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W BA 14 20 _V 1. 0 SAÚDE E NUTRIÇÃO NA INFÂNCIA: IMUNIDADE E CONDIÇÕES PARTICULARES 2 Izabella Tesoto Loscalzo Londrina Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2024 SAÚDE E NUTRIÇÃO NA INFÂNCIA: IMUNIDADE E CONDIÇÕES PARTICULARES 1ª edição 3 2024 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR Homepage: https://www.cogna.com.br/ Diretora Sr. de Pós-graduação & OPM Silvia Rodrigues Cima Bizatto Conselho Acadêmico Alessandra Cristina Fahl Ana Carolina Gulelmo Staut Camila Turchetti Bacan Gabiatti Camila Braga de Oliveira Higa Giani Vendramel de Oliveira Gislaine Denisale Ferreira Henrique Salustiano Silva Leonardo Ramos de Oliveira Campanini Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Coordenador Camila Turchetti Bacan Gabiatti Revisor Andressa Mara Baseggio Editorial Beatriz Meloni Montefusco Carolina Yaly Márcia Regina Silva Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)_____________________________________________________________________________ Loscalzo, Izabella Tesoto Saúde e nutrição na infância - imunidade e condições Secundário, particulares/ Izabella Tesoto Loscalzo, – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A 2024. 32 p. ISBN 978-65-5903-535-9 1. Intolerâncias e alergias alimentares 2. Nutrição Infantil 3. Nutrição vegetariana na infância I.Título. CDD 613.2083 _____________________________________________________________________________ Raquel Torres – CRB 8/10534 L879s © 2024 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. https://www.cogna.com.br/ 4 SUMÁRIO Apresentação da disciplina __________________________________ 05 Nutrição e imunidade na primeira infância __________________ 06 Fundamentos da resposta imune a alergias e Intolerâncias alimentares (defeitos enzimáticos) ___________________________ 19 Obesidade Infantil e doenças crônicas na infância, aspectos nutricionais e tratamento dietoterápico ______________________ 31 Nutrição vegetariana na infância e adolescência, aspectos nutricionais e dietoterapia ___________________________________ 44 SAÚDE E NUTRIÇÃO NA INFÂNCIA: IMUNIDADE E CONDIÇÕES PARTICULARES 5 Apresentação da disciplina Olá, alunos! A disciplina Saúde e nutrição na infância: imunidade e condições particulares traz para você uma série de elementos atuais e bastante práticos relacionados à saúde dentro da pediatria. Ao longo dos materiais falamos sobre a importância da imunidade e sua relação com a alimentação e nutrição, compreendemos os processos alérgicos e metabólicos envolvidos com determinadas reações adversas que podem ocorrer em crianças susceptíveis e falamos, ainda, de como tratar e diferenciar cada uma delas. Além disso, neste material você encontrará uma aula especial sobre obesidade e doenças crônicas na infância e adolescência, onde você vai aprender a reconhecer a sua complexidade, suas causas e consequências, critérios diagnósticos e de tratamento. Por fim, você vai apreciar um material completo sobre vegetarianismo infantil e juvenil, onde vai aprender sobre as especificidades dietéticas entre aqueles que seguem este estilo alimentar. Todas as aulas abordam os temas de forma bastante simples, direta e prática. Bons estudos! 6 Nutrição e imunidade na primeira infância Autoria: Izabella Tesoto Loscalzo Leitura crítica: Andressa Mara Baseggio Objetivos • Orientar o leitor sobre a importância da boa nutrição na primeira infância. • Estabelecer os aspectos que influenciam na imunidade da criança. • Indicar aspectos específicos sobre a alimentação, nutrição e imunidade na primeira infância. 7 1. Conceitos sobre a primeira infância Para compreendermos sobre a relevância da primeira infância dentro do contexto da alimentação, nutrição e imunidade, é importante, inicialmente, conceituarmos esse termo que vem sendo cada vez mais falado Apesar de existirem diferentes definições cronológicas para esse importante momento da vida, no Brasil se define como primeira infância a fase da vida que tem início ao nascimento e término aos seis anos de idade. No entanto, é importante reforçar que dentro deste período, existe uma janela de bastante relevância no contexto do crescimento e do desenvolvimento infantil, que vai do nascimento aos três anos de idade, conhecida como “primeiríssima infância”. O fato de existir dentro da primeira infância dois momentos cronológicos distintos, muitas vezes gera alguma confusão sobre qual seria a melhor definição para o marco da primeira infância, e por isso alguns dados podem diferir-se entre si, dentre as diversas publicações que são encontradas na literatura (Brasil, 2016). É possível observar a seguir uma ilustração que busca definir cronologicamente o marco temporal da primeira infância. Figura 1 – Definição da primeira infância Fonte: https://www.primeirainfanciaempauta.org.br/bem-vindo-ao-inicio-da-vida. html#:~:text=%5B1%5D%20A%20Lei%20n.,%5B2%5D%20BARAN%2C%20M. Acesso em: 13 mar. 2024. https://www.primeirainfanciaempauta.org.br/bem-vindo-ao-inicio-da-vida.html#:~:text=%5B1%5D%20A%20Le https://www.primeirainfanciaempauta.org.br/bem-vindo-ao-inicio-da-vida.html#:~:text=%5B1%5D%20A%20Le 8 Independentemente de questões específicas relacionadas aos marcos temporais e suas interpretações, é indiscutível que a primeira infância é um dos momentos mais relevantes na vida e saúde geral do ser humano, envolvendo fatores como crescimento, desenvolvimento, alimentação, nutrição e imunidade. Muitos são os aspectos que influenciam positivamente neste processo, dentre eles merece destaque: vacinação em dia, cuidados de higiene, acompanhamento pelo médico pediatra, amamentação e alimentação saudável. Nesse sentido, diversas pesquisas demonstram a imensa relevância dos cuidados alimentares e nutricionais precoces para o pleno desenvolvimento físico, cognitivo, neuromotor e imunológico, a fim de garantir o bem-estar ao longo de toda a vida da criança. Sendo assim, esses fatores são determinantes na prevenção das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), onde se incluem alguns tipos de cânceres, doenças autoimunes e alergias diversas (Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, 2013). Diante disso, podemos perceber o quanto é importante cuidarmos com atenção das crianças que se encontram na primeira infância, não é mesmo? Conquistar uma infância saudável. aumenta muitíssimo as chances de termos adultos com menos problemas de saúde física e mental mais pra frente. A primeira infância deve ser cuidada! Dito tudo isso, vamos contextualizar de forma mais específica sobre a alimentação e nutrição na primeira infância? 2. Alimentação e nutrição da primeira infância Já sabemos da relevância que os cuidados adequados e oportunos instituídos ao longo dos primeiros seis anos de vida da criança, também conhecido como o tempo da “primeira infância”, têm para o resto da vida, certo? Agora vamos afunilar o assunto um pouco mais, para 9 entendermos como a alimentação pode influenciar nesse momento precioso! Para tanto, vamos organizar em partes! Aleitamento materno O leite materno constitui o alimento primordial do ser humano após o nascimento, sendo frequentemente descrito como “ouro líquido” e uma maravilha da natureza. Em condições normais, o aleitamento materno é o meio mais adequado de se alimentar um bebê recém- nascido exclusivamente até os seis meses, e complementando com outros alimentos até dois anos ou mais. Falamos aqui de um alimento nutricionalmente adequado para aquela criança,da resposta imune a alergias e Intolerâncias alimentares (defeitos enzimáticos) Objetivos 1. As reações adversas aos alimentos 2. O que é alergia alimentar? 3. Fatores de risco das alergias alimentares 4. Sintomas comuns das alergias alimentares 5. Os alimentos mais alergênicos 6. O manejo clínico das alergias alimentares 7. Sobre as intolerâncias alimentares 8. Conectando à realidade Referências Obesidade Infantil e doenças crônicas na infância, aspectos nutricionais e tratamento dietoterápico. Objetivos 1. Fatores epidemiológicos e sociais da obesidade na infância e suas doenças crônicas associadas 2. Fatores etiológicos da obesidade na infância 3. Avaliação e diagnóstico alimentar e nutricional 4. Tratamento dietoterápico da obesidade e doenças crônicas associadas na infância 5. Conectando à realidade Referências bibliográficas Nutrição vegetariana na infância e adolescência, aspectos nutricionais e dietoterapia Objetivos 1. Conceitos básicos sobre o vegetarianismo 2. Os macronutrientes na dieta vegetariana durante a infância e adolescência 3. Os micronutrientes na dieta vegetariana durante a infância e adolescência 4. Conectando à realidade Referênciasque contém em sua composição todos os nutrientes necessários para o bebê, em quantidades suficientes e na temperatura ideal. Além disso, o leite materno (LM) não é apenas uma fonte de nutrientes. Trata-se de um alimento vivo, riquíssimo em componentes imunologicamente ativos que possuem propriedades anti-infecciosas e anti-inflamatórias. E não paramos por aí! A amamentação também se associa positivamente com benefícios emocionais e cognitivos para a criança (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). Nesse contexto, achados científicos conduzidos por IP (2009) identificaram que a ausência do aleitamento materno está associada com menor escore de inteligência e também com perdas econômicas de cerca de US$ 302 bilhões todos os anos, o que representa em torno de 0,49% da renda nacional bruta mundial, uma vez que a ausência do aleitamento materno está associada com agravos de saúde, gerando gastos públicos relevantes. Sendo assim, além de todos os benefícios que vimos anteriormente, também concluímos que o ato de amamentar também produz benefícios econômicos para a sociedade. O que nos faz refletir: se é tão importante em amplo espectro, deveríamos ter maiores e melhores investimentos públicos que objetivem proteger, promover e apoiar a amamentação, não é mesmo? 10 Nutrientes que merecem atenção A primeira infância é uma fase de intenso crescimento e desenvolvimento. Por isso, alguns nutrientes merecem mais atenção do que outros. Nesse sentido, as políticas de saúde pública do Brasil orientam sobre a necessidade de atenção e, muitas vezes, suplementação de determinados nutrientes. Vamos falar um pouco sobre eles: • Ferro: dentre todas as carências nutricionais encontradas no mundo, a anemia ferropriva é a mais comum delas, e tem maior prevalência em crianças que vivem nos países em desenvolvimento, o que é o caso do Brasil. As menores de 2 anos são as que apresentam maior risco de desenvolver essa deficiência. As consequências da anemia ferropriva associam- se com mau desenvolvimento mental e psicomotor, menor imunidade, maior morbidade e mortalidade infantil e menor desempenho escolar. Para tanto, recomenda-se para todas as crianças a suplementação preventiva de ferro todos os dias (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). A quantidade a ser suplementada, bem como o momento de iniciar podem ser observados na Tabela 1. Tabela 1 – Recomendação de suplementação medicamentosa profilática de ferro Situação Recomendação Recém-nascido a termo, peso adequado para a idade gestacional, em aleitamento materno exclusivo 1 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando aos 90 dias vidas até o 24º mês de vida. Recém-nascido a termo, peso adequado para a idade gestacional. independentemente do tipo de alimentação (fórmula infantil ou leite de vaca integral). 1 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando aos 90 dias vidas até o 24º mês de vida. 11 Recém-nascidos a termo com peso inferior a 2.500 g. 2 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando com 30 dias de vida, durante um ano. Após este prazo, 1 mg/kg/dia mais um ano. Recém-nascidos prematuros com peso superior a 1.500 g 2 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando com 30 dias de vida, durante um ano. Após este prazo, 1 mg/kg/dia mais um ano. Recém-nascidos prematuros com peso entre 1.500 e 1.000 g. 3 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando com 30 dias de vida, durante um ano. Após este prazo, 1 mg/kg/dia mais um ano. Recém-nascidos prematuros com peso inferior a 1.000 g. 4 mg de ferro elementar/kg/dia, iniciando com 30 dias de vida, durante um ano. Após este prazo, 1 mg/kg/dia mais um ano. Recém-nascidos prematuros que receberam mais de 100 mL de concentrado de hemácias durante a internação. Devem ser avaliados individualmente pois podem não necessitar de suplementação de ferro com 30 dias de vida, mas sim posteriormente. Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria (2021). • Vitamina D: apesar de vivermos em um país tropical, o risco de deficiência é alto e, por isso, recomenda-se que haja suplementação desta vitamina nos 2 primeiros anos de vida de qualquer criança, sendo a dose de 400UI a partir da primeira semana de vida até que ela complete 12 meses, e 600UI por dia até que ela complete 24 meses. • Por sua vez, o cálcio também merece atenção, especialmente pela alta demanda da fase em função do crescimento. Como existe uma vasta gama de alimentos ricos em cálcio, bem como o próprio leite materno, orienta-se que haja apenas o consumo adequado, e não a suplementação profilática. Por fim, é importante que se saiba que outros nutrientes também são relevantes e que devem ser considerados para garantir o adequado consumo alimentar e nutricional, como a Vitamina A, zinco e a vitamina B12 (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). 12 Comportamentos alimentares que devem ser considerados e que podem influenciar na qualidade da alimentação durante a primeira infância • Comer bem, nutrir-se adequadamente com alimentos e suplementos em casos específicos, a gente já sabe que são condutas alimentares e nutricionais de bastante importância para promover o melhor cenário de desenvolvimento e crescimento ao longo da primeira infância. • No entanto, algumas fases são esperadas que se iniciem em algum momento ao longo dos seis primeiros anos de vida da criança. São as fases que compreendem hábitos alimentares mais seletivos, que são normais em muitos casos e — como já falamos — esperados. Porém, não é incomum que estas fases piorem e evoluam para o que conhecemos como dificuldade alimentar propriamente dita. O quadro se agrava dependendo de como a família lida com essa fase, e também pode ser influenciado de acordo com a forma que transcorreram as oportunidades alimentares oferecidas ao longo de toda a fase da introdução da alimentação complementar, tais como a oferta dos grupos alimentares de forma adequada, respeito aos sinais de fome e saciedade, evolução das texturas, propiciar vínculo e interação da criança com a comida, entre outros aspectos. • Portanto, é possível concluir que comer não é apenas nutrir! O comportamento importa também. Ou seja, é preciso entender que é normal uma criança ter preferências e aversões alimentares diferentes da sua família, que os padrões de fome e saciedade não são iguais para todo mundo, nem todos os dias, que os contextos que envolvem o ato de comer também podem influenciar bastante no consumo alimentar. A forma como a família lida com essas questões pode evoluir para um quadro de dificuldade alimentar, que pode ser representado por aversão múltipla à alimentos, 13 recusa parcial ou total de comida, neofobia exagerada, restrição exagerada conforme cor, textura, marca, sabor ou temperatura, além de troca de refeição por leite ou outro alimento preferido, reações agressivas e ansiosas perante o momento da refeição, entre outras características bastante desafiadoras. Para nutrir bem, é preciso considerar o comportamento em sua integralidade. Para que a alimentação transcorra adequadamente ao longo de toda a vida da criança e influencie positivamente na sua nutrição e imunidade, é importante olhar para esse assunto com a complexidade que ele merece (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). 3. Nutrição e imunidade na primeira infância Quando se fala de nutrição e imunidade, é preciso considerar a interação entre a microbiota intestinal e o sistema imunológico. Os microrganismos intestinais são fundamentais para o desenvolvimento da imunidade, pois as bactérias da microbiota normal promovem um efeito barreira impedindo a colonização de bactérias patogênicas. Além disso, eles têm função imunomoduladora, que corresponde à interação entre o microbioma e as células do intestino que promovem uma resposta contínua do sistema imunológico. Algumas doenças do sistema imune, como as alergias, podem estar relacionadas com problemas na fase da formação da microbiota intestinal. Por fim, há também a função metabólicae nutricional, uma vez que as bactérias intestinais são capazes de auxiliar no metabolismo de diversos nutrientes. A formação da microbiota intestinal se estabiliza por volta dos dois anos de idade da criança, e parece permanecer em um mesmo padrão ao longo de toda a vida. Daí a importância de cuidados cada vez mais precoces com o bebê neste sentido, como alimentação, garantindo a oferta do leite materno 14 e propiciando uma variedade alimentar rica em alimentos “in natura” e minimamente processados (Brandt et al., 2006). Além da microbiota, existem alguns nutrientes que se associam com uma melhora da resposta imunológica, como os descritos no Quadro 1. Quadro 1 – Nutrientes que influenciam no sistema imune Nutriente Ação imunológica Alimentos-fonte Vitamina A Chamada de vitamina anti- infecciosa, pois tem papel importante na estabilidade celular e nos tecidos do sistema imune. Brócolis, couve, abacate, beterraba, cenoura, laranja, mamão, figo, kiwi, ervilhas, lentilha, carnes e vísceras. Vitamina C Manutenção da função da barreira epitelial, no crescimento e atuação das células do sistema imune inato e adaptativo, na migração celular, na fagocitose e na produção de anticorpo. Pimentão amarelo, mamão papaia, goiaba, caju, brócolis, frutas cítricas como laranja, limão, mexerica, acerola e morango. Zinco Aumenta, complementa e estimula a resistência do sistema imunológico. Tem uma relação com a atividade de células T auxiliadoras, desenvolvimento de linfócitos T citotóxicos, hipersensibilidade retardada, proliferação de linfócitos T, produção de interleucina (IL) - 2 e apoptose de células de linhagens mieloide e linfoide. Mariscos, ostras, carnes vermelhas, fígado, miúdos, ovos, nozes e leguminosas. Vitaminas do complexo B Atuam no funcionamento adequado do sistema imune. Diversos alimentos variados de origem vegetal (hortaliças, cereais e frutas) e animal (carnes, ovos e vísceras). Vitamina D Atua na diferenciação de células como linfócitos, macrófagos e natural killers (NK) e na modulação de citocinas. Exposição solar segura, leite e derivados, alguns peixes como salmão, óleo de fígado de bacalhau e ovo. Ácidos graxos ômega-3 Atua em diversos aspectos, inclusive na resposta inflamatória. Óleo de peixe e de algas. Fonte: Associação de Pediatria de São Paulo (2020). 15 É importante reforçar que suplementar nutrientes específicos, ou dar grande atenção ao consumo de alimentos fonte, sem manejar outros aspectos como consumo hídrico, estresse, atividade física, entre outros, não garante uma imunidade imbatível. O contexto alimentar e nutricional é importante neste sentido (Associação de Pediatria de São Paulo, 2020) Por fim, vimos ao longo de todo este instrumento que existem muitas relações entre nutrição e imunidade na primeira infância, e que elas são especialmente importantes, pois muitos dos eventos que ocorrem nesta época da vida perduram para o resto das nossas vidas. Alimentação, nutrição, comportamento alimentar, imunidade, crescimento e desenvolvimento. Tanta coisa acontece nessa fase que precisa de atenção, não é mesmo? 4. Conectando à realidade Ao longo de todo este material abordamos a importância da imunidade e nutrição durante a primeira infância. Nesse contexto, destaca-se uma experiência relevante ocorrida em um consultório. Certa vez, um bebê de um ano foi atendido, apresentando queixas da família sobre sua baixa imunidade, constantes episódios de nariz escorrendo e necessidade frequente de medicação. Eles relataram um grande cansaço no ciclo de sintoma e medicação, e resolveram me procurar para dar uma chance para a nutrição! Era uma bebê que tinha algumas questões: comia sopinha batida, os cuidadores faziam uma panela enorme de sopa toda semana, e iam oferecendo a mesma preparação todos os dias, no almoço e no jantar. A última sopa relatada tinha: mandioquinha, chuchu, couve e caldo de carne. As frutas eram ofertadas em forma de suco, o bebê nunca tinha recebido 16 suplemento de ferro ou vitamina D até aquele momento e tomava fórmula infantil desde o primeiro mês de vida. A mãe também ofertava extrato não alcoólico de própolis por conta própria. A solução identificada envolveu a adequação da suplementação de ferro e vitamina D, nutrientes críticos com alto risco de deficiência nessa faixa etária. Além disso, recomendou-se diversificar a alimentação. A prática de servir sopa semanalmente, embora conveniente, resultava em uma dieta monótona e nutricionalmente limitada, devido ao cozimento excessivo e à liquidação dos alimentos, que reduzia o aporte nutricional e as características sensoriais dos pratos. O maior desafio surgiu com a necessidade de mudança na consistência das refeições. Devido a um episódio traumático de engasgo, houve resistência dos pais em abandonar a sopa liquidificada em favor de alimentos amassados, que deveriam evoluir em textura gradualmente, até alcançar a consistência usual da dieta familiar. Por fim, após três meses de adaptação de preparos e da suplementação, o bebê finalmente começou a demonstrar uma imunidade mais fortalecida! Apenas com atitudes simples e sem “milagres mirabolantes”. A nutrição pode ser mais simples do que imaginamos! Referências ASSOCIAÇÃO DE PEDIATRIA DE SÃO PAULO. Departamento de Pediatria da Associação Paulista de Medicina (org.). Nutrição adequada e proteção do sistema imunológico na época da COVID-19. São Paulo, 2020. 16 p. BRANDT, K. G. et al. Importância da microflora intestinal. Revista de Pediatria, São Paulo, v. 28, n. 2, p. 117-127, 2006. BRASIL. Lei nº 13.257, de 08 de março de 2016. Marco Legal da Primeira Infância. 1. ed. 8. Brasília, DF: Presidência da República, 2016. 17 FUNDAÇÃO MARIA CECÍLIA SOUTO VIDIGAL (org.). Primeiríssima infância da gestação aos 3 anos: percepções e práticas da sociedade brasileira sobre a fase inicial da vida. São Paulo: Studio 113, 2013. 100p. IP, S. et al. A Summary of the Agency for Healthcare Research and Quality’s Evidence Report on Breastfeeding in Developed Countries. Breastfeeding Medicine, p 17–30, 2009. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA (org.). Guia prático de alimentação da criança de 0 a 5 anos. São Paulo: Departamentos Científicos de Nutrologia e Pediatria Ambulatorial, 2021. 74 p. 18 Fundamentos da resposta imune a alergias e Intolerâncias alimentares (defeitos enzimáticos) Autoria: Izabella Tesoto Loscalzo Leitura crítica: Andressa Mara Baseggio Objetivos • Diferenciar as reações adversas promovidas pelos alimentos. • Compreender os mecanismos fisiopatológicos das alergias alimentares. • Identificar as causas associadas e tratamentos das alergias alimentares. • Estabelecer conceitos de intolerâncias alimentares e formas de tratamento. 19 1. As reações adversas aos alimentos Os alimentos, além de fornecerem os nutrientes necessários para a nossa saúde, podem desencadear uma série de reações adversas que podem impactar significativamente na qualidade de vida das pessoas. Dentre as reações adversas conhecidas, têm-se as intolerâncias e alergias alimentares. Apesar de apresentarem sintomas semelhantes, os mecanismos fisiopatológicos responsáveis por cada uma dessas reações são diferentes (Lucio; Leal, 2022). A Figura 1 apresenta um mapa mental que distingue as reações adversas promovidas por alimentos Figura 1 – Classificação das reações adversas aos alimentos Fonte: elaborada pela autora. Baseado nessas informações, é importante que a gente conheça e diferencie cada uma das reações adversas promovidas por alimentos. Inicialmente vamos abordar com profundidade as alergias alimentares e depois falaremos sobre as intolerâncias. Bons estudos! 20 2. O que é alergia alimentar? A alergia alimentar é uma reação adversa aos alimentos, do tipo imunológica, que ocorre após o consumo e/ou contato com determinados alimentos. Trata-se de uma reação dependente de mecanismo imune, mediado por anticorpo IgE ou não (SociedadeBrasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). Neste sentido, é importante entendermos e diferenciarmos os tipos de reações, que são: • Mediadas por IgE, que ocorrem após a sensibilização a alérgenos alimentares que formam anticorpos de classe IgE, que, por sua vez apresentam manifestações clínicas de hipersensibilidade imediata, tais como as reações cutâneas, respiratórias, gastrointestinais e até as sistêmicas, que são caracterizadas por anafilaxia e choque anafilático (Sampson, 2016). • Mediadas por IgE e hipersensibilidade celular, o que significa que as reações são decorrentes dos mecanismos mediados por IgE, associados à participação dos linfócitos T e de citocinas pró- inflamatórias, tais como a esofagite eosinofílica, dermatite atópica e a asma (Sampson, 2016). • Não mediadas por IgE, são aquelas em que as manifestações não ocorrem de forma imediata, e por isso são classificadas como uma hipersensibilidade mediada por células. Este tipo de manifestação é bastante desafiador na prática clínica onde busca-se identificar o elemento alergênico provindo da alimentação (Sampson, 2016). 21 3. Fatores de risco das alergias alimentares É possível dizer que apenas a exposição aos alérgenos não é suficiente para determinar a alergia. É importante compreender que existem fatores de risco para atopia, o que culmina em sujeitos com baixo, médio ou alto risco para as alergias. A seguir falaremos um pouco de cada fator de risco associado: • Hereditariedade genética: a história familiar de alergia alimentar é um excelente indicativo de risco para sua ocorrência. Para se ter uma ideia, o risco de uma criança ser alérgica a algum alimento é 40% maior se um membro da família também é. Este risco dobra para 80% quando a alergia é observada em dois familiares próximos (Savage; Johns, 2015; Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). • Gestação: ainda um aspecto controverso no meio científico, o que evidencia a necessidade de mais estudos. Por via das dúvidas, a maioria das sociedades científicas internacionais orientam que todas as mães consumam uma alimentação balanceada e equilibrada, não restritiva, durante a gestação e a lactação. Até o momento não existem evidências robustas que indiquem que alguma modificação dietética significativa durante a gestação possa prevenir ou causar alguma alergia alimentar. Como ainda existem dados controversos e em análise, recomenda-se, portanto, garantir uma alimentação adequada, balanceada e variada durante todo o período gestacional. Por outro lado, estudos bem documentados associaram que o tabagismo e etilismo durante a gestação podem ser fatores de risco para níveis elevados de IgE para antígenos alimentares e alérgenos (Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). • Lactação: a exposição ao leite materno possui um papel bastante relevante na indução da tolerância oral, quando o alimento 22 alergênico é introduzido de forma complementar, uma vez que o leite materno possui IgA secretora, que atua como bloqueador de antígenos alimentares e ambientais e também auxilia na maturação da barreira intestinal do lactente. É importante reforçar que quando a amamentação ocorre de forma exclusiva até os 6 meses, há maior associação com a prevenção do aparecimento de sintomas alérgicos. Por outro lado, receber fórmula infantil pode ser um indutor de disbiose intestinal, especialmente quando ofertada nos primeiros dias de vida (Savage; Johns, 2015; Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018) • Disbiose: que é quando as bactérias que compõem o nosso trato gastrointestinal estão desequilibradas, uma vez que a colonização intestinal pré, peri e pós-natal, que se forma e estabiliza especialmente nos dois primeiros anos de vida, é um processo fundamental para o desenvolvimento adequado de diversos sistemas, inclusive o imunológico. Alguns fatores podem influenciar de forma negativa neste processo, eles são: parto cesariano, uso precoce de fórmula infantil, ausência de aleitamento materno, uso materno de antibiótico durante a gestação e lactação, bem como práticas excessivas de higiene (Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). 4. Sintomas comuns das alergias alimentares As manifestações clínicas de hipersensibilidade a alimentos podem ser cutâneas, gastrointestinais, respiratórias e sistêmicas. A Tabela 1 demonstra um resumo das principais manifestações alérgicas: 23 Tabela 1 – Manifestações clínicas de hipersensibilidade Manifestação clínica Sintomas Cutâneas Urticária, angioedema e dermatite atópica. Gastrointestinais Edema, hiperemia, prurido e sensação de queimação nos lábios, língua, palato e garganta), náuseas, vômitos, dor abdominal e diarreia, refluxo gastroesofágico, disfagia, impactação alimentar no esôfago, gastrite eosinofílica, cólica do lactente, enteropatia induzida por proteína alimentar, enterocolite induzida por proteína alimentar, protocolite eosinofílica e constipação intestinal. Respiratórias Rinite alérgica, asma persistente, síndrome de Heiner. Sistêmicas Anafilaxia. Fonte: adaptada de SBP (2018). 5. Os alimentos mais alergênicos Alérgeno é qualquer substância que pode gerar uma resposta de hipersensibilidade. Quando contextualizamos para a alimentação, em sua maioria isso significa glicoproteínas hidrossolúveis. Embora, tecnicamente, qualquer alimento possa causar alergia, sabe-se que 80% das reações ocorrem com alimentos específicos, como leite de vaca, ovo, soja, trigo, amendoim, castanhas, peixes, crustáceos e, mais recentemente, kiwi e gergelim estão ganhando destaque nessa lista. A Tabela 2 demonstra não apenas esses alimentos, mas as proteínas envolvidas com a manifestação alérgica (Solé et al., 2008). 24 Tabela 2 – Alimentos e suas proteínas alergênicas Alimento Leite de vaca: Caseínas (as-caseínas: as1, as2, ß-caseínas, k-caseínas, g-caseínas). Proteínas do soro (ß-lactoglobulina, a-lactoalbumina). Proteases e peptonas, proteínas do sangue, albumina e imunoglobulinas. Ovo de galinha: Clara (albumina, ovalbumina, ovomucoide, ovotransferrina, ovomucina e lisozima). Gema (grânulo, lipovitelina, fosvitina e lipoproteína de baixa densidade). Plasma (Lipoproteína de baixa densidade e Livetina). Peixe: Parvalbuminas (alérgeno M). Crustáceos: Tropomiosinas Leguminosas: Leguminas. Vicilinas. Trigo: Albumina hidrossolúvel. Globulinas solúveis. Prolaminas (Gliadinas a, b, g, v). Glutelinas (Gluteninas). Soja: Globulinas (7S: ß-conglicina, ß-amilase, Lipoxigenase, Lecitina). 11S: glicinina, proteínas do soro, hemaglutinina inibidor de tripsina, urease. Amendoim: Albuminas (aglutininas, glicoproteínas lecitino reativas, inibidores de protease, inibidores de a-amilase, fosfolipases). Globulinas (araquina, conaraquina). Fonte: Solé et al. (2008). 6. O manejo clínico das alergias alimentares O manejo clínico da alergia alimentar diagnosticada é feito de duas formas: • No contexto da urgência/emergência • Neste caso o tratamento é sempre focado na promoção do alívio dos sintomas desencadeados, além de observação de evolução para reação mais grave, como edema de glote ou choque anafilático. Dessa forma, o profissional que vai manejar o tratamento emergencial é o médico, que definirá as medicações e outras medidas para solucionar as reações imunológicas, 25 onde a permeabilidade das vias aéreas, nível de consciência e respiração são os primeiros critérios a se avaliar, para definir a urgência e gravidade da reação, bem como o tratamento oportuno (Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). • No contexto ambulatorial especializado • A única terapia eficaz é a exclusão dietética do alérgeno. Nesse sentido, o paciente e seus responsáveis devem ser adequadamente informados sobre como garantir a exclusão do alérgeno, com orientações como: leitura de rótulos,denominação dos ingredientes de risco, contaminação cruzada na cozinha, contaminação cruzada em ambientes de manipulação como açougue, padaria, restaurantes; receitas adaptáveis, alimentos substitutos do ponto de vista nutricional, alimentos substitutos do ponto de vista culinário, suplementação nutricional quando necessário, medidas de enfrentamento caso haja consumo acidental (especialmente nos casos que envolvem anafilaxia), entre outras frentes para se abordar no contexto clínico. Além disso, em lactentes que apresentem alguma reação alérgica, a dieta de exclusão deve partir da lactante que também receberá as orientações citadas anteriormente. Para os casos onde não há presença do aleitamento materno, reforça-se a importância de utilizar fórmulas infantis adaptadas, conforme a individualidade do caso. Por fim, em linhas gerais, admite-se que a maioria das crianças desenvolverá tolerância clínica nos três primeiros anos, em média (Sociedade Brasileira de Pediatra; Associação Brasileira de Alergia, 2018). 26 7. Sobre as intolerâncias alimentares A intolerância alimentar é, assim como as alergias alimentares, um tipo de reação adversa aos alimentos. No entanto, são enfermidades distintas, pois as intolerâncias não envolvem o sistema imunológico, mas sim patologias sistêmicas e do trato gastrointestinal. Neste sentido, há ausência ou insuficiência da produção de determinadas enzimas digestivas responsáveis pela digestão e absorção de determinados alimentos. Ou seja, trata-se de um déficit enzimático que resulta na má absorção de nutrientes (Lucio; Leal, 2022). Os dados epidemiológicos são escassos e cheios de vieses, contudo, estima-se que, em média, cerca de 15-20% dos indivíduos sofrem de alguma intolerância alimentar (Zopf, 2008). Os sintomas que envolvem as reações de intolerância alimentar são semelhantes com os das alergias, tais como, cutâneos, gastrointestinais, respiratórios e sistêmicos, que envolvem o intestino irritável, dor abdominal, dor de cabeça, distensão abdominal, diarreia, coceira na pele, cansaço excessivo, náuseas e vômitos. Os tipos mais comuns são: intolerância à lactose, ao glúten e aos corantes alimentares (que incluem os edulcorantes). Para diagnosticar uma intolerância alimentar, é possível realizar testes laboratoriais que visem identificar as atividades enzimáticas. Porém, não existe nenhum método diagnóstico “padrão ouro”, sendo a histórias clínica do paciente, seguida da exclusão do alimento suspeito, um método satisfatório desde que o profissional seja capacitado para avaliar as variáveis características das individualidades de cada paciente, uma vez que para alguns indivíduos os sintomas aparecem apenas após determinada quantidade ingerida do alimento suspeito, e em quantidades menores, não. Esse fato representa um desafio para diagnosticar e tratar pacientes intolerantes (Lucio; Leal, 2022; Zopf, 2008). 27 O tratamento, por sua vez, envolve a exclusão total ou parcial do alimento/produto suspeito, a depender dos sintomas e tolerância mínima após a exposição. Além disso, é possível também utilizar a suplementação da enzima exógena para quando há risco de consumo acidental ou também, em determinados casos, quando o paciente planeja comer o alimento em si. De mesmo modo, especialmente nos casos de intolerância à lactose, já existe uma gama bastante variada de produtos lácteos que adicionam a enzima lactase na formulação do alimento e, consequentemente, os tornam apropriados para o consumo em sujeitos intolerantes (Zopf, 2008). 8. Conectando à realidade Quando uma mãe que amamenta e descobre que seu bebê tem APLV (alergia às proteínas do leite de vaca), normalmente é um grande susto. O que fazemos hoje é conduzir a dieta materna da lactante, de modo que o leite de vaca e os seus derivados sejam excluídos da rotina alimentar por cerca de 4-6 semanas, ou quanto tempo o gastropediatra julgar necessário. Porém, o que vejo muito na prática é um caminho diferente: lactantes iniciam o processo de desmame, para que possam ofertar a fórmula infantil com aminoácidos extensamente hidrolisados ao bebê, e que não precisem mais seguir a restrição alimentar. Todos sabemos que o leite materno é o padrão ouro para a nutrição, imunidade e hidratação do bebê. Para bebês alérgicos isso é ainda mais relevante. Por causa disso, na prática clínica e orientados pelos guidelines mais atuais, em casos onde “bebês APLV” não apresentem diarreia, desconforto ou problemas com ganho de peso, é possível que a lactante possa manter o consumo de derivados lácteos, com algumas limitações 28 e bom senso. Tolera-se apenas o sangue nas fezes, desde que o bebê esteja crescendo e se desenvolvendo adequadamente, apesar da alergia. Interessante, não é? Referências LUCIO, A. C.; LEAL, C. Intolerância alimentar. Natal: Ufrn, 2022. SAMPSON, H. A. Food allergy: past, present and future. Allergology International, New York, set. 2016, p. 363-369. SAVAGE J, JOHNS C. Food allergy: epidemiology and natural history. Immunol Allergy Clin North Am., 2015, v. 35, n. 1, p. 45-59. SOECIDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA; ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ALERGIA E IMUNOLOGIA. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2018 - Partes 1 e 2. Arq Asma Alerg Imunol, 2018, v. 2, n. 1, p. 7-38 e 39-82. SOLÉ, D. et al. Consenso Brasileiro sobre Alergia Alimentar: 2007 – Documento conjunto da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia e Sociedade Brasileira de Pediatria. Rev Bras Alerg Imunopatol, 2008, v. 31, p. 64-89. ZOPF, Y. et al. The differential diagnosis of food intolerance. Deutsches Arzteblatt international, 2009, v. 106, n. 21, p. 359-69. 29 Obesidade Infantil e doenças crônicas na infância, aspectos nutricionais e tratamento dietoterápico. Autoria: Izabella Tesoto Loscalzo Leitura crítica: Andressa Mara Baseggio Objetivos • Orientar os alunos sobre os aspectos epidemiológicos e socioeconômicos da obesidade infantil. • Compreender a grande relevância de se reconhecer a etiologia da obesidade infantil. • Estabelecer critérios para tratar a obesidade infantil, considerando toda a complexidade desses casos. 30 1. Fatores epidemiológicos e sociais da obesidade na infância e suas doenças crônicas associadas A obesidade infantil, que é definida pelo excesso de gordura corporal, em quantidade que determine prejuízos à saúde, é um problema crescente a nível nacional e internacional. Neste sentido, a Organização Mundial da Saúde — OMS — (Who, 2013) instituiu a meta de reduzir substancialmente a obesidade de crianças e adolescentes até 2025. Baseando-se em dados epidemiológicos referidos pela própria organização, entre os anos de 1975 e 2016 identificou-se um aumento de dez vezes na quantidade de obesos no mundo nesta faixa etária: de 11 milhões de casos em 1975 para 124 milhões em 2016. Estes dados ainda não levam em consideração os outros 213 milhões de crianças e adolescentes que estavam com sobrepeso no mesmo ano. No Brasil não é diferente, uma vez que 33,5% das crianças possuem excesso de peso, sendo que este valor era de 11,9% no final da década de 80. A grande preocupação fica em torno do fato de que a obesidade infantil não fica restrita apenas ao excesso de peso, mas também as doenças crônicas relacionadas, que chamamos de comorbidades, as quais podem ser exemplificadas por complicações gastrointestinais, músculo esqueléticas e ortopédicas, apneia do sono e início acelerado de doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2 (Who, 2016). No Quadro 1 é possível observar as consequências que a obesidade infantil e as suas comorbidades podem ser capazes de gerar em diferentes aspectos da qualidade de vida da criança. 31 Quadro 1 — Consequências associadas à obesidade infantil Reduz o desempenho escolar da criança, e consequentemente o nível de escolaridade. Altera a saúde da criança. Piora a qualidade de vida. Diminui a socialização. Em longo prazo, pode reduzir a expectativa devida. Contribui para dificuldades comportamentais e emocionais. Fonte: Who (2016). Portanto, a obesidade infantil é um grave problema de saúde pública. Contudo, devido a sua altíssima complexidade, não é possível enfrentá- la de forma simplista. Desse modo, é importante conhecer os fatores etiológicos associados. 2. Fatores etiológicos da obesidade na infância Algumas das causas associadas à obesidade na infância estão destacadas a seguir, em tópicos, para facilitar a assimilação: • Renda • Os estudos são taxativos: os que mais sofrem são os mais vulneráveis economicamente. Isso é escancarado quando observamos os países com maior renda, onde o risco de obesidade infantil é maior nos grupos familiares que possuem menor renda e menor escolaridade. Parte desses indivíduos vivem no que chamamos de “desertos alimentares”, onde há pouco acesso à alimentos “in natura” e minimamente processados, e muita disponibilidade de alimentos ultraprocessados de baixíssima qualidade nutricional. Isso também é observado em casos de crianças migrantes ou 32 indígenas, devido a rápida aculturação e falta de acesso a informações de saúde pública (Who, 2016). • Transição nutricional • Evento bastante comum em países em desenvolvimento, como o Brasil. Com o advento do desenvolvimento econômico e industrial do país, a fome e a desnutrição vão se tornando menos comuns (em nível populacional), e este quadro é substituído por mudanças na dieta e padrões de atividade física que caracterizam um maior risco para o excesso de peso e obesidade na população, inclusive na infância (Popkin et al., 2020). • Formação de hábitos alimentares • A formação dos hábitos alimentares na infância tem seu início durante os primeiros 1000 dias de vida, que abrange desde a gestação até os dois anos de vida. Este período tem forte impacto no metabolismo, saúde, formação de microbiota, imunidade e comportamento alimentar da criança. Dependendo de como foi o manejo da alimentação e nutrição da criança nessa época, bem como das oportunidades de boas práticas comportamentais associadas ao comer, é possível que estes fatores possam impactar no maior risco de excesso de peso e obesidade infantil, e consequentemente, das doenças crônicas associadas (BRASIL, 2019). • Os pais/responsáveis • Os pais são fundamentais no processo de formação dos hábitos de vida da criança, inclusive os alimentares, especialmente na primeira infância, onde as crianças são altamente dependentes deles. É no núcleo familiar que se formam pontos importantes das escolhas e preferências alimentares, uma vez que as 33 crianças colocam em prática comportamentos semelhantes aos de seus pais. De mesmo modo, o estilo de vida, aspectos associados com a insatisfação corporal, ausência de monitoramento da qualidade da alimentação, falta de promoção de habilidades culinárias, controle excessivo do consumo alimentar e refeições realizadas fora da mesa (especialmete em frente de telas) que podem contribuir para o maior risco do desenvolvimento da obesidade na infância (Scaglioni et al., 2018). • Consumo alimentar • Nas últimas décadas observamos intensas alterações na disponibilidade e qualidade dos alimentos ofertados, onde as crianças são cada vez mais expostas aos alimentos ultraprocessados, devido a sua conveniência. Observa-se esse consumo de forma mais relevante em uma refeição que faz parte da rotina da criança, como os lanches, que incluem o escolar. O consumo de alimentos ultraprocessados está associado ao aumento da gordura corporal, em função da maior concentração de calorias provindas de excesso de gorduras e açúcares, que por sua vez, associa-se com dislipidemia, diabetes, doenças cardiovasculares e cáries. É importante reforçar o papel das bebidas açucaradas ultraprocessadas nesse contexto também. Há também o fato de que uma alimentação rica em ultraprocessados desestimula a incorporação das habilidades culinárias entre pais e filhos, prática que pode contribuir com a alimentação e com a própria relação familiar. Nesse sentido, as habilidades culinárias promovem maior consciência alimentar na infância, melhoram a aceitação de alimentos “in natura” e minimamente processados, além de ajudarem na melhor formação do paladar (Brasil, 2019) 34 • Aspectos comportamentais • Existem alguns padrões comportamentais, dentro do contexto da alimentação, que merecem atenção pelo seu papel no desenvolvimento ou prevenção da obesidade, a depender de suas características específicas. Entre eles destaca-se, a frequência de refeições, intervalo de horários, o consumo habitual do café da manhã (sua ausência está relacionada com maior risco de excesso de peso), tamanho das porções, presença forte do comer emocional, que pode levar ao consumo aumentado de alimentos de alta densidade energética (SCAGLIONI et al., 2018) • Sedentarismo • O cenário atual é caracterizado pela falta ou redução do acesso aos espaços de lazer e práticas de atividades físicas, e sofre grande influência das tecnologias em frente às telas, de modo geral. Assim, observa-se uma baixa taxa de atividade física: sabe-se que, , atualmente, 80% das crianças e adolescentes não alcançam sequer 60 minutos diários recomendados de atividade física. Sendo assim, as crianças de hoje se movimentam menos e, consequentemente, gastam pouca energia, o que, associado ao consumo alimentar excessivo, leva ao acúmulo de gordura corporal. . É importante ressaltar que a prática regular de atividade física é capaz de reduzir o risco de diabetes, doenças cardiovasculares e cânceres (WHO, 2016). 35 3. Avaliação e diagnóstico alimentar e nutricional A avaliação e diagnóstico do estado alimentar e nutricional é baseada em 4 pilares: a avaliação do consumo alimentar, a avaliação antropométrica, os sinais clínicos e as medidas bioquímicas. Para crianças, Lacerda e Accioly (2009) trazem alguns pontos importantes nesse contexto: • Avaliação do consumo alimentar em crianças: história dietética atual e pregressa, intolerâncias, alergias, preferências e aversões alimentares, qualidade e quantidade alimentar, refeições, horários de refeições, local, quem cozinha, qual a organização familiar perante o preparo das refeições, autonomia da criança para se alimentar, hábito de comer em frente às telas e ingestão hídrica. • Avaliação dos sinais clínicos, comportamentais e sociais: função intestinal (frequência e consistência das fezes), hábito urinário, sinais clínicos clássicos (olho, boca, mastigação, deglutição, pele, edema…), avaliação da prática de atividade física, tempo da criança em frente às telas, elementos relacionados ao sono e sua qualidade, histórico familiar de doenças, histórico de internações hospitalares e diagnósticos prévios, uso de medicação e suplementos, bem como elementos socioeconômicos como renda familiar, escolaridade dos pais e classe social. • Avaliação antropométrica: peso atual, história de ganho de peso desde o nascimento, considerando a alimentação em cada etapa, estatura atual e pregressa, dobras cutâneas específicas (dobra cutânea do tríceps e subescapular) e circunferência abdominal. Recomenda-se que o profissional tenha acesso às curvas de crescimento desde o nascimento, para poder avaliar e contextualizar o estado antropométrico da criança que está sendo avaliada. A avaliação das curvas de dobras cutâneas e 36 circunferências deve ser considerada a partir dos oito anos, em média. Além disso, Brasil (2015) sugere alguns marcadores de consumo alimentar em crianças que devem ser avaliados, pois são associados com o excesso de peso/obesidade na infância. Estes elementos podem ser observados na Tabela 1. Tabela 1 – Indicadores alimentares para crianças entre dois e nove anos de idade Indicadores alimentares para crianças entre dois e nove anos de idade Hábito de realizar no mínimo três refeições diárias Consumo de verduras e legumes Hábito de realizar as refeições em frente atelas Consumo de hambúrgueres e/ou embutidos Consumo de feijão Consumo de bebidas adoçadas/açucaradas Consumo de fruta Consumo de biscoito recheado, doces e guloseimas Consumo de macarrão instantâneo, salgadinhos de pacote ou biscoitos salgado Fonte: Brasil (2015). 4. Tratamento dietoterápico da obesidade e doenças crônicas associadas na infância A obesidade infantil pode ser revertida por meio do investimento em práticas realistas e graduais que auxiliem a criança e sua família a mudarem seus hábitos. É urgente que o nutricionista compreenda toda a complexidade desta enfermidade, considerando os aspectos etiológicos como um elemento norteador para iniciar a mudança, e que não traga orientações robotizadas e nada individualizadas. Nesse 37 sentido, o Guia Alimentar para a População Brasileira (Brasil, 2014) traz uma série de recomendações relevantes dentro desse contexto, que serão abordadas a seguir, em tópicos: 1. A família deve compreender os aspectos que distinguem quantidade de qualidade dos alimentos, de modo que priorize a percepção interna sobre saciedade e fome, a fim de encontrar um caminho individualizado e realista para quanto comer, e de mesmo modo compreender aspectos básicos do alimento, como a diferenciação entre a densidade energética e nutricional da comida, e de como isso pode impactar significativamente na qualidade do consumo alimentar. Para tanto, é muito importante que a família procure o suporte de um nutricionista atualizado para guiar ness0e processo. 2. Trazer os conceitos sobre os níveis de processamento dos alimentos, e quanto isso influencia na qualidade, quantidade e percepção de fome e saciedade. Além disso, para trazer um contexto realista, o nutricionista deve propor trocas e adaptações de alimentos/preparações, conforme a percepção da influência negativa em relação ao consumo calórico e nutricional que determinados alimentos podem ocasionar no processo de tratamento da obesidade. 3. Orientar que a família busque, gradualmente, priorizar refeições em família. As crianças aprendem por imitação e este momento pode ser valioso. 4. Comer sem distrações, sem o uso de telas ligadas, uma vez que estes elementos acabam promovendo o comer inconsciente, que leva ao consumo alimentar maior do que se deveria. 5. Aumento do vínculo da criança com o alimento, onde busca envolvê-la com o preparo e organização das refeições, que inclui a dinâmica de arrumar a mesa, fazer as compras, reconhecer 38 os alimentos e cozinhar preparações interessantes, saudáveis e saborosas. 6. Não obrigar a criança a comer, mas desenvolver um contexto alimentar que auxilia a criança a se interessar pela comida e o momento de se alimentar. 7. Promover uma percepção corporal positiva, no sentido de que é importante que essa criança se respeite e se ame e, a partir desse ponto, possa escolher boas atitudes perante sua saúde, que inclui a alimentação saudável. 8. Promover a prática de atividade física dentro da rotina dos dias e que ela seja prazerosa. 9. Trazer atividades lúdicas e instigantes dentro do contexto da alimentação, para que auxilie a criança a manter-se dentro do processo da mudança de comportamento alimentar, sem grandes sacrifícios 10. Por fim, é muito importante que a família seja orientada que tudo é um processo, e que a obesidade é uma doença complexa e, por isso, não pode ser resolvida em pouco tempo ou em poucos passos. Há de se compreender que a família precisa mudar hábitos e comportamentos aos poucos, de modo que a criança vá participando deste processo de mudança. Há um tempo, normalmente um tempo longo, mas um caminhar em frente é sempre o melhor caminho. 5. Conectando à realidade Na prática, a avaliação antropométrica da criança em suspeita de obesidade infantil deve considerar os seguintes pontos: 39 • Aferição do peso atual, conhecimento da história de ganho de peso, contextualizando cada fase crítica analisada dentro das curvas de crescimento. • Aferição da estatura atual e pregressa, olhando para as curvas de ganho de peso com olhar crítico sobre o fato de que se trata realmente de uma criança com excesso de peso ou apenas de uma criança maior que a média. • Observação dos pontos de corte de IMC/idade desde os primeiros pontos na curva, até os momentos atuais. Considera-se um dos pontos de alerta que o parâmetro IMC/IDADE esteja maior ou igual ao percentil 85 — mas essa variável não pode ser observada de forma isolada. • Aferir as medidas complementares, que visam identificar as reservas corporais, sua localização e as faixas percentilares associadas. Considera-se como sinais de alerta quando as medidas dobra cutânea do tríceps, dobra cutânea subescapular e circunferência abdominal encontram-se maiores ou iguais ao percentil 85 ao aferir as tabelas específicas. • Para pré-adolescentes e adolescentes ainda é relevante que se observe o estágio de maturação sexual, para entender em qual fase de crescimento a criança se encontra, e quanto este evento pode estar influenciando no crescimento e ganho de peso dela. Diferentemente do adulto, o diagnóstico antropométrico para a população infantil é bastante complexo e exige experiência e bom senso do profissional, uma vez que há necessidade de se considerar além dos valores e suas faixas percentilares, mas também os contextos em cada fase, a alimentação, o comportamento, a maturação sexual, entre outros. 40 Referências bibliográficas BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Orientações para avaliação de marcadores de consumo alimentar na atenção básica. Brasília: Ministério da Saúde, 2015. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária a Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília, 2019 LACERDA, E. M. A.; ACCIOLY, E. Consulta de nutrição pediátrica. In: ACCIOLY, E.; SAUNDERS, C.; LACERDA, E. M. A. Nutrição em obstetrícia e pediatria. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan, 2009. p. 245-249. POPKIN, B. M. et al. Dynamics of the double burden of malnutrition and the changing nutrition reality. Lancet, v. 395, n. 10217, p. 65-74, 2020. SCAGLIONI, S. et al. Factors Influencing Children’s Eating Behaviours. Nutrients, v.10, n. 6, p. 706, 2018. WHO. World Health Organization. Follow-up to the Political Declaration of the High-level Meeting of the General Assembly on the Prevention and Control of Non-Communicable Diseases. Geneva, Switzerland: World Health Assembly, 2013. WHO. World Health Organization. Report of the commission on ending childhood obesity. Washington: WHO, 2016. 41 Nutrição vegetariana na infância e adolescência, aspectos nutricionais e dietoterapia Autoria: Izabella Tesoto Loscalzo Leitura crítica: Andressa Mara Baseggio Objetivos • Orientar os alunos sobre os motivos de escolhas e os tipos de vegetarianismo. • Facilitar a compreensão sobre os cuidados nutricionais que devem ser estabelecidos quanto ao consumo de macronutrientes na dieta vegetariana na infância. • Compreender sobre os cuidados nutricionais que devem ser estabelecidos quanto ao consumo de micronutrientes na dieta vegetariana na infância. 42 1. Conceitos básicos sobre o vegetarianismo A palavra “vegetariano” vem do latim vegetus, que significa “forte, robusto, vigoroso”. O preceito principal do vegetarianismo se baseia no fato da não ingestão de produtos que implicaram na morte de qualquer ser do reino animal (Slywitch, 2017). Muitos são os motivos que levam uma criança e/ou sua família a procurar a mudança de sua dieta onívora (com presença tanto de alimentos de origem animal como vegetal) para o padrão vegetariano. Dentre eles destacam-se as questões éticas, mais encontradas na rotina das crianças, que consideram que os animais têm o mesmo direito à vida e à proteção contra o sofrimento que as pessoas. Deste modo, não precisam morrer para que os humanos comam. Também há uma interação com o motivoreligioso, onde religiões como budismo e hinduísmo escolhem a alimentação vegetariana com base nestes preceitos. Outros motivos também podem estar relacionados, como a saúde e o cuidado com o meio ambiente, sendo que estes últimos se associam mais com motivações encontradas para adultos vegetarianos, do que para crianças e adolescentes (Slywitch, 2017). É importante destacar também que existem diferentes tipos de vegetarianos, que variam conforme a presença de determinados alimentos de origem animal na rotina. São os ovolactovegetarianos, lactovegetarianos, ovovegetarianos, vegetarianos estritos, veganos e outros grupos. Apesar de dietas vegetarianas serem consideradas mais saudáveis, salienta-se para o fato de que o rótulo da dieta não é capaz de indicar o real estado nutricional de indivíduos. Os tipos podem ser encontrados na Tabela 1. 43 Tabela 1 – Tipos de vegetarianos Ovolactovegetariano Não come carne, porém come ovos, leite de vaca e derivados lácteos. Essa é a opção da maioria dos vegetarianos. Lactovegetariano Não come carne, nem ovo, mas ingere laticínios. Ovovegetariano Não come carne, nem laticínios, mas mantém o consumo de ovos. É a variação do vegetarianismo com menor aderência dentre a população. Vegetariano estrito Não come nenhum alimento derivado de animais, como carne, laticínios, ovos, mel, entre outros. Após o tipo “ovolactovegetariano”, é o mais comum de ser encontrado. Vegano Vai além da questão alimentar, que fica no esquema do “vegetariano estrito”. É o indivíduo que também não utiliza, dentro do possível e praticável, outros tipos de produtos e serviços que possam envolver em algum grau a exploração dos animais. Outros tipos Enquadram-se os frugívoros, crudívoros, macrobióticos (que podem ser vegetarianos, ou não) e o semivegetariano (que mantém o consumo esporádico de carne branca). Fonte: adaptado de AMIT (2010). 2. Os macronutrientes na dieta vegetariana durante a infância e adolescência Antes de nos aprofundarmos a respeito das questões nutricionais da dieta vegetariana na infância e adolescência, é muito importante reforçar que são diversas as referências robustas que reafirmam: o vegetarianismo é seguro durante toda a infância e adolescência, desde que haja o acompanhamento profissional adequado, assim como se espera para qualquer indivíduo, uma vez que o acompanhamento nutricional, especialmente nestas fases da vida onde há maiores riscos nutricionais beneficia à todos, independente do estilo alimentar (Melina, Craig, Levin, 2016). Slywitch (2017) reforça que uma alimentação adequada é aquela que fornece todos os nutrientes necessários para a manutenção da 44 saúde, sem falta ou excessos. Assim como para qualquer dieta, a adequação nutricional depende intimamente da escolha alimentar dos indivíduos. A alimentação vegetariana bem planejada é capaz de suprir as demandas nutricionais com facilidade, e cabe a nós, profissionais, nos responsabilizamos por fornecer apoio e encorajamento aos que demonstram interesse pela adoção de uma dieta vegetariana. As recomendações nutricionais não são diferentes entre vegetarianos e onívoros. Porém, nas dietas em que se apresenta uma restrição de um grupo alimentar com relevância energética (proteínas, carboidratos e gorduras), deve-se haver atenção, pois há maior tendência de se consumir maior volume de alimento, e isso pode levar à percepção de plenitude gástrica. Nas crianças este fato é bastante importante, especialmente dentre as crianças menores de 3 anos. Por isso é importante planejar adequadamente os alimentos e o volume das refeições ao longo do dia, de modo que se contemple os requerimentos dietéticos (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). Sobre a distribuição de macronutrientes na infância e adolescência, a Tabela 2 demonstra as diferenças, conforme a faixa etária. Tabela 2 – Distribuição dos macronutrientes na infância e adolescência Nutrientes 1 a 3 anos 4 a 18 anos Carboidratos 45-65% 45-65% Proteínas 5-20% 10-30% Gorduras 30-40% 25-35% Fonte: IOM, 2002. Carboidratos De modo geral, os vegetarianos ingerem, percentualmente, mais carboidratos do que onívoros. No entanto, os carboidratos ingeridos na 45 dieta vegetariana geralmente são do tipo complexo, que apresentam diversos benefícios para a saúde, dentro do contexto de uma alimentação equilibrada. E mais importante do que isso, os estudos reforçam que apesar do consumo ser maior, a ingestão não ultrapassa as recomendações (Sociedade Vegetariana Brasileira, 2020). Proteínas Dentre todos os mitos que rodeiam a dieta vegetariana, especialmente na infância, há um senso comum — reforçado por leigos e profissionais desatualizados —, que a alimentação vegetariana é pobre em proteínas. É importante que se saiba diferenciar proteínas de aminoácidos. Uma analogia simples: imagine que a proteína é como um quebra-cabeça montado, cujas pequenas peças são os aminoácidos. É fisiologicamente impossível absorver a proteína inteira (o quebra-cabeça montado). É necessário, então, desmontar as peças (os aminoácidos) para que, assim, sejam absorvidas. Portanto, na alimentação vegetariana, é mais relevante considerar a ingestão dos aminoácidos essenciais (aqueles que precisam ser consumidos todos os dias) em quantidade e qualidade, e não apenas o conceito mais simplificado de “proteínas” (Sociedade Vegetariana Brasileira, 2020). Abaixo você pode observar, na Tabela 3, a lista dos aminoácidos essenciais, não essenciais e condicionalmente essenciais. 46 Tabela 3 – Lista de aminoácidos Essenciais Condicionalmente essenciais Não essenciais Fenilalanina Glicina Alanina Triptofano Prolina Ácido aspártico Valina Tirosina Ácido glutâmico Leucina Cisteína e Cistina Aspargina Isoleucina Taurina Serina Metionina Arginina Treonina Glutamina Lisina Histidina Fonte: Sociedade Vegetariana Brasileira (2020). A alimentação vegetariana pode possuir todos os aminoácidos essenciais necessários, seja ela vegetariana estrita ou ovolactovegetariana. Isso porque, no reino vegetal, é importante combinar diferentes alimentos para que se obtenha a proporção de aminoácidos essenciais perfeita. Um bom exemplo é o nosso clássico “arroz + feijão”, que também pode ser compreendido pela combinação de “cereal + leguminosa”. Além disso, incluir no dia a dia oleaginosas e sementes é uma boa estratégia, já que também são fontes interessantes de aminoácidos. Essa combinação é completa em aminoácidos essenciais, e deve acontecer no dia a dia alimentar das crianças e adolescentes vegetarianos (Melina, Craig, Levin, 2016; Slywitch, 2017; Sociedade Brasileira DE Pediatria, 2021; Sociedade Vegetariana Brasileira, 2020). Gorduras Os estudos indicam que as crianças vegetarianas consomem menos gordura do que as onívoras, especialmente gordura saturada e colesterol. Esse achado é positivo em muitos aspectos, mas também merece atenção, pois dietas pobres em gorduras (menos de 15% das calorias totais da dieta) podem levar à deficiência de ácidos graxos essenciais, como o ômega-3 e 6 (Sociedade Brasileira de Pediatria, 2021). 47 Grande atenção precisa ser disponibilizada para a oferta do ômega-3 — especialmente dos ácidos graxos EPA (ácido eicosapentaenoico) e DHA (ácido docosaexaenoico) na dieta vegetariana, uma vez que não há consumo de peixes e frutos do mar. Por outro lado, o ácido graxo ômega-3 ALA (ácido alfa-linolênico) é encontrado em boas quantidades em algas, nozes, chia e linhaça. No entanto, estudos apontam que é baixa a taxa de conversão em EPA e DHA. Neste sentido, alguns acertos devem ser feitos, tais como: consumir uma boa relação entre ômega-3 e 6, para que haja uma melhor taxa de transformação do ômega-3 em EPA e DHA. O balanço ideal é 2:4 de ômega-6 para cada ômega-3. O óleo de linhaça é uma fonte vegetal mais rica em ômega-3. Em uma 5gr do óleo encontra-se 2,7g do ômega-3. Além disso, investir no consumo de sementes e oleaginosas também traz um perfil lipídico bastanteda resposta imune a alergias e Intolerâncias alimentares (defeitos enzimáticos) Objetivos 1. As reações adversas aos alimentos 2. O que é alergia alimentar? 3. Fatores de risco das alergias alimentares 4. Sintomas comuns das alergias alimentares 5. Os alimentos mais alergênicos 6. O manejo clínico das alergias alimentares 7. Sobre as intolerâncias alimentares 8. Conectando à realidade Referências Obesidade Infantil e doenças crônicas na infância, aspectos nutricionais e tratamento dietoterápico. Objetivos 1. Fatores epidemiológicos e sociais da obesidade na infância e suas doenças crônicas associadas 2. Fatores etiológicos da obesidade na infância 3. Avaliação e diagnóstico alimentar e nutricional 4. Tratamento dietoterápico da obesidade e doenças crônicas associadas na infância 5. Conectando à realidade Referências bibliográficas Nutrição vegetariana na infância e adolescência, aspectos nutricionais e dietoterapia Objetivos 1. Conceitos básicos sobre o vegetarianismo 2. Os macronutrientes na dieta vegetariana durante a infância e adolescência 3. Os micronutrientes na dieta vegetariana durante a infância e adolescência 4. Conectando à realidade Referências