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O Teatro do Absurdo e as Relações Internacionais

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AMANDA REZENDE
O TEATRO DO ABSURDO E AS RELAÇÕES 
INTERNACIONAIS?
Monografia apresentada como requisito para 
conclusão do curso de bacharelado em 
Relações Internacionais no Centro 
Universitário de Brasília – UniCEUB. 
Orientador: Prof. Marco Antonio de 
Meneses Silva
BRASÍLIA – DF
2006
i
AMANDA REZENDE
O TEATRO DO ABSURDO E AS RELAÇÕES 
INTERNACIONAIS?
Banca Examinadora:
_________________________________
Prof. Marco Antonio de Meneses Silva
(Orientador)
_________________________________
Prof. Delmo Oliveira Arguelles
 (Membro)
_________________________________
Prof. Cláudio Tadeu Cardoso Fernandes
(Membro)
BRASÍLIA – DF
2006
ii
AGRADECIMENTO
Agradeço, antes de tudo, à minha família, em especial minha mãe, pela paciência e 
compreensão de não fazer qualquer barulho em casa por vários fins de semana, seguidos de 
muitos meses, para que eu pudesse trabalhar nesta monografia, ao meu irmão que mesmo 
distante sempre foi uma força e um incentivo para que eu fosse até o final e ao meu namorado 
Dirceu, por estar ao meu lado todo o tempo, acompanhando passo-a-passo essa construção, 
sempre com muito carinho, dedicação, companheirismo e amor. 
Sou grata ainda ao meu professor de teatro, Alberto Bruno, que apaixonadamente me 
apresentou a esse universo maravilhoso do “Absurdo”, e ao professor Delmo, do UniCEUB, 
que se dispôs a discutir o projeto desde o início, fornecendo preciosas direções com relação à 
parte histórica deste estudo. 
Por fim, mas não menos importante, agradeço imensamente ao meu orientador, Marco 
Antonio, que compartilhou essa experiência nova e desafiadora com muito entusiasmo e 
confiança durante todo o processo e que me desencorajou a fazer o primeiro projeto que eu 
tinha em mente.
iii
RESUMO
A presente monografia tem por objetivo apresentar as relações existentes entre o Teatro do 
Absurdo e as Relações Internacionais. Inicialmente, o foco da pesquisa está voltado para a 
situação vivida na Europa, em especial, na Grã-Bretanha, após a Segunda Guerra Mundial. A 
seguir, contextualizamos o surgimento das obras do Teatro do Absurdo, com ênfase na 
produção de Eugène Ionesco, mais especificamente a peça A Cantora Careca, no período pós-
Segunda Guerra. Por último, apresenta-se o conteúdo de “desconstrução” de paradigmas 
existentes tanto no Teatro do Absurdo quanto no Pós-Modernismo e as conseqüências das 
artes de vanguarda na pós-modernidade. Concluímos que o Absurdo teve conseqüências no 
período que denominamos pós-modernidade e que influenciou o Pós-Modernismo nas 
Relações Internacionais.
Palavras-chave: Teatro do Absurdo; Pós-Modernismo em Relações Internacionais; 
desconstrução.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 1
1 O PÓS-SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E A SOCIEDADE EUROPÉIA: O 
“ABSURDO” DA CONDIÇÃO HUMANA ............................................................................ 4 
2 O TEATRO DO ABSURDO .............................................................................................. 21
 3 O ABSURDO E O PÓS-MODERNISMO – O “DISCURSO DOS DISSIDENTES” ...... 34 
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................. 49 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 52
INTRODUÇÃO
A proposta da presente monografia é a de identificar as relações existentes entre o 
Teatro do Absurdo e as Relações Internacionais. A princípio, pode parecer um tanto estranho um 
estudo que se propõe a executar essa tarefa, pois as duas áreas encontram-se claramente 
separadas quando pensamos onde estão localizadas dentro dos campos de conhecimento e 
retomamos seus objetivos e finalidades.
Em um primeiro momento, nos chamará atenção, ao analisarmos as páginas a seguir e os 
textos sobre as relações internacionais de modo geral, as influências do teatro nas terminologias 
adotadas na disciplina. Alguns exemplos disso são as palavras ator, palco, cenário, protagonista, 
e as expressões teatro de operações e “estado da arte”.
Este trabalho, entretanto, busca relações mais significativas que os exemplos dados 
acima. Sua importância reside no fato de que esta pesquisa procura intensificar os debates acerca 
das possibilidades e da necessidade de irmos além da interdisciplinaridade no escopo das 
ciências sociais, área do conhecimento em que as Relações Internacionais estão inseridas. 
O objetivo central deste estudo é o de suscitar uma discussão epistemológica que 
ultrapasse as fronteiras “permitidas” para a produção de conhecimento no campo das Relações 
Internacionais e nos possibilite investigar os elementos propostos nesta pesquisa em prol da tão 
falada emancipação.
Os meios que foram utilizados para atingir o objetivo deste estudo são uma combinação 
de diversos elementos que permeiam as mais variadas esferas do conhecimento: do teatro ao 
campo teórico das Relações Internacionais, passando pela História, História da Arte, Economia, 
Sociologia, Política, entre outras.
Além disso, este trabalho busca evidenciar que a linha que separa o que é do que não é 
“ciência” nas Relações Internacionais, e nas ciências sociais em geral, é muito controversa e não 
considera aspectos importantes que envolvem o estudo desta disciplina. Vale ressaltar que as 
Relações Internacionais não estudam fenômenos mensuráveis como o faz a Química e a Física, 
mas, sim, relações sociais complexas que são executadas por pessoas, e pessoas que agem, 
muitas das vezes, de forma imprevisível e não podem ter seu comportamento equiparado a 
átomos ou astros.
2
Faz-se necessário registrar que esta monografia só é passível de realização nesse 
momento porque, ao final da década de 1980, as Relações Internacionais passaram por um 
período que ficou conhecido por “terceiro debate”. Até então, apenas teorias fundamentadas 
nas epistemologias positivistas compunham a disciplina e disputavam a atenção e a escolha dos 
acadêmicos no escopo das Relações Internacionais. O terceiro debate trouxe à tona as teorias 
denominadas pós-positivistas e a idéia de se ter a teoria passou a ser algo difícil de se imaginar. 
É justamente neste debate que surge o Pós-Modernismo, que será nosso grande aliado para que a 
proposta apresentada acima seja concluída.
A divisão dos capítulos foi feita de acordo com a cronologia histórica dos acontecimentos 
abordados no intuito de propiciar, em primeiro lugar, o entendimento do cenário em que surgiu 
não apenas o Teatro do Absurdo, mas também as Relações Internacionais como disciplina. Em 
seguida, apresentamos o Absurdo desde seus movimentos precursores para, logo adiante, 
relacionarmos essa corrente teatral com o estudo dos fenômenos internacionais. Essa 
estruturação, e aqui me arrisco a escrever o óbvio, julgando que pode não ser tão óbvio assim,
sugere que o segundo capítulo seja entendido a partir do primeiro e o terceiro, considerando o 
primeiro e o segundo capítulos.
O primeiro capítulo trata da situação vivida na Europa, especialmente na Grã-Bretanha, 
após a Segunda Guerra Mundial e tem por objetivo principal apresentar uma contextualização 
histórica da configuração da sociedade européia após a guerra, expondo o cenário em que o 
Absurdo desenvolve suas idéias. Inicia-se falando brevemente sobre o início da Segunda Grande 
Guerra e se avança com os desfechos e desdobramentos do conflito. A seguir, para abordar o 
tema do declínio do Império Britânico, escolheu-se o episódio da crise do Canal de Suez por se 
tratardo “suspiro final” desse Estado como potência mundial. Em continuidade à abordagem 
sobre a Grã-Bretanha, características da sociedade britânica na época são discutidas para reforçar 
a situação social à qual o Absurdo se opunha. 
O segundo capítulo coloca em cena o Teatro do Absurdo. Nele são trabalhados os 
aspectos gerais do Absurdo que vão dos movimentos que o antecederam e o influenciaram até o 
surgimento de suas primeiras peças na década de 1950. Passa-se, então, ao afunilamento do tema 
com a abordagem de um de seus autores principais, Eugène Ionesco, e a primeira peça “absurda” 
deste autor, A Cantora Careca. A escolha de Ionesco se deu pelo fato do autor escrever suas 
peças, em especial a peça mencionada acima, voltadas à crítica do que ele chamava de “pequena 
burguesia universal”. A peça abordada no capítulo em questão não apenas critica a burguesia de 
forma geralizada, mas ataca diretamente a burguesia britânica. Essas escolhas acompanham o 
diagnóstico apresentado no capítulo 1. 
3
Finalmente, o Teatro do Absurdo e o Pós-Modernismo são apresentados com ênfase na 
“desconstrução” dos paradigmas existentes no teatro e no estudo das Relações Internacionais, 
assim como as conseqüências das artes de vanguarda, contexto no qual o Absurdo se encontra 
inserido, na era que denominaremos pós-modernidade.
1 O PÓS-SEGUNDA GUERRA MUNDIAL E A SOCIEDADE 
EUROPÉIA: O “ABSURDO” DA CONDIÇÃO HUMANA
Iniciada no dia 1° de setembro de 1939, com a invasão da Polônia pela Alemanha, a 
Segunda Guerra Mundial só atingiu suas proporções mundiais no ano de 1941, quando, 
segundo Saraiva, “as duas guerras paralelas, na Europa e na Ásia, juntar-se-iam (...), depois da 
invasão alemã à União Soviética e do ataque japonês à base americana de Pearl Harbor, para 
transformar radicalmente o curso das relações internacionais”.1
A partir disso, “(...) em um único ano [1941], as regras do jogo herdadas do século 
anterior” desmoronaram e “o vazio de poder mundial começou a ser preenchido”. Com “a 
França invadida e a Grã-Bretanha falida evidenciavam [-se] a decadência das antigas 
potências” e uma nova balança de poder no cenário internacional começava a ser 
estabelecida.2
Nesse contexto, o declínio naval britânico e a crise do mercado financeiro, antes 
comandado por Londres, vinham confirmar “(...) a derrocada das relações internacionais do 
mundo liberal que se construíra no século XIX [mundo este construído e liderado pela própria 
Grã-Bretanha] e do sistema de dominação que havia globalizado as relações entre os povos 
(...). Os indícios da agonia apareciam por todos os lados, dentro e fora da Europa”.3
A crise britânica era observada pelos Estados Unidos de forma preocupante, afinal, “a 
Grã-Bretanha era a última resistência democrática européia às ambições hegemônicas de 
Hitler”. A resistência britânica era vista ainda pela opinião pública norte-americana não 
apenas como uma forma de manter o seu poder internacional, “(...) mas para preservar um 
conjunto de valores e regras que haviam alimentado a vida internacional do mundo liberal e 
democrático”.4
 Enquanto os Estados preocupavam-se com suas áreas de influência no mundo e, 
alguns, com sua própria existência, a humanidade passava, principalmente no cenário 
europeu, por uma das piores, senão a pior, situações já vistas. A era de desespero e total falta 
 
1 SARAIVA, José Flávio Sombra. “A agonia européia e a gestação da nova ordem internacional (1939-1947)”. 
In: Relações Internacionais Dois Séculos de História. Volume I. Brasília: IBRI, 2001. p. 222.
2 Ibidem, p. 233.
3 Ibidem, p. 231.
4 Ibidem, p. 234.
5
de esperança que atingia as pessoas trazia à tona a triste realidade de que a humanidade não 
estava aprendendo com as experiências passadas, que não havia aprendido nada com a 
Primeira Guerra Mundial. Como escreve o autor Adam Watson, “diz-se às vezes que o 
sofrimento torna os homens sábios. Isso não aconteceu na Primeira Guerra Mundial”.5
Ocorreram fatos inesquecivelmente terríveis que abalaram a vida dos que viram de 
perto os horrores da guerra e deixaram marcas em suas vidas e nas de suas famílias, assim 
como nas sociedades que apenas presenciaram os absurdos cometidos. Um dos exemplos que 
pode ser citado é o dos campos de concentração, que retiravam a dignidade, a identidade e 
qualquer traço de sanidade do indivíduo. Nas palavras de Vincent:
Como se sobreviver no campo de concentração? A negação da identidade é 
imediata: a tosquia, as roupas do deportado, a retirada de qualquer objeto 
pessoal – principalmente a aliança. Não resta um traço daquilo que indicava 
a situação social do indivíduo. Nova relação com o tempo: o futuro já não é 
pensado em termos de meses ou semanas, mas de dias, às vezes de horas.6
Hannah Arendt, citada por Gérard Vincent, complementa o pensamento acima 
escrevendo que “nada pode se comparar à vida nos campos de concentração [...] nenhum 
relato consegue expô-la plenamente, pela simples razão de que o sobrevivente volta ao mundo 
dos vivos, o que o impede de acreditar inteiramente em suas experiências passadas”.7
Em 2 de setembro de 1945, a Segunda Guerra Mundial teve seu fim anunciado 
oficialmente com um saldo de cinqüenta milhões de pessoas mortas e mais de dez milhões 
que passaram por campos de concentração e extermínio.8 Segundo Landes, “alguns 
sobreviventes consolaram-se com a esperança de que a guerra tornara-se algo impensável no 
futuro. Outros alimentaram feridas incuráveis e ressentimentos insuperáveis. Ainda outros 
dispuseram-se a encetar a tarefa de criar um mundo melhor”.9
Os danos ocasionados à Europa e ao Japão pela guerra permitiram aos Estados Unidos 
e à União Soviética ocupar o lugar e as funções antes reconhecidamente européias10, “(...) o 
 
5 WATSON, Adam. “O colapso da dominação européia”. In: A evolução da sociedade internacional: uma 
análise histórica comparativa. Tradução de René Loncan. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004. p. 
392.
6 VINCENT, Gérard. “Uma história do segredo?”. In: PROST, Antoine; VINCENT, Gérard (Org.). História da 
Vida Privada: da Primeira Guerra a nossos dias. Tradução de Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das 
Letras, 1995. p. 226.
7 ARENDT, Hannah. As origens do totalitarismo. Apud VINCENT, Gérard, op. cit., pp. 223-224.
8 SARAIVA, José Flávio Sombra, op. cit., p. 253.
9 LANDES, David S. “Vencedores e...” In: A Riqueza e a Pobreza das Nações. 6 ed. Tradução de Álvaro Cabral. 
Rio de Janeiro: Campus, 1998. p. 525.
10 WATSON, Adam. “A Era das Superpotências e da Descolonização”. In: A evolução da sociedade 
internacional: uma análise histórica comparativa. Tradução de René Loncan. Brasília: Editora Universidade 
de Brasília, 2004. p. 401.
6
mundo depois de 1945 estava dividido pela rivalidade entre países burgueses, capitalistas, por 
um lado, sociedades socialistas e comunistas, por outro”.11
De acordo com Hobsbawm, “a Segunda Guerra Mundial mal terminara quando a 
humanidade mergulhou no que se pode encarar, razoavelmente, como uma Terceira Guerra 
Mundial, embora uma guerra muito peculiar”, onde “gerações inteiras se criaram à sombra de 
batalhas nucleares globais que, acreditava-se firmemente, podiam estourar a qualquer 
momento, e devastar a humanidade”. O autor continua dizendo que até “(...) mesmo os que 
não acreditavam que qualquer um dos dois lados pretendia atacar o outro achavam difícil não 
ser pessimistas, pois a Lei de Murphy12 é uma das mais poderosas generalizações sobre as 
questões humanas”.13
O tempo passava e cada vez mais coisas podiam dar errado, tanto política quanto 
tecnologicamente, “(...) num confronto nuclear permanente baseado na suposição deque só o 
medo da ‘destruição mútua inevitável’ (adequadamente expresso na sigla MAD, das iniciais 
da expressão em inglês – mutually assured destruction)” poderia impedir um dos lados a “(...) 
dar o sempre pronto sinal para o planejado suicídio da civilização”. Isso não ocorreu, contudo, 
pareceu uma possibilidade diária durante quarenta anos.14
Segundo Gérard Vincent, a partir do final da Segunda Guerra Mundial, “(...) o homem 
passa a ter razões ‘objetivas’ para desesperar”, pois “até então, ‘o som e a fúria’ podiam ser 
imputados à escassez de bens”, fato que havia sido vencido com o progresso técnico que 
garantia que “todos poderiam [grifo meu] ter alimentos, roupas, abrigo”. Notem que, no
entanto, o autor se refere ao acesso à comida, roupas e abrigo de forma que “todos poderiam” 
e não como todos puderam, uma vez que a “(...) vitória sobre a escassez não se universalizou: 
o Terceiro e o Quarto mundos morrem de fome. Os excedentes são atirados ao mar”.15
Por outro lado, há “(...) quem diga que existe uma razão para nutrir esperanças: desde 
os anos 50, o homem tem o poder de destruir o mundo e não o destrói. Exato. O medo tem 
salvado a humanidade do apocalipse. (...) Assim, a Terra é dominada pelo egoísmo e pelo 
medo”.16 Seria esse um motivo para se nutrir esperanças mesmo?
Como retrato mais evidente dessa época, podemos apontar dois fatores: o fim da 
supremacia européia e “o surgimento de uma nova ordem internacional, que elevou dois 
 
11 LANDES, David S., op. cit., p. 525.
12 Segundo o autor, a “Lei de Murphy” pode ser entendida a partir da seguinte assertiva: “Se algo pode dar 
errado, mais cedo ou mais tarde vai dar”. (HOBSBAWM, Eric. 1995, p. 224)
13 HOBSBAWM, Eric. “Guerra Fria”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São Paulo: 
Companhia das Letras, 1995. p. 224. 
14 Idem.
15 VINCENT, Gérard, op. cit., p. 237.
16 Idem.
7
países fora das fronteiras européias17 ao ocidente e ao oriente à condição de superpotências 
(...)”.18 Ou seja, França e Grã-Bretanha perderam espaço no cenário internacional como 
potências mundiais e cederam lugar para Estados Unidos (EUA) e União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS). Esse período ficou conhecido por “Guerra Fria”.
Apesar da situação descrita acima, o final da Segunda Guerra foi seguido por quatro 
décadas (de 1945 a 1985) onde a ordem e a autoridade foram elementos muito mais 
constantes que no período anterior. Foi nessa época que as economias capitalistas ocidentais 
“(...) deixaram para trás a Grande Depressão e as perdas do tempo de guerras, e ingressaram 
num período de crescimento sem precedentes”.19
“O Império Britânico, onde o sol nunca se punha, ocupava vastas zonas em todos os 
continentes e depressa se viu envolvido em mais do que um simples apoio logístico à Grã-
Bretanha”.20 As colônias britânicas desempenhavam um papel de grande importância, 
principalmente em tempos de guerra, pois além de servirem de suporte em termos de 
matérias-primas e apoio naval (exemplos disso são Austrália, Nova Zelândia, Canadá e África 
do Sul), também garantiam o equilíbrio financeiro do Império que corria riscos em função dos 
esforços de guerra (Índia e Egito, por exemplo).
Essa realidade, entretanto, vinha sendo ameaçada há algum tempo. O declínio das 
potências européias não está historicamente delimitado por um período exato que indica 
quando esse fenômeno realmente ocorreu. Na verdade, nem para os velhos impérios esse 
momento estava totalmente claro depois da Segunda Guerra Mundial.21 Entretanto, é certo 
que, desde a Primeira Guerra, a Europa já era vista como “um império destinado a cair como 
metáfora de uma elite cultural ocidental minada e em desmoronamento ela própria (...)” e que 
“(...) essas imagens há muito rondavam os escuros desvãos da imaginação centro-européia”.22
O fenômeno da descolonização, que vinha se fortalecendo e ganhando legitimidade, 
“(...) foi parte da maré baixa mais fundamental do poder europeu”. A doutrina de 
autodeterminação ganhava espaço nos meios internacionais, primeiramente no âmbito da Liga 
das Nações e, posteriormente, das Nações Unidas, em detrimento à doutrina imperialista. A 
 
17 Aqui, vale fazer uma observação na afirmação do autor quando o mesmo coloca que dois países “fora das 
fronteiras européias” foram elevados à condição de superpotências, pois não podemos desconsiderar que boa 
parte da União Soviética era formada por países europeus.
18 SARAIVA, José Flávio Sombra, op. cit., p. 221.
19 LANDES, David S., op. cit., p. 526.
20 FARIA, Luísa Leal de. “O Pós-Guerra”. In: Sociedade e Cultura Inglesas. Lisboa: Universidade Aberta, 1996. 
p. 557.
21 HOBSBAWM, Eric. “O fim dos impérios”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 218.
22 HOBSBAWM, Eric. “As artes 1914-45”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 188.
8
disseminação do conceito de descolonização geral deu-se de forma rápida no período entre-
guerras.23
O historiador Marc Ferro coloca que o fenômeno da descolonização não teve como 
única causa a luta dos povos para tal, mas também o questionamento da própria população da 
metrópole sobre quanto e quê rendiam as colônias e as rivalidades entre as potências. Ferro 
aponta ainda que “(...) foram sobretudo as pressões externas das duas superpotências, após 
1945, que contribuíram para o fim do tempo das colônias”.24 Dessa maneira, podemos indicar 
três conjuntos de fatores que levaram ao “eclipse dos Impérios”:
(...) a exigência dos povos colonizados, o questionamento, na metrópole, das 
vantagens do expansionismo, e, por último, a pressão vinda de fora, de 
concorrentes ou de novas potências que lançavam um desafio.
Assim, a forte ascensão dos Estados Unidos e da URSS, e a afirmação 
do nacionalismo árabe juntaram-se, durante a crise de Suez, para selarem a 
decomposição dos Impérios Francês e Britânico, já avançada, doravante 
irreversível.25
Na Inglaterra, especificamente, enquanto os meios de comunicação social da época 
“(...) começavam a oferecer matéria para reflexão inquieta, outros elementos que reflectem 
angústia, mal-estar ou apenas desajustamento começavam a tornar-se visíveis na sociedade e 
na cultura dos anos cinquenta e sessenta”. Luísa Leal de Faria coloca que “por volta de 1955-
1956 começam a emergir sinais de ruptura e de mudança que, em pouco tempo, iriam 
transformar o país [Grã-Bretanha]”. A autora também aponta “(...) a crise do Suez como 
indicador visível de rupturas que, de modo invisível, vinham preparando profundas 
transformações”.26
Em 1956, Grã-Bretanha e França planejam, juntamente com Israel, uma operação 
militar com o objetivo de derrubar o governo revolucionário do coronel Nasser, no Egito. 
Segundo Hobsbawm, a tentativa nasce fadada ao insucesso, mais do que realmente britânicos 
e franceses tinham noção. “O episódio foi um fracasso catastrófico (exceto do ponto de vista 
de Israel), tanto mais ridículo pela combinação de indecisão, hesitação e inconvincente 
desfaçatez do primeiro-ministro britânico, Anthony Eden”. O autor indica que a operação foi 
 
23 WATSON, Adam. “A Era das Superpotências e da Descolonização”. In: A evolução da sociedade 
internacional: uma análise histórica comparativa. Tradução de René Loncan. Brasília: Editora Universidade 
de Brasília, 2004. pp. 410-411.
24 FERRO, Marc. “Libertação ou Descolonização” In: História das Colonizações: das conquistas às 
independências, séculos XIII a XX. Tradução Rosa Freire d’Águiar. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. 
p. 346.
25 Ibidem,pp. 356-357.
26 FARIA, Luísa Leal de, op. cit., p. 563.
9
mal lançada e acarretou em conseqüências desastrosas para os anglo-franceses: a operação foi 
cancelada por intervenção dos EUA, “empurrou” o Egito para a área de influência soviética 
“(...) e acabou para sempre o chamado ‘Momento da Grã-Bretanha no Oriente Médio’, a 
época de inquestionada hegemonia britânica naquela região instaurada a partir de 1918”.27
Os antecedentes da crise se dão em 1954, quando da rejeição, por parte da Assembléia 
Nacional francesa, do tratado da Comunidade Européia de Defesa (CED). Tal atitude cria nos 
Estados Unidos uma desconfiança com relação à França, cujas conseqüências puderam ser 
vistas na crise de Suez. Na região do Oriente Médio, os norte-americanos têm interesse de que 
o Pacto de Bagdá, também conhecido por MEDO (Middle East Defense Organization), seja 
assinado por Iraque, Jordânia, Irã, Turquia e Egito. Para tal, contam com a colaboração 
inglesa para que o pacto seja aderido por Iraque e Jordânia e se empenharão pessoalmente 
para que os demais países assinem o acordo.28
Dessa forma, o secretário de Estado norte-americano Foster Dulles se encontra com o 
coronel Nasser, “(...) o contexto é favorável, já que aos militares egípcios não faltaram 
contatos nos Estados Unidos, antes de organizarem seu Putsch contra o rei Faruk, identificado 
com a Inglaterra”. Contudo, “(...) quando Foster Dulles menciona a necessidade de o ‘mundo 
livre’ se unir contra a URSS, Nasser responde que, ‘para ele, solidariedade do mundo livre 
significa imperialismo e dominação’”.29 O Egito impôs a condição de somente aderir ao 
MEDO quando a Inglaterra se retirasse de seu território.
Nessa época se iniciou a era do “quem-dá-mais”. Enquanto a URSS fornecia armas 
para o Egito, os EUA prometiam realizar o sonho de Nasser de construção da barragem de 
Assuã, com um custo estimado de 1 bilhão de dólares norte-americanos. Mesmo com 
contribuições do BIRD (Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento), dos 
EUA e da Grã-Bretanha, o empreendimento estava longe de ser concretizado em função de 
seu custo gigantesco. 
Nessas circunstâncias, Nasser recusou o empréstimo do BIRD (de US$200 milhões) 
devido às condições impostas por este, pediu ajuda à URSS e multiplicou seus gestos 
inamistosos com relação aos EUA: reconhecimento da China comunista e um acordo militar 
com a Síria. Foster Dulles anulou, então, o empréstimo do BIRD ao Egito (em 19 de julho de 
1956) e a contribuição dos EUA para a construção da barragem, e foram seguidos pela recusa 
britânica. Nasser se surpreendeu com essa forma “insultante”, pois os EUA alegaram “a não-
 
27 HOBSBAWM, Eric. “O fim dos impérios”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 218.
28 FERRO, Marc, op. cit., pp. 357-358.
29 Ibidem, p. 358.
10
fiabilidade dos eventuais devedores egípcios” para o cancelamento dos empréstimos. Como 
resposta, Nasser anuncia, dois dias depois, a nacionalização da Companhia do Canal de Suez 
para o financiamento das obras de Assua. Mais que atingir os norte-americanos, a decisão de 
Nasser visava à Inglaterra. Mas os egípcios não imaginavam o quanto a França também se 
identificava com Suez.30
A Grã-Bretanha estava inconformada em ter se tornado “o brilhante auxiliar dos 
Estados Unidos”. Considerava que havia “(...) ‘defendido’ duas vezes o Egito e o canal de 
Suez: em 1917, contra os turcos, e em 1942, contra Rommel31 e os italianos” e argumentava 
que o Egito não era livre desde o tempo dos faraós. Daquela época até hoje já haviam sido 
dominados por diversos povos: gregos, romanos, bizantinos, árabes, turcos, franceses. Os 
britânicos insistiam que ocupavam o Egito para defendê-los (os próprios egípcios) melhor.32
Do lado egípcio, a ‘proteção’ inglesa teria sido recusada durante a Segunda Guerra 
Mundial, “(...) conforme demonstraram as rumorosas manifestações que saudaram as vitórias 
de Rommel em 1941... Por conseguinte, os ingleses julgaram que, uma vez terminada a 
guerra, deviam sair do Egito”. Entretanto, em 1947, ao partirem do Cairo, os britânicos 
conseguiram que Ismaília e a zona do canal de Suez fossem novamente ocupadas 
militarmente a pretexto de “(...) evitar qualquer ameaça estrangeira contra a Turquia ou o 
mundo árabe; tratava-se, é evidente, da URSS, mas isso também pareceu um pretexto”.33
Apesar de a Grã-Bretanha ter-se retirado do Egito antes da data prevista, as relações 
com os generais Neguib e Nasser, no poder desde 1952, sofreram uma deterioração muito 
rápida. “Os ingleses queriam continuar a desempenhar, em Suez e no Egito em geral, o papel 
de padrinhos privilegiados, e, sobretudo, manter o país submetido às suas regras do jogo, 
considerando como intrusos os novos dirigentes que eles não conseguiam controlar”. 
Entretanto, os ingleses sentiam que a retirada do Egito não era resultado de um acordo, mas 
“obrigatória e forçada”.34
O objetivo da Grã-Bretanha era evitar que Nasser tornasse o Sudão uma colônia do 
Egito, enquanto “(...) Nasser e seus oficiais livres encarnavam um mundo árabe novo (...), o 
 
30 Ibidem, pp. 358-359.
31 Erwin Rommel foi um importante oficial do exército alemão na Segunda Guerra Mundial. Foi ele quem 
comandou o “Afrika Korps” (entre os anos de 1941 a 1943), um destacamento alemão responsável por 
auxiliar as tropas italianas a retirarem o exército britânico do Norte da África. 
32 FERRO, Marc, op. cit., p. 359.
33 Idem.
34 Ibidem. pp. 359-360.
11
da pequena burguesia intelectual e militar: o novo contra o velho, o que explica a atração que 
a revolução nasserista exercia sobre a pequena burguesia síria e iraquiana (...)”.35
A popularidade de Nasser aumentou. O rei Hussein da Jordânia, por exemplo, negou-
se a aderir ao pacto de Bagdá que acabava de assinar com Ancara (Turquia). Os britânicos 
tiveram que se retirar do canal e, em julho de 1956, ocorreu a nacionalização de Suez. Esse 
episódio foi considerado pela França um insulto, afinal, o canal era uma “(...)‘obra francesa’, 
inaugurada pela imperatriz Eugénie, relacionada ao nome de Ferdinand de Lesseps, que nova 
afronta! ‘Um desafio’, foi a manchete de Le Monde. ‘Como Hitler ele agiu, como Hitler ele 
morrerá’, opinou Le Quotidien, acrescentando: ‘É preciso reocupar o canal’”. E para realizar 
essa missão, os franceses tinham a ajuda de Israel.36
A aliança entre França e Israel teve de ser aceita por Londres, afinal, Paris, que havia 
fornecido armas aos israelenses “(...) para compensar as entregas feitas a Nasser pelos 
‘tchecos’ [na verdade, quem forneceu armas para o Egito foi a URSS. Entretanto, esta não 
queria criar problemas com os EUA e mandou as armas destinadas ao Egito endereçadas à 
Tchecoslováquia], considerou que, diante do inimigo comum, Israel poderia servir de aliado 
de retaguarda, e impôs essa condição para intervir ao lado dos ingleses”. A Grã-Bretanha não 
tinha muita escolha, pois um terço de seus navios passava pelo canal e a situação que se 
apresentava prenunciava que o petróleo poderia faltar. Uma ação militar imediata foi 
cogitada, mas tanto britânicos quanto franceses não tinham um corpo militar disponível para 
tal.37
Os EUA defendiam o Egito dizendo que Nasser tinha o direito de nacionalizar a 
empresa e que resolveriam o problema da passagem dos navios. Não concordavam com os 
caminhos propostos por Grã-Bretanha e França para colocar Nasser nos trilhos. De outro lado, 
Nasser começava a se perguntar qual era o significado da atitude norte-americana e Dulles 
respondia “que se negava a identificar a política de seu país com a defesa dos interesses das 
antigaspotências”.38
Diante disso, a Inglaterra resolveu aceitar a colaboração de Israel proposta pela França 
e foram negociadas as convenções de Sèvres, em segredo. 
A idéia era deixar Israel atacar o Egito, e depois intervir para salvar a paz. 
Assim, aos olhos dos árabes os ocidentais não teriam se ‘sujado’ 
colaborando com Israel. Ben Gurion e Shimon Peres aceitavam essa 
 
35 Ibidem. pp. 359-361.
36 Ibidem, pp. 362-363.
37 Ibidem. pp. 363-364.
38 Idem.
12
proposta humilhante porque ela ‘garantiria a segurança de Israel’; quanto à 
França e à Inglaterra, ‘ambas recuperariam sua influência no Oriente’. A 
idéia era ganhar a guerra sem fazê-la, deixando a iniciativa por conta dos 
israelenses, e a pesada armada franco-inglesa teria apenas que ajudar na 
missão.39
A ofensiva israelense deu-se no dia 29 de outubro de 1956, com a invasão do Sinai 
pelas tropas israelenses, surpreendendo os egípcios que partiram em debandada. Entretanto, 
não estava previsto que Nasser “iria fazer-se de mártir” frente à comunidade internacional. 
Britânicos e franceses, que planejaram o desembarque para o dia 6 de novembro, não queriam 
dar a impressão, perante o mundo árabe, de que eram solidários a Israel.40 
O intervalo foi fatal, “(...) pois toda a máquina da ONU entrou em ação (...) e Foster 
Dulles conseguiu aprovar uma resolução contra a intervenção”. A URSS, por sua vez, enviava 
no dia 5 “(...) uma ‘nota’ cominativa a Guy Mollet [França], a Eden, a Ben Gurion [Israel], 
dizendo que (...) estava ‘disposta a utilizar todas as formas modernas de armas destrutivas 
caso não se pusesse um fim à expedição’”. As tropas anglo-francesas, que já haviam 
desembarcado e avançavam em direção a Suez, tiveram que parar, “(...) pois Londres e Paris 
cederam às injunções da ONU, de Washington e de Moscou”.41
 Logo depois se soube que a URSS não seria capaz de cumprir sua ameaça.
As conseqüências foram as piores possíveis, uma vez que “a opinião do mundo voltou-
se contra o Reino Unido, incluindo a opinião dos Estados Unidos, gerando instabilidade na 
libra, cessação dos abastecimentos de petróleo, e a retirada humilhada das tropas britânicas, 
censuradas pelas Nações Unidas”.42
Para a Grã-Bretanha, a crise de Suez não só deixou nítida a sua situação de ex-grande 
potência, mas também o fato de que ela não poderia mais agir sem o aval dos Estados Unidos, a 
grande potência do Ocidente agora. Desse modo, “Suez selava (...) o fim do regime colonial da 
Grã-Bretanha no mundo árabe”.43 As constatações numéricas desse novo status podem ser 
verificadas a seguir: “globalmente, de 1950 a 1970, o comércio da Grã-Bretanha com seu 
Império passou da metade ao quarto do total de seu intercâmbio”. Houve uma reorientação 
completa, notou-se um desengajamento econômico “(...) que manifestava o relativo desinteresse 
por um sistema de relações que se esgotara, e ao qual se substituíra uma interconexão mais 
dinâmica com parceiros europeus, americanos ou japoneses. Assim chegava ao fim um sistema 
 
39 Ibidem. pp. 364-365.
40 Ibidem. p. 365.
41 Idem.
42 FARIA, Luísa Leal de, op. cit., p. 563.
43 FERRO, Marc, op. cit., pp. 365-366.
13
global mundial cujo eixo fora a Grã-Bretanha”.44
Suez serviu também para trazer à tona o surgimento de um Terceiro Mundo, que se 
consolidava mais para explorar a rivalidade entre EUA e URSS do que para buscar uma 
identidade própria. Suas conseqüências podem ser observadas no endurecimento da atitude 
francesa frente à Argélia, levando ao golpe de Estado de 13 de maio de 1958; De Gaulle 
tomava atitudes incertas, até mesmo para os mais próximos, perante as lutas de libertação das 
colônias francesas; os conservadores britânicos ficaram desestabilizados em função da 
descolonização, o que levou Anthony Eden a pedir demissão; “as metrópoles subscreveram-
se, de tal maneira havia sido forte a impacto dos acontecimentos no Oriente Médio... Como 
se, positivamente, a Europa tivesse entregado os pontos”.45
Entretanto, de acordo com Luísa Leal de Faria, para a sociedade inglesa em si “(...) o 
processo de cedência de autonomia fora cumprido sem grande dor nem saudade, sem reflexos 
sociais ou ideológicos dignos de registo”.Uma prova disso é a de que não se encontraram 
indícios, no plano global, de que a imaginação nacional tenha sido afetada pela queda do 
Império, sendo que apenas nos anos oitenta o cinema e a televisão britânicos retomaram com 
uma dose de nostalgia a temática da desintegração imperial.46
 “O capitalismo e a sociedade burguesa transformaram e dominaram o mundo, e 
ofereceram o modelo – até 1917 o único [grifo do autor] modelo – para os que não queriam 
ser devorados ou deixados para trás pela máquina mortífera histórica”.47 Entretanto, após a 
Segunda Guerra Mundial, a situação na Grã-Bretanha já não era a mesma de outrora. O que se 
pode verificar é que, nos anos que se seguiram ao final da guerra, houve uma reorientação no 
modelo de sociedade, embasada por uma filosofia de fundamento socialista, a que deram o 
nome de Estado de Providência.48
O Estado de Providência pode ser mais bem entendido se o apresentamos em cinco 
objetivos gerais: a) garantia a todos, em qualquer ocasião, de “um nível de vida decente”49; b) 
proteção a todos os cidadãos das oscilações da vida cotidiana, como doença e desemprego, 
por exemplo; c) contribuição para que as famílias se desenvolvam, por meio de “abonos de 
família”; d) melhoramentos nas áreas de educação e saúde como serviços públicos; e e) 
 
44 Ibidem, p. 351. 
45 Ibidem. p. 366-367.
46 FARIA, Luísa Leal de, op. cit., p. 563.
47 HOBSBAWM, Eric. “O fim dos impérios”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 199.
48 FARIA, Luísa Leal de, op. cit., p. 558.
49 “Decente” aqui pode ser entendido, de acordo com a autora, como viver “sem que o mínimo necessário à 
subsistência tivesse que ser ganho através de um emprego”. Ibidem. p. 559.
14
desenvolvimento e melhoria das instituições públicas para a conseqüente melhoria da vida da 
população.50 
Para se ter uma idéia melhor sobre a situação da sociedade inglesa depois da Segunda 
Guerra, podemos citar o livro do escritor britânico Ernest Watkins que foi escrito para o 
público norte-americano e originado de perguntas enviadas por um amigo americano sobre a 
vida do povo britânico após 1945. 
O amigo americano de Watkins enviou as seguintes perguntas: 1) Tratou-se de uma 
crise longa ou não? 2) O que é este socialismo que os Ingleses parecem apreciar e nós não? 3) 
Os doces ainda são racionados? 4) Por que é que os vossos sindicatos não gostam de salários 
altos nem da grande produção? 5) E como se sentem por terem perdido um império quase de 
um dia para o outro?51
Watkins respondeu apresentado a situação em Inglaterra como numa peça de 
teatro. O cenário era simples: <<A cortina levanta-se sobre uma fábrica 
parcialmente destruída. O chão está cheio de envólucros de granadas por 
acabar. No telhado, parte do material usado para esconder as luzes à noite foi 
violentamente arrancado.>>52
Para a primeira pergunta, a resposta de Watkins “(..) foi que apesar de <<não ter sido 
uma crise longa>>, houvera uma terrível crise dos combustíveis em 1947, que forçou os ingleses 
a sofrerem os rigores do Inverno sentados à frente de lareiras quase vazias (...)” e, dois anos mais 
tarde, houve “(...) uma crise ainda mais alarmante, (...) quando o défice das trocas em dólares 
duplicou e Sir Stafford Cripps, o austero Chanceler da época, decidiu desvalorizar a libra 
drasticamente (baixando o câmbio de 4,04 dólares para 2,8)”.53
A resposta paraa terceira pergunta foi que realmente “(...) o açúcar estava ainda 
racionado (e continuou a estar até 1954). De facto, observara-se uma deterioração da situação 
dos consumidores domésticos após 1945: o pão, que não fora racionado mesmo nos piores dias 
da guerra, foi-o entre Julho de 1946 e Julho de 1948; e o mesmo aconteceu às batatas, em fins de 
1947”.54
Com relação às segunda, quarta e quinta perguntas, as respostas eram mais complicadas. 
No ano de 1945 foi eleito um governo trabalhista com larga maioria de votos. A 
direção do governo ficou a cargo de Clement Attlee (393 lugares no parlamento contra 213). 
“Este governo realizara um ensaio de nacionalização da indústria, ao mesmo tempo que 
 
50 Idem.
51 BRIGGS, Asa. “Pobreza e Progresso”. In: História Social de Inglaterra. Tradução de Eduardo Nogueira. 
Lisboa: Editorial Presença, 1998. p. 278.
52 Ibidem. p. 279.
53 Idem.
54 Idem.
15
reorganizava a política social”. Porém, nas eleições seguintes de 1950, mesmo ano do início 
da Guerra da Coréia, os trabalhistas ganharam com uma pequena maioria (315 contra 298). 
“Tinha sido necessário recorrer a medidas de austeridade, mas apesar de esta necessidade ter 
sido expressa em termos claramente morais (...) tiveram um efeito progressivamente mais 
deprimente à medida que a vitória na guerra passava a segundo plano”.55
Passado algum tempo, a popularidade das medidas de bem-estar social promovidas 
pelo Governo deixaram “(...) de contrabalançar o carácter inaceitável daquelas medidas [as 
medidas de austeridade referidas no parágrafo anterior], e, em 1951, Churchill (...)”, que havia 
perdido votos nas eleições de 1945 em função de seu discurso anti-socialista, “(...) conseguiu 
recuperar o poder quando disse ao eleitorado que devia escolher entre degraus de escada (que 
todos podiam subir) e filas de espera (onde todos ficariam à espera daquilo a que tinham 
direito)”.56
Churchill declarava ainda que “(...) o socialismo só tornava os homens iguais na 
medida em que os tornava miseráveis”. O partido trabalhista ficou dividido com relação à 
qual estratégia deveria seguir “(...) e o mesmo se passou com os seus membros de base, 
acabando o partido por aceitar a derrota apesar de os seus 48,8 por cento de votos lhe terem 
dado mais apoio do que recebido pelos conservadores”.57 O Partido Trabalhista não conseguiu 
voltar ao governo por treze anos.
Para a quarta pergunta, “(...) o autor notou que os sindicatos, que então dispunham mais 
de nove milhões de associados, regulavam os seus próprios assuntos e continuavam a apoiar 
firmemente o Partido Trabalhista e a sua direcção”. Entretanto, os sindicados não haviam 
conseguido alcançar sucesso na conversão de “(...) muitos dos seus membros da necessidade de 
eliminar as <<práticas restritivas>> na indústria, e quando elas eram postas em causa respondiam 
com as fraquezas da gestão”.58
Referente à perda do Império, Ernest Watkins respondeu que a reação popular na 
Inglaterra propriamente dita foi pouca, tanto a favor quanto contra. “Como H. G. Wells referiu 
em dada ocasião, o público conhecia pouco o Império – <<tão pouco como o que sabem da 
República Argentina ou do Renascimento italiano>>”.59 Um estudioso americano, já em 1948, 
havia calculado que o poder da Grã-Bretanha equivalia a um sétimo do poder norte-americano 
 
55 Idem.
56 Idem.
57 Idem.
58 Ibidem. p. 280.
59 Idem.
16
“(...) e em 1962 Dean Acheson60, numa posição de conforto relativo do outro lado do Atlântico, 
reconheceu que a Inglaterra perdera um Império – cuja existência os americanos nunca tinham 
aprovado – e que não tinha ainda encontrado o seu novo papel no mundo”.61
Com efeito, a América, que apoiara substancialmente a Grã-Bretanha 
durante a guerra, contribuíra também directamente para as dificuldades do 
país no pós-guerra ao não renovar o acordo de Empréstimo e Arrendamento 
(ao abrigo do qual cedera armamentos e serviços à Inglaterra), em 1945, e ao 
impor termos bastante restritivos para o empréstimo concedido a seguir à 
guerra (que foi negociado do lado inglês por J. M. Keynes). (...) A tentativa 
de auxiliar a Grã-Bretanha e os seus futuros rivais (e sócios a partir de 1973) 
europeus, através do programa Marshall lançado em 1947, veio já bastante 
tarde, não poupando a Inglaterra à carência de divisas e à crise monetária de 
1949.62
O autor passou por cima de questões relevantes, porém “o que lhe parecia mais 
importante, na perspectiva imediata dos fins dos anos 40, eram os contrastes <<favoráveis>> 
entre a Inglaterra passada e a presente, pelo menos no que se referia ao <<povo comum>>”. 
Há de se concordar que houve algum progresso na vida dos ingleses, estudos estatísticos 
apontavam para o aumento no rendimento dos cidadãos britânicos e alguns com índices muito 
maiores de rendimentos que dez anos antes.63
Nota-se, no entanto, que em 1951 o número de crimes atingiu seu valor máximo, 
sendo que esse número já havia aumentado em cinqüenta por cento durante a Segunda Guerra 
Mundial: “(...) enquanto, em 1938, uma em cada 100 pessoas do grupo etário das 14 aos 17 
anos cometera um crime, em 1951 o mesmo valor passara para uma em 50”.64
De acordo com Nietzche, “o que, a bem dizer, há de revoltante na dor não é a dor em 
si, mas a falta de sentido da dor [...]. Para poder expulsar do mundo a dor ocultada, irrevelada 
e sem testemunhas, para poder negá-la de boa-fé, foi então quase forçoso inventar deuses”.65
É fato que na Inglaterra do início da década de 1950 poucas pessoas afirmavam não ter 
religião.66
Os anos imediatos do final da Segunda Guerra Mundial foram marcados pela coesão e 
consenso. O Estado de Providência, desenvolvido entre os anos de 1945 e 1951 pelos 
trabalhistas, havia se tornado um símbolo da Inglaterra do período pós-guerra, “(...) com 
 
60 Dean Acheson foi Secretário de Estado norte-americano e teve importante participação no Plano Marshall.
61 BRIGGS, Asa, op. cit., p. 280.
62 Idem.
63 Ibidem. p. 281.
64 Ibidem. p. 287.
65 NIETZCHE, Friedrich. A genealogia da moral. Apud VINCENT, Gérard, op. cit., p. 231.
66 BRIGGS, Asa, op. cit., p. 296.
17
pleno emprego, possuidora de um individualismo temperado pela intervenção estatal, com 
garantia de direito ao trabalho e a um salário mínimo, com uma estrutura laboral reconhecida 
e eficaz”.67 Todavia essa estrutura começava a apresentar sinais de ruptura. 
Segundo François Bédarida, citado por Faria, três fatores contribuíram paulatinamente 
para a fragmentação da estrutura do pós-guerra que, em meados da década de cinqüenta, se 
torna visível: 
a) O Reino Unido entrou em uma era de abundância a partir dos 
anos de 1954-1955;
b) Houve a transformação dos padrões morais coletivos da 
sociedade inglesa, com a ruptura do código de conduta vitoriano 
(expresso nos valores de respeito do dever, da honestidade etc). Em 
lugar disso, “o individualismo de orientação social, que caracterizava a 
sociedade britânica, era agora substituído por outro tipo de 
individualismo, mais egocentrista e limitado aos pequenos grupos ou 
esferas de mobilidade individual”;
c) Relação da população com o orgulho nacional e o sentimento 
patriótico. A Grã-Bretanha passava, depois da crise de Suez, da menor 
das grandes potências para a maior das pequenas potências. 68
Nesse sentido, as preocupações dos governos do pós- Segunda Guerra, que eram 
consensuais e coletivizantes, passavam “(...) em finais da década de cinquenta, a ser 
substituídas por preocupações orientadas para a satisfação das necessidades individuais”.69
Nessa época, a era de difusão maciça do cinema e do rádio se iniciava no paíscomo um 
fenômeno “imparável”. 
Apesar dos grandes avanços tecnológicos, do aumento da riqueza na Inglaterra e do 
advento da televisão, “(...) um sentimento de revolta e de mal-estar toma formas de expressão 
literária, social e política. O romance, o cinema e o teatro dão voz ao descontentamento (...). 
O sentimento de deslocação e desenraizamento do indivíduo numa sociedade em mudança 
(...)”.70
Alterações nos padrões artísticos, que já vinham sendo desencadeadas desde a 
Primeira Guerra Mundial, tomam formas cada vez mais plenas e os movimentos de vanguarda 
 
67 FARIA, Luísa Leal de, op. cit., p. 559.
68 BÉDARIDA, François. Apud FARIA, Luísa Leal de, op. cit., pp. 564-565.
69 Ibidem. p. 565.
70 Idem.
18
artística se tornam mais ativos e atuantes no seu papel de trazer à tona aos olhos da sociedade 
a situação vivida por ela mesma. Vincent coloca que “depois da guerra [Segunda Guerra], 
Samuel Beckett71, Nathalie Sarraute e Alain Robbe-Grillet contestam ao escritor o direito de 
atribuir uma ‘psicologia’ à personagem e de lhe confiar uma ‘mensagem’”. Essas novas 
funções atribuídas à personagem demonstram a preocupação do artista em “quebrar” as 
características do período anterior, marcado pelos “romancistas de grande venda” que não se 
debatiam entre os terrores ontológicos ou sequer se perguntavam “(...) se o romance deve ser 
a narrativa de uma história ou a história de uma narrativa”.72
Certamente, a mensagem a que se refere o parágrafo anterior é a da situação que o 
homem vivia naquele momento e que não estava sendo vista da forma que deveria. O 
indivíduo era cada vez menos consciente de sua passagem do tempo. 
Gérard Vincent escreve sobre a sociedade européia dessa época e se pergunta se a 
sociedade estava bloqueada. Ele mesmo responde dizendo que “ela [a sociedade] nunca se 
transformou com tanta rapidez. Talvez possa se falar em filosofia bloqueada, ou melhor, 
ausente. Ao que parece, nem a bomba atômica nem o holocausto estimularam o homem a 
pensar no mundo e a se pensar no mundo de maneira nova (ou nunca dita antes)”.73
Diante dos horrores vividos na Segunda Guerra e do tempo de incertezas que se seguiu 
após a guerra, o homem encontrou-se em um mundo desorientado, onde ele percebe que “(...) 
qualquer que seja sua posição, seu papel, sua função, está mais solitário do que nunca perante 
a dificuldade de escolha”.74 Depois de viver os horrores de duas guerras e as mudanças 
bruscas pela qual a humanidade passou em um curto espaço de tempo, “(...) o indivíduo não 
dispõe de tempo suficiente para adquirir as novas atitudes que lhe permitiriam se adaptar às 
mudanças de seu meio, em função de sua personalidade própria. Isso o desorienta e o torna 
inseguro”. Quanto maior se torna essa confusão, mais este homem é levado a observar o 
comportamento alheio e a tentar imitá-lo. O problema é que “(...) esse comportamento imitado 
não está de acordo com sua própria personalidade, segue-se um enfraquecimento de sua 
integração, e ele se torna cada vez menos capaz de reagir de maneira autônoma a novas 
mudanças”.75 Entretanto, é importante ressalvar que esses sentimentos não foram exclusivos 
do século XX.
 
71 Samuel Beckett foi um dos autores precursores do Teatro do Absurdo (ver o capítulo 2).
72 VINCENT, Gérard, op. cit. pp. 243-244.
73 Ibidem. p. 238.
74 Idem.
75 BETTELHEIM, B.. Apud VINCENT, Gérard, op. cit., p. 226.
19
Essa angústia identitária acarreta diversas reações. Podemos indicar algumas delas no 
plano cultural de forma geral na sociedade européia. 
Em primeiro lugar, há a paixão genealógica que se apodera da França a 
partir dos anos 60. As sociedades de genealogia mobilizavam grupos cada 
vez maiores. Desenraizado pela urbanização e por uma mobilidade 
geográfica mesmo que limitada, o francês sai em busca de seus 
antepassados. “A evolução das ciências e dos costumes gera inquietude: não 
podendo prever para onde vamos, já é tranqüilizador saber de onde viemos. 
Em sua necessidade de estar ligado a alguma coisa, o homem busca suas 
raízes. Não podendo ‘viver no torrão natal’, ele precisa de uma terra de 
origem e de uma história, quando menos para alimentar sua nostalgia”.76
Há de se convir que a modernidade, tanto social quanto psicologicamente, é “(...) 
irremediavelmente autocrítica: um exercício infindável e, no fim, sem perspectivas de 
autocancelamento e auto-invalidação”77 e que, no decorrer de sua marcha, “(...) devíamos ter 
aprendido a nossa lição: que o transe existencial humano é incuravelmente ambivalente, que o 
bem está sempre combinado com o mal, que é impossível traçar com segurança a linha entre a 
dose benigna e a venenosa de um remédio (...)”. Essa lição devia ter sido aprendida. Mas não 
o fizemos. De acordo com Bauman, “havendo desacreditado o remédio, nos esquecemos da 
enfermidade a cuja cura ele se destinava”.78
 
76 PENANSTER, A. de. Apud VINCENT, Gérard, op. cit., p. 240.
77 BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Tradução de Mauro Gama, Cláudia Martinelli. Rio de 
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998. p. 91.
78 Ibidem. p. 104.
2 O TEATRO DO ABSURDO
O Teatro do Absurdo foi uma convenção teatral que surgiu em meados do século XX, 
no período pós-Segunda Guerra Mundial, para “enquadrar” os textos teatrais que fugiam à 
estrutura aristotélica de formação de texto que será tratada no próximo capítulo. As obras que 
deram início ao Absurdo foram A Cantora Careca, de Eugéne Ionesco, e Esperando Godot, 
de Samuel Beckett. Foi um movimento diversificado em termos de produção literária, onde 
cada autor buscava, de maneiras distintas, “(...) expressar a sua noção da falta de sentido da 
condição humana e da insuficiência da atitude racional por um repúdio aberto dos recursos 
racionais e do pensamento discursivo”.79
Seu surgimento se dá em um contexto de vanguardas artísticas, que seriam formadas 
por “(...) grupos que se afanan en mostrar su independencia y rebeldía frente al arte oficial, 
muy valorado por una burguesía muy conservadora y desconfiada ante cualquier novedad 
artística”80, mas suas origens remontam a tradições antigas como: o teatro “puro”81; 
palhaçadas, brincadeiras e cenas de loucura; nonsense verbal; literatura de sonho e fantasia.82
Um dos temas centrais expressados pelo Absurdo deriva da “(...) preocupação do 
homem moderno de dialogar com o mundo em que vive. Ele tenta fazê-lo enfrentar a 
condição humana tal como ela é, libertá-lo de ilusões fadadas a causar desajustamentos e 
desapontamentos constantes”. Pois o Teatro do Absurdo defende a idéia de que a dignidade 
humana está “(...) em sua capacidade de enfrentar a realidade em tôda (sic.) a sua insensatez, 
aceitá-la livremente, sem medo, sem ilusões – e rir-se dela”.83
 
79 ESSLIN, Martin. O Teatro do Absurdo. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1968. p. 20.
80 Disponível em: <http://html.rincondelvago.com/vanguardias-artisticas.html>. Acesso em: 29 de mar. de 2006.
81 De acordo com Esslin, o teatro “puro” é composto de “efeitos cênicos abstratos, tais como os que nos são 
familiares no circo ou na revista, no trabalho dos malabaristas, acrobatas, toureiros e funâmbulos 
[equilibristas]”. No Teatro do Absurdo, o elemento de teatro “puro” que predomina “é um aspecto de sua 
atitude antiliterária, de seu repúdio da linguagem como instrumento de expressão das mais profundas camadas 
de significação”. (ESSLIN, Martin. 1968, p. 278.)
82 Idem.
83 Ibidem. p. 373.
22
Para Ionesco, a concepção de Absurdo “(...) é aquilo que não tem objetivo... 
Divorciado de suas raízes religiosas, metafísicas e transcendentais, o homemestá perdido; 
tôdas (sic.) as suas ações se tornam sem sentido, absurdas, inúteis”.84 Em Pavis, Absurdo é “o 
que é sentido como despropositado, como totalmente sem sentido ou sem ligação com o resto 
do texto ou da cena. Em filosofia existencial, o absurdo não pode ser explicado pela razão e 
recusa ao homem qualquer justificação filosófica ou política de sua ação”.85
Vale destacar também algumas definições de “Absurdo” que estão fora do contexto da 
arte: de acordo com o Dicionário Aurélio, é algo “Adj. 1. Contrário à razão, ao bom senso: 
atitude absurda [grifo do autor]. 2. P. ext. Disparatado, inepto. 3. Filos. Que fere as regras da 
lógica ou as leis da razão, ou é irredutível a elas: raciocínio absurdo [grifo do autor]. 4. 
Filos.P. ext. Que escapa a regras ou a condições determinadas (...)”86; segundo Orlando 
Neves, “Absurdo é aquilo que repugna à razão, que surge a despropósito. (...) Em latim, 
absurdus é aquilo que se ouve mal, que é desagradável ao ouvido, que soa dissonante”.87
De forma geral, o Absurdo retorna a formas não-verbais do teatro, sempre tendendo 
para uma desvalorização do componente linguagem em uma obra. Citando uma das “sínteses 
lapidares” de Ionesco: “uma coisa dita já está morta, a realidade situa-se além dela”.88 Dessa 
forma, o Teatro do Absurdo se insere no contexto dos movimentos antiliterários. 
Uma formulação de Cummings, que pode ser entendida como a filosofia do Teatro do 
Absurdo, é a de que “(...) ‘vida’ é um verbo de duas vozes, a ativa, fazer, e a passiva, sonhar. 
Outros crêem que fazer não passa de uma forma de sonhar. E outros ainda descobriram (num 
espelho cercado de espelhos) alguma coisa mais dura do que o silêncio, porém mais suave do 
que cair: a terceira voz da ‘vida’, que acredita em si mesma e que não pode significar porque 
é”.89
Vale destacar como nomes importantes do Absurdo, além de Ionesco e Beckett: Amos 
Kenan, Arthur Adamov, Dino Buzzati, Edward Albee, Ezio d’Errico, Fernando Arrabal, 
 
84 IONESCO, Eugène. “Dans les Armes de la Ville”, Cashiers de la Compagnie Madeleine Renaud-Jean-Louis 
Barrault, Paris, n° 20, outubro de 1957. Apud ESSLIN, Martin, op. cit., p. 20.
85 PAVIS, Patrice. Dicionário de Teatro. 2 ed. Tradução de J. Guinsbug e Maria Lúcia Pereira. São Paulo: 
Perspectiva, 2003. p. 1.
86 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa. 3 ed. 
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. p. 18.
87 NEVES, Orlando. Dicionário da origem das palavras. Lisboa: Editorial Notícias, 2001. p. 15.
88 IONESCO, Eugène. Apud MAGALDI, Sábato. “Ionesco e a Morte”. In: O texto no teatro. 3 ed. São Paulo: 
Editora Perspectiva, 2001. p. 339.
89 E. E. CUMMINGS Apud BENTLEY, Eric. Notas para him em From the Modern Repertoire, II (Indiana 
University Press, 1957), p. 487. Apud ESSLIN, Martin, op. cit., p. 343.
23
Harold Pinter, Jack Gelber, Jean Genet, Jean Tardieu, Max Frisch, Norman Frederick 
Simpson, Wolfang Hildesheimer. 
O Teatro do Absurdo teve como precursores dois movimentos que ocorreram durante 
e após a Primeira Guerra Mundial: o Dadaísmo e o Surrealismo. Entretanto, existiram 
manifestações isoladas que podem ser entendidas como pioneiras do Absurdo também.
O melhor exemplo destas manifestações é a peça O Processo, de Kafka, produzida por 
André Gide e Jean-Louis Barrault, que estreou no Théâtre de Marigny (Paris) a 10 de outubro 
de 1947, antecipando invenções cênicas que seriam posteriormente usadas nos espetáculos do 
Absurdo, como a ligação de condições de circo, da poesia do nonsense e da literatura de 
sonho e de alegoria.90
Outras considerações a respeito desse pioneirismo estão relacionadas à “(...) luta para 
transcender a concepção da arte como mera mimese91, como imitação de aparências, (...) 
conduzida numa frente ampla, e o Teatro do Absurdo deve tanto às colagens de PICASSO ou 
JUAN GRIS e à pintura de KLEE (...) quanto à obra de seus ancestrais literários [o dadaísmo 
e o surrealismo]”.92
Bertolt Brecht é outro exemplo a ser considerado, seja por utilizar métodos do Teatro 
do Absurdo como de clown e do music hall, seja por se preocupar com a temática da 
identidade e mutabilidade do eu. Peças como a farsa em um ato Die Hochzeit (O Casamento), 
Im Dickicht der Städle (Na Floresta das Cidades) e a “comédia” Mann Ist Mann (Homem por 
Homem) reforçam a idéia de que esse autor foi um dos primeiros mestres do Teatro do 
Absurdo e que este, “(...) em sua irracionalidade, e o teatro politicamente engajado, em sua 
natureza altamente dirigida, não são contradições tão irreconciliáveis quanto o verso e o 
reverso da mesma medalha”.93
Por último, e em alguns aspectos, pode-se citar a peça The Vegetable (O Vegetal) de F. 
Scott Fitzgerald, montada em 1922, pelo menos em sua parte central, onde fornece “(...) uma 
visão grotesca e de nonsense da vida na Casa Branca”.94
Em linhas gerais, os movimentos que serão descritos adiante ajudarão a entender o 
Absurdo a partir de seu contexto histórico e artístico, onde as duas assertivas que seguem 
representarão uma simplificação aceitável do “mundo” que está sendo estudado: “A arte de 
 
90 ESSLIN, Martin, op. cit., pp. 304-305.
91 Segundo Patrice Pavis, “a mimese [grifo do autor] é a imitação ou a representação de uma coisa. (...) Na 
Poética de ARISTÓTELES [obra que será abordada no capítulo 3], a produção artística (poiesis) é definida 
como imitação [grifo do autor] (mimese) da ação (práxis)”. (PAVIS, Patrice, op. cit., p. 241.). 
92 ESSLIN, Martin, op. cit., p. 313.
93 Ibidem. pp. 324-327.
94 Ibidem. p. 343.
24
vanguarda centro-européia da era dos cataclismos raramente expressou esperança”95 e “o 
Teatro do Absurdo é a Commedia dell’arte do niiilismo, o grand guignol de um mundo de 
paradoxos”.96
Em 1916, na cidade de Zurique, Suíça, um grupo formado por jovens exilados da 
guerra franceses, alemães e de outros países da Europa, cria um movimento chamado 
Dadaísmo, que tinha como objetivo principal denunciar ao mundo que eram contrários à 
guerra que envolvia seus países, “(...) como um angustiado mas irônico protesto niilista contra 
a guerra mundial e a sociedade que a incubara, inclusive contra sua arte”97, e também saudar a
guerra como renovação dos espíritos. A arte aqui referida deve ser entendida principalmente 
como a arte convencional da era burguesa, que estava ligada aos horrores da guerra.98 Para tal, 
“fundaram um movimento literário para expressar suas decepções (...). Sendo a negação total 
da cultura, o Dadaísmo defende o absurdo, a incoerência, a desordem, o caos. Politicamente, 
firma-se como um protesto contra uma civilização que não conseguiria evitar a guerra”.99
O termo “Dada” foi escolhido quando, acidentalmente, Hugo Ball e Tristan Tzara 
folheavam um dicionário alemão-francês: “Dada é uma palavra francesa que significa na 
linguagem infantil ‘cavalo de pau’. Esse nome escolhido não fazia sentido, assim como a arte 
que perdera todo o sentido diante da irracionalidade da guerra”.100
Os dadaístas fundaram, ainda em 1916, o Cabaré Voltaire, que tinha como co-
fundadores nomes como Tristan Zara, Hugo Ball e sua esposa, Emmy Hennings, Richard 
Huelsenbeck, Hans Arp, Marcel Janco. O Cabaré apresentava uma mistura entre a tradição 
dos cafés literários de Munique e a tradição francesa da canção popular com uma 
programação modesta de “(...) canções, recitais de poesia, pequenos sketches e, 
ocasionalmente, uma peça”.101
A primeira peça apresentada no âmbito do movimento dadaísta, em abril de 1917, foi 
Sphinx und Strohmann (A Esfinge e o Espantalho) de Oskar Kokoschka, um pintor austríaco. 
 
95HOBSBAWM, Eric. “As artes 1914-45”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. pp. 187-188.
96 BERTHOLD, Margot. “Do Naturalismo ao presente”. In: História Mundial do Teatro. Tradução de Maria 
Paula V. Zurawski, J. Guinsburg, Sérgio Coelho e Clóvis Garcia. São Paulo: Perspectiva, 2003. p. 523.
97 HOBSBAWM, Eric. “As artes 1914-45”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 179.
98 ESSLIN, Martin, op. cit., p. 314.
99 Disponível em: <http://www.historiadaarte.com.br/dadaismo.html>. Acesso em: 1 de abr. de 2006. 
100 Idem. 
101 ESSLIN, Martin, op. cit., p. 314.
25
A direção foi de Marcel Janco (que também criou as máscaras utilizadas no espetáculo) e 
Hugo Ball representou um dos papéis principais.102
A peça traz elementos como a alma feminina, um “homem-cobra”, um papagaio, um 
coro de senhores encartolados que ao invés de rostos possuem buracos, onde a Morte é a 
única personagem que apresenta características inteiramente humanas e normais, e o nonsense
é parte integrante do texto.103 É considerada um exemplo do início do expressionismo e 
descrita por Tzara como “(...) a feição de nosso teatro [dadaísta], que deixará a direção à sutil 
invenção do vento explosivo (da espontaneidade), com o cenário no auditório, a direção 
visível e meios grotescos, enfim, o teatro dadaísta”.104 
Em junho de 1916, foi publicado o único número do que seria um periódico, o 
Cabaret Voltaire, com contribuições de artistas como Apollinaire, Picasso, Kandinsky, 
Marinetti, Blaise Cendras e Modigliani.105 Em 1921, o Dada como atividade de grupo se 
encerrou.
O movimento nunca chegou a causar grandes impactos no teatro. Suas peças, 
normalmente apresentadas por eles mesmos, eram “(...) poemas de nonsense em forma de 
diálogo, acompanhados por marcações igualmente sem sentido e visualmente amparadas por 
máscaras e figurinos bizarros”.106
O Surrealismo surgiu na década de 1920 apresentando características com relações 
diretas com o Dadaísmo. Historicamente, o movimento nasce em outubro de 1924, quando 
André Breton, psiquiatra e poeta francês, publica o Manifesto do Surrealismo que afirmava: 
O surrealismo, tal como o encaro, declara bastante o nosso não-conformismo 
absoluto para que possa ser discutido trazê-lo, no processo do mundo real., 
como testemunho de defesa. (...) Este mundo só relativamente está à altura 
do pensamento, e os incidentes deste gênero são apenas os episódios até aqui 
mais marcantes de uma guerra de independência, da qual tenho o orgulho de 
participar. O surrealismo é o ‘raio invisível’ que um dia nos fará vencer os 
nossos adversários. ‘Não tremes mais, carcaça.’ Neste verão as rosas são 
azuis, a madeira é de vidro. A terra envolta em seu verdor me faz tão pouco 
afeito quanto um fantasma. VIVER E DEIXAR DE VIVER É QUE SÃO 
 
102 Ibidem. pp. 314-315.
103 Ibidem. p. 315.
104 TZARA, Tristan. “Chronique Zurichoise”, em Die Geburt des Dada, p. 173. Apud ESSLIN, Martin, op. cit., 
p. 316.
105 Ibidem, p. 314.
106 Ibidem. p. 316.
26
SOLUÇÕES IMAGINÁRIAS. A EXISTÊNCIA ESTÁ EM OUTRO 
LUGAR.107
Para Guillaume Apollinaire, o primeiro a utilizar o termo “drama surrealista” para 
classificar sua peça Les Mammeles de Tirésias (Os Seios de Tirésias, 1917), “o surrealismo 
(...) era uma arte mais real do que a realidade, que expressava antes essências do que 
aparências. Queria um teatro que fosse (sic.) ‘moderno, simples, rápido, com os atalhos e 
aumentos que são necessários a fim de chocar o espectador’”.108 A representação girava em 
torno de temas relacionados ao irracional e ao subconsciente.
Com influências dos estudos psicanalíticos de Freud e do cenário político de incertezas 
que vivia a sociedade européia após a Primeira Guerra Mundial, o Surrealismo “(...) era mais 
que um protesto negativo; como seria de esperar de um movimento centrado principalmente 
na França, um país onde toda moda exige uma teoria”.109 Enquanto os dadaístas propunham a 
destruição por si só, o Surrealismo apresentava idéias de destruição da sociedade existente e 
criação de uma nova sob pilares diferentes. “Enquanto o dadaísmo era puramente negativo, o 
surrealismo acreditava na fôrça (sic.) enorme, positiva e curativa do subconsciente”.110
“No teatro, a colheita do surrealismo foi, afinal, bem pobre”.111 Uma vez que o teatro é 
uma arte onde a determinação é um aspecto forte, fica impraticável para esse meio deixar-se 
dominar pelo automatismo psicológico do Surrealismo, que significa “qualquer expressão em 
que a mente não exercesse nenhum tipo de controle”.112
Antonin Artaud, entretanto, um dramaturgo francês considerado um dos ícones do 
teatro surrealista, trouxe colaborações importantes para o Teatro do Absurdo no que se refere 
aos seus escritos teóricos e às suas experiência diretoriais. Artaud aclamava “(...) pelo retôrno 
(sic.) do mito e da mágica, pela implacável denúncia dos mais profundos conflitos da mente 
humana (...)” e afirmava que “o teatro deveria procurar expressar o que a linguagem é incapaz 
de dizer com palavras”.113 O autor publicou, em 1938, suas teorias teatrais em um livro 
chamado Le Théâtre et son Double, que contém uma série de ensaios, cartas, manifestos 
 
107 Disponível em: <http://www.culturabrasil.pro.br/zip/breton.pdf>. Acesso em: 2 de abr. de 2006.
108APOLLINAIRE, Guillaume. Prefácio de Les Mamelles de Tirésias, Ouevres (Plêiade), p. 868. Apud ESSLIN, 
Martin, op. cit., p. 312.
109 HOBSBAWM, Eric. “As artes 1914-45”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 180.
110 ESSLIN, Martin, op. cit., p. 327.
111 Ibidem. p. 328.
112 Disponível em: <http://www.historiadaarte.com.br/surrealismo.html>. Acesso em: 2 de abr. de 2006.
113 ESSLIN, Martin, op. cit., pp. 332-333.
27
escritos depois de 1930, num período que contempla o final da Primeira Guerra, a Grande 
Depressão e a iminência da Segunda Guerra Mundial. 
O Surrealismo teve também como marcos importantes a publicação da revista A 
Revolução Socialista e do Segundo Manifesto do Surrealismo, datados de 1929. Alguns 
nomes importantes do movimento na década de 1920 foram: Alberto Giacometti, escultor 
italiano; Salvador Dalí e Joan Miró, pintores espanhóis; René Magritte, pintor belga; Max 
Ernst, pintor alemão; Luis Buñuel, cineasta espanhol e Paul Éluard, Louis Aragon e Jacques, 
escritores franceses. 
Vale ressaltar que tanto o Dadaísmo quanto o Surrealismo eram a favor da revolução 
russa, com algumas diferenças entre si, porém basicamente adeptos das idéias que eram 
apresentadas ao mundo. Entretanto, foram ambos os movimentos rejeitados, como argumenta 
Hobsbawm:
Na verdade, guerra e revolução politizaram vários movimentos de vanguarda 
não políticos antes da guerra na França e na Rússia. (...) O dadaísmo era a 
favor da revolução. Seu sucessor, o surrealismo, só tinha problemas para 
decidir que tipo de revolução, a maioria da seita preferindo Trotski a Stalin. 
(...)
A tragédia dos artistas modernistas [onde se enquadram dadaístas e 
surrealistas], de esquerda ou de direita, foi que o compromisso político muito 
mais efetivo de seus próprios movimentos de massa e de seus próprios 
governantes (...) os rejeitaram.114
Eugène Ionesco nasceu em Slatina, Romênia, em 26 de novembro de 1909. Há uma 
controvérsia com relação ao ano em que nasceu, pois existem fontes que indicam como seu 
ano de nascimento 1912. Isso em parte pela vaidade do autor que, no início dos anos de 1950, 
mentiu sua idade quando um crítico chamado Jacques Lemarchand escreveu sobre o advento 
da nova geração de jovens autores quesurgia em sua época, onde se situavam Ionesco e 
Beckett.115
Filho de um advogado francês e de uma engenheira francesa, sua família mudou-se 
para Paris, França, logo após seu nascimento. Sua primeira língua foi o francês e aprendeu a 
maior parte do romeno aos treze anos, quando voltou à sua terra natal. Em 1916, durante a 
Primeira Guerra Mundial, seu pai volta à Bucareste e sua mãe fica em Paris com os dois 
filhos. 
 
114 HOBSBAWM, Eric. “As artes 1914-45”. In: Era dos Extremos – O breve século XX 1914-1991. 2 ed. São 
Paulo: Companhia das Letras, 1995. pp. 186-187.
115 Disponível em: <http://www.ionesco.org/vie-en.html>. Acesso em: 8 de abr. de 2006. 
28
De 1917 a 1919, a mãe de Ionesco o envia para morar na aldeia de La Chapelle 
Anthenaise, com a irmã, em virtude de sua saúde frágil. Os irmãos viveram com uma família 
de fazendeiros e foi ali que o autor começou a “brincar de teatro” com outras crianças.116 O 
período é lembrado pelo autor como um dos mais tranqüilos e harmoniosos de sua vida.117
Esslin assim descreve: 
Lembra-se êle (sic.) de que àquela época [quando viveu no campo] sonhava 
em tornar-se santo, mas que, ao ler livros religiosos encontrados na aldeia, 
descobriu que era errado buscar a glória. Abandonou então a idéia da 
santidade. Pouco depois leu as vidas de Turenne e Condé e resolveu tornar-
se um grande guerreiro. Aos treze anos, de volta a Paris, escreveu sua 
primeira peça, um drama patriótico.118
Sua família volta então à Romênia e o mundo que Ionesco encontra não o agrada. 
Como ele mesmo escreve: 
Pouco tempo depois de chegar à minha segunda pátria vi um homem, ainda 
jovem, grande e forte, atacar um velho a sôcos (sic.) e dar-lhe pontapés com 
suas botas... Não tenho qualquer imagem do mundo a não ser as da 
evanescência e da brutalidade, da vaidade e da raiva, do nada ou de um ódio 
horrendo e inútil. Tudo que tenho vivido desde então apenas confirmou o 
que vi e compreendi em minha infância: fúria vã e sórdida, gritos 
repentinamente abafados pelo silêncio, sombras engolfadas eternamente pela 
noite...119
Ionesco estudou literatura francesa na Universidade de Bucareste e se tornou professor 
em um liceu da cidade. Seus primeiros poemas foram escritos na época de faculdade, 
influenciados por escritores como Maeterlinck, poeta belga que participou do movimento 
simbolista em Paris e ganhador do Prêmio Nobel de Literatura de 1911, e Francis Jammes, 
poeta francês.120
Durante a faculdade ainda, o autor publicou um panfleto com críticas literárias que 
atacavam os principais escritores romenos, “acusando-os de provincianismo estreito e de falta 
de originalidade”. Em seguida, publicou um segundo panfleto que elogiava os autores 
criticados anteriormente como “figuras exponenciais e universalmente válidas da literatura 
nacional romena”. Depois, publicou os dois panfletos conjuntamente com o título de “Não!” 
 
116 ESSLIN, Martin, op. cit., pp. 119-120.
117 Disponível em: <http://www.ionesco.org/vie-en.html>. Acesso em: 8 de abr. de 2006.
118 ESSLIN, Martin, op. cit., p. 120.
119 IONESCO, Eugène. “Lorsque j’éeris...”, Cashiers dês Sasions, nº 15. Apud ESSLIN, Martin, op. cit., p. 120.
120 ESSLIN, Martin, op. cit., pp. 120-121.
29
(1934), para mostrar que duas posições opostas sobre uma mesma temática podem ser 
mantidas sem afetar as identidades dos contrastes.121
Em 1936, casou-se com Rodica Burileano, uma mulher de feições assemelhadas às das 
mulheres da Europa oriental e teve sua filha, Marie-France, no ano de 1944. Quando da 
Segunda Guerra Mundial, o autor estava em Marselha e voltou para Paris um tempo depois 
para trabalhar em uma editora. No final da guerra, Eugène Ionesco tinha trinta e três anos e 
não havia nenhum indício de que se tornaria famoso, ainda mais como escritor de teatro. Ele 
confessa que ia pouco ao teatro, pois, nas palavras do autor “ir ao teatro (...) era ir ver gente, e 
aparentemente gente séria, fazendo papelão”.122
Em 1948, resolveu que aprenderia a língua inglesa e comprou um livro de inglês. O 
próprio autor descreve o que aconteceu em seguida:
Comecei a trabalhar. Copiava conscienciosamente frases inteiras do meu 
manual com o objetivo de decorá-las. Ao relê-las atentamente, o que aprendi 
não foi inglês, mas algumas verdades surpreendentes: que, por exemplo, há 
sete dias na semana, coisa que eu já sabia; que o chão é em baixo, o teto no 
alto, coisas que eu também já sabia, porém às quais eu nunca havia dedicado 
séria consideração, ou talvez das quais eu me havia esquecido, e que me 
pareciam, repentinamente, tão estarrecedoras quanto indiscutìvelmente (sic.) 
verdadeiras.123
Dessa forma, Ionesco escreveu La Cantatrice Chauve (A Cantora Careca) em 1948, 
tornando-se um dos precursores do Teatro do Absurdo na sua forma atual. A peça que, para 
seu criador, representava a “tragédia da linguagem” foi apresentada pela primeira vez no 
Théâtre des Noctambulés (Paris) em 11 de maio de 1950, dirigida pelo jovem, de então vinte 
e três anos, Nicolas Bataille. 
A peça, que foi recebida friamente pelo público, foi rotulada por Ionesco de 
“antipeça”. Mais adiante, em 1958, Kenneth Tynan, crítico de teatro do jornal The Observer, 
escreveu um artigo sobre Ionesco onde dizia: “Eis aqui, enfim, um defensor autoproclamado 
do antiteatro [grifo do autor]124: explìcitamente (sic.) anti-realista, implìcitamente (sic.) é 
 
121 Ibidem. p. 121.
122 IONESCO, Eugène. Apud ESSLIN, Martin, op. cit., p. 122.
123 IONESCO, Eugène. “La Tragédie du Language”, Spectacles, Paris, nº. 2, julho de 1958. Apud ESSLIN, 
Martin, op. cit., pp. 122-123.
124 O termo antiteatro tem sua origem nos anos de 1950, no início do Teatro do Absurdo, e “(...) se caracteriza 
por uma atitude crítica e irônica ante a tradição, artística e social”. É mais uma denominação jornalística que 
científica e que não se refere só ao absurdo, mas também a outras formas de teatro. O antiteatro pode ser 
entendido também como uma forma de dramaturgia anti-aristotélica. (PAVIS, Patrice. 2003, pp. 15-16.).
30
também anti-realidade. Eis aqui um escritor pronto a declarar que as palavras não têm sentido 
e que tôda (sic.) comunicação entre sêres (sic.) humanos é impossível”.125
Ionesco responde as alegações de Tynan que ele seria um anti-realista e sobre a 
afirmação de que a comunicação entre humanos é impossível, alfinetando autores como 
Sartre, Brecht, Osborne, Miller que, para ele, representavam “(...) um conformismo de 
esquerda que é tão melancólico quanto o da direita”:126
Nenhuma sociedade foi capaz de acabar com a tristeza humana, nenhum 
sistema político poderá livrar-nos da agonia de viver, de nosso mêdo (sic.) 
da morte, de nossa sêde (sic.) do absoluto; é a condição humana que orienta 
a condição social, e não vice-versa. 
(...)
Para descobrir o problema fundamental comum a tôda (sic.) a humanidade, 
tenho que indagar qual é o meu [grifo do autor] problema fundamental, qual 
o meu [grifo do autor] mêdo (sic.) mais inerradicável. (...) Uma obra de arte 
é a expressão de uma realidade incomunicável que se tenta comunicar – e 
que por vêzes (sic.) pode ser comunicada. Esse é seu paradoxo e sua 
verdade.127
O autor escreveu ainda peças como: La Leçon (A Lição, 1950), Jacques ou La 
Soumission (1950), O Futuro está nos Ovos, ou É Preciso de Tudo para Fazer Um Mundo
(1951), Les Chaises (As Cadeiras, 1950) – considerada uma de suas maiores obras –, Victimes 
du Devoir (As Vítimas do Dever, 1952), Amédée (1953), Le Noveau Locataire (O Novo 
Inquilino, 1953), Tueur Sans Gages (O Assassino Sem Recompensa, 1957) – sua melhor e 
mais ambiciosa peça, classificada como uma das obras mais importantes

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