações e o grande 
equilíbrio de poder demonstrado nesse período. 
Palavras-chave: Equilíbrio, finanças, Revolução, Paz. 
 
Introdução 
 
 mundo no século XIX apresentou 
momentos únicos na história da 
humanidade, sendo um século vultoso 
que vai deste as grandes revoluções e 
transformações sociais, mudanças de guinadas 
econômicas e políticas. Enfim, é um dos séculos 
mais fecundos na história da humanidade, pois esse 
período é uma espécie de quebra de paradigma 
entre o velho e o novo, o arcaico e inovador. 
 Século em que inúmeros autores e pesquisas 
acadêmicas das mais diferentes áreas debruçam 
suas dissertações, teses e projetos de pesquisa. Esse 
período compreendido entre o fim das guerras 
napoleônicas que sacodem a Europa e o começo do 
grande morticínio da Primeira Grande Guerra, 
produziu e produzirá ainda novas pesquisas e 
perspectivas novas acerca de seus inúmeros 
nuances e desenvolvimentos. 
 O presente trabalho possui por objetivos 
principais realizar um debate historiográfico acerca 
dos fatos e nuances desse século tão fértil. Assim, 
procuraremos explicitar o arcabouço teórico de 
acordo com autores consagrados da historiografia 
mundial nacional. Nesse período conhecido como 
O 
 
 G N A R U S | 56 
 
o século da paz de cem anos, as relações entre as 
nações se tornam primordiais para o 
desenvolvimento do comércio, dos investimentos e 
da indústria. Um dos objetivos desse trabalho é 
esmiuçar ao leitor, o quanto essa complexa rede de 
relações era complexa e atrelada ao objetivo da 
nova classe emergente após a revolução francesa: a 
Burguesia. 
 Assim, nas próximas páginas trataremos 
alguns dos principais fatos desse recorte histórico e 
suas principais características, e os fundamentais 
desdobramentos desse longo período causaram no 
mundo. O objetivo desse trabalho é procurar 
explicitar assim, de forma sucinta mais coesa, quais 
são esses nuances principais. 
 
O panorama geral Europeu entre 1815 e 1914. 
De acordo Remond (1997), O século XIX, tal como 
os historiadores o delimitam, ou seja, o período 
compreendido pelo referido autor entre o fim das 
guerras napoleônicas e o início do primeiro conflito 
mundial, é um dos séculos mais complexos, mais 
cheios de nuances e percalços que existem na 
história humana. 
Hobsbawm (1981) salienta que, através da grande 
onda da ideologia pregada pelo forte movimento 
Iluminista do séc. XVIII, surgem os princípios 
universais que guiariam a Revolução Francesa: 
(liberdade, igualdade e fraternidade). Fato é que 
este mesmo pensamento, apesar de inovador, 
repleto de ideias humanitárias, de racionalidade e 
de progresso, ainda que indiretamente, favoreceu à 
consolidação do grande ideal do capitalismo 
(anseios do vitorioso mundo Burguês). 
René Remond assinala também que o século XIX 
foi fértil no terreno das revoluções, o autor também 
aponta que nesse período o traço mais evidente é a 
grande frequência de choques revolucionários. 
Nesse respectivo século, o volume de levantes, 
insurreições e guerras civis foi tão grande que pode 
ser considerado o século mais fértil da história 
humana no plano revolucionário, Acerca disso o 
autor descreve: 
Essas revoluções têm como pontos comuns 
o fato de quase todas serem dirigidas contra 
a ordem estabelecida (regime político, 
ordem social, às vezes, domínio estrangeiro), 
quase todas feitas em favor da liberdade, da 
democracia política ou social, da 
independência ou unidade nacionais. É esse 
o sentido profundo da efervescência que se 
manifesta continuamente na superfície da 
Europa, a que não ficou imune nenhuma 
parte do continente: tanto a Irlanda como a 
península ibérica, os Bálcãs como a França, a 
Europa Central e a Rússia, foram afetadas por 
essa agitação, uma ou mais vezes.(Remond, 
1997,p. 05) 
 
Polany (2000) atenta para o fato que a civilização 
do século XIX, manter-se-ia em quatro grandes 
parâmetros: O primeiro parâmetro era o “sistema 
de equilíbrio de poder” equilíbrio este que, durante 
um século, impediu a ocorrência de qualquer 
guerra prolongada e devastadora entre as Grandes 
Potências” (POLANY, 2000, p.01). O segundo 
parâmetro era o uso e propagação do padrão 
internacional do ouro que simbolizava uma 
organização exclusiva na história econômica 
mundial. A terceira era o mercado auto-regulável, 
que produziu um bem-estar material sem 
precedentes para crescentes indivíduos 
consumidores. O último parâmetro era o estado 
liberal, com menor intervenção do Estado nas 
atividades econômicas. Classificando esses 
parâmetros de modo mais quantitativo, verificam-
se dois parâmetros econômicas e dois políticos. 
Com relação a Europa pós napoleônica, Remond 
(1997) atenta para o fato de que após a derrota dos 
exércitos franceses em Waterloo (1815), os 
 
 G N A R U S | 57 
 
processos de restauração encabeçados pelas 
potências centrais são intensificados, com o 
objetivo de se restaurar todo o processo 
monárquico abolido pelos ideais da revolução. É 
restaurado o poder monárquico nos países onde os 
ventos revolucionários franceses passaram (França, 
Espanha, Portugal) baseando-se nas voltas das 
famílias e de seus aristocratas. Mais, porém, essa 
nova monarquia, se baseia agora numa verdadeira 
“corda bamba’, pois com o acesso de certos extratos 
sociais dantes negligenciados, são criadas cartas 
constitucionais que limitam os poderes dos chefes 
de Estado. Acerca desse importante processo o 
autor destaca esse processo no caso da França: 
[...] O caso da França — de onde partiu a 
Revolução — é, na espécie,particularmente 
exemplar, já que Luís XVIII não viu 
possibilidades de voltar ao Antigo Regime e 
outorga a seus súditos uma Carta 
Constitucional, fazendo concessões 
importantes à experiência e às aspirações 
dos franceses. A existência de uma Carta já é 
por si mesma uma concessão importante. O 
Antigo Regime caracterizava-se pela 
ausência de constituição. Com a Carta 
Constitucional há, agora, um texto, uma 
regra, à qual se pode fazer referência, uma 
constituição disfarçada. Com efeito, apesar 
do preâmbulo, que insiste na concessão 
unilateral feita pelo rei, trata-se na verdade 
de uma constituição, uma espécie de 
contrato passado entre o soberano 
restaurado e a nação.[...] 
[...] A análise do conteúdo da Carta dissipa, 
a esse respeito, todas as dúvidas. Ela prevê 
instituições representativas, uma Câmara 
eletiva (trata-se de uma homenagem ao 
princípio eletivo) associada ao exercício do 
poder legislativo, que vota o orçamento, em 
aplicação do princípio da necessidade do 
consentimento dos representantes da nação 
ao imposto. Trata-se, de algum modo, vinte 
e cinco anos depois, da legitimação das 
pretensões dos Estados Gerais. Enfim, a Carta 
reconhece explicitamente certo número de 
liberdades que a primeira Revolução havia 
proclamado: liberdade de opinião, liberdade 
de culto, liberdade de imprensa, isto é, quase 
toda aessência do programa liberal [...] 
(Remond, 1997, p.11). 
Esse foi, portanto, um grande avanço da 
revolução francesa, pois agora o movimento liberal 
se consolidara no cenário europeu, e as classes 
burguesas estavam se garantindo cada vez mais, no 
centro do poder europeu e de suas decisões 
institucionais. De acordo com Hobsbawm (1981) é 
observado que a cultura do campo, assim como a 
religião deste, sofre uma grande refração no 
decorrer de todo o séc. XIX, se tornando o mundo 
mais cético, cientifico e com uma população mais 
esclarecida (devido ao avanço na educação das 
massas) e principalmente pela vitória evidenciada 
da cidade (liberal) sobre o campo (tradicional). 
Outro ponto bastante preponderante no bojo 
desses momentos, foi a grande evidência de que a 
restauração dos antigos poderes absolutistas estava 
muito longe, de ser e conseguir, ser absoluta. Não 
obstante, impulsionaram-se pesadas pressões no 
que diz respeito às transformações sociais. De 
acordo dom Rémond (1997), por todo rincão de 
terra onde a Revolução passou, ela abalou 
profundamente as estruturas sociais e por toda 
parte verifica-se a conservação essencial de suas 
concepções originais, e de suas transformações- na 
França, onde a Carta reconhece as liberdades civis, 
nos Países Baixos, na Alemanha Ocidental, no Norte 
da Itália e até na Polônia, onde códigos inspirados 
nos códigos napoleônicos ficam em vigor por um 
tempo indeterminado. 
 Algumas mudanças ocorrem em grandes áreas, 
tais como: O regime de servidão é abolido, os 
privilégios de certas classes são suprimidos e a mão-
morta eclesiástica desapareceu. A equidade civil de 
todos diante da lei, diante da justiça, diante dos 
impostos, para o acesso aos cargos públicos e 
administrativos, é agora a norma para uma boa 
parte do continente Europeu. Todas essas reformas 
favorecem principalmente a classe burguesa, e de 
 
 G N A R U S | 58 
 
fato, verificou-se a transição de sociedade 
aristocrática para uma sociedade burguesa. Essas 
transformações e sua conservação aproximam 
demasiadamente, os territórios dos países nos quais 
elas ocorrem, sendo bem acima das diferenças 
existentes no passado regido pelo ethos 
nobiliárquico. Nesse ínterim, essas reformas lançam 
uma linha de união e colaboram para unificar a 
Europa Ocidental, fazendo dessa parte da Europa 
ficaria bastante diferente da Oriental, no que tange 
os aspectos sociais, políticos e econômicos. Outro 
importante marco do século XIX,é o movimento das 
nacionalidades. Esse processo procede da herança 
da Revolução, pois ao enumerar as consequências 
da Revolução sobre a ideia de nacionalidade. Nisso, 
surgem dois importantes Estados que iram fazer 
parte do rolo das nações protagonistas nos 
processos econômicos, políticos e sociais europeus 
e mundiais: Alemanha e Itália. No que concerne o 
movimento das nacionalidades, Rémond (1997) 
descreve: 
Enfim, o movimento das nacionalidades, 
que não se segue cronologicamente aos três 
precedentes, mas corre por todo o século 
XIX, constitui o último tipo de movimento. 
Ele procede da herança da Revolução, como 
vimos ao enumerar as consequências da 
Revolução sobre a ideia de nacionalidade; 
ele também é contemporâneo tanto dos 
movimentos liberais como das revoluções 
democráticas, e mesmo das revoluções 
sociais, e mantém com essas três correntes 
relações complexas, cambiantes, ambíguas, 
sendo ora aliado, ora adversário dos 
movimentos liberais, ou das revoluções 
democráticas e socialistas.(Rémond, 1997, 
p.04). 
Após a grande destruição causada pelas Guerras 
Napoleônicas, o mapa Europeu redesenhou-se em 
suas fronteiras em 1815. Conforme Remond (1997 
:10), “O mapa está muito simplificado; o número 
 
1René Remond salienta que, geograficamente o mapa 
europeu foi modificado de maneira profunda a partir de 1815. 
dos Estados está visivelmente reduzido”. Países 
como a Polônia, Suécia e Finlândia serão 
abocanhadas pela crescente potência da Rússia. A 
Prússia consegue aumentar substancialmente seus 
territórios, nesse ínterim a Áustria também perde 
parte de seu grande território, fracionados nos 
Países Baixos1 
 
As finanças como protetoras da “paz”. 
Percebe-se uma grande aclamação pela paz nas 
potências industriais e nas economias arrasadas 
pelos conflitos. É dentro dessas perspectivas que 
incluem-se o período descrito por Karl Polany como 
“cem anos de paz”. O autor trabalha com a ideia de 
que era necessário para se conservar as economias 
em plena ascensão, e no caso a maior potência do 
Globo - a Inglaterra - evitar ao máximo, grandes 
confrontos armados. É necessário que o comércio, 
as finanças e as atividades manufatureiras 
prosperem, e para isso, é necessária a paz. A Europa 
passará por um grande período sem um grande 
conflito armado, a não ser por pequenos e 
esporádicos conflitos como, por exemplo, a Guerra 
da Criméia. Acerca disso, Polany descreve: 
O comércio se unira definitivamente à paz. 
No passado, a organização do comércio fora 
militar e guerreira; era um conjunto de 
piratas e bucaneiros, era a caravana armada, 
o caçador e o que colocava armadilhas, o 
mercador com a espada, a burguesia armada 
das cidades, os aventureiros e os 
exploradores, os plantadores e os 
conquistadores, os caçadores de homens e os 
comerciantes de escravos, os exércitos 
coloniais e os navios fretados. Tudo isto já 
havia sido esquecido. O comércio dependia 
agora de um sistema monetário 
internacional que não podia funcionar numa 
guerra generalizada. Ele exigia a paz e as 
Grandes Potências se esforçavam por mantê-
Estando a Europa, muito longe de uma restauração dos 
Estados e dos soberanos no status quo anterior a 1789. 
 
 G N A R U S | 59 
 
Ia. Todavia, o sistema de equilibro de poder, 
como vimos, não podia garantir a paz por si 
mesmo. Isto foi conseguido pela finança 
internacional, cuja própria existência 
incorporava o princípio de uma nova 
dependência do comércio à paz. (Polany, 
2000,p.30). 
 
Nesse ínterim, essa nova sociedade burguesa 
central europeia irá tecer sua nova organização da 
vida econômica e fornecer o pano de fundo para a 
Paz dos Cem Anos. Num primeiro momento, devido 
as grandes percas materiais causadas pelas guerras 
napoleônicas, criaram nas classes mais abastadas e 
dirigentes a perceber que, para o pleno 
desenvolvimento econômico, a manutenção da 
ordem social e a paz são extremamente 
necessários. Assim, a partir dessa nova perspectiva 
econômica vigente, o modelo da “paz” estava 
vitorioso. As classes médias eram o sustentáculo do 
interesse na paz, muito mais poderoso do que o de 
seus predecessores reacionários, e alimentado pelo 
caráter nacional internacional de uma nova 
economia. Entretanto, “o interesse pela paz” só se 
tornou efetivo porque foi capaz de fazer o sistema 
de equilíbrio de poder servir à sua causa, 
fornecendo àquele sistema os órgãos sociais 
capazes de lidarem diretamente com as forças 
internas ativas na área da paz. “2. 
 De modo organizacional, a haute finance foi o 
epicentro de uma das mais intricadas instituições 
que a história do homem já produziu. Apesar de 
transitória, ela só é comparável, em universalidade 
e pela profusão de formas e instrumentos, com o 
montante das atividades humanas na indústria e no 
comércio do qual se tornou, de alguma forma, a 
frente e o verso de um sistema. Além do centro 
 
2Karl Polany também afirma que Durante a paz dos Trinta Anos, 
1816-1846, a Grã-Bretanha já pressionavamuito pela paz e 
internacional, a haute finance propriamente dita, 
criou uma nova classe de homens ligados a 
aproximar as nações no que diz respeito aos 
negócios e a paz, esses profissionais eram os 
diplomatas que zelavam pelos interesses de suas 
elites e governos mundo afora. Houve também 
alguns centros nacionais gravitando em torno dos 
seus bancos de emissões de moeda e suas bolsas de 
valores. Os banqueiros internacionais não se 
limitavam a financiar governos em suas aventuras 
de guerra e paz, realizando polpudos investimentos 
externos na indústria, nos serviços públicos e 
bancos, bem como empréstimos a longo prazo à 
corporações públicas e a Estados dos mais 
diferentes lugares do globo. 
 Arrighi (1996) descreve que com a súbita e 
irreversível expansão do capitalismo, verifica-se 
formar no mundo Europeu os chamados “hegemons” 
que são nada mais, nada menos do que países que 
possuem mais poder e recursos que os seus 
anteriores, e que controlam os meios sociais e 
políticos, fato esse o que os torna fundamentais no 
jogo político mundial existente. 
 Giovanni Arrighi (1996) adverte que o 
Imperialismo de livre comércio, marca do sistema 
mundial organizado e mantido pelos britânicos, 
tinha por principais premissas, guardar a 
importância das comunidades nacionais e da 
propriedade privada a extensa centralização do 
poder mundial no Reino Unido. O equilíbrio de 
poder entre as potências, consistiu num modo em 
que nenhuma grande potência se destacasse mais 
que a outra, política essa materializada no 
Concerto Europeu, contando com o apoio 
fundamental da Haute Finance, Não obstante, o 
pelos negócios, e mesmo a Santa Aliança não desdenhava a 
crucial ajuda dos Rothschilds. 
 
 G N A R U S | 60 
 
uso do padrão ouro nas transações comerciais e 
constitucionalismo nas políticas nacionais também 
se caracterizaram como característica dessa 
hegemonia economia britânica nos quatro cantos 
do mundo. No que diz respeito à Hegemonia 
inglesa no mundo, Arrighi (1996), descreve o 
conceito de hegemonia como “à capacidade de um 
Estado exercer funções de liderança e governo 
sobre um sistema de nações soberanas” (Arrighi, 
1996, p.27). 
Essa dominação não necessita ser só de cunho 
físico, mais também pode se apresentar como 
dominação ideológica 3 , dominação essa que a 
Inglaterra passará a exercer no mundo no século 
XIX e os E.U.A passaram a exercer no século, mais 
precisamente após a destruição da Primeira Grande 
Guerra. 
Segundo Kennedy (1989) o controle da haute 
finance pelos ingleses, sua supremacia marítima, 
posição insular, poderio militar, influências 
continentais e comerciais a fizeram tornar uma 
nação com poder sem precedentes. Sua hegemonia 
global exercia influência em todo o globo e era 
interessante para a manutenção desse poderio que 
o mundo todo fosse uma grande extensão do 
pensamento liberal, que esse pensamento passasse 
a sobrepor as decisões dos Estados. No que 
pertence essa afirmação, Arrighi (1996) descreve: 
O poder mundial da Grã-Bretanha no 
século XIX não teve precedentes. Mas a via 
de desenvolvimento que levou a essas 
conquistas não deve ser considerada 
totalmente inédita. Pois o imperialismo de 
livre comércio da Grã-Bretanha 
simplesmente fundiu, numa síntese 
 
3De acordo com o pensador italiano Gramsci, para um povo ter 
preponderância sobre outro, somente a ação e repressão 
militar não são necessários, ficando o campo ideológico com 
muita importância para legitimar e coordenar as ideias de 
submissão de um Estado mais fraco ante um mais forte. 
4De acordo com Eduard Palmer Thompson, os costumes dos 
trabalhadores que antes de entraram no mundo fabril, não são 
harmoniosa, duas vias de desenvolvimento 
aparentemente divergentes , que tinham 
sido abertas muito antes pelos grupos 
dominantes de outros Estados. O que houve 
de diferente foi a combinação entre essas 
vias, e não as vias em si.(Arrighi, 1996, p.57). 
 
Hobsbawm (1981), descreve que a primeira fase 
da industrialização britânica se baseou na indústria 
têxtil, principalmente a do algodão. Dona de um 
monopólio comercial imenso no escoamento e 
produção desse produto na América 
(principalmente os Estados Unidos) e Ásia. Com o 
monopólio cada vez maior da venda e compra de 
algodão mundial, os industriais ingleses assim 
entravam nessa empresa com certeza de venda de 
seus produtos e lucro imediato e certo. Enquanto 
isso paisagens de cidades como Manchester e 
Liverpool iam mudando, se tornando mais cinzas, 
horizontais, com inúmeras fábricas, além de um 
exército de trabalhadores famigerados e 
maltrapilhos, sendo que, a mentalidade acerca do 
trabalho e do tempo é transformada 4 . Com o 
desenvolvimento dessas cidades a indústria 
alimentícia foi em seguida alavancada com o 
desenvolvimento e aumento demográfico das 
cidades, causando no campo uma espécie de 
“revolução” na produtividade das culturas, com o 
implemento de novas técnicas agrárias e pastoris 
como a fertilização dos campos, revezamento de 
culturas, novas culturas adotadas (como o caso da 
Batata, vinda da América do Sul). Todas essas 
inovações que incrementaram o aumento da 
população e consequentemente mais braços para 
as fábricas. A Indústria alimentícia foi abastecida de 
totalmente suprimidos, tendo esses homens e mulheres 
costumes que perfazem boa parte do tempo. A percepção 
acerca do tempo é totalmente transformada pela noção 
capitalista segundo a ótica de tal autor, mais de uma forma 
lenta e gradual e não totalmente abrupta. 
 
 G N A R U S | 61 
 
novas técnicas de produção de bebidas e comidas, 
se tornado essas mais dinâmicas para a vida corrida 
do trabalho fabril. Outra indústria vital para o 
abastecimento energético das fábricas foi à 
extração do carvão vegetal, sendo usado de forma 
tanto industrial como doméstica devido à fraca 
vegetação arbórea Inglesa. O carvão mineral se 
tornou a mola central no abastecimento das 
máquinas a vapor tanto das indústrias, como 
também das ferrovias mundo afora. Foi o 
combustível da revolução. 
Todo o mercado financeiro e especulativo teve 
que se reformular se tornado mais proativo para 
suplantar cada vez mais os altos capitais circulantes 
no mundo, não havendo dificuldade quanto às 
técnicas comerciais e financeiras. Os bancos e 
todos os seus artífices, estavam cada vez mais 
interligados com a industrialização, seja 
oferecendo facilidades a empréstimos e 
investimentos maciços em qualquer atividade de 
cunho industrial ou afins. As Expansões industriais 
em torno das atividades têxteis eram facilitadas 
pela grande soma de lucro que adivinha de sua 
venda, e assim, novas máquinas e tecnologias eram 
adquiridas podendo ser pagas em torno de pouco 
tempo, devido ao ganho de mercados 
consumidores como a América Espanhola, Ásia e 
África. 
 
Um mundo em constante movimento 
Segundo Arrighi (1996), após um século inteiro de 
hegemonia britânica mundial, verifica-se a partir 
dos anos de 1870 a ascensão de dois concorrentes 
implacáveis, Estados Unidos da América e 
Alemanha. Os E.U.A, grande nação de dimensões 
continentais possuía recursos naturais, potencial 
humano, economia nacional maiores que os da 
 
 G N A R U S | 62 
 
terra da rainha. Essa guinada na mudança da grande 
potência mundial irá se propagar com maior ênfase 
após a Grande Primeira Guerra Mundial. Os Estados 
Unidos segundo Kennedy (1989), preferiram após a 
guerra de Secessão, concentrar suas energias e 
forças no aparelhamento de sua economiano que 
diz respeito ao comércio, a indústria, e a sua 
crescente influência no continente americano em 
detrimento dos gastos militares. O número de 
militares regulares dos Estados Unidos era de certa 
forma no século XIX, menor que potências médias 
europeias, como a Hungria e a Áustria. O 
antagonismo da E.U.A e da Rússia era enorme 
frente aos exércitos regulares, mais era muito maior 
no aspecto econômico, Trocando em miúdos, a 
Rússia se mantivera entre as grandes potencias por 
sua alta capacidade militar, mas não pela sua 
econômica frágil. 
Já na Europa, surge uma nação que irá acirrar 
ainda mais o concerto europeu, a Alemanha 
unificada por Otto Von Bismark em 1870, angariava 
seu poderio em sua grande e expoente indústria 
química e siderúrgica, assim percebeu-se que o 
concerto da Europa estava em seu auge. “Nas duas 
décadas que se seguiram imediatamente à 
ascensão da Alemanha à categoria de Grande 
Potência, ela foi a principal beneficiária do 
interesse pela paz” (Polany, 2000, p.35). Kennedy 
(1989) salienta que essa nova potência central 
forçou seu caminho até as primeiras fileiras 
mundiais à custa do relativo atraso econômico da 
Áustria e da França pois para os franceses era mais 
vantajoso para manter seu grande status quo e 
evitar uma guerra mortífera com a poderosíssima 
Alemanha de Bismarck. O alto escalão do Governo 
alemão favoreceu deliberadamente a paz com a 
colaboração conjunta das outras Grandes Potências 
(Áustria, França, Inglaterra e Rússia) evitando 
compromissos que pudessem forçar a Alemanha 
para fora de seus anseios de manutenção de paz, 
pois com essa paz, os negócios, indústria e 
comercio alemães prosperavam. Nessa mesma 
ideia, mais do outro lado do Atlântico, 
Hobsbawm (2004) descreve que os últimos anos 
do século XIX foram vistos até hoje na história da 
civilização humana como um período de 
estabilidade social e política. Foram anos de 
intensa prosperidade econômica e crescimento 
constante das nações mais abastadas do Globo. Os 
governos se mostraram mais experientes na arte de 
conter agitações políticas e sociais. Época 
conhecida como belle époque, onde o mundo de 
certa forma estava mergulhado num mundo de 
intensa prosperidade. Apesar de todo esse 
otimismo e ar próspero, algumas áreas mundiais 
estavam passando por momentos de muita 
instabilidade e com grande eminência de 
revoluções até que em 1914 o mundo assistir a 
segunda guerra mundial afetando a paz em todo o 
globo. Áreas como o Império Otomano, Rússia e o 
Império Habsburgo tiveram como a primeira 
guerra mundial uma espécie de desencadeamento 
de conflitos internos e instabilidade política. É bem 
lógico que a belle époque não estava inserida de 
forma continua em todo o mundo, vários países 
como o México passavam por serias revoluções, 
Países como China e a Rússia passariam por 
transformações profundas na sua concepção tanto 
política, ideológica e econômica, as grandes crises 
sociais que esses países passaram por vários anos e 
as grandes pressões internas devido a sua 
amplitude geográfica, trouxeram grandes 
mudanças na virada do Séc. XX. 
 
 
 
 
 G N A R U S | 63 
 
O colapso de um sistema frágil 
Entretanto, de acordo com Polany (2000) no final 
da década de 1870, o episódio do livre comércio 
estava no seu final, e a utilização do padrão ouro 
pela Alemanha marcou o início de uma extensa 
rede de protecionismo e expansão colonial mundo 
afora. A Alemanha passava agora, a reforçar sua 
posição através de uma união com a Áustria-
Hungria e a Itália. A partir daí, a Grã-Bretanha 
passou assim, a ser o principal líder do interesse 
pela paz em uma Europa onde ainda permanecia 
um grupo de estados soberanos independentes e 
portanto, sujeitos ao tão desejado equilíbrio de 
poder. Na década de 1890, a haute finance estava 
no seu apogeu e a paz parecia mais segura do que 
nunca. Os interesses britânicos e franceses diferiam 
entre si na África, os britânicos e os russos 
competiam uns com os outros na Ásia. O Concerto, 
embora capengando, continuava a funcionar. A 
despeito da Tríplice Aliança, ainda havia mais de 
duas potências independentes para vigiar uma a 
outra ciumentamente. Mas isso não durou muito 
tempo. Em 1904, a Grã-Bretanha fez um acordo 
com a França sobre o Marrocos e o Egito, e alguns 
anos mais tarde entrou em acordo com a Rússia 
sobre o território Persa. Estava ai formada a contra-
aliança. O Concerto da Europa, essa federação 
frouxa de potências independentes, foi 
subitamente substuído por dois agrupamentos 
antagônicos e o desejado e complexo “castelo de 
areia” que era equilíbrio do poder, chegara a seu 
final. Com apenas dois grupos de poder em extrema 
competição acirrada pelo imperialismo, seu 
mecanismo deixara de funcionar de forma 
harmônica, como funcionara em tempos atrás. 
 Nisso, já não havia mais um terceiro grupo que se 
unisse a um ou outro para frear aquele que buscasse 
aumentar o seu poder e ser o fiel da balança. 
Praticamente na mesma época, os sintomas de 
dissolução das formas existentes de economia 
mundial como a rivalidade colonial na África e Ásia, 
e a competição por mercados exóticos tornaram-se 
aguçados. A habilidade da haute finance em 
contornar a disseminação das guerras diminuía 
rapidamente. A paz ainda se arrastou durante os 
sete anos seguintes, mas era apenas uma questão 
de tempo para desmoronar-se, e que, de fato a teia 
da organização econômica do século XIX ruísse e 
acabasse por completo com a Paz dos Cem Anos. 
Da paz a uma guerra sem precedentes históricos. 
 
Conclusão. 
 Percebemos que uma das grandes 
preocupações das potências europeias foi 
justamente se evitar uma guerra de alta 
deflagração, pois um conflito de alto custo humano 
e material nesse período era muito ruim para a 
prosperidade dos negócios e das finanças. O mundo 
do século XIX é completamente diferente depois 
da sacudida institucional que a Revolução Francesa 
trouxe ao mundo europeu. O século XIX também é 
apresentado como um século de unificações 
nacionais de países como a Alemanha e a Itália, que 
serão importantíssimos nos decorreres dos anos nos 
cenários europeu e mundial. O período analisado 
nesse trabalho também demonstra a guinada na 
mentalidade europeia no que concerne a política, 
ciências e artes nesse período conhecido como a 
paz de cem anos. 
 Como grandes baluartes da “paz de cem anos” 
verificamos que as finanças e os governos tiveram 
uma importância primordial, pois a guerra entre as 
grandes potencias, era vista como essencialmente 
danosa para a burguesia industrial, comercial e 
financeira das maiores potências do globo. Essa teia 
de compromissos e equilíbrio finalmente rui a partir 
 
 G N A R U S | 64 
 
do final do século XIX, pois com o fenômeno do 
imperialismo, a competição por produtos exóticos, 
matérias-primas e mercados nos países africanos e 
asiáticos, traz por terra todo o arcabouço feito 
pelas finanças. Para um conflito de grandes 
proporções e intensa carnificina, seria só uma 
questão de tempo. Infelizmente para boa parte da 
humanidade. 
Ricardo Luiz de Souza é Aluno do 9º período do 
Curso em Licenciatura em História da UFRRJ, 
campus Nova Iguaçu. ricardoluisouza@gmail.com 
 
Bibliografia 
GRAMSCI, Antonio. Os intelectuais e a organização 
da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 
1968. 
HOBSBAWM, Eric. A Era das Revoluções. Rio de 
Janeiro, Paz e Terra, 1981. 
_______________. A Era dos Impérios. Rio de Janeiro: 
Paz e Terra, 1988. 
_________________ .A Era do Capital. Rio de Janeiro, 
Paz e Terra, 2004. 
POLANYI, Karl. A Grande Transformação - as 
origens de nossa época. Rio de Janeiro: Campus, 
2000. 
KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes 
potências: transformação econômica e conflito 
militar entre 1500 e 2000. Rio de Janeiro, Editora 
Campus, 1989. 
REMOND, Rene. O século XIX – 1815-1914. São 
Paulo, Editora Cultrix, 1997. 
DA SILVA, Francisco Carlos Teixeira. O projeto 
prussiano de Império Alemão. IN: DA SILVA, 
Francisco Carlos Teixeira, CABRAL, Ricardo 
Pereira e MUNHOZ, Sidnei J. Impérios na 
História. Rio de Janeiro, Elsevier, 2009. 
THOMPSON, Edward P. “Tempo, disciplina do 
trabalho e o capitalismo industrial”. In: Costumes 
em comum. Estudos sobre a cultura popular 
tradicional. São Paulo: Companhia das Letras, 
1998.

Continue navegando