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LEGITIMIDADE DEMOCRÁTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL

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LEGITIMIDADE DEMOCRÁTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: UMA ANÁLISE A
PARTIR DA MORFOLOGIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
DEMOCRATIC LEGITIMACY OF THE JUDICIAL REVIEW: AN ANALYSIS BASED ON THE
MORPHOLOGY OF THE SUPREME COURT
Adriano Sant'Ana Pedra
josé Maria Barreto Siqueira Parrilha Terra
RESUMO
Este estudo trata da morfologia do Supremo Tribunal Federal, em especial quanto à forma de acesso e ao
prazo de investidura no cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, como elementos a serem
considerados na análise da legitimidade desta Corte Constitucional. São analisados aspectos históricos
relacionados à criação e à implantação do STF, que demonstra, desde a gênese do Tribunal, a luta por
legitimidade. Abordam-se as diferenças entre legalidade e legitimidade. É feita uma breve explanação
acerca da jurisdição constitucional, para então ser discutida a legitimidade do STF em relação à
acessibilidade e ao período de investidura dos Ministros no cargo. O método utilizado é a pesquisa
bibliográfica, buscando-se a opinião de vários autores a respeito do tema principal e de temas correlatos.
Utiliza-se também o direito comparado para analisar a forma de acesso e do tempo de permanência no cargo
de Ministro em outras Cortes Constitucionais. Isto permitirá uma análise crítica da PEC 342/2009, que
pretende modificar a forma de investidura dos Ministros do STF, bem como fixar mandato temporário para
o exercício do cargo.
PALAVRAS-CHAVES: jurisdição constitucional; legitimidade democrática; Supremo Tribunal Federal;
vitaliciedade.
ABSTRACT
This study deals with the manner and time of taking office as Justice as legitimacy requirements of Brazilian
Federal Supreme Court (STF). Historical aspects are analyzed with respect to the creation and deployment
of the STF, which demonstrate, since the genesis of the Court, the struggle for legitimacy. It deals with the
differences between legality and legitimacy. There is a explanation of what judicial review would be.
Finally, the legitimacy of the Supreme Court before the affordability period and the appointment of Justices
in office is discussed. The method used is the literature search, which seeks the opinion of several authors
about the main theme and related topics. It is also used the comparative law analysis of how to access and
the time spent in the office of Justice in other constitutional courts. It shows the PEC 342/2009, which seeks
to modify the form of access of Justices of the STF and to set temporary mandate to exercise the office. The
main objective of this study is to contribute to the academic debate about the legitimacy of the STF and,
thus, to participate in the historical quest for democratic legitimacy of the powers that make up the
Democratic State.
KEYWORDS: democratic legitimacy; judicial review; Supreme Court; tenure.
 
1 INTRODUÇÃO
 
A polêmica acerca da legitimidade democrática do Supremo Tribunal Federal renova-se
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constantemente, especialmente quando surge algum ativismo judicial ou, inversamente, em caso de omissão
ou demonstração de fragilidade. O momento atual aguça ainda mais o interesse sobre o tema, uma vez que a
o STF vem atuando de forma direta e polêmica, na política e na sociedade, de tal forma que já se levantam
vozes afirmando que o STF seria uma terceira Câmara.
 
Isto é uma consequência da posição de destaque que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem
recebido na atualidade e pela insuficiência de uma teoria desenvolvida acerca de suas funções, o que
possibilitaria identificar o espaço que a Excelsa Corte ocupa e pode vir a ocupar, seus limites, sua natureza e
sua legitimidade democrática. Este trabalho se ocupará em estudar este último ponto.
 
O trabalho procura contribuir para o debate acerca do aperfeiçoamento da democracia brasileira.
Nesse sentido, a indagação que se faz é se há legitimidade democrática na forma de acesso e o período de
investidura no cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, que constituem elementos de sua
morfologia. Este questionamento se justifica porque uma das maiores críticas que se faz à jurisdição
constitucional diz respeito à sua (falta de) legitimidade democrática. Esta preocupação ocorre porque o
destino das leis e atos normativos não depende apenas da vontade do Legislativo ou do Executivo,
instâncias eletivas, mas depende do crivo da decisão do STF, cujos membros são vitalícios e são escolhidos
indiretamente.
 
Para desenvolver este tema, no primeiro momento é feita uma abordagem histórica da Justiça no
Brasil, objetivando elucidar as condições e os objetivos pelos quais foi criada a Corte Constitucional
brasileira. O segundo momento é dedicado ao estudo do conceito de legitimidade e legalidade, estudando
tais conceitos à luz do positivismo e do jus-naturalismo. O terceiro momento adentra na discussão em torno
acesso e do prazo de investidura dos ministros do STF. Neste momento é feito um breve estudo de direito
comparado, onde são analisadas cortes constitucionais europeias e latino-americanas. Por fim, é apresentada
e analisada a Proposta de Emenda Constitucional nº 342/2009, que pretende alterar entre outros
dispositivos, os que regulamentam a forma de acesso e o período de investidura no cargo de Ministro do
STF.
 
 
2 A HISTÓRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
 
As cortes constitucionais surgem na história da humanidade com a finalidade de garantir que o
poder exercido pelo Estado não venha extrapolar os limites nem contrariar as diretrizes versadas nas
constituições nacionais. Desta forma, uma corte constitucional é mais que uma simples aplicadora de lei,
mas uma garantidora do poder emanado do povo.
 
Todo objeto de um estudo tem a sua história. Conhecê-la é fundamental para que se compreenda o
seu presente e se possa lançar um olhar sobre o seu futuro. Assim sendo, será abordada sucintamente a
história do Poder Judiciário brasileiro e, sobretudo, da Corte Constitucional.
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A primeira tentativa de se implantar uma justiça no território brasileiro foram as Ordenações
Manuelinas. Os donatários hereditários eram responsáveis por organizar e aplicar em todos os sentidos tal
jurisdição, restringindo-se a competência ao território de suas capitanias.
 
Em 1548, é criado o então Governo-Geral, que reverte o sistema jurídico a Coroa portuguesa,
passando então o Ouvidor-Geral a ser a autoridade máxima da Justiça na colônia. Em 1609 instala-se em
Salvador a chamada Relação do Brasil, que é composta por dez desembargadores e concentra a jurisdição do
Brasil colônia. Em 1708, o então Rei D. José I cria a Relação do Rio de Janeiro, dividindo a jurisdição dos
estados brasileiros entre duas casas de relação, situação esta que perdurará até a vinda da família real
portuguesa para o Brasil.
 
A instalação da corte portuguesa no Rio de Janeiro fez surgir a necessidade de se implementar a
autonomia administrativa da colônia. Neste contexto, é criada a Casa de Suplicação, que abre caminho para
que a Carta Imperial de 1824, em seu artigo 163, crie o Supremo Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:
 
Art. 163. Na Capital do Império, além da Relação, que deve existir, assim como nas demais Províncias,
haverá também um Tribunal com a denominação de Supremo Tribunal de Justiça, composto de Juizes
Letrados, tirados das Relações por suas antiguidades; e serão condecorados com o Título do Conselho.
Na primeira organização poderão ser empregados neste Tribunal os Ministros daqueles, que se
houverem de abolir.
 
A criação do Supremo Tribunal de Justiça rompeuem definitivo com a justiça metropolitana. O
Supremo Tribunal de Justiça era composto originalmente de 17 Juízes Letrados, escolhidos por sua
antiguidade ou aproveitados dos tribunais que deveriam ser extintos. O Imperador era quem fazia a escolha
do presidente da referida Corte. Em seus onze anos de existência, o Supremo Tribunal de Justiça acolheu
onze presidentes.
 
Em julho de 1889, o Imperador D. Pedro II, ao se despedir dos juristas Ruy Barbosa, Salvador
Mendonça e Lafayete Rodrigues, disse-lhes:
 
Estudem, com todo cuidado, a organização do Supremo Tribunal de Justiça de Washington. Creio que
nas funções da Corte Suprema esteja o segredo do bom funcionamento da Constituição norte-
americana. Quando voltarem, haveremos de ter uma conferência a este respeito. Entre nós as coisas não
vão bem, e parece que, se pudéssemos criar aqui um tribunal igual ao norte-americano, e transferir para
ele as atribuições do Poder Moderador da nossa Constituição, ficaria esta melhor. Dêem toda atenção a
este ponto.[1]
 
Os referidos juristas quando voltam para o Brasil já não encontram mais o Império, mas, sim, a
República. Entretanto, seus estudos não se perdem, uma vez que agora a criação do Supremo Tribunal
Federal tem por missão consolidar a recente República.
 
Em 22 de julho de 1890, o Decreto nº 510 cria uma “Constituição provisória”, onde se determina a
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criação do Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:
 
O Supremo Tribunal Federal compor-se-á de quinze juízes nomeados na forma do art. 47, n. II, dentre
os trinta juízes federais mais antigos e os cidadãos de notável saber e reputação, elegíveis para o
Congresso.[2]
 
Impelido pela urgência de se criar uma justiça nos moldes republicanos, o Ministro Campos Sales,
no Decreto nº 848, de 11 de outubro de 1890, regulamenta e dá provimento ao funcionamento do STF. Em
sua exposição de motivos para o referido Decreto, deixa clara a necessidade de uma Justiça Federal para a
consolidação da República:
 
O que, principalmente, deve caracterizar a necessidade da imediata organização da justiça federal é
papel de alta preponderância a que ela se destina representar, como órgão de um poder, no corpo social.
[...] A magistratura que agora se instala no país, graças ao regime republicano, não é instrumento cego,
ou mero intérprete na execução dos atos do Poder Legislativo. Antes de aplicar a lei cabe-lhe o direito
de exame, podendo dar-lhe sanção, se ela lhe parecer conforme ou contrária à lei orgânica. [...] A
função do liberalismo no passado, diz um eminente pensador inglês, foi por um limite ao poder violento
dos reis; o dever do liberalismo na época atual é opor um limite ao poder atual dos parlamentos. [...] É
por isso que na grande União Americana, com razão, se considera o poder jurídico como pedra angular
do edifício federal e o único capaz de defender com eficácia a liberdade, a autonomia individual. [...]
Porque a República, segundo a máxima americana, deve ser o governo da lei. [3]
 
Diante do exposto, nota-se a preocupação em se criar um equilíbrio entre os três órgãos de poder.
Surge o Judiciário constitucional, como ente de equilíbrio entre os poderes republicanos. E, para cumprir
sua missão, o Supremo Tribunal Federal tem o dever de fazer valer a Constituição mesmo contra a vontade
de quaisquer dos três poderes.
 
A influência norte-americana se justifica pelo fato de os Estados Unidos da América surgir como
um exemplo de República, pois rompe com a política monárquica mais poderosa de sua época. A Suprema
Corte dos EUA é a primeira Corte na história com a prerrogativa de anular dispositivos infraconstitucionais
que viessem a ofender mandamentos constitucionais. Uma verdadeira Corte escudeira da Constituição.
 
Em seus primeiros tempos, o STF por figurar como limite ao poder do governante, era atacado e
desacatado a todo o momento. Boa parte dos problemas se devia ao fato de a própria Corte não ter
consciência do poder que agora representava. Isto é bem salientado por Castro Nunes:
 
Nos primeiros tempos da República, o tribunal não tinha a consciência de seu papel no regime. Este
representava, para muitos dos juízes que o compunham e que traziam do Império uma bagagem
intelectual copiosa e até brilhante, mas inadequada à compreensão das novas instituições, um sistema
pouco conhecido e que teria de receber na órbita judiciária uma aplicação perturbadora pelos
preconceitos da educação judiciária haurida nas fontes romanas, reinícolas, nas tradições do antigo
regime e nos expositores do direito público francês.[4]
 
 
A defesa do papel do STF na recente República teve de ser encarnada pelo eminente jurista Ruy
Barbosa, que defendia que o habeas corpus era mais que um instrumento de defesa de locomoção, mas de
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toda forma de liberdade. Quando, no dia 23 de abril de 1892, na defesa do habeas corpus nº 300, diz na
tribuna do STF: “Custa-me, entretanto, a dominar o respeito, quase supersticioso, com que me cerco deste
tribunal, o oráculo da nova Constituição, a encarnação viva das instituições federais...”.[5]
 
No mês de junho do ano de 1891, o senador Amaro Cavalcante, defende que os ministros do STF
deveriam ter seus nomes referendados pelo Senado, independentes de já terem sidos nomeados ou não, e
que deveria ser feito em sessão fechada. Defendia Ruy Barbosa uma posição oposta: defendia que a sessão
deveria ser aberta, conforme o regimento do STF.
 
Assim, desde a sua gênese, a legitimidade do STF vem sendo discutida, seja pela forma de
investidura de seus ministros, seja pelo conteúdo de sua atuação jurisdicional, e atualmente pelo período de
investidura no cargo de Ministro.
 
Embora o Brasil tenha passado por diversas constituições, que refletiram diversos regimes e
fatores de poder, a estrutura do STF permanece basicamente a mesma desde sua criação, evidenciando ainda
mais a necessidade de que este tema seja discutido, não só nas arenas acadêmicos, como também nos
espaços sociais e políticos.
 
 
3 PODER E LEGITIMIDADE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
 
Entender a natureza do poder bem como de onde ele surge é primordial para que se possa discutir
o conceito de legitimidade. A respeito do que se entende por poder, versa David Beethan que “o poder
indica a prerrogativa de que um cidadão dispõe para os efeitos por ele desejados no meio que o cerca e no
lugar previsto para a sua realização”.[6]
 
Para que uma vontade se imponha a um cidadão sem que esta vontade seja a usurpação da sua, é
necessário que a vontade imposta seja oriunda de um poder reconhecido por este cidadão. Tal raciocínio é
válido para os poderes democráticos, tal qual o poder estabelecido na Constituição brasileira: “todo poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição” (artigo 1º, parágrafo único).
 
Desde os primórdios da história, sem que houvesse sido desenvolvido qualquer conceito de
legitimidade, um homem mandava e outros se dispunham a obedecer, por considerar que o poder daquele
que mandava era oriundo de Deus. Este sistema teocrático não permitia qualquer questionamento ou direitos
por parte dos destinatários das ordens, uma vez que não se pode questionar a vontade de Deus.
 
Com as mudanças econômicas provenientes da Revolução Industrial e as mudanças políticas
eclodidas durante a Revolução Francesa, passou-se a ter uma nova maneira de se legitimar o poder. A
legitimidade que outrora se baseava em um poder divino passou a se lastrearna razão. Um dos papeis
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preponderantes da legitimidade racional é servir à paz social, na medida em que equilibra os que exercessem
o poder com aqueles sobre quem ele é exercido. Nesse sentido, explica José Eduardo Faria:
 
A legitimação converte dessa maneira em um processo de integração entre os detentores do poder (os
legitimados) e os cidadãos (os legitimantes) resultando em torno de valores delineados como modelo de
vida de uma comunidade. Como em todo sistema de dominação sempre existe em maior ou menos grau
um componente de receio e de medo por parte dos governados, temerosos do arbítrio dos governantes, a
legitimidade se converte numa ponte capaz de propiciar a suspensão dessa incerteza entre o poder e os
grupos sociais, tornando a vida pública mais segura.[7]
 
Por mais que se entrelacem e, por vezes, venham a se confundir, os conceitos de legitimidade e
legalidade não são sinônimos. Entender as diferenças entre estes conceitos é fundamental para que
desenvolva um raciocínio jurídico-social a respeito de qualquer poder, inclusive o exercido pelo STF. A este
respeito, Ivo Dantas anota:
 
Se o conceito de legalidade é um conceito jurídico-formal, ou seja, considera-se o que determinado está
na lei, a legitimidade, pelo contrário, é um conceito sociológico-político, interessando-lhe valores e
ideais dos grupos, ou seja, legitimo é aquele poder que, mesmo à margem da lei, se exerce atentando
aos interesses da sociedade para qual se destina.[8]
 
Por outro lado, Walber de Moura Agra explana:
 
Para o positivismo jurídico, o conceito de legitimação está calçado nas normas componentes do
ordenamento jurídico, preponderantes nas normas constitucionais. Sua justificação não pode ser
procurada em fatores metodológicos, pois iria acarretar perda na autonomia da ciência jurídica. A
legitimidade é realizada com base no escalonamento normativo, cujo dispositivo superior garante a
validade do inferior e assim sucessivamente. [9] (AGRA, 2005. p. 151)
 
Neste contexto, discute-se a legitimidade democrática que teria o Supremo Tribunal Federal para
poder anular as mais populares decisões tomadas pelo Poder Legislativo e pelo Poder Executivo. Daí surge
a complexidade que tem o Estado Constitucional ao colocar o Tribunal Constitucional em tensão com a
vontade da maioria.
 
Grande parte das discussões acerca da legitimidade democrática da Corte Constitucional acaba
sendo remetida à própria concepção de democracia é adotada. Isto porque, se, por um lado, a democracia
constitucional exige que as decisões políticas sejam tomadas pelos representantes escolhidos pelo povo, por
outro, coexiste com o controle de constitucionalidade que, objetivando preservar o próprio sistema
constitucional, não deve sobrepujar a democracia.[10]
 
 
4 JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL E DEMOCRACIA
 
Desde o final do século XVIII nos Estados Unidos, e mais adiante na Europa, surgiu a necessidade
de se estabelecer órgãos que pudessem realizar a tarefa de defesa da Constituição para que fosse possível
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efetivamente vivenciar o constitucionalismo.
 
As fórmulas de proteção das disposições fundamentais geram questões terminológicas distintas,
como “defesa da Constituição”, “controle de constitucionalidade”, “giurisdizione costituzionale”, “processo
costituzionale”, “Verfassungsgerichtsbarkeit”, e “judicial review”.
 
Para Ronald Dworkin,[11] um dos defensores do instituto do judicial review, “os Estados Unidos
são hoje uma sociedade mais justa do que teriam sido se seus direitos constitucionais tivessem sido
confiados à consciência de instituições majoritárias”.
 
Todavia, há diversos autores que consideram ter havido uma usurpação de poderes por parte do
Tribunal Constitucional, tendo sido a judicial review uma função auto-atribuída.
 
Como explicar a surpreendente aceitação geral de uma instituição cuja posição central está baseada
inteiramente em uma competência, a de judicial review, que não foi atribuída expressamente pela
Constituição, mas foi propriamente “usurpada”, ou ao menos auto-atribuída?[12]
 
John Hart Ely destaca como principal problema do controle jurídico de constitucionalidade o fato
de que “um corpo que não é eleito ou mesmo responsável politicamente de nenhuma forma significativa
está a dizer aos representantes eleitos pelo povo que eles não podem governar como querem”.[13] Rejeita o
autor o argumento de que a Corte tenha função constitucional de definir valores e proclamar princípios, uma
vez que os valores em questão seriam aqueles dos próprios magistrados. O judicial review deve fiscalizar se
os pressupostos da democracia foram respeitados nas decisões, controlando aquelas que impliquem em risco
para a continuidade da democracia.
 
A justiça constitucional não pode ser rotulada de antidemocrática exatamente em razão de sua
finalidade de garantir a Constituição, e porque a sua legitimidade não deriva de uma maioria atual, mas da
maioria pretérita constituinte[14].
 
Sem embargo, André Ramos Tavares esclarece que o percurso histórico do Tribunal
Constitucional, bem como a sua acentuada presença em diversas Constituições, tem feito com que não seja
questionada a sua legitimidade quanto ao aspecto de sua existência.
 
A questão da legitimidade da jurisdição constitucional e com ela do Tribunal Constitucional como
órgão máximo a exercê-la, perdeu muito de seu caráter controverso. Assume maior relevância, hoje, a
questão do sentido, alcance, extensão e limites da justiça constitucional.[15]
 
Pelo que foi exposto a respeito da jurisdição constitucional, o que se faz necessário discutir não é
se existe legitimidade democrática nas Cortes Constitucionais, mas, sim, o que é necessário para que uma
Corte Constitucional não seja uma usurpadora do poder democrático.
 
Esta discussão passa essencialmente por duas questões básicas que foram eleitas para serem
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analisadas neste estudo: a primeira diz respeito à forma de investidura dos ministros que compõem a Corte;
e a segunda refere-se ao tempo em se permanece investido no cargo de ministro.
 
 
5 MORFOLOGIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ACESSIBILIDADE E
VITALICIEDADE DOS SEUS MEMBROS
 
Após a Segunda Grande Guerra, emerge a necessidade de se implantarem tribunais constitucionais
autônomos, com poder para garantir as liberdades outrora vilipendiadas. Então, uma maior atenção é dada à
legitimidade dos tribunais que exercem a chamada “jurisdição constitucional”, pois qualquer vício nestes
tribunais comprometeria a própria democracia.
 
Conforme já foi dito anteriormente, a legitimidade do STF passa, necessariamente, pela forma de
investidura dos seus membros e pelo período em que permanecem investidos no cargo. No que diz respeito
ao primeiro elemento, existem opiniões tanto contrárias como favoráveis à forma de investidura prevista em
nossa Constituição.
 
André Ramos Tavares defende a legitimidade dos membros do Supremo Tribunal Federal,
sobretudo no tocante a acessibilidade, apregoando o autor que a nomeação dos membros do STF pelo
presidente da República é legítima pelo argumento da democracia indireta e em razão de a democracia
respeitar o governo das minorias. Segundo o autor, estas características permitem que os membros da
referida Corte se mantenham afastados da política partidária. Defende o autorque os grupos de pressão só
são admissíveis por via de argumentação nas peças processuais, e por ocasião de sustentações orais, que ao
se utilizar de elementos extrajurídicos, que não podem fazer parte das motivações da decisão, acabam de
forma reflexa influenciando os magistrados.[16]
 
Em argumento favorável ao acesso por indicação presidencial e referendo pela Casa Legislativa,
Lawrence Baum explica que a representatividade democrática está no Parlamento, que é maioria qualificada
para aprovação do nome do juiz constitucional e, desta forma, garante um maior pluralismo, sendo reflexo
do pluralismo democrático das Casa Legislativa. Neste sentido assevera o então Ministro do STF Francisco
Rezek, no prefácio da obra do autor supracitado.
 
Para reconforto dos brasileiros, seu tribunal mais alto não é e não será jamais uma confraria de
almas-irmãs. Não tem sido tão pouco a Suprema Corte Americana; e isto, dado o pluralismo que
caracteriza as duas sociedades – e que, no Brasil, não se limita ao plano das ideias –, é mais que
positivo. Chega a ser imperioso, na medida em que o poder político facultado às duas casas de
justiça reclama que representem de modo autêntico e completo, um quadro social heterogêneo e
marcado por constante transformação.[17]
 
É importante salientar que o Supremo Tribunal Federal, como guardião da Constituição Federal, é
um órgão político. Não do ponto de vista partidário, mas, sim, do ponto de vista político-estrutural do
Estado Democrático de Direito. E é importante que seja assim porque a missão do Tribunal Constitucional
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não é apenas interpretar e aplicar o direito comum, mas também antecipar a realização das aspirações da
sociedade[18].
 
Todavia, nos dias atuais muito tem se discutido a respeito da forma acesso ao STF, pois alguns têm
considerado que a nomeação dos Ministros do STF compromete os nomeados politicamente, fazendo com
que o STF seja mais que uma Corte com influências políticas, mas uma corte verdadeiramente partidária.
 
Andrei Koerner mostra, do ponto de vista histórico, um comprometimento político quanto aos
critérios de nomeação para ministro do STF nos anos de 1900 a 1911. A nomeação pelo presidente da
República objetivava tão-somente garantir a maioria favorável no Tribunal, podendo ainda a nomeação
servir apenas como retribuição de favores ou ainda como uma aliança de favores.[19]
 
Criticando a forma de acesso à Corte Constitucional, Francisco Gerson Marques de Lima defende
a ilegitimidade dos ministros do STF, principalmente no tocante à sua investidura no cargo por meio de
nomeação por parte do Presidente da República, nos seguintes termos:
 
A acessibilidade à cúpula do Judiciário depõe contra a democracia. (...) Num regime no qual a cúpula
dos poderes é eleita diretamente (Presidente da República, Senadores, Deputados Federais e Estaduais,
Governadores, Prefeitos e Vereadores), mantém-se, contraditoriamente, o STF com eleição indireta,
apesar de se lhe conferir competência para rever atos normativos e, em geral, de representantes do povo,
portadores de mandato popular. Num país onde o acesso ao Judiciário se dá por concurso, ressalvado o
caso o caso dos representantes da OAB nos tribunais (e a indicação deles parte da própria Ordem),
contrapõe-se o órgão máximo, com seus integrantes escolhidos por critérios meramente políticos, a
romper toda justificativa da escolha de juízes por certame público. Este modo de acesso ao STF situa-se
no limbo, não é critério adotado pelos demais Poderes, nem é do próprio Poder Judiciário. E pugna
contra a regra da democracia direta, esposada pela CF/88 (art. 1º, parágrafo único: “todo poder emana
do povo”.[20]
 
A repulsa de alguns setores da sociedade quanto à forma como tem sido conduzido o ingresso dos
membros do Supremo Tribunal Federal pode ser exemplificada nesta nota divulgada pela Associação
Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA:
 
Tal modelo de nomeação está em descompasso com os princípios democráticos e com o ideal
republicano porque não reflete adequadamente o sistema de freios e contrapesos informador da relação
entre os Poderes da República, que deve ser de independência e harmonia. A lamentável prática de
utilização de critérios exclusivamente políticos para escolha dos Ministros daquela Corte pelo
Presidente da República e a incompreensível atuação meramente homologatória dos Senadores da
República nas chamadas “sabatinas” dos candidatos comprometem seriamente a idéia de
imparcialidade da magistratura e ensejam inconveniente partidarização do STF.[21]
 
 
No mesmo sentido o Ministério Público do Estado de Goiás, participando do debate a cerca da
acessibilidade para o cargo de ministro do STF, divulgou em seu site oficial, no dia 10 de novembro de
2005, um texto onde é abordada a questão política que envolve a nomeação dos ministros do STF:
 
A nomeação de cada ministro é flagrantemente elitista. O cidadão comum não tem como influir nela,
nem ao menos por meio de seus representantes na Câmara dos Deputados. Nem mesmo a corporação
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nacional de juízes é consultada. A indicação do presidente da República precisa, sim, ser aprovada pela
maioria absoluta dos senadores. Mas, afora a representatividade política do Senado ser muito inferior à
da Câmara, a chancela senatorial tem sido ordinária formalidade: desde a gestão de Floriano Peixoto
(1891-94), quando rejeitou cinco indicações, nunca mais o Senado deixou de, por compadrio ou
displicência, sancionar a escolha presidencial.[22]
 
Quanto ao período de investidura no cargo de Ministro do STF, há que se levar em conta que a
permanência em definitivo em qualquer cargo de poder democrático poderia comprometer a alternância de
poder, imperiosa em governos republicanos, pois sem esta alternância não há que se falar em uma autêntica
República.
 
A respeito do assunto, Walber de Moura Agra anota:
 
Característica dos tribunais constitucionais é a fixação de um mandato para o exercício das funções por
parte de seus membros, o que permite regularidade na renovação de sua composição, mantendo-se
dessa forma sincronia mais estreita com os anseios sociais. [...] Outra importante característica dos
tribunais constitucionais é o impedimento à reeleição de seus membros, vedação existente, dentre
outros, nos tribunais da Alemanha, da Itália, de Portugal e da Espanha. Esse impedimento permite que
os juízes não tenham que se sujeitar às vontades políticas para terem seus mandatos renovados,
podendo atuar livremente no exercício de suas funções, sem pairar nenhuma ameaça às suas atividades.
A única possibilidade jurídica de interrupção de seu mandato antes do prazo determinado é se eles
incorrerem em crime de responsabilidade.[23]
 
Para melhor elucidar o assunto, é útil socorrer-se do direito comparado a fim de verificar a forma
de acesso e o tempo de investidura no cargo de membro de uma Corte Constitucional.
 
Na Espanha, o Tribunal Constitucional é composto por 12 membros nomeados pelo Rei, onde 4
são propostos pelo Congresso, 4 pelo Senado (em ambos os casos aprovados por maioria de 3/5), 2 são
propostos pelo Governo e 2 são propostos pelo Conselho Geral do Poder Judicial. Possuem mandato de
nove anos, renovadas por terça parte. Na França, a composição é mista; existem membros vitalícios (todos
os ex-presidentes, que, na prática, não integram o Conselho Constitucional, por razões políticas e fáticas) e
9 membros indicados, sendo 3 nomeados pelo Presidente da República, 3 pelo Presidente do Senadoe 3
pelo Presidente da Assembléia Nacional, todos para um mandato de nove anos não renovável. Na Itália, a
Corte Constitucional é formada por 15 juízes, 5 nomeados pelo Parlamento, 5 pelo Presidente da República,
e outros 5 pelos Tribunais Superiores; todos possuem mandato de nove anos, proibida a sua recondução. Em
Portugal, o Tribunal Constitucional é composta por 13 juízes, sendo 10 designados pela Assembléia da
República e 3 cooptados por este para um mandato de 6 anos. No Peru, o Tribunal Constitucional é
composto por 7 membros, eleitos por 2/3 dos membros do Congresso da República, para mandatos de 05
anos.[24]
 
No Brasil o debate a respeito da legitimidade da morfologia do STF vem ganhado força não apenas
no meio acadêmico. As atuações recentes do Excelso Tribunal e, sobretudo, a possibilidade de edição de
súmulas vinculantes, levou o tema da acessibilidade e da vitaliciedade do cargo de Ministro do STF ao
Congresso Nacional.
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 7326
 
Foi apresentada a Proposta de Emenda à Constituição – PEC nº 342/2009, idealizada pelo
deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), ex-juiz federal, com a intenção de modificar a redação do artigo 101 da
Constituição Federal a fim de alterar a forma de acesso e o período de investidura no cargo de Ministro do
STF.
 
Segundo a referida PEC, os ministros do STF teriam mandatos de onze anos, vedada a recondução
ou exercício de novo mandato. As indicações seriam feitas da seguinte forma: 5 ministros indicados pelo
presidente da República, devendo a escolha ser aprovada por 3/5 dos membros do Senado Federal; 2
ministros indicados pela Câmara dos Deputados; 02 ministros indicados pelo Senado Federal; 02 ministros
indicados pelo próprio Supremo Tribunal Federal[25]. A justificativa da PEC nº 342/2009 foi explicitada da
seguinte forma:
 
O Supremo Tribunal Federal é, essencialmente, uma Corte Constitucional, sendo o órgão responsável
pela interpretação definitiva de nossa Constituição Federal. Participa, como tal, da tomada de decisões
acerca de assuntos da mais alta relevância para o Estado e para a sociedade. Assim o faz não só atuando
como legislador negativo, realizando o controle de constitucionalidade das leis, mas também exercendo
funções legiferantes positivas, por exemplo, por meio da elaboração de súmulas vinculantes e pelo
salutar ativismo judicial diante de omissões legislativas declaradas inconstitucionais. É inegável,
portanto, o fato de que sua atuação tem forte carga política e consequências de igual natureza. Chega-se,
com alguma razão, a se falar inclusive em um sistema legislativo tri-cameral, em que o STF, juntamente
com as duas Casas do Congresso Nacional, desempenha papel ativo e central no processo de definição
do conteúdo das leis. Ora, se as principais funções exercidas por nossa Corte Constitucional são tão
proeminentemente políticas, é necessário – em respeito à própria noção de República – que haja
alternância entre aqueles que as exercem. Por isso, proponho o estabelecimento de um mandato
limitado em 11 anos para os futuros ministros do Supremo Tribunal Federal, sendo vedada à
recondução ao cargo. Com efeito, é importante que seus mandatos não sejam muito curtos (gerando
instabilidade institucional) ou demasiadamente longos (frustrando a temporariedade) e, na medida do
possível, que não coincidam com os dos outros dois Poderes. Ressalte-se que conferir-se nova
configuração à vitaliciedade dos ministros do STF não gera qualquer violação à independência do
Poder Judiciário. É óbvio que não se deseja ameaçar a independência dos julgadores. De fato, a
vitaliciedade sequer é necessária para que o Supremo Tribunal Federal se mantenha independente. A
função da citada garantia é a de impedir que os magistrados sejam alvos de pressões com relação à
manutenção de seus cargos, o que viria a influenciar suas decisões. Ocorre que, no caso dos ministros
do STF, não há qualquer agente externo que se encontre em posição que lhes seja hierarquicamente
superior e que, assim, seja capaz de contra eles exercer esse tipo de pressão.[26]
 
A proposta de alteração do texto constitucional encontrou um forte eco no mundo jurídico, seja
pelo fato de o STF acumular funções de Tribunal Superior e de Corte Constitucional, seja por haver
necessidade de se garantir uma alternância de poder para um Estado mais democrático.
 
Outras Propostas de Emendas à Constituição tramitam hoje no Congresso Nacional. Em comum,
elas têm o objetivo de diminuir o poder do presidente da República na nomeação dos ministros do Supremo.
 
Embora seja possível dizer que existe uma legitimidade indireta na escolha dos membros do
Supremo Tribunal Federal, porque são escolhidos por representantes eleitos pelo povo, é salutar que estas
escolhas partam de outros setores a fim de conferir uma maior pluralidade à composição da Excelsa Corte
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 7327
brasileira.
 
Em um Estado Democrático de Direito deve-se zelar pela independência do Tribunal
Constitucional, pois, sem esta independência, o conteúdo da Constituição, em grande parte construído pela
interpretação constitucional, estaria comprometido. Mas independência não significa isolamento das
questões sociais. Daí a razão para que o acesso à composição do Supremo Tribunal Federal ocorra mediante
diversos canais representativos da sociedade.
 
 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
 
Neste estudo, foi apresentado um breve apanhado histórico do Poder Judiciário no Brasil, a fim de
compreender o contexto em que surgiu e foi instalado o Supremo Tribunal Federal. Isto permitiu verificar
que, desde os primórdios, buscou-se alcançar a legitimidade democrática da jurisdição constitucional pátria
a fim de realizar seus propósitos.
 
Após esta abordagem histórica, passou-se para um estudo teórico a respeito dos conceitos de
legitimidade, a fim de esclarecer as diferenças entre o que é legítimo e o que é legal, para evitar que se
incida no erro de pensar que uma norma por ser legal é obrigatoriamente legítima.
 
Este desenvolvimento propiciou fazer uma análise da forma de acesso e do período de investidura
dos ministros do STF. Para esta análise, valeu-se do direito comparado para mostrar que, em diversas Cortes
que exercem a jurisdição constitucional, a forma de investidura não recai exclusivamente sobre os ditames
presidenciais, mas é dividida com outros setores jurídico-políticos, que compõem o Estado, proporcionando
uma maior pluralidade social na composição da Corte Constitucional. Quanto ao tempo de investidura dos
seus magistrados, em outras Cortes ele é limitado por um mandato, procurando, assim, garantir alternância
no exercício do poder.
 
Como a Constituição goza de uma supremacia normativa e axiológica, merece ser especialmente
defendida. O órgão que defende a Constituição é a concretização vivente desta. Este órgão deve ser
respeitado e respeitar a si mesmo. Os seus membros devem ser inamovíveis e exercer as funções do cargo
por um período razoável e determinado. É preciso, sobretudo, dotar o Tribunal Constitucional do máximo
de independência e prestígio.
 
Deve-se, por fim, sublinhar que este trabalho pretendeu analisar a legitimidade democrática do
Supremo Tribunal Federal tão-somente a partir da forma de acesso e do período de investidura no cargo de
Ministro desta Corte. É certo que a existência de legitimidade democrática na morfologia do Tribunal
Constitucional não assegura o caráter democrático da decisão proferida por este órgão, mas é inequívoco
que a inexistência daquela macula esta.
 
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 7328
 
7 REFERÊNCIAS
 
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jurisdição constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
 
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CORREA, Oscar Dias. O Supremo Tribunal Federal: Corte constitucional do Brasil. Rio de Janeiro:
Forense, 1987.
 
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Fabris, 1985.
 
FAVOREU, Louis. As Cortes Constitucionais. Trad. Dunia Marinho Silva. São Paulo: Landy, 2004.
 
GARCÍA DE ENTERRÍA. La Constitución como norma y el tribunal constitucional. 4. ed. Madri:
Thomsom Civitas, 2006.
 
KOENER, Andrei. Judiciário e cidadania na Constituição da República Brasileira. São Paulo: HUCITEC
– Departamento de Ciência Política da USP, 1998.
 
LIMA, Francisco Gerson Marques de. O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira.
Fortaleza: ABC, 2001.
 
PEDRA, Adriano Sant’Ana. A Constituição viva: poder constituinte permanente e cláusulas pétreas. Belo
Horizonte: Mandamentos, 2005.
 
PEDRA, Adriano Sant’Ana. A justiça constitucional como elemento de aperfeiçoamento da democracia em
Cuba. In: TAVARES, André Ramos (coord.). Justiça constitucional e democracia na América Latina. Belo
Horizonte: Fórum, 2008.
 
PEDRA, Adriano Sant’Ana. As mudanças no Supremo. Valor Econômico, São Paulo, 06 fev. 2006.
 
SUPREMO Tribunal Federal. Edição comemorativa. Brasília: Senado, 1976.
 
TAVARES. Tribunal e jurisdição constitucional. São Paulo: IBDC, 1998.
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 7329
 
 
 
 
[1] BOECHAT, Leda. História do Supremo Tribunal Federal. Brasília: Senado, 1973, v. I, p. 1.
[2] BOECHAT, Leda. História do Supremo Tribunal Federal. Brasília: Senado, 1973, v. I, p. 11.
[3] SUPREMO Tribunal Federal. Edição comemorativa. Brasília: Senado, 1976, p. 14-16.
[4] NUNES, Castro apud CORREA, Oscar Dias. O Supremo Tribunal Federal: Corte constitucional do Brasil. Rio de Janeiro:
Forense, 1987, p. 5.
[5] CORREA, Oscar Dias. O Supremo Tribunal Federal: Corte constitucional do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 6.
[6] BEETHAN, David. The legitimation of the hanspshire. London: Macmilan, 1991, p. 43.
[7] FARIA, José Eduardo. A crise constitucional e restauração da legitimidade. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1985, p. 13-
14.
[8] DANTAS, Ivo. Teoria do Estado. Belo Horizonte: Del Rey, 1989. p. 115.
[9] AGRA, Walber de Moura. A reconstrução da legitimidade do Supremo Tribunal Federal: densificação da jurisdição
constitucional brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 151.
[10] PEDRA, Adriano Sant’Ana. A Constituição viva: poder constituinte permanente e cláusulas pétreas. Belo Horizonte:
Mandamentos, 2005, p. 276.
[11] DWORKIN. O império do direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p. 426-427.
[12] Tradução livre do original em espanhol: “¿Cómo explicar la sorprendente aceptación general de una institución cuya posición
central está basada enteramente en una competencia, la de judicial review, que no ha sido atribuida expresamente por la
Constitución, sino propiamente ‘usurpada’, o al menos autoatribuida?”. Cf. GARCÍA DE ENTERRÍA. La Constitución como norma
y el tribunal constitucional. 4. ed. Madri: Thomsom Civitas, 2006, p. 135.
[13] Tradução livre do original em inglês: “a body that is not elected or otherwise politically responsible in any significant way is
telling the people’s elected representatives that they cannot govern as they’d like”. Cf. ELY, John Hart. Democracy and distrust: a
theory of judicial review. Cambridge: Harvard University, 1980, p. 4-5.
[14] PEDRA, Adriano Sant’Ana. A justiça constitucional como elemento de aperfeiçoamento da democracia em Cuba. In:
TAVARES, André Ramos (coord.). Justiça constitucional e democracia na América Latina. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 227.
[15] TAVARES. Tribunal e jurisdição constitucional. São Paulo: IBDC, 1998, p. 113.
[16] TAVARES, André Ramos. Tribunal e jurisdição constitucional. São Paulo: IBDC, 1998, p. 84.
[17] BAUM, Lawrence. A Suprema Corte americana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987, p. 13.
[18] PEDRA, Adriano Sant’Ana. As mudanças no Supremo. Valor Econômico, São Paulo, 06 fev. 2006, p. E2.
[19] Alberto Torres e Epitácio Pessoa tiveram rejeitadas suas pretensões de domínio dos seus Estados, devido à regra do
reconhecimento das facções dominantes que Campos Salles estabelecera para a Política dos Governadores. A sua nomeação para o
STF foi uma forma pela qual este presidente assegurou a manutenção da sua aliança com eles. Este também é o caso de Guimarães
Natal, cunhado de Leopoldo de Bulhões, nomeado por Rodrigues Alves. Bulhões era ministro da Fazenda e dominava o estado de
Goiás, onde o seu cunhado era juiz federal. Em meados de 1905, o governador do Estado rompeu com Bulhões, aliando-se à
oposição. Na sucessão governamental, ocorreram duplicatas de governo e assembleia. Rodrigues Alves, porém, não decretou a
intervenção no Estado, encaminhando o caso ao Congresso Nacional, o que resultou no controle do Estado pela oposição. O ministro
pediu demissão, mas Rodrigues Alves não aceitou. Em setembro de 1905, este ofereceu uma cadeira do STF a Bulhões, que indicou
o seu cunhado. Nomeações por aliança parecem ter sido também as de Pedro Lessa e Canuto Saraiva, ligados aos paulistas,
nomeados por Affonso Penna, mineiro. O outro tipo de nomeação era a retribuição pelo presidente da República por serviços
prestados. Rodrigues Alves nomeou três chefes de polícia: Oliveira Ribeiro, desembargador de São Paulo, que fora chefe de polícia
durante seu governo em São Paulo; Cardoso de Castro e Manuel Espínola, na presidência da República. Nilo Peçanha nomeou
Godofredo Cunha, genro de Quintino Bocaiúva e seu amigo (11), e Carolino Leoni Ramos, que fora deputado estadual no Rio de
Janeiro e chefe de Polícia do Distrito Federal durante o seu governo. Cf. KOENER, Andrei. Judiciário e cidadania na Constituição
da República Brasileira. São Paulo: HUCITEC – Departamento de Ciência Política da USP, 1998, p. 189-190.
[20] LIMA, Francisco Gerson Marques de. O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira. Fortaleza: ABC, 2001, p.
50.
[21]ANAMATRA. Disponível em: http://www.ansef.org.br/verNoticia.php?cod=538. Acesso em 25/03/2010.
[22] GOIÁS. Ministério Público do Estado de Goiás. Uma Critica ao Supremo Tribunal Federal. Disponível em:
http://www.mp.go.gov.br/jornais/fullnews.php?id=3438. Acesso em 25/03/2010.
[23] AGRA, Walber de Moura. A reconstrução da legitimidade do Supremo Tribunal Federal: densificação da jurisdição
constitucional brasileira: Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 59.
[24] LIMA, Francisco Gerson Marques de. O Supremo Tribunal Federal na crise institucional brasileira. Fortaleza: ABC, 2001, p.
71-74. Cf. também: FAVOREU, Louis. As Cortes Constitucionais. Trad. Dunia Marinho Silva. São Paulo: Landy, 2004.
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* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010 7330[25] Proposta de Emenda à Constituição nº 342/2009 (Altera dispositivos constitucionais referentes à composição do Supremo
Tribunal Federal): “Art. 1º O artigo 101 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação e acrescido dos seguintes
parágrafos: ‘Art. 101. O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e
cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. §1º. Os Ministros do Supremo
Tribunal Federal serão escolhidos: I – cinco pelo Presidente da República, devendo a escolha ser aprovada por três quintos dos
membros do Senado Federal; II – dois pela Câmara dos Deputados; III – dois pelo Senado Federal; IV – dois pelo Supremo Tribunal
Federal; § 2º. No caso dos incisos II, III e IV serão considerados escolhidos os nomes que obtiverem três quintos dos votos dos
respectivos membros, em escrutínios secretos, tantos quantos forem necessários. § 3º. As escolhas recairão obrigatoriamente em
nomes constantes de listas tríplices que serão apresentadas: I – pelo Superior Tribunal de Justiça II - pelo Tribunal Superior do
Trabalho; III – pelo Conselho Nacional de Justiça; IV – pelo Conselho Nacional do Ministério Público; V – pelo Conselho Federal
da Ordem dos Advogados do Brasil; VI – pelos órgãos colegiados das Faculdades de Direito que mantenham programa de doutorado
em funcionamento há pelo menos dez anos. § 4º. O mandato dos ministros do Supremo Tribunal Federal será de 11 anos, sendo
vedada a recondução ou o exercício de novo mandato. § 5º. A aposentadoria dos ministros do Supremo Tribunal Federal ocorrerá
nos termos do art. 40. § 6º. É vedado ao ministro do Supremo Tribunal Federal o exercício de cargos em comissão ou de mandatos
eletivos em quaisquer dos Poderes e entes da federação até três anos após o término do mandato previsto no § 4º.’ (NR) Art. 2º As
regras previstas no artigo anterior somente se aplicarão aos ministros do Supremo Tribunal Federal nomeados após a publicação
desta Emenda Constitucional. Art. 3º As escolhas iniciais para os cargos que vagarem no Supremo Tribunal Federal a partir da
publicação desta Emenda Constitucional obedecerão à seguinte ordem: I – Primeira, quinta, nona, décima e décima primeira, pelo
Presidente da República. II - Segunda e sexta, pela Câmara dos Deputados; III – Terceira e sétima, pelo Senado Federal; IV – Quarta
e oitava, pelo Supremo Tribunal Federal; Art. 4º Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.”
[26] Disponível em http://www.direitodoestado.com/noticias/noticias_detail.asp?cod=8134. Acesso em 28/03/2009.
 
 
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