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O menino na areia não é sírio

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"O menino na areia não é sírio. 
O menino na areia não é refugiado. 
O menino na areia não respira. 
E não respiram todos que viraram o rosto para o rosto virado na areia. 
Ele, o menino na areia, é o arame farpado na fronteira, é o lorde de peruca no parlamento, é o 
trem sem janelas na estação fechada de todos os países. O menino na areia é alemão, é húngaro, 
é inglês. E também é argentino, brasileiro e judeu. 
O menino na areia vive (e morre) na periferia de sua atenção, embaixo do tapete, no rodapé do 
jornal que não existe mais. O menino na areia é a especulação, a taxa de câmbio, o spread 
bancário e o socialista de botequim. O menino na areia é o menino deitado, de rosto virado para 
os cegos do outro lado da areia. 
Cegos que, ontem, finalmente, viram o menino na areia. 
E viram no livro dos rostos, que não estavam virados, mas ocupados, entre festas na areia, carros 
importados e guerrilhas ideológicas. 
Ontem, todos nós vimos o menino na areia. 
Mas o rosto, virado na areia, não era o do menino na areia. 
- Olhe de novo, menino na areia." 
Por Felipe Pena

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